APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002798-64.2018.4.03.6120
RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA
APELANTE: CLUBE NAUTICO ARARAQUARA
Advogados do(a) APELANTE: FERNANDO CORREA DA SILVA - SP80833-A, MARIANA DIAS DE MELO PITA - BA68112
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002798-64.2018.4.03.6120 RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA APELANTE: CLUBE NAUTICO ARARAQUARA Advogado do(a) APELANTE: FERNANDO CORREA DA SILVA - SP80833-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação interposto por Clube Náutico Araraquara em face da r. sentença de id 128817538, que julgou improcedentes os pedidos e condenou o autor em honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa atualizado. Relata o apelante, em síntese, que sua sede campestre possui área total de 664 ha, sendo 380,4 ha relativos à área de reserva legal; 202,3 ha ocupados com benfeitorias úteis e necessárias e 81,3 ha de área aproveitável, essa última sobre a qual recai o ITR. Afirma que foi instaurado processo administrativo fiscal que culminou com o lançamento do ITR também sobre a área com benfeitorias, área que não é aproveitável (cf. art. 10, § 1º, I, “a”, Lei nº 9.393/1996 c.c art. 16, II, do Decreto nº 4.382/2002). Alega que, embora indeferida a produção de prova, a sentença entendeu como provada a existência das benfeitorias, somente não as qualificando como úteis e necessárias a ocasionar a exclusão da área respectiva do cálculo do imposto. Assim, caso se entenda que a perícia é imprescindível para dirimir a lide, a r. sentença deve ser declarada nula. Afirma que é ilógico admitir que apenas no exercício de 2005 as benfeitorias inexistiam ou que foram demolidas e reconstruídas em 2006, exatamente como eram em 2004. Requer a reforma da sentença para declarar a nulidade do ato administrativo atinente à mantença da Notificação de Lançamento n. 08122/00006/2008, de 22/09/2008, no que concerne à consideração da área de 202,3 ha ocupada com benfeitorias para fins de cálculo do Imposto Territorial Rural – ITR do exercício de 2005, e, consequentemente, invertidos os ônus sucumbenciais. Subsidiariamente, entendendo-se pela necessidade da perícia para o livre convencimento motivado, e já recebido e processado o presente recurso, pede-se o seu provimento, de modo que seja declarada a nulidade da r. sentença pelo julgamento prematuro da lide, com ordem de remessa dos autos à primeira instância a fim de que se retome a fase instrutória. Com contrarrazões, os autos subiram a esta e. Corte. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002798-64.2018.4.03.6120 RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA APELANTE: CLUBE NAUTICO ARARAQUARA Advogado do(a) APELANTE: FERNANDO CORREA DA SILVA - SP80833-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Cinge-se a controvérsia a respeito da caracterização da área declarada como ocupada com benfeitorias úteis e necessárias para fins de cálculo do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural - ITR. O imposto sobre a propriedade territorial rural, de competência da União, na forma do art. 153, VI, da Constituição, incide nas hipóteses previstas no art. 29 do Código Tributário Nacional. Confira-se: Art. 29. O imposto, de competência da União, sobre a propriedade territorial rural tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de imóvel por natureza, como definido na lei civil, localizado fora da zona urbana do Município. O fato gerador do ITR é a propriedade, o domínio útil ou a posse de imóvel por natureza, localizado fora da zona urbana do município, em 1º de janeiro de cada ano. Para fins de cálculo do ITR, considera-se imóvel rural a área contínua, formada de uma ou mais parcelas de terras confrontantes, do mesmo titular, localizada na zona rural do município, ainda que, em relação a alguma parte da área, o contribuinte detenha apenas a posse com animus domini (Lei nº 9.393/1996, art. 1º, § 2º; RITR/2002, art. 9º; IN SRF nº 256, de 2002, art. 8º). A área total do imóvel rural compõe-se de áreas não-tributáveis e tributáveis. As áreas tributáveis podem ser: a) áreas aproveitáveis: - utilizadas ou não pela atividade rural; b) áreas ocupadas por benfeitorias úteis e necessárias à atividade rural, exceto as empregadas diretamente na exploração de atividade granjeira ou aquícola. O artigo 30, CTN, dispõe que a base de cálculo do imposto é o valor fundiário, traduzido não apenas pela titularidade do domínio do imóvel rural, mas antes pela gradação da viabilidade de utilização e exploração econômica e social da propriedade. A base de cálculo do ITR é o Valor da Terra Nua Tributável - VTNt (Lei nº 9.393/1996, arts. 10, § 1º, incisos I e III, e 11; RITR/2002, arts. 32 e 33; IN SRF nº 256/2002, arts. 32 e 33). Para se chegar ao Valor da Terra Nua Tributável (VTNt), assim determina o art. 10 da Lei nº 9.393/1996: Art. 10. A apuração e o pagamento do ITR serão efetuados pelo contribuinte, independentemente de prévio procedimento da administração tributária, nos prazos e condições estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal, sujeitando-se a homologação posterior. § 1º Para os efeitos de apuração do ITR, considerar-se-á: I - VTN, o valor do imóvel, excluídos os valores relativos a: a) construções, instalações e benfeitorias; III - VTNt, o valor da terra nua tributável, obtido pela multiplicação do VTN pelo quociente entre a área tributável e a área total; IV - área aproveitável, a que for passível de exploração agrícola, pecuária, granjeira, aqüícola ou florestal, excluídas as áreas: a) ocupadas por benfeitorias úteis e necessárias; b) de que tratam as alíneas do inciso II deste parágrafo; (Redação dada pela Lei nº 11.428, de 2006) V - área efetivamente utilizada, a porção do imóvel que no ano anterior tenha: a) sido plantada com produtos vegetais; VI - Grau de Utilização - GU, a relação percentual entre a área efetivamente utilizada e a área aproveitável. São consideradas benfeitorias úteis e necessárias àquelas destinadas à atividade rural, podendo, assim, serem excluídas da área aproveitável do imóvel. Confira-se o Decreto nº 4.382/2002: Seção IV - Da Área Aproveitável Art. 16. Área aproveitável, passível de exploração agrícola, pecuária, granjeira, aqüícola ou florestal, é a área total do imóvel, excluídas (Lei nº 9.393, de 1996, art. 10, § 1º, inciso IV): Benfeitorias Úteis e Necessárias Art. 17. Para fins do disposto no inciso II do art. 16, consideram-se ocupadas por benfeitorias úteis e necessárias (Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916 - Código Civil, art. 63): Como bem observou o juízo a quo, "o Decreto n. 4.382/2002 refere-se a ‘benfeitoria’ em contextos distintos, um para apuração da área aproveitável, como visto no artigo 17, acima transcrito, outro para apuração do valor da terra nua (VTN) no artigo 32, §2º, e nesse caso mencionando expressamente as que não se relacionam à atividade rural: Art. 32. O Valor da Terra Nua - VTN é o valor de mercado do imóvel, excluídos os valores de mercado relativos a (Lei nº 9.393, de 1996, art. 8º, § 2º, art. 10, §1º, inciso I): I - construções, instalações e benfeitorias; II - culturas permanentes e temporárias; III - pastagens cultivadas e melhoradas; IV - florestas plantadas. (...) § 2º Incluem-se no conceito de construções, instalações e benfeitorias, os prédios, depósitos, galpões, casas de trabalhadores, estábulos, currais, mangueiras, aviários, pocilgas e outras instalações para abrigo ou tratamento de animais, terreiros e similares para secagem de produtos agrícolas, eletricidade rural, colocação de água subterrânea, abastecimento ou distribuição de águas, barragens, represas, tanques, cercas e, ainda, as benfeitorias não relacionadas com a atividade rural. O conceito de Valor de Terra Nua (VTN) estabelece a exclusão das benfeitorias do cálculo. O valor do ITR é obtido mediante a multiplicação do VTNt pela alíquota correspondente, considerados a área total e o grau de utilização (GU) do imóvel rural, que é a relação percentual entre a área efetivamente utilizada pela atividade rural e a área aproveitável do imóvel rural. O autor informou na Declaração de Informação e Apuração do ITR - DIAT, no quadro Distribuição da Área do Imóvel Rural, o montante de 202,3 ha como Área Ocupada com Benfeitorias Úteis e Necessárias Destinadas à Atividade Rural, visando à exclusão dessa área da incidência do ITR. Conforme se extrai do exame do processo administrativo nº 13851-720.153/2008-63, a parte autora foi autuada em razão da constatação das seguintes irregularidades na apuração do ITR: a) área de reserva legal não comprovada; b) valor da terra nua declarado não comprovado; c) área de benfeitorias não comprovada. A legislação que rege o ITR não estabeleceu a forma para a comprovação das benfeitorias existentes no imóvel, não havendo, portanto, que exigir respeito às normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT como consta na autuação fiscal que, inclusive, considerou no cálculo a área de reserva legal, afastada em recurso pelo CARF, conforme acórdão n. 2101-001.974 da 1ª Câmara/1ª Turma Ordinária. Observa-se que a autoridade fiscal recorreu à técnica de arbitramento por falta de comprovação do valor da terra nua declarado pelo contribuinte, com fundamento no art. 14 da Lei nº 9.393/1996. Portanto, a controvérsia nos autos reside sobre a comprovação da extensão da área declarada por benfeitorias úteis e necessárias para fins da DITR 2005. Embora a Administração possa sempre rever seus atos, observa-se que os dados apresentados pelo contribuinte para o cálculo do ITR são os mesmos nos exercícios de 2004 e 2006. Considerando que pairam dúvidas quanto a ocupação da área de 202,3 ha com benfeitorias para fins de cálculo do tributo, é prudente que seja realizada a prova pericial, por profissional técnico legalmente habilitado, devendo ser levantados os dados necessários, nos termos do art. 464 do CPC. Em face do exposto, dou provimento ao recurso de apelação para declarar nula a r. sentença a fim de que se retome à fase instrutória para elucidar a questão, conforme fundamentação supracitada. É como voto.
(...)
b) servido de pastagem, nativa ou plantada, observados índices de lotação por zona de pecuária;
c) sido objeto de exploração extrativa, observados os índices de rendimento por produto e a legislação ambiental;
d) servido para exploração de atividades granjeira e aqüícola;
e) sido o objeto de implantação de projeto técnico, nos termos do art. 7º da Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993;
I - as áreas não tributáveis a que se referem os incisos I a VI do art. 10;
II - as áreas ocupadas com benfeitorias úteis e necessárias.
I - as áreas com casas de moradia, galpões para armazenamento da produção, banheiros para gado, valas, silos, currais, açudes e estradas internas e de acesso;
II - as áreas com edificações e instalações destinadas a atividades educacionais, recreativas e de assistência à saúde dos trabalhadores rurais;
III - as áreas com instalações de beneficiamento ou transformação da produção agropecuária e de seu armazenamento;
IV - outras instalações que se destinem a aumentar ou facilitar o uso do imóvel rural, bem assim a conservá-lo ou evitar que ele se deteriore.
E M E N T A
DIREITO TRIBUTÁRIO. IMPOSTO TERRITORIAL RURAL. BASE DE CÁLCULO. VALOR DA TERRA NUA. BENFEITORIAS ÚTEIS E NECESSÁRIAS. REVISÃO DO LANÇAMENTO. NECESSIDADE DE PERÍCIA TÉCNICA. RECURSO DE APELAÇÃO PROVIDO. SENTENÇA ANULADA.
1 - O imposto sobre a propriedade territorial rural, de competência da União, na forma do art. 153, VI, da Constituição, incide nas hipóteses previstas no art. 29 do Código Tributário Nacional.
2 - O fato gerador do ITR é a propriedade, o domínio útil ou a posse de imóvel por natureza, localizado fora da zona urbana do município, em 1º de janeiro de cada ano.
3 - A base de cálculo do ITR é o Valor da Terra Nua Tributável - VTNt (Lei nº 9.393/1996, arts. 10, § 1º, incisos I e III, e 11; RITR/2002, arts. 32 e 33; IN SRF nº 256/2002, arts. 32 e 33).
4 - O conceito de Valor de Terra Nua (VTN) estabelece a exclusão das benfeitorias do cálculo.
5 - O valor do ITR é obtido mediante a multiplicação do VTNt pela alíquota correspondente, considerados a área total e o grau de utilização (GU) do imóvel rural, que é a relação percentual entre a área efetivamente utilizada pela atividade rural e a área aproveitável do imóvel rural.
6 - O autor informou na Declaração de Informação e Apuração do ITR - DIAT, no quadro Distribuição da Área do Imóvel Rural, o montante de 202,3 ha como Área Ocupada com Benfeitorias Úteis e Necessárias Destinadas à Atividade Rural, visando à exclusão dessa área da incidência do ITR.
7 - A autoridade fiscal recorreu à técnica de arbitramento por falta de comprovação do valor da terra nua declarado pelo contribuinte, com fundamento no art. 14 da Lei nº 9.393/1996.
8 - Embora a Administração possa sempre rever seus atos, observa-se que os dados apresentados pelo contribuinte para o cálculo do ITR são os mesmos nos exercícios de 2004 e 2006.
9 - Considerando que pairam dúvidas quanto à ocupação da área de 202,3 ha com benfeitorias para de cálculo do tributo, é prudente que seja realizada a prova pericial, por profissional técnico legalmente habilitado, devendo ser levantados os dados necessários, nos termos do art. 464 do CPC.
10 - Recurso de apelação provido.