Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma

MANDADO DE SEGURANÇA CRIMINAL (1710) Nº 5001740-77.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

IMPETRANTE: TEBAR CONTENTE SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA

Advogados do(a) IMPETRANTE: GUSTAVO OLIVEIRA CHALFUN - MG81424-A, SERGIO RODRIGUES LEONARDO - MG85000

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CAMPINAS/SP - 1ª VARA FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma
 

MANDADO DE SEGURANÇA CRIMINAL (1710) Nº 5001740-77.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

IMPETRANTE: TEBAR CONTENTE SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA

Advogado do(a) IMPETRANTE: GUSTAVO OLIVEIRA CHALFUN - MG81424-A

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CAMPINAS/SP - 1ª VARA FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:

 

Trata-se de Mandado de Segurança com pedido liminar impetrado por SÁ PEREIRA CONSULTORIA ADVOCATÍCIA– (fls. 01/27 - ID 269363993), em face do r. decisum (fls. 1/3 – ID 269364009), proferido em 13.12.2022 pela Exma. Juíza Federal Raquel Coelho Dal Rio Silveira (1ª Vara Federal de Campinas/SP), que, no bojo dos autos n. 5013052-05.2022.403.6105 (incidente de liberação de bloqueio judicial), manteve o bloqueio dos valores originariamente pertencentes ao investigado AEDI CORDEIRO DOS SANTOS (medida constritiva de direitos anteriormente deferida nos autos 5008194-62.2021.403.6105 e relacionada à denominada Operação Black Flag) e julgou improcedente o pedido formulado (liberação de valores bloqueados judicialmente para pagamento de honorários advocatícios), nos termos do artigo 487, I, do CPC.

Alega em síntese que (ID 269363993):

a) o impetrante e o investigado AEDI CORDEIRO DOS SANTOS, aos 07.06.2021, celebraram contrato de serviços advocatícios consistente na impetração de Habeas Corpus perante o STJ para fins de reversão da prisão preventiva decretada. Na mesma data, pactuaram um termo aditivo contratual, sem alteração nos valores ajustados (R$ 350.000,00 à vista e em caso de êxito R$ 2.500.000,00 a serem pagos em até sessenta dias após a revogação da medida, tendo sido dado em garantia uma embarcação, tipo lancha), incluindo a atuação do ora impetrante perante o TRF3. O contrato entabulado não fora completamente adimplido, restando o pagamento dos honorários no importe de R$2.500.000,00 (dois milhões e quinhentos mil reais), já que AEDI tivera sua prisão revogada em razão do serviços prestados;

b) em razão do inadimplemento contratual foi ajuizada a ação de execução por quantia certa n.º 5052270-35.2022.8.13.0024 perante a 20ª Vara Cível da Comarca de Belo Horizonte/MG, onde se pleiteia o bloqueio do saldo devedor nas contas do executado, o que não ocorreu até o momento;

c) sabedor da medida cautelar proferida em desfavor de AEDI CORDEIRO DOS SANTOS nos autos 5008194-62.2021.403.6105 o ora impetrante ajuizou incidente de liberação do bloqueio judicial para pagamento de honorários perante a 1ª Vara Federal de Campinas/SP nos autos 5013052-05.2022.403.6105. O decisum, ao julgar improcedente a liberação dos valores bloqueados violou direito líquido e certo;

d) aduz que sua pretensão encontra fundamento no artigo 24-A da Lei n.º 8.906, de 04.07.1994, incluído pela Lei nº 14.365/2022, que dispõe que no caso de bloqueio universal do patrimônio do cliente por decisão judicial, garantir-se-á ao advogado a liberação de até 20% (vinte por cento) dos bens bloqueados para fins de recebimento de honorários e reembolso de gastos com a defesa;

e) requer seja oportunizado o recolhimento das custas processuais ao final do processo diante das dificuldades financeiras, bem como a concessão da liminar determinando a imediata transferência para a conta corrente do advogado, ora impetrante, do montante atualizado de R$3.129.442,00 (três milhões, cento e vinte e nove mil, quatrocentos e quarenta e dois reais), bloqueados nos autos n.º 5008194- 62.2021.403.6105, e no mérito, “CONCEDIDA A SEGURANÇA em definitivo, confirmando-se a liminar caso concedida, para o fim de ser declarada a abusividade e ilegalidade da decisão do Impetrado que julgou improcedente o Incidente de Liberação do Bloqueio Judicial para o Pagamento de Honorários do Impetrante, autorizando seu ressarcimento.”

A inicial (ID 269363993) veio acompanhada da documentação digitalizada (ID’s 269363997, 269364002, 269364003, 269364005, 269364008, 269364009, 269364011, 269364014 e 269364017). 

Em 10.03.2023, foi indeferida a medida liminar requerida e determinada a comprovação das alegadas dificuldades financeiras ou o recolhimento das custas, no prazo de 05 (cinco) dias (ID 271101897).

Sobrevieram informações da autoridade coatora, relatando que o pedido foi julgado improcedente e, após as intimações necessárias, em 09/02/2023, houve o trânsito em julgado do feito, que fora arquivado em 14/02/2023 (ID 271271533).

O impetrante colacionou extratos bancários relativos aos quatro últimos meses, a fim de comprovar a hipossuficiência alegada (ID 271616608).

Parecer do Ministério Público Federal no sentido de que, à luz da Súmula n.º 268 do Eg. STF, o presente mandado de segurança afigura-se claramente descabido, pelo que manifesta-se esta PRR-3.ª Região pelo indeferimento da petição inicial, com fundamento no art. 10 da Lei n.º 12.016/2009 (ID 271740174).

É o relatório.

Dispensada a revisão nos termos regimentais.

 

 

 

 


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OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:

DAS CUSTAS PROCESSUAIS

 

O impetrante pleiteou o recolhimento das custas processuais ao final do processo alegando dificuldades financeiras, tendo sido determinada a comprovação destas ou o recolhimento das custas.

 

Os extratos bancários colacionados aos autos (ID 271616609) não são suficientes para demonstrar a impossibilidade do pagamento no presente momento.

 

No entanto, considerando a avançada fase processual e a fim de possibilitar o exercício do direito de ação constitucional, defiro o recolhimento das custas ao fim do processo.

 

 

MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO JUDICIAL. CABIMENTO. ADMISSIBILIDADE DO EXPEDIENTE.

 

A teor do disposto no art. 5º, LXIX, da Constituição Federal, conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. Importante ser dito que a disciplina legal do remédio constitucional em tela ficou a cargo da Lei n.º 12.016, de 07 de agosto de 2009, cabendo destacar que o Mandado de Segurança impetrado contra ato judicial somente poderá ser conhecido caso a decisão apontada como coatora não desafie recurso próprio com efeito suspensivo e não tenha ocorrido a sobrevinda de trânsito em julgado - a propósito, vide o art. 5º, II e III, de indicada Lei: Não se concederá mandado de segurança quando se tratar: (...) II - de decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo; III - de decisão judicial transitada em julgado. 

 

É certo que o Mandado de Segurança não deve, em regra, servir como sucedâneo recursal, sob pena de se desnaturar sua vocação e finalidade precípua (inteligência da Súmula 267 do Supremo Tribunal Federal). Nesse contexto, não se ignora a existência de entendimento no sentido de que, em havendo no ordenamento a previsão de um recurso idôneo contra o ato judicial que se quer impugnar, mesmo sendo este desprovido de efeito suspensivo, não se deveria admitir a impetração do mandamus. Nesse sentido, confira-se:

 

PENAL. PROCESSUAL PENAL. MANDADO DE SEGURANÇA. SEQUESTRO DE BENS. DESCABIMENTO.

1. Não obstante certa oscilação de entendimento quanto ao cabimento do mandado de segurança contra decretação de sequestro em processo penal, confrontando a apelação (CPP, art. 593, II) com os embargos (CPP, art. 130), cujo julgamento depende do trânsito em julgado da condenação (CPP, art. 130, parágrafo único), força convir que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça admite a interposição de apelação, a excluir, em consequência, o mandado de segurança (STJ, RMS n. 28938, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 06.12.12; RMS n. 26768, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 27.03.12; RMS n. 200802350866, Rel. Des. Fed. Conv. Adilson Vieira Macabu, j. 21.06.11; REsp n. 258167, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, j. 02.05.02).

2. Segurança denegada.

(TRF3, Quarta Seção, Mandado de Segurança n.° 346641 – Autos n.° 0020035-05.2013.4.03.0000, Julg. em 21.08.2014, Rel. André Nekatschalow, e-DJF3 Judicial 1 de 26.08.2014)

 

Mais prudente, todavia, parece ser o entendimento que admite a impetração de Mandado de Segurança nas hipóteses em que o recurso eventualmente cabível carece de efeito suspensivo, inclusive porque o afastamento, ab initio, da admissibilidade do mandamus poderia, p. ex., inviabilizar a análise, no caso concreto, acerca de eventual teratologia, abuso de poder, e/ou patente ilegalidade do ato impugnado.

 

No caso em questão, em que o ato impugnado diz respeito a decisão que manteve o sequestro e que julgou improcedente o pedido formulado (de liberação de valores bloqueados judicialmente, com a finalidade de pagamento de honorários advocatícios),  embora se possa argumentar que existe, no ordenamento pátrio, recurso idôneo passível de ser manejado, qual seja, a Apelação prevista no art. 593, II, do CPP, é certo que esta não é dotada de efeito suspensivo, de modo que não se vislumbra óbice à admissibilidade do presente mandamus.

 

Inclusive, a jurisprudência desta E. Corte vem admitindo, sem maiores questionamentos, o manejo do Mandado de Segurança para impugnação de ato judicial que decreta o sequestro de bens e valores, por  exemplo. Nesse sentido, confira-se:

 

PROCESSUAL PENAL. MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO JUDICIAL CONSUBSTANCIADO NO SEQUESTRO DE BENS DE RÉUS DENUNCIADOS PELA PRÁTICA DE CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. CABIMENTO. DECISÃO GENÉRICA. NULIDADE. SEGURANÇA PARCIALMENTE CONCEDIDA.

I - O mandado de segurança constitui ação adequada para a impugnação de ato judicial que decreta o sequestro de bens em matéria criminal. Precedentes.

II - A decisão que determinou a constrição dos bens dos impetrantes não aponta quais os indícios concretos no sentido de que o patrimônio fora adquirido com dinheiro proveniente de atividade ilícita, limitando-se a supor que a aquisição decorrera da prática de crimes contra o Sistema Financeiro Nacional.

III - A simples presença de elementos autorizadores do recebimento da denúncia (prova da materialidade e indícios de autoria), na ausência de previsão legal específica, tal como ocorre nos crimes contra a ordem tributária, em que a conduta delituosa resulta em prejuízo para a Fazenda Pública (Decreto Lei nº. 3.240/41), não serve de exclusiva motivação para o deferimento da medida cautelar de seqüestro, havendo previsão específica, nos artigos 125 e 126 do Código de Processo Penal, no sentido de que os bens seqüestrados tenham sido adquiridos com os proventos da infração, não havendo qualquer apontamento concreto nesse sentido, o que evidencia a nulidade do ato judicial por falta de motivação.

IV - Alegação de descabimento da impetração rejeitada. No mérito, segurança parcialmente concedida para cassar a decisão que determinou o seqüestro dos bens dos impetrantes, ressalvando-se a possibilidade de nova decretação devidamente motivada.

(TRF3, Primeira Seção, Mandado de Segurança n.° 296499 – Autos n.° 0093622-70.2007.4.03.0000, Julg. em 07.02.2013, Rel. Cotrim Guimarães, e-DJF3 Judicial de 19.02.2013) (grifei)

 

PROCESSUAL PENAL. MANDADO DE SEGURANÇA. SEQUESTRO DE BENS. DECISÃO SUFICIENTEMENTE FUNDAMENTADA. INDÍCIOS DO ENVOLVIMENTO DO RÉU NA PRÁTICA DE CRIMES LIGADOS AO TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS. QUESTÕES DE MAIOR PROFUNDIDADE. DECISÃO QUE DECRETOU O SEQUESTRO DE BENS ENCONTRADOS E QUE O VENHAM A SER. LEGALIDADE. SEGURANÇA DENEGADA.

1. Não padece de falta ou deficiência de fundamentação a decisão que, indicando o provável envolvimento do agente em determinados crimes previstos na lei antitóxicos (artigo 12, § 2º, inciso III, e artigo 14, ambos da Lei n.º 6.368/1976), decreta o sequestro de seus bens, abrangendo os encontrados e os que vierem a sê-lo.

2. O envolvimento do réu em tráfico de mais de uma tonelada de maconha e a provável integração dele em associação para a prática do tráfico ilícito de drogas são indícios suficientes à decretação do sequestro de seus bens, máxime quando se sabe que, atualmente, já há condenações em ambos os feitos, nas duas instâncias ordinárias.

3. As alegações de que o réu teria sido vítima de ‘armação’ ou ‘fraude processual’ não encontram sede adequada no mandado de segurança, devendo ser formuladas, debatidas e decididas no bojo da ação penal.

4. Ordem denegada.

(TRF3, Primeira Seção, Mandado de Segurança n.° 280090 – Autos n.° 0057153-59.2006.4.03.0000, Julg. em 03.05.2012, Rel. Nelton dos Santos, e-DJF3 Judicial 1 de 10.05.2012) (grifei)

 

Cumpre mencionar, ainda, que a autoridade coatora informou o trânsito em julgado da decisão ora impugnada em 09.02.2023, posteriormente, portanto, à impetração deste mandamus, em 31.01.2023.

 

Assim, não se aplica ao caso a proibição inscrita no art. 5º, III, da Lei n. 12.016/2009, bem como na Súmula n. 268 do Supremo Tribunal Federal (Não cabe mandado de segurança contra decisão judicial com trânsito em julgado), dado que o cabimento do mandado de segurança deve ser aferido no momento de sua impetração.

 

Nesse sentido, colaciono precedente da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça:

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO MANDADO DE SEGURANÇA. TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO IMPETRADA OCORRIDO APÓS A IMPETRAÇÃO. AÇÃO DE USUCAPIÃO. BEM ARREMATADO EM EXECUÇÃO TRABALHISTA. AÇÃO DE IMISSÃO NA POSSE DECORRENTE DA ARREMATAÇÃO DE MESMO IMÓVEL. SUSPENSÃO DO PROCESSO POR PRAZO INDETERMINADO. DESRESPEITO À LITERALIDADE DO ART. 265, § 5º DO CPC/1973. ILEGALIDADE DA DECISÃO. SEGURANÇA CONCEDIDA.

1. ‘A atribuição de efeitos infringentes aos embargos de declaração é possível, em hipóteses excepcionais, para corrigir premissa equivocada no julgamento, bem como nos casos em que, sanada a omissão, a contradição ou a obscuridade, a alteração da decisão surja como consequência necessária’ (EDcl no AgRg no Ag n. 1.026.222/SP, Relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 10/10/2014).

2. É incabível mandado de segurança contra decisão judicial transitada em julgado, incidindo, portanto, o teor do art. 5º, inciso III, da Lei n. 12.016/2009 e da Súmula n. 268/STF. Precedentes.

3. No entanto, sendo a impetração do mandado de segurança anterior ao trânsito em julgado da decisão questionada, mesmo que venha a acontecer, posteriormente, não poderá ser invocado o seu não cabimento ou a sua perda de objeto, mas preenchidas as demais exigências jurídico-processuais, deverá ter seu mérito apreciado.

(...)

9. Embargos de declaração acolhidos com efeitos infringentes para conhecer do agravo e conceder a segurança.

(STJ, CE, EDcl no MS 22157/DF, j. 14.03.2019, DJe 11.06.2019) (grifei)

 

REQUISITOS PARA O DEFERIMENTO DE ORDEM MANDAMENTAL: NECESSIDADE DE QUE O ATO JUDICIAL APONTADO COMO COATOR DETENHA TERATOLOGIA, ILEGALIDADE OU ABUSO DE PODER PARA QUE SEJA POSSÍVEL A CONCESSÃO DA ORDEM VINDICADA.

 

O entendimento jurisprudencial que se formou acerca do cabimento do mandamus impetrado contra ato judicial aponta para a necessidade de que a decisão judicial acoimada como coatora esteja revestida de teratologia, de abuso de poder ou de ilegalidade - nesse sentido:

 

Agravo regimental em mandado de segurança. 2. Direito Processual Civil. 3. Razões do agravo regimental não atacam os fundamentos da decisão agravada. Incidência da Súmula 287 do STF. 4. Mandado de segurança contra ato judicial. Ausência de teratologia ou abuso de poder. Não cabimento. Súmula 267 do STF. 5. Mandado de segurança em face de decisão judicial transitada em julgado. Incabível. Súmula 268 do STF. 6. Interposição de agravo contra decisão da origem que aplicou a sistemática da repercussão geral. Não conhecimento. Precedentes. 7. Agravo regimental a que se nega provimento (STF, MS 34866 AgR, Rel. Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 27/10/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-253 DIVULG 07-11-2017 PUBLIC 08-11-2017) - (grifei) 

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. MANDADO DE SEGURANÇAATO JURISDICIONALNÃO CABIMENTO DO WRIT. IMPOSIÇÃO DE MULTA. (...) 2. Decisões judiciais só podem ser impugnadas em mandado de segurança se forem teratológicas, o que não é o caso dos autos. (...) (STF, MS 30048 ED, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 09/09/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-243 DIVULG 16-11-2016 PUBLIC 17-11-2016) - (grifei) 

 

MANDADO DE SEGURANÇAATO JUDICIAL. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA RECURSAL. IMISSÃO NA POSSE. MANDADO DE SEGURANÇA NÃO PODE SER UTILIZADO COMO SUCEDÂNEO RECURSALNÃO SE TRATA DE DECISÃO TERATOLÓGICA. PRETENSÃO QUE DEMANDA DILAÇÃO PROBATÓRIA, INVIÁVEL EM MANDADO DE SEGURANÇA. (...) II - O mandado de segurança não pode ser utilizado como sucedâneo recursal, sob pena de se desnaturar a sua essência constitucional. III - Apenas em casos excepcionais, quando o ato judicial é eivado de ilegalidade, teratologia ou abuso de poder, esta Corte tem abrandado o referido posicionamento. (...) (STJ, AgInt no RMS 45.152/DF, Rel. Min. FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/12/2017, DJe 14/12/2017) (grifei) 

 

PROCESSUAL CIVIL. NÃO CABIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. ARTS. 1009, § 1º, E 1015 DO CPC/2015. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é de que o Mandado de Segurança não pode ser utilizado como sucedâneo recursal, sendo descabido o seu manejo contra ato judicial recorrível. (...) 3. Ademais, como ressaltado, a jurisprudência desta Corte é assente no sentido de que o Mandado de Segurança contra ato judicial é medida excepcional, admissível somente nas hipóteses em que se verifica de plano decisão teratológica, ilegal ou abusiva, contra a qual não caiba recurso. (...) (STJ, RMS 54.969/SP, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/10/2017, DJe 23/10/2017) (grifei).

 

Ocorre que, compulsando os autos, não se nota a presença de teratologia, de abuso de poder ou de flagrante ilegalidade apta a justificar a concessão da ordem mandamental.

 

ANÁLISE DO CASO CONCRETO

 

O r. decisum tido como coator, proferido em 13.12.2022, pela Exma. Juíza Federal Raquel Coelho Dal Rio Silveira (1ª Vara Federal de Campinas/SP), no incidente de liberação de bloqueio judicial n.° 5013052-05.2022.403.6105, manteve o bloqueio dos valores originariamente pertencentes ao investigado AEDI CORDEIRO DOS SANTOS (medida constritiva de direitos anteriormente deferida nos autos 5008194-62.2021.403.6105 e relacionada à denominada Operação Black Flag) e julgou improcedente o pedido formulado (liberação de valores bloqueados judicialmente com a finalidade de pagamento de honorários advocatícios), nos termos do artigo 487, I, do CPC.

 

Não há direito líquido e certo como invocado pelo ora impetrante, por mais de um fundamento.

 

Inicialmente, o contrato de honorários advocatícios foi pactuado entre o impetrante e o investigado AEDI CORDEIRO DOS SANTOS, aos 07.06.2021, ou seja, anteriormente ao advento do artigo 24-A da Lei n.º 8.906/1994, porquanto este fora incluído ao Estatuto da OAB pela Lei n.º 14.365 tão somente em 2022, não estando, portanto, o ajuste acobertado pela novel legislação.

 

Ainda que assim não fosse, o disposto no artigo 24-A da Lei supramencionada prevê hipótese distinta da dos autos.

 

Com efeito, o artigo 24-A estatui que “no caso de bloqueio universal do patrimônio do cliente por decisão judicial, garantir-se-á ao advogado a liberação de até 20% (vinte por cento) dos bens bloqueados para fins de recebimento de honorários e reembolso de gastos com a defesa, ressalvadas as causas relacionadas aos crimes previstos na Lei n.º 11.343, de 23 de agosto de 2006 (Lei de Drogas), e observado o disposto no parágrafo único do art. 243 da Constituição Federal.” (grifei)

 

Como é possível entrever da documentação acostada aos autos e do que restou pontuado na decisão tida como coatora (ID 269364009), o bloqueio de bens determinado por aquele r. Juízo não foi universal, mas único, “na data em que comandado e com montante fixo, calculado com base nos prejuízos causados ao erário e na necessária reparação do dano, além daqueles valores sobre os quais pesam indícios de serem proveito do ilícito”.

 

Portanto, a medida constritiva de direitos “não atingiu a totalidade dos bens do contratante, cujo patrimônio é, diga-se, desconhecido. Tanto é assim que, mesmo preso e já com a ordem de indisponibilidade vigente, o contratante ajustou e pagou parcela de contrato de honorários e firmou garantia com bem por ela não atingido.” (ID 269364009)

 

Como se vê, a medida constritiva de direitos não abarcou a totalidade de bens de AEDI CORDEIRO DOS SANTOS, pressuposto necessário para adequação ao disposto no artigo 24-A da Lei n.º 8.906/1994. Ora, no momento do ajuste AEDI contava com patrimônio suficiente para arcar com os honorários advocatícios, tendo quitado a primeira parcela no valor de R$ 350.000,00 e dado em garantia a embarcação tipo lancha (ID 269364005).

 

Ademais, tramita perante a 20ª Vara Cível da Comarca de Belo Horizonte/MG a ação de execução por quantia certa n.º 5052270-35.2022.8.13.0024 em que se pleiteia o bloqueio do saldo devedor nas contas do executado em razão do inadimplemento contratual (consulta em 14.04.2023), ambiente processual em que se deverá solucionar a questão.

 

Por fim, em consulta (em 17.05.2023) ao site do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (https://pje-consulta-publica.tjmg.jus.br/pje/ConsultaPublica/DetalheProcessoConsultaPublica/listView.seam?ca=59b0346a816a546c0274fbdf5e1f123f5673fabd47590f8a) nota-se que AEDI opôs embargos à execução, sob n. 5217086-34.2022.8.13.0024, de modo que a questão é controvertida, restando litigiosa a relação jurídica, o que, igualmente, evidencia a ausência de direito líquido e certo.

 

Noto que segundo a f. 192 do download dos presentes autos, em ordem crescente, há, inclusive, alegação de vício de consentimento por parte de AEDI, o que demandará, eventualmente, produção de prova oral.

 

 

DISPOSITIVO

Ante o exposto, vota-se por DENEGAR A ORDEM requerida.

 

 



E M E N T A

 

PROCESSO PENAL. MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO JUDICIAL. CABIMENTO. TRÂNSITO EM JULGADO DO ATO IMPUGNADO POSTERIOR À IMPETRAÇÃO. ADMISSIBILIDADE DO EXPEDIENTE. REQUISITO PARA O DEFERIMENTO DE ORDEM MANDAMENTAL: NECESSIDADE DE QUE O ATO JUDICIAL APONTADO COMO COATOR DETENHA TERATOLOGIA, ILEGALIDADE OU ABUSO DE PODER PARA QUE SEJA POSSÍVEL A CONCESSÃO DA ORDEM VINDICADA. ANÁLISE DO CASO CONCRETO – PEDIDO DE LIBERAÇÃO DE VALORES DO CLIENTE BLOQUEADOS JUDICIALMENTE COM A FINALIDADE DE PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DENEGAÇÃO DA ORDEM MANDAMENTAL.

- A teor do disposto no art. 5º, LXIX, da Constituição Federal, conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. A disciplina legal do remédio constitucional em tela ficou a cargo da Lei n.º 12.016, de 07 de agosto de 2009, cabendo destacar que o Mandado de Segurança impetrado contra ato judicial somente poderá ser conhecido caso a decisão apontada como coatora não desafie recurso próprio com efeito suspensivo e não tenha ocorrido a sobrevinda de trânsito em julgado (art. 5º, II e III, de indicada Lei). Adentrando ao caso concreto descrito neste writ, embora se possa argumentar que existe, no ordenamento pátrio, recurso idôneo passível de ser manejado, qual seja, a Apelação prevista no art. 593, II, do CPP, é certo que esta não é dotada de efeito suspensivo, de modo que não se vislumbra óbice à admissibilidade do presente mandamus. Ademais, a autoridade coatora informou o trânsito em julgado da decisão ora impugnada em 09.02.2023, posteriormente, portanto, à impetração deste mandamus, em 31.01.2023. Assim, não se aplica ao caso a proibição inscrita no art. 5º, III, da Lei n. 12.016/2009, bem como na Súmula n. 268 do Supremo Tribunal Federal, dado que o cabimento do mandado de segurança deve ser aferido no momento de sua impetração.

- O entendimento jurisprudencial que se formou acerca do cabimento do mandamus impetrado contra ato judicial aponta pela necessidade de que a decisão judicial acoimada como coatora esteja revestida de teratologia, de abuso de poder ou de ilegalidade, nunca sendo possível sua submissão a tal via estreita quando passível de ser manejado recurso. Precedentes do C. Supremo Tribunal Federal e do C. Superior Tribunal de Justiça.

- O impetrante pretende a liberação de valores bloqueados judicialmente pertencentes a investigado, seu cliente, com a finalidade de pagamento de honorários advocatícios.

- O contrato de honorários advocatícios foi pactuado entre o impetrante e o investigado AEDI CORDEIRO DOS SANTOS, aos 07.06.2021, ou seja, anteriormente ao advento do artigo 24-A da Lei n. 8.906/1994, porquanto este fora incluído ao Estatuto da OAB pela Lei n. 14.365 tão somente em 2022, não estando, portanto, o ajuste acobertado pela novel legislação.

- Ainda que assim não fosse, o disposto no artigo 24-A da lei supramencionada prevê hipótese distinta da dos autos. O artigo 24-A estatui que “no caso de bloqueio universal do patrimônio do cliente por decisão judicial, garantir-se-á ao advogado a liberação de até 20% (vinte por cento) dos bens bloqueados para fins de recebimento de honorários e reembolso de gastos com a defesa, ressalvadas as causas relacionadas aos crimes previstos na Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006 (Lei de Drogas), e observado o disposto no parágrafo único do art. 243 da Constituição Federal”. A medida constritiva de direitos do feito subjacente “não atingiu a totalidade dos bens do contratante, cujo patrimônio é, diga-se, desconhecido. Tanto é assim que, mesmo preso e já com a ordem de indisponibilidade vigente, o contratante ajustou e pagou parcela de contrato de honorários e firmou garantia com bem por ela não atingido”.

- Ademais, tramita perante a 20ª Vara Cível da Comarca de Belo Horizonte/MG a ação de execução por quantia certa n. 5052270-35.2022.8.13.0024 em que se pleiteia o bloqueio do saldo devedor nas contas do executado em razão do inadimplemento contratual, ambiente processual em que se deverá solucionar a questão, e no qual o executado opôs embargos à execução, sob n. 5217086-34.2022.8.13.0024, de modo que a questão é controvertida, restando litigiosa a relação jurídica, o que, igualmente, evidencia a ausência de direito líquido e certo.

- Denegada a ordem requerida.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, A Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu DENEGAR A ORDEM requerida, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.