Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0001727-52.2008.4.03.6124

RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSOM DI SALVO

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS, UNIÃO FEDERAL

APELADO: ORLANDO SANTOS MELO, MARINO MASSARO, ADELVAN SANTOS MELO, CESP COMPANHIA ENERGETICA DE SAO PAULO, MUNICIPIO DE SANTA ALBERTINA, NAIR DA SILVA MASSARO, ORIDES PEREIRA MELO, RIO PARANÁ ENERGIA S.A

Advogado do(a) APELADO: SILMARA PORTO PENARIOL - SP190786-A
Advogado do(a) APELADO: ADRIANA ASTUTO PEREIRA - SP389401-A
Advogado do(a) APELADO: SARA SUZANA APARECIDA CASTARDO DACIA - SP152464-A
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE ABBY - SP303656-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0001727-52.2008.4.03.6124

RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSOM DI SALVO

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS, UNIÃO FEDERAL

APELADO: ORLANDO SANTOS MELO, MARINO MASSARO, ADELVAN SANTOS MELO, CESP COMPANHIA ENERGETICA DE SAO PAULO, MUNICIPIO DE SANTA ALBERTINA, NAIR DA SILVA MASSARO, ORIDES PEREIRA MELO, RIO PARANÁ ENERGIA S.A

Advogado do(a) APELADO: SILMARA PORTO PENARIOL - SP190786-A
Advogado do(a) APELADO: ADRIANA ASTUTO PEREIRA - SP389401-A
Advogado do(a) APELADO: SARA SUZANA APARECIDA CASTARDO DACIA - SP152464-A
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE ABBY - SP303656-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

R E L A T Ó R I O

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOHONSOM DI SALVO, RELATOR:

 

Trata-se de REEXAME NECESSÁRIO e APELAÇÕES interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pela UNIÃO FEDERAL e pelo INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS (IBAMA), contra a sentença de improcedência da AÇÃO CIVIL PÚBLICA em epígrafe, que objetiva a reparação de dano ambiental na área de preservação permanente (APP) no entorno do reservatório da Usina Hidrelétrica (UHE) de Ilha Solteira.

 

Entre os anos de 2008 e 2009 o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ajuizou 501 ações civis públicas com o mesmo propósito, cada qual em relação a um imóvel específico (ID 268634884).

 

Nesses autos, a inicial se reporta ao imóvel pertencente a ORLANDO SANTOS MELO,  ADELVAN SANTOS MELO, ORIDES PEREIRA MELO,  MARINO MASSARO e NAIR DA SILVA MASSARO, situado na APP no entorno da UHE de Ilha Solteira em Santa Albertina/SP, por omissão da COMPANHIA ENERGÉTICA DE SÃO PAULO (CESP), na qualidade de concessionária da UHE de Ilha Solteira, da UNIÃO FEDERAL, na qualidade de poder concedente, do IBAMA, na qualidade de executor da Política Nacional do Meio Ambiente e do MUNICÍPIO DE SANTA ALBERTINA/SP, que promulgou legislação autorizadora das edificações em APP (ID 268634660 – fls. 13/28, ID 268634661 – fls. 1/13, 17/21, ID 268634662 – fls. 1/3).

 

À época da propositura dessa ação civil pública, a legislação ambiental em vigor estabelecia que a APP incidente seria de 100 metros (ID 268634660 – fls. 13/28, ID 268634661 – fls. 1/13, 17/21, ID 268634662 – fls. 1/3; ID 268634884).

 

Requereu-se, em apertada síntese, a delimitação física da APP existente no imóvel; a recuperação da APP, mediante retirada de edificações/impermeabilizações e subsequente reflorestamento; o exercício de efetivo poder de polícia pelo IBAMA e do MUNICÍPIO DE SANTA ALBERTINA/SP sobre atividades antrópicas realizadas na APP; o pagamento de indenização pelos danos ambientais decorrentes da eventual impossibilidade de recuperação da APP; a rescisão do contrato de concessão de exploração da UHE de Ilha Solteira por descumprimento da legislação ambiental. Deu-se à causa o valor de R$ 100.000,00 (ID 268634660 – fls. 13/28, ID 268634661 – fls. 1/13, 17/21, ID 268634662 – fls. 1/3).

 

Em 15/10/2009, o feito foi distribuído a 1ª Vara Federal de Jales/SP (ID 268634661 – fls. 14).

 

A tutela de urgência foi parcialmente deferida para   interditar a realização de novas atividades na APP do imóvel; determinar ao IBAMA e ao MUNICÍPIO DE SANTA ALBERTINA/SP a realização de vistoria no imóvel para elaboração de laudo preliminar; determinar à UNIÃO FEDERAL a fiscalização da execução do contrato de concessão (ID 268634665 – fls. 11/17).

 

A UNIÃO FEDERAL e o IBAMA foram transferidos para o polo ativo da ação civil pública (ID 268634666 – fls. 14, ID 268634667 – fls. 2).

 

O MUNICÍPIO DE SANTA ALBERTINA/SP, ORLANDO SANTOS MELO, a CESP e ADELVAN SANTOS MELO, ORIDES PEREIRA MELO, MARINO MASSARO e NAIR DA SILVA MASSARO apresentaram contestação (ID 268634667 – fls. 16/20, ID 268634668 – fls. 1/4, 13/20, ID 268634669 – fls. 3/11, ID 268634670 – fls. 1/8, ID 268634679 – fls. 4/11).

 

A CESP informou que a edificação em questão se encontra fora da APP, ao teor da Lei nº 12.651/2012 (ID 268634679 – fls. 16/18).

 

A CESP reiterou que a edificação em questão se encontra fora da APP, pois o IBAMA, no processo de regularização ambiental da UHE de Ilha Solteira, concluiu que a mesma está compreendida entre a cota normal de operação e o limite da desapropriação efetuada (ID 268634684 – fls. 1/4).

 

Em 19/8/2014, o feito foi suspenso por 180 dias, tendo em vistas as ações diretas de inconstitucionalidade nº 4901, nº 4902 e nº 4903 em curso no STF, acerca da Lei nº 12.651/2012 (ID 268634684 – fls. 12).

 

A CESP informou que o IBAMA, no processo de regularização ambiental da UHE de Ilha Solteira, concedeu em 30/6/2015 a Licença de Operação nº 1300/2015 (ID 268634687 – fls. 3/15).

 

A CESP informou que o seu contrato de concessão da UHE de Ilha Solteira terminou em 7/7/2015 e requereu sua sucessão do polo passivo pela atual concessionária, a RIO PARANÁ ENERGIA S/A (ID 268634713 – fls. 8/11).

 

O STF declarou a constitucionalidade do artigo 62 da Lei nº 12.651/2012 e o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL pugnou pelo prosseguimento do feito, com a manutenção da CESP e a inclusão da RIO PARANÁ ENERGIA S/A no polo passivo (ID 268634715 – fls. 5, 8/14).

 

O Juízo a quo determinou que todos os atos processuais praticados na ação civil pública nº 0001653-95.2008.403.6124, tida como “processo piloto”, produziriam efeitos nesse processo até ulterior pronunciamento (ID 268634715 – fls. 16).

 

Na ação civil pública nº 0001653-95.2008.403.6124, houve decisão saneadora, onde se reconheceu a persistência do interesse de agir e a necessidade de definição da extensão da APP no entorno da UHE de Ilha Solteira; rejeitou o pedido de denunciação à lide do Estado de São Paulo; determinou a inclusão da RIO PARANÁ ENERGIA S/A no polo passivo; confirmou a legitimidade passiva da CESP, mesmo após o encerramento do contrato de concessão; ordenou a tentativa conciliação extrajudicial (ID 268634884).

 

A audiência de conciliação havida na ação civil pública nº 0001653-95.2008.403.6124 restou infrutífera (ID 268634884).

 

A RIO PARANÁ ENERGIA S/A foi incluída no polo passivo e apresentou contestação, com réplica da CESP, do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, do IBAMA e do MUNICÍPIO DE SANTA ALBERTINA/SP (ID 268634768, ID 268634781, ID 268634871, ID 268634872, ID 268634881).

 

O Juízo a quo encerrou a tramitação em conjunto com a ação civil pública nº 0001653-95.2008.403.6124; afastou a conexão entre as 501 ações civis públicas ajuizadas; reiterou a legitimidade passiva da CESP e da RIO PARANÁ ENERGIA S/A; reiterou a legitimidade passiva de ORLANDO SANTOS MELO,  ADELVAN SANTOS MELO, ORIDES PEREIRA MELO,  MARINO MASSARO e NAIR DA SILVA MASSARO, com fulcro na Súmula 623 do STJ; reiterou o interesse processual do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL; afastou a prescrição da pretensão de recuperação ambiental, com fulcro no Tema 999 do STF (ID 268634884).

 

Em decisão saneadora, o Juízo a quo, após analisar a legislação ambiental antecedente e vigente, a doutrina e a jurisprudência aplicáveis e as especificidades dos autos, delimitou como marco normativo para julgamento do presente caso, o artigo 62 do Lei nº 12.651/2012, caracterizando a extensão da APP no imóvel objeto da lide como a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum, assim compreendida como a faixa máxima alcançada pelo reservatório em períodos de grandes cheias (ID 268634884).

 

Prosseguindo no saneamento do feito, o Juízo a quo afastou o pedido do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL de declaração incidental de inconstitucionalidade da legislação municipal; determinou a inversão do ônus probatório em desfavor dos proprietários do imóvel, reputando como questão controversa se as edificações estão dentro da extensão da APP delimitada nos termos do artigo 62 do Lei nº 12.651/2012; nomeou perito judicial; fixou os honorários periciais (ID 268634884).

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, ORLANDO SANTOS MELO,  ADELVAN SANTOS MELO, ORIDES PEREIRA MELO,  MARINO MASSARO e NAIR DA SILVA MASSARO, a CESP, a RIO PARANÁ ENERGIA S/A, o IBAMA, o MUNICÍPIO DE SANTA ALBERTINA/SP e a UNIÃO FEDERAL apresentaram quesitos e nomearam assistente técnico (ID 268634886, ID 268634887, ID 268634891, ID 268634893, ID 268634898, ID 268634900, ID 268634901, ID 268634915).

 

ORLANDO SANTOS MELO,  ADELVAN SANTOS MELO, ORIDES PEREIRA MELO,  MARINO MASSARO e NAIR DA SILVA MASSARO recolheram os honorários periciais e apresentaram quesitos (ID 268634896).

 

Foi realizada a perícia técnica (ID 268634919).

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL requereu a realização de nova perícia técnica, tendo como parâmetro a Lei nº 4.771/65, a Resolução CONAMA nº 4/1985 e a Resolução CONAMA nº 302/2002, que delimitam a APP de 100 metros a partir do nível máximo normal de operação da UHE de Ilha Solteira (ID 263472207).

 

O IBAMA impugnou o laudo pericial (ID 268634930).

 

Em 28/6/2022, foi proferida a sentença de improcedência:

 

... Por todo o exposto, JULGO IMPROCEDENTES OS PEDIDOS (art. 487, inciso I, do CPC/15).

Sem custas e sem honorários, à luz do art. 18 da Lei nº 7.347/85.

Proceda-se à transferência do saldo remanescente do depósito judicial dos honorários periciais para a conta indicada pelo perito.

Condeno a UNIÃO ao ressarcimento dos honorários periciais adiantados, consoante tese fixada pelo STJ no julgamento do REsp nº 1.253.844/SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, submetido ao rito dos recursos repetitivos (Tema nº 510).

Interposta apelação, intime-se a parte contrária para contrarrazões. Após, remetam-se os autos ao eg. TRF/3ª Região com as cautelas de praxe e homenagens de estilo.

Sentença sujeita a reexame necessário, ex vi do art. 19 da Lei nº 4.717/65....

(ID 268634932)

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, nas razões de apelação, requer (1) preliminarmente, a reforma da decisão que determinou o artigo 62 do Lei nº 12.651/2012 como marco normativo para julgamento do presente caso e a realização de nova perícia técnica, tendo como parâmetro a Lei nº 4.771/65, a Resolução CONAMA nº 4/1985 e a Resolução CONAMA nº 302/2002, que delimitam a APP de 100 metros a partir do nível máximo normal de operação da UHE de Ilha Solteira; (2) subsidiariamente, procedência da ação com a condenação solidária dos corréus à recomposição dos danos ambientais quantificados na fase de cumprimento de sentença (ID 268634940).

 

A UNIÃO FEDERAL, nas razões de apelação, requer (1) o afastamento da condenação de ressarcimento dos honorários periciais, pois não agiu de má-fé; (2) subsidiariamente, o rateio do ressarcimento dos honorários periciais entre os litisconsortes ativos (ID 268634941).

 

O IBAMA, nas razões de apelação, requer (1) preliminarmente, a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, ante a ausência esclarecimento a sua impugnação do laudo pericial; (2) preliminarmente, a reforma da decisão que determinou o artigo 62 do Lei nº 12.651/2012 como marco normativo para julgamento do presente caso; (3) a reforma da sentença, pois a adoção generalizada do artigo 62 da Lei nº 12.651/2012 é equivocada, considerando que a sua incidência está relacionada à ocupação antrópica ocorrida até 22/7/2008 ou, subsidiariamente, até 28/5/2012; e que após esse marco temporal, onde não houve ocupação antrópica, a faixa de APP a ser considerada é a definida no licenciamento ambiental, conforme artigos 4º, III, e 5º da Lei nº 12.651/2012 (ID 268634942).

 

Apresentaram contrarrazões o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, ORLANDO SANTOS MELO,  ADELVAN SANTOS MELO, ORIDES PEREIRA MELO,  MARINO MASSARO e NAIR DA SILVA MASSARO, a CESP e a RIO PARANÁ ENERGIA S/A (ID 268634945, ID 268634946, ID 268634948, ID 268634952,).

 

Em 10/1/2023, o feito foi distribuído nessa Corte, a minha relatoria.

 

A PROCURADORIA REGIONAL DA REPÚBLICA, no parecer, opinou pelo provimento dos do reexame necessário e dos recursos do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e do IBAMA, restando prejudicado o apelo da UNIÃO FEDERAL (ID 269407952).

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


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APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0001727-52.2008.4.03.6124

RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSOM DI SALVO

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS, UNIÃO FEDERAL

APELADO: ORLANDO SANTOS MELO, MARINO MASSARO, ADELVAN SANTOS MELO, CESP COMPANHIA ENERGETICA DE SAO PAULO, MUNICIPIO DE SANTA ALBERTINA, NAIR DA SILVA MASSARO, ORIDES PEREIRA MELO, RIO PARANÁ ENERGIA S.A

Advogado do(a) APELADO: SILMARA PORTO PENARIOL - SP190786-A
Advogado do(a) APELADO: ADRIANA ASTUTO PEREIRA - SP389401-A
Advogado do(a) APELADO: SARA SUZANA APARECIDA CASTARDO DACIA - SP152464-A
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE ABBY - SP303656-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

V O T O

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOHONSOM DI SALVO, RELATOR:

 

DA MATÉRIA PRELIMINAR

 

Da nulidade da sentença por cerceamento de defesa

 

A perícia técnica deferida nos autos teve por objetivo a delimitação da APP no imóvel em questão, nos termos do disposto no artigo 62 do Lei nº 12.651/2012, e a verificação da existência de intervenção humana que impedisse a regeneração da vegetação nativa (ID 268634884).

 

E todos os quesitos apresentados pelo IBAMA foram respondidos no laudo pericial, se relativos ao objetivo da perícia. Confira-se:

 

...IBAMA 1. Primeiramente, solicita-se ao sr. perito informar quais as coordenadas geográficas do imóvel objeto da perícia. Pode apresentar um croqui básico de sua localização e dimensões? (Ver Anexo 5)

IBAMA 2. Caso o imóvel esteja situado à margem do reservatório, qual o valor da cota de operação do reservatório na data da perícia? Qual o valor da cota máxima normal de operação, da cota máxima maximorum e da cota de desapropriação deste reservatório na localização do imóvel? (Ver Anexo 5)

IBAMA 3. Considerando a definição de APP contida no art. 62 da Lei nº 12.651/2012 (Código Florestal), qual a medida exata da APP no local do imóvel (distância em metros entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum)? Média de 10,11 metros

IBAMA 4. Há ocupação ou atividade antrópica dentro da área referida pelo art. 62 (na distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum)? Favor descrever esta ocupação. E caso exista, localizar atividades em mapa. Não há

IBAMA 5. Qual a distância mais próxima entre eventual intervenção antrópica presente no imóvel objeto da perícia e a cota máxima normal de operação do reservatório? Favor descrever esta ocupação ou atividade e se é anterior ou posterior a 22/07/2008. (Prejudicado) Fora do objetivo da perícia

IBAMA 6. Considerando a área edificada sob análise, pode o sr. perito informar se ocorreu alguma ampliação ou reforma daquelas edificações e em que data teriam ocorrido? Em caso positivo, descrever, dimensionar e informar o ano em que teriam ocorrido estas alterações, mesmo que em época aproximada. (Prejudicado) Fora do objetivo da perícia

IBAMA 7. Há alguma ocupação ou atividade antrópica no limite de 30 metros contados a partir do nível máximo normal? Favor descrever esta ocupação ou atividade. Favor indicar se a ocupação em questão é anterior ou posterior a 22/07/2008. E caso exista, localizar atividades e/ou ocupação em croqui básico. (Prejudicado) Fora do objetivo da perícia

IBAMA 8. Há alguma ocupação ou atividade antrópica no limite de 100 metros contados a partir do nível máximo normal? Favor descrever esta ocupação ou atividade. Favor descrever esta ocupação ou atividade. Favor indicar se a ocupação em questão é anterior ou posterior a 22/07/2008. E caso exista localizar atividades e/ou ocupação em croqui básico. (Prejudicado) Fora do objetivo da perícia

IBAMA 9. O imóvel autuado está localizado em área rural ou em área urbana? Justificar a resposta. (Prejudicado) Fora do objetivo da perícia

IBAMA 10. A vegetação existente no imóvel objeto da perícia pode ser caracterizada como do tipo nativa ou introduzida? Quais as características da vegetação predominante no referido imóvel? Citar as principais espécies vegetais existentes. (Prejudicado) Fora do objetivo da perícia

IBAMA 11. A ocupação dada pelo proprietário ao imóvel em questão, impede a regeneração natural da vegetação? Explicar. Não há intervenção

IBAMA 12. Há alguma vegetação na faixa de 30 metros no entorno do reservatório? Em caso afirmativo, trata-se de vegetação primária ou secundária? Em caso de vegetação secundária, qual o estágio de recomposição? Favor descrever a vegetação encontrada. E caso exista localizar vegetação em croqui básico. (Prejudicado) Fora do objetivo da perícia

IBAMA 13. Há alguma vegetação na faixa de 100 metros no entorno do reservatório? Em caso afirmativo, trata-se de vegetação primária ou secundária? Em caso de vegetação secundária, qual o estágio de recomposição? Favor descrever a vegetação encontrada. (Prejudicado) Fora do objetivo da perícia

IBAMA 14. Pode o sr. perito informar se o imóvel objeto desta perícia é utilizado para residência fixa de seu proprietário ou se para atividades de lazer, mesmo que estas ocorram eventualmente? (Prejudicado) Fora do objetivo da perícia

IBAMA 15. Considerando os danos ambientais relacionados à ocupação antrópica, pode o sr. perito informar se há possibilidade de restauração da área degradada? Quais as medidas a serem tomadas para mitigação dos danos e para recomposição da APP? Descreva resumidamente (Prejudicado) (Prejudicado) Fora do objetivo da perícia...

(ID 268634919)

 

Apresentado o laudo pericial o IBAMA insurgiu-se quanto aos quesitos dados por prejudicados, requerendo que o expert se pronunciasse sobre os mesmos – o que foi refutado pelo Juízo a quo na sentença, por dizerem respeito a parâmetros diferentes ao objetivo da perícia técnica (ID 263472218; ID 268634932).

 

Confira-se:

 

...Assim, na decisão de saneamento o escopo da perícia estava plenamente delimitado, no que eventuais quesitos elaborados pelas partes deveriam guardar pertinência com o objeto da perícia, sem espaço para ampliação à revelia de decisão judicial.

Vale frisar que, contra a decisão saneadora, não houve interposição de recursos, no que a questão, ao menos na primeira instância, restou preclusa.

No entanto, tanto o MPF como o IBAMA formularam quesitos que tomavam como parâmetro diverso para delimitação da APP. Os quesitos formulados pelo MPF postulavam que o perito delimitasse a APP à luz do parâmetro da Lei nº 4.771/65, alínea “b”, e Resolução CONAMA nº 04/1985, isto é, delimitando-a a partir do parâmetro de 100 metros do nível máximo normal, ao passo que o IBAMA pretendia que fosse delimitada a como a área entre a cota máxima normal de operação e o limite da área desapropriada.

Ora, tais parâmetros foram rejeitados na decisão saneadora e, portanto, estavam foram do escopo da perícia, daí a impertinência ao caso (art. 470, inciso I, do CPC/15).

Assim, andou bem o perito ao assentar prejudicados os quesitos que extrapolavam o limite da prova pericial, nos exatos termos do art. 473, § 2º, do CPC/15, no que dispõe, dentre outros pontos, que “é vedado ao perito ultrapassar os limites de sua designação”.

Para além da questão jurídica acima retratada, há uma questão prática que impediria realização de ato pericial tão amplo como o almejado.

É que, como se sabe, tramitam na 1ª Vara Federal de Jales aproximadamente 500 ações civis públicas com o mesmo escopo relativo à delimitação de APP no entorno de diversos imóveis próximos ao reservatório de água da UHE de Ilha Solteira.

Foi necessário realizar perícia em aproximadamente 350 dessas demandas, todas a cargo de um único expert, após celebração de convênio com a UNESP. Os trabalhos periciais tiveram início em meados de 2020 e agora no início de 2022 os primeiros resultados desse esforço foram concretizados com a entregada dos laudos.

Caso fosse necessário que o perito respondesse a quesitos outros fora do escopo da perícia, notadamente aqueles que buscam infirmar o parâmetro legal adotado pelo Juízo na decisão saneadora, certamente as atividades de campo levariam tempo bem mais extenso, impedindo que a solução da lide fosse realizada em tempo adequado.

Daí que, à luz do princípio da razoável duração do processo (art. 5º, inciso LXXVIII, da Constituição de 1988), a delimitação do escopo da prova pericial buscou atender à necessidade de pronta conclusão dessas demandas, cuja tramitação iniciou-se em meados de 2008 e reclama pronta conclusão.

Por essas razões, os requerimentos formulados pelo MPF e pelo IBAMA devem ser plenamente rejeitados, eis que a perícia está em plena consonância com o escopo da prova pericial delimitada na decisão saneadora....

(ID 268634932)

 

Ora, ...não há cerceamento de defesa quando o julgador, ao constatar nos autos a existência de provas suficientes para o seu convencimento, indefere pedido de produção de prova. Cabe ao juiz decidir, motivadamente, sobre os elementos necessários à formação de seu entendimento, pois, como destinatário da prova, é livre para determinar as provas necessárias ou indeferir as inúteis ou protelatórias... (STJ - AgInt no AREsp 1682003/PR, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 08/02/2021, DJe 23/02/2021).

 

Consequentemente, não se vislumbra na espécie o cerceamento de defesa suscitado pelo IBAMA.

 

Matéria preliminar afastada.

 

DO MÉRITO

 

Dos fatos

 

Cuida-se de ação civil pública objetivando a reparação de dano ambiental em APP, definida no artigo 3º, II, da Lei nº 12.651/2012, o novo Código Florestal, como a área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.

 

Ainda de acordo com a Lei nº 12.651/2012, no seu artigo 4º, considera-se APP, em zonas rurais ou urbanas, as faixas marginais de qualquer curso d'água natural perene e intermitente; o entorno dos lagos, lagoas, reservatórios d'água artificiais, nascentes e olhos d'água; as encostas; as restingas; os manguezais; as bordas dos tabuleiros ou chapadas; o topo de morros, montes, montanhas e serras; as veredas.

 

O caso dos autos diz respeito à APP do reservatório da UHE de Ilha Solteira, em Santa Albertina/SP, que adentra o imóvel pertencente a ORLANDO SANTOS MELO, ADELVAN SANTOS MELO, ORIDES PEREIRA MELO, MARINO MASSARO e NAIR DA SILVA MASSARO, edificado no “Loteamento Jocema I”.

 

Extrai-se da matrícula nº 02.780 assentada no Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Jales/SP e da escritura pública de venda e compra lavrada pelo Registro Civil das Pessoas Naturais e Notorial da Comarca de Jales/SP, que ORLANDO SANTOS MELO, em 29/10/1993, adquiriu 1,9465% do imóvel denominado Fazenda Ponte Pensa, com área total de 5,05 hectares, em Santa Albertina/SP. E que,  em 23/10/1998, ORLANDO SANTOS MELO vendeu 2/3 ou 3,5662% desse imóvel a ADELVAN SANTOS MELO e ORIDES PEREIRA MELO e a MARINO MASSARO e NAIR DA SILVA MASSARO, casados em comunhão de bens (ID 268634662 – fls. 4/17, ID 268634663 – fls. 1/14, ID 268634728 – fls. 11/13).  

 

A área onde fica o imóvel em questão foi regularizada pelo MUNICÍPIO DE SANTA ALBERTINA/SP, conforme Lei Municipal nº 12/1985, Lei Complementar nº 31/1999 e Lei Complementar nº 39/2001 (ID 268634761 – fls. 9/12).

 

A inicial veio instruída com o procedimento administrativo nº 1.34.015.001084/2004-38, instaurado pela PROCURADORIA DA REPÚBLICA em São José do Rio Preto/SP. Consoante a documentação colacionada nesse expediente,

 

- em 26/5/2004, o IBAMA lavrou o auto de infração ambiental nº 263582/D e o termo de embargo/interdição nº 0267557/C em desfavor de ORLANDO SANTOS MELO, com aplicação de multa de R$ 5.000,00, por utilização desautorizada da APP do reservatório da UHE de Ilha Solteira, com fulcro na Lei nº 9.605/98 e na Lei nº 4.771/65 (ID 268634717 – fls. 3/4);

 

- em 12/1/2005, ORLANDO SANTOS MELO apresentou “Projeto de Recuperação Ambiental” de seu imóvel (ID 268634717 – fls. 9/20);

 

- foi lavrado o Parecer Técnico PRSP/MPF nº 131/2007, acerca dos imóveis que formam o “Loteamento Jocema I”, dentre os quais o de ORLANDO SANTOS MELO, com 2.709.86 metros quadrados, sendo 187,85 metros quadrados de área impermeabilizada (ID 268634717 – fls. 25/27, ID  268634720 – fls. 1/5);

 

- em 7/1/2006, ORLANDO SANTOS MELO declarou à Polícia Federal que adquiriu o imóvel em 1994, juntamente com ADELVAN SANTOS MELO e MARINO MASSARO, já desprovido de sua vegetação original; que ele e seus sócios firmaram contrato de concessão de uso com a CESP e edificaram uma casa a 30 metros da margem do curso d’água; que se trata de área urbana, objeto de IPTU (ID 268634728 – fls. 9/10).

 

No curso dessa ação civil pública, que integra o conjunto de 501 processos ajuizados pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL entre os anos de 2008 e 2012, objetivando a reparação de dano ambiental na APP do entorno da UHE de Ilha Solteira, a Justiça Federal celebrou um convênio com a Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP) para que as perícias técnicas fossem realizadas pelo mesmo profissional, no intuito de otimizar o tempo e o trabalho (ID 268634902, ID 268634911).

 

Foi nomeado, então o Engenheiro Civil ARTUR PANTOJA MARQUES, Professor Doutor da UNESP no campus de Ilha Solteira/SP, que realizou a perícia técnica em 28/1/2022 e entre 15 e 17/2/2022 no imóvel dos corréus, para delimitar a APP nos termos do disposto no artigo 62 do Lei nº 12.651/2012 e verificar da existência de intervenção humana impeditiva da regeneração da vegetação nativa (ID 268634902, ID 268634919).

 

Da delimitação da APP

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, com base no princípio do tempus regit actum, defende que a extensão da APP no entorno do reservatório da UHE de Ilha Solteira a ser considerada nesses autos é de 100 metros, a partir do seu nível máximo normal, em conformidade com a Lei 4.771/65, que encerrava o antigo Código Florestal, a Resolução CONAMA nº 4/1985 e a Resolução CONAMA nº 302/2002:

 

Lei 4.771/65

Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:

...

b) ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d'água naturais ou artificiais;

 

Resolução CONAMA nº 4/1985

Art. 3º. São Reservas Ecológicas:

...

b. as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:

I. ao longo dos rios ou de outro qualquer corpo d'água, em faixa marginal além do leito maior sazonal, medida horizontalmente, cuja largura mínima será:

...

- de 100 (cem) metros para todos os cursos d'água cuja largura seja superior à 200 (duzentos) metros

 

Resolução CONAMA nº 302/2002

Art 3º Constitui Área de Preservação Permanente a área com largura mínima, em projeção horizontal, no entorno dos reservatórios artificiais, medida a partir do nível máximo normal de:

I - trinta metros para os reservatórios artificiais situados em áreas urbanas consolidadas e cem metros para áreas rurais;

...

§ 1º Os limites da Área de Preservação Permanente, previstos no inciso I, poderão ser ampliados ou reduzidos, observando-se o patamar mínimo de trinta metros, conforme estabelecido no licenciamento ambiental e no plano de recursos hídricos da bacia onde o reservatório se insere, se houver.

 

Durante a tramitação dessa ação civil pública foi promulgada a Lei nº 12.651/2012, que traz o novo Código Florestal, alterando substancialmente a legislação afeta ao tema:

 

Lei nº 12.651/2012

Art. 4º Considera-se Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei:

...

III - as áreas no entorno dos reservatórios d’água artificiais, decorrentes de barramento ou represamento de cursos d’água naturais, na faixa definida na licença ambiental do empreendimento;                   (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012). 

...

Art. 5º Na implantação de reservatório d’água artificial destinado a geração de energia ou abastecimento público, é obrigatória a aquisição, desapropriação ou instituição de servidão administrativa pelo empreendedor das Áreas de Preservação Permanente criadas em seu entorno, conforme estabelecido no licenciamento ambiental, observando-se a faixa mínima de 30 (trinta) metros e máxima de 100 (cem) metros em área rural, e a faixa mínima de 15 (quinze) metros e máxima de 30 (trinta) metros em área urbana.     (Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012). 

...

Art. 62. Para os reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, a faixa da Área de Preservação Permanente será a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum.    

 

Conforme relatado, o STF reconheceu a constitucionalidade desses dispositivos legais no julgamento a ação declaratória de constitucionalidade nº 42, e ainda afastou a aplicação automática do princípio da vedação do retrocesso para anular opções validamente eleitas pelo legislador. Confira-se os seguintes trechos do v. acórdão:

 

DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO AMBIENTAL. ART. 225 DA CONSTITUIÇÃO. DEVER DE PROTEÇÃO AMBIENTAL. NECESSIDADE DE COMPATIBILIZAÇÃO COM OUTROS VETORES CONSTITUCIONAIS DE IGUAL HIERARQUIA. ARTIGOS 1º, IV; 3º, II E III; 5º, CAPUT E XXII; 170, CAPUT E INCISOS II, V, VII E VIII, DA CRFB. DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL. JUSTIÇA INTERGERACIONAL. ALOCAÇÃO DE RECURSOS PARA ATENDER AS NECESSIDADES DA GERAÇÃO ATUAL. ESCOLHA POLÍTICA. CONTROLE JUDICIAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS. IMPOSSIBILIDADE DE VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DEMOCRÁTICO. EXAME DE RACIONALIDADE ESTREITA. RESPEITO AOS CRITÉRIOS DE ANÁLISE DECISÓRIA EMPREGADOS PELO FORMADOR DE POLÍTICAS PÚBLICAS. INVIABILIDADE DE ALEGAÇÃO DE VEDAÇÃO AO RETROCESSO. NOVO CÓDIGO FLORESTAL. AÇÕES DIRETAS DE INCONSTITUCIONALIDADE E AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE JULGADAS PARCIALMENTE PROCEDENTES.

...

15. A preservação dos recursos naturais para as gerações futuras não pode significar a ausência completa de impacto do homem na natureza, consideradas as carências materiais da geração atual e também a necessidade de gerar desenvolvimento econômico suficiente para assegurar uma travessia confortável para os nossos descendentes.

...

19. O Princípio da vedação do retrocesso não se sobrepõe ao princípio democrático no afã de transferir ao Judiciário funções inerentes aos Poderes Legislativo e Executivo, nem justifica afastar arranjos legais mais eficientes para o desenvolvimento sustentável do país como um todo.

20. A propósito, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal demonstra deferência judicial ao planejamento estruturado pelos demais Poderes no que tange às políticas públicas ambientais. No julgamento do Recurso Extraordinário nº 586.224/SP (Rel. ministro Luiz Fux, julgamento em 05/03/2016), apreciou-se o conflito entre lei municipal proibitiva da técnica de queima da palha da cana-de-açúcar e a lei estadual definidora de uma superação progressiva e escalonada da referida técnica. Decidiu a Corte que a lei do ente menor, apesar de conferir aparentemente atendimento mais intenso e imediato ao interesse ecológico de proibir queimadas, deveria ceder ante a norma que estipulou um cronograma para adaptação do cultivo da cana-de-açúcar a métodos sem a utilização do fogo. Dentre os fundamentos utilizados, destacou-se a necessidade de acomodar, na formulação da política pública, outros interesses igualmente legítimos, como os efeitos sobre o mercado de trabalho e a impossibilidade do manejo de máquinas diante da existência de áreas cultiváveis acidentadas. Afastou-se, assim, a tese de que a norma mais favorável ao meio ambiente deve sempre prevalecer (in dubio pro natura), reconhecendo-se a possibilidade de o regulador distribuir os recursos escassos com vistas à satisfação de outros interesses legítimos, mesmo que não promova os interesses ambientais no máximo patamar possível. Idêntica lição deve ser transportada para o presente julgamento, a fim de que seja refutada a aplicação automática da tese de vedação ao retrocesso para anular opções validamente eleitas pelo legislador.

21. O Código Florestal ostenta legitimidade institucional e democrática, sendo certo que a audiência pública realizada nas presentes ações apurou que as discussões para a aprovação da Lei questionada se estenderam por mais de dez anos no Congresso Nacional. Destarte, no âmbito do Parlamento, mais de 70 (setenta) audiências públicas foram promovidas com o intuito de qualificar o debate social em torno das principais modificações relativas ao marco regulatório da proteção da flora e da vegetação nativa no Brasil. Consectariamente, além da discricionariedade epistêmica e hermenêutica garantida ao Legislativo pela Constituição, também militam pela autocontenção do Judiciário no caso em tela a transparência e a extensão do processo legislativo desenvolvido, que conferem legitimidade adicional ao produto da atividade do Congresso Nacional.

22. Apreciação pormenorizada das impugnações aos dispositivos do novo Código Florestal (Lei nº 12.651/2012):

...

(e) Art. 4º, inciso III e §§ 1º e 4º (Áreas de preservação permanente no entorno de reservatórios artificiais que não decorram de barramento de cursos dágua naturais e de reservatórios naturais ou artificiais com superfície de até um hectare): As alegações dos requerentes sugerem a falsa ideia de que o novo Código Florestal teria extinto as APPs no entorno dos reservatórios dágua artificiais, decorrentes de barramento ou represamento de cursos dágua naturais. No entanto, esses espaços especialmente protegidos continuam a existir, tendo a lei delegado ao órgão que promover a licença ambiental do empreendimento a tarefa de definir a extensão da APP, consoante as especificidades do caso concreto. Essa opção legal evita os inconvenientes da solução one size fits all e permite a adequação da norma protetiva ao caso concreto. Por sua vez, a pretensão de constitucionalização da metragem de Área de Proteção Permanente estabelecida na lei revogada ofende o princípio democrático e a faculdade conferida ao legislador pelo art. 225, § 1º, III, da Constituição, segundo o qual compete à lei alterar, ou até mesmo suprimir, espaços territoriais especialmente protegidos. Pensamento diverso transferiria ao Judiciário o poder de formular políticas públicas no campo ambiental. Conclusão : Declaração de constitucionalidade do art. 4º, III e §§ 1º e 4º, do novo Código Florestal;

...

(h) Artigos 5º, caput e §§ 1º e 2º, e 62 (Redução da largura mínima da APP no entorno de reservatórios dágua artificiais implantados para abastecimento público e geração de energia): O estabelecimento legal de metragem máxima para áreas de proteção permanente no entorno de reservatórios dágua artificiais constitui legítima opção de política pública ante a necessidade de compatibilizar a proteção ambiental com a produtividade das propriedades contíguas, em atenção a imperativos de desenvolvimento nacional e eventualmente da própria prestação do serviço público de abastecimento ou geração de energia (art. 175 da CF). Por sua vez, a definição de dimensões diferenciadas da APP em relação a reservatórios registrados ou contratados no período anterior à MP nº 2166-67/2001 se enquadra na liberdade do legislador para adaptar a necessidade de proteção ambiental às particularidades de cada situação, em atenção ao poder que lhe confere a Constituição para alterar ou suprimir espaços territoriais especialmente protegidos (art. 225, § 1º, III). Trata-se da fixação de uma referência cronológica básica que serve de parâmetro para estabilizar expectativas quanto ao cumprimento das obrigações ambientais exigíveis em consonância com o tempo de implantação do empreendimento; Conclusão: Declaração de constitucionalidade dos artigos 5º, caput e §§ 1º e 2º, e 62, do novo Código Florestal;

...

23. Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 4901, 4902, 4903 e 4937 e Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 42 julgadas parcialmente procedentes.

(STF - ADC 42, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 28/02/2018, publicado em 13/08/2019)

 

O Juiz de origem concluiu que o resultado do julgamento da ação declaratória de constitucionalidade nº 42 pelo STF é vinculante e cogente, aplicando-o (ID 268634884).

 

E de fato é, como se depreende do recente julgamento da reclamação nº 38.764 pelo STF, onde foi cassada a decisão proferida em sede de apelação por esse TRF3R, nos autos da ação civil pública nº 0002737-88.2008.4.03.6106, que privilegiou o princípio do tempus regit actum para afastar a incidência do artigo 62 da Lei nº 12.651/2012:

 

...Passo à análise da reclamação.

O cabimento da reclamação, instituto jurídico de natureza constitucional, deve ser aferido nos estritos limites das normas de regência, que somente a concebem para preservação da competência do Tribunal e para garantia da autoridade de suas decisões (art. 102, I, l, CF), bem como contra atos que contrariem ou indevidamente apliquem Súmula Vinculante (art. 103-A, § 3º, da CF).

Na espécie, a autoridade reclamada assim apreciou a matéria (eDOC 29, p. 10/11):

“A ilegalidade da ocupação desse imóvel, do ponto de vista ambiental, vem sendo apontada, discutida e apurada desde 12/04/2005, data em que o réu José Cláudio Alvarez foi autuado nos moldes do Auto de Infração Ambiental/Interdição nº 263662 (fl. 36/37). Portanto, na vigência do antigo código, Lei nº 4.771, de 1965.

Diante do fato de existirem, no curso do processo de apuração, três leis tratando dessa matéria (4.771, de 1965 - 7.803, de 1989 e 12651, de 2012), por razões de segurança jurídica, deve-se aplicar o princípio do tempus regit actum, até porque, como já decidiu o C. STJ, o novo Código Florestal tem eficácia ex nunc e não alcança fatos pretéritos quando isso implicar a redução do patamar de proteção do meio ambiente:

...(AgRg no REsp 1434797 / PRAGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL2013/0395471-7 - Ministro HUMBERTO MARTINS - SEGUNDA TURMA - Julgamento em 17/05/2016 - Publicado no DJe 07/06/2016)

Nesse mesmo sentido o entendimento deste Tribunal Regional:

...”.

Nesta reclamação, sustenta-se que os acórdãos prolatados pela autoridade reclamada teriam “deliberadamente” deixado de aplicar a norma do art. 62 da Lei 12.651/2012. Este artigo modificou os critérios de determinação das APPs em reservatórios artificiais para geração de energia elétrica e ou abastecimento de água que foram registrados ou, simplesmente, tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001. Os referidos acórdãos teriam deixado de observar, assim, as decisões desta Corte na ADI 4903 e na ADC 42.

Julgadas em conjunto, as decisões apontadas como paradigmas trataram, nas palavras de seu e. Relator, Ministro Luiz Fux, Relator, do exame da (in)constitucionalidade de “praticamente todo o Código Florestal”.

O ponto em questão, qual seja, a possibilidade de a norma do art. 62 do Código Florestal retroagir para disciplinar os reservatórios artificiais de água destinados à geração de energia ou abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, foi objeto de debate por ocasião do julgamento dos processos paradigmas, conforme destacado pelo Ministro Dias Toffoli, ao deferir a medida liminar (eDOC 33, p. 6):

“No ponto, as razões da Procuradoria-Geral da República não foram acolhidas pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal que, “por unanimidade, julgou constitucional o art. 62 do Código Florestal”.

Na oportunidade do julgamento do leading case, o Min. Luiz Fux, Relator, assim consignou:

...

Na ocasião, acompanhei a conclusão do e. Relator, asseverando que nos termos do art. 225, § 1º, III, da Constituição Federal, permite-se que lei altere ou suprima os espaços territoriais especialmente protegidos, de modo que a fixação, por meio de edição de lei, de metragem máxima para APPs no entorno de reservatórios d´água artificiais consubstancia alternativa de política pública.

Esse também foi o meu entendimento quanto à alegação de que o dispositivo em comento (art. 62 da 12.651/2012) permitiria a descaracterização das APPs no entorno de reservatórios artificiais, pelo que consubstanciava retrocesso ambiental, uma vez que o referido artigo determina que a faixa da Área de Preservação Permanente será a distância entre o nível máximo operativo norma e a cota máxima maximorum.

Por fim, destaco o seguinte trecho da manifestação do Procurador-Geral da República, que bem direciona o deslinde da questão veiculada nesta reclamação (eDOC 39, p. 11-13):

“A manutenção do posicionamento adotado pela Corte Regional (e pelo Superior Tribunal de Justiça em vários julgados posteriores ao julgamento proferido na Suprema Corte), no sentido da aplicação do princípio tempus regit actum e do postulado da vedação do retrocesso em matéria ambiental, leva a um sério risco de perpetuação da judicialização do tema da aplicabilidade do Novo Código Florestal, gerando insegurança jurídica. Tendo sido já discutida a controvérsia pela Suprema Corte em sede de controle concentrado de constitucionalidade, a discussão sobre a validade do dispositivo legal em questão está superada e sua aplicação ao caso é obrigatória.

A decisão em sede de controle de constitucionalidade possui efeito erga omnes, vinculante e retroativo. Como leciona o Ministro Luís Roberto Barroso, “a decisão que acolhe o pedido tem, como a designação da ação sugere, natureza declaratória. Consequentemente, não inova ela na ordem jurídica, limitando-se a estabelecer certeza jurídica acerca de situação preexistente. É possível afirmar que os efeitos da decisão se produzem ex tunc no sentido de que a lei será tida como constitucional desde o seu nascimento”.

Essencial destacar que não houve modulação de efeitos do julgamento proferido pela Suprema Corte, o que permitiria, caso assim pretendesse o Tribunal, restringir os efeitos da decisão, excluindo de seu alcance determinadas situações ou impedindo sua retroação em específicas hipóteses. Não foi essa, todavia, a intenção do STF, de forma que aplicável, no caso, a regra geral da eficácia ex tunc, abrangendo-se assim intervenções ambientais anteriores ao julgado.

Nas palavras do reclamante, “uma vez declarada a constitucionalidade da referida norma, obrigatório reconhecer a sua validade desde o início de sua vigência, ou seja, desde 25 de maio de 2012. Ressalte-se que a referida norma tem validade não apenas após a decisão do C. STF, mas sim desde o termo legal de vigência fixado em seu texto, dado o conteúdo declaratório da decisão que afirmou a constitucionalidade dos dispositivos do Novo Código Florestal impugnados”.

Com efeito, após o pronunciamento definitivo da Suprema Corte sobre o tema, não é cabível negativa de aplicação do art. 62 da Lei 12.651/2012 pelos órgãos do Poder Judiciário ou pela administração pública, tendo em vista o disposto no art. 102, § 2º, da Constituição Federal, segundo o qual “as decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal”. “

Contata-se, assim, que o acórdão reclamado, ao afastar a aplicação do art. 62 da 12.651/2012, deixou de observar a autoridade das decisões desta Corte proferidas em sede de controle concentrado.

Ante o exposto, nos termos do arts. 21, § 1º, e 161, parágrafo único, do RISTF, julgo procedente a presente reclamação, para cassar a decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que apreciou a Apelação Cível nº 0002737-88.2008.4.03.6106/SP, e determinar que nova decisão seja proferida com a observância do que decidido por esta Corte na ADI 4903 e na ADC 42...

(STF - Rcl 38764/SP, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, julgamento em 28/05/2020, publicado em 17/06/2020)

 

Nesse contexto, o Juízo a quo acertadamente rejeitou a aplicação do princípio do tempus regit actum defendido pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e determinou que a extensão da APP no entorno do reservatório da UHE de Ilha Solteira a ser considerada nesses autos é a prevista no artigo 62 da Lei nº 12.651/2012.

 

No mesmo sentido são os recentes julgados desse TRF3R:

 

PROCESSUAL CIVIL. ANÁLISE DA LEGITIMIDADE. TEORIA DA ASSERÇÃO. ADMINISTRATIVO. MULTA AMBIENTAL. DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. DANO AMBIENTAL. EDIFICAÇÃO REALIZADA EM APP. CRITÉRIO CONSTANTE NO ART. 62, DA LEI Nº 12.651/12. RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA SUBJETIVA. CONFIGURAÇÃO NO CASO DOS AUTOS. SANÇÃO APLICADA NO PATAMAR MÍNIMO. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE DA SANÇÃO. RECURSO DE APELAÇÃO DESPROVIDO.

...

6. Utilizando-se dos parâmetros do julgado proferido pela Segunda Seção deste e. Tribunal Regional Federal (TRF 3ª Região, 2ª Seção, AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 5020192-48.2017.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal ANTONIO CARLOS CEDENHO, julgado em 06/05/2021, DJEN DATA: 10/05/2021), bem como do quanto reconhecido na ADC nº 42, do a. Supremo Tribunal Federal, o artigo 62, da Lei nº 12.651/12 tem aplicação retroativa.

7. Indo adiante, o nível normal de operação é o de 446,3m e o nível máximo maximorum é de 447,36m. Destarte, utilizando-se dos critérios constantes na legislação, a área de proteção permanente confirmar-se-ia neste pouco mais de 1,0m (um metro).

8. Ocorre que, nos termos do levantamento planialtimétrico constante no id nº 90434789, f. 39, ao menos a rampa de concreto fora construída na área de preservação permanente (entre o nível de operação e o nível máximo maximorum).

9. Sendo assim, dúvida não remanesce que a área de preservação permanente sofrera infração administrativa, nos termos do artigo 70, da Lei nº 9.605/98, na modalidade recuperação do meio ambiente.

10. Cumpre analisar, neste momento, a responsabilidade administrativa e, neste desiderato, a jurisprudência do c. Superior Tribunal de Justiça é devidamente firme em reconhecer que esta apenas se configura em caráter subjetivo, não se confundindo com a responsabilidade civil, de natureza objetiva e propter rem.

11. Neste diapasão, o próprio apelante apresentou manifestação perante o órgão ambiental, alegando que realizara as edificações na área (id nº 90434790, f. 77), o que denota a livre realização da conduta danosa ao meio ambiente, tornando patente a necessidade da manutenção da autuação.

12. Registre-se, por oportuno, que a multa aplicada ocorrera no valor mínimo à época, o que torna proporcional e razoável a sanção que incidira à espécie, em cotejo com o dano experimentado.

13. Recurso de apelação desprovido.

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0030711-17.2015.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal NELTON AGNALDO MORAES DOS SANTOS, julgado em 11/11/2021, DJEN DATA: 16/11/2021)

 

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. PRELIMINAR DE DECADÊNCIA AFASTADA. MÉRITO. JULGAMENTO ANTECIPADO. DANO AMBIENTAL. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. UHE ÁGUA VERMELHA. APLICAÇÃO DO CÓDIGO NOVO CÓDIGO FLORESTAL. ARTIGO 62. CONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO STF. ADI 4.903 E ADC 42. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. RESCISÓRIA PROCEDENTE.

...

5. Quanto ao mérito, na ADI 4.903/DF, assim como na ADC 42, restou consignada a constitucionalidade do artigo 62 do Novo Código Florestal. Não é demais ressaltar que o Ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, debruçando-se não só sobre o tema, mas especificamente sobre a UHE Água Vermelha, nos autos da Reclamação Rcl 38.764/SP distribuída à Relatoria do Min. Edson Fachin, decidiu que esta Corte Federal, nos autos da Apelação Cível nº 0002737-88.2008.4.03.6106/SP (caso análogo ao presente), desrespeitou a autoridade do Supremo Tribunal Federal e a eficácia do julgado na ADI 4.903/DF e na ADC nº 42/DF.

6. Assim, resta indene de dúvida que o artigo 62 do Novo Código Florestal tem aplicação pretérita já que o dispositivo, cuja constitucionalidade foi declarada, em sua literalidade, define novos parâmetros às áreas de preservação permanente “Para os reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à MP nº 2.166-67 de 2001”, o que e o caso da UHE Água Vermelha.

7. Realizado este apanhado, há de ser reconhecida a violação à norma jurídica, especificamente o artigo 62 do Novo Código Florestal, pelo acórdão rescindendo, de modo que a decisão combatida comporta rescisão.

8. Com efeito, embora o acórdão rescindendo tenha fixado como área de preservação permanente a extensão de 100 metros no entorno da UHE Água Vermelha, aplicado o artigo 62 do Novo Código Florestal ao contrato de concessão em espécie, firmado em 1999, a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum da UHE de Água Vermelha coincide no valor de 383,3 m, o que culmina em uma área de preservação permanente nula ou igual a zero.

9. Em decorrência, havendo norma legal declarada constitucional e aplicável ao caso vertente, afasta-se a pretensa aplicação, pela defesa, da Resolução CONAMA 302/2004, inexistindo, via de consequência, dano ambiental a ser reconhecido.

10. Agravo interno prejudicado, preliminar arguida afastada. No mérito, julgada procedente a ação rescisória.

(TRF 3ª Região, 2ª Seção, AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 5020192-48.2017.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal ANTONIO CARLOS CEDENHO, julgado em 06/05/2021, DJEN DATA: 10/05/2021)

 

APELAÇÃO. REMESSA NECESSÁRIA. AGRAVO RETIDO NÃO CONHECIDO. AMBIENTAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PRELIMINARES E PREJUDICIAIS DE MÉRITO AFASTADAS. INTERVENÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. RESERVATÓRIO ARTIFICIAL. USINA DE MARIMBONDO. RECUPERAÇÃO DA ÁREA. NECESSIDADE. IBAMA. REALOCAÇÃO AO POLO ATIVO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.

...

3. Cinge-se a questão em averiguar a responsabilidade dos apelantes e do proprietário do imóvel pelo levantamento de edificações em área de preservação permanente, situada às margens do Reservatório da Usina Hidrelétrica de Marimbondo, no município de Guaraci/SP.

3. A Lei 12.651/2012 (novo Código Florestal) descreve hipóteses objetivas de Áreas de Preservação Permanente - APP nas quais, em regra, é vedada qualquer intervenção antrópica, dentre elas, os entornos de reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização firmados anteriormente à Medida Provisória 2.166-67, de 24/10/2001.

4. Nesses casos, a faixa da APP será a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum, nos termos do art. 62 do novo Código Florestal.

5. No caso do imóvel do recorrente, localizado na beira da UHE de Marimbondo, a APP corresponde à área inundável do reservatório, ou seja, aquele nível limite suportado pelo reservatório em casos excepcionais, além do nível máximo normal de operação.

6. Salienta-se que o E. Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADIN 4.903, em 13/08/2019, declarou a constitucionalidade do art. 62 do novo Código Florestal, o que deverá ser observado pelos demais órgãos judicantes em razão do efeito erga omnes e vinculante próprios de decisórios dessa natureza.

7. De se ter presente, ainda, que o Pretório Excelso, no julgamento da Reclamação 38.764, em 17/06/2020, cassou acórdão deste C. TRF da 3ª Região proferido no processo 0002737-88.2008.4.03.6106, o qual havia deixado de aplicar a norma do art. 62 da Lei 12.651/2012, ao fundamento de que esse dispositivo não alcançaria fatos anteriores à sua vigência.

8. Naquela oportunidade, fixou o E. STF que, ao menos no que concerne à incidência do art. 62 do novo Código Florestal, não têm aplicação os preceitos da vedação ao retrocesso ou do “tempus regit actum”, o que impõe considerar que todos os reservatórios artificiais de água para geração de energia registrados ou concedidos anteriormente à Medida Provisória 2.166-67, de 24/08/2001 - como é o caso da Usina de Marimbondo, em operação comercial desde 1975 – possuem, atualmente, APP fixada nos termos daquele dispositivo, sendo desimportante a existência de anteriores normas, ainda que de cunho mais protetivo.

9. Neste caso, conforme atestado por farta prova documental, as construções levadas à cabo no local dos fatos – alambrado e portão guarnecidos por baldrames e colunas de alvenaria, sem prejuízo da constatação de outras em liquidação e cumprimento de sentença - efetivamente invadiram área de preservação permanente, uma vez que não observaram os limites da área inundável do reservatório artificial.

10. O dano ambiental efetivamente ocorreu, sendo inerente à desautorizada intervenção no local, que sabidamente gera supressão de vegetação nativa, resíduos e efluentes domésticos, e portanto, a reparação da área danificada é determinação constitucional nos termos do § 3º do art. 225 da Carta Magna e deve ser promovida pelos seus causadores, razão pela qual a discussão sobre a existência ou não de excludente de ilicitude não tem relevância, em face da natureza objetiva da responsabilidade por dano ambiental, refletida na teoria do risco integral. (REsp 1374284/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 27/08/2014 pela sistemática dos recursos repetitivos).

...

22. Não se conhece do agravo retido. Nega-se provimento à remessa necessária e às apelações de Furnas Centrais Elétricas S/A e do município de Guaraci/SP. Dá-se provimento ao apelo do IBAMA.

(TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0011307-97.2007.4.03.6106, Rel. Desembargador Federal DIVA PRESTES MARCONDES MALERBI, julgado em 30/04/2021, Intimação via sistema DATA: 04/05/2021)

                                                                                

Com efeito, a concessão da UHE de Ilha Solteira foi outorgada à CESP, à época sob a denominação Centrais Elétricas de São Paulo S/A, por meio do Decreto nº 67.066, de 17/8/1970:

 

DECRETO N° 67.066, DE 17 DE AGOSTO DE 1970

Dá nova redação ao artigo 1° do Decreto n° 55.513, de 11 de janeiro de 1965.

O Presidente da República, usando da atribuição que lhe confere o artigo 81, item III, da Constituição, e nos termos dos artigos 140 e 150 do Código de Águas,

Considerando que o artigo 1º do Decreto nº 55.513, de 11 de janeiro de 1965 outorgou à Centrais Elétricas de Urubupungá S.A. concessão para o aproveitamento progressivo do trecho do rio Paraná, na divisa dos Estados de Mato Grosso e São Paulo, compreendido entre a Ponte Francisco Sá, da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil e a confluência dos seus formadores principais, rios Paranaíba e Grande;

Considerando que a Centrais Elétricas de São Paulo S.A., sucessora da Centrais Elétricas de Urubupungá S.A., apresentou documentação complementar contendo as modificações introduzidas no projeto da Usina Hidrelétrica de Jupiá, no rio Paraná, na divisa dos Estados de Mato Grosso e São Paulo.

Considerando que a Centrais Elétricas de São Paulo S.A. solicitou, através processo MME 709.826-69, seja dada nova redação ao art. 1º do Decreto nº 55.513, de 11 de Janeiro de 1965,

decreta:

Art. 1º O artigo 1º do Decreto número 55.513, de 11 de Janeiro de 1965 passa a ter a seguinte redação:

"Art. 1º É outorgada à Centrais Elétricas de São Paulo S.A. concessão para o aproveitamento progressivo da energia hidráulica dos seguintes trechos e cursos dágua:

I - Rio Paraná - Trecho na divisa dos Estados de São Paulo e Mato Grosso, compreendido entre a Ponte Francisco Sá, da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil e a confluência dos seus formadores principais, rios Paranaíba e Grande.

II - Rio Paranaíba - Trecho na divisa dos Estados de Mato Grosso e Goiás  com Estado de Minas Gerais, compreendido entre a sua confluência no rio Paraná e o ponto situado 10 km (dez quilômetros) a jusante da Ponte da Estrada de Rodagem BR - 34 que liga os Estados de Minas Gerais e Goiás.

III - Rio Grande - Trecho na divisa dos Estados de Minas Gerais e São Paulo, compreendido entre sua confluência no rio Paraná e o ponto situado 1 km (um quilômetro) a jusante do Salto da Água Vermelha.

IV - Afluentes do rio Paraná, trechos a montante das respectivas confluências com o mesmo:

a) rio Tietê: 50 km (cinquenta quilômetros);

b) rio São José dos Dourados; 60 km (sessenta quilômetros);

c) rio Sucuriú: 100 km (cem quilômetros);

d) rio Pântano: toda sua extensão;

e) rio Quitéria: toda sua extensão.

Art. 2º O presente Decreto entrará em vigor na data da sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

Brasília, 17 de agosto de 1970; 149º da Independência e 82º da República.

EMÍLIO G. MÉDICI

 

E a concessão foi prorrogada por mais 20 anos, de 8/7/1995 a 7/7/2015, pela Portaria MME nº 289/2004, que antecedeu o Contrato de Concessão nº 003/2004/ANEEL/CESP (processo nº 48500.005033/00-41):

 

PORTARIA No 289, DE 11 DE NOVEMBRO DE 2004.

A MINISTRA DE ESTADO DE MINAS E ENERGIA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 3o do Decreto no 1.717, de 24 de novembro de 1995, nos termos do art. 19 da Lei nº 9.074, de 7 de julho de 1995, e tendo em vista o que consta dos Processos nº 48500.005033/00-41, 48100.000118/96-05, 48100.000114/96-46, 48100.000113/96-83, 48100.000111/96-58 e 27100.001961/88-93, resolve:

Art. 1º Prorrogar, pelo prazo de vinte anos, contado a partir de 8 de julho de 1995, as concessões para exploração das Usinas Hidrelétricas - UHE, a seguir especificadas, de que é titular a Companhia Energética de São Paulo - CESP:

I - UHE Ilha Solteira, nos Municípios de Ilha Solteira e Selvíria, Estado de São Paulo; e

II - UHE Jupiá (Eng o Souza Dias), nos Municípios de Castilho e Três Lagoas, Estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul, respectivamente.

Art. 2º Prorrogar, pelo prazo de vinte anos, as concessões para exploração das Usinas Hidrelétricas - UHE, a seguir especificadas, de que é titular a Companhia Energética de São Paulo - CESP:

I - UHE Jaguari, no Município de São José dos Campos, Estado de São Paulo, contado a partir de 21 de maio de 2000; e

II - UHE Paraibuna (Paraibuna/Paraitinga), no Município de Paraibuna, Estado de São Paulo, contado a partir de 10 de março de 2001.

Art. 3º A prorrogação dos prazos das concessões de que trata esta Portaria somente terá eficácia com a assinatura do respectivo contrato de concessão entre a Companhia Energética de São Paulo - CESP e o Poder Concedente, que será efetuado por intermédio da Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL, nos termos da delegação de competência constante do Decreto no 4.932, de 23 de dezembro de 2003.

Parágrafo único. O Contrato de Concessão observará as normas e condições estabelecidas pela legislação pertinente, bem como aquelas previstas na Lei n o 10.848, de 15 de março de 2004, e seus respectivos regulamentos.

Art. 4º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.

DILMA ROUSSEFF

 

Ou seja, a concessão da UHE de Ilha Solteira foi outorgada à CESP indubitavelmente antes da Medida Provisória nº 2.166-67/2001, referida no artigo 62 da Lei nº 12.651/2012.

 

Prosseguindo, o IBAMA alega que o artigo 62 da Lei nº 12.651/2012 só seria aplicável em áreas consolidadas – isto é, com ocupação antrópica – até 22/7/2008, conforme previsto no caput do artigo 61-A do mesmo diploma legal. Após esse marco temporal, onde não houve ocupação antrópica, a faixa de APP a ser considerada é a definida no licenciamento ambiental do empreendimento, ao teor dos artigos 4º, III, e 5º da Lei nº 12.651/2012, ressaltando que interpretação diversa, de cunho generalista, equivaleria a um salvo-conduto para novas invasões/edificações em APP de reservatórios artificiais.

 

Entretanto, na letra do novo Código Florestal, inexiste indicativo de que o referido marco temporal é extensível ao artigo 62. O que se depreende do mesmo, inserto na Seção II – Das Áreas Consolidadas em Área de Preservação Permanente, dentro do Capítulo XIII – Disposições Transitórias, é que diz respeito à APP em área consolidada, onde já existe ocupação/atividade antrópica estabelecida.

 

E esse é justamente o caso dessa ação civil pública, pois ORLANDO SANTOS MELO adquiriu o imóvel em 29/10/1993, em cadeia sucessória, após o desmembrado da Fazenda Ponte Pensa (ID 268634662 – fls. 4/17, ID 268634663 – fls. 1/14, ID 268634728 – fls. 11/13).  

 

Acrescente-se que o Juízo a quo, ao afastar a tramitação conjunta das 501 ações civis públicas que objetivam a reparação de dano ambiental na APP do entorno da UHE de Ilha Solteira, privilegiou o exame individualizado de cada uma das situações postas, o que – per si – afasta o risco de “generalização” (ID 268634884).

 

Sem reparo, portanto, a sentença no ponto em que determina que a extensão da APP no entorno do reservatório da UHE de Ilha Solteira a ser considerada nesses autos é a prevista no artigo 62 da Lei nº 12.651/2012.

 

Da inexistência de dano ambiental

 

A perícia técnica verificou, a partir de equipamentos topográficos, geodésicos e aerofotogramétricos, que a APP do reservatório da UHE de Ilha Solteira, nos termos do artigo 62 da Lei nº 12.651/2012, compreende uma faixa entre 328 e 329 metros, dentro da cota de desapropriação:

 

...O reservatório da UHE de Ilha Solteira apresenta como níveis de armazenamento (acima do nível do mar) as cotas, NMO - Nível Máximo Operativo Normal igual a 328,00 metros e CMM – Cota Máxima Maximorum igual a 329,00 metros. A cota de desapropriação apresenta valores entre 330,00 metros e 335,00 metros. A APP do reservatório da UHE de Ilha Solteira, considerando o Art. 62 do Código Florestal em vigor (Lei 12.651/2012) apresenta, sua área definida entre esses dois níveis NMO e a CMM, ou seja, na faixa entre 328,00 metros e 329,00 metros, portanto, dentro da faixa de desapropriação...

(ID 268634919)

 

E que no imóvel dos corréus inexiste intervenção humana que impeça a regeneração da vegetação nativa na APP (ID 268634919).

 

A sentença de improcedência, portanto, não merece qualquer reparo.

 

Dos honorários periciais

 

Mantida a condenação da UNIÃO FEDERAL ao ressarcimento dos honorários periciais adiantados pelos corréus, conforme Tema 510 do STJ:

 

PROCESSUAL CIVIL. HONORÁRIOS PERICIAIS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REQUERIMENTO MINISTERIAL. FAZENDA PÚBLICA. RESPONSABILIDADE.

1. A Primeira Seção do STJ, sob o rito do art. 543-C do CPC/1973, consolidou o entendimento de que, em se tratando de ação civil pública proposta pelo Ministério Público, caberá à Fazenda Pública ao qual se acha vinculado o Parquet arcar com as despesas das perícias requeridas pelo MP, ainda que não seja parte no processo.

2. Entendimento aplicável mesmo após a entrada em vigor do CPC/2015, visto que as disposições contidas na Lei n. 7.347/1985 são especiais em relação às normas do ordenamento processual civil, subsistindo a orientação firmada no julgamento do REsp 1.253.844/SC.

3. Agravo interno desprovido.

(STJ - AgInt no RMS n. 66.296/RJ, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 29/8/2022, DJe de 23/9/2022)

 

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ADIANTAMENTO DE HONORÁRIOS PERICIAIS. NÃO CABIMENTO. INCIDÊNCIA PLENA DO ART. 18 DA LEI N. 7.347/85. ENCARGO TRANSFERIDO À FAZENDA PÚBLICA. APLICAÇÃO DA SÚMULA 232/STJ, POR ANALOGIA.

1. Trata-se de recurso especial em que se discute a necessidade de adiantamento, pelo Ministério Público, de honorários devidos a perito em Ação Civil Pública.

2. O art. 18 da Lei n. 7.347/85, ao contrário do que afirma o art. 19 do CPC, explica que na ação civil pública não haverá qualquer adiantamento de despesas, tratando como regra geral o que o CPC cuida como exceção. Constitui regramento próprio, que impede que o autor da ação civil pública arque com os ônus periciais e sucumbenciais, ficando afastada, portanto, as regras específicas do Código de Processo Civil.

3. Não é possível se exigir do Ministério Público o adiantamento de honorários periciais em ações civis públicas. Ocorre que a referida isenção conferida ao Ministério Público em relação ao adiantamento dos honorários periciais não pode obrigar que o perito exerça seu ofício gratuitamente, tampouco transferir ao réu o encargo de financiar ações contra ele movidas. Dessa forma, considera-se aplicável, por analogia, a Súmula n. 232 desta Corte Superior ("A Fazenda Pública, quando parte no processo, fica sujeita à exigência do depósito prévio dos honorários do perito"), a determinar que a Fazenda Pública ao qual se acha vinculado o Parquet arque com tais despesas. Precedentes: EREsp 981949/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/02/2010, DJe 15/08/2011; REsp 1188803/RN, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/05/2010, DJe 21/05/2010; AgRg no REsp 1083170/MA, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/04/2010, DJe 29/04/2010; REsp 928397/SP, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/09/2007, DJ 25/09/2007 p. 225; REsp 846.529/MS, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 19/04/2007, DJ 07/05/2007, p. 288.

4. Recurso especial parcialmente provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ n. 8/08.

(STJ - REsp n. 1.253.844/SC, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 13/3/2013, DJe de 17/10/2013)

 

Por todo o exposto, voto para afastar a matéria preliminar e, no mérito, negar provimento ao reexame necessário e às apelações do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, do IBAMA e da UNIÃO FEDERAL.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

DANO AMBIENTAL NA ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE NO ENTORNO DO RESERVATÓRIO DA USINA HIDRELÉTRICA DE ILHA SOLTEIRA: ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal objetivando a reparação de dano ambiental na área de preservação permanente (APP) do entorno da Usina Hidrelétrica (UHE) de Ilha Solteira em Santa Albertina/SP, que adentra  o imóvel pertencente a Orlando Santos Melo,  Adelvan Santos Melo, Orides Pereira Melo,  Marino Massaro e Nair da Silva Massaro, por omissão da Companhia Energética de São Paulo (CESP), na qualidade de concessionária da UHE de Ilha Solteira, da União Federal, na qualidade de poder concedente e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), na qualidade de executor da Política Nacional do Meio Ambiente. No decorrer da instrução, a União Federal e o IBAMA foram transferidos para o polo ativo e a empresa Rio Paraná Energia S/A passou a integrar o polo passivo. O feito foi julgado improcedente, motivando a apelação do Ministério Público Federal, da União Federal e do IBAMA. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO: a perícia técnica deferida nos autos teve por objetivo a delimitação da APP no imóvel em questão, nos termos do disposto no artigo 62 do Lei nº 12.651/2012, e a verificação da existência de intervenção humana que impedisse a regeneração da vegetação nativa. E todos os quesitos apresentados pelo IBAMA foram respondidos no laudo pericial, se relativos ao objetivo da perícia. Ademais, ...não há cerceamento de defesa quando o julgador, ao constatar nos autos a existência de provas suficientes para o seu convencimento, indefere pedido de produção de prova. Cabe ao juiz decidir, motivadamente, sobre os elementos necessários à formação de seu entendimento, pois, como destinatário da prova, é livre para determinar as provas necessárias ou indeferir as inúteis ou protelatórias... (STJ - AgInt no AREsp 1682003/PR, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 08/02/2021, DJe 23/02/2021). Matéria preliminar afastada. SITUAÇÃO FÁTICA: o caso dos autos diz respeito ao imóvel no “Loteamento Jocema I”, em Santa Albertina/SP, adquirido em 29/10/1993 por Orlando Santos Melo e em 23/10/1998 por Adelvan Santos Melo, Orides Pereira Melo, Marino Massaro e Nair da Silva Massaro. A inicial foi instruída com o procedimento administrativo nº 1.34.015.001084/2004-38, instaurado pela Procuradoria da República em São José do Rio Preto/SP, onde consta que o imóvel, com 2.709.86 metros quadrados, apresentava 187,85 metros quadrados de área impermeabilizada NOVO CÓDIGO FLORESTAL: o Ministério Público Federal, com base no princípio do tempus regit actum, defende que a extensão da APP no entorno do reservatório da UHE de Ilha Solteira a ser considerada nesses autos é de 100 metros, a partir do seu nível máximo normal, em conformidade com a Lei 4.771/65, que encerrava o antigo Código Florestal, a Resolução CONAMA nº 4/1985 e a Resolução CONAMA nº 302/2002. Durante a tramitação dessa ação civil pública foi promulgada a Lei nº 12.651/2012, que traz o novo Código Florestal, alterando substancialmente a legislação afeta ao tema, com especial destaque aos seus artigos 4º, III, 5º e 62. É sabido que o STF reconheceu a constitucionalidade desses dispositivos legais no julgamento a ação declaratória de constitucionalidade nº 42, além de afastar a aplicação automática do princípio da vedação do retrocesso para anular opções validamente eleitas pelo legislador (STF - ADC 42, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 28/02/2018, publicado em 13/08/2019). Cuida-se de decisão vinculante e cogente. É o que se depreende do recente julgamento da reclamação nº 38.764 pelo STF, onde foi cassada a decisão proferida em sede de apelação por esse TRF3R, nos autos da ação civil pública nº 0002737-88.2008.4.03.6106, que privilegiou o princípio do tempus regit actum para afastar a incidência do artigo 62 da Lei nº 12.651/2012 (STF - Rcl 38764/SP, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, julgamento em 28/05/2020, publicado em 17/06/2020). DELIMITAÇÃO DA EXTENSÃO DA APP AO TEOR DO ARTIGO 62 DA LEI Nº 12.651/2012 MANTIDA: nesse contexto, o Juízo a quo acertadamente rejeitou a aplicação do princípio do tempus regit actum defendido pelo Ministério Público Federal e determinou que a extensão da APP no entorno do reservatório da UHE de Ilha Solteira a ser considerada nesses autos é a prevista no artigo 62 da Lei nº 12.651/2012. Precedentes dessa Corte (TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv 0030711-17.2015.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal NELTON AGNALDO MORAES DOS SANTOS, julgado em 11/11/2021; 2ª Seção, AR 5020192-48.2017.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal ANTONIO CARLOS CEDENHO, julgado em 06/05/2021; ApCiv 0011307-97.2007.4.03.6106, 6ª Turma, Rel. Desembargador Federal DIVA PRESTES MARCONDES MALERBI, julgado em 30/04/2021). APP EM ÁREA CONSOLIDADA: o artigo 62 do novo Código Florestal, inserto na Seção II – Das Áreas Consolidadas em Área de Preservação Permanente, dentro do Capítulo XIII – Disposições Transitórias, diz respeito à APP em área consolidada, onde já existe ocupação/atividade antrópica estabelecida. E esse é justamente o caso dessa ação civil pública, pois Orlando Santos Melo adquiriu o imóvel em 29/10/1993, em cadeia sucessória, após o desmembrado da Fazenda Ponte Pensa. Acrescente-se que o Juízo a quo, ao afastar a tramitação conjunta das 501 ações civis públicas que objetivam a reparação de dano ambiental na APP do entorno da UHE de Ilha Solteira, privilegiou o exame individualizado de cada uma das situações postas, o que – per si – afasta o risco de “generalização” aventado pelo IBAMA e pela União Federal. INEXISTÊNCIA DE DANO AMBIENTAL: a perícia técnica realizada em 28/1/2022 e entre 15 e 17/2/2022 verificou, a partir de equipamentos topográficos, geodésicos e aerofotogramétricos, que a APP do reservatório da UHE de Ilha Solteira, nos termos do artigo 62 da Lei nº 12.651/2012, compreende uma faixa entre 328 e 329 metros dentro da cota de desapropriação. E que no imóvel dos corréus inexiste intervenção humana que impeça a regeneração da vegetação nativa na APP. HONORÁRIOS PERICIAIS: sem reparo a condenação da União Federal ao ressarcimento dos honorários periciais adiantados pelos corréus, conforme Tema 510 do STJ (STJ - AgInt no RMS n. 66.296/RJ, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 29/8/2022, DJe de 23/9/2022; REsp n. 1.253.844/SC, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 13/3/2013, DJe de 17/10/2013). SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSOS DESPROVIDOS.

 

 

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma, por unanimidade, afasta a matéria preliminar e, no mérito, nega provimento ao reexame necessário e às apelações do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, do IBAMA e da UNIÃO FEDERAL., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.