INCIDENTE DE ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE CÍVEL (216) Nº 0017774-71.2011.4.03.6100
RELATOR: Gab. DES. FED. DAVID DANTAS
ARGUINTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
ARGUIDO: MULTIGRAIN S.A.
Advogado do(a) ARGUIDO: MEIRE MARQUES MICONI - SP198821
OUTROS PARTICIPANTES:
INCIDENTE DE ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE CÍVEL (216) Nº 0017774-71.2011.4.03.6100 RELATOR: Gab. DES. FED. DAVID DANTAS ARGUINTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL ARGUIDO: MULTIGRAIN S.A. Advogado do(a) ARGUIDO: MEIRE MARQUES MICONI - SP198821 OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS: Trata-se de Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade Cível, calcado no art. 97 da Constituição Federal, Súmula Vinculante 10 do Supremo Tribunal Federal e art. 481 do Código de Processo Civil de 1973, distribuído neste Órgão Especial por força de decisão da E. 3ª Turma desta Corte, que, à unanimidade, nos autos originários de mandado de segurança preventivo, com pedido de liminar “inaudita altera pars”, impetrado por Multigrain S. A. contra “Delegado da Receita Federal do Brasil de Administração Tributária em São Paulo – DERAT”, “para determinar que a autoridade Impetrada se abstenha de aplicar a multa constantes (sic) dos parágrafos 15 e 17, do artigo 74, da Lei n.° 9.430/96, com redação dada pelo artigo 62, da Lei n.° 12.249/10, em caso de mero indeferimento de pedido de ressarcimento/compensação, ressalvada a possibilidade de incidência de multa nas hipóteses de comprovação de má-fé”, decidiu (fls. 239-249): “Em suma, tratando-se de discussão a envolver impugnação à valia constitucional de lei federal, cujo mérito deve ser apreciado pelo Órgão Especial da Corte, em observância à cláusula constitucional de reserva (artigo 97, CF) e Súmula Vinculante 10/STF, voto por reconhecer como relevante e admissível a alegação do contribuinte para suspender o julgamento da apelação e da remessa oficial com o envio dos autos ao Órgão Especial da Corte para a deliberação que lhe cabe, nos termos do artigo 481 do Código de Processo Civil.” Registremos a ementa do aresto em consideração (fls. 250-253): “DIREITO CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. RESTITUIÇÃO E COMPENSAÇÃO. MULTA. ARTIGO 74, § 1°, LEI 9.430/1996, REDAÇÃO DA LEI 12.249/2010. LEI 13.097/2015. MP 656/2014. MP 668/2015. ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. EXAME DE RELEVÂNCIA. ÓRGÃO ESPECIAL. ARTIGO 97, CF. RESERVA DE PLENÁRIO. SUSPENSÃO DO FEITO JUNTO À TURMA. 1. Relevante a arguição de inconstitucionalidade quanto à previsão de multa, contida no artigo 74, §§ 15 e 17, da Lei 9.430/1996, com redação dada pela Lei 12.249/2010, alterada pela Lei 13.097/2015. 2. Conquanto revogado o § 15 pela MP 656/2014 e, depois, pela MP 668/2015, e alterada a redação do § 17 pela MP 656/2014, convertida na Lei 13.097/2015, subsiste interesse processual na discussão, pois as normas, na respectiva vigência, produziram efeitos, cuja constitucionalidade é discutida, não se confundindo as consequências da revogação da lei no controle concentrado e no controle difuso: precedentes do Supremo Tribunal Federal. 3. As multas isoladas, fixadas em 50% do crédito discutido, devem ser aplicadas, segundo a legislação, se declarado indevido o valor ou indeferido o ressarcimento, ou não homologada a compensação, tenha ou não agido o contribuinte de má-fé, pois somente no § 16 - que não é objeto desta ação, mas que foi igualmente revogado pela MP 656/2014 e MP 668/2015 - havia previsão diferenciada para a aplicação da multa de 100% (em vez de 50%) ‘na hipótese de ressarcimento obtido com falsidade no pedido apresentado pelo sujeito passivo’. 4. Como consta claramente dos textos censurados e, tal qual alegado pela PFN, a imposição da multa independe de qualquer análise subjetiva, decorre simplesmente do fato objetivo de ser reputado indevido o crédito, pelo Fisco, ou, por outro motivo, for indeferido o pedido de ressarcimento, ou não homologada a compensação. 5. No plano legal, a intenção do agente, ou a natureza e os efeitos da infração, não eximem o contribuinte da responsabilidade tributária, salvo preceito legal expresso em contrário (artigo 136, CTN); porém tal orientação normativa tem sido mitigada, em certa medida, pela jurisprudência, em favor da boa-fé e em casos de comprovada falta de dano ao erário. 6. As inúmeras hipóteses abrangidas pelas possibilidades das normas, consideradas situações em que possível reputar indevido o crédito ou indeferido o pleito de ressarcimento, ou não homologada a compensação, demonstram que, mesmo o propósito declarado pelo Fisco para a defesa da validade constitucional das imposições, consistente em inibir abusos ou negligências em contrapartida a benefícios decorrentes da simplificação de procedimentos para agilizar a análise fiscal, não pode ser aceito para, razoavelmente, legitimar ou justificar, a título de garantia, a penalidade de que tratam os preceitos impugnados. 7. Se a intenção do legislador foi coibir abusos e negligências, razoável, adequado e proporcional seria condicionar a imposição de tais sanções à apuração de situações de abusos e negligências - como, por exemplo, quando prestadas informações falsas, imprecisas ou incoerentes para auferir vantagem indevida -, de sorte a excluir da incidência das normas as situações em que o contribuinte tiver agido com erro escusável, por dúvida razoável na exegese do direito e em outros casos que não permitam ver a má-fé nem elidam a presunção geral de boa-fé do postulante. 8. A infração, que gera responsabilidade objetiva, consiste na violação omissiva ou comissiva de obrigação tributária, principal ou acessória, condizente com pagamento do tributo ou penalidades pecuniárias, ou com realização de prestações positivas ou negativas previstas na lei no interesse da arrecadação ou fiscalização tributária (artigo 113, CTN). 9. O ressarcimento e compensação são formas de restituição frente a pagamento indevido ou a maior, em variadas hipóteses (artigo 165, CTN), ou de percepção de crédito concedido por lei, tendo como devedor o Fisco e, como credor, o contribuinte. Na medida em que configuram pretensões deduzidas pelo contribuinte para exame administrativo, ainda que a lei confira ou possa dar efeito imediato aos pedidos - como no caso das declarações de compensação -, é certo que somente a decisão administrativa, em si, consolida resultados jurídicos. 10. A imposição de multa, na forma prevista em tais preceitos, inibe o direito de petição, não apenas de contribuintes de má-fé, mas dos que estejam em dúvida ou não possam ter certeza absoluta e objetiva acerca do direito pleiteado, em razão da própria controvérsia em torno da lei, do enquadramento do fato ou da interpretação fiscal ou judicial pertinente ou vigente, tratando-os de um modo equivalente, quando evidentemente há distinção de essência a ser considerada, em termos de situação e conduta objetiva. Tanto é assim que a própria PFN disse, claramente, que o contribuinte em dúvida pode formular consulta, porém a mera possibilidade de tal procedimento, que têm características próprias, não ampara, tutela nem justifica proteção efetiva para a amplitude de contribuintes e situações jurídicas que estão sob o efeito da sanção pecuniária pelo exercício do direito de petição. 11. Existe evidente desproporção entre a finalidade, que teria motivado a edição das normas, e a forma adotada para atingi-la, na medida em que para ser evitado abuso, fraude e má-fé em pedidos de ressarcimento e compensação, para proteção do erário, diante das dificuldades administrativas de processamento e de apreciação dos requerimentos, a tempo e modo, diante do excesso de demanda, instituiu-se multa de valor significativo capaz de atingir contribuintes de boa-fé - ainda que os pedidos possam ser improcedentes - e, assim, gerar receita indevida e enriquecimento sem causa. 12. Afigura-se, pois, relevante a arguição de inconstitucionalidade do § 15 do artigo 74 da Lei 9.430/1996, com a redação dada pela Lei 12.249/2010, no período da respectiva vigência, ou seja, até a sua revogação pela MP 656, de 07/10/2014, e, depois, pela MP 668, de 30/01/2015, atualmente vigente; assim como do § 17 do artigo 74 da Lei 9.430/1996, cuja redação, seja durante a vigência da Lei 12.249/2010, seja a partir da MP 656, de 07/10/2014, que foi convertida na Lei 13.097, de 19/01/2015, foi fundamentalmente a mesma, no que diz respeito à imposição de multa isolada de 50% sobre o valor do crédito (ou ‘débito’, a partir da MP 656/2014, convertida na Lei 13.097/2015) objeto da declaração de compensação não homologada, salvo no caso de falsidade da declaração apresentada pelo sujeito passivo. 13. Na cognição cabível perante a Turma, basta o reconhecimento da plausibilidade jurídica da inconstitucionalidade para sujeição da questão ao Órgão Especial, ao qual cabe dizer sobre o cabimento da arguição e, no mérito, se existe vício de inconstitucionalidade e se a declaração deve ser integral, parcial, sem redução de texto ou com interpretação conforme. 14. Arguição de inconstitucionalidade acolhida, para remessa dos autos ao Órgão Especial, suspenso o julgamento da apelação e da remessa oficial no âmbito da Turma até a conclusão do exame do incidente.” Redistribuição ao C. Órgão Especial desta Casa (fl. 258). Aberta vista à Procuradoria Regional da República (fl. 264). Parecer do “Parquet” Federal (fl. 267) a reiterar o anteriormente exarado, quanto “a alegação de inconstitucionalidade do artigo 74, §§ 15 e 17 da Lei n° 9.430/1996”, a saber, “pelo desprovimento dos recursos” (fls. 231-233). Sobrestamento do feito, haja vista a questão debatida estar sob apreciação do Supremo Tribunal Federal, no RE 796939/RS, com repercussão geral reconhecida (fls. 268-269). Comunicado o julgamento do Recurso Extraordinário 796939/RS (fls. 296-298). Levantamento da suspensão do processo, vista às partes e, após, ao Ministério Público Federal (fl. 299). Manifestações da Fazenda Nacional e do “Parquet” Federal para prosseguimento do processo (fls. 301-302). É o relatório.
INCIDENTE DE ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE CÍVEL (216) Nº 0017774-71.2011.4.03.6100 RELATOR: Gab. DES. FED. DAVID DANTAS ARGUINTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL ARGUIDO: MULTIGRAIN S.A. Advogado do(a) ARGUIDO: MEIRE MARQUES MICONI - SP198821 OUTROS PARTICIPANTES: V O T O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS: Cuida-se de Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade Cível, inaugurado neste Órgão Especial por força de decisão da E. 3ª Turma desta Corte, nos autos originários de mandado de segurança preventivo, com pedido de liminar “inaudita altera pars”, impetrado por Multigrain S. A. contra “Delegado da Receita Federal do Brasil de Administração Tributária em São Paulo – DERAT”, “para determinar que a autoridade Impetrada se abstenha de aplicar a multa constantes (sic) dos parágrafos 15 e 17, do artigo 74, da Lei n.° 9.430/96, com redação dada pelo artigo 62, da Lei n.° 12.249/10, em caso de mero indeferimento de pedido de ressarcimento/compensação, ressalvada a possibilidade de incidência de multa nas hipóteses de comprovação de má-fé”. No “writ”, ao conceder a segurança, o Juízo “a quo” deliberou (fl. 176): “Em face do exposto, julgo procedente o pedido formulado e concedo a segurança pleiteada para que a autoridade impetrada se abstenha de aplicar multa constante dos parágrafos 15 e 17, do artigo 74, da Lei no 9.430/96, diante da manifesta inconstitucionalidade dos mesmos, conforme razões expostas. Sentença sujeita ao reexame necessário.” (g. n.) Consigne-se que a União – Fazenda Nacional recorreu (fls. 185-196). Sobre o cabimento do presente incidente de arguição de inconstitucionalidade, tenho-o por pertinente, em função das abalizadas razões exprimidas no citado pronunciamento judicial da C. 3ª Turma deste Regional, a par de o assunto ter sido levado ao conhecimento do E. Supremo Tribunal Federal. No mais, com respeito ao caso concreto, a “quaestio iuris” veiculada no “mandamus” encontrava-se, como dito, sob apreciação do C. Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário 796939/RS, de relatoria do i. Min. Edson Fachin, com repercussão geral reconhecida, ensejando, inclusive, a suspensão deste pleito, com espeque nos §§ 5º e 9º do art. 1.035 do Código de Processo Civil (fls. 268-269). Acontece que, em 20/03/2023, o Pleno do Pretório Excelso julgou o mérito do Recurso Extraordinário em epígrafe, tendo decidido (Tema 736): “TRIBUNAL PLENO Decisão: O Tribunal, por unanimidade, apreciando o tema 736 da repercussão geral, conheceu do recurso extraordinário e negou-lhe provimento, na medida em que inconstitucionais, tanto o já revogado § 15, quanto o atual § 17 do art. 74 da Lei 9.430/1996, mantida, assim, a decisão proferida pelo Tribunal a quo. Foi fixada a seguinte tese: ‘É inconstitucional a multa isolada prevista em lei para incidir diante da mera negativa de homologação de compensação tributária por não consistir em ato ilícito com aptidão para propiciar automática penalidade pecuniária’.” Entrementes, em hipótese semelhante a versada neste procedimento, este C. Órgão Especial já deliberou o seguinte: “CONSTITUCIONAL - CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE - ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE - PROCESSUAL CIVIL - AUSÊNCIA DE INTERESSE SUPERVENIENTE - DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SOBRE A MATÉRIA - PREJUDICIALIDADE DO INCIDENTE. 1. Incidente conhecido. Afastado eventual prejuízo decorrente da ausência do voto do Desembargador Federal que presidia o Colegiado. 2. Quanto ao exame do mérito da presente arguição, de rigor o reconhecimento de superveniente falta de interesse para apreciação da presente arguição, tendo em conta o julgamento da matéria posta em deslinde pelo Pleno do C. Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 343.446/SC, em consonância com o disposto no art. 176, parágrafo único, do Regimento Interno desta E. Corte. 3. Incidente conhecido, e, no mérito, julgado prejudicado.” (TRF – 3ª Região, Órgão Especial, PET 0012719-56.1999.4.03.6102, rel. Des. Fed. Therezinha Cazerta, rel. p/ acórdão Des. Fed. Mairan Maia, e-DJF3 18/03/2010, p. 97) De fato, tendo sido solucionada a controvérsia, relativamente à inconstitucionalidade dos dispositivos legais em testilha, pensamos ter ocorrido a perda superveniente do objeto deste incidente, nos exatos termos do quanto decidido na Petição Cível acima mencionada, cujo acórdão transcrevemos. Ante o exposto, voto no sentido de conhecer do vertente incidente de arguição de inconstitucionalidade e, no mérito, julgá-lo prejudicado. Tornem os autos à 3ª Turma deste Tribunal, para prosseguimento do julgamento da remessa oficial e do recurso voluntário. É o voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. §§ 15 E 17 DO ART. 74 da LEI 9.430/1996. PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA SUPERVENIENTE DE INTERESSE. DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ACERCA DA MATÉRIA. PREJUDICADO O INCIDENTE.
- Pertinência do incidente de arguição de inconstitucionalidade, em função das abalizadas razões exprimidas no pronunciamento judicial da C. 3ª Turma deste Regional e do assunto ter sido levado ao conhecimento do E. Supremo Tribunal Federal.
- Com respeito ao caso concreto, a “quaestio iuris” veiculada no “mandamus” que deu origem ao vertente incidente encontrava-se sob apreciação do C. Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário 796939/RS, de relatoria do i. Min. Edson Fachin, com repercussão geral reconhecida.
- Em 20/03/2023, o Pleno do Pretório Excelso julgou o mérito do Recurso Extraordinário em epígrafe, tendo decidido (Tema 736): “O Tribunal, por unanimidade, apreciando o tema 736 da repercussão geral, conheceu do recurso extraordinário e negou-lhe provimento, na medida em que inconstitucionais, tanto o já revogado § 15, quanto o atual § 17 do art. 74 da Lei 9.430/1996, mantida, assim, a decisão proferida pelo Tribunal a quo. Foi fixada a seguinte tese: ‘É inconstitucional a multa isolada prevista em lei para incidir diante da mera negativa de homologação de compensação tributária por não consistir em ato ilícito com aptidão para propiciar automática penalidade pecuniária’.”
- Solucionada a controvérsia, relativamente à inconstitucionalidade dos dispositivos legais em testilha, ocorrente a perda superveniente do objeto deste incidente. Precedente deste E. Órgão Especial.
- Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade conhecido e, no mérito, julgado prejudicado. Tornem os autos à 3ª Turma deste Tribunal, para prosseguimento do julgamento da remessa oficial e do recurso voluntário.