Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5015352-28.2017.4.03.6100

RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. GISELLE FRANÇA

APELANTE: ELISABETE DE JESUS ANTUNES

Advogados do(a) APELANTE: CARLA SUELI DOS SANTOS - SP132545-A, CELIO LUIS GALVAO NAVARRO - SP358683-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5015352-28.2017.4.03.6100

RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. PEIXOTO JUNIOR

APELANTE: ELISABETE DE JESUS ANTUNES

Advogados do(a) APELANTE: CARLA SUELI DOS SANTOS - SP132545-A, CELIO LUIS GALVAO NAVARRO - SP358683-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de mandado de segurança impetrado contra ato do Superintendente Regional do Patrimônio da União no Estado de São Paulo acoimado de violação a direito líquido e certo da parte impetrante.

A sentença proferida (Id 3868640) extinguiu o processo sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil, ao reconhecer que "carece a parte impetrante de legitimidade para questionar a exigibilidade do laudêmio".

Recorre a parte impetrante (Id 3868648) sustentando a sua legitimidade e postulando a análise de mérito do mandado de segurança para declarar a inexigibilidade do crédito.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.

Id 6006324, manifestou-se o representante do MPF de 2ª Instância pela inexistência de interesse público a justificar a intervenção.

É o relatório.

 

Peixoto Junior

Desembargador Federal

 

 

 

 

 

 


 

A sentença Id 3868640 julgou extinto o feito sem exame do mérito, nos termos do art. 485, inciso VI, do CPC, entendendo seu prolator que:

 

A parte impetrante expressamente postula em sua exordial o reconhecimento da inexigibilidade do laudêmio, laudêmio cujo sujeito passivo é o alienante do domínio útil/cessão de direitos (no caso, Resort Tamboré Empreendimentos Ltda). 

Assim, carece a parte impetrante de legitimidade para questionar a exigibilidade do laudêmio, mesmo que prevista em escritura situação diversa”.

 

Assim entendeu-se na sentença, conclusão com a qual, porém, não me ponho de acordo. 

Conforme a jurisprudência desta Corte, os valores devidos a título de laudêmio podem ser exigidos tanto do alienante quanto do adquirente por tratar-se de obrigação propter rem, razão pela qual não há se falar em ilegitimidade ativa da parte impetrante, adquirente do domínio útil do imóvel em questão. Confira-se:

 

APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. LEGITIMIDADE ATIVA. LAUDÊMIO. NATUREZA PROPTER REM. FATO GERADOR DO LAUDÊMIO. TRANSFERÊNCIA OU CESSÃO ONEROSA DO DIREITO DE USO. TERMO INICIAL PARA CONTAGEM DA DECADÊNCIA/PRESCRIÇÃO. CIÊNCIA DA UNIÃO. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA NÃO CONFIGURADOS. EXIGIBILIDADE DO LAUDÊMIO. INAPLICABILIDADE DO §1º DO ART. 47 DA LEI 9.636/98. APELAÇÃO DESPROVIDA. 
1. Sabe-se que o laudêmio possui natureza propter rem, ou seja, as obrigações desta natureza gravam a própria coisa independentemente de quem seja o titular do direito real sobre elas.
2. Sobre o elemento pessoal, o sujeito ativo é a União Federal (proprietária do imóvel e senhoria direta) e o sujeito passivo é o vendedor (enfiteuta ou foreiro, e não o adquirente, nos termos do art. 3º do DL nº 2.398/1987), embora pactos privados legítimos que modifiquem esse ônus devam ser respeitados pelos que negociam o domínio útil (E.STJ, REsp 1399028/CE, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 17/11/2016, DJe 08/02/2017). E porque o laudêmio assume contorno de obrigação propter rem, tanto o vendedor quanto o adquirente estão legitimados para compor lides sobre o tema.

3. O fato da cobrança do laudêmio se dar em nome de terceiro, não afasta a legitimidade e o interesse de agir da parte impetrante para discutir a cobrança judicial do laudêmio fundada na transferência onerosa do domínio útil do imóvel em questão, pois futuras transmissões deste imóvel poderão ser obstadas por causa da ausência do prévio recolhimento das obrigações enfitêuticas.
4. O laudêmio tem natureza de receita administrativa patrimonial originária da União, decorrente da relação contratual, sem qualquer correlação com o poder de tributar que os entes federativos gozam, de forma que não é considerado um tributo, de modo que não se submete às disposições do Código Tributário Nacional.
5. Com relação à decadência e prescrição, os créditos anteriores à Lei 9.821/99 não se sujeitavam à decadência, mas, tão-somente, ao prazo prescricional de cinco anos, previsto no art. 1º, do Decreto 20.910/32; com a edição da Lei 9.636/98 foi instituída a prescrição quinquenal em seu art. 47, sendo que o referido artigo foi modificado pela Lei 9.821/99, que passou a vigorar a partir do dia 24 de agosto de 1999, instituindo prazo decadência de cinco anos para constituição do crédito, mediante lançamento, mantendo-se, todavia, o prazo prescricional de cinco anos para a sua exigência; por fim, com a edição da Lei 10.852/2004, publicada em 30 de março de 2004, houve nova alteração do art. 47 da Lei 9.636/98, sendo estendido o prazo decadencial para dez anos, mantendo-se, novamente, o prazo prescricional quinquenal, a contar do lançamento.
6. Sabe-se que o fato gerador do laudêmio somente ocorre no ato do registro da transferência onerosa e/ou da cessão de direitos junto ao Cartório de Registro de Imóveis (CRI).
7. Há de se ressaltar que a data da celebração do contrato entre os particulares não necessariamente corresponde ao momento em que a União toma conhecimento da alienação do direito de ocupação ou de foro, para fins de contagem do prazo prescricional/decadencial.
8. Compulsando os autos verifico que a averbação da transferência do domínio útil do imóvel, celebrada em 15.01.2010, somente foi levada ao conhecimento da União em 05.03.2018, conforme consta na escritura de Venda e Compra e Cessão do Imóvel.
9. Outrossim, registre-se ainda que a inexigibilidade, prevista no §1º do art. 47 da Lei nº 9.636 /98, é incompatível com o instituto do laudêmio, uma vez que, tratando-se de receita eventual, a constituição de seu crédito depende da comunicação da venda ou da cessão de direitos, em razão da ausência de um fato gerador contínuo no tempo.
10. Não há que se falar, portanto, em decadência nos termos do disposto no artigo 47, I, da Lei 9.696/98, na redação conferida pela lei 10.852/2004, e tampouco há que se cogitar ser o caso de prescrição que, segundo o inciso II, somente deve ocorrer cinco anos contados do lançamento.
11. Apelação desprovida.  
(TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5022379-57.2020.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, julgado em 01/06/2022, Intimação via sistema DATA: 08/06/2022);

 

DIREITO ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. LAUDÊMIO. INTERESSE DE AGIR DOS ADQUIRENTES DE DOMÍNIO ÚTIL DO IMÓVEL. PRAZO DECADENCIAL. INÍCIO. CIÊNCIA, PELA UNIÃO, DA ALIENAÇÃO. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA NÃO OCORRIDAS. APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO PROVIDOS.

1. O laudêmio possui natureza propter rem, ou seja, as obrigações desta natureza gravam a própria coisa independentemente de quem seja o titular do direito real sobre elas.

2. Basta a aquisição do domínio, ainda que não haja a imissão na posse, para que o adquirente se torne responsável por tais obrigações, inclusive com relação às parcelas anteriores à aquisição. Precedente desta Corte.

3. Ainda que assim não fosse, resta evidente o interesse de agir das impetrantes quanto à discussão judicial sobre ser devida, ou não, a cobrança de laudêmio fundada em transferência onerosa do domínio útil do imóvel por eles adquirido, já que, a persistir a exigência dos valores pela União, futuras transmissões deste domínio útil poderão ser obstadas em razão de tais pendências, nos termos do artigo 3º, § 2°, I, “b” do Decreto-Lei nº 2.398/87.

4. Os fatos que dão causa à cobrança do laudêmio (hipótese material de incidência) são a cessão (ou cessões) ou o registro da escritura. No entanto, o prazo decadencial só se inicia, para efeito de constituição, mediante lançamento, a partir do conhecimento, pela União Federal (SPU), das transações então noticiadas na escritura.

5. A prevalecer a tese da impetrante, bastaria aos alienantes e adquirentes que mantivessem em segredo as diversas transferências do domínio útil durante o prazo decadencial e/ou prescricional para, só após o seu decurso, dar publicidade às transações, pretendendo se furtar ao pagamento do laudêmio devido sob a alegação de prescrição e/ou decadência, o que não se pode admitir, sob pena de que vendedores e compradores se beneficiem de sua própria torpeza.

6. No caso concreto, o impetrante adquiriu direitos sobre domínio útil do imóvel em questão por meio de escritura pública que foi levada a registro em 04/12/2014 e que, embora não haja nos autos a data exata do lançamento do laudêmio, o presente writ foi impetrado em 07/10/2017, de sorte que certamente não decorreu o prazo decadencial decenal para constituição do crédito, tampouco o prazo prescricional quinquenal.

7. De rigor o reconhecimento de que não se operou a decadência nem a prescrição no caso concreto, devendo a sentença ser reformada para se denegar a segurança.

8. Apelação e reexame necessário providos.

(TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApReeNec - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO, 5018146-22.2017.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal WILSON ZAUHY FILHO, julgado em 12/03/2020, Intimação via sistema DATA: 13/03/2020);

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. LEGITIMIDADE ATIVA PARA IMPETRAÇÃO. LAUDÊMIO. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. INAPLICABILIDADE DO ART. 1.013, § 3º, I DO CPC. SENTENÇA ANULADA. RECURSO PROVIDO.

1. Apelação em mandado de segurança interposta contra sentença que julgou o processo extinto, sem o exame do mérito, ao ponderar que a impetrante carece de legitimidade para questionar a exigibilidade do laudêmio.

2. Considerado que os valores devidos em razão do domínio útil podem ser exigidos tanto do alienante quanto do adquirente, por se tratar de obrigação propter rem, a impetrante deve ser considerada parte legítima para figurar no polo ativo da ação mandamental.

3. Sentença anulada para reconhecer a legitimidade ativa da apelante para a impetração e determinar o retorno dos autos ao Juízo de origem para que o feito tenha regular prosseguimento.

4. Impossibilidade de julgamento nos moldes do art. 1.013, §3º, I, do CPC, tendo em vista o duplo grau obrigatório previsto no art. 14, §1º, da Lei nº 12.016/09.

5. Apelação provida. 

(TRF 3ª Região, 1ª Turma,  ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL, 5013687-74.2017.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal HELIO EGYDIO DE MATOS NOGUEIRA,  julgado em 14/02/2020,  Intimação via sistema DATA: 18/02/2020).              

 

Tratando-se, in casu, de matéria exclusivamente de direito, tendo a autoridade impetrada apresentado informações (Id 3868629), cabível a apreciação, por esta Corte, do postulado na inicial, com amparo no art. 1.013, §3º, inciso I, do CPC, que assim dispõe:

 

"Art. 1.013. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.

§ 3o Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando:

I - reformar sentença fundada no art. 485".

 

Feita estas considerações, passo à análise do mérito.

Debate-se nos autos sobre matéria de decadência/prescrição de crédito oriundo de cobrança de laudêmio. 

A questão rege-se pelo disposto no artigo 47 da Lei 9.636/98: 

Art. 47. O crédito originado de receita patrimonial será submetido aos seguintes prazos:  

I - decadencial de dez anos para sua constituição, mediante lançamento; e  

II - prescricional de cinco anos para sua exigência, contados do lançamento.  

§ 1o O prazo de decadência de que trata o caput conta-se do instante em que o respectivo crédito poderia ser constituído, a partir do conhecimento por iniciativa da União ou por solicitação do interessado das circunstâncias e fatos que caracterizam a hipótese de incidência da receita patrimonial, ficando limitada a cinco anos a cobrança de créditos relativos a período anterior ao conhecimento.  

§ 2o Os débitos cujos créditos foram alcançados pela prescrição serão considerados apenas para o efeito da caracterização da ocorrência de caducidade de que trata o parágrafo único do art. 101 do Decreto-Lei no 9.760, de 1946, com a redação dada pelo art. 32 desta Lei.  

 

Em exegese ao referido artigo de lei, a Segunda Turma já se pronunciou no sentido de que o prazo decadencial de dez anos começa a fluir da data de ciência da União acerca da transferência do domínio útil do imóvel, somente a partir do lançamento iniciando-se a contagem do prazo prescricional de cinco anos: 

 

APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. LEGITIMIDADE ATIVA DOS IMPETRANTES. FATO GERADOR DO LAUDÊMIO. REGISTRO NO CRI. DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO AFASTADAS.APELAÇÃO DESPROVIDA. 

1. O laudêmio tem natureza de receita administrativa patrimonial originária da União, decorrente da relação contratual, sem qualquer correlação com o poder de tributar que os entes federativos gozam, de forma que não é considerado um tributo, de modo que não se submete às disposições do Código Tributário Nacional. 

2. Com relação à decadência e prescrição, os créditos anteriores à Lei 9.821/99 não se sujeitavam à decadência, mas, tão-somente, ao prazo prescricional de cinco anos, previsto no art. 1º, do Decreto 20.910/32; com a edição da Lei 9.636/98 foi instituída a prescrição quinquenal em seu art. 47, sendo que o referido artigo foi modificado pela Lei 9.821/99, que passou a vigorar a partir do dia 24 de agosto de 1999, instituindo prazo decadência de cinco anos para constituição do crédito, mediante lançamento, mantendo-se, todavia, o prazo prescricional de cinco anos para a sua exigência; por fim, com a edição da Lei 10.852/2004, publicada em 30 de março de 2004, houve nova alteração do art. 47 da Lei 9.636/98, sendo estendido o prazo decadencial para dez anos, mantendo-se, novamente, o prazo prescricional quinquenal, a contar do lançamento. 

3. Há de se ressaltar que a data da celebração do contrato entre os particulares não necessariamente corresponde ao momento em que a União toma conhecimento da alienação do direito de ocupação ou de foro, para fins de contagem do prazo prescricional/decadencial. 

4. Sabe-se que o fato gerador do laudêmio somente ocorre no ato do registro da transferência onerosa e/ou da cessão de direitos junto ao Cartório de Registro de Imóveis (CRI). 

5. In casu, a averbação da transferência do domínio útil do imóvel, havida em 08.01.2009, somente foi levada ao conhecimento da União em 09.07.2016, conforme processo administrativo nº 04977.008338/201194 (ID 3239975). 

6. Não há que se falar em decadência nos termos do disposto no artigo 47, I, da Lei 9.696/98, na redação conferida pela lei 10.852/2004, e tampouco há que se cogitar ser o caso de prescrição que, segundo o inciso II, somente deve ocorrer cinco anos contados do lançamento. 

7. Apelação desprovida. 

(TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL,5025985-98.2017.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, julgado em 30/04/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 08/05/2020)

 

Da leitura da ementa do citado precedente verifica-se que o que se desvela determinante na solução da questão é apurar se o lançamento ocorreu dentro do prazo de dez anos, contado da data de ciência da União acerca da transferência do domínio útil do imóvel, e se a cobrança foi efetuada em observância ao prazo prescricional de cinco anos a partir do lançamento.

Quanto à restrição de cobrança estabelecida na parte final do §1º do art. 47 da Lei 9.636/98 prevendo limitação “a cinco anos a cobrança de créditos relativos a período anterior ao conhecimento”, nela vislumbro compatibilidade somente com receitas patrimoniais periódicas, como no caso da taxa de ocupação e foro, não se aplicando ao laudêmio, que constitui receita esporádica, a adoção de entendimento diverso esvaziando de conteúdo a previsão contida no inciso I do referido artigo 47.

No caso, conforme se verifica da documentação acostada aos autos (Id 3868604, Id 3868614, Id 3868616 e Id 3868615) a ciência da União acerca da transferência do domínio útil do imóvel ocorreu em 03/11/2016, assim legítima afigurando-se a cobrança com vencimento em 31/08/2017.

Diante do exposto, dou provimento ao recurso para afastar a extinção do feito sem exame do mérito e, nos termos do art. 1.013, § 3º do CPC, julgar improcedente a impetração e denegar a ordem.

É como voto.

 

Cotrim Guimarães

Desembargador Federal

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


O Exmo. Desembargador Federal Carlos Francisco: Com a devida vênia, divirjo em parte do e.Relator.

De início, acompanho o e. Relator quanto ao reconhecimento da legitimidade da parte impetrante, acolhendo o apelo.

Quanto ao mérito, a enfiteuse ou aforamento é figura jurídica pela qual há a divisão (onerosa e entre vivos) das prerrogativas relativas a bens imóveis, colocando de um lado o domínio eminente ou conspícuo (confiado ao senhorio) e de outro lado o domínio útil (transferido ao enfiteuta ou foreiro). O laudêmio corresponde à obrigação pecuniária de direito público instituída por preceitos legislativos federais em favor da União Federal, em razão de transações envolvendo o domínio útil de seus imóveis submetidos a aforamento ou enfiteuse, sob a justificativa de compensar a União pelo não exercício do direito de consolidar o domínio pleno nessas transações.

Ainda que correntemente seja empregado o vocábulo “taxa”, o laudêmio tem natureza jurídica de receita patrimonial não tributária (nos termos do art. 39, § 2°, da Lei nº 4.320/1964, incluído pelo DL nº 1.735/1979), motivo pelo qual são inaplicáveis os regramentos do art. 145, II da Constituição de 1988 e do art. 77 e seguintes do Código Tributário Nacional (porque não há contraprestação estatal por serviço público ou por exercício do poder de polícia). Porém, a linguagem normativa utilizada para a taxa de laudêmio é muito próxima da empregada em matéria tributária, daí porque há fato gerador, lançamento, decadência, prescrição e inexigibilidade, dentre outras figuras, inclusive representando dívida ativa para efeito de cobrança executiva (art. 201 do DL nº 9.760/1942).

Toda transferência de imóvel sob o regime de aforamento da União deverá ser precedida de do recolhimento de laudêmio segundo cálculos fornecidos ao interessado pela Secretaria do Patrimônio da União (SPU), após o que esse mesmo órgão federal expede a Certidão de Autorização de Transferência (CAT). Por força do contido no art. 3º, § 2º, I, “a”, do Decreto-Lei nº 2.398/1987 (alterado pelo art. 33 da Lei nº 9.636/1998), sob pena de responsabilidade dos seus respectivos titulares, os Cartórios de Notas e Registros de Imóveis não lavrarão, nem registrarão escrituras relativas a bens imóveis de propriedade da União (ou que contenham, ainda que parcialmente, área de seu domínio) sem a CAT elaborada pela SPU que declare ter o interessado recolhido o laudêmio devido.

Quanto aos elementos materiais e quantitativos, o art. 3º, caput, do DL nº 2.398/1987 (com alterações pela nº Lei 13.240/2015 e, depois, pela MP nº 759/2016, convertida na Lei nº 13.465/2017) prevê que o fato gerador é a transferência onerosa (entre vivos) do domínio útil e da inscrição de ocupação de terreno da União Federal, ou de cessão de direito a eles relativos, sendo calculado na ordem de 5% sobre o valor atualizado do domínio pleno do terreno.

Sobre o elemento pessoal, o sujeito ativo é a União Federal (proprietária do imóvel e senhoria direta) e o sujeito passivo é o vendedor (enfiteuta ou foreiro, e não o adquirente, nos termos do art. 3º do DL nº 2.398/1987), embora pactos privados legítimos que modifiquem esse ônus devam ser respeitados pelos que negociam o domínio útil (E.STJ, REsp 1399028/CE, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 17/11/2016, DJe 08/02/2017). E porque o laudêmio assume contorno de obrigação propter rem, tanto o vendedor quanto o adquirente estão legitimados para compor lides sobre o tema.

Quanto ao elemento temporal ínsito ao elemento material, é verdade que, à luz do direito privado (art. 1.227 do Código Civil de 2002), a transferência do domínio útil de um imóvel não ocorre no momento da celebração do contrato de compra e venda e nem quando de sua quitação ou da lavratura de escritura em Cartório de Notas, mas sim com as devidas anotações na matrícula do imóvel em Cartório de Registro de Imóveis. Já no âmbito do direito público, cabe ao legislador estabelecer a materialidade e o momento no qual são consumadas as transferências onerosas entre vivos para fins de laudêmio, sendo certo que o art. 3º, caput, do DL nº 2.398/1987 previu essa obrigação em toda transação do “domínio útil e da inscrição de ocupação de terreno da União ou de cessão de direito a eles relativos”, aí incluídas as negociações não levadas anteriormente a registro público pelos negociantes.

Essas transações não submetidas a registro em Cartório de Imóveis acabam sendo reveladas por força do art. 195 e do art. 237, ambos da Lei nº 6.015/1973, ao exigirem que as anotações na matrícula de imóveis sejam feitas em continuidade ou sequência para apontar todas as transferências de domínio, especialmente para dar segurança jurídica às transações e para garantir que a propriedades ou os direitos somente sejam negociados apenas por seus titulares. Por essa necessária continuidade ou encadeamento, os registros devem indicar toda a sequência dominial, apontando cada transferência de modo individualizado, mesmo que uma ou mais não tenham sido anteriormente levadas a registro.

Cessões do domínio útil de imóveis da União Federal, mesmo se celebradas por contratos particulares não registrados, são fatos geradores do laudêmio em decorrência da delimitação material do fato gerador previsto no art. 3º, caput, do DL nº 2.398/1987 (com alterações pela nº Lei 13.240/2015 e, depois, pela MP nº 759/2016, convertida na Lei nº 13.465/2017), mesmo porque a desoneração poderia dar ensejo a negócios feitos às margens de registros públicos tão somente para evitar essa obrigação pecuniária.

Em suma, pela sequência de procedimentos exigidos pela legislação de regência, o interessado solicita à SPU o cálculo do laudêmio, após o que faz o recolhimento do montante devido para, então, pedir à mesma SPU a expedição da CAT necessária para a escritura no Cartório de Notas e para o registro da transferência no Cartório de Imóveis. Na sequência, o adquirente deverá requerer à SPU as anotações para que seu nome conste como foreiro (titular do domínio útil do imóvel da União Federal), sob pena de multa pecuniária (art. 3º, §§ 4º e 5º do DL nº 2.398/1987). 

É sabido que a expedição da CAT não é precedida de diligências ou investigações por parte da SPU sobre a sequência das transações envolvendo o imóvel aforado, mas tendo ciência acerca de cessões por contratos particulares não levados a registro (notadamente quando o adquirente pede a que seu nome seja anotado como foreiro), o laudêmio deve ser lançado e cobrado pela União Federal.

Como decorrência da segurança jurídica, a regra geral é a fixação de prazo para que obrigações sejam exigidas pelo credor, cabendo ao legislador estabelecer hipóteses de decadência e de prescrição, com seus respectivos prazos, termos (iniciais e finais) e circunstâncias de suspensão e de interrupção da exigibilidade.

Pela sequência de atos legislativos pertinentes ao laudêmio, constam os seguintes prazos e termos sobre decadência para lançar e prescrição para exigir essa receita patrimonial:

(a) antes da Lei nº 9.636/1998 havia apenas prazo prescricional quinquenal, nos termos das previsões gerais do art. 1º, do Decreto nº 20.910/32, sendo ínsito que o lançamento deveria se dar no mesmo lapso temporal;

(b) o art. 47 da Lei nº 9.636/1998 se tornou legislação específica a tratar do tema, mantendo apenas a prescrição quinquenal para a cobrança do crédito estatal e sem dispor sobre decadência (daí porque o lançamento correspondente também deveria ser feito no mesmo prazo);

(c) com a modificação do art. 47 da Lei nº 9.636/1998 pela Lei nº 9.821/1999 (resultante da MP 1787/1998 – reeditada até a MP 1787-1/1999 e seguida da MP 1856-7/1999), desde 30/12/1998 passou a haver prazo decadencial de cinco anos para constituição do crédito mediante lançamento, a partir do que corre o prazo prescricional quinquenal para a sua exigência;

(d) com a nova alteração do art. 47 da Lei nº 9.636/1998 pela Lei nº 10.852/2004 (conversão da MP 152/2003), desde 24/12/2003, o prazo decadencial para lançar passou a ser de dez anos, mantido o lapso prescricional de cinco anos para a cobrança do crédito (contados da data do lançamento).

Essa sequência normativa foi consolidada pelo E.STJ na Tese firmada no Tema 244  (“O prazo prescricional, para a cobrança da taxa de ocupação de terrenos de marinha, é de cinco anos, independentemente do período considerado.”), ao julgar o REsp nº 1.133.696/PE, em 13/12/2010, aplicável também ao laudêmio porque a legislação de regência cuida de todas as receitas patrimoniais não tributárias da União Federal.

Por certo que nenhum desses atos legislativos pode ter aplicação retroativa no sentido do restabelecimento de decadências ou de prescrições já consumadas anteriormente às modificações introduzidas (art. 5º, XXXVI da Constituição), mas os novos prazos (incluindo suas majorações) incidem para as obrigações que não haviam perecido quando das publicações dos atos normativos (TRF 3ª Região, 1ª Turma,  ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0044721-47.2010.4.03.6182, Rel. Des. Federal Hélio Egydio de Matos Nogueira, julgado em 19/12/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 10/01/2020).

A atual redação do art. 47 da Lei nº 9.636/1998 é a seguinte:

Art. 47.  O crédito originado de receita patrimonial será submetido aos seguintes prazos: (Redação dada pela Lei nº 10.852, de 2004)

I - decadencial de dez anos para sua constituição, mediante lançamento; e  (Incluído pela Lei nº 10.852, de 2004)

II - prescricional de cinco anos para sua exigência, contados do lançamento.  (Incluído pela Lei nº 10.852, de 2004)

§ 1o  O prazo de decadência de que trata o caput conta-se do instante em que o respectivo crédito poderia ser constituído, a partir do conhecimento por iniciativa da União ou por solicitação do interessado das circunstâncias e fatos que caracterizam a hipótese de incidência da receita patrimonial, ficando limitada a cinco anos a cobrança de créditos relativos a período anterior ao conhecimento.   (Redação dada pela Lei nº 9.821, de 1999)

§ 2o  Os débitos cujos créditos foram alcançados pela prescrição serão considerados apenas para o efeito da caracterização da ocorrência de caducidade de que trata o parágrafo único do art. 101 do Decreto-Lei nº 9.760, de 1946, com a redação dada pelo art. 32 desta Lei. 

Conforme expressamente indicado no art. 47 da Lei nº 9.636/1998, o termo inicial do prazo de decadência para lançamento do laudêmio é aquele em que a União (SPU) toma conhecimento da existência do fato gerador, por iniciativa própria ou por solicitação do interessado das circunstâncias e fatos que caracterizam a hipótese de incidência da receita patrimonial. E o termo inicial do prazo prescricional é a data na qual se consuma a inadimplência do recolhimento do laudêmio lançado.

Particularmente acredito que a União Federal toma ciência das transferências no dia em que os Cartórios enviam à Receita Federal do Brasil a Declaração de Operações Imobiliárias (DOI) de que trata o art. 8º da Lei nº 10.426/2002 (conversão da MP 16/2001). Por essa DOI, os serventuários da Justiça informam à Receita Federal as operações imobiliárias anotadas, averbadas, lavradas, matriculadas ou registradas nos Cartórios de Notas ou de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos sob sua responsabilidade. Cada operação imobiliária corresponderá uma DOI, que deverá ser apresentada até o último dia útil do mês subsequente ao da anotação, averbação, lavratura, matrícula ou registro da respectiva operação, nos termos da Instrução Normativa SRF nº 473/2004 e alterações, sendo certo que o art. 1º e o art. 2º, ambos da Portaria RFB nº 1384/2016 trata tais dados como não protegidos por sigilo fiscal para fins de disponibilização a órgãos e entidades da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional.

Não obstante meu entendimento pessoal, admito que a interpretação dominante neste E.TRF é em outro sentido, ao qual me curvo em favor da unificação do direito e da pacificação dos litígios. Nesta E.Corte predomina a conclusão no sentido de que cessões de direitos realizadas por instrumento particular e não levadas a registro são fatos geradores de laudêmio (art. 3º, caput, do DL nº 2.398/1987), e o termo inicial do prazo decadencial é o dia em que a União Federal toma conhecimento dessas transferências, ainda que mediante apresentação de documentação anotada em Cartório de Notas ou Cartório de Registro de Imóveis quando o interessado pleiteia que a SPU faça a transferência do domínio útil de bem aforado para seu nome (art. 47, §1º, da Lei nº 9.636/1998). Nesse sentido, menciono: 1ª Turma,  ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0025227-44.2016.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal Wilson Zauhy Filho, julgado em 14/09/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 21/09/2020, e 1ª Turma,  ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5020613-71.2017.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal Hélio Egydio de Matos Nogueira, julgado em 19/08/2020, Intimação via sistema DATA: 20/08/2020; e Segunda Turma,  Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 233985 - 0042187-71.1999.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal Cotrim Guimarães, julgado em 09/06/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/06/2015.         

Contudo, ainda que o art. 47, I, da Lei nº 9.636/1998 tenha estabelecido duas regras para exercício das prerrogativas estatais (prazo decadencial para o lançamento e prazo prescricional para cobrança dessas receitas patrimoniais da União Federal), a parte final do §1º desse mesmo preceito legal prevê a inexigibilidade como terceira regra que limita a imposição dessas receitas estatais “a cinco anos a cobrança de créditos relativos a período anterior ao conhecimento”. A inexigibilidade prevista na parte final do §1º do art. 47, §1º, da Lei nº 9.636/1998 é aplicável a todas as taxas tratadas nessa lei, porque o legislador não diferenciou receitas patrimoniais periódicas (como foro e taxa de ocupação) das esporádicas (como o laudêmio).

Ademais, o art. 47 da Lei nº 9.636/1998 rege toda a matéria relativa a decadência e prescrição dessas receitas patrimoniais não tributárias da União Federal, não havendo razão jurídica para negar vigência à parte final do §1º desse mesmo preceito normativo quanto à inexigibilidade do laudêmio devido em casos de cessões particulares.

Até mesmo a administração pública federal expressamente reconheceu que a receita esporádica do laudêmio está sujeita à inexigibilidade do art. 47, §1º, parte final, da Lei nº 9.636/1998. Nos termos do ainda vigente art. 20, III, da Instrução Normativa SPU nº 01/2007, é inexigível o crédito não constituído originado em receita patrimonial cujo fato gerador anteceda cinco anos ou mais da data do conhecimento das circunstâncias e fatos que caracterizam a hipótese de incidência da respectiva receita, considerando-se como fato gerador, para o crédito de laudêmio sobre cessão, a data da transação (se estiver definida), ou à míngua de definição da data, a data do instrumento que a mencione. Não tendo sido alterado pela Instrução Normativa SPU 01/2018, o art. 20, III, da Instrução Normativa SPU nº 01/2007 está vigendo com a seguinte redação: (grifei)

Art. 20. É inexigível o crédito não constituído originado em receita patrimonial cujo fato gerador anteceda cinco anos ou mais da data do conhecimento das circunstâncias e fatos que caracterizam a hipótese de incidência da respectiva receita, considerando-se como fato gerador:

I - para os créditos de foro e taxa de ocupação, a data em que deveria ter ocorrido o lançamento estabelecido conforme o disposto no art. 3º.

II - para o crédito de diferença de laudêmio, a data do título aquisitivo quando ocupação, e de seu registro quando aforamento.

III - para o crédito de laudêmio sobre cessão, a data da transação, se estiver definida, ou à míngua de definição da data, a data do instrumento que a mencione.

§ 1º Para o crédito de multa de transferência, são inexigíveis as parcelas que antecederem a sessenta meses da data do conhecimento.

§ 2º Quando a data do conhecimento for anterior a 30 de dezembro de 1998, são inexigíveis os créditos não constituídos anteriores a 30 de dezembro de 1993.

Com base em memorandos e pareceres (p. ex., Memorando nº 10.040/2017 do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, Memorando Circular nº 372/2017-MP , Parecer nº 0088 - 5.9/2013/DPC/CONJUR-MP/CGU/AGU, Parecer/MP/CONJUR/DPC/Nº 0471 - 5.9 / 2010), a partir de 18/08/2017, a SPU passou a adotar entendimento de que a regra de inexigibilidade do art. 47, §1º da Lei nº 9.636/1998 não se aplicaria ao laudêmio por ser destinada a receitas periódicas e não a receitas esporádicas.

Esses memorandos e pareceres não só contrariam os expressos comandos do art. 47, §1º, parte final, da Lei nº 9.636/1998 e do art. 20, III, da Instrução Normativa SPU nº 01/2007, como também conduzem à insegurança jurídica pela anomalia da imprescritibilidade do laudêmio em sistema normativo no qual a regra geral é o perecimento de prerrogativas do Estado mesmo diante de atos ilícitos graves praticados por pessoas físicas ou jurídicas (tais como infrações criminais ou administrativas, mesmo quando relacionados à matéria de arrecadação). A interpretação estatal dada por tais memorandos e pareceres fragmenta a redação do §1º do art. 47 da Lei nº 9.636/1998, acolhendo a primeira parte que interessa à administração pública (quanto ao termo inicial da decadência) mas recusando a parte final porque contraria sua pretensão de arrecadação (limitação da exigibilidade a cinco anos).   

Ainda que seja possível cogitar em imprescritibilidade (exceção no sistema jurídico brasileiro), suas hipóteses devem ser estabelecidas expressamente em atos legislativos, não podendo ser impostas por memorandos ou pareceres que contrariam comandos normativos positivados. E mesmo na remota possibilidade de se admitir que há espaço jurídico para dar validade a esses memorandos e pareceres, haveria de se discutir se foi levada a efeito o reconhecimento da invalidade da interpretação até então empregada pela administração pública (o que implicaria na obrigatória anulação dos atos administrativos anteriormente realizados, observados os termos da Súmula 473 do E.STF), ou se foi implementada mudança de interpretação (cujos efeitos não podem ser retroativos às inexigibilidades até então consumadas, nos moldes do art. 2º, XIII, da Lei nº 9.784/1999).

Reconheço que há controvérsias nesta E.Corte sobre o tema, mas filio-me ao entendimento conforme julgados que ora colaciono: (grifei)

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. RECEITA DECORRENTE DE LAUDÊMIO. COBRANÇA LIMITADA A CINCO ANOS ANTERIORES AO CONHECIMENTO.  TRANSFERÊNCIA DE DIREITOS E OBRIGAÇÕES DECORRENTES DE CONTRATO DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. FATO GERADOR. LAUDÊMIO. REGISTRO DO IMÓVEL. INEXIGIBILIDADE DA EXAÇÃO. REMESSA NECESSÁRIA E RECURSO DE APELAÇÃO NÃO PROVIDOS.

1. Reexame necessário e apelação em mandado de segurança interposta pela União Federal contra sentença que julgou procedente o pedido, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, I do Código de Processo Civil, concedendo a segurança postulada por SOCIMEL EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA, confirmando a liminar deferida, para reconhecer a inexigibilidade do laudêmio de cessão referente ao imóvel de Registro Imobiliário (RIP) nº 7047.0003642-01.

2. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do recurso especial representativo de controvérsia (REsp 1.133.696 - PE), firmou entendimento no sentido de que as relações de direito material que ensejam o pagamento de taxa de ocupação, foro e laudêmio de terrenos públicos têm natureza eminentemente pública, sendo regidas pelas regras do Direito Administrativo, e que os créditos gerados na vigência da Lei nº 9.821/99 estão sujeitos a prazo decadencial de cinco anos (art. 47), que passou a ser de dez anos após a vigência da lei 11.852/2004, ao passo que o prazo prescricional é de 5 anos, independentemente do período considerado, uma vez que os débitos posteriores a 1998 se submetem ao prazo quinquenal do o artigo 47 da Lei 9.636/98, e os anteriores à vigência da citada lei, se submetem ao prazo previsto no art. 1º do Decreto-Lei n. 20.910/1932.

3. O parágrafo 1º do artigo 47 da Lei nº 9.636/1998 não foi revogado, de sorte que continua vigente a limitação a cinco anos da cobrança de créditos relativos a período anterior ao conhecimento do ocorrido, sob pena de inexigibilidade. Ademais, não se encontra nesse dispositivo nenhuma ressalva quanto à sua aplicação exclusivamente a receitas periódicas.

4. O fato gerador do laudêmio não consiste na celebração do contrato de compra e venda nem na sua quitação, mas sim no registro do imóvel em cartório. Assim, no caso dos autos, somente estão alcançadas pela inexigibilidade as receitas de laudêmio anteriores a cinco anos contados do registro do imóvel. Precedentes.

5. A mera celebração de compromisso de compra e venda não se trata de negócio jurídico hábil a ensejar a transferência do direito real de ocupação do imóvel, não constituindo, portanto, fato gerador da incidência de laudêmio (art. 3º, do Decreto-lei nº 2.398/1987).

6. A efetiva transferência do domínio útil do imóvel - fato gerador da exação - realizou-se, tão somente, por meio de negócio jurídico celebrado entre os alienantes Sérgio Pinho Mellão e Renata da Cunha Bueno Mellão e os adquirentes, havendo o respectivo título translativo foi devidamente levado a registro, consoante certidão de matrícula do bem objeto da transação.

7. Somente é exigível o laudêmio em face da efetiva transferência do domínio útil do imóvel, consubstanciada pelo registro do respectivo título translativo no Cartório Registro de Imóveis (artigo 1.227, do Código Civil de 2002). Precedentes.

8. Negado provimento à remessa necessária e ao recurso de apelação interposto pela União Federal.

(TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5025017-68.2017.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal HELIO EGYDIO DE MATOS NOGUEIRA, julgado em 12/05/2020, Intimação via sistema DATA: 13/05/2020)

                                                                        

AGRAVO DE INSTRUMENTO. INEXIGIBILIDADE DE LAUDÊMIO COBRADO PELO SPU. NÃO É CASO DE PRESCRIÇÃO OU DECADÊNCIA. COBRANÇA LIMITADA A 5 ANOS DE PERÍODO ANTERIOR AO CONHECIMENTO DA AUTORIDADE. RECURSO PROVIDO.

- Trata-se de contrato particular, sem conhecimento de terceiros e muito menos da União Federal, tendo sido o pedido de transferência formalizado perante a União Federal somente em 22/06/2016, data em que tomou conhecimento do fato ensejador da cobrança, somente a partir daí podendo correr o prazo decadencial e/ou prescricional, posto que tais prazos extintivos somente se materializam com a inércia do titular do direito em promover os atos necessários ao seu exercício.

- A cobrança poderia ser lançada até 22/06/2026 (prazo decadencial, art. 47, inc. I e §1º) e depois cobrada em mais cinco anos (prazo prescricional, art. 47, inc. II e §1º), não havendo que se falar, portanto, no caso em exame, de decadência e ou prescrição do laudêmio cobrado.

- No caso dos autos, entretanto, requer-se a aplicação da inexigibilidade prevista no § 1º do art. 47 da Lei 9.636/98, por haver transcorrido mais de cinco anos da data de conhecimento dos fatos pela autoridade administrativa.

- Dispõe expressamente o preceito legal invocado, em sua parte final, "...ficando limitada a cinco anos a cobrança de créditos relativos a período anterior ao conhecimento", de forma que, mesmo sendo um crédito legítimo, líquido e certo, não alcançado por decadência e nem por prescrição, será ele, porém, inexigível na situação ali descrita na norma legal, norma que continua em vigor e com plena aplicabilidade. Aplicando o supra exposto ao caso dos autos, tem-se que o crédito não estaria atingido pela decadência ou pela prescrição, mas, sim, não está sujeito à cobrança sob fundamento da incidência da inexigibilidade prevista no § 1º, parte final, do artigo 47 da Lei nº 9.636/98.

- Agravo de instrumento provido.

 (TRF 3ª Região, 2ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5027507-93.2018.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal LUIZ ALBERTO DE SOUZA RIBEIRO, julgado em 07/08/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 09/08/2019)

 

No caso dos autos, a parte impetrante Elisabete de Jesus Antunes questiona a cobrança do débito de laudêmio exigido em decorrência da cessão de domínio útil do imóvel consiste no apartamento 122F, do Condomínio Resort Tamboré, Av. Marcos Penteado de Ulhoa Rodrigues, n. 3800, Santana de Parnaíba/SP, objeto do Registro Imobiliário Patrimonial - RIP n. 7047.0103107-40.

Foi lavrada escritura de venda e compra do referido imóvel, em 24/08/2016 (id 3868614, Pág. 1/8), indicando Tamboré S/A como vendedora e Elisabete de Jesus Antunes como compradora. CAT expedida em 10/08/2016.

Na referida escritura consta a formalização do instrumento particular de cessão de direitos de domínio útil do imóvel em questão para a compradora, em 07/08/2011.

Em 03/11/2016, objetivando a transferência do imóvel para o nome dos compradores, foi protocolizado o pedido junto à SPU, quando então o ente estatal tomou conhecimento de todas as transações (informações id 3868629, Pág. 1/2).

Assim é que tendo tido ciência da transferência em 2016, a SPU não pode, em 2016, exigir qualquer parcela sobre laudêmio devido em 07/08/2011 e dos cálculos que fez para a CAT em 2016, em ambos os casos pela inexigibilidade em relação ao quinquênio anterior ao momento em que tomou conhecimento da transação (art. 47, §1º, da Lei nº 9.636/1998).

Note-se que aos autos está acostado DARF indicando exigência de laudêmio atinente ao período de apuração em 07/08/2011, com vencimento em 31/08/2017 (id 3868616, Pág. 1).

Dito isso, acompanho o e. Relator para dar provimento à apelação para afastar a ilegitimidade de parte e, no mérito, dele divirjo para conceder a ordem.

 

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5015352-28.2017.4.03.6100

RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. PEIXOTO JUNIOR

APELANTE: ELISABETE DE JESUS ANTUNES

Advogados do(a) APELANTE: CARLA SUELI DOS SANTOS - SP132545-A, CELIO LUIS GALVAO NAVARRO - SP358683-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

V O T O

 

A sentença Id 3868640 julgou extinto o feito sem exame do mérito, nos termos do art. 485, inciso VI, do CPC, entendendo seu prolator que:

 

A parte impetrante expressamente postula em sua exordial o reconhecimento da inexigibilidade do laudêmio, laudêmio cujo sujeito passivo é o alienante do domínio útil/cessão de direitos (no caso, Resort Tamboré Empreendimentos Ltda). 

Assim, carece a parte impetrante de legitimidade para questionar a exigibilidade do laudêmio, mesmo que prevista em escritura situação diversa”.

 

Assim entendeu-se na sentença, conclusão com a qual, porém, não me ponho de acordo. 

Conforme a jurisprudência desta Corte, os valores devidos a título de laudêmio podem ser exigidos tanto do alienante quanto do adquirente por tratar-se de obrigação propter rem, razão pela qual não há se falar em ilegitimidade ativa da parte impetrante, adquirente do domínio útil do imóvel em questão. Confira-se:

 

APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. LEGITIMIDADE ATIVA. LAUDÊMIO. NATUREZA PROPTER REM. FATO GERADOR DO LAUDÊMIO. TRANSFERÊNCIA OU CESSÃO ONEROSA DO DIREITO DE USO. TERMO INICIAL PARA CONTAGEM DA DECADÊNCIA/PRESCRIÇÃO. CIÊNCIA DA UNIÃO. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA NÃO CONFIGURADOS. EXIGIBILIDADE DO LAUDÊMIO. INAPLICABILIDADE DO §1º DO ART. 47 DA LEI 9.636/98. APELAÇÃO DESPROVIDA. 
1. Sabe-se que o laudêmio possui natureza propter rem, ou seja, as obrigações desta natureza gravam a própria coisa independentemente de quem seja o titular do direito real sobre elas.
2. Sobre o elemento pessoal, o sujeito ativo é a União Federal (proprietária do imóvel e senhoria direta) e o sujeito passivo é o vendedor (enfiteuta ou foreiro, e não o adquirente, nos termos do art. 3º do DL nº 2.398/1987), embora pactos privados legítimos que modifiquem esse ônus devam ser respeitados pelos que negociam o domínio útil (E.STJ, REsp 1399028/CE, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 17/11/2016, DJe 08/02/2017). E porque o laudêmio assume contorno de obrigação propter rem, tanto o vendedor quanto o adquirente estão legitimados para compor lides sobre o tema.

3. O fato da cobrança do laudêmio se dar em nome de terceiro, não afasta a legitimidade e o interesse de agir da parte impetrante para discutir a cobrança judicial do laudêmio fundada na transferência onerosa do domínio útil do imóvel em questão, pois futuras transmissões deste imóvel poderão ser obstadas por causa da ausência do prévio recolhimento das obrigações enfitêuticas.
4. O laudêmio tem natureza de receita administrativa patrimonial originária da União, decorrente da relação contratual, sem qualquer correlação com o poder de tributar que os entes federativos gozam, de forma que não é considerado um tributo, de modo que não se submete às disposições do Código Tributário Nacional.
5. Com relação à decadência e prescrição, os créditos anteriores à Lei 9.821/99 não se sujeitavam à decadência, mas, tão-somente, ao prazo prescricional de cinco anos, previsto no art. 1º, do Decreto 20.910/32; com a edição da Lei 9.636/98 foi instituída a prescrição quinquenal em seu art. 47, sendo que o referido artigo foi modificado pela Lei 9.821/99, que passou a vigorar a partir do dia 24 de agosto de 1999, instituindo prazo decadência de cinco anos para constituição do crédito, mediante lançamento, mantendo-se, todavia, o prazo prescricional de cinco anos para a sua exigência; por fim, com a edição da Lei 10.852/2004, publicada em 30 de março de 2004, houve nova alteração do art. 47 da Lei 9.636/98, sendo estendido o prazo decadencial para dez anos, mantendo-se, novamente, o prazo prescricional quinquenal, a contar do lançamento.
6. Sabe-se que o fato gerador do laudêmio somente ocorre no ato do registro da transferência onerosa e/ou da cessão de direitos junto ao Cartório de Registro de Imóveis (CRI).
7. Há de se ressaltar que a data da celebração do contrato entre os particulares não necessariamente corresponde ao momento em que a União toma conhecimento da alienação do direito de ocupação ou de foro, para fins de contagem do prazo prescricional/decadencial.
8. Compulsando os autos verifico que a averbação da transferência do domínio útil do imóvel, celebrada em 15.01.2010, somente foi levada ao conhecimento da União em 05.03.2018, conforme consta na escritura de Venda e Compra e Cessão do Imóvel.
9. Outrossim, registre-se ainda que a inexigibilidade, prevista no §1º do art. 47 da Lei nº 9.636 /98, é incompatível com o instituto do laudêmio, uma vez que, tratando-se de receita eventual, a constituição de seu crédito depende da comunicação da venda ou da cessão de direitos, em razão da ausência de um fato gerador contínuo no tempo.
10. Não há que se falar, portanto, em decadência nos termos do disposto no artigo 47, I, da Lei 9.696/98, na redação conferida pela lei 10.852/2004, e tampouco há que se cogitar ser o caso de prescrição que, segundo o inciso II, somente deve ocorrer cinco anos contados do lançamento.
11. Apelação desprovida.  
(TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5022379-57.2020.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, julgado em 01/06/2022, Intimação via sistema DATA: 08/06/2022);

 

DIREITO ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. LAUDÊMIO. INTERESSE DE AGIR DOS ADQUIRENTES DE DOMÍNIO ÚTIL DO IMÓVEL. PRAZO DECADENCIAL. INÍCIO. CIÊNCIA, PELA UNIÃO, DA ALIENAÇÃO. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA NÃO OCORRIDAS. APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO PROVIDOS.

1. O laudêmio possui natureza propter rem, ou seja, as obrigações desta natureza gravam a própria coisa independentemente de quem seja o titular do direito real sobre elas.

2. Basta a aquisição do domínio, ainda que não haja a imissão na posse, para que o adquirente se torne responsável por tais obrigações, inclusive com relação às parcelas anteriores à aquisição. Precedente desta Corte.

3. Ainda que assim não fosse, resta evidente o interesse de agir das impetrantes quanto à discussão judicial sobre ser devida, ou não, a cobrança de laudêmio fundada em transferência onerosa do domínio útil do imóvel por eles adquirido, já que, a persistir a exigência dos valores pela União, futuras transmissões deste domínio útil poderão ser obstadas em razão de tais pendências, nos termos do artigo 3º, § 2°, I, “b” do Decreto-Lei nº 2.398/87.

4. Os fatos que dão causa à cobrança do laudêmio (hipótese material de incidência) são a cessão (ou cessões) ou o registro da escritura. No entanto, o prazo decadencial só se inicia, para efeito de constituição, mediante lançamento, a partir do conhecimento, pela União Federal (SPU), das transações então noticiadas na escritura.

5. A prevalecer a tese da impetrante, bastaria aos alienantes e adquirentes que mantivessem em segredo as diversas transferências do domínio útil durante o prazo decadencial e/ou prescricional para, só após o seu decurso, dar publicidade às transações, pretendendo se furtar ao pagamento do laudêmio devido sob a alegação de prescrição e/ou decadência, o que não se pode admitir, sob pena de que vendedores e compradores se beneficiem de sua própria torpeza.

6. No caso concreto, o impetrante adquiriu direitos sobre domínio útil do imóvel em questão por meio de escritura pública que foi levada a registro em 04/12/2014 e que, embora não haja nos autos a data exata do lançamento do laudêmio, o presente writ foi impetrado em 07/10/2017, de sorte que certamente não decorreu o prazo decadencial decenal para constituição do crédito, tampouco o prazo prescricional quinquenal.

7. De rigor o reconhecimento de que não se operou a decadência nem a prescrição no caso concreto, devendo a sentença ser reformada para se denegar a segurança.

8. Apelação e reexame necessário providos.

(TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApReeNec - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO, 5018146-22.2017.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal WILSON ZAUHY FILHO, julgado em 12/03/2020, Intimação via sistema DATA: 13/03/2020);

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. LEGITIMIDADE ATIVA PARA IMPETRAÇÃO. LAUDÊMIO. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. INAPLICABILIDADE DO ART. 1.013, § 3º, I DO CPC. SENTENÇA ANULADA. RECURSO PROVIDO.

1. Apelação em mandado de segurança interposta contra sentença que julgou o processo extinto, sem o exame do mérito, ao ponderar que a impetrante carece de legitimidade para questionar a exigibilidade do laudêmio.

2. Considerado que os valores devidos em razão do domínio útil podem ser exigidos tanto do alienante quanto do adquirente, por se tratar de obrigação propter rem, a impetrante deve ser considerada parte legítima para figurar no polo ativo da ação mandamental.

3. Sentença anulada para reconhecer a legitimidade ativa da apelante para a impetração e determinar o retorno dos autos ao Juízo de origem para que o feito tenha regular prosseguimento.

4. Impossibilidade de julgamento nos moldes do art. 1.013, §3º, I, do CPC, tendo em vista o duplo grau obrigatório previsto no art. 14, §1º, da Lei nº 12.016/09.

5. Apelação provida. 

(TRF 3ª Região, 1ª Turma,  ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL, 5013687-74.2017.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal HELIO EGYDIO DE MATOS NOGUEIRA,  julgado em 14/02/2020,  Intimação via sistema DATA: 18/02/2020).              

 

Tratando-se, in casu, de matéria exclusivamente de direito, tendo a autoridade impetrada apresentado informações (Id 3868629), cabível a apreciação, por esta Corte, do postulado na inicial, com amparo no art. 1.013, §3º, inciso I, do CPC, que assim dispõe:

 

"Art. 1.013. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.

§ 3o Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando:

I - reformar sentença fundada no art. 485".

 

Feita estas considerações, passo à análise do mérito.

Debate-se nos autos sobre matéria de decadência/prescrição de crédito oriundo de cobrança de laudêmio. 

A questão rege-se pelo disposto no artigo 47 da Lei 9.636/98: 

Art. 47. O crédito originado de receita patrimonial será submetido aos seguintes prazos:  

I - decadencial de dez anos para sua constituição, mediante lançamento; e  

II - prescricional de cinco anos para sua exigência, contados do lançamento.  

§ 1o O prazo de decadência de que trata o caput conta-se do instante em que o respectivo crédito poderia ser constituído, a partir do conhecimento por iniciativa da União ou por solicitação do interessado das circunstâncias e fatos que caracterizam a hipótese de incidência da receita patrimonial, ficando limitada a cinco anos a cobrança de créditos relativos a período anterior ao conhecimento.  

§ 2o Os débitos cujos créditos foram alcançados pela prescrição serão considerados apenas para o efeito da caracterização da ocorrência de caducidade de que trata o parágrafo único do art. 101 do Decreto-Lei no 9.760, de 1946, com a redação dada pelo art. 32 desta Lei.  

 

Em exegese ao referido artigo de lei, a Segunda Turma já se pronunciou no sentido de que o prazo decadencial de dez anos começa a fluir da data de ciência da União acerca da transferência do domínio útil do imóvel, somente a partir do lançamento iniciando-se a contagem do prazo prescricional de cinco anos: 

 

APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. LEGITIMIDADE ATIVA DOS IMPETRANTES. FATO GERADOR DO LAUDÊMIO. REGISTRO NO CRI. DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO AFASTADAS.APELAÇÃO DESPROVIDA. 

1. O laudêmio tem natureza de receita administrativa patrimonial originária da União, decorrente da relação contratual, sem qualquer correlação com o poder de tributar que os entes federativos gozam, de forma que não é considerado um tributo, de modo que não se submete às disposições do Código Tributário Nacional. 

2. Com relação à decadência e prescrição, os créditos anteriores à Lei 9.821/99 não se sujeitavam à decadência, mas, tão-somente, ao prazo prescricional de cinco anos, previsto no art. 1º, do Decreto 20.910/32; com a edição da Lei 9.636/98 foi instituída a prescrição quinquenal em seu art. 47, sendo que o referido artigo foi modificado pela Lei 9.821/99, que passou a vigorar a partir do dia 24 de agosto de 1999, instituindo prazo decadência de cinco anos para constituição do crédito, mediante lançamento, mantendo-se, todavia, o prazo prescricional de cinco anos para a sua exigência; por fim, com a edição da Lei 10.852/2004, publicada em 30 de março de 2004, houve nova alteração do art. 47 da Lei 9.636/98, sendo estendido o prazo decadencial para dez anos, mantendo-se, novamente, o prazo prescricional quinquenal, a contar do lançamento. 

3. Há de se ressaltar que a data da celebração do contrato entre os particulares não necessariamente corresponde ao momento em que a União toma conhecimento da alienação do direito de ocupação ou de foro, para fins de contagem do prazo prescricional/decadencial. 

4. Sabe-se que o fato gerador do laudêmio somente ocorre no ato do registro da transferência onerosa e/ou da cessão de direitos junto ao Cartório de Registro de Imóveis (CRI). 

5. In casu, a averbação da transferência do domínio útil do imóvel, havida em 08.01.2009, somente foi levada ao conhecimento da União em 09.07.2016, conforme processo administrativo nº 04977.008338/201194 (ID 3239975). 

6. Não há que se falar em decadência nos termos do disposto no artigo 47, I, da Lei 9.696/98, na redação conferida pela lei 10.852/2004, e tampouco há que se cogitar ser o caso de prescrição que, segundo o inciso II, somente deve ocorrer cinco anos contados do lançamento. 

7. Apelação desprovida. 

(TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL,5025985-98.2017.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, julgado em 30/04/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 08/05/2020)

 

Da leitura da ementa do citado precedente verifica-se que o que se desvela determinante na solução da questão é apurar se o lançamento ocorreu dentro do prazo de dez anos, contado da data de ciência da União acerca da transferência do domínio útil do imóvel, e se a cobrança foi efetuada em observância ao prazo prescricional de cinco anos a partir do lançamento.

Quanto à restrição de cobrança estabelecida na parte final do §1º do art. 47 da Lei 9.636/98 prevendo limitação “a cinco anos a cobrança de créditos relativos a período anterior ao conhecimento”, nela vislumbro compatibilidade somente com receitas patrimoniais periódicas, como no caso da taxa de ocupação e foro, não se aplicando ao laudêmio, que constitui receita esporádica, a adoção de entendimento diverso esvaziando de conteúdo a previsão contida no inciso I do referido artigo 47.

No caso, conforme se verifica da documentação acostada aos autos (Id 3868604, Id 3868614, Id 3868616 e Id 3868615) a ciência da União acerca da transferência do domínio útil do imóvel ocorreu em 03/11/2016, assim legítima afigurando-se a cobrança com vencimento em 31/08/2017.

Diante do exposto, dou provimento ao recurso para afastar a extinção do feito sem exame do mérito e, nos termos do art. 1.013, § 3º do CPC, julgar improcedente a impetração e denegar a ordem.

É como voto.

 

Peixoto Junior

Desembargador Federal

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


E M E N T A

 

MANDADO DE SEGURANÇA. LAUDÊMIO. LEGITIMIDADE ATIVA DA PARTE IMPETRANTE. TRANSFERÊNCIA OU CESSÃO ONEROSA DO DIREITO DE USO. FATO GERADOR. INAPLICABILIDADE DO §1º DO ART. 47 DA LEI 9.636/98.  EXIGIBILIDADE. TERMO INICIAL PARA CONTAGEM DA DECADÊNCIA/PRESCRIÇÃO. CIÊNCIA DA UNIÃO. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA NÃO CONFIGURADOS.

1. Não há se falar em ilegitimidade ativa da parte impetrante, adquirente do domínio útil do imóvel em questão.

2. A inexigibilidade prevista no §1º do art. 47 da Lei nº 9.636/98, é incompatível com o instituto do laudêmio, uma vez que, tratando-se de receita eventual, a constituição de seu crédito depende da comunicação da venda ou da cessão de direitos, em razão da ausência de um fato gerador contínuo no tempo.

3. Sabe-se que o fato gerador do laudêmio somente ocorre no ato do registro da transferência onerosa e/ou da cessão de direitos junto ao Cartório de Registro de Imóveis (CRI).

4. Há de se ressaltar que a data da celebração do contrato entre os particulares não necessariamente corresponde ao momento em que a União toma conhecimento da alienação do direito de ocupação ou de foro, para fins de contagem do prazo prescricional/decadencial.

5. No caso, a ciência da União acerca da transferência do domínio útil do imóvel ocorreu em 03/11/2016, assim legítima afigurando-se a cobrança com vencimento em 31/08/2017.

6. Não há que se falar, portanto, em decadência nos termos do disposto no artigo 47, I, da Lei 9.696/98, na redação conferida pela lei 10.852/2004, e tampouco há que se cogitar ser o caso de prescrição que, segundo o inciso II, somente deve ocorrer cinco anos contados do lançamento.

7. Afastada a extinção do feito sem apreciação do mérito. Julgada improcedente a impetração, nos termos do art. 1.013, § 3º do CPC. Segurança denegada.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no julgamento, nos termos do artigo 942 do Código de Processo Civil, a Segunda Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso para afastar a extinção do feito sem exame do mérito e, nos termos do art. 1.013, § 3º do CPC, por maioria, julgou improcedente a impetração e denegar a ordem, nos termos do voto do senhor Desembargador Federal Peixoto Junior (relator), acompanhado pelos votos dos senhores Desembargadores Federais Cotrim Guimarães, Carlos Muta e Wilson Zauhy; vencido, nesta parte, o senhor Desembargador Federal Carlos Francisco, que concedia a ordem, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.