Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0012985-93.2016.4.03.6119

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

APELANTE: AMBEV S.A.

Advogados do(a) APELANTE: HAMILTON DIAS DE SOUZA - SP20309-A, LUIS HENRIQUE DA COSTA PIRES - SP154280-A

PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0012985-93.2016.4.03.6119

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

APELANTE: AMBEV S.A.

Advogados do(a) APELANTE: HAMILTON DIAS DE SOUZA - SP20309-A, LUIS HENRIQUE DA COSTA PIRES - SP154280-A

PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

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R E L A T Ó R I O

Trata-se de embargos à execução fiscal opostos por AMBEV S.A. em face da União Federal, a desconstituição da CDA nº 80.3.16.003142-20, oriunda de autuação lavrada em razão do não pagamento do IPI na saída do estabelecimento industrial de Guarulhos, destacando-se que a empresa é optante do Regime Especial de Tributação de Bebidas Frias (REFRI), previsto nos arts. 58-A e 58-J a 58-T da Lei nº 10.833/2003.

Alega a embargante que é pessoa jurídica que se dedica, principalmente, à fabricação e comercialização de bebidas, possuindo diversos estabelecimentos no território nacional. Afirma que em junho de 2008, a Lei nº 11.727/2008 alterou a Lei nº 10.833/2003 e facultou aos contribuintes do setor de bebidas a opção pela adoção de regime especial de apuração e pagamento – “REFRI”. Por esse regime, o IPI (i) incidiria uma única vez (art. 58-N) e (ii) sob regime ad rem (valor fixo por unidade – art. 58-J), abrangendo todos os estabelecimentos da pessoa jurídica (art. 58, J, I). Em paralelo a esse regime especial, continuou a subsistir a legislação normal do IPI no que foi não fosse incompatível com as regras específicas do “REFRI”. Dentre essas regras, continuou regularmente aplicável, até janeiro/2015 a suspensão do imposto na saída de um a outro estabelecimento da pessoa jurídica (RIPI/2002, art. 42, X e RIPI/2010, art. 43, X).

Aduz que optou pelo REFRI e adotou o seguinte procedimento: seu estabelecimento industrial, situado em Guarulhos, fabricava os produtos e os remetia com suspensão do IPI aos estabelecimentos filiais (centros de distribuição –“CDDs”) responsáveis pela posterior distribuição junto ao mercado em geral (atacadistas, varejistas, venda direta etc.) e ao consequente pagamento do imposto, de acordo com os valores fixos previstos na legislação. Alega que foi autuada pela Receita Federal sob o fundamento de que, no âmbito do REFRI, não teria aplicação a regra de suspensão do IPI na remessa de um a outro estabelecimento da mesma pessoa jurídica, como permitido pelo RIPI e que a regra geral de suspensão não se aplicaria ao regime especial do REFRI, por suposta incompatibilidade. Concluiu, assim, que o estabelecimento industrial da embargante (autuado) deveria pagar o imposto em razão de sua remessa aos CDDs.

Sustenta que não houve desvirtuamento da sistemática monofásica de incidência do imposto e que qualquer estabelecimento da empresa poderia ter efetuado o pagamento do tributo, tendo a autoridade administrativa ignorado indevidamente a prova de pagamento. Alega que a execução cobra tributo já pago.

Por meio de sentença, o MM Juízo a quo julgou improcedentes os embargos à execução fiscal, com fulcro no art. 487, inciso I do Código de Processo Civil. Sem condenação em honorários advocatícios a teor do encargo previsto no Decreto-Lei nº 1.025/69 (Id. 268076455 e 268076461).

Apela a embargante, alegando em preliminar cerceamento de defesa diante da necessidade de realização de perícia contábil. Aduz que em se tratando de litígio em que a prova de pagamento do IPI reclamado é essencial ao deslinde do feito, não poderia ter sido negado o direito à produção de tal prova, ainda mais que o r. Juízo sentenciante julgou improcedente a ação por falta de prova. No mérito, alega a iliquidez do título executivo e descumprimento da decisão proferida pelo CARF (Id. 268076465).

Com contrarrazões, os autos foram remetidos a esta E. Corte.

É o relatório.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0012985-93.2016.4.03.6119

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

APELANTE: AMBEV S.A.

Advogados do(a) APELANTE: HAMILTON DIAS DE SOUZA - SP20309-A, LUIS HENRIQUE DA COSTA PIRES - SP154280-A

PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

Sustenta a recorrente que o pedido de perícia contábil é necessário para comprovar que, nos termos do acórdão proferido pelo CARF, houve o pagamento do IPI pelos demais estabelecimentos da empresa.

Alega que em se tratando de litígio em que um fato (prova de pagamento do IPI reclamado, ainda que de modo parcial) é essencial à tomada de decisão, inclusive por conta do quanto decidido no âmbito administrativo, não se mostra viável julgar improcedente à demanda por falta de comprovação do fato (pagamento) e, simultaneamente, negar à Apelante o direito à produção da prova destinada a apurar justamente esse fato.

Pois bem. O magistrado, no uso de suas atribuições, deve estabelecer a produção de provas que sejam importantes e necessárias ao exame da causa, tendo o poder de decidir acerca da conveniência e da oportunidade de sua produção, visando obstar a prática de atos inúteis ou protelatórios.

Com efeito, o sistema jurídico brasileiro é pautado no princípio do livre convencimento racional, segundo o qual o Juiz deve decidir fundamentadamente, segundo sua convicção pessoal, a partir das provas que constam nos autos, in verbis:

Art. 371. O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento.”

Ou seja, o Juízo não está adstrito a nenhuma das provas nem essas possuem força vinculante. Do mesmo modo, o juiz não está impelido a deferir a produção de qualquer tipo de prova requerida pelas partes quando as considerar desnecessárias para o deslinde do feito.

Por sua vez, o ônus da prova é regulado pelo NCPC nos seguintes termos:

Art. 373. O ônus da prova incumbe:

I – ao ator, quanto ao fato constitutivo do seu direito;

II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.”

Ainda, nos termos do art. 16, § 2º, da LEF, compete ao executado a instrução da petição inicial dos embargos com os documentos destinados à prova de suas alegações, podendo o embargante requerer ao juiz da causa, justificadamente, outras provas consideradas necessárias à sua defesa, que dependam de intervenção judicial, tais como a oral, pericial, requisição de documentos sigilosos etc.

Entendo que se justifica a necessidade da produção de provas sempre que exista um fato que escape do conhecimento ordinário do julgador e cuja aferição dependa de conhecimento especial, seja testemunhal, técnico ou científico.

No caso em análise, o indeferimento da perícia contábil, além de cercear, em tese, o direito de defesa da apelante, poderia acarretar situação jurídica não condizente com a realidade dos fatos.

Deveras, na espécie, a realização da perícia se faz imprescindível para que a apelante possa eventualmente provar suas alegações, principalmente quanto à comprovação do pagamento do crédito cobrado.

Neste contexto, não se pode perder de vista que a realização da prova pericial requerida, sob o crivo do contraditório, poderá fornecer os elementos necessários para a comprovação do direito defendido pela apelante, estabelecendo seu alcance e dimensão, sob pena de estarmos diante de um possível cerceamento de defesa, que, caso venha a ser reconhecido no futuro, poderá ensejar a nulidade de todos os atos decisórios eventualmente vinculados proferidos posteriormente.

Porém, os pontos controversos devem ser previamente delimitados e as questões enfrentadas não deverão envolver temas eminentemente de direito, sendo que, na espécie, a apelante pediu a realização de prova pericial contábil com o intuito de direta ou indiretamente, apurar se o imposto pago foi suficiente ou não, e em que medida, para extinguir a obrigação tributária (CTN, art. 156, I e IX) objeto do Auto de Infração que originou a Execução Fiscal. Sem essa prova, não poderia o MM. Juízo ter julgado improcedente a demanda justamente por conta da falta de prova do pagamento.

Assim, deve ser deferida a produção da prova pericial contábil, anulando-se a sentença.

Ante o exposto, dou provimento ao recurso de apelação da embargante, para anular a sentença, a fim de deferir a produção de prova pericial contábil.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL CONTÁBIL. NECESSIDADE.CERCEAMENTO DE DEFESA. OCORRÊNCIA.

1. O magistrado, no uso de suas atribuições, deve estabelecer a produção de provas que sejam importantes e necessárias ao exame da causa, tendo o poder de decidir acerca da conveniência e da oportunidade de sua produção, visando obstar a prática de atos inúteis ou protelatórios.

2. O sistema jurídico brasileiro é pautado no princípio do livre convencimento racional, segundo o qual o Juiz deve decidir fundamentadamente, segundo sua convicção pessoal, a partir das provas que constam nos autos (art. 371).

3. O Juízo não está adstrito a nenhuma das provas nem essas possuem força vinculante. Do mesmo modo, o juiz não está impelido a deferir a produção de qualquer tipo de prova requerida pelas partes quando as considerar desnecessárias para o deslinde do feito. Já o ônus da prova é regulado pelo art. 373, I e II, do Código de Processo Civil.

4. Ainda, nos termos do art. 16, § 2º, da LEF, compete ao executado a instrução da petição inicial dos embargos com os documentos destinados à prova de suas alegações, podendo o embargante requerer ao juiz da causa, justificadamente, outras provas consideradas necessárias à sua defesa, que dependam de intervenção judicial, tais como a oral, pericial, requisição de documentos sigilosos etc.

5. Justifica-se a necessidade da produção de provas sempre que exista um fato que escape do conhecimento ordinário do julgador e cuja aferição dependa de conhecimento especial, seja testemunhal, técnico ou científico.

6. No caso em análise, o indeferimento da perícia contábil, além de cercear, em tese, o direito de defesa da apelante, poderia acarretar situação jurídica não condizente com a realidade dos fatos.

7. A realização da perícia se faz imprescindível para que a apelante possa eventualmente provar suas alegações, principalmente quanto à comprovação do pagamento do crédito cobrado.

8. Não se pode perder de vista que a realização da prova pericial requerida, sob o crivo do contraditório, poderá fornecer os elementos necessários para a comprovação do direito defendido pela apelante, estabelecendo seu alcance e dimensão, sob pena de estarmos diante de um possível cerceamento de defesa, que, caso venha a ser reconhecido no futuro, poderá ensejar a nulidade de todos os atos decisórios eventualmente vinculados proferidos posteriormente.

9. Os pontos controversos devem ser previamente delimitados e as questões enfrentadas não deverão envolver temas eminentemente de direito, sendo que, na espécie, a apelante pediu a realização de prova pericial contábil com o intuito de direta ou indiretamente, apurar se o imposto pago foi suficiente ou não, e em que medida, para extinguir a obrigação tributária (CTN, art. 156, I e IX) objeto do Auto de Infração que originou a Execução Fiscal. Sem essa prova, não poderia o MM. Juízo ter julgado improcedente a demanda justamente por conta da falta de prova do pagamento.

10. Apelo provido.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu dar provimento ao recurso de apelação da embargante, para anular a sentença, a fim de deferir a produção de prova pericial contábil, nos termos do voto do Des. Fed. MARCELO SARAIVA (Relator), com quem votaram a Juíza Fed. Conv. DIANA BRUNSTEIN e o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE. Ausente, justificadamente, em razão de férias, a Des. Fed. MÔNICA NOBRE (substituída pela Juíza Fed. Conv. DIANA BRUNSTEIN) , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.