APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000865-48.2011.4.03.6004
RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE
APELANTE: EMBRATEC COMERCIAL IMPORTADORA E EXPORTADORA DE CEREAIS E PRODUSTOS AGRICOLAS LTDA
Advogado do(a) APELANTE: DONIZETE DOS SANTOS PRATA - SP130143-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000865-48.2011.4.03.6004 RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE APELANTE: EMBRATEC COMERCIAL IMPORTADORA E EXPORTADORA DE CEREAIS E PRODUSTOS AGRICOLAS LTDA Advogado do(a) APELANTE: DONIZETE DOS SANTOS PRATA - SP130143-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: [ialima] R E L A T Ó R I O Apelação interposta pela Embratec Comercial Importadora e Exportadora de Cereais e Produtos Agrícolas Ltda. contra sentença que, em sede de mandado de segurança, denegou a ordem e julgou improcedente o pedido de encaminhamento do recurso administrativo à instância superior (Id 95118377, p. 07/10). Opostos embargos de declaração (Id 95118377, p. 16/17), foram rejeitados (Id 95118377, p. 26/27). Aduz (Id 95118377, p. 36/47) que: a) de acordo com o artigo 5º, inciso LV, da Constituição, é assegurado aos litigantes em processo administrativo o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; b) a referida norma constitucional é de eficácia plena (artigo 5º, §1º, da CF), de forma que qualquer comando normativo que afronte esse preceito é inconstitucional, como é o caso do artigo 27, §4º, do Decreto-Lei n.º 1.455/76, que prevê julgamento em instância única, não recepcionado pela Constituição; c) a decisão administrativa foi proferida por autoridade incompetente, uma vez que deveria ser emanada do Ministro da Fazenda, a teor dos artigos 27, §4º, do Decreto-Lei n.º 1.455/76 e 774, §6º, do Decreto n.º 6.759/09; d) o artigo 295, inciso IV, da Portaria MF n.º 587/10, que trata do regimento interno da Secretaria da Receita Federal do Brasil, não confere ao inspetor chefe competência para o julgamento de processos e definição de penalidades; e) os artigos 56, §§ 1º e 2°, e 57 da Lei n.º 9784/99, que regulam o processo administrativo no âmbito da administração pública federal, vedam a conduta da autoridade coatora, pois estabelecem a faculdade de recursos em face das decisões administrativas. Em contrarrazões (Id 95118377, p. 72/76), a União requer a manutenção da sentença. O parecer ministerial é no sentido de que seja provido o recurso (Id 95118377, p. 81/85). É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000865-48.2011.4.03.6004 RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE APELANTE: EMBRATEC COMERCIAL IMPORTADORA E EXPORTADORA DE CEREAIS E PRODUSTOS AGRICOLAS LTDA Advogado do(a) APELANTE: DONIZETE DOS SANTOS PRATA - SP130143-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O I – Dos fatos Mandado de segurança impetrado por Embratec Comercial Importadora e Exportadora de Cereais e Produtos Agrícolas Ltda. contra ato praticado pelo Inspetor da Receita Federal do Brasil em Corumbá/MS, com vista ao encaminhamento do recurso administrativo à instância superior. Para melhor compreensão da questão, faço uma breve exposição dos fatos, tais como apresentados no feito: a) a autora é sociedade empresária que tem como objeto social o comércio, importação e exportação de frutas, gêneros alimentícios, hortifrutigranjeiros, sucos concentrados, sapatos, móveis, eletrodomésticos, eletroeletrônicos, cereais e veículos automotores, bem como o beneficiamento e exportação de madeiras brutas e serradas (Id 95118376, p. 27); b) em 19.12.2008, foi lavrado o termo de retenção das mercadorias e iniciado o procedimento especial previsto nos artigos 65 e 66 da IN SRF n. º 206/2002, porquanto analisado que a autora não dispunha de recursos financeiros necessários para a realização da importação de 120 toneladas de feijão provenientes da Bolívia, objeto da Declaração de Importação 08/1962988-4 (Id 95118376, p. 35/36); c) em 12.05.2009, a empresa tomou ciência do auto de infração e apresentou impugnação tempestiva. Em 12.01.2011, a ação fiscal foi julgada procedente e declarado o perdimento da mercadoria, na forma do artigo 23, inciso V, §2º, do Decreto-Lei n. º 1.455/76 (Id 95118376, p. 100/122). Contra essa decisão foi interposto, em 10.2.2011, recurso (Id 95118376, p. 41/67), ao qual foi negado seguimento, em razão da ausência de previsão normativa (Id 95118376, p. 68/69). II – Da aplicação da lei processual Inicialmente, ressalta-se que a sentença recorrida foi proferida em 20.10.2011 (Id 95118377, p. 10), razão pela qual, aplicada a regra do tempus regit actum, segundo a qual os atos jurídicos se regem pela lei vigente à época em que ocorreram, o recurso será analisado à luz do Diploma Processual Civil de 1973 (Enunciados Administrativos n.º 01 e 03/2016, do STJ). III – Do processo administrativo a) Da competência administrativa Inicialmente, não prospera a alegação de incompetência do Inspetor da Receita Federal, dado que era possível ao Ministro da Fazenda a delegação de parte de suas atribuições, conforme previsto nos artigos 774, § 7º, do Decreto n.º 6.759/09 e 295, inciso IV, da Portaria MF n.º 587/2010, vigentes à época dos fatos, que assim dispunham: Decreto n.º 6.759/09 Art. 774. As infrações a que se aplique a pena de perdimento serão apuradas mediante processo fiscal, cuja peça inicial será o auto de infração acompanhado de termo de apreensão e, se for o caso, de termo de guarda fiscal (Decreto-Lei nº 1.455, de 1976, art. 27, caput). (...) § 6º Após o preparo, o processo será submetido à decisão do Ministro de Estado da Fazenda, em instância única (Decreto-Lei nº 1.455, de 1976, art. 27, § 4º). § 7º O Ministro de Estado da Fazenda poderá delegar a competência para a decisão de que trata o § 6º. Portaria MF n. º 587/2010 Art. 295. Aos Delegados da Receita Federal do Brasil e Inspetores-Chefes da Receita Federal do Brasil incumbem, no âmbito da respectiva jurisdição, as atividades relacionadas com a gerência e a modernização da administração tributária e aduaneira e, especificamente: IV - aplicar pena de perdimento de mercadorias e valores; [destaquei] b) Do julgamento em instância única No mais, cinge-se a questão à legalidade do julgamento em instância única, como disposto no artigo 27, §4º, do Decreto-Lei n.º 1.455/76, que estabelece normas sobre mercadorias estrangeiras apreendidas, verbis: Art. 27. As infrações mencionadas nos artigos 23, 24 e 26 serão apuradas através de processo fiscal, cuja peça inicial será o auto de infração acompanhado de termo de apreensão, e, se for o caso, de termo de guarda. § 1º Feita a intimação, pessoal ou por edital, a não apresentação de impugnação no prazo de 20 (vinte) dias implica em revelia. § 2º Apresentada a impugnação, a autoridade preparadora terá o prazo de 15 (quinze) dias para remessa do processo a julgamento. § 3º O prazo mencionado no parágrafo anterior poderá ser prorrogado quando houver necessidade de diligências ou perícias, devendo a autoridade preparadora fazer comunicação justificada do fato ao Secretário da Receita Federal. § 4º Após o preparo, o processo será encaminhado ao Secretário da Receita Federal que o submeterá a decisão do Ministro da Fazenda, em instância única. À recorrente foi imposta a pena de perdimento da mercadoria importada, que é a punição mais severa prevista no âmbito do direito aduaneiro e implica perda de bens em processos administrativos de instância única a cargo da própria autoridade que supostamente constatou a infração. Da leitura do artigo observa-se que o Decreto-Lei nº 1.455/76 traz em si uma restrição de direito que não se coaduna com a promulgação da CF/88 e com os ditames do estado democrático de direito por ela instaurado, que tem como um de seus pilares a ampla proteção aos direitos e às garantias dos cidadãos. Especificamente, o artigo 5º, incisos LIV e LV, assegura, indistintamente, a todos os litigantes, em processo judicial ou administrativo, as garantias ao devido processo legal, ao contraditório e ampla defesa com os meios e recursos a eles inerentes. No caso, negado seguimento ao recurso interposto contra decisão proferida pela Inspetoria da Receita Federal em Corumbá/MS (Id 95118376, p. 100/122), a recorrente não teve acesso à ampla defesa e ao duplo grau de jurisdição, situação que contraria o ordenamento jurídico pátrio. Nesse sentido: ADMINISTRATIVO. PENA DE PERDIMENTO DE BENS. PROCESSO ADMINISTRATIVO. DECRETO-ART. 27 DO LEI Nº 1.455/76. DECISÃO IRRECORRÍVEL. OFENSA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. 1.Cinge-se a controvérsia acerca da possibilidade de a impetrante ter seu recurso apreciado em instância administrativa superior, a despeito de a antecedente impugnação ter sido considerada intempestiva nos termos do artigo 27 do Decreto-Lei nº 1.455/76 - ensejando assim a aplicação da pena de perdimento das mercadorias importadas, oriundas da China, por suposta interposição fraudulenta. 2. In casu, constam das informações trazidas pela autoridade impetrada que a autuada, ora apelante, foi cientificada do auto de infração em 16 de outubro de 2009 e apresentou impugnação em 10 de novembro de 2009, ou seja, foi apresentada de forma intempestiva, aplicando-se o disposto no §1° do art. 27, do Decreto-Lei n° 1.455/76, em razão da intempestividade da impugnação apresentada. 3. A aplicação ao contencioso administrativo em uma única instância, conforme dispõe o artigo 27, § 4°, do Decreto-Lei n° 1.455/76, encontra-se em claro descompasso com a Constituição Federal, na medida em que não respeita as garantias que foram estendidas ao processo administrativo - devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. 4. O STF, no RE n° 389.383 -SP, cujo tema central era a exigência do depósito de 30% para interposição de recurso voluntário perante o INSS, reviu seu posicionamento quanto ao direito ao duplo grau de jurisdição em processos administrativos e declarou inconstitucional a aludida exigência, precisamente por reconhecer o direito de defesa, do duplo grau de jurisdição e devido processo legal naquela instância. 5. Apelo provido. (TRF 3ª Região, Quarta Turma, AC 0013927-12.2012.4.03.6105, Rel. Des. Fed. Marcelo Saraiva, j. 02.02.2021, destaquei). CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ADMINISTRATIVO. ART. 27 DO DECRETO-LEI 1.455/76. JULGAMENTO EM ÚNICA INSTÂNCIA. OFENSA A PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. (..) - Discute-se o direito ao julgamento de recurso administrativo em segunda instância, atinente ao Auto de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal de Mercadorias, lavrado em razão da emissão de duas faturas de exportação, de idêntica numeração, nas quais constavam mercadorias diversas entre si. - O Decreto-Lei nº 1.455/76, norma infraconstitucional, cuja vigência data de período anterior à Constituição Federal, traz uma restrição ao direito à interposição de recurso administrativo, assegurado pela Lei Maior. - Referido dispositivo não foi recepcionado pela atual ordem constitucional, por trazer limitação a direito fundamental, ainda que implícito. Não se está aqui defendendo a impossibilidade de lei infraconstitucional regular direitos e garantias constitucionais, ainda que mediante a criação de limitações, mas que referida norma seja razoável e proporcional, e se harmonize com os interesses resguardados na constituição de modo conglobante. - De fato, ao prever a norma julgamento de recurso administrativo em única instância, está a ofender os princípios do devido processo legal no âmbito administrativo, recentemente reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal (RE 389383/SP, RE390513/SP e RE 504.288/BA, da ampla defesa e do duplo grau de jurisdição. - Agravo retido e apelação não conhecidos e remessa oficial a que se nega provimento. (TRF 3ª Região, Terceira Turma, AC/REO 0004074-18.2008.4.03.6105, Rel. Juíza Conv. Eliana Marcelo, j. 16.09.2010, destaquei) Desse modo, à vista da ilegalidade do ato, é de rigor a reforma da sentença. Por fim, as questões relativas ao demais artigos suscitados pelo apelante, quais sejam, 777 a 783 do Decreto n. º 6.759/09, 56, §§1º e 2º, e 57 da Lei n. º 9.784/99, não têm condão de alterar esse entendimento pelos motivos já apontados. V – Do dispositivo Ante o exposto, dou provimento à apelação para reformar a sentença e conceder a ordem para determinar o envio do recurso interposto à Delegacia de Julgamento da Receita Federal do Brasil, responsável pelo exame do recurso, na forma do artigo 330 da Portaria ME n.º 284/2020 (antigo 229 da Portaria MF n.º 587/2010). Sem honorários, na forma do artigo 25 da Lei n. º 12.016/09. Custas ex vi legis. É como voto.
DECLARAÇÃO DE VOTO
O Excelentíssimo Senhor Juiz Federal Convocado SILVA NETO:
Data venia, conjugados os valores do Devido Processo e da Legalidade, aqui ênfase o art. 37, Lei Maior, ousa este Juiz Convocado parcialmente divergir de Sua Excelência, o Eminente Desembargador Relator, unicamente para firmar pela licitude do tema julgador administrativo em foco, de modo que a ausência de outras Instâncias Julgadoras a não contaminar ao desfecho administrativo firmado, superior assim a Legalidade dos atos estatais.
Ou seja, está-se ao vertente caso diante de situação onde a legislação previu Instância Única, cenário não configurador de ofensa ao constitucional princípio da ampla defesa ou do contraditório, pois o Estado Brasileiro adota o sistema de controle administrativo inglês, por meio do qual o Judiciário possui a prerrogativa de reanalisar o quanto decidido naquela seara, bastando o ajuizamento da ação competente pelo interessado, art. 5º, XXXV, Constituição da República.
Com efeito, a ampla defesa e o contraditório, emanados da Lei Maior, demandam regulamentação pela legislação infraconstitucional, significando dizer que o administrado está adstrito à utilização dos mecanismos existentes no ordenamento e cabíveis ao caso concreto.
Por fim, a Suprema Corte Brasileira também já o tendo vaticinado, em dito rumo:
"Agravo regimental. Tributário. Pena de perdimento. Duplo grau de jurisdição. Inexistência de assento constitucional. Inafastabilidade da jurisdição. Devido processo legal. Ofensa reflexa. 1. Segundo a jurisprudência da Corte, não há no ordenamento jurídico brasileiro a garantia constitucional do duplo grau de jurisdição. A afronta aos princípios do devido processo legal e da inafastabilidade da jurisdição, em termos processuais, configura, via de regra, apenas ofensa indireta ou reflexa à Constituição. Precedentes. 2. Agravo regimental não provido. A título de honorários recursais, a verba honorária já fixada deve ser acrescida do valor equivalente a 10% (dez por cento) de seu total, nos termos do art. 85, § 11, do novo Código de Processo Civil, observados os limites dos §§ 2º e 3º do citado artigo e a eventual concessão de justiça gratuita."
(RE 976178 AgR, Relator: DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 09/12/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-030 DIVULG 14-02-2017 PUBLIC 15-02-2017 - destaquei)
"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO, COMPEDIDO DE ATRIBUIÇÃO DE EFEITOS INFRINGENTES. SUPRIMENTO DE OMISSÃO QUANTO À ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO E DO JUIZ NATURAL. MATÉRIA DE CUNHO INFRACONSTITUCIONAL, CONSTITUINDO EVENTUAL OFENSA INDIRETA OU REFLEXA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PERSISTÊNCIA DA INADMISSIBILIDADE DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. 1. A garantia constitucional do duplo grau de jurisdição (art. 5º, LV) insere-se no âmbito de proteção do princípio constitucional da ampla defesa, insculpido no mesmo enunciado normativo da Carta Magna, razão pela qual o tema foi enfrentado no acórdão embargado sob essa ótica, consignando-se a natureza infraconstitucional da controvérsia. 2. A violação do princípio constitucional do juiz natural (art. 5º, LIII), implica suprir a omissão do acórdão embargado para assentar que, também nessa hipótese, há eventual ofensa indireta ou reflexa, que não autoriza a interposição do recurso extraordinário. 3. Mantida a inadmissibilidade do recurso extraordinário, é de se rejeitar a atribuição dos pretendidos efeitos infringentes. 4. Embargos declaratórios a que se dá provimento parcial”
(AI 845.223 AgRED, Primeira Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 2/4/12)
"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ADMINISTRATIVO. PENA DE PERDIMENTO DE BENS. ALEGADA CONTRARIEDADE AO ART. 5º, INC. LIV E LV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA CONSTITUCIONAL INDIRETA. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO”
(ARE nº 704.364/DF–AgR, Segunda Turma, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe de 8/11/12)
Desta forma, no exercício da competência prevista no art. 105, III, da CF, a E. Primeira Seção do Superior Tribunal da Justiça, por cada uma de suas Turmas, sedimentou o entendimento de que não há ilegalidade diante da ausência de instância recursal administrativa:
"AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. ADUANEIRO. TRIBUTÁRIO. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ART. 535, CPC. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 211/STJ. QUESTÃO DE FATO. SÚMULA N. 7/STJ. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚMULA N. 284/STF. PENA DE PERDIMENTO. PROCESSO ADMINISTRATIVO. ART. 27, §4º, DO DECRETO-LEI Nº 1.455/76. NORMA ESPECIAL. ARTS. 56 E 69, DA LEI Nº 9.784/99. NORMA GERAL. DECISÃO EM INSTÂNCIA ÚNICA. AUSÊNCIA DE OBRIGATORIEDADE DO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO ADMINISTRATIVA.
1. Ausente a alegada violação ao art. 535, do CPC, pois a reiteração dos fundamentos da sentença, se suficiente, não configura ausência de fundamentação.
2. Negado conhecimento ao recurso pela alegada violação ao art. 333, I e II do CPC, visto que não prequestionado o dispositivo correspondente que diz respeito à distribuição do ônus da prova.
Incide, pois, a Súmula n. 211/STJ. De ver que a tese da recorrente de que tinha direito a ter suas provas examinadas encontra respaldo não no art. 333, do CPC, mas no art. 130 do mesmo diploma, que não foi invocado e, ainda que o fosse, tem o seu exame obstado pela Súmula n. 7/STJ. Múltiplos precedentes.
3. A alegação de violação à lei federal que disciplina o Preço de Transferência (Lei n. 9.430/1996), foi efetuada de forma genérica, sem a indicação específica dos dispositivos legais violados e respectivas teses a serem enfrentadas. Aplicação da Súmula n. 284/STF: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia".
4. O processo aduaneiro, com a consequente aplicação da pena de perdimento, vem regrado pelo art. 27, do Decreto-Lei n. 1.455/76, onde admitido o julgamento em instância única, não havendo que se aplicar o art. 56 da Lei n° 9.784/99, tendo em vista a especialidade garantida pelo art. 69 da mesma lei. Precedente específico: AgRg no REsp 1279053 / AM, Primeira Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 06.03.2012. Precedentes em casos análogos representativos da controvérsia: REsp 1150579 / SC, Primeira Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 10.08.2011; REsp 1046376 / DF, Primeira Seção, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 11.02.2009.
5. Agravo regimental não provido.
(AgRg no REsp n. 1.464.381/PR, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 5/5/2016, DJe de 12/5/2016)
"AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. PENA DE PERDIMENTO DE BENS. PROCESSO ADMINISTRATIVO. DECRETO-LEI Nº 1.455/76. DECISÃO IRRECORRÍVEL DO MINISTRO DA FAZENDA. AUSÊNCIA DE OBRIGATORIEDADE DO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO ADMINISTRATIVA. AGRAVO IMPROVIDO.
I - Esta Corte Superior de Justiça firmou entendimento segundo o qual "não há, na Constituição de 1988, garantia de duplo grau de jurisdição administrativa" (RMS 22064/MS, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA, DJe 05/10/2011).
II - Não se incompatibiliza com o ordenamento jurídico pátrio, que não prevê o duplo grau obrigatório na instância administrativa, a previsão contida no § 4º do art. 57 do Decreto-Lei nº 1.455/76 de decretação de pena de perdimento de bens em processo administrativo, por decisão irrecorrível do Ministro da Fazenda.
III - A Lei nº 9.784/99, que dispõe que das decisões administrativas cabe recurso, em face de razões de legalidade e de mérito, porque de caráter geral, não teve o condão de derrogar o Decreto-Lei nº 1.455/76, que regula procedimento administrativo específico relacionado à pena de perdimento de bens.
IV - Prevendo o artigo 69 da Lei nº 9.784/99 que os processos administrativos específicos continuarão a reger-se por lei própria, aplicando-se-lhes apenas subsidiariamente os preceitos desta Lei, não há, pois, falar em derrogação dos preceitos do Decreto-Lei nº 1.455/76.
V - Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp n. 1.279.053/AM, Relator Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, julgado em 6/3/2012, DJe de 16/3/2012.)
Posto isto, pelo improvimento à apelação da parte empresarial.
É como voto.
E M E N T A
ADUANEIRO. APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PERDIMENTO. PROCESSO ADMINISTRATIVO. JULGAMENTO EM INSTÂNCIA ÚNICA. ARTIGO 27, §4º, DECRETO-LEI N.º 1.455/1976. ILEGALIDADE. RECURSO PROVIDO.
- A sentença recorrida foi proferida em antes da vigência da Lei n.º 13.105/2015 (NCPC), razão pela qual, aplicada a regra do tempus regit actum, segundo a qual os atos jurídicos se regem pela lei vigente à época em que ocorreram, o recurso será analisado à luz do Diploma Processual Civil de 1973 (Enunciados Administrativo n.º 01 e 03/2016, do STJ).
- Não prospera a alegação de incompetência do Inspetor da Receita Federal, dado que é possível ao Ministro da Fazenda a delegação de parte de suas atribuições, conforme previsto no 774, § 7º, do Decreto n.º 6.759/09 e 295, inciso IV, da Portaria n.º 587/2010, vigente à época dos fatos.
- A pena de perdimento da mercadoria importada é a punição mais severa prevista no âmbito do direito aduaneiro e implica perda de bens em processos administrativos de instância única a cargo da própria autoridade que supostamente constatou a infração.
- Observa-se que o Decreto-Lei nº 1.455/76 traz em si uma restrição de direito que não se coaduna com a promulgação da CF/88 e com os ditames do estado democrático de direito por ela instaurado, que tem como um de seus pilares a ampla proteção aos direitos e às garantias dos cidadãos. Especificamente, o artigo 5º, incisos LIV e LV, assegura, indistintamente, a todos os litigantes, em processo judicial ou administrativo, as garantias ao devido processo legal, ao contraditório e ampla defesa com os meios e recursos a eles inerentes. Precedentes.
- Apelação provida.