Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002956-51.2019.4.03.6002

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DA GRANDE DOURADOS

APELADO: MICHELLE VISCARDI SANT ANA

Advogados do(a) APELADO: EDGAR AMADOR GONCALVES FERNANDES - MS19237-A, ROMULO ALMEIDA CARNEIRO - MS15746-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002956-51.2019.4.03.6002

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DA GRANDE DOURADOS

APELADO: MICHELLE VISCARDI SANT ANA

Advogados do(a) APELADO: ROMULO ALMEIDA CARNEIRO - MS15746-A, EDGAR AMADOR GONCALVES FERNANDES - MS19237-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Cuida-se de apelação interposta pela FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DA GRANDE DOURADOS em face de sentença que julgou procedente pedido de alteração do “fundamento de nomeação da servidora Michelle Viscardi Sant Ana, retirando-lhe o caráter sub judice de modo a tornar a sua investidura definitiva. Declara-se o direito da autora à nomeação no cargo de Técnico em Assuntos Educacionais, Nível de Classificação E, Nível de Capacitação 1, Padrão de Vencimento 01, 40 horas semanais, código de vaga 0689110” (fls. 274-PJe – ID Num. 161856136 - Pág. 7).

 

Em 25 de novembro de 2019, a autora ajuizou a presente ação de conhecimento, com pedido de tutela de urgência, formulando pedido para “nomear voluntariamente MICHELLE VISCARDI SANT ANA, em decorrência de sua aprovação em 3º (terceiro) lugar para o cargo efetivo de Técnico em Assuntos Educacionais, tornando-se definitiva sua nomeação, retirando o aspecto de nomeação sub judice”.

 

Sustentou que “foi aprovada em concurso público (Edital de Abertura PROGRAD nº 10, de 16 de abril de 2015) para a vaga de Técnico em Assuntos Educacionais” e que “foi aprovada em 1º (primeiro) lugar para as vagas reservadas a candidatos autodeclarados pretos e pardos e em 3º (terceiro) lugar para as vagas gerais, de ampla concorrência, com 84 (oitenta e quatro) pontos.” O edital de abertura do certame “possuía 1 (uma) vaga para pretos e pardos, contudo, após a homologação do resultado final, o edital sofreu alterações e retiraram a vaga em questão” alocando-a para os candidatos da ampla concorrência, ficando “disponíveis 2 (duas) vagas para sua área.” Em razão disso, visando a manutenção da vaga para os candidatos cotistas, impetrou “Mandado de Segurança (Autos nº 0002561-86.2015.4.03.6002) em “16 de dezembro de 2015, tendo sido deferido o seu pedido liminar”, assegurando sua nomeação. No entanto, quatro anos depois, o pleito foi julgado improcedente, sendo cassada a liminar. Ocorre que, nesse período, foram chamados nove candidatos da ampla concorrência, sendo preterido o nome da autora por erro da Administração, contrariando o disposto na Súmula 15 do Supremo Tribunal Federal (“Dentro do prazo de validade do concurso, o candidato aprovado tem o direito à nomeação, quando o cargo for preenchido sem observância da classificação”). Aduziu, por fim, que, nos trâmites internos, a Procuradoria que presta assessoria jurídica à Ré proferiu parecer no sentido de reconhecer e corrigir o erro apontado, o que não foi acatado pela Pró-Reitoria de Ensino de Graduação da Universidade, obrigando-a ao ajuizamento desta ação para a sua manutenção no cargo.

 

A petição inicial foi instruída com os documentos de fls. 25/156-PJe (ID Num. 161856084 - Pág. 1).

 

O pedido de tutela provisória foi deferido para o fim de manter a autora no cargo até o julgamento do feito (fls. 159/166-PJe – ID Num. 161856113 - Pág. 1).

 

Em contestação, a ré aduziu, em síntese, a impossibilidade de manutenção da autora no cargo, pois que proferida decisão final no mandado de segurança 0002561-86.2015.4.03.6002, que cassou a liminar, tendo a sentença transitado em julgado, sendo incabível a aplicação da teoria do fato consumado. Sustentou, ainda, que cabia à autora pleitear a sua nomeação, na época própria, à vaga destinada à ampla concorrência, o que deixou de fazer, abrindo mão dessa vaga, sendo que o prazo de validade do concurso se encerrou, após sua prorrogação, em 19-08-2019 (fls. 184/197-PJe – ID Num. 161856117 - Pág. 1).

 

Sobreveio sentença por meio da qual o magistrado de primeira instância julgou procedente pedido de alteração do “fundamento de nomeação da servidora Michelle Viscardi Sant Ana, retirando-lhe o caráter sub judice de modo a tornar a sua investidura definitiva”, declarando-se “o direito da autora à nomeação no cargo de Técnico em Assuntos Educacionais, Nível de Classificação E, Nível de Capacitação 1, Padrão de Vencimento 01, 40 horas semanais, código de vaga 0689110”, condenando a ré ao pagamento dos honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa (fls. 268/274-PJe – ID Num. 161856136 - Pág. 7).

 

Apela a ré sustentando a impossibilidade de modificação da sentença proferida no mandado de segurança 0002561-86.2015.4.03.6002, já transitada em julgado, sob pena de ofensa à coisa julgada, o que só pode ser feito mediante ação rescisória. Por outro lado, cabia à autora pleitear a sua nomeação, na época própria, à vaga destinada à ampla concorrência, o que deixou de fazer, abrindo mão dessa vaga, não podendo a Administração convocá-la, pois que esgotadas as nove vagas abertas durante o prazo de validade do certame (fls. 276/280- PJe – ID Num. 161856138 - Pág. 1)

 

Com contrarrazões (fls. 288/293-PJe – ID Num. 161856144 - Pág. 1), subiram os autos a esta Corte.

 

É o relatório.

 

 


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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002956-51.2019.4.03.6002

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V O T O

 

 

Preliminarmente, não há que se falar em coisa julgada, pois, embora as partes sejam as mesmas, a causa de pedir e o pedido são diversos, uma vez que, no mandado de segurança (posteriormente convertido em ação de rito ordinário) 0002561-86.2015.4.03.6002, a autora buscava a sua nomeação na condição de cotista (onde logrou classificar-se em primeiro lugar), sustentando ter havido alteração das regras no curso do certame, sendo que nesta demanda busca-se a nomeação no mesmo cargo, mas na condição de candidata da lista de ampla concorrência (na qual se classificou em terceiro lugar), sob fundamento de ter sido preterida na lista de classificação, pois no prazo de validade do concurso foram abertas mais vagas além daquelas previstas no edital, com nomeação de candidatos pior classificados.

 

Para melhor compreensão, transcrevo o inteiro teor da sentença proferida no mandado de segurança (posteriormente convertido em ação de rito ordinário) 0002561-86.2015.4.03.6002:

 

“Trata-se de ação de procedimento comum, ajuizada por MICHELLE VISCARDI SANT ANA contra a UNIVERSIDADE FEDERAL DA GRANDE DOURADOS E OUTRO, por meio da qual requer que seja disponibilizada a vaga de pretos e pardos conforme o edital de abertura do concurso público que a Ré disponibilizou, restando classificada em primeiro lugar nesta vaga de ação afirmativa.

Narra a autora que participou do concurso para provimento de cargos de Técnico-Administrativo da UFGD, regido pelo Edital de Abertura PROGRAND Nº 10, DE 16 DE ABRIL DE 2015. Tal edital disponibilizou 2 vagas para o cargo de Técnico em Assuntos Educacionais, sendo uma delas de ação afirmativa de pretos e pardos, da qual a parte autora fora classificada em 1º (primeiro) lugar, conforme consta nas fls. 17/43 dos autos.

Assevera, contudo, que o edital fora alterado, por meio do EDITAL DE RETIFICAÇÃO Nº 4, DE 17 DE AGOSTO DE 2015, a posteriori do certame, excluindo a vaga de pretos e pardos, e colocando-a na ampla concorrência.

Por fim, aduz que, com a alteração do Edital, a parte autora restou prejudicada, em virtude de ter obtido a 3ª (terceira) classificação neste concurso da UFGD, malogrando, por conseguinte, em ingressar no determinado cargo de Técnico de Assuntos Educacionais.

Decisão de fls. 108/109, converteu o rito em ordinário e deferiu a liminar determinando a disponibilização de vaga de pretos/pardos para a Autora.

A parte Ré alegou que a anunciada alteração visou atender ao disposto na Lei n. 12.990/2014, aludindo-se ao dever de anular os próprios atos administrativos, quando estes eivados de vícios de ilegalidade (cópia do AI de fls. 163/167).

Decisão de fls. 221/221v, determinou a suspensão, por trinta dias, da decisão que concedeu a liminar.

O despacho de fl. 228 determinou a inclusão de Cristiane Silveira Batista e Evangelista Canazza da Silva no polo passivo deste feito.

Em sede de contestação EVANGELISTA CANZZA DA SILVA pugnou pelo julgamento improcedente da demanda (fls. 240/250), sendo que às fls. 262/266 informou sua exoneração do cargo por ele assumido (em 2º lugar), tendo em vista a aprovação em concurso posterior.

A parte autora, às fls. 268/275, impugnou à contestação ratificando os termos da exordial.

Sem outros meios de prova a produzir os autos vieram conclusos para sentença.

É o relatório, decido.

2. FUNDAMENTAÇÃO

Todo ato administrativo deverá atentar para o princípio da legalidade, sendo um verdadeiro poder-dever da Administração Pública o desfazimento de atos reputados como ilegais, conforme disposto na Constituição Federal, bem como no entendimento sedimentado do Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral:

Constituição Federal:

Art. 37 - A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (grifo nosso) [...]

Ao Estado é facultada a revogação de atos que repute ilegalmente praticados; porém, se de tais atos já tiverem decorrido efeitos concretos, seu desfazimento deve ser precedido de regular processo administrativo.

[Tese definida no RE 594.296, rel. min. Dias Toffoli, P, j. 21-9-2011, DJE 30 de 13-2-2012, Tema 138.]

O princípio da legalidade impõe à administração pública a obediência estrita à lei. Nesse corolário, todos os seus atos devem estar em conformidade com a lei, impossibilitando a sua contrariedade. Atente-se que somente a lei pode ser a fonte primária de obrigações, noutro dizer, todas obrigações impostas aos indivíduos devem ter origem legal, sendo por os atos editados pela administração pública, sejam regulamentares ou normativos, decorram da explícita permissão legal.

Ressalte-se que a legalidade é um princípio geral de Direito, aplicável tanto ao Direito Público quanto ao Direito Privado. Considerando que a administração pública pode produzir atos regidos por qualquer um dos ramos, cumpre distinguir que os atos de império, regidos pelo Direito Público, estão restritos aos limites dos mandamentos legais, enquanto que os atos de gestão, regidos pelo Direito Privado, têm a lei apenas como limite negativo.

Assim entende o STF:

Súmula 346 - A Administração Pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos.

Súmula 473 - A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.

Portanto, em caso de vícios nos atos administrativos cabe a própria Administração Pública, com base no seu poder de autotutela, invalidá-los, com a produção de efeitos ex tunc, com efeitos retroativos à data em fora praticado o ato ilegal. Assim, "A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos" (artigo 53 da Lei 9.784/99).

In casu, a parte autora alegou que restou prejudicada com a modificação da vaga de auto declaração de pretos e pardos no concurso para o cargo de Técnico de Assuntos Educacionais, entretanto, a Administração Pública tem o poder-dever de gerir seus próprios atos, anulando-os, caso seja necessário, não restando direito adquirido à Autora.

Art. 54. (Lei 9.784/99) - O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.

Superado este ponto - poder-dever da Administração Pública de autogerir seus próprios atos-, passo à análise da supressão das cotas raciais, tendo em vista que com as alterações realizadas pela Ré do Edital, não foi possível disponibilizar a porcentagem prevista na lei regente, conduzindo à Autora a concorrer de forma ampla com os demais candidatos, resultando sua aprovação em 3º lugar. Vejamos o dispositivo legal que trata das cotas: Vejamos o texto legal e a decisão do Supremo da ADC 41 sobre o tema:

Lei 12.990/2014:

Art. 1º Ficam reservadas aos negros 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública federal, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista controladas pela União, na forma desta Lei.

A reserva de vagas será aplicada sempre que o número de vagas oferecidas no concurso público for igual ou superior a 3 (três) (grifo Nosso).

Ementa: Direito Constitucional. Ação Direta de Constitucionalidade. Reserva de vagas para negros em concursos públicos. Constitucionalidade da Lei n 12.990/2014. Procedência do pedido. 1. É constitucional a Lei n 12.990/2014, que reserva a pessoas negras 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública federal direta e indireta, por três fundamentos. 1.1. Em primeiro lugar, a desequiparação promovida pela política de ação afirmativa em questão está em consonância com o princípio da isonomia. Ela se funda na necessidade de superar o racismo estrutural e institucional ainda existente na sociedade brasileira, e garantir a igualdade material entre os cidadãos, por meio da distribuição mais equitativa de bens sociais e da promoção do reconhecimento da população afrodescendente. 1.2. Em segundo lugar, não há violação aos princípios do concurso público e da eficiência. A reserva de vagas para negros não os isenta da aprovação no concurso público. Como qualquer outro candidato, o beneficiário da política deve alcançar a nota necessária para que seja considerado apto a exercer, de forma adequada e eficiente, o cargo em questão. Além disso, a incorporação do fator "raça" como critério de seleção, ao invés de afetar o princípio da eficiência, contribui para sua realização em maior extensão, criando uma "burocracia representativa", capaz de garantir que os pontos de vista e interesses de toda a população sejam considerados na tomada de decisões estatais. 1.3. Em terceiro lugar, a medida observa o princípio da proporcionalidade em sua tríplice dimensão. A existência de uma política de cotas para o acesso de negros à educação superior não torna a reserva de vagas nos quadros da administração pública desnecessária ou desproporcional em sentido estrito. Isso porque: (i) nem todos os cargos e empregos públicos exigem curso superior; (ii) ainda quando haja essa exigência, os beneficiários da ação afirmativa no serviço público podem não ter sido beneficiários das cotas nas universidades públicas; e (iii) mesmo que o concorrente tenha ingressado em curso de ensino superior por meio de cotas, há outros fatores que impedem os negros de competir em pé de igualdade nos concursos públicos, justificando a política de ação afirmativa instituída pela Lei n 12.990/2014. 2. Ademais, a fim de garantir a efetividade da política em questão, também é constitucional a instituição de mecanismos para evitar fraudes pelos candidatos. É legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de heteroidentificação (e.g., a exigência de autodeclaração presencial perante a comissão do concurso), desde que respeitada a dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a ampla defesa. 3. Por fim, a administração pública deve atentar para os seguintes parâmetros: (i) os percentuais de reserva de vaga devem valer para todas as fases dos concursos; (ii) a reserva deve ser aplicada em todas as vagas oferecidas no concurso público (não apenas no edital de abertura); (iii) os concursos não podem fracionar as vagas de acordo com a especialização exigida para burlar a política de ação afirmativa, que só se aplica em concursos com mais de duas vagas; e (iv) a ordem classificatória obtida a partir da aplicação dos critérios de alternância e proporcionalidade na nomeação dos candidatos aprovados deve produzir efeitos durante toda a carreira funcional do beneficiário da reserva de vagas. 4. Procedência do pedido, para fins de declarar a integral constitucionalidade da Lei n 12.990/2014. Tese de julgamento: "É constitucional a reserva de 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública direta e indireta. É legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de heteroidentificação, desde que respeitada a dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a ampla defesa". (sem grifo no original)

(ADC 41 / DF - DISTRITO FEDERAL AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Julgamento: 08/06/2017 Órgão Julgador: Tribunal Pleno)

Do cotejo da Lei de Cotas com a decisão do STF na ADC 41, pode-se concluir que há obrigatoriedade de reserva de vagas para ações afirmativas apenas quando as vagas forem iguais ou superiores a três, portanto a Requerida cumpriu a lei.

Por fim, destaco que não vislumbro efeito concreto digno de provocar a instauração de processo administrativo, pois apesar do ato anulado ter repercutido na esfera de interesse da Autora, tratava-se de processo seletivo, existindo a mera expectativa do direito de ser aprovada.

3. DISPOSITIVO

Ante o exposto, julgo IMPROCEDENTE o pedido da Autora, decidindo o mérito nos termos do art. 487, I do NCPC, REVOGO a liminar deferida, bem como a decisão que determinou a sua suspensão, em razão do poder-dever da Requerida de anular seus próprios atos ilegais.

Condeno à autora MICHELLE VISCARDI SANTANA ao pagamento dos honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da causa, ressalvando que a cobrança dos honorários advocatícios deve ficar sobrestada até que seja feita prova (pela parte contrária) de que a mesma perdeu a condição de necessitada, pelo prazo máximo de cinco anos, após o qual estará prescrita a pretensão, conforme o disposto no 3º do artigo 98 do CPC.

Oficie-se ao Desembargador Federal, relator do Agravo de Instrumento. Custas na forma da lei.

Com o trânsito em julgado, arquivem-se os autos, com as cautelas de praxe.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

12 JUN 2019

(fls. 347/354-PJe 1º Grau – ID Num. 24377076 - Pág. 14)

 

No que pertine à aplicação da “teoria do fato consumado”, observo que, de fato, o E. STF, em sede de repercussão geral, firmou orientação no sentido de não ser compatível com o regime constitucional de acesso aos cargos públicos a manutenção no cargo de candidato não aprovado que nele tomou posse em decorrência de execução provisória de medida liminar supervenientemente revogada, verbis:

 

“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO REPROVADO QUE ASSUMIU O CARGO POR FORÇA DE LIMINAR. SUPERVENIENTE REVOGAÇÃO DA MEDIDA. RETORNO AO STATUS QUO ANTE. “TEORIA DO FATO CONSUMADO”, DA PROTEÇÃO DA CONFIANÇA LEGÍTIMA E DA SEGURANÇA JURÍDICA. INAPLICABILIDADE. RECURSO PROVIDO.

1. Não é compatível com o regime constitucional de acesso aos cargos públicos a manutenção no cargo, sob fundamento de fato consumado, de candidato não aprovado que nele tomou posse em decorrência de execução provisória de medida liminar ou outro provimento judicial de natureza precária, supervenientemente revogado ou modificado.

2. Igualmente incabível, em casos tais, invocar o princípio da segurança jurídica ou o da proteção da confiança legítima. É que, por imposição do sistema normativo, a execução provisória das decisões judiciais, fundadas que são em títulos de natureza precária e revogável, se dá, invariavelmente, sob a inteira responsabilidade de quem a requer, sendo certo que a sua revogação acarreta efeito ex tunc, circunstâncias que evidenciam sua inaptidão para conferir segurança ou estabilidade à situação jurídica a que se refere.

3. Recurso extraordinário provido.

(RE 608482, Relator(a): TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 07/08/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-213  DIVULG 29-10-2014  PUBLIC 30-10-2014)”

 

No entanto, consultando o inteiro teor do que foi decidido no referido precedente, observa-se que o efeito próprio da decisão revogadora da medida liminar é fazer as partes retornar ao estado anterior ao da concessão da medida, verbis:

 

“Com efeito, é decorrência natural do regime das medidas cautelares antecipatórias que a sua concessão se cumpra sob risco e responsabilidade de quem as requer, que a sua natureza é precária e que a sua revogação opera automáticos efeitos ex tunc. Em se tratando de mandado de segurança, há até mesmo súmula do STF a respeito (Súmula 405: "Denegado o mandado de segurança pela sentença, ou no julgamento do agravo, dela interposto, fica sem efeito a liminar concedida, retroagindo os efeitos da decisão contrária". A matéria tem, atualmente, disciplina legal expressa, aplicável a todas as medidas antecipatórias, sujeitas que estão ao mesmo regime da execução provisória (CPC, art. 273, § 3º). Isso significa que a elas se aplicam as normas do art. 475-O do Código: o seu cumprimento corre por conta e responsabilidade do requerente (inciso I), que, portanto, tem consciência dos riscos inerentes; e, se a decisão for revogada, "ficam sem efeito", "restituindo-se as partes ao estado anterior" (inciso II). O mesmo ocorre em relação às medidas cautelares, cuja revogação impõe o retorno das partes ao status quo ante, ficando o requerente responsável pelos danos oriundos da indevida execução da medida (art. 811 do CPC).

...

O que se quer realçar, com essa digressão sobre a natureza dos provimentos cautelares e da execução provisória das sentenças, é que não há suporte lógico ou teleológico para, em relação aos efeitos de sua efetivação, pretender evitar o retorno ao status quo ante invocando o princípio da segurança jurídica ou da proteção da confiança legítima.

...

(págs 11 e 15)

 

No caso, o retorno das partes ao estado anterior implica a aplicação das regras previstas no edital, tal como deixou assentada a decisão proferida no feito acima citado, quando firmou ser legítima a alteração da regra para fazer prevalecer o postulado da legalidade, sem alterar as demais regras do certame.

 

Quanto às vagas reservadas, assim dispôs o edital:

 

8. DAS VAGAS RESERVADAS

8.1. Em cumprimento à Lei nº 12.990/2014, ficam reservadas aos candidatos que se autodeclararem pretos ou pardos 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas neste Concurso Público, na forma definida na Tabela I.

8.2. Em cumprimento ao disposto no § 2º, do Artigo 5º, da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, bem como na forma do Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999, ficam reservadas para as pessoas com deficiência 5% (cinco por cento) das vagas definidas na Tabela I.

8.3. Todo candidato inscrito para as vagas reservadas estará igualmente concorrendo às vagas de ampla concorrência.

8.4. É condição para concorrer às vagas reservadas que os candidatos sejam aprovados nos termos do item 16 deste Edital.

8.5. Os candidatos às vagas reservadas, se aprovados na forma do item 16, além de figurar na lista de aprovados para as vagas de ampla concorrência, terão seu nome constante na lista específica de vagas reservadas para pessoas com deficiência ou para pretos e pardos.

8.6. A distribuição das vagas reservadas entre as várias áreas temáticas do concurso, de acordo com o contido na Tabela I deste edital, foi definida em audiência pública realizada no dia 15 de abril de 2015, conforme ata que consta dos autos do Processo Administrativos nº 23005.001396/2015-52.

8.7. Os candidatos classificados para ocupação das vagas reservadas para as pessoas com deficiência deverão comprovar, por ocasião da posse, que se enquadram nos critérios da modalidade escolhida. A não comprovação impedirá a investidura do candidato no respetivo cargo, hipótese em que será tornada sem efeito a nomeação, na forma da lei.

8.8. O candidato que não optar, no ato da inscrição, por concorrer às vagas reservadas, mesmo que atenda às exigências para participar dessa forma de ingresso, concorrerá apenas às vagas de ampla concorrência.

8.9. As vagas reservadas que não forem providas por falta de candidatos que atendam às exigências legais ou mesmo por reprovação no concurso público, serão preenchidas pelos concorrentes às vagas de ampla concorrência, observada a ordem de classificação.

8.10. Os candidatos às vagas reservadas que forem aprovados serão convocados para efeito de nomeação segundo a ordem de classificação.

8.11. A área onde somente houver a oferta de vaga reservada também receberá inscrições de candidatos que desejam concorrer na ampla concorrência. Os candidatos assim inscritos, porém, FICAM CIENTES de que a preferência para o provimento da vaga ofertada será sempre do candidato que se inscreveu para concorrer à vaga reservada, podendo eventual vaga que vier a surgir no prazo de validade do certame ser destinada ao candidato que se inscreveu e foi aprovado na ampla concorrência.

8.12. A Coordenadoria do Centro de Seleção da UFGD divulgará, após a homologação das inscrições, as áreas temáticas onde houve ou não candidatos homologados para concorrer às vagas reservadas oferecidas.

8.13. As nomeações em vagas novas que surgirem durante a validade do concurso observará e manterá, na forma da lei, os percentuais de vagas reservadas.

(fls. 34/35-PJe – ID Num. 161856087 - Pág. 7)

 

10. DAS VAGAS DESTINADAS AOS CANDIDATOS NEGROS

10.1. O candidato interessado deverá, no ato da inscrição, optar por concorrer às vagas reservadas aos pretos ou pardos, conforme quesito cor ou raça, utilizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE.

10.1.1. A opção por concorrer às vagas reservadas aos candidatos pretos ou pardos valerá como autodeclaração de cor ou raça, exclusivamente, para este Concurso Público.

10.2. As informações prestadas no momento da inscrição são de inteira responsabilidade do candidato, devendo este responder por qualquer falsidade. Na hipótese de constatação de declaração falsa, o candidato será eliminado do Concurso e, se houver sido nomeado, ficará sujeito à demissão, após procedimento administrativo em que lhe sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa, sem prejuízo de outras sanções cabíveis.

10.3. Os candidatos negros participarão do Concurso em igualdade de condições com os demais candidatos, no que se refere aos requisitos para o cargo, ao conteúdo das provas, à avaliação e aos critérios de aprovação, ao dia, horário e local de aplicação das provas, à nota mínima exigida para aprovação e aos comandos do Decreto Federal nº 6.944, de 21 de agosto de 2009.

(fls. 36-PJe – ID Num. 161856087 - Pág. 9)

 

17. DA HOMOLOGAÇÃO DO CONCURSO PÚBLICO E DO PROVIMENTO DOS CARGOS

17.1. O resultado final do concurso será publicado no Diário Oficial da União e divulgado na Página do Concurso, na data estabelecida no Item 2 – Do Cronograma Do Concurso Público.

17.1.1. Concluídos os trabalhos do concurso público, a Coordenadoria do Centro de Seleção encaminhará, com relatório específico, a relação nominal dos candidatos aprovados à Pró-Reitoria de Ensino de Graduação, para fins de homologação e publicação na forma do subitem anterior.

17.2. O candidato aprovado e classificado no concurso público, na forma estabelecida nesse Edital, será nomeado, obedecida a ordem de classificação, no cargo para o qual foi habilitado, na Classe, Nível de Capacitação e Padrão iniciais da respectiva categoria funcional, mediante portaria expedida pelo Reitor da UFGD, publicada no Diário Oficial da União e divulgada na página da Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas (PROGESP): http://www.ufgd.edu.br / progesp /editais.

17.2.1. A convocação dos candidatos nomeados para posse será divulgada na página da PROGESP.

17.3. A posse deverá ocorrer no prazo improrrogável de 30 (trinta) dias, contados a partir da publicação do ato de nomeação no Diário Oficial da União.

17.4. Por ocasião da posse, serão exigidos dos candidatos nomeados os originais e cópias dos seguintes comprovantes:

...

17.4.1. Para a posse também serão exigidos os seguintes formulários e declarações:

...

17.5. A não apresentação de qualquer um dos documentos comprobatórios fixados no subitem 17.4, dentro do prazo legal, tornará sem efeito a nomeação do candidato.

17.6. Os candidatos aprovados e classificados serão nomeados conforme a necessidade da UFGD, dentro do prazo de validade do concurso.

17.7. Para admissão, os candidatos também deverão apresentar todos os documentos exigidos pelo presente Edital e demais documentos legais necessários, sob pena de perda do direito à vaga.

17.8. O candidato admitido que deixar de entrar em exercício, no prazo de 15 (quinze) dias corridos, nos termos legais, perderá os direitos decorrentes de sua nomeação.

17.9. É facultado à Universidade Federal da Grande Dourados exigir dos candidatos, na admissão, além da documentação prevista neste Edital, documentos comprobatórios de bons antecedentes que julgar necessários, na forma da lei.

17.10. A falta de comprovação de qualquer dos requisitos para investidura até a data da posse ou a prática de falsidade ideológica em prova documental acarretarão cancelamento da inscrição do candidato, sua eliminação do concurso público e anulação de todos os atos com respeito a ele praticados pela UFGD, ainda que já tenha sido publicado o edital de homologação do resultado final, sem prejuízo das sanções legais cabíveis.

(fls. 42-PJe – ID Num. Num. 161856087 - Pág. 15)

 

Segundo as normas do edital, a nomeação e a convocação do candidato aprovado pressupõem atos da Administração, pela óbvia razão de que o controle das vagas abertas está sob sua gerência, tal como ocorreu, por exemplo, quando o candidato classificado em segundo lugar nas vagas destinadas à ampla concorrência pediu exoneração do cargo, conforme se observa da seguinte passagem da sentença proferida naquele feito:

 

“Em sede de contestação EVANGELISTA CANZZA DA SILVA pugnou pelo julgamento improcedente da demanda (fls. 240/250), sendo que às fls. 262/266 informou sua exoneração do cargo por ele assumido (em 2º lugar), tendo em vista a aprovação em concurso posterior.”

 

Logo, não há que se falar em caber à autora pleitear a sua nomeação, na época própria, à vaga destinada à ampla concorrência, sob pena de eliminação do certame, pois, como se viu, é ônus da Administração fazer a convocação dos candidatos.

 

Nesse sentido, qual seja, o de ter havido falha da Administração nos “encaminhamentos internos”, é a orientação constante de parecer ofertado pela Procuradoria de assistência jurídica à ré:

 

NOTA n. 00120/2019/GAB/PFUFGD/PGF/AGU

NUP: 00868.000080/2019-11 (REF. 00607.000145/2017-38)

INTERESSADOS: MICHELLE VISCARDI SANT ANA E OUTROS

ASSUNTOS: ATIVIDADE CONCOMITANTE

1. Trata-se de encaminhamento oriundo da Procuradoria Federal em Mato Grosso do Sul, a qual comunica sobre a revogação de liminar que havia determinado a nomeação da servidora MICHELLE VISCARDI SANT ANA no cargo de Técnico em Assuntos Educacionais da UFGD e encarece sejam tomadas as providências devidas (Sapiens, Seq. 1).

2. É o breve relato. Passo a orientar a Administração.

3. Pelo [que] se infere dos autos, a servidora MICHELE VISCARDI SANT ANA fez inscrição no concurso público de provas e títulos para o cargo de Técnico em Assuntos Educacionais. Na oportunidade, o edital estava a ofertar duas vagas para o referido cargo: uma para ampla concorrência e outra reservada para pretos/pardos. E a servidora, então candidata, fez inscrição e concorreu para a vaga de pretos/pardos.

4. Posteriormente, na mesma data em que o concurso estava para ser homologado, o edital foi alterado e a vaga que havia sido ofertada para pretos/pardos foi realocada para a ampla concorrência, de modo que o concurso passou a ter duas vagas para a ampla concorrência e nenhuma vaga para a cota de pretos/pardos (Sapiens, Seq. 8).

5. Finalizado o concurso, a servidora, então candidata, ficou em terceiro lugar na ampla concorrência, situação que a colocava fora das vagas ofertadas no certame.

6. Diante desse quadro, ela impetrou mandado de segurança questionando a alteração do edital, momento em que conseguiu, por meio de decisão judicial liminar, reverter a alteração do edital e ser nomeada para o cargo na condição de cotista para pretos/pardos. Em outras palavras, a então candidatada, ora servidora, conseguiu reverter na Justiça, ainda que de modo precário, a alteração do edital, de maneira que sendo ela a primeira colocada na condição de pretos/pardos, acabou sendo nomeada sub judice (Sapiens, Seq. 11).

7. Pois bem.

8. Em circunstâncias normais, a medida a adotar nesse momento seria apenas a exoneração da servidora, dado que a decisão judicial que sustentava a sua nomeação e investidura no cargo não mais existe.

9. Ocorre que a servidora também foi aprovada em terceiro lugar na ampla concorrência, sendo que tal lista, a da ampla concorrência, nomeou candidatos até a nona colocação, posição essa ocupada pela servidora IVANILDA TEIXEIRA CAVALCANTE CANAZZA (Sapiens, Seq. 10).

10. Nessa linha, o caso não é o de exonerar a servidora, mas sim o de tornar definitiva a sua nomeação, uma vez que ela foi aprovada em terceiro lugar em um certame que convocou e nomeou até a nona colocação. Em outras palavras, independentemente de ela ter ou não conseguido vencer o processo judicial para ser nomeada como primeira colocada entre os cotista[s], o fato é que ela teve desde quase o início das convocações o direito de ser nomeada administrativamente, ou seja, sem decisão judicial a garantir-lhe no cargo. Pondero, ademais, que quando a lista de convocação chegou na terceira colocação da ampla concorrência ela já deveria ter sido nomeada, o que não aconteceu por equívoco nos encaminhamentos.

Isso, porém, não implica na perda do seu direito, dado que se trata de mero equívoco nos encaminhamentos internos, o que pode ser corrigido na fase atual, na forma do art. 53 da Lei nº 9.784/99.

12. Importante ressaltar, por fim, que quando um candidato se inscreve em concurso na condição de cotista, ele não deixa de concorrer na condição de não cotista. É dizer, o cotista concorre tanto como cotista como na ampla concorrência, de modo que o direito da servidora em continuar no cargo, na hipótese, apresenta-se legítimo, bastando apenas a alteração do fundamento de sua nomeação.

13. Posto isso, OPINO seja apenas corrigido o fundamento de nomeação da servidora, retirando-lhe o fundamento sub judice, de modo a tornar a sua investidura definitiva, em especial porque ela já foi inclusive aprovada no estágio probatório (Sapiens, Seq. 12).

14. Para tanto, orienta-se seja editada, com os ajustes de forma que entender pertinentes, a seguinte portaria, verbis:

...

(fls. 148/149-PJe – ID Num. 161856105 - Pág. 1)

 

Ao que se observa, além do pedido de exoneração do candidato classificado em segundo lugar, é fato incontroverso que, no período de validade do certame, novas vagas foram abertas em número suficiente a atingir a colocação da autora no certame (3º lugar na listagem de ampla concorrência). Logo, incide o precedente estabelecido pelo Plenário do STF no julgamento do RE 837.311, segundo o qual, surgindo novas vagas durante período de validade do certame e ocorrendo a preterição de candidato aprovado fora das vagas de forma arbitrária e imotivada por parte da Administração, “exsurge o direito subjetivo à nomeação”, verbis:

 

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. TEMA 784 DO PLENÁRIO VIRTUAL. CONTROVÉRSIA SOBRE O DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO DE CANDIDATOS APROVADOS ALÉM DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL DE CONCURSO PÚBLICO NO CASO DE SURGIMENTO DE NOVAS VAGAS DURANTE O PRAZO DE VALIDADE DO CERTAME. MERA EXPECTATIVA DE DIREITO À NOMEAÇÃO. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS. IN CASU, A ABERTURA DE NOVO CONCURSO PÚBLICO FOI ACOMPANHADA DA DEMONSTRAÇÃO INEQUÍVOCA DA NECESSIDADE PREMENTE E INADIÁVEL DE PROVIMENTO DOS CARGOS. INTERPRETAÇÃO DO ART. 37, IV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE 1988. ARBÍTRIO. PRETERIÇÃO. CONVOLAÇÃO EXCEPCIONAL DA MERA EXPECTATIVA EM DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. PRINCÍPIOS DA EFICIÊNCIA, BOA-FÉ, MORALIDADE, IMPESSOALIDADE E DA PROTEÇÃO DA CONFIANÇA. FORÇA NORMATIVA DO CONCURSO PÚBLICO. INTERESSE DA SOCIEDADE. RESPEITO À ORDEM DE APROVAÇÃO. ACÓRDÃO RECORRIDO EM SINTONIA COM A TESE ORA DELIMITADA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. O postulado do concurso público traduz-se na necessidade essencial de o Estado conferir efetividade a diversos princípios constitucionais, corolários do merit system, dentre eles o de que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (CRFB/88, art. 5º, caput).

2. O edital do concurso com número específico de vagas, uma vez publicado, faz exsurgir um dever de nomeação para a própria Administração e um direito à nomeação titularizado pelo candidato aprovado dentro desse número de vagas. Precedente do Plenário: RE 598.099 - RG, Relator Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, DJe 03-10-2011.

3. O Estado Democrático de Direito republicano impõe à Administração Pública que exerça sua discricionariedade entrincheirada não, apenas, pela sua avaliação unilateral a respeito da conveniência e oportunidade de um ato, mas, sobretudo, pelos direitos fundamentais e demais normas constitucionais em um ambiente de perene diálogo com a sociedade.

4. O Poder Judiciário não deve atuar como “Administrador Positivo”, de modo a aniquilar o espaço decisório de titularidade do administrador para decidir sobre o que é melhor para a Administração: se a convocação dos últimos colocados de concurso público na validade ou a dos primeiros aprovados em um novo concurso. Essa escolha é legítima e, ressalvadas as hipóteses de abuso, não encontra obstáculo em qualquer preceito constitucional.

5. Consectariamente, é cediço que a Administração Pública possui discricionariedade para, observadas as normas constitucionais, prover as vagas da maneira que melhor convier para o interesse da coletividade, como verbi gratia, ocorre quando, em função de razões orçamentárias, os cargos vagos só possam ser providos em um futuro distante, ou, até mesmo, que sejam extintos, na hipótese de restar caracterizado que não mais serão necessários.

6. A publicação de novo edital de concurso público ou o surgimento de novas vagas durante a validade de outro anteriormente realizado não caracteriza, por si só, a necessidade de provimento imediato dos cargos. É que, a despeito da vacância dos cargos e da publicação do novo edital durante a validade do concurso, podem surgir circunstâncias e legítimas razões de interesse público que justifiquem a inocorrência da nomeação no curto prazo, de modo a obstaculizar eventual pretensão de reconhecimento do direito subjetivo à nomeação dos aprovados em colocação além do número de vagas. Nesse contexto, a Administração Pública detém a prerrogativa de realizar a escolha entre a prorrogação de um concurso público que esteja na validade ou a realização de novo certame.

7. A tese objetiva assentada em sede desta repercussão geral é a de que o surgimento de novas vagas ou a abertura de novo concurso para o mesmo cargo, durante o prazo de validade do certame anterior, não gera automaticamente o direito à nomeação dos candidatos aprovados fora das vagas previstas no edital, ressalvadas as hipóteses de preterição arbitrária e imotivada por parte da administração, caracterizadas por comportamento tácito ou expresso do Poder Público capaz de revelar a inequívoca necessidade de nomeação do aprovado durante o período de validade do certame, a ser demonstrada de forma cabal pelo candidato. Assim, a discricionariedade da Administração quanto à convocação de aprovados em concurso público fica reduzida ao patamar zero (Ermessensreduzierung auf Null), fazendo exsurgir o direito subjetivo à nomeação, verbi gratia, nas seguintes hipóteses excepcionais:

i) Quando a aprovação ocorrer dentro do número de vagas dentro do edital (RE 598.099);

ii) Quando houver preterição na nomeação por não observância da ordem de classificação (Súmula 15 do STF);

iii) Quando surgirem novas vagas, ou for aberto novo concurso durante a validade do certame anterior, e ocorrer a preterição de candidatos aprovados fora das vagas de forma arbitrária e imotivada por parte da administração nos termos acima.

8. In casu, reconhece-se, excepcionalmente, o direito subjetivo à nomeação aos candidatos devidamente aprovados no concurso público, pois houve, dentro da validade do processo seletivo e, também, logo após expirado o referido prazo, manifestações inequívocas da Administração piauiense acerca da existência de vagas e, sobretudo, da necessidade de chamamento de novos Defensores Públicos para o Estado.

9. Recurso Extraordinário a que se nega provimento.

(RE 837311, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 09/12/2015, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-072 DIVULG 15-04-2016 PUBLIC 18-04-2016)

 

No caso, o candidato cotista concorre em duas listas (a lista dos candidatos que concorrem pelo sistema da “ampla concorrência” – critério normal presente em qualquer concurso; e a listagem dos candidatos concorrentes às cotas), tendo direito de ser chamado naquela que lhe resultar melhor convocação. Assim, se por qualquer razão, deixa de figurar na relação dos cotistas, continua concorrendo entre os candidatos da lista de ampla concorrência, pois o objetivo da norma que criou o sistema de cotas por concorrência aos cargos público é a inclusão dos candidatos cotistas.

 

Nesse sentido, é a orientação desta Corte e dos demais Regionais:

 

TRF1:

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAPÁ UNIFAP. CARGO DE AUXILIAR DE ENFERMAGEM. NOMEAÇÃO. RESERVA DE VAGAS PARA NEGROS. ART. 3º, §1º, DA LEI 12.990/2014. CANDIDATO APROVADO PARA AS VAGAS DESTINADAS À AMPLA CONCORRÊNCIA. NÃO CONTABILIZAÇÃO NAS VAGAS RESERVADAS. ILEGALIDADE. SEGURANÇA CONCEDIDA. SENTENÇA MANTIDA.

1. O art. 3º da Lei 12.990/2014 prescreve que os candidatos negros concorrerão concomitantemente às vagas reservadas e às vagas destinadas à ampla concorrência, de acordo com a sua classificação no concurso, tendo o seu § 1º disposto que os candidatos negros aprovados dentro do número de vagas oferecido para ampla concorrência não serão computados para efeito do preenchimento das vagas reservadas.

2. Hipótese em que o impetrante, classificado inicialmente em 2º lugar para as vagas reservadas a negros, não foi convocado para tomar posse em uma das 05 vagas disponibilizadas para o cargo de Auxiliar de Enfermagem, tendo em vista que a vaga preenchida pela candidata classificada em 4º lugar da lista reservada à ampla concorrência e 1ª colocada da lista de cotistas autodeclarados negros foi indevidamente computada na cota reservada aos negros.

3. Constatada a inobservância ao disposto no §1º do art. 3º da Lei 12.994/2014, pois a primeira colocada nas vagas reservadas obteve nota e classificação suficientes para ser aprovada na lista de ampla concorrência, devendo nela figurar, correta a sentença que concedeu a segurança para assegurar ao impetrante a convocação para apresentação de documentação e realização de perícia médica, como primeiro classificado pelo sistema de cotas.

4. Apelação e remessa necessária a que se nega provimento.

(AMS 1000301-78.2017.4.01.3100, DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO COSTA, TRF1 - QUINTA TURMA, PJe 31/08/2020 PAG.)

 

REEXAME NECESSÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. RESERVA DE VAGAS PARA NEGROS NOS CONCURSOS PÚBLICOS. CONSTITUCIONALIDADE. CANDIDATO NEGRO APROVADO PARA AS VAGAS DESTINADAS À AMPLA CONCORRÊNCIA NÃO É COMPUTADO NAS VAGAS RESERVADAS AOS AFRODESCENDENTES. SENTENÇA CONFIRMADA.

1. Reexame necessário da sentença pela qual o Juízo, no mandado de segurança impetrado por Illa Pires de Azevedo Brito impugnando ato do Reitor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Baiano, concedeu o mandamus para determinar que a autoridade coatora mantenha a convocação e nomeação da impetrante, retificando o seu quadro de convocação, para constar o candidato José Nilton Santos da Cruz como convocado pela 3ª colocação de ampla concorrência. Parecer da PRR1 pelo não provimento da remessa oficial.

2. Conclusão do Juízo no sentido de que o candidato José Nilton Santos da Cruz, por figurar na 3ª classificação de ampla concorrência, não deveria ter sido nomeado na vaga reservada para negro; e que, [c]om isso, a primeira vaga reservada a candidato negro, já objeto de nomeação, deveria ter sido da candidata Fernanda da Silva Machado, sendo a próxima vaga reservada a impetrante, por ser a próxima cotista negra da lista. (A) Conclusão em consonância com a jurisprudência do STF no sentido da constitucionalidade da Lei n° 12.990/2014, com a seguinte Tese de julgamento: É constitucional a reserva de 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública direta e indireta. É legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de heteroidentificação, desde que respeitada a dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a ampla defesa. (STF, ADC 41.) (B) Em consequência, o Juízo aplicou corretamente o disposto no Art. 3º, caput, e § 1º, da Lei 12.990, segundo os quais, [o]s candidatos negros concorrerão concomitantemente às vagas reservadas e às vagas destinadas à ampla concorrência, de acordo com a sua classificação no concurso; e [o]s candidatos negros aprovados dentro do número de vagas oferecido para ampla concorrência não serão computados para efeito do preenchimento das vagas reservadas. (C) Dessa forma, o candidato negro aprovado para as vagas destinadas à ampla concorrência não é computado nas vagas reservadas aos afrodescendentes.

3. Remessa oficial não provida.

(REOMS 1000635-94.2017.4.01.3300, JUIZ FEDERAL LEÃO APARECIDO ALVES (CONV.), TRF1 - QUINTA TURMA, PJe 01/02/2019 PAG.)

 

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. INSURGÊNCIA CONTRA REGRAS EDITÁLICIAS. VAGAS DESTINADAS ÀS PESSOAS NEGRAS E PARDAS. LEI 12.990/2014. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DO ÓRGÃO PROMOTOR DO CERTAME. EXCLUSÃO DE CANDIDATO DAS VAGAS RESERVADAS. IMPOSSIBILIDADE. ART. 3º DA LEI 12.990/04. SENTENÇA MANTIDA.

1. O órgão promotor do certame é o responsável por determinar as diretrizes constantes no edital regrador do concurso público, sendo, por isso, parte legítima para integrar o polo passivo do mandado de segurança quando a insurgência for contra suposta ilegalidade constante no edital, sendo a banca examinadora mera executora das determinações emanadas da referida autoridade.

2. O art. 3º da Lei 12.990/2014 dispõe que os candidatos negros concorrerão concomitantemente às vagas reservadas e às vagas destinadas à ampla concorrência, de acordo com a sua classificação no concurso.

3. A inteligência desse dispositivo deve ser compreendida com o sentido de que a nomeação do candidato negro ou pardo aprovado no certame deve ter realizada com base na melhor classificação por ele obtida para esse fim.

4. Ausência de razoabilidade na possibilidade de candidato aprovado com melhor classificação nas vagas reservadas ser preterido por outro com classificação inferior na mesma lista.

5. Compreensão de que o § 1º do art. 3º da Lei 12.990/14 visa apenas a garantir que o total final das vagas destinadas aos candidatos negros ou pardos será igual à soma do número desses candidatos aprovados pela ampla concorrência com a soma das vagas reservadas, mas sem possibilitar a indevida preterição do candidato que, aprovado em ambas as listas, terminaria sendo nomeado em momento posterior a outro candidato com colocação inferior à sua.

6. Remessa oficial e apelação a que se nega provimento.

(AMS 1008444-97.2015.4.01.3400, JUIZ FEDERAL ROBERTO CARLOS DE OLIVEIRA (CONV.), TRF1 - QUINTA TURMA, e-DJF1 02/04/2019 PAG.)

 

ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. MANDADO DE SEGURANÇA. VII CONCURSO PÚBLICO PARA PROVIMENTO DE CARGOS NA JUSTIÇA FEDERAL DE 1º E 2º GRAUS DA PRIMEIRA REGIÃO. COTAS PARA NEGROS, PRETOS OU PARDOS. CANDIDATA CONSIDERADA INAPTA PELA COMISSÃO AVALIADORA. NÃO ENQUADRAMENTO NA CONDIÇÃO DECLARADA. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ DO CANDIDATO. PEDIDO SUBSIDIÁRIO. REINCLUSÃO NO CERTAME PARA CONCORRER ÀS VAGAS GERAIS. CONCESSÃO DA ORDEM.

1. Mandado de segurança impetrado por candidato contra ato do Presidente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região e da Diretora-Geral do Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de Eventos (CEBRASPE) que a excluíram do VII Concurso Público para provimento de cargos na Justiça Federal da 1ª Região, objetivando a concessão da segurança para que seja ratificada sua autodeclaração de pessoa parda prestada na inscrição do certame, garantindo-lhe a reinclusão na posição classificatória nas vagas reservadas aos candidatos negros e pardos, bem como, na ampla concorrência, caso não seja acolhido este pedido.

2. Se o candidato é considerado inapto pela comissão avaliadora do certame da condição declarada para concorrer às vagas destinadas a negros, pretos ou pardos, deve lhe ser garantido o direito de concorrer às vagas destinadas à ampla concorrência, ante a evidente ausência de má-fé na sua declaração de pessoa parda.

3. O edital do concurso, em seu item 6.3, previa que: “Os candidatos negros concorrerão concomitantemente às vagas a eles reservadas e às vagas destinadas à ampla concorrência, de acordo com a sua classificação no concurso”.

4. O não reconhecimento pela banca examinadora da autodeclaração da candidata como pessoa parda, não pode ensejar a gravosa consequência de sua imediata exclusão do concurso, tendo em vista a existência de pedido subsidiário no sentido de que, caso não reconhecida sua condição de candidata cotista, se lhe garantisse o direito de concorrer às vagas destinadas à ampla concorrência.

5. Segurança concedida, em relação ao pedido subsidiário, para considerar a impetrante inscrita entre os candidatos concorrentes às vagas gerais do concurso, garantindo-se-lhe, em consequência, conforme requerido, que a candidata seja reintegrada na lista da ampla concorrência.

(MS 1012727-76.2018.4.01.0000, DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES, TRF1 - CORTE ESPECIAL, PJe 02/10/2020 PAG.)

 

TRF2:

ADMINISTRATIVO. REMESSA NECESSÁRIA. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. PROVIMENTO DE CARGO DE ENFERMEIRO GERAL DA UFRJ. APROVAÇÃO NAS ETAPAS OBJETIVA E PRÁTICA DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS DE AMPLA CONCORRÊNCIA. ELIMINAÇÃO DO CERTAME POR NÃO COMPARECIMENTO PERANTE A COMISSÃO DE AFERIÇÃO DA AUTODECLARAÇÃO RACIAL.

1. Trata-se de Mandado de Segurança impetrado em face do Reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, objetivando a concessão de ordem que suspenda o ato que eliminou o Impetrante do certame, em virtude do não comparecimento para aferição da veracidade de sua declaração racial, a fim de assegurar o regular prosseguimento do candidato no concurso público para o preenchimento do cargo C 301 - Enfermeiro Geral, nas vagas de livre concorrência.

2. Ao efetuar sua inscrição o candidato adere às normas previamente estabelecidas pelo edital do certame, que vinculam não só a Administração como os concorrentes, não sendo admissível conferir tratamento diferenciado, sob pena de violação aos princípios da isonomia, legalidade, publicidade e da transparência do processo seletivo, mormente porque todos os candidatos se submeteram às mesmas regras.

3. O Edital do concurso objeto do writ, em observância ao disposto no artigo 3º da Lei 12.990/2014 ("Os candidatos negros concorrerão concomitantemente às vagas reservadas e às vagas destinadas à ampla concorrência, de acordo com a sua classificação no concurso"), estabeleceu, no item 5.2, que "O candidato negro concorre em igualdade de condições com os demais candidatos às vagas de ampla concorrência e, ainda, às vagas reservadas aos negros do cargo/área de atuação para o qual se inscreveu ".

4. No caso em apreço o candidato, após lograr aprovação nas etapas objetiva e prática, foi eliminado do certame por não ter comparecido perante a Comissão encarregada para aferir a veracidade da autodeclaração racial, restando suficientemente comprovado nos autos que o não comparecimento deveu- se ao desconhecimento do candidato em relação a data designada, visto que nem o Edital nem o cronograma fixaram previamente uma data objetiva para a respectiva apresentação. Tal hipótese não se confunde com a previsão legal de eliminação decorrente de declaração falsa (art. 2º, parágrafo único, da Lei 12.990/2014).

5. Releva consignar que após o deferimento da liminar a Autoridade Impetrada informou que "a Comissão Executiva de Concursos da UFRJ resolve[u] aplicar o disposto para todos os demais candidatos que se encontram na mesma situação, por meio do Edital nº 339 de 27 de junho de 2017, publicado no D.O.U. Nº 122 de 28 de junho de 2017, págs.75 a 85, o qual retifica o Edital nº 99/2017, alterando a previsão de eliminação dos candidatos que faltaram a verificação de autodeclaração de negro, passando a integrar às vagas de ampla concorrência, seguindo, conforme o caso, nas fases que lhe foram suprimidas", denotando o reconhecimento do pedido.

6. Merece ser prestigiada a sentença que, constatando que "o Edital do Certame não traz como causa de eliminação do concurso o não comparecimento perante a comissão para aferição da autodeclaração, bem como de que nem o § 3º, do art. 2ª, da Orientação Normativa nº 3/2016, do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, nem o parágrafo único, do art. 2º, da Lei nº 2.990/2014, fixam como causa de eliminação o não comparecimento perante a comissão de aferição da autodeclaração", concluiu, com acerto, que "não existe justificativa legal para sua eliminação do certame e para afastar sua participação no concurso para concorrer às vagas destinadas a ampla concorrência", ressalvando que o Impetrante " não poderá concorrer às vagas reservadas". 7. Remessa ex officio desprovida.

(TRF2 REOAC 0131026-59.2017.4.02.5101, 8ª Turma Esp., Rel. Des. Fed. MARCELO PEREIRA DA SILVA, j. 18-06-2018)

 

TRF3:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. DIPLOMATA. LITISCONSÓRCIO. INOCORRÊNCIA. PRETERIÇÃO. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. INOBSERVÂNCIA. APELAÇÃO DA UNIÃO E REMESSA OFICIAL IMPROVIDAS.

- Preliminar de nulidade da r. sentença afastada: o Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que é dispensável a formação de litisconsórcio passivo entre o candidato e os demais concorrentes do certame (AgInt no REsp 1690488/MG; AgRg no AREsp 656.540/PI).

- No caso concreto, após ter sido convocado para a realização de exames admissionais por ter logrado alcançar a 20ª posição no concurso de admissão à carreira de diplomata (edital nº 11), o autor foi realocado de posições, em sucessivos editais, em razão de circunstâncias diversas, até a atingir a 23ª colocação da ampla concorrência, o que resultou em sua não nomeação para o cargo.

- Ocorre que, ao contrário dos editais anteriores, o edital de n.º 12 não observou o princípio da legalidade. Houve deslocamento de candidato para o grupo de aprovados em ampla concorrência. Com efeito, após a somatória das notas realizadas nos termos do item 9 do edital, o candidato que concorria como cotista “migrou” de grupo, tendo em vista que teria sido aprovado dentro do número de vagas oferecidas à ampla concorrência, nos termos do artigo 4.2.4 do edital, e em conformidade com o §1º do artigo 3º da Lei 12.990/2014.

- Porém, a “migração” do candidato cotista para a ampla concorrência foi feita de maneira irregular, vez que este obteve a 249ª posição na 1ª fase do concurso, sendo que apenas 225 candidatos eram aprovados em ampla concorrência (ID nº 1937055 – pág 60). Destarte, não fosse pelas cotas, o candidato não seria sequer aprovado na primeira fase. Assim, a organizadora fez constar durante todo o concurso que tal candidato concorria exclusivamente pela reserva de vagas.

- A redação do transcrito artigo 3º deve ser entendida no sentido de que os candidatos negros concorrerão também às vagas de ampla concorrência em igualdade plena de condições, inclusive no que diz respeito às barreiras eliminatórias dos concursos, sob pena de se ferir a isonomia.

- Diante de tal argumentação, considerando-se o candidato Douglas Nascimento Santana aprovado na reserva de vagas, de rigor, reconhecer o direito do apelado na manutenção de sua nomeação.

- Preliminar rejeitada. Apelação e remessa oficial improvidas.

(TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000962-04.2018.4.03.6105, Rel. Desembargador Federal MONICA AUTRAN MACHADO NOBRE, julgado em 19/02/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 26/02/2020)

 

PROCESSO CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - CONCURSO PÚBLICO - REGIME DE COTAS - CANDIDATO APROVADO DENTRO DAS VAGAS, EM AMPLA CONCORRÊNCIA - INAPLICABILIDADE DA AVALIAÇÃO FENOTÍPICA.

1- O C. Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do regime de cotas, assim como dos mecanismos de avaliação da autodeclaração, pela instituição interessada, no regime da Lei Federal nº. 12.711/12.

2- A avaliação da autodeclaração, na vigência da Lei Federal nº. 12.990/14, é regular.

3- A aprovação dentro das vagas destinadas à ampla concorrência afasta o regramento pertinente às vagas reservadas, nos termos do artigo 3º, § 1º, da Lei Federal nº. 12.990/14.

4- Nesse quadro, era desnecessária a verificação da autodeclaração, no caso específico do agravante.

5- Agravo de instrumento provido.

(TRF 3ª Região, 6ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5018754-16.2019.4.03.0000, Rel. Juiz Federal Convocado LEILA PAIVA MORRISON, julgado em 11/02/2020, Intimação via sistema DATA: 13/02/2020) 

 

Por fim, quanto à verba honorária, é de ser aplicada a regra da sucumbência recursal estabelecida no art. 85, parágrafo 11, do CPC-15, razão pela qual majoro-a para 15% sobre o valor da causa.

 

Posto isso, nego provimento à apelação, com majoração da verba honorária.

 

É como voto.



E M E N T A

 

CONCURSO PÚBLICO PARA PROVIMENTO DE CARGO DE TÉCNICO EM ASSUNTOS EDUCACIONAIS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DA GRANDE DOURADOS. CANDIDATO EMPOSSADO PELO SISTEMA DE COTAS (1º LUGAR), POR FORÇA DE LIMINAR POSTERIORMENTE REVOGADA. DIREITO DE SE MANTER NO CARGO POR FORÇA DE SUA CLASSIFICAÇÃO PELO SISTEMA DE AMPLA CONCORRÊNCIA (3º LUGAR). RECURSO DESPROVIDO.

1 – Preliminarmente, não há que se falar em coisa julgada, pois, embora as partes sejam as mesmas, a causa de pedir e o pedido são diversos, uma vez que, no mandado de segurança (posteriormente convertido em ação de rito ordinário) 0002561-86.2015.4.03.6002, a autora buscava a sua nomeação na condição de cotista (onde logrou classificar-se em primeiro lugar), sustentando ter havido alteração das regras no curso do certame, sendo que nesta demanda busca-se a nomeação no mesmo cargo, mas na condição de candidata da lista de ampla concorrência (na qual se classificou em terceiro lugar), sob fundamento de ter sido preterida na lista de classificação, pois no prazo de validade do concurso foram abertas mais vagas além daquelas previstas no edital, com nomeação de candidatos pior classificados.

2 – O efeito próprio de uma decisão revogadora de medida liminar é fazer as partes retornarem ao estado anterior ao da concessão da medida. Caso em que o retorno das partes ao estado anterior implica a aplicação das regras previstas no edital, tal como deixou assentada a decisão proferida no feito acima citado, quando firmou ser legítima a alteração da regra para fazer prevalecer o postulado da legalidade, sem alterar as demais regras do certame.

3 - Segundo as normas do edital, a nomeação e a convocação do candidato aprovado pressupõem atos da Administração, pela óbvia razão de que o controle das vagas abertas está sob sua gerência, tal como ocorreu, por exemplo, quando o candidato classificado em segundo lugar nas vagas destinadas à ampla concorrência pediu exoneração do cargo. Logo, não há que se falar em caber à autora pleitear a sua nomeação, na época própria, à vaga destinada à ampla concorrência, sob pena de eliminação do certame. Caso em que a própria Procuradoria de assistência jurídica da ré reconheceu ter havido falha da Administração nos “encaminhamentos internos”.

4 - É fato incontroverso que, no período de validade do certame, novas vagas foram abertas em número suficiente a atingir a colocação da autora no certame (3º lugar na listagem de ampla concorrência). Aplicação do precedente estabelecido pelo Plenário do STF no julgamento do RE 837.311, segundo o qual, surgindo novas vagas durante período de validade do certame e ocorrendo a preterição de candidato aprovado fora das vagas de forma arbitrária e imotivada por parte da Administração, “exsurge o direito subjetivo à nomeação”.

5 – O candidato cotista concorre em duas listas (a lista dos candidatos que concorrem pelo sistema da “ampla concorrência” – critério normal presente em qualquer concurso; e a listagem dos candidatos concorrentes às cotas), tendo direito de ser chamado naquela que lhe resultar melhor convocação. Assim, se por qualquer razão, deixa de figurar na relação dos cotistas, continua concorrendo entre os candidatos da lista de ampla concorrência, pois o objetivo da norma que criou o sistema de cotas no sistema de concorrência aos cargos públicos é a inclusão dos candidatos cotistas. Precedentes desta Corte e dos Regionais.

6 – A regra da sucumbência recursal estabelecida no art. 85, § 11, do CPC-15 determina que o Tribunal majore a verba honorária. Honorários advocatícios majorados para 15% sobre o valor da causa.

7 – Apelação não provida, com majoração da verba honorária.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação, com majoração da verba honorária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.