Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001175-82.2010.4.03.6006

RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA

APELANTE: LUCIANO VOLPATO

Advogado do(a) APELANTE: MARCOS DOS SANTOS - MS12942-A

APELADO: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS

Advogado do(a) APELADO: RAFAEL GUSTAVO DE MARCHI - PR46525

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001175-82.2010.4.03.6006

RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA

APELANTE: LUCIANO VOLPATO

Advogado do(a) APELANTE: MARCOS DOS SANTOS - MS12942-A

APELADO: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS

Advogado do(a) APELADO: RAFAEL GUSTAVO DE MARCHI - PR46525

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

O Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz Federal Convocado SILVA NETO (Relator):

 

Cuida-se de apelação, em embargos à execução fiscal, deduzidos por Luciano Volpato em face do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, objetivando o reconhecimento de inexigibilidade da multa aplicada e do embargo imposto, pois a construção existente no local foi erigida antes da edição da Lei 4.771/65, sendo descabida a retroação da norma.

 

A r. sentença, ID 89336197 - Pág. 67, proferida sob a égide do CPC/1973, julgou improcedente o pedido, asseverando não foi provada construção anterior a 1965 e, mesmo que assim tivesse sido provado, não há direito adquirido em manter construção em área de preservação permanente, pois, se havia casa de madeira, tal não dá ao postulante o direito de construir casa de alvenaria, não legalizando eventual área urbana consolidada a conduta do embargante, cuidando-se de casa de veraneio, o que não se confunde com ecoturismo ou turismo rural, por isso inaplicável o art. 61-A, Lei 12.651/2012. Sujeitou a parte embargante ao pagamento de honorários, no importe de R$ 2.000,00. Revogou a tutela antecipada.

 

Apelou a parte privada, ID 89336197 - Pág. 77, alegando, em síntese, construção do imóvel em data pretérita à Lei 4.771/65, invocando razoabilidade, irretroatividade, segurança jurídica, direito à moradia e lazer, tassim possível autorização do órgão ambiental, frisando tratar-se de área urbana, conforme lei municipal, inexistindo impacto ambiental de sua propriedade, existindo outras construções, invocando o art. 61-A, Lei 12.651/2012, que autoriza o ecoturismo.

 

Apresentadas as contrarrazões, ID 89336198 - Pág. 19, sem preliminares, subiram os autos a esta E. Corte.

 

Peticionou o particular, pugnando por suspensão do feito em razão de afetação do Tema 1.010, STJ, que tratará  sobre extensão de faixa edificável em relação à metragem da Lei 12.651/2012 ou a da Lei 6.766/1979, ID 124837787.

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001175-82.2010.4.03.6006

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APELANTE: LUCIANO VOLPATO

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OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

 

O Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz Federal Convocado SILVA NETO (Relator):

 

Primeiramente, cuida-se de infração ambiental cometida no ano 2005, ID 89336196 - Pág. 15, assim inoponível afetação do Tema 1.010, que abordará a Lei 12.651/2012, analisando-se o processo conforme o Código Florestal do tempo dos fatos, conforme adiante se elucidará.

 

No mais, a r. sentença deve ser mantida.

 

De fato, configura o meio ambiente bem ao alcance de todos e pelo qual também a coletividade deva primar, em seus cuidados, proteção e perpetuação, nos termos do art. 225, da Lei Maior.

 

Repousa o meio ambiente em patamar doutrinário na chamada “terceira geração de direitos fundamentais”, ocupando, assim, destaque em cadeia de proteção, ante a magnitude de sua importância.

 

Cientificamente há estudos concretos, por entidades e pesquisadores de alta gabaritagem (ciência, mundo fenomênico, dos fatos), apontando que os rumos do planeta dependem da modificação comportamental do homem, em termos de cessação da degradação ambiental, sob pena de alterar (ou extinguir), por completo, as mais diversas formas de vida, quadro que está intrinsicamente ligado ao tema climático (veja-se a histórica seca atual, crise grave impactante na economia e diretamente na geração de energia, ante a escassez de diversidade de fontes), inclusive podendo a Terra se tornar inabitável – em processo natural que um dia ocorrerá – em função de aceleradas (e toscas) atitudes humanas.

 

Em tal contexto e pedra angular ao deslinde da controvérsia, a presente ação “foi proposta em momento anterior à vigência do Novo Código Florestal, envolvendo fatos igualmente anteriores a esta vigência. Assim inviável a aplicação da nova disciplina legal, em razão do princípio de proibição do retrocesso na preservação ambiental, uma vez que a norma mais moderna estabelece um padrão de proteção ambiental inferior ao existente anteriormente. O princípio do “tempus regit actum” orienta a aplicabilidade da lei no tempo, considerando que o regime jurídico incidente sobre determinada situação deve ser aquele em vigor no momento da materialização do fato. No caso em tela, portanto, deve prevalecer os termos da legislação vigente ao tempo da infração ambiental. Ao aplicar o Novo Código Florestal à presente demanda, o julgado se encontra em desconformidade com a jurisprudência do STJ, conforme se depreende da leitura dos seguintes precedentes: AgInt no REsp n. 1.719.552/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 12/2/2019, DJe 15/2/2019; EDcl no AgInt no REsp n. 1.597.589/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 19/6/2018, DJe 27/6/2018; REsp n. 1.680.699/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 28/11/2017, DJe 19/12/2017”, AgInt no REsp 1726737/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 05/12/2019, DJe 11/12/2019.

 

No presente caso, o polo apelante foi autuado por realizar edificação em área de preservação permanente sem licença ambiental, na margem do rio Paraná.

 

Nesta senda, o Código Florestal vigente ao tempo dos fatos, Lei 4.771/65, art. 2º, “a”, considerava de preservação permanente as áreas ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água, fixando distância a ser resguardada, levando-se em consideração as margens e a largura do curso pluvial:

 

Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:

 

 a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será: (Redação dada pela Lei nº 7.803 de 18.7.1989)

 

1 - de 30 (trinta) metros para os cursos d'água de menos de 10 (dez) metros de largura; (Redação dada pela Lei nº 7.803 de 18.7.1989)

 

2 - de 50 (cinquenta) metros para os cursos d'água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;  (Redação dada pela Lei nº 7.803 de 18.7.1989)

 

3 - de 100 (cem) metros para os cursos d'água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura; (Redação dada pela Lei nº 7.803 de 18.7.1989)

 

4 - de 200 (duzentos) metros para os cursos d'água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;  (Redação dada pela Lei nº 7.803 de 18.7.1989)

 

5 - de 500 (quinhentos) metros para os cursos d'água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros;  (Incluído pela Lei nº 7.803 de 18.7.1989)

 

 

Com efeito, nenhum reparo a demandar a r. sentença, que mui bem resolveu a controvérsia, embasada nos elementos probatórios ao feito produzidos, que adiante serão abordados.

 

Realmente, nos termos da perícia, não há provas de construção anterior ao Código Florestal de 1965 e, se havia, houve reforma, em razão das boas condições do imóvel, ID 89336197 - Pág. 10.

 

Neste ínterim, ainda que outro fosse o entendimento, houve continuidade/modificação de ocupação de área de preservação, após a previsão legislativa vedatória.

 

Importante esclarecimento a repousar no fato de a infração ambiental se perpetuar no tempo, logo de caráter permanente :

 

 

“ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. AREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE - APP. INFRAÇÃO. AUTUAÇÃO. EMBARGO. MULTA. LEGITIMIDADE. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO.

1 - No caso em exame, o cerne da controvérsia cinge-se em aferir a legitimidade do ato administrativo impugnado pelo impetrante, ora apelado.

2 - Preliminarmente, cumpre salientar que não se opera a prescrição da punibilidade aplicada ao impetrante/apelado, porquanto a suposta infração apontada no presente feito é de natureza permanente, protraindo-se no tempo enquanto perdurar a ilicitude verificada, não se aplicando, portanto, ao caso, o disposto na primeira parte do caput do art. 1º, da Lei n. 9.873, de 23 de novembro de 1999.

...”

(TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA, AMS 0004003-65.2007.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NERY JUNIOR, julgado em 20/06/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/06/2013)

 

 

Ou seja, não se resume a ocupação irregular a uma construção anterior à previsão legal, assim a ação humana na área subsumiu-se aos conceitos previstos na Lei 4.771/65, em ação continuada.

 

Portanto, não resta mínima dúvida de que a construção litigada se perfez ao tempo em que previsto impedimento para ocupação da área, por este motivo caindo por terra as arguições envolvendo irretroatividade da norma e “direito adquirido”, prevalecendo, assim, os interesses coletivos à preservação em norma estatuídos:

 

 

“AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA REPARAÇÃO DE DANO AMBIENTAL. EDIFICAÇÃO PARA LAZER EM ÁREA DE PROTEÇÃO PERMANENTE (APP) NA ILHA DO PARANAÍBA, ÁS MARGENS DO RIO PARANAÍBA, MUNÍCIPIO DE CENTRALINA/MG, SEM AUTORIZAÇÃO DO ÓRGÃO AMBIENTAL.COMPROVADA DEGRADAÇÃO DO MEIO AMBIENTE. DEVER DE DEMOLIR A CONSTRUÇÃO E REPARAR O DANO.

1. Consideram-se de preservação permanente as formas de vegetação natural encontradas ao redor de lagoas, lagos ou reservatórios d'água naturais ou artificiais (Código Florestal, Lei 4.771/65, art. 2º , "b").

2. A Resolução nº 04/85 do CONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente estabelece em seu art. 3º, II, que são reservas ecológicas as áreas ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d'água naturais ou artificiais, desde o seu nível mais alto medido horizontalmente, em faixa marginal cuja largura mínima de cem metros para as represas hidrelétricas.

3. A Resolução CONAMA 302/2002, no seu art. 3º, II, dispõe que constitui área de preservação permanente a área com largura mínima, em projeção horizontal, no entorno dos reservatórios artificiais, medida a partir do nível máximo normal de 15 metros, no mínimo, para os reservatórios artificiais de geração de energia elétrica com dez hectares, sem prejuízo da compensação ambiental.

4. Segundo o art. 18, caput da Lei 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, as áreas consideradas de preservação permanente são consideradas reserva ou estação ecológica de responsabilidade do IBAMA: "São transformadas em reservas ou estações ecológicas, sob responsabilidade do IBAMA, as florestas e demais formas de vegetação natural de preservação permanente, relacionadas no art. 2º, da Lei 4.771, de 15 de setembro de 1965".

5. A vontade da lei é que sejam protegidas as APP porque as características dessas áreas são importantes para o uso dos recursos naturais no presente e para as gerações futuras (contrarrazões do Parquet Federal).

6. Por serem características da área que determinam sua permanente proteção, impõe-se que o dano ambiental é inerente à ação humana de invadir e edificar nessas áreas e impedir o livre ambiente na região.

7. Foi relatado no laudo de constatação/inspeção de situação ambiental (uso e ocupação), feito pelo IBAMA, que o apelante edificou obra de alvenaria com área de 22,32 m², com extensão de dano de aproximadamente 412,50 m².

8. Nos últimos anos, segundo informação do IBAMA, houve invasão indiscriminada e acelerada, com construção de casas de veraneio, acesso, quiosques, canteiros de hortaliças e cultivo de mandioca.

9. Foi realizada inspeção judicial na "Ilha do Paranaíba" e se constatou que a APP está sendo alvo de danos ambientais repetitivos, resultantes da invasão de indivíduos que lá constroem casas, trapiches, tablados para pesca, muros de contenção, criam animais, fazem plantações e promovem desmatamento.

10. Segundo restou comprovado pelo laudo do IBAMA e inspeção policial no local, o rancho de propriedade do apelante, como de outros invasores, está edificado em área de preservação permanente, à beira de lago. A ação de construir e desmatar APP implica no dever de demolir a construção e restaurar a vegetação nativa.

11. Apelação improvida.

(AC 200838030016328, JUIZ FEDERAL PAULO ERNANE MOREIRA BARROS (CONV.), TRF1 - QUINTA TURMA, e-DJF1 DATA:26/04/2013 PAGINA:860.)

 

 

Por sua vez, patente que a norma visou a permitir preservação do ambiente que margeia o rio, evitando assoreamento e degradação, buscando com que o curso d’água fosse preservado, a fim de que regeneração apropriada do local fosse realizada.

 

Em outro dizer, referida área não deve ser ocupada, esta a hermenêutica da regra, assim não merece amparo o argumento de que não há degradação ambiental, ou que seria de menor potencial – não houve autorização do órgão ambiental competente para a realização da edificação – porquanto tem a restrição a natureza de limitação non aedificandi (a presença humana impossibilita a regeneração natural do tracto de terra, por evidente).

 

De seu giro, nenhuma alteração ao quadro infracional firmado pelo IBAMA a ocorrer com a transformação em “Distrito” da área do Porto Caiuá, pelo Município de Naviraí/MS, porquanto, como descrito no laudo pericial, está a região distante 66 km da urbe, ID 89336197 - Pág. 3, evidenciando as fotografias tratar-se de área afastada/remota e que possui, ainda, mata ciliar preservada, ID 89336197 - Pág. 17, fotos 13/14, contando o povoado com apenas 181 moradores, dados do censo/2000, ID 89336197 - Pág. 36, assim mui diferente do buscado cenário de “urbanização e antropização”, tecido na apelação.

 

De sua face, o inciso V do art. 2º da Resolução Conama 302 preconiza quais os critérios são adotados para a configuração de área urbana consolidada :

 

V - Área Urbana Consolidada: aquela que atende aos seguintes critérios:

 

a) definição legal pelo poder público;

 

b) existência de, no mínimo, quatro dos seguintes equipamentos de infra-estrutura urbana:

1. malha viária com canalização de águas pluviais,

2. rede de abastecimento de água;

3. rede de esgoto;

4. distribuição de energia elétrica e iluminação pública;

5. recolhimento de resíduos sólidos urbanos;

6. tratamento de resíduos sólidos urbanos; e
 

 

c) densidade demográfica superior a cinco mil habitantes por km2.

 

 

Assim, diante das peculiaridades retro expostas, não restou demonstrada configuração de zona de expansão urbana, para fins ambientais, por desatendimento aos critérios normativos, como visto:

 

 

“AMBIENTAL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE -MATA CILIAR - CONSTRUÇÕES - FAIXA MARGINAL LIMÍTROFE - ÁREA RURAL -100 METROS - DANO AMBIENTAL - CONFIGURAÇÃO - OBRIGAÇÃO PROPTER REM -RESPONSABILIDADE OBJETIVA - DEVER DE REPARAÇÃO.

1. A questão ambiental está inserida entre os chamados Direitos Humanos de Terceira Geração, consagrada pelo artigo 225 da Constituição Federal de 1988 como direito social e difuso do homem.

2. O antigo Código Florestal de 1965 (Lei nº 4.771/65) já definia a área localizada ao redor dos reservatórios (naturais ou artificiais) como área de preservação permanente.

3. A Resolução/CONAMA nº 302/2002 delimita a faixa protetiva de trinta metros para os reservatórios artificiais situados em áreas urbanas consolidadas e de cem metros para áreas rurais.

4. Área rural. A par da juntada aos autos de cópia do carnê de IPTU e da existência de texto legal municipal classificando a área como de expansão urbana, não houve comprovação do preenchimento dos requisitos mínimos do mencionado art. 2º da Resolução/CONAMA nº 302/2002, dentre os quais, a existência de, pelo menos, quatro dos equipamentos de infraestrutura urbana listados, bem como de ser a densidade demográfica superior a 5.000 habitantes por km².

5. Incontroverso o fato de haverem os réus desobedecido o limite de 100 metros do reservatório de Ilha Solteira.

6. O dever de preservação constitui obrigação propter rem, não podendo o réu eximir-se de responsabilidade (que, in casu, é objetiva) pela recuperação ambiental ao fundamento de já ter encontrado a área degradada. Precedentes do STJ: RESP 948.921/SP; RESP 1107219/SP; RESP 1264250/MG.”

(AC 00033473720004036106, DESEMBARGADOR FEDERAL MAIRAN MAIA, TRF3 - SEXTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/11/2015)

 

 

“AMBIENTAL. ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. OCUPAÇÃO E EDIFICAÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. ESPAÇO DE LAZER. MARGENS DA REPRESA DA USINA HIDRELÉTRICA SÉRGIO MOTTA. DENUNCIAÇÃO DA LIDE NÃO ADMITIDA. INEXISTÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO A POLUIR. DANO AMBIENTAL E NEXO DE CAUSALIDADE COMPROVADAS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. APELAÇÃO DESPROVIDA.

- No esteio da Constituição Federal de 1988, o CONAMA publicou a Resolução 302/2002, que substituiu a Resolução 04/1985 e manteve o resguardo ao entorno dos reservatórios artificiais como sendo áreas de proteção permanente.

- Dispõe a Resolução 302/2002 que a área de proteção permanente deve ser de 30 (trinta) metros para os reservatórios artificiais situados em áreas urbanas consolidadas e de 100 (cem) metros para áreas rurais. Estabelece, ainda, que para uma região ser considerada área urbana consolidada, deve atender os critérios cumulativos de: definição legal pelo poder público; densidade demográfica superior a cinco mil habitantes por km²; e existência de no mínimo quatro dos seguintes equipamentos de infra-estrutura urbana: i) malha viária com canalização de águas pluviais; ii) rede de abastecimento de água; iii) rede de esgoto; iv) distribuição de energia elétrica e iluminação pública; v) recolhimento de resíduos sólidos; vi) tratamento de resíduos sólidos urbanos.

- Restou constatado nos autos que a área em comento não preenche os requisitos para ser tida como área urbana consolidada. Não houve definição legal da área como sendo área urbana; a região não possui coleta de esgoto ou infraestrutura urbanizada; e a densidade demográfica tampouco supera cinco mil habitantes por km² - a densidade era de 16,97 habitantes por km² no censo de 2010, de acordo com o sítio do IBGE na internet.

- Caracterizado o local como sendo área rural, seria necessária a observância da faixa de 100 (cem) metros lindeiros aos reservatórios artificiais da Usina Hidrelétrica Sérgio Motta (Porto Primavera).- Tendo sido comprovada a ocorrência de ocupação irregular sobre os 100 (cem) metros da área de proteção permanente, é de rigor a responsabilização do proprietário do terreno.- Não cabe denunciação da lide à CESP, pois a ação trata da responsabilidade objetiva do réu (DER), causador do dano ambiental, e a lide secundária trataria de responsabilidade subjetiva da CESP perante o DER, o que acarretaria ampliação indevida dos limites objetivos do processo.- Constatados a conduta lesiva, o dano ambiental e o nexo de causalidade, é de rigor a imposição de responsabilidade objetiva ambiental e correspondentes consequências.- A preservação do meio ambiente é uma obrigação propter rem e inerente à função social da propriedade, não havendo direito adquirido a danificar o meio ambiente. Precedentes.- Possível a cumulação das obrigações de reparar o dano causado ao meio ambiente e de pagar indenização. Precedentes do STJ.- Apelação desprovida.
(AC 00137116920084036112, DESEMBARGADORA FEDERAL DIVA MALERBI, TRF3 - SEXTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/10/2015)

 

 

Em tal cenário, a legislação federal se sobrepõe, por evidente, à norma local ou aprovações de construção que tenha obtido o polo apelante, que não pode suprimir critério objetivo previsto em âmbito nacional, por isso inoponível ventilada área urbana, que, em tese, teria gerado a desejada amiúde “regularização fundiária” :

 

 

“DIREITO AMBIENTAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL - REMESSA OFICIAL -NÃO CONHECIMENTO (ART. 475, § 2º, DO CPC) - IBAMA - AUTOS DE INFRAÇÃO- CONSTRUÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE - LICENÇA MUNICIPAL -INEXISTÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO E ATO JURÍDICO PERFEITO - PREVALÊNCIA DA TUTELA AMBIENTAL - AVERBAÇÃO NO REGISTRO DE IMÓVEIS - DESNECESSIDADE -MANUTENÇÃO DE AVE EM CATIVEIRO - SUBSUNÇÃO DO FATO À NORMA - PRESUNÇÃO DE VERACIDADE E LEGITIMIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO - ÔNUS DA PROVA (ART. 333, I, DO CPC) - DANOS MORAIS - EXCESSO NA AUTUAÇÃO - COMPENSAÇÃO DEVIDA -QUANTUM - MANUTENÇÃO.

...

5. As leis municipais devem se conformar com o ordenamento legal federal e estadual, haja vista a competência concorrente para fins de proteção do meio ambiente, consagrada no art. 23, incisos III, VI e VII, da Constituição Federal.

...”
(APELREEX 00098852620034036107, DESEMBARGADOR FEDERAL MAIRAN MAIA, TRF3 - SEXTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/05/2015)

 

 

Aliás, por se tratar de originária ocupação irregular do solo, entende essa C. Corte que o debate acerca de zona urbana ou rural acaba por se perder, diante da existência de legislação nacional (para todo o País, pois ...), que impõe o resguardo de metragem em áreas de preservação, às margens de rios/reservatórios :

 

 

“DIREITO AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REMESSA OFICIAL, TIDA POR INTERPOSTA. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 19 DA LEI N.º 7.347/1985. PRELIMINARES AFASTADAS. INQUÉRITO CIVIL PÚBLICO. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE (APP). RIO PARANÁ. MUNICÍPIO DE ROSANA. DEVERES. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. DANO AMBIENTAL. EXTENSÃO. 500 METROS. EDIFICAÇÃO. DEMOLIÇÃO. REMOÇÃO DE ENTULHOS. RECOMPOSIÇÃO DA COBERTURA VEGETAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS INCABÍVEIS.  

...

8. Comprovado nos autos, conforme Relatório Técnico de Vistoria n.º 39, de 11/04/2011 e Boletim de Ocorrência Ambiental n.º 110447, de 04/08/2011, o fato de que o lote em questão está em Área de Preservação Permanente, cujo parcelamento do solo foi realizado de forma irregular e clandestina, com risco de inundação, a discussão acerca do caráter urbano ou rural da área e sua eventual sujeição às leis municipais de uso e ocupação do solo torna-se despicienda.

9. Portanto, a faixa a ser considerada, in casu, deve ser a de 500 metros do leito do Rio Paraná, na forma da legislação ambiental e não a de 5 metros, conforme prevista no § 1º do art. 61-A da Lei n.º 12.651/2012.

...”

(ApCiv 5001654-79.2018.4.03.6112, Desembargador Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, TRF3 - 6ª Turma, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 08/07/2019)

 

 

Portanto, superior ao vertente caso o interesse coletivo à preservação, nos termos da lei, que se sobrepõe ao privado anseio (por este motivo superado o invocado direito à moradia, ao lazer, à proporcionalidade e à razoabilidade), por evidente, descabendo ao apelante fazer comparações com outras situações que considera irregulares, porque, a uma, em exame seu exclusivo direito e, a duas, aos autos tratada situação específica que se demonstrou violadora da legislação, nos termos das provas produzidas, assim de todo o acerto o agir do IBAMA, afigurando-se degradadora ao meio ambiente a só permanência humana em local cuja norma proibiu ocupação, por isso não se há de falar em mitigação de impacto:

 

 

“CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE. ART. 225 DA CF/88. LEIS 4.711/1965, 6.938/1981, 7.347/1985 E 12.651/2012. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. OCUPAÇÃO E EDIFICAÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE CILIAR. DANO AMBIENTAL CONFIGURADO IN RE IPSA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA E PROPTER REM DO POSSUIDOR. CONDENAÇÃO EM OBRIGAÇÃO DE FAZER, NÃO FAZER E INDENIZAR. HONORÁRIOS.

I. A proteção ambiental detém status constitucional, estando os agentes infratores, pessoas físicas ou jurídicas, sujeitos a sanções civis, penais e administrativas, cuja incidência pode ser cumulativa, ante sua autonomia (art. 225, § 3º, CF; art. 4º, VII, c/c art. 14, § 1º, L. 6.938/81).

II. Ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal para apuração de responsabilidade por dano ao meio ambiente, decorrente da inobservância da função socioambiental da propriedade, traduzida pela ocupação e posse irregular de parcela de imóvel rural mediante construção e manutenção de edificações e benfeitorias em mata ciliar, "rancho" erigido em Área de Preservação Permanente às margens do Rio Pardo, no Município de Jardinópolis.

III. A degradação ou supressão de vegetação natural legalmente protegida configura conduta instantânea de efeitos permanentes, estendendo-se a destruição do meio ambiente de modo continuado no decorrer do tempo e persistindo a responsabilidade do proprietário ou possuidor de área degradada quanto à obrigação de conservar o patrimônio ambiental, não se falando em prescrição. Precedentes do STJ.

IV. A obrigação de reparação dos danos ambientais é propter rem, sem prejuízo da solidariedade entre os vários causadores do dano, descabendo falar em direito adquirido à degradação, competindo ao novo proprietário ou possuidor assumir os ônus de manter a preservação, tornando-se responsável pela reposição, mesmo que não tenha contribuído para o desmatamento, configurando-se dano ambiental in re ipsa a exploração, ocupação e edificação em Área de Preservação Permanente (art. 7º, L. 12.651/12). Precedentes do STJ.

V. Preceitua o Código Florestal configurar Área de Preservação Permanente aquela detentora da função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas (art. 2º, II, L. 4.771/65; art. 3º, II, L. 12.651/12).

VI. Nos termos do art. 2º, "a", item 3, da L. 4.771/1965, e arts. 3º e 4º, I, "c", da L. 12.651/2012, constituem Área de Preservação Permanente as florestas e demais formas de vegetação natural situadas ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água desde o seu nível mais alto, em faixa marginal, cuja largura mínima será de 100 metros para os cursos d'água que tenham entre 50 e 200 metros de largura.

VII. Possuindo o Rio Pardo cerca de 200 metros de largura na região de Jardinópolis, e devendo portanto ser observada a Área de Preservação Permanente Ciliar de 100 metros, constata-se a violação à legislação de proteção ambiental por parte do réu, pois a faixa por ele ocupada a 30 metros da margem fluvial não é passível de exploração, edificação, supressão de vegetação ou qualquer outra intervenção humana.

VIII. Inexistentes quaisquer das hipóteses excepcionais de uso autorizado pelos órgãos de proteção ambiental, taxativamente previstas na legislação, adstritas à utilidade pública e interesse social ou ao baixo impacto, vedada, de igual sorte, a compensação.

IX. Configurado o dano ambiental in re ipsa e, mais ainda, estando a degradação demonstrada nos autos, restam comprovados os elementos hábeis à responsabilização do réu, quais sejam, conduta lesiva, ocorrência do dano e configuração do nexo de causalidade, tornando de rigor reconhecer sua responsabilidade pelo prejuízo ambiental causado, impondo-se o consequente dever de indenizar.

X. Tratando-se de apelo exclusivo do réu, e em observância à legislação, à razoabilidade e proporcionalidade, devem ser mantidos os termos da sentença de procedência da ação civil pública, quais sejam, a condenação do apelante à desocupação da Área de Preservação Permanente, à demolição da edificação ali erigida e decorrente retirada do entulho, ao pagamento de indenização já quantificada pelos analistas ambientais e confirmada no bojo do decisum, a ser revertida ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos, bem como às custas e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, cujo patamar está em consonância aos termos do artigo 20, § 3º, do CPC e à linha de entendimento desta Quarta Turma.

XI. Apelação desprovida.

(TRF 3ª Região, QUARTA TURMA, AC 0001390-42.2002.4.03.6102, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL ALDA BASTO, julgado em 23/08/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/09/2013)

 

 

Lado outro, pelo raciocínio privado, se há infrações sendo cometidas por outrem/vizinhos, então justificável o seu “não apenamento”, logo tal evidentemente a não frutificar, afinal o livramento do recorrente significaria a perpetuação do cometimento de ilegalidades e o incentivo ao uso irregular de terrenos protegidos, tudo com egoísmo e descaso à vital preservação do meio ambiente, ainda mais na área litigada, lindeira a curso d’água (importante rio – Paraná – do Continente), fonte de vida e substância escassa ao Planeta, que atualmente vive agravante crise hídrica, tudo por causa de ações impensadas do homem e de erros cometidos ao longo da história, seja por desconhecimento, seja por postura predatória em busca de riquezas, desastrosas experiências estas a imporem sensíveis reflexos ao presente e também impactantes a um futuro próximo, infelizmente.

 

Deste modo, não resta mínima dúvida de que a construção vilipendia os interesses públicos à preservação, em norma estatuídos, REsp 1782692/PB, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 13/08/2019, DJe 05/11/2019:

 

 

“PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSTRUÇÕES EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE - APP. MARGEM DE RIO. MANGUEZAL. PRINCÍPIO DE PRESERVAÇÃO DA INTEGRIDADE DO SISTEMA CLIMÁTICO. CÓDIGO FLORESTAL. ARTS. 1°-A, PARÁGRAFO ÚNICO, I, 3°, II, 8°, CAPUT E §§ 2°, 4°, 64 e 65 DA LEI 12.651/2012. CRISE HÍDRICA E MUDANÇAS CLIMÁTICAS. ART. 5°, III, E 11 DA LEI 12.187/2009. DIREITO A CIDADE SUSTENTÁVEL. ARTS. 2°, I, DA LEI 10.257/2001. REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA URBANA. ART. 11, I e II, e § 2°, DA LEI 13.465/2017. FUNDAMENTO ÉTICO-POLÍTICO DE JUSTIÇA SOCIAL DO DIREITO A MORADIA EXCLUSIVO DE PESSOAS POBRES, MAS APLICADO INDEVIDAMENTE PELO ACÓRDÃO RECORRIDO A CASAS DE VERANEIO E ESTABELECIMENTOS COMERCIAIS.

AFASTAMENTO DA TEORIA DO FATO CONSUMADO. SÚMULA 613 DO STJ. REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA URBANA DE INTERESSE SOCIAL. DEVER DO PODER PÚBLICO DE FISCALIZAR. PRINCÍPIO DE VEDAÇÃO DO NON LIQUET. ART. 140, CAPUT, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015.

1. Trata-se, na origem, de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ibama contra particulares e a Municipalidade de Pitimbu, Estado da Paraíba, pugnando por provimento judicial que proíba a ampliação e determine a demolição de construções ilegais em onze imóveis localizados na faixa marginal do rio Acaú. Entre as edificações contestadas, incluem-se bar, farmácia, casas de veraneio e residências familiares.

2. Os fatos e a ocupação irregular da Área de Preservação Permanente são incontroversos. Conforme apontou a Corte de origem, os prédios embargados "foram erigidos às margens do Rio Acaú, estando inseridos em Área de Preservação Permanente, por ofensa à distância mínima exigida para edificar-se nas bordas de rios". Em idênticos termos, a sentença, apoiada em perícia, confirma que as construções acham-se "'coladas' à margem do rio, invadindo, portanto, a Área de Preservação Permanente marginal aos cursos d'água'" estabelecida pelo Código Florestal, em consequência causando 'dano ambiental também pelo lançamento de esgotos no Rio Acaú, sendo que a reversão dessa situação dependeria da demolição dos imóveis e da recuperação da vegetação no local'".

ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE (APP), PRESUNÇÃO ABSOLUTA DE INTOCABILIDADE, ROL TAXATIVO DE INTERVENÇÃO EXCEPCIONAL, NATUREZA PROPTER REM E DANO IN RE IPSA

3. As Áreas de Preservação Permanente formam o coração do regime jurídico ambiental-urbanístico brasileiro no quadro maior do desevolvimento ecologicamente sustentável. Ao contrário do que se imagina, o atributo de zona non aedificandi também revela avultado desígnio de proteger a saúde, a segurança, o patrimônio e o bem-estar das pessoas contra riscos de toda a ordem, sobretudo no espaço urbano. Daí o equívoco (e, em seguida, o desdém) de ver as APPs como mecanismo voltado a escudar unicamente serviços ecológicos tão indispensáveis quanto etéreos para o leigo e distantes da consciência popular, como diversidade biológica, robustez do solo contra a erosão, qualidade e quantidade dos recursos hídricos, integridade da zona costeira em face da força destruidora das marés, e corredores de fauna e flora.

4. Consoante o Código Florestal (Lei 12.6512012), "A intervenção ou a supressão de vegetação nativa em Área de Preservação Permanente somente ocorrerá nas hipóteses de utilidade pública, de interesse social ou de baixo impacto ambiental previstas nesta Lei" (art. 8°, caput, grifo acrescentado). O legislador, iure et de iure, presume valor e imprescindibilidade ambientais das APPs, presunção absoluta essa que se espalha para o prejuízo resultante de desrespeito à sua proteção (dano in re ipsa), daí a dispensabilidade de prova pericial. Logo, como regra geral, "Descabida a supressão de vegetação em Área de Preservação Permanente - APP que não se enquadra nas hipóteses previstas no art. 8º do Código Florestal (utilidade pública, interesse social e baixo impacto ambiental)" (REsp 1.394.025/MS, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 18/10/2013).

5. Encontrar-se a área destituída de vegetação nativa ou inteiramente ocupada com construções ou atividades proibidas não retira dela o elemento legal congênito de preservação permanente (= non aedificandi), qualidade distintiva insulada do estado atual de plenitude ou penúria das funções ecológicas, pois, consoante a letra categórica da lei, indiferente esteja "coberta ou não por vegetação nativa" (art. 3°, II, do Código Florestal, grifo acrescentado). Exatamente por isso e também para não premiar o vilipendiador serelepe (que tudo arrasa de um só golpe), a condição de completa desolação ecológica em vez de criar direito de ficar, usar, explorar e ser imitado por terceiros, impõe dever propter rem de sair, demolir e recuperar, além do de pagar indenização por danos ambientais causados e restituir eventuais benefícios econômicos diretos e indiretos auferidos (= mais-valia-ambiental) com a degradação e a usurpação dos serviços ecossistêmicos associados ao bem privado ou público - de uso comum do povo, de uso especial ou dominical.

6. Nomeadamente quanto à "faixa ciliar", a jurisprudência do STJ há tempos prescreve a intocabilidade e o cunho propter rem dessa modalidade de APP: "em qualquer propriedade", não podem as margens "ser objeto de exploração econômica" e "aquele que perpetua a lesão ao meio ambiente cometida por outrem está, ele mesmo, praticando o ilícito", pois "se a manutenção da área destinada à preservação permanente é obrigação propter rem, ou seja, decorre da relação existente entre o devedor e a coisa, a obrigação de conservação é automaticamente transferida do alienante ao adquirente, independentemente deste último ter responsabilidade pelo dano ambiental" (REsp 343.741/PR, Rel. Min. Franciuli Neto, Segunda Turma, DJ de 7/10/2002).

7. Na Área de Preservação Permanente estão proibidos usos econômicos diretos, ressalvadas hipóteses previstas em lista fechada, ou seja, estabelecidas por lei federal em sentido formal, como utilidade pública, interesse social, e ainda assim respeitados rígidos critérios objetivos de incidência e técnica hermenêutica (= interpretação restritiva). Para o STJ, "estando a construção edificada em área prevista como de preservação permanente, limitação administrativa que, só excepcionalmente, pode ser afastada (numerus clausus), cabível sua demolição com a recuperação da área degradada", haja vista contrariedade direta a dispositivos expressos do Código Florestal, que devem ser "interpretados restritivamente" (REsp 1.298.094/SC, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, DJe de 2.2.2016). Em sentido similar: "Induvidosa a prescrição do legislador, no que se refere à posição intangível e ao caráter non aedificandi da Área de Preservação Permanente - APP, nela interditando ocupação ou construção, com pouquíssimas exceções (casos de utilidade pública e interesse social), submetidas a licenciamento" (AgInt no REsp 1.572.257/PR, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 17.5.2019). Ou ainda: "De acordo com o Código Florestal brasileiro (tanto o de 1965, como o atual, a Lei 12.651, de 25.5.2012) e a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81), a flora nativa, no caso de supressão, encontra-se uniformemente protegida pela exigência de prévia e válida autorização do órgão ambiental competente, qualquer que seja o seu bioma, localização, tipologia ou estado de conservação (primária ou secundária). Além disso, em se tratando de área de preservação permanente, a sua supressão deve respeitar as hipóteses autorizativas taxativamente previstas em Lei, tendo em vista a magnitude dos interesses envolvidos de proteção do meio ambiente" (REsp 1.362.456/MS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe de 28.6.20130, grifo acrescentado).

8. No caso da vegetação ciliar, em acréscimo ao amparo das águas e à constituição de rede de corredores ecológicos, na sua ratio sobressai a intenção de prevenir deterioração do leito físico (calha) de córregos e rios e de inibir riscos gerados pelo acúmulo de sedimentos causadores de inundações e de graves ameaças à vida e à poupança da população, sobretudo da mais carente de recursos. "A proteção marginal dos cursos de água, em toda sua extensão, possui importante papel de proteção contra o assoreamento" (REsp 1.518.490/SC, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe de 15.10.2018).

DIREITO AO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO E DIREITO A MORADIA

9. Entre os onze imóveis objeto da presente Ação Civil Pública, há casas de veraneio, bar e farmácia. É o conhecido artifício de que se servem grileiros ambientais, pelo qual o ilegal em grau máximo - nas APPs urbanas, verdadeira infantaria precursora de destruição, mas em rigor embrião de gentrificação imediata ou futura do terreno não edificável - lança mão da população de baixíssima renda como anteparo ético e de justiça social, pretexto esperto, mas vazio tanto de equidade como de legitimidade, destinado a sustentar e a reter, em proveito individual, comercial e de lazer, ocupações, construções e usos irregulares sobre espaços naturais legalmente protegidos em favor da coletividade. Tudo agravado, na espécie dos autos, pela comprovação inequívoca de que várias das construções foram erigidas em violação não só à letra clara da lei, mas também em aberta desobediência a autos de infração e interdição emitidos pelo Ibama.

10. No Estado Social de Direito, moradia é direito humano fundamental, o que não implica dizer direito absoluto, já que encontra limites em outros direitos igualmente prestigiados pelo ordenamento jurídico e com os quais convive em diálogo harmônico, entre os quais o direito à saúde, o direito à segurança, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Sábios e civilizados seremos verdadeiramente reputados no dia em que o desrespeito à blindagem legal das Áreas de Preservação Permanente adquirir patamar de repulsa no povo, similar à provocada pela edificação, residencial ou não, em terrrenos ocupados por bens públicos icônicos nacionais - como a Praça dos Três Poderes, em Brasília; o Parque do Ibirapuera, em São Paulo e o Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro.

11. A modalidade de conflito, em que se chocam direitos humanos fundamentais - p. ex., o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e o direito à água, de um lado, e o direito a moradia, do outro - não é desconhecida do Superior Tribunal de Justiça. Em precedente relativo à Represa Billings, que abastece milhões de paulistanos, o STJ já decidiu que, "no caso, não se trata de querer preservar algumas árvores em detrimento de famílias carentes de recursos financeiros"; ao contrário, cuida-se "de preservação de reservatório de abastecimento urbano, que beneficia um número muito maior de pessoas do que as instaladas na área de preservação. Assim, deve prevalecer o interesse público em detrimento do particular, uma vez que, in casu, não há possibilidade de conciliar ambos a contento. Evidentemente, o cumprimento da prestação jurisdicional causará sofrimento a pessoas por ela atingidas, todavia, evitar-se-á sofrimento maior em um grande número de pessoas no futuro; e disso não se pode descuidar" (REsp 403.190/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Segunda Turma, DJ de 14.8.2006, p. 259).

12. Inexiste incompatibilidade mortal entre direito a moradia e direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, a ponto de a realização de um pressupor o sacrifício do outro, falso dilema que nega a própria essência ética e jurídica do direito à cidade sustentável (Lei 10.257/2001, art. 2°, I). No direito a moradia convergem a função social e a função ecológica da propriedade. Por conseguinte, não se combate nem se supera miserabilidade social com hasteamento de miserabiliadde ecológica, mais ainda porque água, nascentes, margens de rios, restingas, falésias, dunas e manguezais, entre outros bens públicos ambientais supraindividuais escassos, finitos e infungíveis, existem somente onde existem. Já terreno para habitação não falta, inclusive nas grandes metrópolis: o que carece é vontade política para enfrentar o vergonhoso deficit habitacional brasileiro, atribuindo-lhe posição de verdadeira prioridade nacional.

13. Construções e atividades irregulares em Áreas de Preservação Permanente, em especial nas margens de rios, encostas, restingas e manguezais, são convite para tragédias recorrentes, até mesmo fatais, e prejuízos patrimoniais, devastadores, de bilhões de reais, que oneram o orçamento público, arrasam haveres privados e servem de canteiro fértil para corrupção e desvio de fundos emergenciais. Por exemplo, desastres urbanos (inundações, desmoronamentos de edificações, escorregamento de terra, etc.) estão em curva ascendente, no contexto de agravamento da frequência, intensidade e danosidade de eventos climáticos extremos e da vulnerabilidade de assentamentos humanos.

14. Na hipótese dos autos, quanto aos carentes de tudo, que construíram suas casas estritamente residenciais antes da autuação e interdição pelo Ibama, caberá ao Município omisso assegurar-lhes apoio material, inclusive "aluguel social", e prioridade em programas habitacionais, dever esse não condicionante nem impeditivo da execução imediata da ordem judicial de remoção das construções ilegítimas.

15. Por último, casas de veraneio e estabelecimentos comerciais não se encaixam, sob nenhum ângulo, no molde estrito de moradia para população de baixa renda. Daí, em Área de Preservação Permanente, ser "totalmente descabida a pretensão de grupos de pessoas que degradam referidas áreas para finalidades recreativas, acarretando ônus desmesurado ao meio ambiente e aos demais indivíduos" (AgInt no REsp 1.760.512/MS, Rel. Min. Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe de 27.2.2019, grifo acrescentado).

...”

(REsp 1782692/PB, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/08/2019, DJe 05/11/2019)

 

Sobremais, o Doutor Advogado Marcos dos Santos, OAB/MS 12.942-A, também patrocinou os autos 0001166-91.2008.4.03.6006, que recaíram sob Relatoria deste subscritor, onde outra parte debateu os mesmos pontos aqui versados, portanto já conhece o desfecho da lide, apelo aquele julgado improvido e transitado em julgado em 14/10/2021.

 

Ausentes honorários advocatícios recursais, por sentenciada a causa sob à égide do CPC anterior,  EDcl no AgInt no REsp 1573573/RJ, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 04/04/2017, DJe 08/05/2017.

 

Por conseguinte, em âmbito de prequestionamento, refutados se põem os demais ditames legais invocados em polo vencido, art. 1.228, CCB, Lei 9.605/98, Decreto 23.793/34, Lei 7.511/86, arts. 5º, XXXVI e 6º, CF, Lei Municipal 1.603/2011, e Lei 10.257/2001, que objetivamente a não socorrerem, com seu teor e consoante este julgamento, ao mencionado polo (artigo 93, IX, CF).

 

Ante o exposto, pelo improvimento à apelação, tudo na forma retro estabelecida.

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL – AMBIENTAL – MULTA POR UTILIZAÇÃO DE ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE, ÀS MARGENS DO RIO PARANÁ, LEI 4.771/65, ART. 2º, “A” – CONFIGURADO O ILÍCITO, EM RAZÃO DA OCUPAÇÃO DE ÁREA NON AEDIFICANDI – CONSTRUÇÃO/REFORMA/AMPLIAÇÃO REALIZADA AO TEMPO DO CÓDIGO FLORESTAL DE 1965 – PREVALÊNCIA DO INTERESSE PÚBLICO DE PRESERVAÇÃO AOS INTERESSES PRIVADOS DE LAZER E MORADIA, INVOCADOS – NÃO CONFIGURAÇÃO DE ÁREA URBANA CONSOLIDADA – IMPROCEDÊNCIA AO PEDIDO – IMPROVIMENTO À APELAÇÃO PRIVADA

1 - Cuida-se de infração ambiental cometida no ano 2005, ID 89336196 - Pág. 15, assim inoponível afetação do Tema 1.010, que abordará a Lei 12.651/2012, analisando-se o processo conforme o Código Florestal do tempo dos fatos, conforme adiante se elucidará.

2 - Configura o meio ambiente bem ao alcance de todos e pelo qual também a coletividade deva primar, em seus cuidados, proteção e perpetuação, nos termos do art. 225, da Lei Maior.

3 - Repousa o meio ambiente em patamar doutrinário na chamada “terceira geração de direitos fundamentais”, ocupando, assim, destaque em cadeia de proteção, ante a magnitude de sua importância.

4 - Cientificamente há estudos concretos, por entidades e pesquisadores de alta gabaritagem (ciência, mundo fenomênico, dos fatos), apontando que os rumos do planeta dependem da modificação comportamental do homem, em termos de cessação da degradação ambiental, sob pena de alterar (ou extinguir), por completo, as mais diversas formas de vida, quadro que está intrinsicamente ligado ao tema climático (veja-se a histórica seca atual, crise grave impactante na economia e diretamente na geração de energia, ante a escassez de diversidade de fontes), inclusive podendo a Terra se tornar inabitável – em processo natural que um dia ocorrerá – em função de aceleradas (e toscas) atitudes humanas.

5 - Em tal contexto e pedra angular ao deslinde da controvérsia, a presente ação “foi proposta em momento anterior à vigência do Novo Código Florestal, envolvendo fatos igualmente anteriores a esta vigência. Assim inviável a aplicação da nova disciplina legal, em razão do princípio de proibição do retrocesso na preservação ambiental, uma vez que a norma mais moderna estabelece um padrão de proteção ambiental inferior ao existente anteriormente. O princípio do “tempus regit actum” orienta a aplicabilidade da lei no tempo, considerando que o regime jurídico incidente sobre determinada situação deve ser aquele em vigor no momento da materialização do fato. No caso em tela, portanto, deve prevalecer os termos da legislação vigente ao tempo da infração ambiental. Ao aplicar o Novo Código Florestal à presente demanda, o julgado se encontra em desconformidade com a jurisprudência do STJ, conforme se depreende da leitura dos seguintes precedentes: AgInt no REsp n. 1.719.552/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 12/2/2019, DJe 15/2/2019; EDcl no AgInt no REsp n. 1.597.589/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 19/6/2018, DJe 27/6/2018; REsp n. 1.680.699/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 28/11/2017, DJe 19/12/2017”, AgInt no REsp 1726737/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 05/12/2019, DJe 11/12/2019.

6 - O polo apelante foi autuado por realizar edificação em área de preservação permanente sem licença ambiental, na margem do rio Paraná.

7 - O Código Florestal vigente ao tempo dos fatos, Lei 4.771/65, art. 2º, “a”, considerava de preservação permanente as áreas ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água, fixando distância a ser resguardada, levando-se em consideração as margens e a largura do curso pluvial.

8 - Nenhum reparo a demandar a r. sentença, que mui bem resolveu a controvérsia, embasada nos elementos probatórios ao feito produzidos, que adiante serão abordados.

9 - Nos termos da perícia, não há provas de construção anterior ao Código Florestal de 1965 e, se havia, houve reforma, em razão das boas condições do imóvel, ID 89336197 - Pág. 10.

10 - Ainda que outro fosse o entendimento, houve continuidade/modificação de ocupação de área de preservação, após a previsão legislativa vedatória.

11 - Importante esclarecimento a repousar no fato de a infração ambiental se perpetuar no tempo, logo de caráter permanente. Precedente.

12 - Não se resume a ocupação irregular a uma construção anterior à previsão legal, assim a ação humana na área subsumiu-se aos conceitos previstos na Lei 4.771/65, em ação continuada.

13 - Não resta mínima dúvida de que a construção litigada se perfez ao tempo em que previsto impedimento para ocupação da área, por este motivo caindo por terra as arguições envolvendo irretroatividade da norma e “direito adquirido”, prevalecendo, assim, os interesses coletivos à preservação em norma estatuídos. Precedente.

14 - Patente que a norma visou a permitir preservação do ambiente que margeia o rio, evitando assoreamento e degradação, buscando com que o curso d’água fosse preservado, a fim de que regeneração apropriada do local fosse realizada.

15 - Referida área não deve ser ocupada, esta a hermenêutica da regra, assim não merece amparo o argumento de que não há degradação ambiental, ou que seria de menor potencial – não houve autorização do órgão ambiental competente para a realização da edificação – porquanto tem a restrição a natureza de limitação non aedificandi (a presença humana impossibilita a regeneração natural do tracto de terra, por evidente).

16 - Nenhuma alteração ao quadro infracional firmado pelo IBAMA a ocorrer com a transformação em “Distrito” da área do Porto Caiuá, pelo Município de Naviraí/MS, porquanto, como descrito no laudo pericial, está a região distante 66 km da urbe, ID 89336197 - Pág. 3, evidenciando as fotografias tratar-se de área afastada/remota e que possui, ainda, mata ciliar preservada, ID 89336197 - Pág. 17, fotos 13/14, contando o povoado com apenas 181 moradores, dados do censo/2000, ID 89336197 - Pág. 36, assim mui diferente do buscado cenário de “urbanização e antropização”, tecido na apelação.

17 – O inciso V do art. 2º da Resolução Conama 302 preconiza quais os critérios são adotados para a configuração de área urbana consolidada.

18 - Diante das peculiaridades retro expostas, não restou demonstrada configuração de zona de expansão urbana, para fins ambientais, por desatendimento aos critérios normativos, como visto. Precedente.

19 - A legislação federal se sobrepõe, por evidente, à norma local ou aprovações de construção que tenha obtido o polo apelante, que não pode suprimir critério objetivo previsto em âmbito nacional, por isso inoponível ventilada área urbana, que, em tese, teria gerado a desejada amiúde “regularização fundiária”. Precedente.

20 - Por se tratar de originária ocupação irregular do solo, entende essa C. Corte que o debate acerca de zona urbana ou rural acaba por se perder, diante da existência de legislação nacional (para todo o País, pois ...), que impõe o resguardo de metragem em áreas de preservação, às margens de rios/reservatórios. Precedente.

21 - Superior ao vertente caso o interesse coletivo à preservação, nos termos da lei, que se sobrepõe ao privado anseio (por este motivo superado o invocado direito à moradia, ao lazer, à proporcionalidade e à razoabilidade), por evidente, descabendo ao apelante fazer comparações com outras situações que considera irregulares, porque, a uma, em exame seu exclusivo direito e, a duas, aos autos tratada situação específica que se demonstrou violadora da legislação, nos termos das provas produzidas, assim de todo o acerto o agir do IBAMA, afigurando-se degradadora ao meio ambiente a só permanência humana em local cuja norma proibiu ocupação, por isso não se há de falar em mitigação de impacto. Precedente.

22 - Pelo raciocínio privado, se há infrações sendo cometidas por outrem/vizinhos, então justificável o seu “não apenamento”, logo tal evidentemente a não frutificar, afinal o livramento do recorrente significaria a perpetuação do cometimento de ilegalidades e o incentivo ao uso irregular de terrenos protegidos, tudo com egoísmo e descaso à vital preservação do meio ambiente, ainda mais na área litigada, lindeira a curso d’água (importante rio – Paraná – do Continente), fonte de vida e substância escassa ao Planeta, que atualmente vive agravante crise hídrica, tudo por causa de ações impensadas do homem e de erros cometidos ao longo da história, seja por desconhecimento, seja por postura predatória em busca de riquezas, desastrosas experiências estas a imporem sensíveis reflexos ao presente e também impactantes a um futuro próximo, infelizmente.

23 - Não resta mínima dúvida de que a construção vilipendia os interesses públicos à preservação, em norma estatuídos, REsp 1782692/PB, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 13/08/2019, DJe 05/11/2019. Precedente.

24 - O Doutor Advogado Marcos dos Santos, OAB/MS 12.942-A, também patrocinou os autos 0001166-91.2008.4.03.6006, que recaíram sob Relatoria deste subscritor, onde outra parte debateu os mesmos pontos aqui versados, portanto já conhece o desfecho da lide, apelo aquele julgado improvido e transitado em julgado em 14/10/2021.

25 - Ausentes honorários advocatícios recursais, por sentenciada a causa sob à égide do CPC anterior,  EDcl no AgInt no REsp 1573573/RJ, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 04/04/2017, DJe 08/05/2017.

26 – Improvimento à apelação. Improcedência aos embargos.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu pelo improvimento à apelação, nos termos do voto do Juiz Fed. Conv. SILVA NETO (Relator), com quem votaram o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE e a Des. Fed. MÔNICA NOBRE. Ausentes, justificadamente, em razão de férias, a Des. Fed. MARLI FERREIRA (substituída pelo Juiz Fed. Conv. SILVA NETO) e o Des. Fed. MARCELO SARAIVA , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.