APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5001318-46.2022.4.03.6141
RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA
APELANTE: UNIÃO FEDERAL, COMANDANTE DA AERONÁUTICA DE SÃO PAULO UNIDADE SEREP - SERVIÇO DERECRUTAMENTO E PREPARO DE PESSOAL DA AERONÁUTICA
APELADO: JANE CRISTINA DO NASCIMENTO MALERES
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5001318-46.2022.4.03.6141 RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA APELANTE: UNIÃO FEDERAL, COMANDANTE DA AERONÁUTICA DE SÃO PAULO UNIDADE SEREP - SERVIÇO DERECRUTAMENTO E PREPARO DE PESSOAL DA AERONÁUTICA APELADO: JANE CRISTINA DO NASCIMENTO MALERES OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de remessa necessária e apelação interposta pela União Federal, contra sentença que concedeu a ordem em mandado de segurança impetrado por Jane Cristina do Nascimento Maleres, objetivando tutela jurisdicional que reconheça a ilegalidade de sua exclusão, na etapa da Inspeção de Saúde, do processo seletivo para convocação à prestação de serviço militar voluntário, em caráter temporário, na especialidade de Radiologia (Portaria DIRAP 116/3SM, de 29/12/2021) para o ano de 2021/2022, em São Paulo/SP. Em suas razões recursais, o ente público aduz Com contrarrazões, os autos vieram conclusos. É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5001318-46.2022.4.03.6141 RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA APELANTE: UNIÃO FEDERAL, COMANDANTE DA AERONÁUTICA DE SÃO PAULO UNIDADE SEREP - SERVIÇO DERECRUTAMENTO E PREPARO DE PESSOAL DA AERONÁUTICA APELADO: JANE CRISTINA DO NASCIMENTO MALERES OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A questão posta nos autos diz respeito à eliminação em processo seletivo, na etapa de Inspeção de Saúde. É pacífica a jurisprudência dos Tribunais Superiores no sentido de que, em concurso público, as etapas consistentes em testes de capacidade física e exames médicos somente podem ser exigidas se (i) houver previsão legal nesse sentido, (ii) a exigência tiver relação com as atribuições do cargo, (iii) a exigência estiver pautada em critérios objetivos, e (iv) o resultado for passível de recurso. Verbis: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. TESTE DE APTIDÃO FÍSICA. PREVISÃO EM LEI. CRITÉRIOS OBJETIVOS. POSSIBILIDADE. ALEGAÇÃO NÃO APRECIADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DESCABIMENTO. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. In casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015. II - A submissão de candidatos em concurso público ao teste de aptidão física é legítima quando houver, além da observância de critérios objetivos, previsão em lei e no edital. Precedentes. III - É firme o entendimento nesta Corte segundo o qual "é vedada, no julgamento de recurso ordinário em mandado de segurança, a apreciação de matéria não abordada pelo Tribunal de origem, sob pena de supressão de instância" (RMS 31.400/TO, 6ªT., Rel. Min. Maria Thereza De Assis Moura, DJe 27/8/2012). Precedentes. IV - Não apresentação de argumentos suficientes para desconstituir a decisão recorrida. V - Em regra, descabe a imposição da multa, prevista no art. 1.021, § 4º, do Código de Processo Civil de 2015, em razão do mero improvimento do Agravo Interno em votação unânime, sendo necessária a configuração da manifesta inadmissibilidade ou improcedência do recurso a autorizar sua aplicação, o que não ocorreu no caso. VI - Agravo Interno improvido. (AgInt nos EDcl no RMS 56.200/PE, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 07/08/2018, DJe 14/08/2018) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. POLICIAL MILITAR. CURSO DE FORMAÇÃO. EDITAL SAEB/01/2008. REPROVAÇÃO NO RETESTE. NÚMERO MÍNIMO DE FLEXÕES NÃO REALIZADO. ILEGALIDADE NÃO CONFIGURADA. DIREITO LÍQUIDO E CERTO NÃO DEMONSTRADO. 1. Trata-se, na origem, de Mandado de Segurança impetrado contra ato atribuído ao Secretário de Administração do Estado da Bahia e ao Comandante-Geral da Polícia Militar do Estado, com o objetivo de efetuar matrícula no Curso de Formação de Soldado e permitir que o impetrante seja submetido a nova avaliação nas provas em que não conseguiu atingir os índices mínimos. 2. O Superior Tribunal de Justiça reprime testes físicos em concursos públicos realizados segundo critérios subjetivos do avaliador, bem como a ocorrência de sigilo no resultado do exame e de irrecorribilidade, sob pena de violação dos princípios da legalidade e da impessoalidade. Ocorre que nenhuma dessas situações é verificada no caso. 3. Compulsando os autos, verifico que o impetrante foi eliminado porque foi reprovado no teste de aptidão física - especificamente no teste da Barra Fixa - em concurso destinado ao provimento de vagas para a seleção de candidatos ao Curso de Formação de Soldado da Polícia Militar Edital SAEB/01/2008. 4. Tal ato administrativo não pode ser considerado irrazoável, porquanto: a) a aprovação no teste de aptidão física está prevista em edital, b) o critério utilizado é objetivo e c) a exigência é compatível com as atribuições do cargo de policial. 5. Assim sendo, não atingidos pelo insurgente os critérios de ordem objetiva exigidos no edital, demonstrada a inaptidão do candidato para o cargo almejado, já que reprovado nos testes de esforço físico realizados, e ausente a comprovação de subjetividade, arbitrariedade ou falta de motivação do avaliador, não vejo configurado o direito líquido e certo do impetrante. Precedentes: AgRg no RMS 38.424/BA, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 30.11.2012; e RMS 32.851/BA, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 25.5.2011. 6. O agravante não trouxe qualquer argumento capaz de infirmar os fundamentos da decisão recorrida e demonstrar a ofensa ao direito líquido e certo. 7. Agravo Regimental não provido. (AgRg no RMS 39.181/BA, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/11/2014, DJe 02/12/2014) De acordo com item 5.5.3, g, do Aviso de Convocação, na etapa de Inspeção de Saúde, para as candidatas do sexo feminino, exige-se a apresentação laudo de exame citopatológico (Preventivo do Câncer Ginecológico), cuja realização não ultrapasse 180 da data do último dia previsto para a INSPSAU. Nesse contexto, a impetrante apresentou atestado médico que estava impossibilitada da realização do referido exame na ocasião, em razão do acometimento de dismenorreia secundária, conforme indicado pelo CID 10 N94.5, mencionado no documento (ID 267477246 – fl. 6). Ocorre que a mencionada exigência tem previsão apenas em ato normativo infralegal, qual seja, nas Instruções Técnicas das Inspeções de Saúde na Aeronáutica – ICA 160-6, aprovadas pelo Ministério da Defesa mediante a Portaria DIRSA nº 79/SECSCTEC de 22/05/2012. Embora tal regulamento tenha sido editado com respaldo na Lei 12.464/11, este diploma, por sua vez, traz apenas previsões genéricas, e estabelece que os exames médicos requeridos serão aqueles que demonstrem a inexistência de característica ou patologia incompatível com as atividades a serem desempenhadas. Observa-se: Art. 20. Para o ingresso na Aeronáutica e habilitação à matrícula em um dos cursos ou estágios da Aeronáutica destinados à formação ou adaptação de oficiais e de praças, da ativa e da reserva, o candidato deverá atender aos seguintes requisitos: I - ser aprovado em processo seletivo, que pode ser composto por exame de provas ou provas e títulos, prova prático-oral, prova prática, inspeção de saúde, teste de avaliação do condicionamento físico, exame de aptidão psicológica e teste de aptidão motora; (...) § 5º A inspeção de saúde do processo seletivo avaliará as condições de saúde dos candidatos, por meio de exames clínicos, de imagem e laboratoriais, inclusive toxicológicos, definidos em instruções da Aeronáutica, de modo a comprovar não existir patologia ou característica incapacitante para o serviço militar nem para as atividades previstas. Ademais, conforme bem decidido em primeira instância, a exigência de exame ginecológico invasivo não guarda qualquer pertinência com a vaga pretendida e viola os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, ao extrapolar a necessidade de demonstração de boa saúde física e mental para o desempenho das funções. Verbis: PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TUTELA DE URGÊNCIA. CONCURSO PÚBLICO. INGRESSO EM CARGOS DE TÉCNICO E ANALISTA DO INSS. EXIGÊNCIA DE EXAMES MÉDICOS DE COLPOSCOPIA E CITOLOGIA ONCÓTICA. DESPROPORCIONALIDADE. PROBABILIDADE DO DIREITO. PERIGO DE DANO. 1. O artigo 37, I, primeira parte, da Constituição Federal determina que os cargos, empregos ou funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei. O inciso II do mesmo dispositivo prevê que a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e título, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei. 2. A conferir aplicabilidade às normas constitucionais acima, a Lei n° 8.112/90, denominada Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União, dispõe que: “Art. 14. A posse em cargo público dependerá de prévia inspeção médica oficial. Parágrafo único. Só poderá ser empossado aquele que for julgado apto física e mentalmente para o exercício do cargo.”. 3. Embora os exames de colposcopia e citologia oncótica visem detectar a presença do HPV (vírus do papiloma humano), que é a principal causa do câncer no colo do útero, sendo a saúde direito de todos e dever do Estado, nos termos do artigo 206 da Constituição Federal, o Poder Público deve promovê-la através de políticas públicas específicas, e não por meio de imposição de condição para admissão nos quadros de pessoal da Administração Pública. 4. Ainda que fosse detectada alguma moléstia nesses exames, como HPV ou mesmo câncer no colo do útero, não implicaria necessariamente na inaptidão de mulheres para o exercício dos cargos de Técnico ou Analista do INSS, pois não se revelam incompatíveis com as atribuições desses cargos, mormente quando esta moléstia mais grave pode ser detectada através de outros exames considerados menos invasivos. 5. A eliminação de candidato, por ser portador de doença ou limitação física que não o impede de exercer as atividades inerentes ao cargo, viola o princípio da isonomia, da razoabilidade e da dignidade da pessoa humana, inexistindo plausibilidade em eventual pretensão de impedir sua investidura no cargo para o qual logrou aprovação em concurso público, baseada em mera possibilidade de evolução de doença. 6. O perigo de dano ou o risco ao resulta útil do processo advém da violação aos direitos fundamentais à intimidade e à vida privada de submissão a tais exames das candidatas aprovadas que podem ser nomeadas para os cargos públicos nos próximos meses. 7. Agravo de instrumento provido para que seja afastada a exigência de realização de exames de colposcopia e citologia oncótica para investidura nos cargos de Técnico e Analista do INSS, para candidatas aprovadas no concurso público iniciado em 2015, sem prejuízo da realização de outros exames médicos. (TRF 3ª Região, 3ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5003547-45.2017.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal ANTONIO CARLOS CEDENHO, julgado em 03/08/2017, Intimação via sistema DATA: 08/08/2017) Inexistem, pois, razões à reforma da sentença. Em face do exposto, nego provimento à apelação e à remessa necessária. É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. EXIGÊNCIA DE EXAME GINECOLÓGICO EM PROCESSO SELETIVO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. FALTA DE PERTINÊNCIA COM AS FUNÇÕES A SEREM DESEMPENHADAS. DESPROPORCIONALIDADE.
1. A questão posta nos autos diz respeito à eliminação em processo seletivo, na etapa de Inspeção de Saúde.
2. É pacífica a jurisprudência dos Tribunais Superiores no sentido de que, em concurso público, as etapas consistentes em testes de capacidade física e exames médicos somente podem ser exigidas se (i) houver previsão legal nesse sentido, (ii) a exigência tiver relação com as atribuições do cargo, (iii) a exigência estiver pautada em critérios objetivos, e (iv) o resultado for passível de recurso.
3. De acordo com item 5.5.3, g, do Aviso de Convocação, na etapa de Inspeção de Saúde, para as candidatas do sexo feminino, exige-se a apresentação laudo de exame citopatológico (Preventivo do Câncer Ginecológico), cuja realização não ultrapasse 180 da data do último dia previsto para a INSPSAU.
4. Nesse contexto, a impetrante apresentou atestado médico que estava impossibilitada da realização do referido exame na ocasião, em razão do acometimento de dismenorreia secundária, conforme indicado pelo CID 10 N94.5, mencionado no documento (ID 267477246 – fl. 6).
5. Ocorre que a mencionada exigência tem previsão apenas em ato normativo infralegal, qual seja, nas Instruções Técnicas das Inspeções de Saúde na Aeronáutica – ICA 160-6, aprovadas pelo Ministério da Defesa mediante a Portaria DIRSA nº 79/SECSCTEC de 22/05/2012. Embora tal regulamento tenha sido editado com respaldo na Lei 12.464/11, este diploma, por sua vez, traz apenas previsões genéricas, e estabelece que os exames médicos requeridos serão aqueles que demonstrem a inexistência de característica ou patologia incompatível com as atividades a serem desempenhadas, nos termos de seu art. 20, §5º.
6. Conforme bem decidido em primeira instância, a exigência de exame ginecológico invasivo não guarda qualquer pertinência com a vaga pretendida e viola os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, ao extrapolar a necessidade de demonstração de boa saúde física e mental para o desempenho das funções.
7. Apelação improvida.