Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
5ª Turma

AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL (413) Nº 5030408-92.2022.4.03.0000

RELATOR: Gab. 17 - DES. FED. MAURICIO KATO

AGRAVANTE: ANDRE NEY GABRIEL DOS SANTOS

Advogado do(a) AGRAVANTE: WELDER DE ASSIS MIRANDA - GO28384

AGRAVADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
5ª Turma
 

AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL (413) Nº 5030408-92.2022.4.03.0000

RELATOR: Gab. 17 - DES. FED. MAURICIO KATO

AGRAVANTE: ANDRE NEY GABRIEL DOS SANTOS

Advogado do(a) AGRAVANTE: WELDER DE ASSIS MIRANDA - GO28384

AGRAVADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

R E L A T Ó R I O

Trata-se de agravo em execução penal interposto pela defesa de André Ney Gabriel dos Santos (id. 266485238) em face da decisão proferida pelo Juízo Federal da 1ª Vara de Jales/SP que indeferiu seu pedido de extinção da punibilidade do agravante pela prescrição da pretensão executória (id. 266485244 –fls. 64/67), nos autos da Execução Penal nº 7000038-91.2021.4.03.6124.

Em razões recursais (id. 266485238), a defesa pretende a reforma da sentença, alegando que desde o trânsito em julgado já decorreram mais de 3 (três) anos, de forma que requer seja declarada a prescrição da pretensão executória.

O Ministério Público apresentou contrarrazões (id. 266485240) e, em juízo de retratação, o Magistrado de primeiro grau manteve a decisão recorrida (id. 266485241).

A Procuradoria Regional da República manifestou-se pelo desprovimento do agravo em execução (id. 270279992).

É o relatório.

Dispensada a revisão, a teor dos artigos 34 e 236, parágrafo único, do Regimento Interno desta Corte Regional.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
5ª Turma
 

AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL (413) Nº 5030408-92.2022.4.03.0000

RELATOR: Gab. 17 - DES. FED. MAURICIO KATO

AGRAVANTE: ANDRE NEY GABRIEL DOS SANTOS

Advogado do(a) AGRAVANTE: WELDER DE ASSIS MIRANDA - GO28384

AGRAVADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

V O T O

 

O agravo em execução penal interposto pela defesa de André Ney Gabriel dos Santos comporta provimento.

Consta dos autos que o Juízo a quo indeferiu o pedido de extinção da punibilidade do sentenciado e determinou o prosseguimento da execução penal, pois não transcorreu o lapso prescricional de 04 (quatro) anos (id. 266485244).

A questão controvertida refere-se à análise dos marcos interruptivos da prescrição da pretensão executória e, por consequência, da ocorrência ou não da extinção da punibilidade pela prescrição do réu André Ney Gabriel dos Santos.

De início, cumpre esclarecer que o termo inicial da prescrição da pretensão executória sempre foi questão controversa no âmbito dos tribunais superiores.

Nesse contexto, o Supremo Tribunal Federal reconheceu nos autos de Recurso Extraordinário com Agravo a existência de repercussão geral da controvérsia relativa à recepção do artigo 112, inciso I, do Código Penal, tendo em vista a necessidade de harmonização do instituto da prescrição da pretensão executória com o ordenamento jurídico constitucional vigente, diante dos postulados da estrita legalidade e da presunção de inocência (artigo 5º, incisos II e LVII, da Constituição Federal) (RG no ARE 848.107/DF, Tema nº 788, Relator Ministro Dias Toffoli, julgado em 11/12/2014). O julgamento desse leading case (ARE 848.107/DF - Tema nº 788) foi finalizado no dia 30/06/2023, ocasião em que a Suprema Corte, por unanimidade, fixou a seguinte tese:

O prazo para a prescrição da execução da pena concretamente aplicada somente começa a correr do dia em que a sentença condenatória transita em julgado para ambas as partes, momento em que nasce para o Estado a pretensão executória da pena, conforme interpretação dada pelo Supremo Tribunal Federal ao princípio da presunção de inocência (art. 5º, inciso LVII, da Constituição Federal) nas ADC 43, 44 e 54.

O Supremo Tribunal Federal, por maioria, negou provimento ao agravo em recurso extraordinário interposto pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios e declarou a não recepção pela Constituição Federal da locução “para a acusação”, contida na primeira parte do inciso I do artigo 112 do Código Penal, conferindo-lhe interpretação conforme à Constituição de modo a se entender que a prescrição começa a fluir do dia em que a sentença condenatória transita para ambas as partes. No tocante à modulação dos efeitos da decisão, determinou a aplicação deste entendimento: i) aos casos em que a pena não foi declarada extinta pela prescrição e ii) nas hipóteses em que o trânsito em julgado para a acusação tenha ocorrido após 12/11/2020, nos termos do voto do Relator Ministro Dias Toffoli.

No ponto, ficou vencido o Ministro Alexandre de Moraes, que conhecia do agravo no recurso extraordinário e, no mérito, dava-lhe provimento e divergia quanto à modulação dos efeitos do julgado, ao entendimento de que não deviam se aplicar apenas às decisões com trânsito em julgado. 

O julgamento do Tema nº 788 reflete entendimento que já vinha tomando consistência no Supremo Tribunal Federal. De fato, o plenário tinha proferido decisão no sentido de que o termo inicial para a contagem da prescrição da pretensão executória era o trânsito em julgado para ambas as partes (AgReg no AI 794.971/RJ, Relator para acórdão Ministro Marco Aurélio, julgado em 19/04/2021).

Diante da manifestação dos Ministros do Supremo Tribunal Federal sobre a controvérsia no AgRg no AI 794.971/RJ e considerando a ausência de divergência interna nessa Corte Suprema sobre o assunto, bem como a necessidade de alinhamento dos julgados da Corte Superior de Justiça com esse posicionamento, a 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça também fixou entendimento de que a prescrição da pretensão executória tinha como marco inicial o trânsito em julgado para ambas as partes (STJ, Terceira Seção, AgReg no REsp 1.983.259/PR, Relator Ministro Sebastião Reis Júnior, julgado em 26/10/2022).

Igualmente, o posicionamento da Quarta Seção deste Tribunal Regional Federal já vinha sendo fixado nestes termos: TRF da 3ª Região, 4ª Seção, EI 0004802-10.2017.4.03.6181, relator Des. Fed. André Nekatschalow, julgado em 20/02/2020; EI 0011138-64.2016.4.03.6181, relator Des. Fed. Paulo Fontes, julgado em 30/01/2020; e, EI 0006821-57.2015.4.03.6181, relator Des. Fed. Nino Toldo, julgado em 21/06/2018.

Com efeito, o artigo 112, inciso I do Código Penal segundo o qual a prescrição depois de transitar em julgado a sentença final condenatória começa a correr no dia em que transita em julgado a sentença condenatória, para a acusação, ou a que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condiciona, deve ser interpretado de forma sistemática e à luz dos direitos fundamentais da Constituição Federal insculpidos no artigo 5º, sobretudo os incisos II e LVII.

Isto porque o Supremo Tribunal Federal, ao julgar procedentes as Ações Declaratórias de Constitucionalidade nº 43, nº 44 e nº 54 (julgamento concluído em 07/11/2019), assentou a constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal e decidiu pela necessidade de esgotamento de todas as possibilidades de recursos para início do cumprimento de pena (e eventual decretação de prisão-pena), sem prejuízo da possibilidade de prisão cautelar.

Diante do recente julgamento de tema afetado à repercussão geral na Suprema Corte, a aplicação literal do artigo 112, inciso I do Código Penal acarretaria ineficácia do sistema de execução penal, pois o curso da prescrição da pretensão executória se iniciaria sem que o órgão acusatório pudesse dar início à execução da pena, bem como implicaria violação aos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da isonomia processual (paridade de armas).

Ademais, admitir como termo inicial de contagem da prescrição executória a data do trânsito em julgado para a acusação também implicaria contradição com o próprio conceito de prescrição, que encerra uma ideia de inércia do titular do direito (e, no caso, não se poderia admitir que o Estado-acusação deixou de executar a decisão condenatória).  

Assim, de fato, a melhor interpretação a ser dada ao disposto no artigo 112, inciso I do Código Penal é aquela que indica que o prazo prescricional da pretensão executória somente passa a fluir após o encerramento definitivo da fase cognitiva do processo penal, com o trânsito em julgado para ambas as partes.

Ainda, é necessário observar a modulação dos efeitos da decisão conferida pelo próprio Supremo: a tese consubstanciada no Tema nº 788 deve ser aplicada nas hipóteses em que a pena não foi declarada extinta pela prescrição e cujo trânsito em julgado para a acusação tenha ocorrido após 12/11/2020. No particular, de acordo com consulta ao sistema processual desta Corte Regional, o trânsito em julgado para a acusação ocorreu em 03/10/2018, de modo que não se aplica o novo entendimento.

Tendo em vista as penas concretamente aplicadas de 01 (um) ano de reclusão (artigo 334 do Código Penal) e 01 (um) ano de detenção (artigo 70 da Lei 4.117/62), as quais devem ser isoladamente observadas para fins de prescrição, tem-se que o prazo prescricional é de 04 (quatro) anos. Nesse contexto, considerando que entre a data do trânsito em julgado para a acusação (03/10/2018) até a presente data decorreu lapso superior a 04 (quatro) anos, deve ser reconhecida a prescrição da pretensão executória do Estado (artigos 107, inciso IV, c.c 109, inciso V, 110, 112, inciso I, 1ª parte, todos do Código Penal).

Ante o exposto, dou provimento ao agravo em execução penal interposto pela defesa de André Ney Gabriel dos Santos.

É o voto.



E M E N T A

PROCESSUAL PENAL. AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA.  ACÓRDÃO CONFIRMATÓRIO. TERMO INICIAL. TRÂNSITO EM JULGADO PARA AMBAS AS PARTES. TEMA Nº 788, STF. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DO JULGADO.

1. O termo inicial para contagem do prazo prescricional da pretensão executória deve ser a data do trânsito em julgado para ambas as partes, com modulação de efeitos, nos termos da tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Tema nº 788 (ARE 848.107/DF).

2. Diante da necessidade de esgotamento de todas as possibilidades de recursos para início do cumprimento da pena, sem prejuízo da possibilidade de prisão cautelar, a aplicação literal do artigo 112, inciso I, do Código Penal acarretaria ineficácia do sistema de execução penal e implicaria contradição com o próprio conceito de prescrição.

3. Agravo em execução penal da defesa provido.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quinta Turma, por unanimidade, decidiu, dar provimento ao agravo em execução penal interposto pela defesa de André Ney Gabriel dos Santos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.