Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
5ª Turma

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0005309-57.2017.4.03.6120

RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, ALEXANDRA BARBOSA CAMARGO, ERIKA CRISTINA DE OLIVEIRA ALVES MOREIRA, GILSON DE SOUZA, JOSE LUIZ ALVES MOREIRA, SIVAL MIRANDA DOS SANTOS

Advogado do(a) APELANTE: PRISCILA CRISTINA DOS SANTOS CHIUZULI - SP348933-A
Advogado do(a) APELANTE: RAFAEL RAMOS - SP319067-A
Advogados do(a) APELANTE: CAIO HENRIQUE KONISHI - SP311435-A, CLAUDINEI DE LIMA - SP317742-A
Advogados do(a) APELANTE: ANDERSON LUIS CORDEIRO MOREIRA - PR54639-A, LUCIANO BORGES DOS SANTOS - PR62905-A
Advogado do(a) APELANTE: JULIANA MARI RIQUETO - SP247202-A

APELADO: GILSON DE SOUZA, JOSE LUIZ ALVES MOREIRA, ERIKA CRISTINA DE OLIVEIRA ALVES MOREIRA, SIVAL MIRANDA DOS SANTOS, ALEXANDRA BARBOSA CAMARGO, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

Advogado do(a) APELADO: PRISCILA CRISTINA DOS SANTOS CHIUZULI - SP348933-A
Advogado do(a) APELADO: JULIANA MARI RIQUETO - SP247202-A
Advogado do(a) APELADO: RAFAEL RAMOS - SP319067-A
Advogados do(a) APELADO: CAIO HENRIQUE KONISHI - SP311435-A, CLAUDINEI DE LIMA - SP317742-A
Advogados do(a) APELADO: ANDERSON LUIS CORDEIRO MOREIRA - PR54639-A, LUCIANO BORGES DOS SANTOS - PR62905-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
5ª Turma
 

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0005309-57.2017.4.03.6120

RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, ALEXANDRA BARBOSA CAMARGO, ERIKA CRISTINA DE OLIVEIRA ALVES MOREIRA, GILSON DE SOUZA, JOSE LUIZ ALVES MOREIRA, SIVAL MIRANDA DOS SANTOS

Advogado do(a) APELANTE: PRISCILA CRISTINA DOS SANTOS CHIUZULI - SP348933-A
Advogado do(a) APELANTE: RAFAEL RAMOS - SP319067-A
Advogados do(a) APELANTE: CAIO HENRIQUE KONISHI - SP311435-A, CLAUDINEI DE LIMA - SP317742-A
Advogado do(a) APELANTE: JULIANA MARI RIQUETO - SP247202-A

APELADO: GILSON DE SOUZA, JOSE LUIZ ALVES MOREIRA, ERIKA CRISTINA DE OLIVEIRA ALVES MOREIRA, SIVAL MIRANDA DOS SANTOS, ALEXANDRA BARBOSA CAMARGO, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

Advogados do(a) APELADO: CLAUDINEI DE LIMA - SP317742-A, CAIO HENRIQUE KONISHI - SP311435-A
Advogado do(a) APELADO: RAFAEL RAMOS - SP319067-A
Advogado do(a) APELADO: JULIANA MARI RIQUETO - SP247202-A
Advogado do(a) APELADO: PRISCILA CRISTINA DOS SANTOS CHIUZULI - SP348933-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

 

Trata-se de apelações interpostas por Gilson de Souza, José Luiz Alves Moreira, Sival Miranda dos Santos, Alexandra Barbosa Camargo, Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira, Fábio Henrique Alberghini e pelo Ministério Público Federal contra a sentença conjunta proferida nos Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120 e 0005556-38.2017.4.03.6120, que: a) absolveu Guilherme Augusto Moreira Luiz da prática do delito do art. 312, caput, c. c. os arts. 29 e 327, todos do Código Penal, e da prática do delito do art. 2º da Lei n. 12.850/13, com fundamento nos arts. 386, VII e III, do Código de Processo Penal, respectivamente; b) condenou Gilson de Souza (Autos n. 0005309- 57.2017.4.03.6120) pela prática do delito do art. 312, caput, c. c. os arts 29, 71 e 327, todos do Código Penal, em concurso material com o delito do art. 2º da Lei n. 12.850/13, à pena de 10 (dez) anos, 9 (nove) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 40 (quarenta) dias-multa, em regime inicial fechado; c) condenou José Luiz Alves Moreira (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120) pela prática do delito do art. 312, caput, c. c. os arts. 29, 71 e 327, todos do Código Penal, em concurso material com o delito do art. 2º da Lei n. 12.850/13, à pena de 6 (seis) anos de reclusão e 28 (vinte e oito) dias-multa, em regime inicial semiaberto; d) condenou Sival Miranda dos Santos (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120 e n. 0005556-38.2017.4.03.6120) pela prática do delito do art. 312, caput, c. c. os arts. 29, 71 e 327, todos do Código Penal, em concurso material com o delito do art. 2º da Lei n. 12.850/13, à pena privativa de liberdade de 5 (cinco) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 23 (vinte e três) dias-multa, em regime inicial semiaberto; e) condenou Alexandra Barbosa Camargo (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120 e n. 0005556-38.2017.4.03.6120) pela prática do delito do art. 312, caput, c. c. os arts. 29, 71 e 327, todos do Código Penal, em concurso material com o delito do art. 2º da Lei n. 12.850/13, à pena privativa de liberdade de 5 (cinco) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 20 (vinte) dias-multa, em regime inicial semiaberto; f) condenou Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120) pela prática do delito do art. 312, caput, c.c os artigos 29, 71 e 327, todos do Código Penal, em concurso material com o delito do art. 2º da Lei 12.850/13, à pena de 4 (quatro) anos e 7 (sete) meses de reclusão e 18 (dezoito) dias-multa, em regime inicial semiaberto; g) condenou Fábio Henrique Alberghini (Autos n. 0005556-38.2017.4.03.6120) pela prática do delito do art. 312, caput, c.c arts. 29, 30 e 327, todos do Código Penal, à pena de 2 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, em regime inicial aberto, com substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos; h) condenou Naiara de Almeida Santos (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120 e n. 0005556-38.2017.4.03.6120) pela prática do delito do art. 312, caput, c. c. os arts. 29, 71 e 327, todos do Código Penal, à pena de 2 (dois) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 9 (nove) dias-multa, em regime inicial aberto, com substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos. Na oportunidade, houve decretação de perdimento de bens em favor da União (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120, Ids ns. 157677140 a 157677142, Autos n. 0005556-38.2017.4.03.6120, Ids. ns. 157675108 a 157675110).

Sival Miranda dos Santos interpôs apelação nos termos que seguem:

a) restou provado que o apelante não agia por conta própria, limitando-se a cumprir ordens de Gilson de Souza, seu patrão, e de José Luiz (CP, art. 23, III);

b) o apelante tinha receio de que, não cumpridas as ordens, perdesse o seu emprego, garantia de seu sustento e de sua família;

c) discorre sobre as imagens gravadas e repassadas à Receita Federal, que sustenta não terem sido editadas e que afastam a sua participação na prática delitiva (contrabando de cigarros), baseando-se a condenação em meras alegações dos corréus;

d) malgrado o flagrante, restou comprovado que o apelante apenas cumpria ordens, sem nenhuma contrapartida financeira;

e) as conversas telefônicas interceptadas judicialmente demonstram que o apelante não autorizou a entrada do caminhão apreendido, de modo que resulta atípica a sua conduta (CPP, art. 386, III);

f) inexistente a intenção de integrar organização criminosa, deve o apelante ser absolvido da prática do delito do art. 2º da Lei n. 12.850/13 (CPP, art. 386, IV e V);

g) mantida a condenação, as penas-base devem ser fixadas no mínimo legal, com redução para 1/6 (um sexto) do aumento decorrente da aplicação do art. 71 do Código Penal (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120, Id n. 157677143, pp. 33 e 43/55).

Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira alega, em apelação, o que segue:

a) a acusação não individualizou as condutas imputadas à apelante;

b) a apelante não pode ser considerada como funcionária pública equiparada, razão pela qual é indevida a sua condenação pela prática do delito do art. 312 do Código Penal;

c) antes dos fatos narrados na denúncia, a apelante teve um relacionamento com Gilson de Souza, do qual dependia financeiramente para sustento próprio e do filho menor de idade;

d) Gilson de Souza era agressivo e submetia a apelante a ameaças físicas e psicológicas, exigindo que ela contribuísse com os seus negócios, “seja na intermediação de contatos, agendamentos ou ainda serviços bancários, como se fosse uma espécie de secretária particular";

e) a apelante não ocupava cargo/função nas empresas do ex-companheiro, limitando-se a cumprir ordens, o que impõe a aplicação do art. 22 do Código Penal;

f) a apelante não se associou ou agiu em conluio com terceiros para obter vantagem pecuniária, apenas repassava informações mediante coação irresistível, o que também infirma a prática do delito do art. 2º da Lei n. 12.850/13;

g) mantida a condenação, deve ser reduzida para o mínimo legal a pena-base do delito do art. 312 do Código Penal, afastando-se a valoração negativa da culpabilidade e das circunstâncias do crime (a apelante não contribuiu decisivamente para o desvio da quantidade de cigarros apontada na sentença);

h) no que diz respeito ao comportamento da vítima, deve ser ponderado que o Estado colaborou com a prática delitiva ao omitir-se na fiscalização;

i) na terceira fase da dosimetria da pena do art. 312 do Código Penal, deve ser mínimo o aumento de pena decorrente da aplicação do art. 71 d Código Penal;

j) a incidência do art. 29, § 1º, do Código Penal deve resultar na diminuição da pena em 1/3 (um terço);

k) quanto ao delito do art. 2º da Lei n. 12.850/13, a pena-base deve ser fixada no mínimo legal, nos termos anteriormente apontados, mantendo-se a incidência da atenuante da confissão e diminuindo-se a pena em 1/3 (um terço) em face da aplicação do art. 29, § 1º, do Código Penal;

l) a apelante permaneceu presa de 14.06.18 a 06.12.18, período que deve ser descontado da pena total que lhe foi aplicada, a resultar na fixação do regime inicial aberto (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120, Id n. 157677144, pp. 63 e 132/134, Id n. 157677145).

Alexandra Barbosa Camargo interpôs apelação nos seguintes termos:

a) postula a absolvição da prática do delito de organização criminosa (é ré confessa no que concerne ao delito de peculato), uma vez que a saída de mercadorias do Depósito de Materiais decorria de ordem de superior hierárquico (José Luiz, Gilson ou Érika), nada sabendo a apelante sobre compradores ou lucro obtido com a venda dos cigarros;

b) não há prova do objetivo da associação para obtenção de vantagem indevida, elementar do delito de organização criminosa;

c) a quebra de sigilo bancário apontou os pequenos valores movimentados pela apelante;

d) aplicação do art. 23, III, do Código Penal, a resultar em absolvição nos termos do art. 386, IV e V, do Código de Processo Penal, para o delito de organização criminosa;

e) para o delito de peculato, a pena-base deve ser reduzida para o mínimo legal, mantida a aplicação da atenuante da confissão e reduzida para 1/6 (um sexto) a exasperação da pena pela incidência do art. 71 do Código Penal;

f) mantida a condenação, a pena do delito de organização criminosa deve ser fixada no mínimo legal (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120, Id n. 157677143, p. 36, n. 157677146, pp. 32/39).

José Luiz Alves Moreira sustenta, em apelação, o que segue:

a) a colaboradora/delatora Naiara não renunciou ao direito ao silêncio nem prestou o compromisso de dizer a verdade, o que macula, por ausência de formalidade essencial, a delação e os atos processuais posteriores (Lei n. 12.850/13, art. 4º, § 14);

b) nulidade decorrente da oitiva do delator/colaborador após a oitiva do delatado, pois o error in procedendo viola o direito de defesa do apelante;

c) as informações dos corréus não podem dever admitidas como prova, uma vez que prestadas sem o compromisso de dizer a verdade;

d) José Luiz confessou ter desviado cigarros do galpão da Receita Federal, contando apenas com a participação de Alexandra e Gilson (a participação dos demais réus deu-se após a sua saída);

e) a acusação não individualizou os períodos da suposta atuação ilícita do réu;

f) a atuação do apelante restringe-se ao período compreendido entre março de 2014 (data da abertura das empresas ECOAM e PLS) e abril de 2017;

g) no que concerne à dosimetria das penas, deve-se ponderar que o apelante é primário, idoso, é casado e tem uma filha menor de idade, confessou a prática delitiva (desvio de cigarros) e apresentou elementos, documentos e livros que permitiram o esclarecimento de diversos pontos dos autos;

h) aplicação do benefício previsto art. 4º da Lei n. 12.850/13;

i) indevida decretação do perdimento de bens, à míngua de comprovação de aquisição por meios ilícitos (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120, Id n. 157677143, p. 34, n. 157677146, pp. 40/46).

Gilson de Souza, em apelação, alega o seguinte:

a) insurge-se apenas em relação à dosimetria das penas de peculato e organização criminosa;

b) no que diz respeito ao delito de peculato, são genéricos os fundamentos deduzidos pelo Juízo a quo para a majoração da pena-base a título de culpabilidade exacerbada, circunstâncias e consequências do delito que não integram o tipo penal;

b) bis in idem no que toca às circunstâncias delitivas, considerando-se que para a condenação do particular pelo delito de peculato, é imprescindível a relação de confiança mantida com o ente público;

c) em relação às consequências do delito, é indevida a imputação de um novo crime (contrabando), não comprovado, para a majoração da pena-base;

d) ainda que presente alguma circunstância judicial desfavorável, o aumento adequado seria de 1/8 (um oitavo);

e) indevida aplicação da agravante do art. 61, I, do Código Penal, por não dizer respeito a “dirigente das atividades”, sendo taxativas as demais hipóteses do dispositivo legal;

f) inaplicabilidade da agravante do art. 61, II, g, do Código Penal, que se restringe à violação de deveres de profissões regulamentadas;

g) a causa de aumento de pena do art. 71 do Código Penal deve ser reduzida para o mínimo legal;

h) com relação ao delito de organização criminosa, é descabida a majoração da pena ao argumento de que o apelante seria líder da organização criminosa, à míngua de prova nesse sentido;

i) assim como ocorre com o peculato, o Juízo a quo fundamenta-se no argumento genérico de prática de outro delito (contrabando) e violação da “confiança do órgão Federal”,

j) para o estabelecimento de relação de confiança é insuficiente o simples contrato de prestação de serviços, celebrado após licitação de caráter impessoal;

k) bis in idem na aplicação do art. 2º, § 3º, da Lei n. 12.850/13, pois a suposta liderança da organização criminosa já foi utilizada para majoração da pena-base;

l) mantida a aplicação da causa de aumento de pena, a exasperação deve ser fixada em 1/8 (um oitavo);

m) detração penal, descontando-se da pena total o período de prisão preventiva e o período de sujeição do apelante a medidas cautelares diversas da prisão, visto que também limitadoras de sua liberdade;

n) fixação do regime inicial semiaberto, conforme dispõe o art. 33, § 2º, b, do Código Penal (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120, Id n. 157677143, p. 15, e n. 253420730).

Fábio Henrique Alberghini interpõe apelação nos seguintes termos:

a) foi condenado à pena de 2 (dois) anos de reclusão pela prática do delito de peculato;

b) a autoria delitiva fundamenta-se somente da prisão em flagrante do apelante nos Autos n. 0005556-38.2017.4.03.6120;

c) o apelante não foi denunciado por organização criminosa, a indicar que não agiu em conluio para desviar mercadorias do Depósito de Materiais Apreendidos da Receita Federal em Araraquara;

d) os elementos dos autos indicam a boa-fé do apelante, que sequer tinha a possibilidade de saber que o produto por ele transportado advinda de prática ilícita (mero prestador de serviço/frete);

e) os documentos indicados pelo Magistrado na sentença condenatória não dizem respeito a conversas telefônicas ou mensagens entre o apelante e os corréus Sival, Alexandre e Naiara;

f) no mesmo sentido, os laudos periciais dos celulares apreendidos;

g) as declarações de Naiara (colaboração premiada), assim como a prova oral e os interrogatórios dos corréus nada apontaram em relação à participação do apelante na prática do delito de peculato;

h) é notória a informalidade do contrato de transporte (frete), a resultar na ausência da documentação pretendida pela acusação, em especial tratando-se de resíduo, ou seja, material destinado à destruição;

i) o apelante não tinha ciência de que as mercadorias transportadas eram da Receita Federal nem tinha ciência da condição dos funcionários da empresa AGL (equiparados a funcionários públicos), de modo que resulta inaplicável a exceção prevista no § 1º do art. 327 do Código Penal, à vista do disposto no art. 30 do Código Penal;

j) postula a sua absolvição nos termos do art. 386, inciso IV ou inciso VII, do Código de Processo Penal, “em respeito ao principio da presunção de inocência (artigo 50, inciso LVII, da Constituição Federal, artigo 80, item 2, da Convenção Interamericana de Direitos Humanos) e do in dubio pro reo”, bem como em face do disposto no art. 156 do Código de Processo Penal;

k) subsidiariamente, requer a desclassificação para peculato culposo (imprudência ou negligência);

l) desclassificado o delito, impõe-se a aplicação do art. 89 da Lei n. 9.099/95;

m) restando inaplicável o art. 89 da Lei n. 9.099/95, a pena do delito do art. 312, § 2º, do Código Penal deve ser reduzida para o mínimo legal, com desconto do período de prisão provisória do apelante e do período em que submetido a medidas cautelares diversas da prisão (Autos n. 0005556-38.2017.4.03.6120, Id n. 157675111, pp. 11 e 49/67).

O Ministério Público Federal, em sede recursal, afirma o que segue:

a) conforme referido na denúncia da Ação Penal n. 0005556-38.2017.403.6120, Sival Miranda, Alexandra Barbosa, Naiara de Almeida e Fábio Alberghini, em 11.09.17, “foram flagrados enquanto desviavam uma carga de cigarros estrangeiros que se encontravam sob custódia da Receita Federal, de que tinham posse em razão da condição de empregados da empresa AGL Armazém Geral e Logística Ltda. (SIVAL, ALEXANDRA e Naiara), empresa contratada pela Delegacia de Receita Federal de Araraquara, SP, para administração do depósito. Na ocasião, Fábio conduzia o caminhão que transportava a carga de cigarros”;

b) na ocasião, houve oferecimento de denúncia apenas em relação às pessoas presas em flagrante, pelo crime de peculato (Operação Gestas I), porém as diligências policiais prosseguiram e deram ensejo ao oferecimento de segunda denúncia em face de Gilson de Souza, José Luiz Alves, Érika Cristina, Sival Miranda, Alexandra Barbosa, Naiara de Almeida e Guilherme Augusto, por 285 (duzentos e oitenta e cinco) peculatos semelhantes ao do flagrante, além da imputação de prática do crime de organização criminosa durante o período de março de 2013 a setembro de 2017 (Autos n. 0005309-57.2017.403.6120, decorrente da Operação Gestas II);

c) Gilson de Souza era o proprietário da empresa AGL Armazéns Gerais e Logística Ltda., que administrava o Depósito de Materiais da Delegacia da Receita Federal em Araraquara e, nessa condição, desviava cigarros estrangeiros sob a sua custódia;

d) deve haver exasperação da pena do crime de peculato para mais de 5 (cinco) anos, em face da culpabilidade exacerbada de Gilson de Souza (desvio de mercadorias sob a sua guarda e em razão de contrato oneroso), das circunstâncias e das graves consequências do crime (significativo período de prática delitiva, desvio de 85.000 caixas de cigarros avaliadas em R$ 150.000.000,00, com grave dano à saúde pública);

e) a conduta social de Gilson de Souza também deve ser avaliada negativamente, pois constituiu empresas em nome de terceiros para garantir o seu acesso ao Depósito de Materiais da Receita Federal, vale dizer, fraudou as sociedades empresárias Ecoam Prestadora de Serviços, PLS Vigilância e Segurança, Gel Comercial e Capital Segurança e Vigilância para depois contratá-las por meio da AGL, ao que se acresce o seu comportamento familiar violento;

f) no que toca a José Luiz, as penas-base dos delitos de peculato e organização criminosa devem ser exacerbadas de modo a resultarem proporcionais à culpabilidade do réu, às circunstâncias e consequências dos crimes;

g) José Luiz participou desde o início das atividades ilícitas e, em conjunto com Gilson de Souza, estabeleceu a dinâmica e o modus operandi do grupo criminoso, além de dar ordens e permanecer no Depósito para garantir a saída dos cigarros desviados, o conteúdo e o destino das cargas;

h) José Luiz emprestou o seu nome para a constituição fraudulenta de empresas por Gilson de Souza, nos termos anteriormente referidos, o que deve ser valorado negativamente a título de circunstâncias do crime, ademais, utilizou conta bancária para movimentar valores superiores a R$ 4.500.000,00 (quatro milhões e quinhentos mil reais), repassando a Gilson o que lhe competia;

i) as consequências do crime devem ser valoradas negativamente para José Luiz, conforme exposto em relação a Gilson de Souza;

j) Érika Cristina participou desde o início da organização criminosa (não apenas a partir de abril/maio de 2017, como constou na sentença), inclusive com movimentação bancária em montante superior a R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais) (Autos n. 0000171-75.2018.403.6120);

k) deve ser revista a dosimetria das penas-base de Érika Cristina no que dizem respeito à culpabilidade, circunstâncias e consequências dos crimes, pois Érika era um importante elemento para a destinação ilícita dos cigarros e após a saída de José Luiz (seu pai), assumiu integralmente a comercialização da mercadoria desviada para diversas localidades;

l) as penas de Sival Miranda e Alexandra Barbosa devem ser majoradas, ainda que empregados de Gilson de Souza na empresa AGL, visto que se valeram do  livre acesso ao galpão de mercadorias para exercerem importante papel no âmbito da organização criminosa, com a prática dos inúmeros peculatos;

m) Sival Miranda, na condição de fiel depositário, gerenciava as atividades administrativas da AGL e reportava-se apenas a Gilson de Souza, era o chefe imediato de outros empregados, autorizava a movimentação dos "caminhões de resíduo" e a abertura e fechamento do galpão das mercadorias em horários diversos do expediente normal, além de ser o responsável por adulterar o sistema de câmeras de segurança do interior do Depósito de Materiais;

n) Alexandra Barbosa, operadora de empilhadeira, não se limitava a “trabalhos braçais”, uma vez que tratava pessoalmente de todos os carregamentos de cigarros desviados para os “caminhões de resíduos”, além de avisar a José Luiz e Érika sobre a chegada de cargas de cigarros ao Depósito de Materiais (ponto inicial para o desvio das mercadorias);

o) competia a Alexandra Barbosa, ainda, simular a existência de cigarros no interior das caixas mantidas no Depósito de Materiais, induzindo a fiscalização a crer que nas caixas havia cigarros quando, na verdade, a mercadoria já havia sido desviada pelo grupo;

p) deve ser afastada a aplicação da circunstância atenuante da confissão em relação a Érika Cristina e Sival Miranda, pois além de parcial e não espontânea,  os réus buscaram eximir-se da responsabilidade sob a alegação de que agiram a mando ou por receio de Gilson de Souza;

q) na terceira fase da dosimetria das penas, deve ser exasperado para 2/3 (dois terços) o aumento decorrente da continuidade delitiva, afastando-se a aplicação da causa de diminuição de pena do art. 29, § 1º, do Código Penal, para Érika Cristina e Alexandra Barbosa;

r) as prestações pecuniárias de Gilson de Souza e José Luiz devem ser majoradas, em relação a ambos os delitos, a fim de que resultem compatíveis com a condição financeira dos réus e representem a devida reprovação aos crimes praticados;

t) deve ser decretado o perdimento de bens e valores de Wida Indústria e Comércio de Embalagens Ltda. – ME,  empresa que pertencia de fato a Gilson de Souza, que após o flagrante cuidou de afastar uma possível constrição judicial de bens de sua propriedade, a impor a conclusão de que valores advindos da comercialização ilícita de cigarros eram utilizados no âmbito dessa empresa;

u) fixação de reparação do dano nos termos do que dispõe o art. 387, IV, do Código de Processo Penal, à vista dos valores que a Receita Federal atribuiu aos cigarros desviados após auditoria no depósito de materiais e tendo como base os respectivos autos de infração (cargas apreendidas), valores que não devem ser afastados porque discrepantes do laudo merceológico (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120, Id n. 157677143, p. 37, n. 157677144, pp. 69/109).

As defesas apresentaram contrarrazões (Id n. 157677144, pp. 126/130, n. 157677146, pp. 23/31 e 47/49, ns. 157677152, 157677158), bem como a acusação (Id ns. 157677160 e 157677161)

A Ilustre Procuradora Regional da República, Dra. Stella Fátima Scampini, manifestou-se pelo: a) provimento da apelação da acusação, com o reconhecimento de que Érika Cristina integrou a organização criminosa desde o início, para a exasperação das penas-base de Alexandra Barbosa, Érika Cristina, Sival Miranda, Gilson de Souza e José Luiz, para o afastamento da atenuante da confissão espontânea em relação a Érika Cristina e Sival Miranda, afastamento da causa de diminuição de pena do art. 29, § 1º, em relação a Érika Cristina e Alexandra Barbosa, aplicação em 2/3 (dois terços) do aumento decorrente da continuidade delitiva, exasperação das penas de multa impostas a Gilson de Souza e José Luiz, alteração dos regimes de cumprimento de pena para Gilson de Souza, José Luiz e Érika Cristina, decretação do perdimento de bens da empresa Wida e fixação de valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, b) conhecimento em parte da apelação de Fábio Henrique Alberghini e, na parte conhecida, pelo não provimento do recurso, c) parcial provimento da apelação de Gilson de Souza, apenas para o afastamento da agravante do art. 61, I, do Código Penal, na dosimetria da pena do delito do art. 312 do Código Penal, d) não provimento das apelações de Alexandra Barbosa, Érika Cristina, José Luiz e Sival Miranda (Id n. 255531270).

É o relatório.

À revisão, nos termos regimentais.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
5ª Turma
 

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0005309-57.2017.4.03.6120

RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, ALEXANDRA BARBOSA CAMARGO, ERIKA CRISTINA DE OLIVEIRA ALVES MOREIRA, GILSON DE SOUZA, JOSE LUIZ ALVES MOREIRA, SIVAL MIRANDA DOS SANTOS

Advogado do(a) APELANTE: PRISCILA CRISTINA DOS SANTOS CHIUZULI - SP348933-A
Advogado do(a) APELANTE: RAFAEL RAMOS - SP319067-A
Advogados do(a) APELANTE: CAIO HENRIQUE KONISHI - SP311435-A, CLAUDINEI DE LIMA - SP317742-A
Advogados do(a) APELANTE: ANDERSON LUIS CORDEIRO MOREIRA - PR54639-A, LUCIANO BORGES DOS SANTOS - PR62905-A
Advogado do(a) APELANTE: JULIANA MARI RIQUETO - SP247202-A

APELADO: GILSON DE SOUZA, JOSE LUIZ ALVES MOREIRA, ERIKA CRISTINA DE OLIVEIRA ALVES MOREIRA, SIVAL MIRANDA DOS SANTOS, ALEXANDRA BARBOSA CAMARGO, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

Advogado do(a) APELADO: PRISCILA CRISTINA DOS SANTOS CHIUZULI - SP348933-A
Advogado do(a) APELADO: JULIANA MARI RIQUETO - SP247202-A
Advogado do(a) APELADO: RAFAEL RAMOS - SP319067-A
Advogados do(a) APELADO: CAIO HENRIQUE KONISHI - SP311435-A, CLAUDINEI DE LIMA - SP317742-A
Advogados do(a) APELADO: ANDERSON LUIS CORDEIRO MOREIRA - PR54639-A, LUCIANO BORGES DOS SANTOS - PR62905-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

Excelentíssimo Desembargador Federal Paulo Fontes: Inicialmente, destaco a admiração e a estima que nutro pelo E. Relator do presente feito, Des. Fed. André Nekatschalow. Pedi vistas dos autos para uma análise mais minuciosa acerca da tipificação dos crimes e da dosimetria das penas e, após fazê-la, ouso divergir parcialmente nos seguintes termos.

Trata-se de apelações interpostas por Gilson de Souza, José Luiz Alves Moreira, Sival Miranda dos Santos, Alexandra Barbosa Camargo, Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira, Fábio Henrique Alberghini e pelo Ministério Público Federal contra a sentença conjunta proferida nos Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120 e 0005556-38.2017.4.03.6120, que: 

a) absolveu Guilherme Augusto Moreira Luiz da prática do delito do art. 312, caput, c. c. os arts. 29 e 327, todos do Código Penal, e da prática do delito do art. 2º da Lei n. 12.850/13, com fundamento nos arts. 386, VII e III, do Código de Processo Penal, respectivamente; 

b) condenou Gilson de Souza (Autos n. 0005309- 57.2017.4.03.6120) pela prática do delito do art. 312, caput, c. c. os arts 29, 71 e 327, todos do Código Penal, em concurso material com o delito do art. 2º da Lei n. 12.850/13, à pena de 10 (dez) anos, 9 (nove) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 40 (quarenta) dias-multa, em regime inicial fechado; 

c) condenou José Luiz Alves Moreira (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120) pela prática do delito do art. 312, caput, c. c. os arts. 29, 71 e 327, todos do Código Penal, em concurso material com o delito do art. 2º da Lei n. 12.850/13, à pena de 6 (seis) anos de reclusão e 28 (vinte e oito) dias-multa, em regime inicial semiaberto; 

d) condenou Sival Miranda dos Santos (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120 e n. 0005556-38.2017.4.03.6120) pela prática do delito do art. 312, caput, c. c. os arts. 29, 71 e 327, todos do Código Penal, em concurso material com o delito do art. 2º da Lei n. 12.850/13, à pena privativa de liberdade de 5 (cinco) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 23 (vinte e três) dias-multa, em regime inicial semiaberto; 

e) condenou Alexandra Barbosa Camargo (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120 e n. 0005556-38.2017.4.03.6120) pela prática do delito do art. 312, caput, c. c. os arts. 29, 71 e 327, todos do Código Penal, em concurso material com o delito do art. 2º da Lei n. 12.850/13, à pena privativa de liberdade de 5 (cinco) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 20 (vinte) dias-multa, em regime inicial semiaberto; 

f) condenou Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120) pela prática do delito do art. 312, caput, c.c os artigos 29, 71 e 327, todos do Código Penal, em concurso material com o delito do art. 2º da Lei 12.850/13, à pena de 4 (quatro) anos e 7 (sete) meses de reclusão e 18 (dezoito) dias-multa, em regime inicial semiaberto; 

g) condenou Fábio Henrique Alberghini (Autos n. 0005556-38.2017.4.03.6120) pela prática do delito do art. 312, caput, c.c arts. 29, 30 e 327, todos do Código Penal, à pena de 2 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, em regime inicial aberto, com substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos; 

h) condenou Naiara de Almeida Santos (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120 e n. 0005556-38.2017.4.03.6120) pela prática do delito do art. 312, caput, c. c. os arts. 29, 71 e 327, todos do Código Penal, à pena de 2 (dois) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 9 (nove) dias-multa, em regime inicial aberto, com substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos.

Ainda, houve decretação de perdimento de bens em favor da União (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120, Ids ns. 157677140 a 157677142, Autos n. 0005556-38.2017.4.03.6120, Ids. ns. 157675108 a 157675110).

O E. Relator, na sessão de julgamento de 19 de setembro de 2022, da mesma forma, julgando em conjunto as apelações criminais 0005309-57.2017.4.03.6120 e 5032273-53.2022.4.03.0000, proferiu voto no sentido de rejeitar a preliminar de nulidade, negar provimento às apelações criminais de José Luiz Alves Moreira, Sival Miranda dos Santos, Alexandra Barbosa Camargo, Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira, dar parcial provimento à apelação criminal de Gilson de Gilson de Souza, apenas para afastar a agravante do art. art. 61, I, do Código Penal na dosimetria da pena do delito do art. 312 do Código Penal, dar parcial provimento à apelação de Fábio Henrique Alberghini, a fim de reduzir para 1 (um) ano, 11 (onze) meses de reclusão e 9 (nove) dias-multa, no mínimo valor unitário legal, a pena que lhe foi aplicada pela prática do delito do art. 312 do Código Penal e dar parcial provimento à apelação do Ministério Público Federal para majorar a pena aplicada a Gilson de Souza pela prática do delito do art. 312 do Código Penal e do art. 2º da Lei n. 12.850/13 para 10 (dez) anos, 10 (dez) meses e 42 (quarenta e dois) dias-multa, no valor unitário de 1/3 (um terço) do salário mínimo, para majorar a pena aplicada a José Luiz Alves Moreira pela prática do delito do art. 312 do Código Penal e do art. 2º da Lei n. 12.850/13 para 6 (seis) anos, 4 (quatro) meses de reclusão e 25 (vinte e oito) dias-multa, no valor unitário de 1/6 (um sexto) dos salário mínimo, para majorar a pela aplicada a Sival Miranda dos Santos pela prática do delito do art. 312 do Código Penal e do art. 2º da Lei n. 12.850/13 para 6 (seis) anos de reclusão e 25 (vinte e cinco) dias-multa, no mínimo valor unitário legal, para majorar a pena aplicada a Alexandra Barbosa Camargo pela prática do delito do art. 312 do Código Penal e do art. 2º da Lei n. 12.850/13 para 5 (cinco) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 20 (vinte) dias-multa e para majorar a pena aplicada a Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira pela prática do delito do art. 312 do Código Penal e do art. 2º da Lei n. 12.850/13 para 5 (cinco) anos, 6 (seis) meses e 22 (vinte e dois) dias-multa, no mínimo valor unitário legal. Mantidos os demais termos da sentença.

Por primeiro, acompanho o E. Relator no tocante à preliminar de nulidade, de modo que não a reconheço por ausência de comprovação de efetivo prejuízo na oitiva da ré NAIARA após a declaração do delatado JOSÉ LUIZ.

No mérito, conforme se verifica da denúncia dos autos 0005556-38.2017.4.03.6120,  SIVAL. NAIARA, ALEXANDRA e FABIO foram denunciados como incursos nas penas do artigo 312, c.c. 327, § 1º, do CP, porquanto:

"(...) no dia 11 de setembro de 2017, por volta das 19h, nas proximidades do Depósito de Materiais da Receita Federal de Araraquara, SP, situado na Rodovia Manoel de Abreu, Krn 4,5, Bairro Tutoia, município de Araraquara, SP, os denunciados SIVAL MIRANDA DOS SANTOS, NAIARA DE ALMEIDA SANTOS, ALEXANDRA BARBOSA CAMARGO e FÁBIO HENRIQUE ALBERGHINI, agindo emcomunhão de propósitos, desviaram, em proveito próprio e alheio, mercadorias sob a custódia da Receita Federal, cujo laudo merceológico será apresentado oportunamente, de que tinham posse em razão da condição de funcionários da AGL Armazéns Gerais e Logística - SIVAL, NAIARA e ALEXANDRA -, empresa contratada pela Delegacia de Receita Federal de Araraquara, SP, para administração do referido depósito.

(...)

Dirigindo-se ao local, os policiais encontraram o caminhão Renault Master, placas FTN 8219, então conduzido pelo denunciado FABIO HENRIQUE ALBERGHINI que, inicialmente indagado, afirmou desconhecer a natureza da carga que transportava.

Vistoriado o caminhão, os policiais notaram que a carroceria estava repleta de cigarros de origem estrangeira e de importação proibida. 0 condutor FÁBIO, então, afirmou que fora contratado apenas para fazer o frete da mercadoria ilícita, sem informar seu destino.

No curso da abordagem policial, compareceu ao local a denunciada NAIARA, que se identificou como funcionária da AGL Armazéns Gerais e Logística, empresa que administra o depósito da Receita Federal em Araraquara, SP. Na ocasião, NAIARA disse aos policiais que se tratava de carga regular de cigarros destinada à incineração. Afirmou, ainda, aos policiais militares que seu superior SIVAL havia autorizado o referido carregamento.

Logo em seguida, SINVAL chegou ao local da abordagem e, inicialmente, negou ter conhecimento ou ter autorizado aquele carregamento de cigarros. Posteriormente, contudo, questionados pelos policiais, SIVAL e NAIARA confessaram que se tratava de desvio ilícito de cigarros apreendícios e custodiados pela Receita Federal, que se encontravam no depósito administrado pela AGL. Na ocasião, NAIARA mostrou-se disposta a colaborar com os policiais e revelou que não se tratava de caso isolado, pois existia um esquema criminoso de desvio de mercadorias no referido depósito.

Ainda em conversa com a polícia militar, SIVAL e NAIARA informaram que o carregamento do referido caminhão fora realizado pela denunciada ALEXANDRA e lhones Souza dos Santos'. ALEXANDRA também é funcionária da AGL e exerce a função de operadora da empilhadeira, tendo a denunciada NAIARA informado que ALEXANDRA integra o mencionado esquema criminoso. 

(...)

Quanto ao fato objeto desta denúncia, verifica-se que SIVAL, NAIARA e ALEXANDRA ostentam a condição de funcionários públicos equiparados, nos termos do artigo 327, § 10, do Código Penal, uma vez que o agiram na condição de empregados da AGL Armazéns Gerais e Logística, empresa que presta serviços à Receita Federal, administrando o depósito de mercadorias apreendidas, ou seja, quem detinha o dever de zelar pela custódia de tais objetos. SIVAL, aliás, era fiel de depósito, pessoa física que, em nome da AGL, assume a condição de fiel depositário das mercadorias ali depositadas. NAIARA, por sua vez, era auxiliar de fiel. Por sua vez, ainda que não fosse funcionário da AGL, o denunciado FÁBIO, ciente do ilícito, participou da prática do delito.

(...)"

 

Igualmente, na denúncia oferecida nos autos 0005309-57.2017.4.03.6120, a acusação afirmou que:

"(...) Segundo consta do incluso inquérito policial, entre o início de 2013 e setembro de 2017, no Depósito de Materiais da Receita Federal de Araraquara, SP, situado na Rodovia Manoel de Abreu, Km 4,5, Bairro Tutóia, Araraquara, SP, os denunciados GILSON DE SOUZA, JOSÉ LUIZ ALVES MOREIRA, ERIKA CRISTINA DE OLIVEIRA ALVES MOREIRA, GUILHERME AUGUSTO MOREIRA LUIZ, SIVAL MIRANDA DOS SANTOS, ALEXANDRA BARBOSA CAMARGO e NAIARA DE ALMEIDA SANTOS, agindo em comunhão de propósitos - alguns durante todo o período e outros durante parte deste intervalo, conforme será melhor detalhado logo abaixo - desviaram, em proveito próprio e alheio, mercadorias sob a custódia da Receita Federal, pelo menos por 285 vezes, no valor aproximado de R$ 124.530.240,80 (cento e vinte e quatro milhões, quinhentos e trinta mil, duzentos e quarenta reais e oitenta centavos), de que tinham posse por conta do relacionamento mantido com a empresa AGL Armazéns Gerais e Logística Ltda., de propriedade de GILSON DE SOUZA, contratada pela Delegacia de Receita Federal de Araraquara, SP, para administração do referido depósito.

E em função do referido contrato, que cuidou da prestação de serviços de administração do Depósito de Materiais da RFB, os denunciados ostentavam a condição de servidores públicos para fins penais, conforme preceitua o art. 327, § 10, do Código Penal.

Desta feita, conforme delineado no item anterior, que tratou do crime de organização criminosa, GILSON DE SOUZA é o proprietário, de fato da AGL, que fora contratada pela Receita Federal para administrar o Depósito de Materiais da Delegacia de Receita Federal de Araraquara, SP. Nessa condição, GILSON contratou a empresa de vigilância PLS Vigilância e Segurança Ltda e de portaria/limpeza ECOAM Prestadora de Serviços Ltda. para prestar serviços no local, ambas de propriedade de JOSÉ LUIZ ALVES MOREIRA, seu ex-sogro e pai ERIKA CRISTINA ALVES MOREIRA. 

A partir de 2013, sendo responsáveis pelo controle da vigilância e portaria do Depósito de Materiais, GILSON e JOSÉ LUIZ engendraram um sofisticado esquema criminoso que lhe permitiam o desvio de elevada quantidade de mercadorias acondicionadas no referido depósito, que eram transportadas por caminhões que ali se dirigiam especificamente para tal fim.

Para tanto, GILSON e JOSÉ LUIZ contavam com a participação dos denunciados SIVAL, NAIARA, ALEXANDRA e GUILHERME, que, exercendo atividades no interior do depósito, cuidavam de toda a logística para entrada, carregamento e saída dos produtos desviados.

Dessa forma, quase que diariamente - às vezes mais de uma vez por dia - JOSÉ LUIZ, e por vezes o próprio SIVAL ou NAIARA, avisava a portaria/vigilância que chegaria "caminhão de resíduo" - posteriormente passaram a usar também a expressão "código 10" para referirem-se a este veículo - autorizando sua entrada imediata ao interior do barracão, dispensando as rotinas de vistoria e segurança.

Os termos "caminhão de resíduo", ou "código 10", eram utilizados pelos denunciados para identificar o veículo destinado ao carregamento das mercadorias desviadas. E, segundo apurado, a grande maioria das referidas mercadorias era composta por cigarros estrangeiros apreendidos, objeto de crimes de contrabando, que estavam custodiados pela Receita Federal.

Previamente acordados sobre o desvio ilícito dos cigarros, GILSON e JOSÉ LUIZ transmitiam os comandos quanto ao conteúdo de cada carga ilícita (marcas dos cigarros) aos empregados da AGL - e comparsas no esquema ilícito - SIVAL, NAIARA e ALEXANDRA, que providenciavam o necessário para a separação dos cigarros e sua retirada do depósito, acautelando-se para que não houvesse suspeita da prática ilícita. Muitas vezes, era SIVAL quem repassava a NAIARA e ALEXANDRA a dinâmica relacionada ao desvio dos cigarros.

No mesmo período, ALEXANDRA recebia comandos especialmente de JOSÉ LUIZ para a separação das mercadorias e subsequente carregamento dos caminhões, bem como para a preparação das caixas em que eram retirados os cigarros, para que não levantassem qualquer suspeita quanto a ausência da mercadoria desviada

Além disso, a denunciada atuava diretamente no carregamento dos caminhões, pois exercia a função de operadora de empilhadeira.

Tal como ALEXANDRA, o denunciado GUILHERME - filho de ERIKA e neto de JOSÉ LUIZ - que trabalhou no interior do depósito em período em que seu avô ainda comandava as atividades ilícitas no galpão, também auxiliava na preparação das caixas e no carregamento dos cigarros para que fossem ilicitamente retirados do galpão. Embora a investigação não tenha identificado o período exato em que GUILHERME mantivera-se no depósito, não há dúvida de que ali exercera atividades em prol do grupo criminoso, integrado especialmente por sua mãe ERIKA CRISTINA, seu ex-padrasto GILSON e seu avô JOSÉ LUIZ22.

Além de ter trabalhado no interior do galpão, GUILHERME, assim como ALEXANDRA, por vezes entrava no galpão de forma irregular, com veículo próprio, para descarregar caixas vazias e desmontadas, destinadas viabilizar a preparação dos cigarros que seriam desviados do depósito. 2.12. Esse grave esquema perdurou até abril de 2017, quando aparente desentendimento havido entre GILSON e JOSÉ LUIZ culminou na substituição das empresas PLS e ECOAM pela CAPITAL Segurança e Vigilância Ltda. e GEL Comercial Ltda. - ambas tendo GILSON como proprietário de fato, conforme descrito no Item I desta denúncia - respectivamente responsáveis pela vigilância e limpeza/portaria do depósito, mesma ocasião em que o denunciado JOSÉ LUIZ deixou de ter participação no esquema.

Após a saída de JOSÉ LUIZ, e atendendo aos comandos de GILSON, o denunciado SIVAL, na condição de fiei de depósito, permaneceu no esquema criminoso, agora contando com maior participação de NAIARA, que então passou a exercer a função de auxiliar de fiei, permanecendo no interior do galpão e acompanhando de perto toda a movimentação para o carregamento dos caminhões e efetivo desvio dos cigarros pelo grupo criminoso. Nessa dinâmica, a ordem para a liberação dos "caminhões de resíduo" vinha de SIVAL e por vezes de NAIARA.

(...)"

Dessa sorte, Gilson, Erika, José Luiz, Guilherme, Sival, Naiara e Alexandra foram denunciados como incursos nas penas dos artigos 312, c.c. 327, § 1º, ambos do CP, e 1º, § 1º, da Lei 12.850/2013, a partir de 19 de setembro de 2013, e 288 do CP, no início de 2013 até 18 de setembro de 2013, com exceção de Guilherme, que atingiu maioridade em 14 de setembro de 2015.

Verifica-se dos autos que a tipificação no crime de peculato por equiparação se deu em razão do réu Gilson ser proprietário da empresa AGL Armazéns Gerais e Logística, que fora contratada pela Receita Federal para administrar o Depósito de Materiais da Delegacia de Receita Federal de Araraquara/SP, enquanto os demais réus eram empregados ou prestavam serviços para a empresa de Gilson.

Com efeito, considerando que a empresa exercia serviço próprio da Receita Federal relativo à destinação de mercadoria proibida para destruição, entende-se que havia a posse legítima e a empresa buscava dar destinação diversa e criminosa aos cigarros estrangeiros apreendidos.

O "peculato-desvio" (artigo 312, caput, 2ª parte, do Código Penal) ocorre quando o agente emprega o bem em fim diverso daquele a que era destinado, se aperfeiçoando com a mudança de direção, alteração do destino ou aplicação, deslocamento de dinheiro, valor ou bem, em proveito próprio ou alheio.

Desta feita, a partir do momento que a ordem de dentro da empresa era o desvio dos cigarros contrabandeados que estavam no depósito da Receita Federal e seriam objeto de destruição, está configurado o crime de peculato na modalidade desvio.

A equiparação a servidor público se dá em razão dos réus estarem prestando serviço típico de uma instituição pública e, em razão dessa condição, darem destinação diversa à mercadoria da que foi acordada.

Não se cogita da tipificação da conduta no crime de contrabando, disposto no artigo 334-A, § 1º, inciso V, do Código Penal, uma vez que os réus tinham a posse legítima da mercadoria, ainda que esta fosse proibida. Os acusados somente receberam os cigarros estrangeiros, em decorrência de estarem prestando serviços para a Receita Federal e serem os responsáveis pelos serviços relativos a incineração dos cigarros contrabandeados.

Da mesma forma, considero acertada a tipificação no crime do artigo 2º da Lei 12.850/2013, não se vislumbrado a desclassificação para o crime do artigo 288 do CP, porquanto restaram amplamente demonstradas a estrutura ordenada e a organização de tarefas entre os integrantes, estando bem delimitada a função de cada integrante dentro do esquema criminoso.

Portanto, está correta a tipificação dada na denúncia aos fatos criminosos, de modo que adiro à fundamentação do E. Relator quanto à tipificação dos crimes.

Observa-se que restaram demonstradas a materialidade e autoria dos crimes por parte dos réus Gilson de Souza, José Luiz Alves Moreira, Sival Miranda dos Santos, Alexandra Barbosa Camargo e Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira. O E. Relator trata das questões de forma exaustiva, não merecendo reparo o que foi decidido no seu voto.

Entretanto, em relação ao réu Fábio Henrique Alberghini, não há nos autos elementos suficientes acerca de seu envolvimento na prática delitiva. Ao que parece, o réu foi apenas contratado por duas vezes para realizar o transporte das mercadorias, não fazendo parte da empresa de Gilson.

Não se observa nos interrogatórios do corréus e nas conversas interceptadas indicativos de que Fábio tinha conhecimento da prática delitiva, estando a condenação baseada no fato de que a retirada da mercadoria se deu em horário incomum, sem qualquer documento de saída e com entrega em um posto de serviços em São Paulo.

Assim, entende-se que o motorista foi contratado de forma eventual, por uma empresa com aparência de prestar serviços lícitos, e não houve a comprovação de que acompanhou o carregamento dos cigarros em seu caminhão e que sabia acerca do desligamento das câmeras, de modo que não é difícil de considerar que pensava que estava prestando um serviço de frete de produtos "inservíveis".

Ademais, Fábio não incorreu em nenhuma elementar do tipo penal, pois não tinha a intenção de desviar a mercadoria, mas sim transportá-la até o local indicado na contratação, não recebendo nada além pela mercadoria desviada, como os demais réus.

Destarte, imperiosa a absolvição de Fábio da prática do crime do artigo 312, c.c. 327, § 1º, ambos do CP, na forma do artigo 386, inciso VII, do Código Penal.

No que tange à dosimetria das penas, da mesma forma, divirjo parcialmente do E. Relator.

Gilson de Souza.

Crime do art. 312, c.c. 327, § 1º, do CP.

O E. Relator, na primeira fase, considerou como negativas as circunstâncias judiciais da culpabilidade e das consequências do crime.

A culpabilidade restou negativa em razão da condição do réu de sócio-administrador da empresa AGL Armazéns Gerais e Logística, o que indica maior grau de consciência da ilicitude dos crimes, por ter sido contratado pela Receita Federal e gozar de confiança. 

Já as consequências são desfavoráveis, considerando o expressivo volume de cigarros estrangeiros desviados do Depósito de Materiais. 

Desta feita, ainda que correta a valoração das duas circunstâncias judiciais, considero exacerbado o aumento na fração de 2/3 (dois terços), mostrando-se adequada a majoração da pena-base na fração de 1/2 (metade), ou seja, em 03 (três) anos de reclusão e 15 (quinze) dias-multa.

Na segunda fase, correto o entendimento de afastar a agravante do art. 61, inciso I, do Código Penal, uma vez que já foi considerada na fase anterior a circunstância de Gilson ser "dirigente das atividades".

Em seguida, é proporcional o aumento em 1/2 (metade) em razão da continuidade delitiva, porquanto o desvio se estendeu do início de 2013 a setembro de 2017.

Desse modo, a pena resta aplicada em 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 23 (vinte e três) dias-multa.

Crime do art. 2º da Lei 12.850/2013.

Em relação ao referido crime, também divirjo parcialmente do E. Relator na primeira fase da dosimetria da pena.

O E. Relator valorou como desfavoráveis as circunstâncias judiciais da culpabilidade, circunstâncias e consequências do crime.

A culpabilidade exacerbada está ligada ao fato de Gilson ser representante legal da AGL Armazéns Gerais e Logística Ltda., empresa à qual foi confiada a administração do Depósito de Materiais.

As circunstâncias do crime foram valoradas negativamente, em decorrência do esquema criminoso elaborado por Gilson que incluía a propriedade de fato de empresas que deveriam garantir a segurança do Depósito de Materiais, mas que na realidade integravam a estrutura da organização criminosa  e asseguravam a ocultação  dos crimes praticados.

No entanto, considero que as duas circunstâncias poderiam ser consideradas para a valoração de apenas uma circunstância negativa, pois estão ligadas entre si, no fundamento de que Gilson liderava o esquema criminoso por ser responsável pela empresa AGL e também garantir a ocultação do esquema criminoso com a criação de empresa de segurança.

Sendo assim, mantenho apenas o aumento decorrente das circunstâncias do crime, devendo ser afastada a circunstância judicial da culpabilidade, sob pena de bis in idem, em razão das duas circunstâncias estarem relacionadas e do aumento na segunda fase da agravante do art. 2º, § 3º, da Lei 12.850/2013.

Ademais, as consequências do crime foram consideradas graves diante do efetivo desvio de expressiva quantidade de caixas de cigarros de origem estrangeira, com grave risco à saúde pública.

Porém, entende-se que a referida circunstância não é capaz de ser considerada para elevação da pena-base do crime de organização criminosa, pois está ligada e já valorada no crime de peculato, de modo que deve ser também afastada.

Outrossim, diante da presença de apenas um circunstância judicial negativa, aumento a pena-base em 1/6, restando fixada em 3 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 12 (doze) dias-multa.

Na segunda fase, mantenho a agravante do artigo 2º, § 3º, da Lei 12.850/2013, na fração de 1/6 (um sexto), pois deve ser considerado o comando exercido por ele na organização criminosa, não havendo que se falar em bis in idem com o afastamento da circunstância judicial da culpabilidade da pena-base.

Ausentes causas de aumento e de diminuição, a pena resta fixada em 04 (quatro) anos e 01 (um) mês de reclusão e 14 (quatorze) dias-multa.

Concurso material.

Com o redimensionamento das penas, a soma totaliza o montante de 08 (oito) anos e 07 (sete) meses de reclusão e 37 (trinta e sete) dias-multa. 

Mantido o valor unitário de 1/15 (um quinze avos) do salário mínimo.

No tocante ao regime para o início do cumprimento de pena, mostra-se acertado o fechado em razão da quantidade de pena aplicada, na forma do artigo 33, § 2º, alínea a, do CP.

Todavia, o réu permaneceu preso até a sentença pelo período de 01 (um) ano, 03 (três) meses e 18 (dezoito) dias, de modo que, de acordo com o artigo 387, § 2º, do CPP, deve ser alterado o início do cumprimento da pena para o regime semiaberto.

Incabível a substituição da pena por restritivas de direitos, uma vez que não preenchidos os requisitos do artigo 44, inciso I, do Código Penal.

 

José Luiz Alves Moreira.

Crime do art. 312, c.c. 327, § 1º, do CP.

Para José Luiz, na primeira fase, foram consideradas negativas pelo E. Relator as circunstâncias da culpabilidade, circunstâncias e consequências do crime.

Segundo consta no voto, a culpabilidade foi exacerbada ante o papel de coordenação exercido, inclusive no que diz respeito à determinação das marcas de cigarros a serem desviadas e a comercialização direta com os interessados nas cargas ilícitas.

Acolhendo a manifestação ministerial, o E. Relator considerou o fato de José Luiz ter atuado como interposta pessoa para a constituição fraudulenta da PLS (serviço de vigilância) e da ECOAM (serviço de portaria), garantindo o livre acesso de caminhões ao Depósito de Materiais e o desvio de cargas de cigarros.

Contudo, entendo que a fundamentação das duas circunstâncias se relacionam por serem as duas ligadas ao fato de José Luiz ter exercido papel de coordenação no esquema criminoso de desvio, já que atuava na escolha da mercadoria e garantia o acesso dos caminhões para a concretização do desvio.

Assim, considero apenas negativa a circunstância judicial da culpabilidade, não merecendo acolhimento o pleito ministerial de valoração das circunstâncias do crime.

Mantenho, entretanto, as consequências do crime negativas, por considerar como expressiva a quantidade de cigarros desviados.

Portanto, com a caracterização de duas circunstâncias do art. 59 do CP desfavoráveis, o aumento da pena-base deve se dar em 1/2 (metade), no montante de 03 (três) anos de reclusão e 12 (doze) dias-multa.

 Na segunda fase, mantenho a atenuante da confissão na fração de 1/3 (um terço), de maneira que a pena intermediária resulta em 02 (dois) anos de reclusão) e 10 (dez) dias-multa.

Reconhecida a continuidade delitiva, na fração de 1/2 (metade), a pena totaliza 03 (três) anos e 15 (quinze) dias-multa.

Crime do art. 2º da Lei 12.850/2013.

Da mesma forma, na primeira fase, o E. Relator valorou como desfavoráveis as circunstâncias judiciais da culpabilidade, circunstâncias e consequências do crime.

A culpabilidade foi considerada negativa, tendo em vista a atividade de coordenação desempenhada por José Luiz dentro da organização criminosa, enquanto que as circunstâncias do crime envolviam a constituição fraudulenta de empresas, subcontratadas pela AGL para prestação de serviços de portaria e de vigilância.

Não obstante, como já consignado no item anterior, entendo que a atividade de coordenação e a constituição fraudulenta de empresas para facilitar a prática criminosa estão dentro de apenas uma circunstância judicial negativa da culpabilidade. 

Sendo assim, afasto a circunstância judicial das circunstâncias do crime, sob pena de bis in idem.

Igualmente, entende-se que as consequências do crime não são capazes de elevarem a pena-base, porquanto a quantidade de cigarros desviados está relacionada ao crime de peculato.

Destarte, presente apenas uma circunstância judicial negativa, fixo a pena-base em 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 12 (doze) dias-multa.

Na segunda fase, mantidas as atenuantes dos artigos 65, inciso III, alínea d, e 66, ambos do CP, nas frações de 1/3 (um terço) e 1/6 (um sexto) respectivamente, a pena intermediária resta aplicada em 03 (três) anos e 10 (dez) dias-multa, na forma da Súmula 231 do STJ.

Ausentes causas de aumento e de diminuição, a pena resulta em 03 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Concurso material.

Com o redimensionamento das penas, a soma totaliza o montante de 06 (seis) anos de reclusão e 25 (vinte e cinco) dias-multa. 

Mantido o valor unitário de 1/25 (um vinte e cinco avos) do salário mínimo, tal como fixado pelo E. Relator.

No tocante ao regime para o início do cumprimento de pena, mostra-se acertado o semiaberto em razão da quantidade pena aplicada, na forma do artigo 33, § 2º, alínea b, do CP.

Verifica-se que, mesmo descontado o período em que réu permaneceu preso, por 05 (cinco) meses e 21 (vinte e um) dias, deve ser mantido o regime inicial semiaberto.

Incabível a substituição da pena por restritivas de direitos, uma vez que não preenchidos os requisitos do artigo 44, inciso I, do Código Penal.

 

Sival Miranda dos Santos.

Crime do art. 312, c.c. 327, § 1º, do CP.

Na primeira fase, o E. Relator, com acerto, reconheceu como negativa apenas a circunstância judicial das consequências do crime.

No entanto, mostra-se mais acertada a aplicação da fração de aumento de 1/6 (um sexto), de modo que a pena-base deve ser fixada em 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão e 12 (doze) dias-multa.

Reconhecida a atenuante da confissão, na fração de 1/3 (um terço), a pena intermediária restou aplicada em 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, na forma da Súmula 231 do STJ, o que adiro.

Igualmente, considero acertada a aplicação da continuidade delitiva na fração de 1/2 (metade), em razão da prática criminosa ter se estendido por cerca de 04 (quatro) anos.

A pena definitiva resta estabelecida 03 (três) anos e 15 (quinze) dias-multa.

Crime do art. 2º da Lei 12.850/2013.

Com razão o E. Relator, ao afastar as circunstâncias judiciais da culpabilidade e das circunstâncias do crime, pois não há comprovação de que o réu exercia papel de liderança dentro da organização criminosa.

Contudo, afasto também para Sival a circunstância negativa das consequências do crime relacionadas a quantidade de cigarros desviados.

Assim, a pena-base resta aplicada no mínimo legal de 03 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Na segunda fase, incide a atenuante da confissão, entretanto, deixo de valorá-la em decorrência dos ditames da Súmula 231 do STJ.

Ausentes causas de aumento e de diminuição, a pena fica aplicada em 03 (três) anos e 10 (dez) dias-multa.

Concurso material.

Com o redimensionamento das penas, a soma totaliza o montante de 06 (seis) anos de reclusão e 25 (vinte e cinco) dias-multa.

Mantido o valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, tal como fixado pelo E. Relator.

No tocante ao regime para o início do cumprimento de pena, mostra-se acertado o semiaberto em razão da quantidade de pena aplicada, na forma do artigo 33, § 2º, alínea b, do CP.

Verifica-se que, mesmo descontado o período em que réu permaneceu preso, por 02 (dois) meses e 26 (vinte e seis) dias, deve ser mantido o regime inicial semiaberto.

Incabível a substituição da pena por restritivas de direitos, uma vez que não preenchidos os requisitos do artigo 44, inciso I, do Código Penal.

 

Alexandra Barbosa Camargo.

Crime do art. 312, c.c. 327, § 1º, do CP.

O E. Relator considerou como negativas contra a ré as circunstâncias judicias da culpabilidade e das consequências do crime.

Não obstante, não considero negativa a culpabilidade da ré Alexandra, pois, ainda que fosse responsável pela simulação do conteúdo das caixas de cigarros e encarregada por avisar José Luiz sobre as novas cargas que chegavam ao Depósito de Materiais, Alexandra apenas cumpria ordens relacionadas ao seu emprego na empresa dadas por José Luiz e, indiretamente, Gilson.

As consequências do crime devem ser mantidas diante da grande quantidade de cigarros desviados pela prática criminosa.

Desta feita, mantida apenas uma circunstância judicial negativa, deve ser aplicado o aumento de 1/6 (um sexto), restando a pena-base aplicada em 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão e 12 (doze) dias-multa.

Na segunda fase, mantenho a atenuante da confissão na fração de 1/3 (um terço), resultando na pena intermediária de 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, na forma da Súmula 231 do STJ.

Na terceira fase, o E. Relator afastou a causa de diminuição do 29, § 1º, do Código Penal, aplicada na sentença, entendendo que, apesar de Alexandra não exercer papel de comando, não podia ser reconhecida a sua atuação como partícipe ou que não tenha colaborado de modo decisivo para o sucesso da empreitada criminosa.

Todavia, entendo que Alexandra atuava de forma a cumprir ordens de seus superiores, recebendo quantia por cada carregamento de mercadoria, não tendo papel decisivo acerca do que era feito na empresa.

Desta feita, mostra-se cabível a aplicação da causa de diminuição na fração de 1/6 (um sexto). 

Ainda, incide a continuidade delitiva na fração de 1/2 (metade), totalizando o montante de 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 12 (doze) dias-multa.

Crime do art. 2º da Lei 12.850/2013.

No referido delito, o E. Relator manteve apenas a circunstância judicial das consequências do crime, tendo em vista a quantidade de cigarros desviados e reiteração delitiva.

Não obstante, como já mencionado para os corréus, considero que a referida circunstância judicial não é cabível de elevar a pena-base para o crime de organização criminosa, uma vez que relacionada à prática do crime de peculato.

Desta maneira, a pena-base resta fixada no mínimo legal de 03 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Na segunda fase, permanece a atenuante da confissão na fração de 1/3 (um terço), de modo que a pena intermediária resta no mesmo patamar da fase anterior, na forma da Súmula 231 do STJ.

Na terceira fase, da mesma forma, o E. Relator afastou a causa de diminuição reconhecida na sentença da participação de menor importância, descrita no artigo 29, § 1º, do Código Penal, sob o mesmo argumento do item anterior.

Entretanto, igualmente, considero acertada a r. sentença na incidência da referida minorante, porquanto a ré, ainda que tenha colaborado para a empreitada criminosa, a sua atividade era condicionada às ordens de Gilson e José Luiz, apenas cumprindo o que era determinado por eles para proceder a organização das caixas.

Assim, deve ser mantida a minorante na fração de 1/6 (um sexto), de modo que a pena fica fixada em 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 08 (oito) dias-multa. 

Concurso material.

Com o redimensionamento das penas, a soma totaliza o montante de 05 (cinco) anos de reclusão e 20 (vinte) dias-multa.

Mantido o valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, tal como fixado pelo E. Relator.

No tocante ao regime para o início do cumprimento de pena, mostra-se acertado o semiaberto em razão da quantidade pena aplicada, na forma do artigo 33, § 2º, alínea b, do CP.

Verifica-se que, mesmo descontado o período em que ré permaneceu presa, de 02 (dois) meses e 26 (vinte e seis) dias, deve ser mantido o regime inicial semiaberto, em observância ao artigo 387, § 2º, do CPP.

Incabível a substituição da pena por restritivas de direitos, uma vez que não preenchidos os requisitos do artigo 44, inciso I, do Código Penal.

 

Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira.

Crime do art. 312, c.c. 327, § 1º, do CP.

Para a ré Érika, o E. Relator considerou negativas as circunstâncias judiciais da culpabilidade e das consequências do crime, aumentando a pena-base na fração de 1/3 (um terço).

Considero acertado o aumento da pena-base para a ré, uma vez que a sua culpabilidade, ainda que negativa, se mostra mais atenuada do que a considerada para Gilson e José Luiz, além das consequências se mostrarem negativas como já ressaltado para os corréus.

Desta sorte, a pena-base resta mantida em 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de reclusão e 13 (treze) dias-multa.

Na segunda fase, com acerto, restou mantida a atenuante da confissão na fração de 1/3 (um terço), resultando em 02 (dois) anos e 10 (dez) dias-multa, na forma da Súmula 231 do STJ.

Na terceira fase, afasto igualmente a minorante do artigo 29, § 1º, do Código Penal, para Érica, uma vez que a ré assumiu papel de destaque com a saída de seu pai no esquema de desvio de mercadoria proibida, não havendo que se falar que seu papel era de menor importância.

Por fim, incide a continuidade delitiva na fração menor de 1/4 (um quarto), considerando que reiterou a conduta criminosa por menos tempo.

Sendo assim, a pena resta fixada em 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 12 (doze) dias-multa.

Crime do art. 2º da Lei 12.850/2013.

 O E. Relator considerou como negativas apenas as consequências do crime, por entender que houve a efetiva prática de inúmeros desvios de mercadorias.

Como já consignado anteriormente, entendo que deve ser afastada a referida circunstância judicial, uma vez que ligada ao crime de peculato e não ao crime de organização criminosa.

Portanto, fixo a pena-base no mínimo legal de 03 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Mantenho a incidência da atenuante da confissão na fração aplicada na r. sentença, ou seja, em 1/3 (um terço), restando a pena intermediária no mesmo patamar anteriormente fixado diante dos ditames da Súmula 231 do STJ.

Da mesma forma, não deve incidir a minorante do artigo 29, § 1º, do CP, de modo que utilizo a mesma fundamentação do item anterior.

A pena definitiva resta em 03 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Concurso material.

Com o redimensionamento das penas, a soma totaliza o montante de 05 (cinco) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 22 (vinte e dois) dias-multa.

Mantido o valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, tal como fixado pelo E. Relator.

No tocante ao regime para o início do cumprimento de pena, mostra-se acertado o semiaberto em razão da quantidade pena aplicada, na forma do artigo 33, § 2º, alínea b, do CP.

Verifica-se que, mesmo descontado o período em que ré permaneceu presa, de 05 (cinco) meses e 21 (vinte e um) dias-multa, deve ser mantido o regime inicial semiaberto, em observância ao artigo 387, § 2º, do CPP.

Incabível a substituição da pena por restritivas de direitos, uma vez que não preenchidos os requisitos do artigo 44, inciso I, do Código Penal.

 

Naiara de Almeida Santos.

Crime do art. 312, c.c. 327, § 1º, do CP.

Não houve insurgência das partes em relação à pena de Naiara fixada na sentença.

O E. Relator manteve a pena na forma em que estabelecida pelo juízo a quo.

Na primeira fase, com acerto, restou fixada apenas a circunstância judicial das consequências do crime, de modo que a pena-base foi fixada em 02 (dois) anos e 04 quatro) meses de reclusão e 12 (doze) dias-multa.

Na fase seguinte, foi reconhecida a confissão na fração de 1/3, levando a pena intermediária para o patamar de 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Em seguida, o juízo a quo reconheceu a incidência da continuidade delitiva na fração de 1/4 (um quarto), bem como reduziu a pena em 1/6 (um sexto) pelo reconhecimento da minorante do art. 29, § 1º, do CP, porque sua função dentro do esquema se restringia a abrir o armazém fora do horário de expediente.

Ainda, aplicou a causa de diminuição específica do artigo 4º da Lei 12.850/2013, na fração de 1/2 (metade), totalizando a pena de 01 (um) ano e 15 (quinze) dias de reclusão e 05 (cinco) dias-multa.

Crime do art. 2º da Lei 12.850/2013.

De igual forma, não houve insurgência das partes quanto à dosimetria da pena do mencionado crime para a ré Naiara.

Na primeira fase do critério trifásico, o juízo a quo considerou como negativa tão somente a circunstância judicial das consequências do crime.

Todavia, ainda que não tenha havido recurso defensivo quanto à não incidência da referida circunstância, afasto, de ofício, as consequências do crime, por considerar que a fundamentação está estritamente ligada ao crime de peculato.

Desse modo, a pena-base fica reduzida de ofício para o mínimo legal de 03 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Na segunda fase, mantida a atenuante da confissão, a qual, todavia, não é valorada em decorrência do disposto na Súmula 231 do STJ, restando inalterada a pena anteriormente fixada.

Na terceira fase, não há causas de aumento, mas incidiu acertadamente a minorante do artigo 29, § 1º, do CP, na fração de 1/6 (um sexto).

Por fim, foi aplicada a causa de diminuição do art. 42 da Lei 12.850/2013, na fração de 1/2 (metade), a qual mantenho, fixando a pena em 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão e 04 (quatro) dias-multa. 

Concurso material.

Com o redimensionamento das penas, a soma totaliza o montante de 02 (dois) anos, 03 (três) meses e 15 (dias) de reclusão e 09 (nove) dias-multa.

Mantido o valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, tal como fixado pelo E. Relator.

No tocante ao regime para o início do cumprimento de pena, mostra-se acertado o aberto  em razão da quantidade pena aplicada, na forma do artigo 33, § 2º, alínea b, do CP.

Cabível a substituição da pena por duas restritivas de direitos, consistentes em  prestação de serviços à comunidade e em prestação pecuniária de 01 (um) salário mínimo.

 

Valor mínimo para reparação de danos.

Acompanho o E. Relator na impossibilidade de fixação, uma vez que o Ministério Público Federal não formulou pedido expresso na denúncia e até a prolação da sentença conjunta em ambas as ações penais.

 

Perdimento dos bens.

Considero acertado o perdimento dos bens decretado na sentença e mantido pelo E. Relator, uma vez que, compulsando os autos, é possível perceber que os bens foram adquiridos em datas ocorridas durante a prática criminosa, a indicar se tratarem de bens adquiridos como proveito do crime, estando presente a necessária contemporaneidade. 

 

Dispositivo.

Ante o exposto, rejeito a preliminar de nulidade (acompanho o E. Relator) e, no mérito, dou parcial provimento aos recursos de José Luiz Alves Moreira, Sival Miranda dos Santos, Alexandra Barbosa Camargo, Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira, para reduzir as penas-base (divirjo do E. Relator); dou parcial provimento ao recurso de Gilson de Souza, em maior extensão, para reduzir as penas-base, afastar a agravante do artigo 61, inciso I, do Código Penal para o crime do artigo 312 do CP, e fixar regime inicial semiaberto após a detração (divirjo parcialmente do E. Relator); dou provimento ao recurso de Fábio Henrique Alberghini, para absolvê-lo do crime do art. 312 do CP; dou parcial provimento, em menor extensão, ao recurso da acusação, tão somente para afastar o reconhecimento da incidência do artigo 29, § 1º, do CP (divirjo parcialmente do E. Relator); e, por fim, reduzo a pena-base do crime do artigo 2º da Lei 12.850/2013 para a ré Naiara de Almeida Santos.

As penas restam fixadas da seguinte forma:

a) Para Gilson de Souza (Autos n. 0005309- 57.2017.4.03.6120) fica estabelecida a pena total de 08 (oito) anos e 07 (sete) meses de reclusão e 37 (trinta e sete) dias-multa, no valor unitário de 1/15 (um quinze avos) do salário mínimo. Fixado o regime semiaberto após a detração do art. 387, § 2º, do CPP; 

b) Para José Luiz Alves Moreira (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120) fica estabelecida a pena total de 06 (seis) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 25 (vinte e cinco) dias-multa, no valor unitário de 1/25 (um vinte e cinco avos) do salário mínimo;

c) Para Sival Miranda dos Santos (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120 e n. 0005556-38.2017.4.03.6120) fica estabelecida a pena total de 06 (seis) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 25 (vinte e cinco) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo;

d) Para Alexandra Barbosa Camargo (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120 e n. 0005556-38.2017.4.03.6120) fica estabelecida a pena total de 05 (cinco) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 20 (vinte) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo;

e) Para Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120) fica estabelecida a pena total de 05 (cinco) anos e 06 (seis) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 22 (vinte e dois) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo; 

f) Para Naiara de Almeida Santos (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120 e n. 0005556-38.2017.4.03.6120) fica estabelecida a pena total de 02 (dois) anos, 03 (três) meses e 15 (dias) de reclusão, em regime inicial aberto, e 09 (nove) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo. Substituída a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e em prestação pecuniária de 01 (um) salário mínimo.

É como voto.


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
5ª Turma
 
 

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0005309-57.2017.4.03.6120

RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, ALEXANDRA BARBOSA CAMARGO, ERIKA CRISTINA DE OLIVEIRA ALVES MOREIRA, GILSON DE SOUZA, JOSE LUIZ ALVES MOREIRA, SIVAL MIRANDA DOS SANTOS

Advogado do(a) APELANTE: PRISCILA CRISTINA DOS SANTOS CHIUZULI - SP348933-A
Advogado do(a) APELANTE: RAFAEL RAMOS - SP319067-A
Advogados do(a) APELANTE: CAIO HENRIQUE KONISHI - SP311435-A, CLAUDINEI DE LIMA - SP317742-A
Advogado do(a) APELANTE: JULIANA MARI RIQUETO - SP247202-A

APELADO: GILSON DE SOUZA, JOSE LUIZ ALVES MOREIRA, ERIKA CRISTINA DE OLIVEIRA ALVES MOREIRA, SIVAL MIRANDA DOS SANTOS, ALEXANDRA BARBOSA CAMARGO, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

Advogados do(a) APELADO: CLAUDINEI DE LIMA - SP317742-A, CAIO HENRIQUE KONISHI - SP311435-A
Advogado do(a) APELADO: RAFAEL RAMOS - SP319067-A
Advogado do(a) APELADO: JULIANA MARI RIQUETO - SP247202-A
Advogado do(a) APELADO: PRISCILA CRISTINA DOS SANTOS CHIUZULI - SP348933-A

OUTROS PARTICIPANTES:

  

 

 

V O T O

 

 

 

Imputação. Autos n. 0005556-38.2017.4.03.6120. O Ministério Público Federal ofereceu denúncia em face de Sival Miranda dos Santos, Naiara de Almeida Santos, Alexandra Barbosa Camargo e Fábio Henrique Alberghini pela prática do delito do art. 312, caput, do Código Penal.

Narra a acusação que, em 11.07.17, por volta de 19h, nas proximidades do Depósito de Materiais da Receita Federal em Araraquara (SP), os denunciados, em comunhão de propósitos, desviaram mercadorias sob a custódia da Receita Federal, em proveito próprio e alheio.

Na condição de funcionários de AGL Armazéns Gerais e Logística, empresa contratada para a administração do Depósito de Materiais, Sival, Naiara e Alexandra tinham a posse de mercadorias apreendidas pela Receita Federal. Na data dos fatos, a Polícia Militar de Américo Brasiliense (SP) recebeu comunicado de que um “caminhão suspeito” trafegava nas proximidades de estrada de ferro da antiga Estação Tutoia. A diligência policial resultou na apreensão de um caminhão Renault Master de placas FTN-8219, conduzido por Fábio Henrique, cuja carroceria estava repleta de cigarros de origem estrangeira de importação proibida. Fábio Henrique afirmou ter sido apenas contratado para fazer o frete da mercadoria, cuja origem ilícita desconhecia. Naiara de Almeida compareceu ao local da abordagem policial. Apresentou-se como funcionária da AGL e alegou a licitude da mercadoria, cujo destino seria a incineração. Aduziu que seu superior Sival havia autorizado o carregamento. Na sequência, Sival Miranda chegou ao local dos fatos. Após serem questionados pelos Policiais, Naiara de Almeida e Sival Miranda admitiram o desvio de cigarros estrangeiros sob custódia da Receita Federal. O carregamento do caminhão havia sido feito por Alexandra Barbosa e Jhones Souza dos Santos (em relação a este, a responsabilidade não restou demonstrada). Naiara de Almeida dispôs-se a colaborar com os Policiais, revelou que não se tratava de caso isolado de desvio de mercadorias.

Em diligência à residência de Alexandra Barbosa, os Policiais apreenderam diversas caixas de papelão. Alexandra Barbosa alegou que as caixas seriam utilizadas pela AGL para empacotar cigarros a serem desviados. A denunciada admitiu ter participado do carregamento apreendido, ciente de que se tratava de desvio de mercadoria. Recebia R$ 1.000,00 (mil reais) a cada auxílio prestado para o carregamento ilícito.

Por fim, registra a denúncia que a reiteração da prática delitiva é objeto de investigação nos Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120 (Id n. 157675097, pp. 3/8).

Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120. O Ministério Público Federal ofereceu denúncia em face de Sival Miranda dos Santos, Naiara de Almeida Santos, Alexandra Barbosa Camargo, Gilson de Souza, Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira, José Luiz Alves Moreira e Guilherme Augusto Moreira Luiz, pela prática do delito do art. 312 c. c. o art. 327, § 1º, do Código Penal, em continuidade delitiva, assim como pela prática do delito do art. 1º, § 1º, da Lei n. 12.850/13 (nos termos do art. 288 do Código Penal em relação aos fatos anteriores à vigência da Lei n. 12.850/13, à exceção de Guilherme, cuja maioridade ocorreu em 14.09.15).

Em 19.10.12, a empresa AGL Armazém Geral e Logística Ltda. firmou contrato de prestação de serviço com a Delegacia da Receita Federal em Araraquara. O objeto do contrato era a administração do Depósito Regional de Materiais, localizado no km 4,5 da Rodovia Manoel de Abreu, Bairro Tutoia, em Araraquara. O contrato de prestação de serviço vigorou até outubro de 2017.

A investigação policial denominada “Operação Gestas II” apurou que Gilson de Souza, proprietário da AGL, constituiu organização criminosa para desviar mercadorias do Depósito de Materiais, em especial cigarros estrangeiros. Os denunciados, “pelo menos entre o início de 2013 e setembro de 2017 - alguns durante todo o período e outros durante parte deste intervalo, conforme será melhor detalhado ainda nesta peça -, associaram-se de forma ordenada, com divisão de tarefas, com o fim de obter
vantagem pecuniária com a prática de reiterados delitos de peculato, tipificado
pelo art. 312 do Código Penal”.

As investigações tiveram início em 11.09.17, com a prisão em flagrante de Sival, Naiara e Alexandra (empregados de AGL), além do motorista Fábio Henrique Alberghini, conforme referido nos Autos n. 0005556-38.2017.4.03.6120.

Naiara firmou termo de colaboração premiada com o Ministério Público Federal, homologado pelo Juízo a quo (Autos n. 0005556-38.2017.4.03.6120). As declarações de Naiara, em conjunto com os demais elementos obtidos pela investigação policial, demonstram o esquema criminoso que perdurou por aproximadamente 5 (cinco) anos.

À frente da organização criminosa estavam Gilson de Souza e José Luiz, este na condição de representante legal de PLS Vigilância e Segurança Ltda. e ECOAM Prestadora de Serviços Ltda., empresas responsáveis respectivamente pela vigilância e pela portaria/limpeza/jardinagem do Depósito de Materiais. Gilson de Souza e José Luiz “criaram uma rotina dentro do depósito, na qual os caminhões que ali se dirigiam para o transporte das mercadorias desviadas eram identificados como ‘caminhões de resíduo’ - posteriormente também viriam a tratá-los de ‘código dez’ - para os quais havia autorização expressa e individual para que tivessem imediata liberação para acesso às dependências do depósito, sem que fosse realizada regular vistoria pelos empregados da portaria e da vigilância, tanto na entrada (vazio), como na saída (carregado com as mercadorias desviadas).”

Gilson de Souza, José Luiz, Érika Cristina (filha de José Luiz e ex-mulher de Gilson), Sival Miranda, Naiara de Almeida e Alexandra Barbosa combinavam entre si o conteúdo das cargas que sairiam do barracão. Os contatos eram feitos pessoalmente, por meio de ligações telefônicas ou por aplicativos de mensagens (Whatsapp e Telegram). Para cada marca de cigarros estrangeiros era dado um código próprio. Na data combinada, José Luiz (e por vezes Sival e Naiara, a depender da indicação de Érika Cristina, em especial a partir da saída de José Luiz) determinava à portaria/vigilância a liberação do “caminhão de resíduo” que estava prestes a chegar ao Depósito de Materiais. O caminhão, encaminhado diretamente ao interior do galpão, era carregado com a mercadoria que já estava separada, saindo do Depósito sem a necessária vistoria. O carregamento era feito por Alexandra Barbosa, contratada pela AGL para exercer a função de operadora de empilhadeira, bem como por Sival Miranda, contratado pela AGL como fiel de depósito e que por vezes contava com o auxílio de terceiros.

Alexandra Babosa recebia aproximadamente R$ 1.000,00 (mil reais) por carga que despachava. Matinha contato com José Luiz para informar-lhe sobre a chegada de novos cigarros, de modo a garantir o contínuo desvio da mercadoria apreendida (conforme mensagens de Whatsapp transcritas em relatório de análise da Polícia Judiciária, Representação Criminal n. 0000340-62.2018.4.03.6120).

Embora não tenha sido possível precisar o período, a investigação apontou que Guilherme Augusto (filho de Érika e neto de José Luiz) trabalhou no Depósito durante certo período. Preparava caixas e ajudava no carregamento dos cigarros. Por vezes, valia-se de veículo próprio para descarregar caixas desmontadas no Depósito. Em algumas oportunidades, fazia a escolta armada dos carregamentos de cigarros.

Naiara de Almeida prestava auxílio na preparação e acompanhamento dos carregamentos de cigarros. A partir de abril/maio de 2017, passou a exercer a função de auxiliar de fiel, atividade que exigia permanência no galpão. Antes disso, graças à atividade administrativa exercida no escritório da AGL, participava da organização criminosa especialmente por meio da conferência de autorizações para a liberação dos “caminhões de resíduos” e preparação de cargas.

A logística adotada pela organização criminosa era complexa e incluía a adulteração do sistema de monitoramento do interior do galpão. Parte das câmeras de vigilância não estava funcionando e outra parte das câmeras era apontada para áreas em que não havia carregamento de caminhões. As imagens captadas eram submetidas a tratamento, com exclusão de trechos para posterior encaminhamento à Receita Federal. Parte da iluminação externa do galpão foi retirada para ocultar a movimentação noturna.

Além disso, a organização criminosa buscava ludibriar a fiscalização por meio da substituição do conteúdo das caixas. Os cigarros desviados eram substituídos por fumo de corda, papelão e plástico, ou mesmo eram mantidas vazias as caixas, porém acondicionadas como se estivessem cheias. O preparo das caixas incumbia a Alexandra Barbosa, que recebia pagamento por essa tarefa.

As saídas do “caminhão de resíduos” com carga desviada era praticamente diária e, por vezes, ocorria mais de uma vez ao dia.

O contrato celebrado pela AGL com a Receita Federal dispunha que a vigilância e o controle de portaria poderiam ser atribuídos a outra empresa. Nesses termos, inicialmente a vigilância coube à PLS Vigilância e a portaria à ECOAM Prestadora de Serviços. O denunciado José Luiz era sócio de ambas as empresas e com o auxílio de Sival Miranda, fiel de depósito da AGL, controlava a saída dos caminhões com a carga desviada. Em maio/junho de 2017, após desentendimento com Gilson, ambas as empresas foram substituídas por Capital (vigilância) e Gel Clean (portaria/limpeza/jardinagem). As duas últimas empresas estavam em nome de Rafael Santana de Souza, filho de Gilson, a indicar que a este eram vinculadas. Com a saída de José Luiz, Érika Cristina assumiu o seu papel, passando a dar ordens a Sival e Naiara.

Mesmo não tenho sido possível apurar todos os ingressos de “caminhões de resíduos” no período, é certo que ao menos por 285 (duzentas e oitenta e cinco) vezes o grupo criminoso desviou cigarros estrangeiros acautelados no Depósito administrado pela AGL.

A Receita Federal informou que “ao menos o quantitativo do desvio já estava concluído e alcançava o montante de mais de 84.000 caixas de cigarros que correspondem a mais de 42.000.000 de maços. Com base no valor atribuído ao maço de cigarros em cada auto de infração lavrado pela Receita, o montante atingiu o expressivo valor de R$ 124.530,240,80” (conforme mídia encartada aos Autos n. 0000340-62.2018.403.6120, fl. 276).

A quebra de sigilo bancário permitiu a apuração da expressiva movimentação bancária dos denunciados, em especial de José Luiz e Érika Cristina, responsáveis pela venda da maior parte dos cigarros. Restou demonstrado o repasse de valores a Gilson de Souza, cujas contas bancárias também recebiam depósitos em dinheiro. Alexandra Barbosa também recebeu valores em suas contas bancárias, referentes à sua participação no esquema criminoso e também para repasse a Naiara de Almeida.

Na segunda parte da denúncia, que diz respeito aos peculatos, sustenta a acusação que, no período de 2013 a setembro de 2017, houve ao menos 285 (duzentos e oitenta e cinco) desvios de mercadorias (cf. Informação n. 009/2018-UIP/AQA, em Apenso II, vol. I), totalizando aproximadamente R$ 124.530.240,80 (cento e vinte e quatro milhões, quinhentos e trinta mil, duzentos e quarenta reais e oitenta centavos).

Em face do contrato de prestação de serviços celebrado com a Receita Federal, os denunciados equiparam-se a servidores públicos para fins penais (CP, art. 327, § 1º).

Na condição de proprietário de fato da empresa AGL, Gilson contratou a PLS Vigilância e a ECOAM Prestadora de Serviços, ambas de propriedade de seu ex-sogro José Luiz. A partir de 2013, Gilson e José Luiz criaram sofisticado esquema para desvio de mercadorias, contando com a participação de Sival, Naiara, Alexandra e Guilherme, os quais cuidavam da logística para entrada, carregamento e saída dos cigarros desviados. Valendo-se do “código 10”, avisavam na portaria/vigilância sobre a chegada de “caminhão de resíduos”, para dispensa da necessária rotina de vistoria e segurança.

Ainda sob o comando de Gilson e José Luiz, os comparsas Sival, Naiara e Alexandra providenciavam a separação dos cigarros e a retirada do Depósito. Alexandra atuava diretamente no carregamento dos caminhões, na função de operadora de empilhadeira.

No que diz respeito a Guilherme Augusto, reitera-se que o denunciado trabalhou no Depósito durante o período em que José Luiz comandava as atividades ilícitas. O denunciado auxiliava na preparação das caixas e no carregamento dos cigarros. Assim como Alexandra, por vezes entrava irregularmente no galpão para descarregar caixas vazias que seriam usadas no desvio dos cigarros.

Em abril de 2017, aparentemente devido a desentendimento entre Gilson e José Luiz, houve substituição da empresa de vigilância e de limpeza/portaria. José Luiz afastou-se do esquema criminoso. Sival Miranda permaneceu na atividade ilícita, na função de fiel depositário, contando com a participação de Naiara de Almeida, que passou a exercer a função de auxiliar de fiel. O esquema criminoso foi aprimorado nesse período. Érika Cristina, com a saída de seu pai José Luiz, passou a exercer o papel de coordenação por ele realizado, dando ordens a Sival, Alexandra e Naiara.

A venda de cigarros incumbia principalmente a José Luiz e Érika Cristina, por vezes a Gilson de Souza. A quebra de sigilo bancário apontou os valores movimentados pelos denunciados, com depósitos realizados em várias cidades dos Estados de São Paulo, Espírito Santo, Rio de Janeiro e Paraná.

Em que pese a “impossibilidade de indicar o efetivo número de vezes que caminhões entraram no Depósito para promover a retirada dos cigarros, sabe-se que o valor atribuído pelos autos de infração lavrados pela RFB quanto aos cigarros que não foram localizados alcançou a expressiva quantia de R$ 124.530.240,80 (cento e vinte e quatro milhões, quinhentos e trinta mil, duzentos e quarenta reais e oitenta centavos)” (Id n. 157670223, pp. 3/20).

Funcionário público. Terceiro setor. Convênio. Equiparação. Com fundamento no § 1º do art. 327 do Código Penal, quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal e quem trabalha para empresa prestadora de serviço público contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública, equipara-se a funcionário público para efeito penal. Em consequência, as entidades integrantes do chamado “terceiro setor”, isto é, fundações, associações, cooperativas, organizações sociais, organizações da sociedade civil de interesse público, quedam-se abrangidos pela incidência da norma penal, na medida em que por seu intermédio venham a ser empregados recursos públicos, os quais constituem o bem jurídico protegido pela norma penal. O Superior Tribunal de Justiça já admitiu a responsabilização criminal de dirigente de organização social por crime de peculato, com base no art. 327, § 1º, do Código Penal (STJ, REsp n. 1.519.662, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 18.08.15). Também este Tribunal e o Tribunal Regional Federal da 5ª Região admitiram a responsabilidade criminal de agentes ligados ao terceiro setor pela prática de crime próprio contra a Administração Pública (TRF 3ª Região, ACr n. 2009.03.99.001632-9, Rel. Des. Fed. Paulo Fontes, j. 12.05.14; TRF 5ª Região, ACr n. 00052726720104058400, Rel. Des. Fed. Joana Carolina Lins Pereira, j. 03.12.13).

Do caso dos autos. Érika Cristina sustenta que não pode ser considerada como funcionária pública equiparada, sendo indevida a sua condenação pela prática do delito do art. 312 do Código Penal. A alegação não prospera. Na condição de contratados da AGL, empresa que administrava o Depósito de Materiais da Receita Federal em Araraquara, aplica-se à réu o disposto no art. 327, § 1º, do Código Penal.

No que diz respeito ao motorista de caminhão Fábio Henrique Alberghini, assiste razão ao Juízo a quo ao afirmar que no caso de concurso de agentes, comunicam-se as circunstâncias e as condições de caráter pessoal quando elementares do crime (CP, art. 30). A alegação de que o réu não conhecia a condição dos demais agentes não se sustenta, conforme será demonstrado oportunamente, por ocasião da análise da autoria delitiva.

Delação premiada. Nulidade. Afirma a defesa de José Luiz Alves Moreira que nos Autos n. 0005717-48.2017.403.6120, a colaboradora/delatora Naiara não renunciou ao direito ao silêncio nem prestou o compromisso de dizer a verdade, em ofensa ao disposto no art. 4º, § 14, da Lie n. 12.850/13. Ademais, as declarações de Naiara foram prestadas após a oitiva do delatado, o que configura violação ao direito de defesa do réu.

A preliminar de nulidade não prospera.

A irregularidade restringe à formalidade do ato, que atingiu sua finalidade. Por outro lado, a defesa não indica o efetivo prejuízo sofrido pelo réu, (STJ, AgRg no RHC 81.075, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 17.11.20, RHC n. 73.043, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 12.12.17, AgRg no AREsp 627.089, Rel. Min. Nefi Cordeiro, j. 17.10.17).

Materialidade. Os seguimentos elementos dos Autos n. 0005556-38.2017.4.03.6120 demonstram a materialidade delitiva:

a) Contrato de prestação de serviços celebrado entre a União (por meio da DPF de Araraquara) e AGL Armazém Geral e Logística Ltda. (representada pelo sócio-administrador Gilson de Souza), datado de 19.10.12 e decorrente do pregão eletrônico, cujo objeto é a prestação de serviços contínuos de custódia e administração de bens apreendidos, com cláusula que permite a subcontratação dos serviços de vigilância eletrônica e armada, limpeza, manutenção predial, auditoria externa e serviço de portaria (Id n. 157675095, pp. 72/99 e aditivos em pp. 100/108 e Id n. 157675096, p. 1);

b) Auto de prisão em flagrante de Silva Miranda, Fábio Henrique, Alexandra Barbosa e Naiara de Almeida, lavrado pela Delegacia de Polícia Federal - DPF de Araraquara em 11.09.17 (Id n. 157675091, pp. 14/16);

c) Auto de apresentação e apreensão, lavrado pela DPF de Araraquara, de diversas caixas de cigarros de origem estrangeira (Id n. 157675091, pp. 36/37);

d) Informação n. 035/2017, da Unidade de Inteligência Policial da DPF de Araraquara, que após análise de dados de planilha arquivada no computador de Naiara de Almeida, apontou como sendo de R$ 178.809.073,21 o “valor negativo estimado” (diferença entre o estoque do sistema e o efetivo estoque do depósito) (Id n. 157675094, pp. 9/10);

e) Auto de infração e termo de apreensão e guarda fiscal de 100.000 (cem mil) maços de cigarros da marca Gift, avaliados pela Receita Federal em R$ 1.557.000,00 (um milhão, quinhentos e cinquenta e sete mil reais) (Id n. 157675102, pp. 88/90);

f) Relatórios de análise de dados (mensagens e áudios) extraídos dos telefones celulares de Naiara de Almeida, Alexandra Barbosa e Sival Miranda (Id n. 157675103, pp. 29/58, 59/71, 72/82, Id n. 157675104, pp. 1/42, 43/61, 62/75);

g) Relatório de análise dos aparelhos celulares de Naiara de Almeida e de Alexandra Barbosa, com indicação das mensagens trocadas entre os denunciados (Id n. 157675103, pp. 29/58 e 59/82, e n. 157675104);

h) Relatório final de diligências realizadas para averiguação do Depósito de Materiais Aprendidos, que constatou o não funcionamento de parte das câmeras de vigilância, cômodo oculto (formado por pallets), caixas montadas e vazias armazenadas nos pallets, caixas originais preenchidas com fumos, dentre outras irregularidades (Id n. 157675103, pp. 12/26);

i) Laudo de perícia criminal federal (mercealogia) das mercadorias indicadas no auto de infração da Receita Federal, a saber, 100.000 (cem mil) maços de cigarros da marca Gift de origem Paraguaia, os quais foram avaliados pelo Perito Criminal em R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) (Id n. 157675105, pp. 72/75).

No que concerne aos Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120, a materialidade delitiva resta demonstrada pelas provas que seguem:

a) Relatório n. 01/2017, da Unidade de Inteligência da DPF em Araraquara, acerca de monitoramento telefônico dos denunciados, referente ao período de 25.08.17 a 14.09.17, com transcrição de trechos de conversas telefônicas (Id n. 157670216, pp. 56/61);

b) Informação n. 33/2017, da DPF de Araraquara, referente ao material apreendido no Depósito de Materiais da Receita Federal (livro de ocorrências do portão de entrada/saída de veículos, com anotação de os ingressos não eram sistematicamente anotados, porém 15 entradas foram registradas como “caminhão de resíduos” ou “código 10”, no período de agosto a setembro de 2017) (Id n. 157670216, pp. 72/74);

c) Informação n. 035/2017, da DPF de Araraquara, referente a planilha arquivada no computador de Naiara de Almeida, com indicação de estoque a menor de 124.260 caixas de cigarros (Id n. 157670217, pp. 13/14);

d) Auto de apreensão de documentos diversos no escritório da AGL localizado no Depósito de Materiais da Receita Federal (Id n. 157670217, p. 67);

d) Informação n. 009/2018, da DPF de Araraquara, referente à análise de livros de controle de acesso e saída de veículos no pátio do Depósito da Receita Federal, bem como de caderno de anotações de Alexandra Barbosa, conclusivo no sentido de que no período de maio de 2013 a agosto de 2017 houve 284 lançamentos/registros de “resíduos” (transporte de cigarros), sem contar o que foi objeto do flagrante em 11.09.17, com autorizações concedidas por Jose Luiz (69 vezes), Maira (26 vezes), Naiara (39 vezes), Sival (138 vezes), não identificadas (10 vezes) (Id n. 157670206, pp. 3/14);

e) Contratos sociais de Capital Segurança e Vigilância Ltda. – ME (Id n. 157670217, pp. 80/85);

f) Relatório n. 09/2018, da DPF de Araraquara, referente à interceptação telefônica dos investigados e diligências policiais realizadas em junho de 2018 (Id n. 157670217, pp. 100/1033);

g) Auto de apreensão de celulares, computadores e documentos, lavrado pela DPF de Araraquara em 14.06.18 (Id n. 157670217, pp. 113/114);

h) Ofício n. 79/2017, da Delegacia da Receita Federal em Araraquara, que encaminha levantamento prévio das irregularidades praticadas no Depósito de Materiais de Araraquara, com indicação de 2008 caixas montadas e vazias armazenadas nos pallets, 880 caixas preenchidas com fumo e armazenadas nos pallets, 1036 caixas de cigarros estrangeiros de marcas diversas, além de caixas vazias ou adulteradas /preenchidas com papelão, plástico etc. (Id n. 157670220, pp. 83/94);

i) Informação n. 017/2018, da DPF em Araraquara, sobre os livros de registros de vigilância, entregues por José Luiz Alves Moreira, com anotações feitas pelos vigilantes da empresa PLS Vigilância e Segurança Ltda. Especificamente sobre a denominada Portaria 1 (P1), acesso dos caminhões, elenca 17 (dezessete) registros de entrada como “resíduo” ou “código ‘10” no período de janeiro de 2016 a maio de 2018. Ressalta que a Informação n. 033/2017 apresenta outras ocorrências, com anotações diárias pelo referido portão de entrada no período de maio de 2017 a 12.09.17, data em que o livro foi apreendido (Id n. 157677132, pp. 36/38).

j) Oficio da Receita Federal, datado de 09.05.19, segundo o qual “o valor atualizado da totalidade dos cigarros estrangeiros desviados do Depósito de Mercadorias Apreendidas, no período investigado, é de R$ 155.830.600,30 (cento e cinquenta e cinco milhões, oitocentos e trinta mil, seiscentos reais e trinta centavos) (Id n. 157677136, p. 136).

Autoria. Autos n. 0005556-38.2017.4.03.6120. Consta do auto de prisão em flagrante que, em 11.09.17, Sival Miranda, Fábio Henrique, Alexandra Barbosa Camargo e Naiara de Almeida foram presos em flagrante e conduzidos à Delegacia de Polícia Federal em Araraquara pelos Policiais Militares Ronildo Aparecido Messias e Fabrício Vieira Lima. Fábio Henrique era o condutor do caminhão Renault Master, placas FTN-8219, cuja carroceria estava carregada com cigarros de origem estrangeira. Durante a abordagem policial, Naiara e Sival foram ao local dos fatos, apresentaram-se como funcionários da AGL e admitiram que se tratava de carga ilícita de mercadoria. Apontaram Alexandra e Jhones como os responsáveis pelo carregamento do caminhão, porém somente a primeira saberia da irregularidade da carga. Os Policiais Militares encaminharam-se à residência de Alexandra, local em que havia diversas caixas de papelão que seriam usadas para empacotar os cigarros. Alexandra, operadora de empilhadeira, admitiu receber R$ 1.000,00 (mil reais) por carregamento realizado (Id n. 157675091, pp. 14/19).

Em sede policial, Fábio Henrique Alberghini negou conhecer a ilicitude da mercadoria. Sustentou que o caminhão era de seu irmão e que o utilizava para fazer fretes. No mais, exerceu o direito ao silêncio (Id n. 157675091, pp. 27/28). Sival Miranda e Alexandra Barbosa, na fase investigativa, também exerceram o direito ao silêncio ((Id n. 157675091, pp. 29/30 e 31/32).

Naiara de Almeida Santos declarou à Autoridade Policial que pretendia colaborar com a investigação. Afirmou trabalhar como auxiliar do depositário fiel, ou seja, para AGL Armazém Geral e Logística. Até maio de 2017, exercia função administrativa. Passou a trabalhar diretamente no depósito após essa data, ocasião em que tomou ciência do esquema de desvio de mercadoria do qual participavam Sival (depositário fiel) e Alexandra (empilhadeira). O esquema funcionava do seguinte modo: Érika Cristina, então esposa de Gilson de Souza (proprietário da AGL), fazia contato via Whatsapp com Sival ou Alexandra para informar que enviaria um caminhão vazio ao depósito, para carregamento com os cigarros apreendidos. Érika informava um código específico para cada marca de cigarro a ser carregada no veículo e desviada. Alexandra e Sival separavam os pallets, de modo a garantir o rápido carregamento do caminhão. O carregamento era frequente, por vezes mais de uma vez ao dia. Segundo informação que recebeu de Alexandra, o esquema era antigo, teve início com José Luiz Alves Moreira, pai de Érika Cristina. Para burlar o controle de mercadorias, no lugar dos cigarros era colocado fumo de corda (também objeto de apreensão) ou, por vezes, as caixas ficavam vazias. Há alguns dias, Sival solicitou-lhe o levantamento do total de mercadorias desviadas. Apurou que nos 4 (quatro) meses anteriores 3.600 pallets de cigarros foram desviados. Cada pallet corresponde a 32 caixas ou 16.000 maços de cigarros. Os dados estão armazenados no computador de que faz uso, no pátio interno do barracão. Cada caminhão carrega aproximadamente 200 (duzentas) caixas. Para garantir o desvio, as câmeras de monitoramento do pátio eram desligadas pela interrogada ou por Sival. Em duas oportunidades recebeu valores pelo auxílio prestado à empreitada criminosa. Em seu celular há registro de conversas suas com Erika, Sival e Alexandra. No que diz respeito ao carregamento apreendido em 11.09.17, Naiara afirmou que ela própria desligou as câmeras de monitoramento antes de o caminhão chegar ao pátio. Sival aguardava do lado de fora do pátio. Após o carregamento, já em sua casa, recebeu mensagens de Érika dando conta da abordagem ao caminhão pela Polícia Militar (Id n. 157675091, pp. 33/35).

O Juízo a quo deferiu a busca e apreensão do computador indicado por Naiara e de documentos relacionados aos fatos, bem como autorizou o acesso aos dados dos celulares apreendidos (Id n. 157675092, pp. 41/44).

Houve apreensão, dentre outros materiais, de livro de ocorrências com registro de movimentação de caminhões identificados como “resíduo” ou “código 10”, em nome de “Érica Dias Supervisora”, conforme apontou a Unidade de Inteligência Policial na Informação n. 33/2017. Os registros de ocorrências permitiram concluir que nem todos os ingressos de veículos eram anotados pelos vigilantes em serviço, de modo que não seria definitiva a indicação de 15 (quinze) ocorrências no período de maio a setembro de 2017 (Id n. 157675092, pp. 104/107).

Segundo a Informação n. 35/2017, da Unidade de Inteligência Policial, o arquivo de computador referido por Naiara em seu depoimento policial, vale dizer, a planilha com o levantamento do total de mercadorias desviadas, indica 124.260 caixas de cigarros a menor, a resultar no “valor negativo estimado” de R$ 178.809.73,21 (Id n. 157675094, pp. 9/10).

Sival Miranda dos Santos, Naiara de Almeida Santos, Alexandra Barbosa Camargo e Fábio Henrique Alberghini foram denunciados pela prática do delito do art. 312, caput, do Código Penal.

Em Juízo, a testemunha Maurício Novaes, Delegado-Chefe da Receita Federal em Araraquara, afirmou que havia determinado à empresa AGL, antes do flagrante, que providenciasse o conserto das câmeras de monitoramento do Depósito de Materiais. As empresas de vigilância e de portaria eram subcontratadas pela AGL, conforme previsão contratual. Por conta da saída da AGL em outubro de 2017, com entrada da empresa vencedora da nova licitação, o inventário das mercadorias do Depósito de Materiais está sendo concluído. Era preciso autorização expressa e individual da Receita Federal para acesso de terceiros às dependências do Depósito (Id n. 258549197).

Os Policiais Militares Ronildo Aparecido Messias e Fabrício Vieira Lima, ouvidos em Juízo, reiteraram os termos das declarações prestadas em sede policial acerca das circunstâncias das prisões em flagrante e apreensão de mercadoria (Ids ns. 258545420 e 258549201).

A testemunha Jhones Souza dos Santos, empregado da AGL, afirmou em Juízo que Naiara pediu-lhe, na data dos fatos, que ficasse no Depósito após as 18h, para auxiliar no carregamento de um caminhão. Na companhia de 2 (dois) colegas e de Alexandra, colocou as caixas de cigarros no caminhão. Não sabia que se tratava de desvio de mercadoria (Id n. 258549199).

A testemunha Emerson Carvalho Martins, vigilante do Depósito na data da apreensão, declarou que estava na portaria quando o caminhão chegou depois das 18h. Naira já havia autorizado a entrada do caminhão, que não foi identificado em nenhuma oportunidade (Id n. 258549200).

Em interrogatório judicial, Naiara de Almeida aduziu que na data da apreensão da mercadoria, recebeu ligação de Érika Cristina, via Whatsapp, para comunicar-lhe sobre o carregamento de cigarros que ocorreria após as 18h. Os cigarros foram separados e preparados por Alexandra, que também ajudou a carregar o caminhão. A interrogada estava no interior do barracão quando o caminhão chegou. Autorizou a entrada junto à portaria do Depósito. Sival desligou o sistema de monitoramento que havia no interior do galpão e ficou aguardando do lado de fora. A própria interrogada religou o sistema de monitoramento por câmeras após a saída do caminhão. Quando já estava em sua residência, recebeu uma ligação de Érika Cristina dando conta da abordagem policial e pedindo-lhe que fosse ao local da apreensão. Quando chegou ao local indicado, identificou-se como funcionária do Depósito aos Policiais Militares. Argumentou que os cigarros destinavam-se à incineração. Na companhia dos Policias, foi ao Depósito para pegar o endereço de Sival, o fiel de depósito. Ao retornar ao local do flagrante, encontraram Sival. A interrogada decidiu revelar que se tratava de desvio de mercadorias do Depósito da Receita Federal (Id n. 258549211).

Em Juízo, Alexandra Barbosa admitiu a participação na prática delitiva. Afirmou ter separado os cigarros e ajudado a carregar o caminhão posteriormente apreendido. Recebia R$ 1.000,00 (mil reais) por carregamento, depositados em sua conta bancária por Érika Cristina. As caixas de papelão apreendidas em sua residência foram deixadas por Érika Cristina e seriam utilizadas para acondicionar os cigarros desviados (Id n. 258549219).

Em interrogatório judicial, Sival de Souza declarou que se limitava a cumprir ordens de Gilson de Souza, o seu patrão. Não autorizou a entrada do caminhão apreendido. Não estava no galpão quando houve o carregamento. Não desligou o sistema de monitoramento por câmeras. Não se recorda de ter sido avisado sobre a chegada do caminhão. Alexandra comunicou-lhe a abordagem policial. Telefonou para Gilson, que determinou a sua ida ao local do flagrante. Ali chegando, identificou-se como responsável pelo Depósito. Indagado sobre a movimentação no Depósito, afirmou que autorizava a entrada e a saída de caminhões somente após ordem de Gilson. As falhas no sistema de monitoramento por câmeras eram decorrentes de queda de sinal, não havia edição de imagens (Id n. 258549222).

Na fase judicial, Fábio Henrique Alberghini negou a participação na prática delitiva. Por meio do aplicativo OLX, foi contratado para um frete. O seu contratante apenas mencionou que a carga era de resíduos, o que levou o interrogado a concluir que se tratava de carregamento de coisas inúteis, descartáveis. Combinaram que a mercadoria seria buscada no Depósito de Materiais Araraquara e deixada em um posto de combustíveis na Rodovia dos Bandeirantes, nas proximidades da cidade de São Paulo. Receberia R$ 1.600,00 (mil e seiscentos reais) pelo frete. Ao chegar ao Depósito, a sua entrada foi liberada. Seguiu até o galpão e aguardou o carregamento no próprio caminhão. Não sabia o conteúdo da carga. Por se tratar de resíduo, não havia nota fiscal. Logo após sair do Depósito, foi abordado pelos Policiais. Após a vistoria da carga, soube que se tratava de cigarros estrangeiros. Fez o frete em confiança, era a segunda vez que transportava carga do Depósito de Materiais (Id n. n. 258549226).

Os elementos dos autos são suficientes à prova da autoria delitiva de Alexandra Barbosa Camargo, Naiara de Almeida Santos, Sival Miranda dos Santos e Fábio Henrique Alberghini.

Em interrogatório judicial, Alexandra Barbosa e Naiara de Almeida confessaram a participação no desvio de cigarros apreendidos em 11.09.17.

No que diz respeito a Sival Miranda, embora tenha procurado afastar a sua responsabilidade sob a alegação de que se limitava a cumprir ordens, pode-se concluir que tinha pleno conhecimento da natureza ilícita de sua conduta. A participação de Sival Miranda na prática delitiva é indicada pelos corréus e corroborada pelas conversas telefônicas por eles mantidas logo após a apreensão da carga de cigarros, interceptadas judicialmente e transcritas no Relatório n. 01/2017, da Delegacia de Polícia Federal em Araraquara:

 

Índice: 554-648

Operação: GESTAS

Nome do Alvo: SIVAL

(...)

Data:11/09/2017

Horário: 19:22:27

Observações: @@@ ALEXANDRA X SIVAL

 

Transcrição:

ALEXANDRA: Sival...

SIVAL: Oi?

ALEXANDRA: A Érica ligou e falou que os cara parou os cara là na Tutóia

SIVAL: Parou quem?

ALEXANDRA: Parou o caminhão lá na Tutóia.

SIVAL: Hahaha! E agora?

ALEXANDRA: Ah, não sei, ela mandou eu te ligar...

SIVAL: Vixe, ave Maria! Sabia, meu! Não, não tem como ligar não, eu não vou voltar lá não, fia!

ALEXANDRA: Falar...

SIVAL: Cê quer que eu faça o que?

ALEXANDRA: Sei lá...

SIVAL: Não tem como fazer nada não! Eu tava vendo isso aí, cara...! Puta que pariu, cara! Olha o B.O. agora. Quem parou? Quem (inaudível) parou?

ALEXANDRA: A polícia parou o caminhão.

SIVAL: A polícia é... é... o que?

ALEXANDRA: Acho que a Militar

SIVAL: Ah, então eles que resolvam por lá, deixa eles resolverem pelo lado de lá

ALEXANDRA: Que ela falou... ela ligou e falou assim: Ah, liga pro Sival prá ele ir lá e liberar os caras

SIVAL: Oxe, como eu vou liberar os caras, falar o que, menino, vou liberar os caras como, você é doido é?

ALEXANDRA: Sei lá, ela falou...

SIVAL: Ooxe, cê é louco fia, tem como não, fia tem como não Oxe, liberar os cara como?

ALEXANDRA: Sei lá...

SIVAL: Ir preso mais um? Agora fudeu, meu, agora tá a merda foi feita mesmo. Puta que pariu, meu, eu tava vendo essa porra... cara, eu vou ver, peraí, peraí.... manda se virar lá, não tem como liberar os caras não, tchau.

ALEXANDRA: Eu vou falar pra ela. Tchau.

 

Indice: 55416229

Operação: GESTAS

Nome do Alvo: SIVAL

(...)

Data: 12/09/2017

Horário: 02:50:11

Observações: @@@ SIVAL X FILHO - GILSON VAI COM ADVOGADO

 

Transcrição: Diálogo relevante aos 1’00”:

............

FILHO: "Liguei pro compadre Gilson... Eu liguei pro compadre Gilson. Ele falou que de manhã ele tá indo. Com advogado.

FILHO: Mas que que aconteceu negão?

SIVAL: Problemas e problemas.

FILHO: É negócio com a AGL?

SIVAL: É... (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120, Id n. 157670216, pp. 56/61).

 

No que toca a Fábio Guilherme Alberghini, motorista do caminhão, carece de credibilidade a afirmação de que teria agido de boa-fé, uma vez que contratado informalmente por meio do aplicativo OLX, acreditando tratar-se de transporte de produtos inservíveis. A retirada de mercadoria no Depósito de Materiais da Receita Federal em Araraquara, após as 18h e sem qualquer tipo de documento de saída, para entrega em um posto de serviços em São Paulo, são suficientes para indicar a irregularidade do frete e infirmar a alegação de que o réu desconheceria a natureza do transporte ou que teria agido apenas culposamente. Portanto, não prospera a pretendida desclassificação para peculato culposo nem a afirmada ofensa a dispositivos legais e constitucionais que tratam da presunção de inocência e do ônus da prova.

Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120. O Ministério Público Federal ofereceu denúncia em face de Sival Miranda dos Santos, Naiara de Almeida Santos, Alexandra Barbosa Camargo, Gilson de Souza, Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira, José Luiz Alves Moreira e Guilherme Augusto Moreira Luiz, pela prática do delito do art. 312 c. c. o art. 327, § 1º, do Código Penal, em continuidade delitiva, assim como pela prática do delito do art. 1º, § 1º, da Lei n. 12.850/13.

Na fase investigativa, José Luiz Alves Moreira declarou que trabalha com compra e venda de cigarros brasileiros e que ocasionalmente vende veículos. Gilson de Souza é seu ex-genro. O depoente era dono de uma empresa de vigilância denominada PLS, que prestava serviços para a AGL, empresa de Gilson que administrava o Depósito de Materiais da Receita Federal em Araraquara. Não manteve relação empresarial com a sua filha Érika Cristina. Conhece Naiara de Almeida, pessoa que cuidava da área administrativa da AGL, porém mantinham apenas relações comerciais. Guilherme Augusto é o seu neto e o seu sócio na DUB Escapamentos. Conhece Alexandra Barbosa, cuja função era de empilhadeira no Depósito de Materiais, não mantinham relação alguma. Conhece Sival Miranda, fiel depositário no Depósito de Materiais. Nunca trabalhou com a venda de cigarros contrabandeados. Indagado sobre áudio datado de 13.03.18, no qual faz menção a marcas de cigarros em conversa telefônica mantida com Ricardo Brito da Silva, vigilante que trabalhou no Depósito da Receita Federal, disse José Luiz que os cigarros mencionados eram de procedência nacional. Negou ter participado do desvio de cigarros do Depósito de Materiais da Receita Federal, inclusive as funções por ele desempenhadas à época sequer permitiam o acesso às mercadorias. Indagado sobre mensagens trocadas via Whatsapp com Alexandra Barbosa, com menção à marca de cigarros Gift, respondeu que não se recorda (Id n. 157670217, pp. 116/122, instruído com transcrição de áudios e conversas degravadas).

Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira, ouvida em sede policial, afirmou ser vendedora autônoma de cestas básicas. Foi casada com Gilson de Souza, de quem se separou em 2014. Trabalhou na parte administrativa da PLS, porém nunca atuou no Depósito da Receita Federal em Araraquara. É filha de José Luiz Alves Moreira, sócio de Gilson na empresa PLS, do ramo de segurança. No mais, exerceu o direito ao silêncio para não responder às perguntas referentes aos áudios e diálogos interceptados judicialmente, transcritos em anexo ao auto de qualificação e interrogatório (Id n. 157670218, pp. 20/21 e 22/25).

Perante a Autoridade Policial, Guilherme Augusto Moreira Luiz, filho de Érika Cristina, negou ter feito escolta armada de caminhão. É proprietário de uma lavadora de carros em Bauru. Gilson de Souza é seu ex-padrasto. Prestou serviços para Gilson no galpão da Receita Federal em Araraquara, por cerca de 4 (quatro) meses. No local trabalhavam Naiara, Alexandra, Wanderlei e Jonathan. Seguia ordens de Sival, o fiel depositário. Uma vez por semana, Sival, por ordem de Gilson, determinava a toda a equipe que colocasse caixas de cigarros dentro de um caminhão. Sival dizia que os cigarros seriam incinerados, porém em certo ponto o depoente começou a desconfiar de que a saída da mercadoria era ilegal. Perguntou a Alexandra, que se esquivou. Quando indagou a Gilson, obteve resposta em tom ameaçador, para que não abrisse a boca, sob pena de sofrer as consequências. Após um mês, deixou de trabalhar no galpão. Gilson era violento, batia na mãe no depoente e já a ameaçou com uma arma (Id n. 157670219, pp. 12/16).

Gilson de Souza, na fase investigativa, exerceu o direito ao silêncio (Id n. 157670219, pp. 43/44).

Na fase policial, Naiara de Almeida Santos afirmou ter iniciado seu trabalho no Depósito de Materiais da Receita Federal em novembro de 2012, um mês após a AGL assumir a administração do local. Gilson de Souza havia trabalhado como fiel no mesmo Depósito, com a empresa TCB. Gilson é padrinho da filha de Sival, tratam-se como compadres. A depoente trabalhava no escritório e desconfiava dos caminhões que entravam sem autorização da Receita Federal. Um caminhão por dia, por vezes mais de um. A entrada dos caminhões sem autorização era feita com a utilização do “código 10”, anteriormente denominados “resíduos”. Após José Luiz dizer a uma funcionária que o assunto não era da alçada dela, não houve mais indagações no escritório sobre esses caminhões. Sival, Alexandra e José Luiz tinham conhecimento das práticas ilícitas. A empresa contratava funcionários avulsos para colocar os cigarros nas caixas e carregar o caminhão de resíduos. Guilherme Augusto chegou a trabalhar na preparação das caixas de cigarros a serem desviadas. Após o sumiço de um celular, Sival disse que não queria mais Guilherme no Depósito. Quando a depoente saiu da parte administrativa e desceu para o Depósito, Guilherme voltou a trabalhar no local por uns 3 (três) meses. Em algumas oportunidades, Guilherme fez a escolta armada da carga desviada. No que diz respeito a Érika Cristina, inicialmente trabalhava como contratada da empresa de vigilância PLS, cujo proprietário era José Luiz. Érika Cristina exercia a função de chefe de segurança, determinava qual caminhão entraria direto no Depósito. Antes disso, Érika Cristina era funcionária de outra empresa, não sabe dizer se nessa época ela sabia das práticas delitivas. Sobre a planilha encontrada em seu computador, esclareceu a depoente que após o recebimento de qualquer mercadoria era feita a Relação de Mercadoria Apreendida – RMA, a ser encaminhada à Delegacia da Receita Federal. Enquanto o documento não era encaminhado, havia o registro de “não formalizado”. Os registros no livro de entrada/saída de veículos eram feitos pelo porteiro, após autorizações dadas pelos funcionários do escritório. No caso de “resíduos”, a regra era a de que o próprio José Luiz fosse à portaria para autorizar pessoalmente a entrada do caminhão. Quando José Luiz não estava, a depoente entrava em contato com ele para perguntar se poderia deixar o caminhão entrar, por essa razão o seu nome constava no livro como sendo a pessoa que havia autorizado a entrada. Nunca viu Sival ligar para José Luiz para pedir autorização, ele próprio autorizava a entrada. Apenas dois depósitos em sua conta corrente, realizados por Alexandra Camargo, dizem respeito ao pagamento de desvio de cargas de cigarros. Os demais decorrem de empréstimos. Uma parte dos depósitos feitos por Gilson são para pagamento de salário ou premiação, os demais depósitos foram realizados para repasse aos outros funcionários. O valor depositado pela empresa ECOAM deu-se para a compra de materiais de limpeza e uniformes. Trabalhou “por fora” para a ECOAM, na parte de RH, por isso eventualmente recebia pagamentos de José Luiz. Após ser informada de que 42,3 milhões de maços cigarros teriam sido desviados, conforme conferência realizada pela Receita, respondeu a depoente que o número seria maior. Pelas suas contas, superior a 62 milhões de maços. Antes de passar a exercer a função de auxiliar de fiel, somente Sival abria a porta do Depósito para a retirada dos cigarros desviados. Por vezes Érika Cristina pediu à depoente que abrisse o Depósito fora do horário de expediente, porém previamente comunicava a Sival para evitar problemas. Sival não queria que a depoente abrisse a porta sem o seu consentimento. Poucas vezes os servidores da Receita estiveram no local, quem mais esteve foi o Delegado da Receita Maurício, que inclusive questionou Sival sobre a dificuldade em acessar as imagens das câmeras de segurança. Para não chamar a atenção dos porteiros, Sival orientou a depoente a acessar a sala onde ficavam os equipamentos de segurança por meio da sala dele, para fazer o desligamento. Érika Cristina também fazia uso desse acesso para baixar as imagens no HD que seria levado a Bauru para exclusão das imagens dos caminhões. Somente após a exclusão as imagens eram encaminhadas à Receita. Os motoristas não desciam dos caminhões durante o carregamento da mercadoria (Id n. 157670220, pp. 99/102).

Alexandra Barbosa Camargo, ouvida pela Autoridade Policial, afirmou que, em 26.10.12, começou a trabalhar como operadora de empilhadeira no Depósito de Materiais da Receita Federal em Araraquara. Trabalhava como mototáxi em Bauru quando foi convidada por Érika Cristina para trabalhar no Depósito. Foi para Araraquara junto com José Luiz, pai de Érika Cristina. Moravam juntos, porém depois de certo tempo José Luiz voltou para Bauru. José Luiz trabalhava no escritório da AGL, usava uniforme como os demais funcionários. Acredita que o desvio de mercadorias teve início em 2013. Nessa época, José Luiz determinou a primeira separação de cigarros, para carregamento do caminhão com cerca de 200 caixas. Ao chegar em casa, José Luiz deu-lhe R$ 300,00 (trezentos reais), foi então que a depoente entendeu o que havia feito. A partir daí, as caixas passaram a ser preparadas, ou seja, metade dos pacotes era retirada das caixas. Por vezes o volume era substituído por serragem ou fumo. Recebia pela preparação das caixas e por vezes pelo serviço de empilhadeira, não havia um valor fixo. Os depósitos efetuados em sua conta bancária por José Luiz e Érika Cristina referem-se a comissões pagas pela organização e controle dos cigarros desviados. Os 2 (dois) depósitos para Naiara dizem respeito a valores que recebeu de Érika Cristina para repasse a Naiara. Outros depósitos decorrem de empréstimos. Os valores depositados por Gilson são pelo pagamento de salários que deveriam ter sido feitos pela AGL, porém foram creditados pela conta de Gilson. A depoente tem uma namorada chamada Érica Maria Dias Salomão, fez depósitos na conta dela porque estava presa, pediu à namorada que ficasse com o seu cartão para fazer pagamentos. Alguns depósitos dizem respeito a valores que estavam sendo guardados para futuramente morarem juntas. A transferência de R$ 10.000,00 (dez mil reais) da conta de Érika Cristina para a conta da namorada da depoente, em 11.09.17, deu-se para pagamento da comissão de cigarros. A sua namorada desconhecia a origem dos recursos. A maioria dos depósitos em sua conta, indicados em planilha que lhe foi apresentada, dizem respeito a comissão por conta dos cigarros desviados. Esclareceu a depoente quais os códigos usados para fazer referência às marcas de cigarros. Guilherme Augusto teve participação na prática delitiva, ele não era funcionário registrado. As retiradas das cargas eram normalmente feitas por José Luiz, que dividia os valores recebidos com Érika e Gilson. Sabe de diversas cargas retiradas por Gilson que não foram divididas. Não tem conhecimento sobre o envolvimento de servidores da Receita Federal nos desvios dos cigarros (Id n. 157670221, pp. 2/3).

Em declarações prestadas em sede policial, Sival Miranda dos Santos aduziu que, em 11.09.17, Alexandra Barbosa informou-lhe por telefone que havia recebido comunicado de Érika sobre a abordagem policial ao caminhão carregado de cigarros. Nega ter sido o responsável pela autorização de entrada no caminhão em 11.09.17. Não sabe dizer quem deu a autorização. O gerenciamento dos caminhões utilizados para o desvio de cigarros era feito por José Luiz. O depoente sempre consultava Gilson de Souza quando chegava um caminhão para a retirada de cigarros do Depósito. As 138 (cento e trinta e oito) entradas foram por ele autorizadas somente após aval de Gilson. Recebia salário de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) da AGL. Sobre os depósitos efetuados por Gilson e AGL em sua conta bancária, disse que tinham por finalidade o pagamento de salários de funcionários e custeio de despesas da AGL. Nada recebia pelas autorizações de entrada de caminhões. Sobre as mensagens de Whatsapp, confirma que os códigos usados indicavam determinadas marcas de cigarros e, em 05.03.17, refere-se a Gilson ao tratar com terceiro (“Batata”) sobre cigarros desviados. Em mensagem de 08.09.17, conversa com Alexandra sobre cigarros desviados, José Luiz havia dado ordem para entrada do caminhão, ordem antes confirmada com Gilson. Em 22.12.17, conversa com Gilson sobre ajuda financeira, pois havia sido demitido com justa causa após o flagrante. Não tratavam de ajuda em decorrência dos desvios praticados. Conheceu Gilson em 1999, na TCB, empresa de administração de negócios de São Paulo. O depoente era ajudante e Gilson atuava como operador de empilhadeira. Em 2012, Gilson o contratou como fiel de depósito em Araraquara. Não sabe dizer quando começaram os desvios de cigarros. As câmeras de segurança do Depósito eram “resetadas” quando o caminhão entrava no depósito e assim ficavam até que fosse carregado. Gilson é seu amigo, dele recebeu ajuda financeira em algumas ocasiões, porém não em decorrência do desvio de cigarros. Vivia apenas de seu salário (Id n. 157670221, pp. 4/5).

Em Juízo, foram ouvidos como testemunhas o Delegado da Receita Federal Maurício Novaes Ferreira, os Agentes de Polícia Federal Vagner José Theodoro e Leonardo Rafael Nunes, Valmir Soares Maciel, Evaldo Rodrigues de Souza, Fausto Dourado, Elaine Cristina da Silva, Fábio Pereira da Fonseca, Ralf Oliveira, Ailton da Silva Cardoso, Maycon Juno Lourenço, João Lopes Neiva Netto, Maria José Rodrigues Custódio, Clayton Van Haandel, Jonatas da Silva Rodrigues , Luíza Urbano Soares, Maria de Fátima Vanderley, Luciany Desiree L. Maria dos S. Lopes, Daniele Dei Hoyo, Benjamim Zapotocny e como informante, Érica Dias Salomão.

A testemunha Maurício Novaes Ferreira, Delegado da Receita Federal em Araraquara, afirmou que, entre março e maio de 2017, recebeu informação de desvio de mercadoria no Depósito de Mercadorias Apreendidas – DMA. Repassou a informação ao Delegado-Chefe da Polícia Federal e aguardou as providências da Polícia. Logo após, a pessoa que havia informado sobre o desvio, acompanhada de outras 2 (duas), ratificou a sua declaração. Acompanhou-as à Delegacia de Polícia Federal. Posteriormente, houve o flagrante (objeto dos Autos n. 0005556-38.2017.4.03.6120). O DMA é um depósito regional, atende mais de dez unidades. Cada unidade faz o seu gerenciamento. As entradas e saídas de mercadorias são tratadas pela Delegacia que fez a apreensão. As unidades da Receita faziam contato direto com o DMA, por correio eletrônico, para liberar o acesso. Não se lembra exatamente do contrato com a empresa AGL. A subcontratação de empresa de segurança era de praxe. Toda pessoa que acessa a área do Depósito deve registrar-se na portaria. A empresa tem que avisar a Receita sobre quem entra e o que fez. Em visitas ao DMA, a Receita verificou que na área de identificação das mercadorias a serem depositadas, ou por onde elas saíam para que lhes fosse dada destinação, várias câmeras não operavam ou estavam mal direcionadas, o que dificultava a visualização remota a partir da Receita. As câmeras deviam transmitir em tempo real para a Receita. A empresa afirmava que o equipamento e os cabos eram muito velhos. Tratou do assunto com Gilson. Alegavam que o contrato estava no final e que o custo seria alto, porém houve reparos de problemas pontuais. As câmeras eram da Receita e o link deveria ser disponibilizado pela empresa contratada. O sistema de segurança gravava as imagens e de tempos em tempos a empresa levava uma gravação para a Receita, por obrigação contratual. Na Receita não havia uma pessoa designada para acompanhar em tempo integral as imagens. Nada sabe sobre edição de imagens em Bauru para posterior encaminhamento à Receita. Depois do flagrante, a Receita fez levantamento preliminar e com o procedimento licitatório que resultou na contratação de uma nova empresa, houve inventário completo das mercadorias. Dentro do barracão havia uma espécie de cômodo, um recinto camuflado por meio do empilhamento de pallets. De fora não se percebia esse espaço vazio. Nesse cômodo é que aparentemente as caixas eram preenchidas com fumo e serragem. O seguro cobriria toda a mercadoria depositada no armazém, porém não sabe outros detalhes. A incineração da mercadoria é de responsabilidade de cada unidade da Receita, normalmente se faz contato com uma usina, cada unidade tem o local que recebe a carga para destruição (Ids ns. 253453313, 253533331 e 253453330 1ª parte).

A testemunha Vagner José Theodoro, Agente de Polícia Federal, esclareceu em Juízo que trabalhou na Operação Gestas, em especial com as interceptações telefônicas cujos relatórios quinzenais foram juntados aos autos. Por exemplo, a investigada Érika afirma que Gilson desviou mercadoria, que ele comandava o esquema. No monitoramento telefônico não foi captada ordem de Gilson para a montagem de caixas de cigarros. Com relação a José Luiz, destaca um trecho em que o réu vendia cigarros , ele e a esposa, em Bauru. Não sabe dizer se esses cigarros eram da Receita. Quanto ao áudio de índice 57265131, concorda que a pronúncia da marca de cigarros não está muito clara (Id n. 253453330 parte final, n. 253453635).

O Agente da Polícia Federal Leonardo Rafael Nunes, ouvido em Juízo como testemunha, apontou diversos bens móveis e imóveis em nome de Gilson ou que estão em nome de terceiros, mas que de fato seriam de Gilson. Na companhia de colegas Policiais, esteve na casa de Gilson em Curitiba. Estranhou a demora do morador em abrir a porta. Apesar de o monitoramento ter indicado que na casa havia um telefone celular de Gilson, o aparelho não foi encontrado durante a busca. Em suas conversas, Gilson menciona Lamborghini, Audi, avião, barco, apartamento de R$ 2 milhões. O levantamento do CPF de Gilson indicou que pelo nome deve passaram vários carros de valores elevados. Por meio da empresa Wida, Gilson montou toda a parte da embalagem. No que diz respeito a José Luiz, foi localizado um sítio de sua propriedade em Ibiúna. Por meio de diligência ao Cartório de Registro de Imóveis, apurou-se que o sítio estava registrado em nome de Roberta, então companheira de José Luiz. A testemunha também fez levantamento de propriedades de José Luiz em Bauru. Em visita velada a um barracão, um vizinho afirmou que o imóvel era de José Luiz e que no local eram guardadas mercadorias da Receita Federal. Em Curitiba constatou que tanto a placa da empresa Wida quanto a placa da AGL tinham o mesmo endereço e que havia 2 (dois) lotes em nome da AGL. Havia 3 (três) outros terrenos em nome de Luciano, que afirmou ser Gilson o real proprietário. A Operação Gestas I tinha por objetivo confirmar se havia saída irregular de mercadorias do Depósito de Materiais. Por meio da Operação Gestas II chegou-se à conclusão de que Gilson era o mandante de todo o esquema criminoso. Há um relatório nos autos que elenca quase 300 (trezentas) viagens para retirada de cigarros do Depósito. No final, José Luiz não ia mais para Araraquara. Parece ter havido uma briga entre José Luiz e Gilson, com posterior cisão (Ids ns. 253453322 a 253453324).

A testemunha Clayton Van Haandel afirmou trabalhar na Wida Embalagens, empresa de embalagens plásticas. Pelo que sabe, a Wida é da ex-mulher de Gilson. Nada sabe sobre os fatos narrado na denúncia. A AGL dividia o escritório com a Wida, funcionavam no mesmo imóvel, mas a AGL não prestava logística para a Wida. Avistava Gilson no local, a conduta dele era sempre normal. Nunca trabalhou para a AGL (Id n. 253453308).

Em Juízo, a testemunha Jonatas da Silva Rodrigues declarou trabalhar na Wida Embalagens desde março de 2017. É supervisor de produção na Wida, no dia da busca e apreensão deu assistência ao setor de produção, por isso não acompanhou o cumprimento do mandado no escritório compartilhado. A empresa de Gilson dividia escritório com a Wida, que é de Daiane Brito. Conhece Gilson e viu Sival algumas vezes. Não sabe dizer o que a AGL fazia no escritório. Até a chegada dos policiais, desconhecia qualquer irregularidade praticada no local (Id n. 253433321).

A testemunha Fausto Dourado, ouvida em Juízo, afirmou desconhecer os fatos narrados na denúncia. O réu José Luiz deixou um trator em consignação na loja da testemunha, acompanhado de nota fiscal, por conta dessa transação comercial o conheceu (Ids ns. 253453317 e 253453318).

As testemunhas Maria José Rodrigues Custódio e Luiza Urbano Soares alegaram ser vizinhas na chácara de José Luiz, pessoa bondosa e de adequada conduta social (Id n. 253453329).

A testemunha Luciany Desiree L. Maria dos S. Lopes, representante da Gráfica Cartões e Cia., disse não conhecer José Luiz nem os corréus (Id n. 253453325).

A testemunha Maria de Fátima Vanderley afirmou conhecer Guilherme e José Luiz há muito tempo. Foram vizinhos. Guilherme e sua mãe Érika são uma família muito simples, de boa conduta. Nada sabe sobre os fatos narrados na denúncia (id n. 253453328).

A testemunha Daniele Del Hoyo sustentou conhecer Guilherme, José Luiz e Érika. Foi colega de infância de Érika, que considera uma boa pessoa. Pelo que sabe, Guilherme está trabalhando, foi criado pela avó de modo bastante decente. Quando os conheceu, eram pessoas simples e depois melhoraram. Pouco tempo atrás, tiveram uma condição melhor que a de hoje (Id n. 253453309).

Benjamim Zapotocny afirmou conhecer Guilherme e José Luiz. Quanto a Érika, conheceu-a em um terreiro de candomblé. Guilherme faz parte da comunidade. Conheceu José Luiz quando o contratou para construir algumas casas no terreiro. Não viu ostentação nem sabe de fatos que possam desabonar a conduta da família (Id n. 253453307).

A testemunha João Lopes Neiva Netto, representante legal de Indústria Brasileira de Cigarros - IBC, aduziu que a empresa já fabricou os cigarros de marcas US Fox Vermelho, US Fox Azul e Egipt. Há alguns meses a IBC fabrica somente o Egipt. Não conhece José Luiz, que o arrolou como testemunha. Nada sabe sobre os fatos narrados na denúncia (Id n. 253453320).

A testemunha Valmir Soares Maciel afirmou nada saber sobre os fatos. Pelo que tem conhecimento, Gilson trabalhava em uma fábrica de plástico. Nada sabe que possa desabonar a conduta do réu (Id n. 253453632).

As testemunhas Fábio Pereira da Fonseca, Ralf Oliveira e Ailton da Silva Cardoso nada souberam dizer sobre os fatos ou sobre os bens de Gilson (Ids ns. 253453636 e 253453637).

A testemunha Evaldo Rodrigues de Souza afirmou que desde novembro de 2013 trabalhava como segurança no Depósito de Materiais Apreendidos da Receita Federal. Os seguranças faziam rodízios em pontos no barracão. Não vistoriavam veículos da Receita Federal ou da Polícia Federal. Quanto a outros veículos, pediam liberação e vistoriavam tanto o veículo quanto as pessoas. Caminhões de resíduos normalmente eram de baú, não eram revistados na saída. Quando chegava um caminhão de resíduos na P1 (Portaria 1), parava a uma certa distância do portão, abriam o baú, vistoriavam o veículo e o motorista. O vigilante não abria o portão, quem abria eram os porteiros. O sistema de vistoria do caminhão de resíduos e as anotações mudaram depois de certo tempo. Os porteiros eram avisados pelo rádio de que chegaria um caminhão de resíduos, então o porteiro abria o portão e o caminhão já entrava. Na saída não revistavam o baú, estava lacrado. Receberam ordem de não vistoriar a cabine. A ordem sempre foi passada pelo pessoal que ficava no barracão, o Sival sempre passava ou quem estava perto da Portaria 13 passava o rádio informando que o caminhão estava a caminho do portão de saída. Havia anotações de veículos de resíduos. Os caminhões de resíduos passaram a ser chamados de código 10. Além de Sival, Naiara passou a autorizar o ingresso desses caminhões código 10, os quais vinham em média 3 (três) vezes por semana (Ids ns. 253533322, 2ª parte, 253453314 a 253553316).

Em sede judicial, a testemunha Elaine Cristina da Silva declarou que começou a trabalhar na limpeza do Depósito de Materiais em 2013, na condição de empregada da Consiste. Entrou na ECOAM em novembro, que pelo que sabe é empresa de José Luiz. Passou a trabalhar na portaria do Depósito em julho de 2017. Confirma a existência dos chamados caminhões de resíduos. A diferença dos caminhões de resíduos para os outros caminhões é que nos primeiros não era feita revista na entrada e saída. Naiara ou Sival dava autorização para a entrada dos caminhões de resíduos. No pouco tempo que ficou na portaria, percebeu que os caminhões de resíduos eram sempre do mesmo tipo, caminhões médios. Desde quando trabalhava na limpeza ouvia falar desses caminhões. Quando passou para a portaria, recebeu a orientação de que não era preciso anotar dados. Nunca anotou a entrada dos caminhões de resíduos. Também era utilizada a denominação “código 10” para esses caminhões. A sua função na portaria era apenas de abrir o portão. Não sabe dizer qual era a carga dos caminhões de resíduos, nunca viu. Quanto aos outros caminhões, era preciso anotar documento e nome da pessoa. Conheceu Gilson e já viu José Luiz no Depósito de Materiais (Id n. 253453636).

A testemunha Maycon Juno Lourenço afirmou em sede judicial que ingressou no Depósito de Materiais como ajudante-geral, depois passou a porteiro. No controle de acesso, a liberação se dava por ordem de Sival, Naiara ou Maíra (irmã de Naiara). Tudo o que entrava era anotado em cadernos: nome, horário de entrada e de saída. Assim que entrou no Depósito ouviu falar em caminhão de resíduos. No primeiro ano de trabalho, todo mês vinha caminhão de resíduo em horários variados. Quando passou a porteiro, vinham de duas a três vezes por semana, entre 16h30 e 17h. Nas últimas vezes, até depois do expediente. Sabe disso porque passou a porteiro noturno. Era avisado quando o caminhão ia chegar. Eram sempre os mesmos caminhões. Os vigilantes não tinham acesso ao barracão. Todos os veículos de resíduos eram anotados no livro. Conhece Gilson, era raro vê-lo no Depósito, ficava pouco tempo e acompanhou algumas saídas de caminhões de resíduos. Falavam que os caminhões de resíduos levavam os cigarros para a incineração. Não tinha permissão para abrir os caminhões. Teve acesso ao barracão quando trabalhou como ajudante-geral, viu o caminhão sendo carregado de cigarros, eram os mesmos caminhões que não eram revistados na saída. Não sabe dizer para onde o caminhão ia. Não recebia ordens de Gilson. Receberam ordem, repassada pela supervisora Érica Dias, para pararem de anotar, por isso parou. Os demais veículos eram todos revistados. Os caminhões de resíduos não eram acompanhados por funcionários da Receita Federal, já os outros caminhões que levavam mercadorias para destruição eram sempre acompanhados pela Receita (Ids ns. 253453637 e 253453327).

Érica Maria Dias Salomão foi ouvida em Juízo na condição de informante. Declarou ter sido inicialmente contratada pela empresa Ponto Fort, como segurança, depois pela PLS. Retornou ao Depósito pela Capital, como supervisora da segurança. Cuidava da parte administrativa dos seguranças, não fazia vistoria de caminhão. Levava os livros de anotações para o escritório da PLS. Quando de seu treinamento em Curitiba, soube que a Capital e a Gel Clean ficavam no mesmo imóvel. Os veículos e as pessoas eram vistoriados na entrada e na saída. O caminhão de resíduos e o respectivo motorista só eram vistoriados na entrada. Indagou Sival sobre o motivo de não haver vistoria desses caminhões na saída. Sival respondeu que ela deveria apenas seguir o procedimento determinado. Sival ou Naiara davam autorização para a entrada do caminhão de resíduos. Inicialmente havia anotação, porém depois houve pedido expresso de Sival para que não fossem mais anotados. A própria vigilância passou a denominação dos caminhões para “código 10”. Naiara trabalhava no escritório e depois foi para o barracão. Todos os vigilantes que tinham rádio ouviam as autorizações que eram passadas. Não presenciou fatos que pudessem levá-la a crer que havia uma organização criminosa no local. Não presenciou Gilson e José Luiz combinando alguma atividade criminosa. Soube das condutas ilícitas somente depois da prisão de Alexandra, sua namorada à época. As imagens das câmeras eram transmitidas ao vivo para a Receita Federal (Ids ns. 253453305, 253453289 e 253453291).

Em interrogatório judicial, Alexandra Barbosa afirmou atualmente trabalhar como motorista de aplicativo. Na época em que trabalhava no Depósito de Materiais, José Luiz mandava separar as mercadorias e com a saída dele, Sival e Naiara passaram a tratar da liberação dos caminhões. A interrogada ficava no barracão, eles chegavam e diziam “separa o vermelho” ou “separa o azul”. Então tirava os cigarros das caixas originais e colocava em outras caixas. José Luiz era quem levava as caixas vazias, depois passou a ser a Érika. Guilherme também chegou a levar as caixas. Não sabia que os cigarros seriam comercializados. José Luiz chegou a dar-lhe dinheiro por esse serviço. Quando chegava um novo carregamento de cigarros apreendidos, avisavam José Luiz. Confirma o teor das conversas telefônicas que manteve com José Luiz, por meio das quais informa sobre a chegada de mercadoria e José Luiz determina que prepare a saída. Para não dar tanta falta, tirava metade dos cigarros da caixa original e colocava na caixa que eles levavam. Nas caixas originais colocava um tanto de cigarro, no meio colocava pó de serra e fumo e em cima mais cigarros, para o caso de a caixa original ser aberta pela fiscalização ou para quando fosse levada à incineração. José Luiz era quem mandava fazer desse modo. Com a saída de José Luiz, Gilson passou a ligar para Sival, que repassava aos demais o recado. Também com a saída de José Luiz, Érika passou a ligar para avisar sobre as marcas de cigarros que deveriam ser separadas, depois Sival e Naiara autorizavam. Davam códigos para os caminhões que fariam o transporte e também para as diferentes marcas de cigarros. Não sabe dizer como ocorria a entrada do caminhão pela portaria, ficava na parte de baixo, no barracão. Antes se chegar o caminhão, Sival descia e avisava para desligar as câmeras de monitoramento, as quais eram ligadas novamente após o término do carregamento. A sala de monitoramento ficava ao lado da sala de Sival. Acredita que o desvio de mercadorias teve início em 2013. O carregamento era feito fora do horário de expediente ou quando sabiam que não chegaria apreensão. Era avisada com antecedência sobre o horário que haveria carregamento. Confirma o depoimento prestado em sede policial acerca da natureza dos depósitos feitos em sua conta bancária. Pediu a Érika Cristina que fizesse depósito de R$ 10.000,00 (dez mil reais) na conta de Érika Dias (namorada da interrogada), para que não ficasse tudo em seu nome. Gilson sempre teve conhecimento das operações, mesmo no período em que José Luiz estava no Depósito (Ids ns. 253453290 e 253453288).

Em Juízo, Guilherme Augusto Moreira Luiz afirmou trabalhar como barman. Não teve participação na prática delitiva. Trabalhou por 3 (três) a 4 (quatro) meses no Depósito de Materiais. Não era funcionário registrado. Recebia ordens de Sival para descarregar caminhão, ajudar Alexandra na arrumação das caixas da empilhadeira. Os caminhões retiravam resíduos, na maioria das vezes eram cigarros. Levou caixas vazias para o Depósito, a mando de Gilson e de José Luiz. Entrava com o carro de Gilson para descarregar as caixas. Nas caixas eram colocados os cigarros para posterior carregamento no caminhão de resíduos. Desconfiou da saída desses caminhões, mas ficou quieto, até porque havia ameaças do tipo “o que você vê aqui, fica por aqui, do contrário vai ser pior”. Prefere não dizer quem fez essa ameaça. Sempre morou em Bauru, mesmo quando fazia esse serviço em Araraquara. Ia e voltava no mesmo dia. Recebia o dinheiro da gasolina e cerca de R$ 100,00 (cem reais) por dia (Id n. 253453301 e n. 253453305, 1ª parte).

Em interrogatório judicial, Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira declarou trabalhar em um bar. É mãe de Guilherme Augusto e tem um filho menor de idade com Gilson de Souza. Quando Gilson brigou com José Luiz, pediu à interrogada que ligasse para Naiara para informar sobre a retirada de resíduos. A interrogada não tinha idéia do que se tratava. Nunca entrou no Depósito de Materiais, só no escritório. Tinha muito medo de Gilson, sofria ameaças de cunho financeiro, por isso fazia o que ele mandava. O Ministério Público Federal indagou à interrogada sobre o Relatório de Análise da Polícia Judiciária que diz respeito ao conteúdo do celular de Naiara, com indicação de diversas conversas por elas mantidas, inclusive tratativas sobre a saída dos cigarros com utilização de códigos para se referirem às diversas marcas de cigarros. Respondeu a interrogada que pensava tratar-se de “resíduos”. Achava que era tudo lixo. Não trabalhava no Depósito, não sabia o que acontecia lá dentro. Não sabe dizer o motivo pelo qual o carregamento não podia sair em horário comercial (Id n. 253453305 2ª parte, n. 253453289 e n. 253453291).

Interrogado na fase judicial, José Luiz Alves Moreira afirmou ser casado e residir em Bauru. Está desempregado, recebe ajuda de sua família. Está sob efeito de calmante, não gostaria de responder perguntas que dizem respeito à sua família, ou seja, sobre a filha Érika Cristina, o neto Guilherme e o ex-genro Gilson de Souza. Compareceu ao interrogatório para falar da sua participação. As empresas PLS e ECOAM estavam em seu nome. O proprietário de fato era Gilson que, desse modo, dominava a portaria e a limpeza do Depósito de Materiais. De acordo com disposição contratual, essas atividades deveriam ser terceirizadas pela AGL. Por ordem de Gilson, havia desvio de cigarros do barracão. Trabalhou na AGL, contratado inicialmente como auxiliar de fiel, de outubro de 2012 a março de 2013. Entrou como funcionário registrado, depois deu baixa na carteira, porém continuou trabalhando no Depósito até maio de 2017. Com a entrada da PLS, o que mudou é que o interrogado não trabalhava mais para a AGL, passou a cuidar da segurança. Não ganhava salário de Gilson/PLS, mas sim dinheiro do desvio. O desvio de cigarros iniciou-se por volta de março de 2013. Aceitou a proposta de Gilson para o desvio de cigarros porque passava por grande dificuldade financeira. A Receita quase não aparecia no Depósito para fazer vistoria. Havia uma sala com monitores, para vigilância do Depósito. Quando entravam os caminhões de resíduos, a filmagem seguia normalmente. Prefere não dizer quem comprava os cigarros desviados. Por ordem de Gilson, informava quando os caminhões chegariam. A pessoa pedia uma carga, que era de 200 (duzentas) caixas, então avisava Alexandra da chegada do caminhão. Perguntava a Alexandra o que tinha, ela separava, marcavam o horário e o caminhão vinha. Gilson não queria aparecer, por isso não mantinha contato direto com Alexandra. Gilson ficava com a maior parte do dinheiro do desvio, dava apenas uma parte para o interrogado e para Alexandra. Sival é uma pessoa simplória demais, trabalhador, se recebia algum valor era de Gilson. Nunca passou dinheiro para Sival. Não tinha muito contato com Sival, não se davam bem. O interrogado e Sival acompanhavam o carregamento do caminhão. Naiara acompanhava de vez em quando, mas naquele tempo nada sabia porque trabalhava no escritório. Conversava por Whatsapp com os demais envolvidos. Os cigarros eram retirados das caixas originais e passados para caixas vazias. Depois as caixas originais vazias eram vendidas para empresas de papel. Bruno Mighetti Ramos era gerente do Banco Santander, pegava dinheiro com o interrogado a fim de depositar para Gilson. Sobre os diversos depósitos efetuados em conta bancária do interrogado no período de abril de 2013 e maio de 2017, montante superior a R$ 4.500.000,00 (quatro milhões e quinhentos reais), identificados após quebra de sigilo bancário, não soube explicar porque tinham origem em diversos Estados, já que os compradores eram somente de São Paulo. Ganhava comissão por saída, Gilson decidia quanto pagar. Às vezes o interrogado ganhava R$ 8.000,00 (oito mil reais), outras vezes R$ 10.000,00 (dez mil reis) por carga desviada. O dinheiro da venda dos cigarros era depositado na conta do interrogado, que descontava o valor que seria seu e de Alexandra e repassava o restante para Gilson. O comprador entrava em contato com o interrogado e fazia o depósito prévio. Havia códigos para indicar as marcas de cigarros. Alexandra avisava quando chegava uma carreta da Receita Federal com os cigarros apreendidos. Gilson obtinha os contatos, depois repassava para o interrogado negociar as vendas. Normalmente eram desviadas 200 (duzentas) caixas por vez, ou seja, o correspondente à carga de um caminhão. Inicialmente o valor da caixa era de R$ 200,00 (duzentos reais), no final chegou a R$ 400,00 (quatrocentos reais). As empresas PLS e ECOAM eram administradas por Gilson em Curitiba, o interrogado começou a perceber algumas coisas que não corriam bem, ambas as empresas deviam imposto. Por isso desentendeu-se com Gilson, os funcionários das empresas não foram pagos, o interrogado também ficou sem receber e acabou saindo do negócio (Ids ns. 253453293 a 253453295).

Interrogada na fase judicial, Naira de Almeida afirmou que atualmente é do lar e tem 3 (três) filhos. Trabalhou na AGL de 2012 a 2017. Quando entrou, fazia um mês que a AGL havia assumido o Depósito de Materiais. O desvio de cigarros começou no início de 2013. Quem recepcionava os caminhões era José Luiz, que ficava no escritório e por vezes descia ao Depósito. Quando José Luiz não estava, o que era raro, Sival recebia os caminhões. Quem ficava no Depósito era Alexandra, que fazia a separação dos cigarros. Como entrou na empresa como auxiliar administrativo, não sabe dizer se nesse período a ordem partia de Gilson de Souza. Só veio a ter maior conhecimento dos fatos quando foi promovida a auxiliar de depósito, entre março e abril de 2017. Pode dizer que os desvios começaram em 2013 porque os caminhões entravam e não eram da Receita, havia comentários. Veículos e pessoas que não os funcionários só poderiam entrar com autorização da Receita (nesses casos, a interrogada recebia os e-mails e repassava a autorização ao porteiro). A Receita ligava para agendar a entrada dos caminhões com a mercadoria apreendida. Quando se tratava de caminhões que não eram da Receita, José Luiz dava autorização e a interrogada repassava aos porteiros. Eram os chamados “caminhões de resíduos”, depois chamados “código 10”. Alexandra separava os cigarros e quando o caminhão chegava, era feito o carregamento. A participação da interrogada teve início entre julho e agosto de 2017, quando pela primeira vez abriu o portão às 6h para entrada do caminhão, a pedido de Sival (o porteiro abria o portão principal, mas quem tinha a chave do Depósito eram Sival e a interrogada). Depois desse dia, Érika Cristina passou a ligar ou mandar mensagem por Whatsapp, para informar à interrogada sobre o horário em que o Depósito deveria ser aberto. Toda vez que Érika Cristina ligava, a interrogada perguntava se ela tinha avisado Sival, porque ele era o fiel, a interrogada era auxiliar dele. Salvo engano, abriu o portão 7 (sete) vezes. Recebia entre R$ 1.000,00 (mil reais) e R$ 2.000,00 (dois mil reais) por vez. Sival tinha ciência de todos os fatos, ele via o que estava acontecendo, era o fiel. Alexandra participou desde o começo, era ela quem separava a carga. No início, José Luiz pedia para ser avisado quando fossem receber mercadoria. Depois Sival proibiu a interrogada de passar esse tipo de informação a José Luiz, quem começou a informá-lo foi Alexandra. Até onde sabe, José Luiz comandava as empresas PLS e ECOAM. Quando a PLS saiu da segurança, entrou a empresa Capital, aí era Gilson quem comandava. Após a interrogada sair do escritório e descer para o Depósito, Alexandra disse-lhe que por vezes a carga saía só para o Gilson e por vezes era Érika quem pedia. Quando era para Gilson, quem pedia a separação da carga era Sival. Certo dia souberam que haveria destruição geral de cigarros. Tanto a interrogada quanto Sival ficaram preocupados porque não havia mercadoria para ser destruída, porém Gilson disse que estava tudo no nome dele, ou seja, a responsabilidade era dele. Sival passou a recepcionar os caminhões depois que José Luiz saiu. Quando o caminhão ia entrar, as câmeras de vigilância eram desligadas ou viradas. Quem desligava era Sival, vez ou outra o José Luiz. Quando a interrogada abria a porta, também desligava. As caixas de cigarros originais eram mantidas no lugar, preenchidas com várias coisas para o caso de a Receita fiscalizar. Acredita que as imagens eram editadas antes de serem encaminhadas à Receita. As imagens eram passadas para um HD externo. Na época da PLS, o HD ia primeiro para Bauru, depois havia o encaminhamento à Receita. Quando entrou a empresa Capital, geralmente Érica Maria Dias passava as imagens para o HD, depois de alguns dias as imagens eram encaminhadas para a Receita. Quem enchia as caixas era Alexandra e os funcionários avulsos que haviam sido contratados para ajudar a descarregar os caminhões, porém foram destinados para esse serviço. Não sabe informar sobre a atuação de Érika Cristina antes da saída de José Luiz, nessa época a interrogada trabalhava no escritório. Quase não havia fiscalização da Receita. No tempo em que ficou no Depósito, quem mais esteve lá foi o Delegado Maurício. Os códigos “vermelho” e “azul” indicavam as marcas de cigarros Eight e Gift, respectivamente. Havia também um código que não se recorda para os cigarros San Marino. Os caminhões de resíduos não eram vistoriados na saída. Na portaria havia um livro de controle de caminhões, porém em certa ocasião, acredita que com a entrada da empresa Capital, pediram que não fosse mais anotada a entrada/saída desses veículos (Id n. 253453304 2ª parte, n. 253453298, n. 253453299 e n. 253453300).

Anote-se que Naiara de Almeida firmou termo de colaboração premiada com o Ministério Público Federal, homologado pelo Juízo a quo (Autos n. 0005556-38.2017.4.03.6120).

Em sede judicial, Sival Miranda dos Santos afirmou atualmente trabalhar como repositor em um mercado de São Paulo. É casado, tem 2 (dois) filhos. Trabalhou como fiel de depósito por 4 (quatro) anos e 9 (nove) meses. Assumiu a função em 26.10.12. Trabalhava na AGL, fazia o que lhe ordenavam. Confirma que eram chamados de “resíduos” os caminhões que saíam do Depósito de Materiais com os cigarros. Falavam que era para liberar, ele liberava. No início, quem avisava por telefone sobre a chegada dos caminhões era José Luiz. Não sabe dizer se o caminhão era vistoriado na saída do Depósito. Recebeu orientação no sentido de que a vistoria na entrada não seria mais necessária. José Luiz cuidava da parte de segurança, foi ele quem deu essa ordem. Quando José Luiz saiu, recebeu ordem de Gilson para que as coisas continuassem do mesmo modo. Era sempre Gilson que o avisava de que um caminhão estava para chegar. Como Gilson era o seu chefe, sempre se reportava a ele. Foi José Luiz quem alterou a denominação dos caminhões, de “resíduos” para “código 10”. Sobre diálogos telefônicos de Naira com Érika nos quais mencionam que o interrogado estava bravo porque caminhões entravam sem que fosse avisado, disse que como era o responsável, precisava saber o que estava acontecendo. A sala de monitoramento (câmeras de vigilância) ficava próxima à sua sala. Não é que desligava as câmeras, o que ocorria é que o sistema dava problema direto, o equipamento era obsoleto. A Receita não dava verba para a troca, por isso entrava na sala para “resetar”. Não é verdade que desligava propositalmente as câmeras quando os caminhões de resíduos chegavam ao Depósito. Os HDs com as imagens vinham de Bauru, local em que era feita a gravação, o interrogado só os encaminhava para a Receita. Sobre as divergências entre as declarações prestadas em sede policial e judicial, disse que verdadeira é a última declaração. As caixas eram compradas para armazenamento em geral, não só para cigarros. Não sabe nem pode dizer de quem foi a ideia de colocar serragem, plástico ou fumo nas caixas cujos cigarros eram retirados. Havia códigos em cores para os cigarros. Guilherme, neto de José Luiz, trazia as caixas de Bauru. O interrogado não recebia valores extras por conta dos caminhões de resíduos. Sobre os diversos depósitos e transferências para a sua conta corrente, apurados após quebra de sigilo bancário, disse que as razões eram várias, tais como funcionário que não podia receber o salário em conta própria, compra de material, verba para pequenos consertos. Não sabe dizer porque esse dinheiro não vinha pela conta da empresa, não fazia parte do administrativo/financeiro. Nega ter conversado por Whatsapp com “Pires de Piracicaba” sobre a compra de cigarros, mensagem que estaria arquivada em seu celular apreendido. Sobre as diversas conversas com “Batata”, cujo assunto é a compra de cigarros e nas quais o interrogado chama Gilson de compadre, disse não se lembrar. Só pode dizer que nunca fez liberação sem ordem de seu patrão. Sobre conversa com Alexandra, datada de 08.09.17, na qual indaga sobre o que havia saído naquele dia, disse que perguntava somente o que lhe passavam para perguntar (Ids ns. 253533302 e 253533303).

Em interrogatório judicial, Gilson de Souza afirmou ter 6 (seis) filhos e viver em união estável. Antes da deflagração da operação policial e de sua prisão, a sua atividade primária era o comércio de peças de veículos. Tinha uma loja de peças de veículos. Teve conhecimento dos fatos narrados nas denúncias somente no dia da prisão em flagrante do pessoal. Não participava do esquema criminoso. Somente saía de Curitiba, cidade em que reside, para ir a Araraquara quando chamado pela Receita, uma ou duas vezes ao mês. Portanto, só ia ao Depósito nessas ocasiões. O único tipo de caminhão de resíduos de que tem conhecimento era quando a Receita fazia leilão de vestuário, celulares e eletrônicos diversos. Essas mercadorias eram destruídas no barracão e o arrematante retirava-as como resíduo. Para entrada de caminhões, era preciso autorização da Receita, dada por e-mail no qual constavam os dados do caminhão e do motorista. Quem recebia essas autorizações era Sival, o fiel do depósito. Mantinha contato somente com Sival. José Luiz era proprietário da PLS e da ECOAM, empresas que prestavam serviço para a AGL. José Luiz não tinha motivo para estar no Depósito, pois o coordenador da parte de segurança tomava conta. Não tinha conhecimento de que José Luiz estava constantemente no Depósito. Também não tinha conhecimento da atividade de Érika Cristina, dela havia se separado, sabia apenas que ela trabalhava na empresa do pai, salvo engano na ECOAM. O único que tinha autorização para dar ordens era Sival, por ser o fiel do depósito. Já recebeu transferência de valores, mas não em razão de cigarros. Por conta de desentendimento com José Luiz, a PLS e a ECOAM deixaram de trabalhar com a AGL. José Luiz estava há meses sem pagar os funcionários, por isso o interrogado reteve o pagamento das notas dele. A Receita disse que não pagaria o interrogado se ele não pagasse a PLS e a ECOAM. Tratou do assunto com o Delegado Maurício. Acabou encerrando o contrato com José Luiz por conta desse problema. Nega ser o proprietário das empresas Capital e Geo Clean, ambas são de seu filho. Sobre a transferência de mais de R$ 1.300.000,00 (um milhão e trezentos mil reais), feita por Érika para a conta do interrogado, da AGL e da Geo Clean, disse não se recordar do motivo. Sobre depósitos em dinheiro no valor de R$ 510.000,00 (quinhentos e dez mil reais), disse que mexe com veículos, não pode determinar quando vendeu ou recebeu o dinheiro. Nega que os valores tenham origem ilícita. Érika não participava da venda de veículos, só pediu certa a ela que prestasse um favor por conta de uma venda feita em Bauru. Nega ter lancha e apartamento em Santa Catarina. Os veículos listados pela Polícia Federal seriam dados pelo comprador do apartamento, seriam repassados para Diogo, o verdadeiro dono do apartamento. Isso se pode deduzir da conversa telefônica gravada pela Polícia Federal, ou seja, que o interrogado está só intermediando um negócio. Por esse serviço ganharia R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais). O avião de que é proprietário foi adquirido por meio de venda casada, também é um caso em que atuou como intermediador e ganhou comissão de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais). Para segurar esse negócio, deixou veículos seus em garantia. Ocorre que o comprador Lourival Sobral desistiu da compra do avião e pediu de volta o valor da comissão. O interrogado entrou com ação judicial pedindo a devolução dos veículos. Começou a trabalhar muito cedo, o seu suposto patrimônio foi apontado como sendo vultoso pela Polícia Federal porque lhe foram atribuídos bens de pessoas que com ele tinham contrato. O seu patrimônio real resume-se atualmente à sua casa (financiada e que está para leilão) e dois barracões (sequer averbados porque não tem dinheiro). Quanto aos veículos luxuosos, se analisados os contratos, eram deixados cheques em caução. Sempre atuou como intermediador, com comissão, vendia e comprava mais. Tem toda a documentação comprobatória. A declaração de imposto de renda que é o problema, porque nunca declarou as suas atividades paralelas, de venda de veículos. Entrou no negócio de licitação depois de trabalhar como auxiliar de fiel em Guarulhos. Comprava mercadorias e veículos em leilões da Receita, com isso começou a se capitalizar para poder participar da licitação, para administrar o Depósito de Materiais. Sobre o sistema de monitoramento do Depósito, disse o interrogado que a Receita tinha acesso a todas as imagens gravadas. Não interferia no sistema de vigilância, incumbência da empresa contratada pela AGL. Passava no Depósito quando tinha que ir a reuniões na Receita, o seu contato no administrativo era com Naiara, funcionária que depois foi promovida a auxiliar de fiel. No barracão podiam entrar somente o conferente, o operador, o fiel e o auxiliar de fiel. Há uma apólice de seguro do barracão, feita em outubro de 2012. Fez esse seguro porque a Receita estipulou em contrato que tinha R$ 26.000.000,00 (vinte e seis milhões de reais) dentro do barracão. O fiel depositário Sival era seu conhecido de São Paulo desde o ano de 2000. O domínio do barracão era todo do Sival. Guilherme era seu enteado, nunca trabalhou para a AGL, não sabe dizer o motivo pelo qual Guilherme entrava no barracão. Érika Cristina, sua ex-esposa, passou a trabalhar com o pai, José Luiz. Não é verdadeira a afirmação de José Luiz de que o interrogado seria o proprietário de fato da PLS. Em determinado momento, José Luiz trabalhou na AGL, depois saiu para criar a PLS. A empresa de vigilância cuidava da parte patrimonial, do prédio e da portaria, da entrada e saída de veículos. Toda a movimentação de veículos dependia de prévia autorização da Receita (Ids ns. 253453633, 253453292 e 253453634).

Após registro do Ministério Público Federal de lapsos na gravação dos interrogatórios (audiência de 14.03.19), o Juízo a quo determinou às defesas que se manifestassem sobre a eventual necessidade de repetição dos atos (Id n. 157677136, pp. 71/72). As defesas de Guilherme Augusto e José Luiz consideraram desnecessário novo interrogatório (Id n. 157677136, pp. 119, 125). Alexandra requereu novo interrogatório de José Luiz, porque a advogada constituída não pôde comparecer (Id n. 157677136, p. 127). Os demais defensores não se manifestaram. A Juíza quo indeferiu o novo interrogatório de José Luiz e determinou o prosseguimento do feito nos termos do art. 402 do Código de Processo Penal (Id n. 157677136, pp. 128/130).

As declarações prestadas em sede policial e judicial, as provas documentais (livros de registros da empresa de vigilância do Depósito) e as conversas telefônicas interceptadas judicialmente demonstram que os réus integraram organização criminosa com o objetivo de obter vantagem mediante a prática do crime de peculato.

Os desvios de cigarros iniciaram-se em 2013, após a AGL assumir a administração do Depósito de Materiais Apreendidos em Araraquara. Prosseguiram até setembro de 2017, quando houve a apreensão da carga de cigarros objeto dos Autos n. 0005556-38.2017.4.03.6120.

Embora Gilson de Souza tenha negado em Juízo a participação no desvio de cigarros do Depósito de Materiais, não se insurge contra a sua condenação pela prática dos delitos de peculato e organização criminosa.

Gilson de Souza era o proprietário da AGL, empresa que administrava o Depósito de Materiais Aprendidos. As provas testemunhais e as declarações dos corréus corroboram a afirmação da acusação de que Gilson de Souza procurava desvincular-se das atividades ilícitas, valendo-se de terceiros para dar ordens e comandar o desvio de cargas do Depósito.

As declarações dos corréus são coesas no sentido de que José Luiz exercia atividade de comando no Depósito de Materiais. A circunstância de não estarem submetidos ao compromisso de dizer a verdade não resulta no afastamento como meio de prova, sobretudo porque em consonância com os demais elementos probatórios.

José Luiz Alves Moreira confessou a prática delitiva. Afirmou ter sido convidado por Gilson de Souza para participar do desvio de cigarros apreendidos, que teve início em março de 2013. Passou a monitorar a chegada dos caminhões da Receita com a carga apreendida, para posterior desvio, competindo-lhe, ainda negociar com os compradores o preço da mercadoria a ser desviada. Gilson ficava com a maior parte do lucro, repassando a José Luiz entre R$ 8.000,00 (oito mil reais) e R$ 10.000,00 (dez mil reais) por carga desviada. A conduta delitiva estendeu-se até meados de 2017, quando então José Luiz desentendeu-se com Gilson de Souza e retirou-se do esquema criminoso.

A confissão da prática delitiva e a contribuição com a investigação policial ou com o processo criminal não são suficientes para a concessão do benefício da colaboração premiada, como pretende a defesa de José Luiz Alves Moreira, à vista do que dispõe o art. 4º da Lei n. 12.850/13.

Alexandra Barbosa Camargo admitiu ter participado desde o início das atividades ilícitas. As declarações prestadas pela ré demonstram que tinha plena ciência dos desvios de cigarros do Depósito de Materiais, embora não fosse a principal beneficiária econômica. Era o contato de José Luiz, informando-o sobre a chegada de cigarros apreendidos pela Receita Federal. Admitiu a ré que separava os cigarros a serem desviados e que para burlar eventual fiscalização, retirava das caixas originais apenas metade dos cigarros, preenchendo-as com pó de serra ou fumo. Quando da chegada do “caminhão de resíduos” (“código 10”), participava do carregamento da carga que seria desviada.

No que diz respeito a Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira, ao contrário do que afirma a defesa, houve regular individualização das condutas delitivas pela acusação e na sentença condenatória, que apontou a efetiva participação da ré nos desvios de cigarros após maio de 2017, quando da retirada de José Luiz da organização criminosa. As declarações de Naira de Almeida e de Alexandra Barbosa convergem no sentido de que competia a Érika Cristina informar sobre o horário de chegada do caminhão de resíduos, para abertura do galpão, visto que o carregamento geralmente ocorria fora do horário de expediente. As mensagens interceptadas indicam que Érika Cristina agia normalmente ao repassar ordens aos demais integrantes da organização criminosa, a infirmar a alegação da defesa de que agia sob coação de seu ex-marido Gilson de Souza. Por outro lado, assiste razão ao Juízo a quo ao concluir pela insuficiência de provas de que Érika Cristina integrava a organização criminosa desde 2013. O contexto familiar de Érika Cristina (ex-mulher de Gilson e filha de José Luiz) e a apuração de depósitos em sua conta bancária em data anterior a 2017 (conferir Id n. 157670223, p. 18, item 2.20) não são suficientes à afirmação segura de que integraria a organização criminosa mesmo antes da saída de seu pai.

No que toca a Sival Miranda dos Santos, fiel de depósito, as provas dos autos demonstram que tinha pleno conhecimento do desvio das mercadorias, delas participando ativamente. Ao contrário do que pretende a defesa, Sival não demonstra ser pessoa desprovida de conhecimento e incapaz de indagar ou concluir pela ilicitude das ordens que lhe eram dadas por Gilson de Souza. As declarações dos corréus e as conversas telefônicas interceptadas judicialmente demonstram que Sival Miranda agia com desenvoltura e que, ainda que subordinado a Gilson de Souza, dava ordens e cobrava informações sobre as cargas retiradas do Depósito de Materiais.

Portanto, devem ser mantidas as condenações de Gilson de Souza, José Luiz Alves Moreira, Sival Miranda dos Santos, Alexandra Barbosa Camargo e Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira pela prática do delito do art. 312 c. c. o art. 327, § 1º, do Código Penal e art. 1º, § 1º, da Lei n. 12.850/13.

Dosimetria. Gilson de Souza. CP, art. 312, caput. Na primeira fase da dosimetria, o Juízo a quo afirmou que a culpabilidade de Gilson de Souza “transbordou os lindes normais ao tipo em questão, justificando a pena-base acima do mínimo”. O réu não tem antecedentes criminais e nada há de relevante quanto aos motivos da prática do crime. Não há elementos que permitam afirmar a conduta social e personalidade do réu. As circunstâncias afastam-se das normais à espécie delitiva (o réu era o proprietário da empresa prestadora de serviços e gozava da confiança da Receita Federal). As consequências foram graves, tendo em vista a quantidade de caixas de cigarros desviados ilicitamente. Por fim, a vítima é o Estado, que em nada colaborou para a prática do delito. Nesses termos, o Juízo a quo fixou a pena-base acima do mínimo legal, em 3 (três) anos, 2 (dois) meses e 3 (três) dias de reclusão.

Na segunda fase da dosimetria, aplicou a circunstância agravante do art. 61, I, do CP, por ser o réu o dirigente das atividades. Inexistindo circunstâncias atenuantes ou outras agravantes, majorou a pena em 1/6 (um sexto), fixando-a em 3 (três) anos, 8 (oito) meses e 13 (treze) dias de reclusão.

Na terceira fase da dosimetria, fez incidir a causa de aumento pela continuidade do crime de peculato durante 4 (quatro) anos (CP, art. 71). Aumentou a pena para 5 (cinco) anos, 6 (seis) meses e 19 (dezenove) dias de reclusão e 24 dias-multa, que resultou definitiva.

O valor do dia-multa foi arbitrado em 1/15 (um quinze avos) do salário mínimo.

O Ministério Público Federal, em apelação, postula a exasperação da pena-base, do aumento decorrente da continuidade delitiva e do valor da multa.

Gilson de Souza interpôs apelação para a manutenção da pena-base ao mínimo legal e, subsidiariamente, para a fixação em 1/8 (um oitavo) do aumento decorrente de cada circunstância judicial valorada negativamente, bem como para o afastamento da agravante do art. 61, I, do Código Penal e redução da fração de aumento da pena em razão da continuidade delitiva.

Passo à análise da dosimetria da pena.

Não há elementos suficientes nos autos que permitam avaliar a personalidade e a conduta social de Gilson de Souza. As alegações de Érika Cristina e de seu filho Guilherme acerca da conduta violenta de Gilson de Souza não restaram suficientemente comprovadas nos autos, de modo que não devem ser consideradas para a majoração da pena-base.

A condição de sócio-administrador de AGL Armazéns Gerais e Logística indica maior grau de consciência da ilicitude dos crimes praticados no Depósito de Materiais da Receita Federal. A menção, pelo Juízo a quo, de que o réu gozava da confiança da Receita Federal não resulta em bis in idem, apenas reforça a conclusão acerca do exacerbado grau de culpabilidade do réu, por ser o representante legal da empresa que celebrou contrato com a Receita Federal.

Gilson de Souza criou as condições e forneceu os meios para que houvesse desvio da mercadoria apreendida, com burla ao sistema de monitoramento da Receita Federal, de modo que deve ser mantida a exasperação da pena-base em face das circunstâncias do crime.

As consequências do crime são graves, uma vez considerado o expressivo volume de cigarros estrangeiros desviados do Depósito de Materiais.

Anoto que a valoração das circunstâncias judiciais não resulta de simples cálculos matemáticos e da aplicação de frações pré-determinadas para a majoração da pena-base. A pena de multa e a pena privativa de liberdade sujeitam-se a critérios uniformes para a sua determinação, razão pela qual é adequada a exasperação proporcional da sanção pecuniária (TRF da 3ª Região, EI n. 0004791-83.2006.4.03.6110, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 16.02.17; TRF da 3ª Região, ACR n. 0002567- 55.2013.4.03.6102, Des. Fed. Cecilia Mello, j. 20.09.16; TRF da 3ª Região, ACR n. 0003484-24.2012.4.03.6130, Rel. Des. Fed. Mauricio Kato, j. 11.04.16).

Nesses termos, reputo adequada a majoração da pena-base em 2/3 (dois terços), a resultar em 3 (três) anos, 4 (quatro) meses de reclusão e 16 (dezesseis) dias-multa.

Na segunda fase da dosimetria da pena, sob pena de restar configurado o bis in idem, deve ser afastado o aumento de pena determinado pelo Juízo a quo em razão de Gilson de Souza ser o “dirigente das atividades”, por se tratar de condição considerada para a majoração da pena-base.

No que diz respeito à continuidade delitiva (CP, art. 71), considero que a majoração da pena em 1/2 (metade), determinada pelo Juízo a quo, é proporcional ao período em que houve desvio de mercadorias (do início de 2013 a setembro de 2017).

A pena definitiva resulta em 5 (cinco) anos de reclusão e 24 (trinta) dias-multa.

Arbitro o valor do dia-multa em 1/3 (um terço) do salário mínimo, de modo a resultar proporcional à capacidade econômica do réu, comprovada documentalmente nos autos.

Lei n. 12.850/13, art. 2º. Na primeira fase da dosimetria, o Juízo a quo consignou ser elevada a culpabilidade de Gilson de Souza, uma vez que “liderou a organização durante cerca de quatro anos, tinha o domínio da situação toda, e foi quem auferiu lucro mais elevado entre todos do grupo, portanto, no gradiente da culpabilidade, está acima dos outros”.

Não há antecedentes devidamente informados nos autos. Nada há de relevante quanto aos motivos da prática do crime. Não há elementos quanto à conduta social e personalidade do réu.

Acrescentou o Juízo a quo que as circunstâncias do crime “são diferentes das normais à espécie delitiva, pois o réu era o proprietário da empresa prestadora de serviços AGL, dominava as subcontratadas PLS, Ecoam, Gel Clean e Capital, e tinha um contrato com a Receita Federal que recebeu vários aditivos e perdurou por quase cinco anos para a administração do DMA, que era utilizado por várias unidades da Receita no Estado de São Paulo. O réu gozava, portanto, da confiança do órgão federal”. As consequências também foram graves, “pois consta o desvio de pelo menos 85.000 caixas de cigarros, no valor que pode chegar a aproximadamente R$ 150.000.000,00 (cento e cinquenta milhões de reais). Por fim, a vítima é o Estado, que não colaborou para a prática do delito.

A pena-base restou fixada em 4 (quatro) anos, 9 (nove) meses e 5 (cinco) dias de reclusão.

Na segunda fase da dosimetria, o Juízo a quo aplicou a agravante do art. 2º, § 3º, da Lei 12.850/13. Majorada em 1/6 (um sexto), a pena foi fixada em 5 (cinco) anos, 6 (seis) meses, 20 (vinte) dias de reclusão e 16 (dezesseis) dias-multa, que resultou definitiva uma vez ausentes causas de aumento e de diminuição de pena.

O valor do dia-multa foi arbitrado em 1/15 (um quinze avos) do salário mínimo.

O Ministério Público Federal, em apelação, postula a exasperação da pena-base de Gilson de Souza, a fixação em 2/3 (dois terços) do aumento decorrente da continuidade delitiva e a majoração da pena de multa.

Gilson de Souza, em apelação, insurge-se contra a valoração negativa das circunstâncias judiciais e a fração de aumento de pena aplicada pelo Juízo a quo. Pretende, ainda, o afastamento da agravante do art. 2º, § 3º, da Lei n. 12.850/13.

Passo à análise das insurgências das partes.

Os elementos dos autos demonstram a culpabilidade exacerbada de Gilson de Souza. As condições pessoais do réu e o fato de ser representante legal de AGL Armazéns Gerais e Logística Ltda., empresa à qual foi confiada a administração do Depósito de Materiais, demonstram maior grau de consciência da ilicitude.

As circunstâncias do crime devem ser valoradas negativamente. O esquema criminoso elaborado por Gilson de Souza incluía a propriedade de fato de empresas que deveriam garantir a segurança do Depósito de Materiais, mas que na realidade integravam a estrutura da organização criminosa e asseguravam a ocultação dos crimes praticados.

Em relação à personalidade e conduta social de Gilson de Souza, os elementos indicados em apelação pelo Ministério Público Federal foram considerados para a avaliação negativa da culpabilidade e das circunstâncias do crime. As alegações de Érika Cristina e de seu filho Guilherme acerca da conduta violenta de Gilson de Souza não restaram suficientemente comprovados nos autos, de modo que não devem ser consideradas para a majoração da pena-base.

As consequências do crime são graves, dado o efetivo desvio de expressiva quantidade de caixas de cigarros de origem estrangeira, com grave risco à saúde pública.

Anoto que a afirmação da gravidade das consequências do crime não decorre da avaliação de possíveis crimes posteriores à introdução clandestina de cigarros no mercado nacional, matéria que deve ser objeto de apuração em autos próprios.

A valoração das circunstâncias judiciais não resulta de simples cálculos matemáticos e de frações fixas para a majoração da pena-base. No que diz respeito à pena de multa e à pena privativa de liberdade, sujeitam-se a critérios uniformes para a sua determinação, razão pela qual é adequada a exasperação proporcional da sanção pecuniária (TRF da 3ª Região, EI n. 0004791-83.2006.4.03.6110, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 16.02.17; TRF da 3ª Região, ACR n. 0002567- 55.2013.4.03.6102, Des. Fed. Cecilia Mello, j. 20.09.16; TRF da 3ª Região, ACR n. 0003484-24.2012.4.03.6130, Rel. Des. Fed. Mauricio Kato, j. 11.04.16).

Em face do exposto, reputo adequada a majoração da pena-base em 2/3 (dois terços), fixando-a em 5 (cinco) anos de reclusão e 16 (dezesseis) dias-multa.

Mantenho a aplicação da circunstância agravante do art. 2º, § 3º, da Lei 12.850/13, tendo em vista o comando da organização criminosa exercido por Gilson de Souza. Não resta configurado o bis in idem, uma vez que para a majoração da pena-base foram considerados dados da subjetividade do réu e o modo de execução do crime, ao passo que para a aplicação da circunstância agravante avaliou-se o comando por ele exercido no âmbito da organização criminosa.

Majorada em 1/6 (um sexto), resta definitiva a pena de 5 (cinco) anos, 10 (dez) meses de reclusão e 18 (dezoito) dias-multa.

Arbitro o valor do dia-multa em 1/3 (um terço) do salário mínimo, de modo a resultar proporcional à maior capacidade econômica do réu, comprovada documentalmente nos autos.

Concurso material e regime inicial de cumprimento de pena. Tendo em vista que os crimes foram praticados em concurso material, as penas foram somadas pelo Juízo a quo, resultando em 10 (dez) anos, 9 (nove) meses, 15 (quinze) dias de reclusão e 40 (quarenta) dias-multa, no valor unitário de 1/15 (um quinze avos) do salário mínimo.

Regime inicial fechado.

Acrescentou o Juízo a quo, para efeito do que dispõe o art. 387, §§ 1º e 2º, do Código de Processo Penal, que “o réu está preso desde 14/06/2018, portanto, há 1 ano, 3 meses e 18 dias, o que, feito o cálculo, a pena se mantêm acima dos 8 anos e não permite a adoção do regime menos gravoso. Essa situação exige o regime inicial fechado para o cumprimento da reprimenda (art. 33, § 2º, “a", do CP)”. (Id n. 157677141, item 5.1).

Tendo em vista a nova dosimetria das penas em sede recursal, a aplicação do disposto no art. 69 do Código Penal resulta em 10 (dez) anos, 10 (dez) meses de reclusão e 42 (quarenta e dois) dias-multa, no valor unitário de 1/3 (um terço) do salário mínimo.

O cômputo do período em que Gilson de Souza permaneceu preso (1 ano, 3 meses e 18 dias) não enseja a alteração do regime inicial fechado de cumprimento de pena (CP, art. 33, § 1º, a).

Inadmissível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos (CP, art. 44, I).

José Luiz Alves Moreira.  CP, art. 312, caput. Na primeira fase da dosimetria, o Juízo a quo afirmou que a culpabilidade de José Luiz supera o normal para o tipo penal, uma vez que o réu “praticamente gerenciou as operações em campo, no depósito e em negociações com compradores, e ainda recebia o dinheiro e repassava para Gilson, e operou como laranja em empresas subcontratadas, justificando a fixação da pena acima do mínimo”.

Ausentes antecedentes criminais. Os motivos e as circunstâncias do crime foram considerados normais. Não há elementos quanto à conduta social e personalidade do réu. As consequências do crime foram graves devido à grande quantidade de cigarros desviados. A vítima é o Estado, que não colaborou para a prática do delito.

O Juízo a quo majorou a pena-base para 2 (dois) anos, 7 (sete) meses e 9 (nove) dias de reclusão.

Na segunda fase da dosimetria, afirmou a inexistência de circunstâncias agravantes e aplicou a atenuante da confissão para reduzir a pena em 1/3 (um terço). Tendo em vista o disposto na Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça, a pena restou fixada em 2 (dois) anos de reclusão.

Na terceira fase da dosimetria, fez incidir a causa de aumento de pena decorrente da continuidade delitiva. Tendo em vista o período de 4 (quatro) anos em que perdurou a prática delitiva, majorou a pena em 1/2 (metade), fixando-a definitivamente em 3 (três) anos de reclusão e 18 (dezoito) dias-multa, no valor unitário em 1/25 (um vinte e cinco avos) do salário mínimo.

O Ministério Público Federal interpôs apelação para a exasperação da pena-base, a fim de que resulte proporcional à culpabilidade do réu, às circunstâncias e consequências do crime. Ressaltou que parte as ações que justificaram o reconhecimento negativo das circunstâncias do crime devem analisadas no âmbito da culpabilidade. No que diz respeito à continuidade delitiva, deve haver exasperação para 2/3 (dois terços). A pena de multa deve ser fixada em valor compatível com a condição financeira do réu e com a necessária reprovação ao crime praticado.

José Luiz Alves Moreira, em apelação, ressalta que é idoso, não tem antecedentes criminais e apresentou elementos que permitiram o esclarecimento de diversos pontos no curso do processo criminal.

Passo à análise da insurgência das partes.

A culpabilidade de José Luiz deve ser avaliada negativamente, considerando-se o maior domínio sobre os fatos e o papel de coordenação por ele exercido, inclusive no que diz respeito à determinação das marcas de cigarros a serem desviadas e a comercialização direta com os interessados nas cargas ilícitas que lhe eram repassados por Gilson de Souza. A ponderação de que José Luiz forneceu documentos e livros de registro da empresa AGL que corroboram os fatos narrados na denúncia não permite afastar a conclusão de que atuava como coordenador das atividades ilícitas, de modo que a sua culpabilidade extrapola o normal para o tipo penal.

Deve ser acolhida a alegação da acusação de que parte dos elementos indicados pelo Juízo a quo a título de culpabilidade diz respeito às circunstâncias do crime. José Luiz atuou como interposta pessoa para a constituição fraudulenta de PLS (serviço de vigilância) e ECOAM (serviço de portaria), de modo a garantir o livre acesso de caminhões ao Depósito de Materiais e o desvio das cargas de cigarros.

A quantidade de cigarros desviados ao longo do período de prática delitiva é expressiva, razão pela qual é adequada a avaliação negativa das consequências do crime.

A valoração das circunstâncias judiciais não resulta de simples cálculos matemáticos ou da aplicação de frações pré-determinadas para a majoração da pena-base. A pena de multa e a pena privativa de liberdade sujeitam-se a critérios uniformes para a sua determinação, razão pela qual é adequada a exasperação proporcional da sanção pecuniária (TRF da 3ª Região, EI n. 0004791-83.2006.4.03.6110, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 16.02.17; TRF da 3ª Região, ACR n. 0002567- 55.2013.4.03.6102, Des. Fed. Cecilia Mello, j. 20.09.16; TRF da 3ª Região, ACR n. 0003484-24.2012.4.03.6130, Rel. Des. Fed. Mauricio Kato, j. 11.04.16).

Em face do exposto, reputo adequado majorar a pena-base em 2/3 (dois terços), fixando-a em 3 (três) anos, 4 (quatro) meses de reclusão e 16 (dezesseis) dias-multa.

Presente a circunstância atenuante da confissão. À míngua de insurgência da acusação, reduzo a pena em 1/3 (um terço), nos termos determinados pelo Juízo a quo, fixando-a em 2 (dois) anos, 2 (dois) meses, 20 (vinte) de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Em face da continuidade delitiva, deve ser mantida a majoração da pena em 1/2 (metade), uma vez que proporcional ao período de prática delitiva, superior a 4 (quatro) anos.

A pena resta definitiva em 3 (três) anos, 4 (quatro) meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa.

Majoro o valor do dia-multa em 1/6 (um sexto) do salário mínimo, à vista dos elementos dos autos que indicam maior capacidade econômica do réu.

Lei n. 12.850/13, art. 2º. O Juízo a quo registrou a aplicação da Súmula n. 711 do Supremo Tribunal Federal e, na primeira fase da dosimetria da pena, afirmou ser elevada a culpabilidade de José Luiz, pois “integrou a organização durante cerca de quatro anos, foi laranja na Ecoam e PLS, subcontratadas da AGL, recebia participação em dinheiro, emprestava conta bancária, fazia as vezes de Gilson no depósito, ao lado de Sival, e confessou que negociava com os compradores da mercadoria desviada. Embora agisse com alguma autonomia, era ainda subordinado a Gilson. Culpabilidade em grau menor que a do líder, porém maior que a dos demais corréus”. Acrescentou o Juízo a quo que José Luiz não tem antecedentes criminais e que nada há de relevante quanto aos motivos da prática do crime. Não há elementos quanto à conduta social e personalidade. As circunstâncias do crime foram normais em relação a José Luiz. As consequências foram graves, “pois consta o desvio de pelo menos 85.000 caixas de cigarros, no valor que pode chegar a aproximadamente R$ 150.000.000,00 (cento e cinquenta milhões de reais)”. A vítima, o Estado, não colaborou para a prática do delito. Nesses termos, a pena-base foi fixada acima do mínimo legal, e 3 (três) anos e 11 (onze) meses de reclusão.

Na segunda fase da dosimetria, o Juízo a quo aplicou a atenuante da confissão e reduziu a pena em 1/3 (um terço). Ressaltou que também deveria ser considerado o arrependimento do acusado, a resultar em redução da pena em 1/6 (CP, art. 66). Em face do disposto pela Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça, a pena foi fixada em 3 (três) anos de reclusão.

Na terceira fase da dosimetria, consignou o Juízo a quo a inexistência de causas de aumento e de diminuição de pena. A pena restou definitiva em 3 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, “valor proporcional à pena privativa de liberdade aplicada (artigos 49, caput, e 59, ambos do Código Penal)”. O valor do dia-multa foi arbitrado em 1/25 (um vinte e vinco avos) do salário mínimo nacional.

O Ministério Público Federal, em apelação, postula a exasperação da pena-base, do aumento decorrente da continuidade delitiva e do valor do dia-multa.

José Luiz Alves Moreira interpôs apelação para redução da fração de aumento de pena decorrente da continuidade delitiva, sob o fundamento de que participou do esquema criminoso de março de 2014 a abril de 2017. Requer, ainda, o benefício da colaboração premiada (Lei n. 12.850/13, art. 4º).

Passo à análise das alegações das partes.

Tendo em vista a atividade de coordenação desempenhada por José Luiz no âmbito da organização criminosa, assiste razão ao Ministério Público Federal ao afirmar que a culpabilidade do réu extrapola o normal para o tipo penal.

As circunstâncias do crime devem ser valoradas negativamente. A organização criminosa envolvia a constituição fraudulenta de empresas em nome de José Luiz, subcontratadas por AGL Armazéns Gerais e Logísticas para a prestação de serviços de portaria e de vigilância, mas que de fato atuavam para facilitar a prática de infrações penais.

As consequências do crime não integram o tipo penal, uma vez que da associação criminosa resultou o desvio de expressiva quantidade de caixas de cigarros de origem estrangeira.

A valoração das circunstâncias judiciais não resulta de simples cálculos matemáticos e da aplicação de frações pré-determinadas para a majoração da pena-base. A pena de multa e a pena privativa de liberdade sujeitam-se a critérios uniformes para a sua determinação, razão pela qual é adequada a exasperação proporcional da sanção pecuniária (TRF da 3ª Região, EI n. 0004791-83.2006.4.03.6110, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 16.02.17; TRF da 3ª Região, ACR n. 0002567- 55.2013.4.03.6102, Des. Fed. Cecilia Mello, j. 20.09.16; TRF da 3ª Região, ACR n. 0003484-24.2012.4.03.6130, Rel. Des. Fed. Mauricio Kato, j. 11.04.16).

Nesses termos, majoro a pena-base em 2/3 (dois terços), fixando-a em 5 (cinco) anos de reclusão e 16 (dezesseis) dias-multa.

Na segunda fase da dosimetria da pena, deve ser mantida a aplicação das circunstâncias atenuantes do art. 65, III, d e do art. 66 do Código Penal, em relação às quais não houve impugnação da acusação. Reduzida a pena em 1/3 (um terço) e 1/6 (um sexto), conforme determinado pelo Juízo a quo, a pena resulta em 3 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, em face do que dispõe a Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça.

À míngua de causas de diminuição e de aumento de pena, a pena definitiva resta fixada em 3 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Majoro o valor do dia-multa em 1/6 (um sexto) do salário mínimo, à vista dos elementos dos autos que indicam maior capacidade econômica do réu.

Concurso material e regime inicial de cumprimento de pena. Tendo em vista que os crimes foram praticados em concurso material, o Juízo a quo aplicou o disposto no art. 69 do Código Penal. A soma das penas totalizou 6 (seis) anos de reclusão e 28 (vinte e oito) dias-multa, cada dia-multa, no valor de 1/25 (um vinte e cinco avos) do salário mínimo nacional.

Regime inicial semiaberto.

Para efeito do art. 387, §§ 1º e 2º do Código Penal, o Juízo a quo registrou que “o réu foi preso em 14/06/2018 e posto em liberdade em 06/12/2018 (fls. 1.459), tendo permanecido encarcerado cautelarmente por pouco menos de seis meses ou 5 meses e 21 dias. Feito o cálculo, a pena se mantém acima dos 5 anos e não permite a adoção do regime menos gravoso. Essa situação exige o regime inicial semiaberto para o cumprimento da reprimenda (art. 33, § 22, do CP), pois não estão preenchidos os requisitos do art. 44, 1, do CP” (Id n. 157677141, item 5.2).

Em face da nova dosimetria das penas em sede recursal, a aplicação do disposto no art. 69 do Código Penal resulta na pena total de 6 (seis) anos, 4 (quatro) meses de reclusão e 25 (vinte e cinco) dias-multa, no valor unitário de 1/6 (um sexto) do salário mínimo.

A detração prevista no § 2º do art. 387 do Código de Processo Penal é inaplicável para as medidas cautelares diversas da prisão (STJ, AgRg no HC n. 494.693, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 11.02.20).

Mantido o regime inicial semiaberto (CP, art. 33, § 2º, b).

Sival Miranda dos Santos. CP, art. 312, caput. Na primeira fase da dosimetria, o Juízo a quo afirmou que a culpabilidade de Sival supera o normal para o tipo, uma vez que “foi fiel do depósito desde o início até sua prisão em flagrante no dia em que desviava ao lado de outros um caminhão de cigarros do DMA; tinha o controle de tudo no local, retransmitia as ordens do patrão e compadre Gilson, a quem mantinha informado. Era contratado da AGL. Praticamente gerenciou as operações no depósito, justificando a fixação da pena acima do mínimo. No entanto, não há qualquer sinal de que fosse sócio do líder no esquema, existindo sinais probatórios de subserviência ao chefe; por isso, sua culpabilidade será considerada em menor grau que a de Gilson e José Luiz”. Ausentes antecedentes criminais. Os motivos do crime foram os normais, assim como as circunstâncias, no que toca a Sival. Inexistentes elementos que permitam afirmar a conduta social e personalidade do réu. As consequências do crime são graves, dada a grande quantidade de cigarros desviados. A vítima é o Estado, que não colaborou para a prática delitiva.

Em decorrência, a pena-base foi majorada para 2 (dois) anos, 5 (cinco) meses e 1 (um) dia de reclusão.

Na segunda fase da dosimetria, o Juízo a quo considerou inexistentes circunstâncias agravantes. Por outro lado, o réu “confessou a efetiva existência do esquema de desvios, embora dissesse em juízo que só cumpria ordens. O fato de corroborar a essência do que se buscava com as investigações e a persecução penal é suficiente”. Aplicou a atenuante da confissão para reduzir a pena em 1/3 (um terço).

Tendo em vista o disposto pela Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça, a pena restou fixada em 2 (dois) anos de reclusão.

Na terceira fase da dosimetria, o Juízo a quo aplicou a causa de aumento de pena decorrente da continuidade delitiva. A prática de crimes de peculato perdurou por 4 (quatro) anos, período no qual está incluída a prisão em flagrante de Sival (Autos n. 0005556-38.2017.403.6120).

Nesses termos, a pena definitiva resultou em 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 13 (treze) dias-multa, no valor de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo nacional.

O Ministério Público Federal interpôs apelação para exasperação da pena-base e para o afastamento da atenuante da confissão. Na terceira fase da dosimetria, pretende a majoração da pena em 2/3 (dois terços), em face do período de continuidade delitiva.

Sival Miranda dos Santos insurge-se contra a majoração da pena-base do delito do art. 312 do Código Penal. Pretende, ainda, a redução para 1/6 (um sexto) do aumento de pena decorrente da continuidade delitiva.

Passo à análise da insurgência das partes.

A culpabilidade de Sival Miranda dos Santos não integra o tipo penal. Embora empregado de AGL Armazéns Gerais/Gilson de Souza, na condição de fiel de depósito foi-lhe confiada maior responsabilidade para zelar pela integridade das mercadorias apreendidas. Por outro lado, ao contrário de Gilson de Souza e José Luiz, Sival Miranda dos Santos não era líder do esquema criminoso nem importante beneficiário econômico.

Considero razoáveis os fundamentos deduzidos pelo Juízo a quo para concluir que, em relação ao réu, as circunstâncias do crime são normais para a espécie delitiva. O fato de desligar das câmeras de segurança do Depósito de Materiais não permite afirmar que Sival Miranda teria exercido papel de liderança ou que o modo de execução do crime, em relação a ele, extrapoloria o normal para o tipo penal.

As consequências do crime são graves, dada a grande quantidade de cigarros desviados. A vítima é o Estado, que não colaborou para a prática delitiva.

Nesses termos, majoro a pena-se em 1/3 (um terço), fixando-a em 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 13 (treze) dias-multa.

Mantenho a aplicação da atenuante da confissão. Pelo que se infere dos precedentes do Superior Tribunal de Justiça, a atenuante da confissão (CP, art. 65, III, d) incide sempre que fundamentar a condenação do acusado, pouco relevando se extrajudicial ou parcial, mitigando-se ademais a sua espontaneidade (STJ, HC n. 154544, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 23.03.10; HC n. 151745, Rel. Min. Felix Fischer, j. 16.03.10; HC n. 126108, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 30.06.10; HC n. 146825, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 17.06.10; HC n. 154617, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 29.04.10; HC n. 164758, Rel. Min. Og Fernandes, j. 19.08.10). A oposição de excludente de culpabilidade não obsta o reconhecimento da atenuante da confissão espontânea (STJ, HC n. 283620, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 20.02.14; AgReg em REsp n. 1376126, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 04.02.14; Resp n. 1163090, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 01.03.11).

Reduzida em 1/3 (um terço), conforme determinado pelo Juízo a quo, a pena resulta em 2 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, à vista do disposto pela Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça.

A continuidade delitiva estendeu-se por cerca de 4 (quatro) anos (o réu permaneceu preso de 11.09.17 a 05.12.17), de modo que fixo em 1/2 (metade) o aumento de pena decorrente da aplicação do art. 71 do Código Penal, a fim de que resulte proporcional às condutas praticadas pelo réu no período.

A pena definitiva resulta em 3 (três) anos de reclusão e 15 (quinze) dias-multa, no mínimo valor unitário legal.

Lei n. 12.850/13, art. 2º. Na primeira fase da dosimetria, o Juízo a quo afirmou que a culpabilidade de Sival Miranda dos Santos não supera o normal para o tipo. “Se o papel por ele exercido era importante para o resultado e para manter Gilson distante do depósito, ficou claro que o acusado se preocupava em manter o emprego, pois era contratado da AGL. Pelo que observou das provas, apesar de ter ciência dos atos ilícitos e colaborar, Sival praticamente exercia tarefas a que era ordenado a cumprir e apesar de ter sido pago ou ter recebido benefícios, tudo indica que não era sócio nem que recebeu valores elevados. Ficou claro que Sival era empregado que gozava da confiança do líder Gilson, seu patrão e compadre, e observo subordinação ao patrão. A dosimetria da pena deve ser equivalente à culpabilidade de cada coautor ou partícipe”. Sival não tem antecedentes criminais e nada há de relevante quanto aos motivos da prática do crime. Não há elementos quanto à conduta social e personalidade do réu. As circunstâncias do crime foram normais em relação ao réu. As consequências do crime foram graves. A vítima, o Estado, não colaborou para a prática do delito.

A pena-base foi majorada para 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão.

Na segunda fase da dosimetria da pena, não houve incidência de circunstância agravante. Presente a atenuante da confissão, “tendo em vista que admitiu a existência dos desvios de fumígenos e, ainda que tenha dito ter somente cumprido ordens, corroborou no fundamental a acusação”.

A pena foi reduzida em 1/3 (um terço), porém em face do disposto na Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça, resultou na pena definitiva de 3 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa. O dia-multa foi arbitrado em 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo nacional.

Sival Mirada postula, em apelação, a redução da pena-base para o mínimo legal.

O Ministério Público Federal interpôs apelação para exasperação da pena-base e afastamento da atenuante da confissão.

A valoração das circunstâncias judiciais não resulta de simples cálculos matemáticos e da aplicação de frações pré-determinadas para a majoração da pena-base. A pena de multa e a pena privativa de liberdade sujeitam-se a critérios uniformes para a sua determinação, razão pela qual é adequada a exasperação proporcional da sanção pecuniária (TRF da 3ª Região, EI n. 0004791-83.2006.4.03.6110, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 16.02.17; TRF da 3ª Região, ACR n. 0002567- 55.2013.4.03.6102, Des. Fed. Cecilia Mello, j. 20.09.16; TRF da 3ª Região, ACR n. 0003484-24.2012.4.03.6130, Rel. Des. Fed. Mauricio Kato, j. 11.04.16).

Os elementos dos autos indicam que a culpabilidade é normal para o tipo penal. Embora ciente da ilicitude das condutas praticadas, Sival Miranda dos Santos subordinava-se a Gilson de Souza e desempenhava tarefas que lhe eram determinadas, de modo que não se pode afirmar que exercia papel de gerência ou de liderança no âmbito da organização criminosa.

As circunstâncias do crime não revelam maior gravidade em relação ao réu.

As consequências do crime não integram o tipo penal, uma vez que da associação resultou o desvio de expressiva quantidade de caixas de cigarros de origem estrangeira.

Em face do exposto, mantenho a majoração da pena-base em 1/6 (um sexto), a resultar em 3 (três) anos, 6 (seis) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa.

Na segunda fase da dosimetria, deve ser aplicada a atenuante da confissão, ainda que Sival Miranda tenha procurado afastar a sua responsabilidade ao argumento de que teria praticado a conduta delitiva a mando ou por receio de Gilson de Souza. Pelo que se infere dos precedentes do Superior Tribunal de Justiça, a atenuante da confissão (CP, art. 65, III, d) incide sempre que fundamentar a condenação do acusado, pouco relevando se extrajudicial ou parcial, mitigando-se ademais a sua espontaneidade (STJ, HC n. 154544, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 23.03.10; HC n. 151745, Rel. Min. Felix Fischer, j. 16.03.10; HC n. 126108, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 30.06.10; HC n. 146825, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 17.06.10; HC n. 154617, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 29.04.10; HC n. 164758, Rel. Min. Og Fernandes, j. 19.08.10). A oposição de excludente de culpabilidade não obsta o reconhecimento da atenuante da confissão espontânea (STJ, HC n. 283620, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 20.02.14; AgReg em REsp n. 1376126, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 04.02.14; Resp n. 1163090, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 01.03.11).

Reduzida em 1/3 (um terço) conforme determinado pelo Juízo a quo, a pena resulta em 3 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, à vista do que dispõe a Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça.

Ausentes causas de diminuição e de aumento de pena, a deve resta definitiva em 3 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Concurso material. Tendo em vista que os delitos foram praticados em concurso material, a soma das penas totalizou 5 (cinco) anos, 8 (oito) meses de reclusão e 23 (vinte e três) dias-multa, arbitrado o dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo.

Regime inicial semiaberto.

Ressaltou o Juízo a quo, para “efeito do previsto no art. 387, parágrafos 1º e 2º, do CPP, o réu foi preso em 11/09/2017 e posto em liberdade em 05/12//2017 (fls. 614), tendo permanecido encarcerado cautelarmente por pouco menos de 2 meses e 26 dias. Feito o cálculo, a pena se mantém acima dos 5 anos, não sendo permitida a adoção do regime menos gravoso. Diante disso, não preenchidos os requisitos do art. 44, 1, do CP, o regime inicial será o semiaberto (art. 33, § 22, "h", do CP) (Id n. 157677141, item 5.3).

Tendo em vista a nova dosimetria das penas em sede recursal, a aplicação do disposto no art. 69 do Código Penal resulta na pena total de 6 (seis) anos de reclusão e 25 (vinte e cinco) dias-multa.

Mantido o regime inicial semiaberto (CP, art. 33. § 2º, b).

Alexandra Barbosa Camargo. CP, art. 312, caput. Na primeira fase da dosimetria, o Juízo a quo ponderou que a culpabilidade de Alexandra supera o normal para o tipo. A ré “desde o inicio do contrato trabalho como operadora de empilhadeira, ficava sempre dentro do barracão onde ficavam as mercadorias e era a responsável por todas as cargas, portanto, sabia de tudo o que saía, via fazer e fazia a montagem e o enchimento das caixas das quais eram retirados os cigarros. Empregada formal da AGL, ela mantinha contato com José Luiz, Sival, Érika e Naiara. Foi presa em flagrante em ação relacionada à apreensão do caminhão carregado no dia 11/09/2017. Não há qualquer sinal de que fosse sócia do líder no esquema, existindo sinais probatórios de subserviência aos demais; por isso, sua culpabilidade será considerada em menor grau que a de Gilson e José Luiz”. Alexandra não tem antecedentes criminais e inexistem elementos que permitam afirmar a sua conduta social e personalidade. Os motivos e as circunstâncias do crime são normais em relação à ré. As consequências do crime superaram a normalidade devido à grande quantidade de cigarros desviados. A vítima é o Estado, que não colaborou para a prática do delito.

A pena-base foi fixada pelo Juízo a quo em 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão.

Na segunda fase da dosimetria, afirmou o Juízo a quo que inexistem circunstâncias agravantes. Acrescentou que Alexandra confessou expressamente a sua participação e apontou integrantes do esquema, ressalvando que cumpria ordens (CP, art. 65, III, V). Reduziu a pena em 1/3 (um terço) e, dado o que dispõe a Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça, fixou a pena em 2 (dois) anos de reclusão.

Na terceira fase da dosimetria, o Juízo a quo aplicou “a causa de aumento pela continuidade do crime de peculato, do qual participou por quase quatro anos (art. 71 do CP), incluído o episódio de sua prisão nos autos 0005556-38.2017.403.6120”.

A pena restou fixada em 3 (três) anos de reclusão.

Por fim, afirmou o Juízo a quo que considera adequado, para Alexandra, a “aplicação da causa de diminuição do concurso de pessoas (art. 29, § 1º, do CP) com redução de 1/6, porque sua participação, apesar de objetiva, foi de menor importância”.

A pena foi definitivamente fixada em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 12 (doze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo, em razão da situação econômica da ré.

O Ministério Público Federal, em apelação, requer a exasperação da pena-base, o afastamento da causa de diminuição de pena do art. 29, § 1º, do Código Penal e a majoração para 2/3 (dois terços) do aumento de pena decorrente da aplicação do art. 71 do Código Penal.

Alexandra Barbosa Camargo interpôs apelação para a fixação da pena-base no mínimo legal e redução para 1/6 (um sexto) do aumento de pena decorrente da continuidade delitiva.

Passo à análise da insurgência das partes.

Na primeira fase da dosimetria, deve ser mantida a avaliação negativa da culpabilidade de Alexandra Barbosa Camargo. A condição de responsável pela simulação do conteúdo das caixas de onde eram retirados os cigarros e a circunstância de ser a responsável por avisar (em especial a José Luiz) sobre as novas cargas que chegavam ao Depósito de Materiais, demonstram um grau de consciência da ilicitude que não integra o tipo penal. Por outro lado, Alexandra era subordinada a José Luiz e, indiretamente, a Gilson de Souza, de modo que não merece reparo a conclusão do Juízo a quo de que a culpabilidade da ré resulta em menor grau que a de Gilson e José Luiz.

As circunstâncias do crime não revelam maior gravidade em relação à ré.

As consequências do crime são graves, tendo em vista a grande quantidade de cigarros desviados. A vítima é o Estado, que não colaborou para a prática do delito.

No que diz respeito à valoração das circunstâncias judiciais para a majoração da pena-base, cumpre registrar que não resulta de simples cálculos matemáticos e da aplicação de frações pré-determinadas. A pena de multa e a pena privativa de liberdade sujeitam-se a critérios uniformes para a sua determinação, razão pela qual é adequada a exasperação proporcional da sanção pecuniária (TRF da 3ª Região, EI n. 0004791-83.2006.4.03.6110, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 16.02.17; TRF da 3ª Região, ACR n. 0002567- 55.2013.4.03.6102, Des. Fed. Cecilia Mello, j. 20.09.16; TRF da 3ª Região, ACR n. 0003484-24.2012.4.03.6130, Rel. Des. Fed. Mauricio Kato, j. 11.04.16).

Nesses termos, considero adequada a majoração em 1/3 (um terço), razão pela qual fixo a pena-base em 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 13 (treze) dias-multa.

Na segunda fase da dosimetria, incide a atenuante da confissão, em relação à qual não houve impugnação do Ministério Público Federal. Reduzida em 1/3 (um terço), conforme procedeu o Juízo a quo, a pena resulta em 2 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa (STJ, Súmula n. 231).

A continuidade delitiva estendeu-se por cerca de 4 (quatro) anos. A fim de que resulte proporcional às condutas praticadas pela ré, majoro para 1/2 (metade) o aumento de pena decorrente da aplicação do art. 71 do Código Penal.

A pena resulta em 3 (três) anos de reclusão e 15 (quinze) dias-multa.

Acolho a alegação do Ministério Público Federal no que concerne à inaplicabilidade do art. 29, § 1º, do Código Penal. Embora subordinada a Gilson de Souza e José Luiz, deve-se ponderar que Alexandra Barbosa Camargo desenvolvia importante função no desvio de cigarros do Depósito de Materiais, o que afasta a conclusão de participação de menor importância.

A pena definitiva resta fixada em 3 (três) anos de reclusão e 15 (quinze) dias-multa.

Lei n. 12.850/13, art. 2º. Na primeira fase da dosimetria, o Juízo a quo considerou que a culpabilidade de Alexandra Barbosa Camargo não supera o normal para o tipo, pois a sua atividade, apesar de necessária, restringia-se às tarefas braçais. “Era empregada da AGL, não tinha poder de decisão e em seus interrogatórios sempre manifestou subordinação, acatando ordens superiores, apesar de receber dinheiro extra para os atos praticados fora da função lícita. A ré não tem antecedentes criminais e não há elementos que permitam afirmar a sua personalidade e conduta social. Nada há de relevante quanto aos motivos do crime e são normais, para Alexandra, as circunstâncias delitivas. As consequências do crime foram graves. O Estado, vítima do crime, não colaborou para a prática do delito. Em decorrência, a pena-base foi fixada em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão.

Na segunda fase da dosimetria, o Juízo a quo consignou a ausência de circunstâncias agravantes. Aplicou a atenuante da confissão e reduziu a pena em 1/3 (um terço). Em face do disposto na Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça, a pena restou fixada em 3 (três) anos de reclusão.

Na terceira fase da dosimetria, o Juízo a quo afirmou ser a participação de Alexandra de menor importância que a de outros, razão pela qual deve incidir a causa de diminuição do concurso de pessoas (CP, art. 29, § 1º), com redução da pena em 1/6 (um sexto).

A pena definitiva resultou definitiva em 2 (dois) anos, 11 (onze) meses de reclusão e 8 (oito) dias-multa, arbitrado no valor unitário de 1/30 (um trinta avos) do salário-mínimo.

O Ministério Público Federal, em apelação, requer a exasperação da pena-base, o afastamento da causa de diminuição de pena do art. 29, § 1º, do Código Penal e a majoração para 2/3 (dois terços) do aumento de pena em face da aplicação do art. 71 do Código Penal.

Alexandra Barbosa Camargo interpôs apelação para a fixação da pena-base no mínimo legal e redução para 1/6 (um sexto) do aumento de pena decorrente da continuidade delitiva.

Passo à análise das insurgências das partes.

A culpabilidade e as circunstâncias do crime, para Alexandra Barbosa Camargo, integram o tipo penal. Conforme apontou o Juízo a quo, a ré não tinha poder de decisão no âmbito da organização criminosa e atuava de modo subordinado no exercício de suas tarefas.

As consequências do crime são graves, uma vez que da organização criminosa resultou a efetiva prática de inúmeras práticas delitivas.

Nesses termos, majoro a pena-base em 1/6 (um sexto), fixando-a em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa.

Aplico a atenuante da confissão e reduzo a pena em 1/3 (um terço), conforme determinado pelo Juízo a quo, à míngua de impugnação da acusação. Tendo em vista que a incidência de circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal, a pena resulta em 3 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Acolho a alegação da acusação para afastar a incidência da causa de diminuição de pena do art. 29, § 1º, do Código Penal. O fato de Alexandra não exercer papel de comando no âmbito da organização criminosa não permite afirmar a sua atuação como partícipe ou que não tenha colaborado de modo decisivo para o sucesso da empreitada criminosa.

A pena definitiva resta fixada em 3 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Concurso material e regime inicial de cumprimento de pena. Em face da aplicação do art. 69 do Código Penal, a soma das penas resultou em 5 (cinco) anos, 5 (cinco) meses de reclusão e 20 (vinte) dias -multa, no mínimo valor unitário legal.

Regime inicial semiaberto.

Para efeito do art. 387, §§ 1º e 2º, do Código Penal, registrou o Juízo a quo, que “a ré foi presa em 11/09/2017 e posta em liberdade em 05/12/2017 (fls. 60l), tendo permanecido encarcerada cautelarmente por pouco menos de 2 meses e 26 dias. Feito o cálculo, a pena se mantêm acima dos 5 anos, não sendo permitida a adoção do regime menos gravoso. Diante disso, não preenchidos os requisitos do art. 44, 1, do CP, o regime inicial será o semiaberto (art. 33, § 2º, “b", do CP).” (Id n. 157677141, item 5.4).

Tendo em vista a nova dosimetria das penas em sede recursal, a aplicação do disposto no art. 69 do Código Penal resulta na pena total de 6 (seis) anos de reclusão e 25 (vinte e cinco) dias-multa.

Mantenho o regime inicial semiaberto (CP, art. 33. § 2º, b).

Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira. CP, art. 312, caput. Na primeira fase da dosimetria da pena, o Juízo a quo afirmou que a culpabilidade de Érika Cristina supera o normal para o tipo. A ré “começou a aparecer abertamente no esquema por volta de abril/maio de 2017, fazendo as vezes de seu pai, José Luiz, retransmitindo ordens de Gilson para o pessoal do barracão, embora não fosse empregada formal da AGL ou outra empresa terceirizada. Era pessoa de confiança do ex-marido e do pai, emprestava sua conta bancária para Gilson mesmo quando estavam separados, porém, sua culpabilidade se deu em menor grau que a de Gilson e José Luiz. Ajudava a desviar cigarros apreendidos”. A ré não tem antecedentes devidamente informados nos autos. Os motivos do crime foram os normais. Não há elementos quanto à sua conduta social e personalidade. As circunstâncias do crime em relação a Érika Cristina não se afastam das normais à espécie. “Apareceu na linha de frente por menos tempo, mas ainda que proporcionalmente analisadas, as consequências superaram a normalidade devido à quantidade de cigarros desviados”. A vítima é o Estado, que não colaborou para a prática do delito. Nesse contexto, a pena-base foi fixada acima do mínimo legal, em 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão.

Na segunda fase, não houve incidência de circunstâncias agravantes. Ponderou o Juízo a quo que “se a acusada procurou eximir-se de responsabilidade alegando cumprir ordens por temer o ex-marido e ficar sem casa para morar, também não negou os desvios nem a participação e liderança de Gilson, o que contribui para a conclusão segura de que o crime foi praticado conforme descrito na inicial”. Assim, concluiu que a admissão da ré configura confissão, de modo que reduziu a pena em 1/3 (um terço). À vista do que dispõe a Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça, a pena foi estabelecida em 2 (dois) anos de reclusão.

Na terceira fase da dosimetria, o Juízo a quo aplicou a causa de aumento pela continuidade do crime de peculato. Ressaltou que a participação de Érika Cristina deu-se em tempo bem menor que a dos corréus, razão pela qual aplicou a fração de 1/4 (um quarto). A pena resultou em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão.

O Juízo a quo fez incidir a causa de diminuição de pena do art. 29, § 1º, do Código Penal e reduziu a pena em 1/6 (um sexto), porque “apesar de coordenar em nome do líder e ter atuação relevante, ainda assim teve papel de menor importância na comparação com outros”.

A pena definitiva resultou em 2 (dois) anos, 1 (um) mês de reclusão e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo.

Em apelação, o Ministério Público Federal postula a exasperação da pena-base de Érika Cristina (que teria participado desde o início das atividades ilícitas), o afastamento da atenuante da confissão e da causa de diminuição de pena do art. 29, § 1º, do Código Penal. Na terceira fase da dosimetria, requer a fixação em 2/3 (dois terços) do aumento decorrente da continuidade delitiva.

Érika Cristina interpôs apelação para manutenção da pena-base no mínimo legal, redução da pena em 1/3 (um terço) pela aplicação do art. 29, § 1º, do Código Penal e redução para 1/6 (um sexto) do aumento de pena em face da incidência do art. 71 do Código Penal.

Passo à análise das insurgências das partes.

Na primeira fase da dosimetria, deve ser mantida a avaliação negativa da culpabilidade da ré. Restou demonstrado que, com a saída de seu pai José Luiz do esquema criminoso, Érika Cristina assumiu parte das funções que lhe incumbiam no desvio de mercadorias, bem como emprestou a sua conta bancária a Gilson de Souza, para o depósito de valores ilícitos. Não restou demonstrado que a ré tenha atuado como administradora do Depósito de Materiais, de modo que resulta adequada a afirmação do Juízo a quo de que, em relação a Gilson de Souza e José Luiz, é menor o grau de culpabilidade de Érika Cristina. Não há, ainda, elementos suficientes nos autos que permitam concluir que Érika Cristina tenha praticado crimes de peculato em data anterior à saída de José Luiz do esquema criminoso.

As circunstâncias do crime devem ser mantidas como integrantes do tipo penal.

As consequências do crime são graves, uma vez considerada a grande quantidade de cigarros desviados, ainda que a ré tenha ingressado posteriormente no esquema criminoso.

A vítima é o Estado, que não colaborou para a prática do delito.

A valoração das circunstâncias judiciais não resulta de simples cálculos matemáticos e da aplicação de frações pré-determinadas para a majoração da pena-base. A pena de multa e a pena privativa de liberdade sujeitam-se a critérios uniformes para a sua determinação, razão pela qual é adequada a exasperação proporcional da sanção pecuniária (TRF da 3ª Região, EI n. 0004791-83.2006.4.03.6110, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 16.02.17; TRF da 3ª Região, ACR n. 0002567- 55.2013.4.03.6102, Des. Fed. Cecilia Mello, j. 20.09.16; TRF da 3ª Região, ACR n. 0003484-24.2012.4.03.6130, Rel. Des. Fed. Mauricio Kato, j. 11.04.16).

Nesses termos, considero adequada a majoração da pena em 1/3 (um terço), de modo que fixo a pena-base em 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 13 (treze) dias-multa.

Na segunda fase da dosimetria, deve ser mantida a aplicação da atenuante da confissão, ainda que Érika Cristina tenha procurado afastar a sua responsabilidade ao argumento de que teria praticado as condutas delitivas a mando ou por receio de Gilson de Souza. Pelo que se infere dos precedentes do Superior Tribunal de Justiça, a atenuante da confissão (CP, art. 65, III, d) incide sempre que fundamentar a condenação do acusado, pouco relevando se extrajudicial ou parcial, mitigando-se ademais a sua espontaneidade (STJ, HC n. 154544, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 23.03.10; HC n. 151745, Rel. Min. Felix Fischer, j. 16.03.10; HC n. 126108, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 30.06.10; HC n. 146825, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 17.06.10; HC n. 154617, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 29.04.10; HC n. 164758, Rel. Min. Og Fernandes, j. 19.08.10). A oposição de excludente de culpabilidade não obsta o reconhecimento da atenuante da confissão espontânea (STJ, HC n. 283620, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 20.02.14; AgReg em REsp n. 1376126, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 04.02.14; Resp n. 1163090, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 01.03.11).

Reduzida em 1/3 (um terço), fração aplicada pelo Juízo a quo, a pena resulta em 2 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa (STJ, Súmula n. 231).

Tendo em vista o menor período de prática delitiva, considero razoável a majoração da pena em 1/4 (um quarto), conforme fixado pelo Juízo a quo, em decorrência da aplicação do disposto no art. 71 do Código Penal.

A pena resulta em 2 (dois) anos, 6 (seis) meses de reclusão e 12 (doze) dias-multa.

Afasto a aplicação do disposto no art. 29, § 1º, do Código Penal. A circunstância de Érika Cristina não exercer papel de comando no desvio de mercadorias do Depósito de Materiais não permite afirmar a sua atuação como simples partícipe ou que não tenha colaborado de modo decisivo para o sucesso da empreitada criminosa.

A pena definitiva resta fixada em 2 (dois) anos, 6 (seis) meses de reclusão e 12 (quinze) dias-multa.

Lei n. 12.850/13, art. 2º. Na primeira fase da dosimetria, a culpabilidade de Érika Cristina foi considerada como não integrante do tipo penal, pelas razões expostas em relação ao delito de peculato. Essa circunstância “justifica a elevação da pena, porém de modo menos intenso que a de Gilson e José Luiz”.

A ré não tem antecedentes criminais, nada havendo de relevante quanto aos motivos da prática do crime. Não há elementos sobre a conduta social e personalidade da ré. As circunstâncias do crime foram normais para o tipo penal. As consequências do crime foram avaliadas como graves. A vítima, o Estado, não colaborou para a prática do delito.

Nesses termos, a pena-base foi fixada acima do mínimo legal, em 3 (três) anos de reclusão e 6 (seis) meses.

Na segunda fase da dosimetria, não houve incidência de circunstância agravante. Presente a atenuante da confissão, a pena foi reduzida em 1/3 (um terço), restando fixada em 3 (três) anos de reclusão (STJ, Súmula n. 231).

Na terceira fase da dosimetria, não houve incidência de causas de aumento de pena. O Juízo a quo considerou que a participação de Érika Cristina seria de importância menor que a dos corréus, razão pela qual aplicou a causa de diminuição do art. 29, § 1º, do Código Penal, com redução da pena em 1/6 (um sexto).

A pena definitiva foi fixada em 2 (dois) anos, 6 (seis) meses de reclusão e 8 (oito) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo.

Em sede recursal, postula o Ministério Público Federal a exasperação da pena-base de Érika Cristina (que teria participado desde o início das atividades ilícitas), o afastamento da atenuante da confissão e da causa de diminuição de pena do art. 29, § 1º, do Código Penal.

Érika Cristina interpôs apelação para manutenção da pena-base no mínimo legal e aplicação em 1/3 (um terço) da causa de diminuição de pena do art. 29, § 1º, do Código Penal.

Passo à análise da dosimetria da pena.

A culpabilidade e as circunstâncias do crime, para Alexandra Barbosa Camargo, integram o tipo penal. Conforme apontou o Juízo a quo, a ré não tinha poder de decisão no âmbito da organização criminosa e atuava de modo subordinado no exercício das tarefas que lhe competiam.

As consequências do crime são graves, uma vez que da organização criminosa resultou a efetiva prática de inúmeras práticas delitivas.

Nesses termos, reputo adequado majorar a pena-base em 1/6 (um sexto), fixando-a em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa.

Mantenho a incidência da atenuante da confissão, ainda que Érika Cristina tenha procurado afastar a sua responsabilidade ao argumento de que teria praticado a conduta delitiva a mando ou por receio de Gilson de Souza. Pelo que se infere dos precedentes do Superior Tribunal de Justiça, a atenuante da confissão (CP, art. 65, III, d) incide sempre que fundamentar a condenação do acusado, pouco relevando se extrajudicial ou parcial, mitigando-se ademais a sua espontaneidade (STJ, HC n. 154544, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 23.03.10; HC n. 151745, Rel. Min. Felix Fischer, j. 16.03.10; HC n. 126108, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 30.06.10; HC n. 146825, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 17.06.10; HC n. 154617, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 29.04.10; HC n. 164758, Rel. Min. Og Fernandes, j. 19.08.10). A oposição de excludente de culpabilidade não obsta o reconhecimento da atenuante da confissão espontânea (STJ, HC n. 283620, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 20.02.14; AgReg em REsp n. 1376126, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 04.02.14; Resp n. 1163090, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 01.03.11).

Reduzo a pena em 1/3 (um terço), conforme determinado pelo Juízo a quo. Tendo em vista que a incidência de circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal (STJ, Súmula n. 231), a pena resulta em 3 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Acolho a alegação do Ministério Público Federal e afasto a aplicação do disposto no art. 29, § 1º, do Código Penal. A circunstância de Érika Cristina não exercer papel de comando no âmbito da organização criminosa não permite afirmar a sua atuação como simples partícipe ou que não tenha colaborado de modo decisivo para o sucesso da organização criminosa.

A pena definitiva resta fixada em 3 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Concurso material. Em face do disposto no art. 69 do Código Penal, as penas totalizaram 4 (quatro) anos e 7 (sete) meses de reclusão e 18 (dezoito) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo.

Regime inicial semiaberto.

Para efeito do art. 387, §§ 1º e 2º, do Código Penal, anotou o Juízo a quo que Érika Cristina foi presa em 14.06.18 e posta em liberdade em 06.12.18 (fls. 1.466), tendo permanecido encarcerada cautelarmente por 5 (cinco) meses e 21 (vinte e um) dias. Feito o cálculo, “a pena se mantêm acima dos 4 anos, não sendo permitida a adoção do regime menos gravoso”. Não preenchidos os requisitos do art. 44, I, do Código Penal, o regime inicial é o semiaberto (CP, art. 33, § 2º, b) (Id n. 157677141, item 5.5).

Tendo em vista a nova dosimetria das penas em sede recursal, a aplicação do disposto no art. 69 do Código Penal resulta na pena total de 5 (cinco) anos, 6 (seis) meses e 22 (vinte e dois) dias-multa.

Mantenho o regime inicial semiaberto (CP, art. 33. § 2º, b).

Fábio Henrique Alberghini. CP, art. 312, caput. Na primeira fase da dosimetria, o Juízo a quo anotou que Fábio Henrique, motorista, foi denunciado em razão de sua prisão em flagrante com 1 (uma) carga de cigarros, razão pela qual a sua culpabilidade não deve ser considerada superior à dos corréus. Todavia, “o réu procurou passar ingenuidade e desconhecimento da ilicitude, mas a sua condição de motorista profissional e o fato de ter admitido já ter feito uma carga dessas antes, pesaram em seu desfavor. Quando considerado o dolo do acusado, também sua culpabilidade no caso presente deve ser um pouco acima do normal”. Fábio Henrique não tem antecedentes criminais. O crime de peculato pelo qual foi preso em flagrante está inserido no contexto dos vários peculatos cometidos pelo grupo. Os motivos do crime foram os normais. Não há elementos quanto à conduta social e personalidade do réu que justifiquem a elevação da pena. As circunstâncias do crime em relação a Fábio Henrique não se afastam das normais à espécie delitiva. As consequências foram mais graves que o normal, mas não tanto quanto os outros, dado que se trata de um ato. A vítima é o Estado, que não influenciou na prática do delito.

A pena-base foi majorada para 2 (anos) e 4 (quatro) meses de reclusão.

Na segunda fase da dosimetria, registrou o Juízo a quo a ausência de circunstâncias atenuantes e agravantes.

Inexistentes causas de aumento de pena. Reconhecida a participação de menor importância do réu (CP, art. 29, § 1º), com redução da pena em 1/6 (um sexto).

A pena restou definitivamente fixada em 2 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo.

Regime inicial aberto.

Registrou o Juízo a quo, para os fins do art. 387, §§ 1º e 2º do Código Penal, que Fábio Henrique foi preso em 11.09.17 e posto em liberdade em 05.12.17, o que não influencia no regime de pena.

A pena privativa de liberdade foi substituída por 2 (duas) restritivas de direitos consistentes em prestação pecuniária de 1 (um) salário mínimo e prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas (157677141, item 5.7).

O Ministério Público Federal não interpôs recurso em face da dosimetria da pena.

Fábio Henrique Alberghini, em apelação, afirma que a pena deve ser fixada no mínimo legal, computando-se na detração penal o tempo em que permaneceu em prisão preventiva e submetido a medidas cautelares diversas da prisão.

Passo à análise da insurgência da defesa em relação à dosimetria da pena.

Na primeira fase da dosimetria, considero que a culpabilidade de Fábio Henrique integra o tipo penal. O fato de ter procurado demonstrar ingenuidade e desconhecimento da ilicitude de sua conduta, assim como ter mencionado anterior transporte de mercadorias, não são suficientes para afirmar maior grau de consciência da ilicitude.

O réu não tem antecedentes criminais, inexistindo elementos concretos nos autos que permitam concluir sobre a sua personalidade e conduta social.

A expressiva quantidade de cigarros transportada (10.000 pacotes de cigarros) indica a maior gravidade das consequências do crime.

No que diz respeito à valoração das circunstâncias judiciais, cumpre ressaltar que não resulta de simples cálculos matemáticos e da aplicação de frações pré-determinadas. Nesses termos, reputo adequado manter a majoração da pena-base em 1/6 (um sexto), por considerá-la proporcional à conduta praticada pelo réu e às consequências do crime.

Portanto, mantenho a pena-base em 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa.

Na segunda fase da dosimetria, não incidem circunstâncias agravantes ou atenuantes.

Na terceira fase da dosimetria da pena, à míngua de impugnação do Ministério Público Federal, incide a causa de diminuição de pena do art. 29, § 1º, do Código Penal. Reduzo a pena em 1/6 (um sexto), a resultar na pena definitiva de 1 (um) ano, 11 (onze) meses de reclusão e 9 (nove) dias-multa.

Regime inicial aberto, com substituição da pena privativa de liberdade por 2 (duas) restritivas de direitos consistentes em prestação pecuniária de 1 (um) salário mínimo e prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas.

Conforme registrou o Juízo a quo, o tempo de prisão provisória do réu não resulta em alteração do regime inicial de cumprimento de pena. A detração prevista no § 2º do art. 387 do Código de Processo Penal é inaplicável para as medidas cautelares diversas da prisão (STJ, AgRg no HC n. 494.693, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 11.02.20).

Naiara de Almeida Santos. Inicialmente o Juízo a quo ressaltou que Naiara é colaboradora nos termos da Lei 12.850/2013 e que a acusação requereu, nos termos do art. 4º da Lei n. 12.850/2013, a redução da pena pela metade.

CP, art. 312, caput. Na primeira fase da dosimetria, a culpabilidade de Naiara supera o normal para o tipo. A ré “começou no esquema por volta de abril de 2017, quando foi promovida a auxiliar de fiel e a trabalhador diretamente no depósito; era empregada formal da AGL; confessou. Ajudou a desviar cigarros contrabandeados apreendidos. A ré não possui antecedentes devidamente informados nos autos; o crime de peculato pelo qual foi presa em flagrante está inserido no contexto dos vários peculatos cometidos pelo grupo. Os motivos do crime foram os normais. Não há elementos quanto à conduta social e personalidade da ré a justificar a elevação da pena. As circunstâncias em relação a ela não se afastam das normais à espécie delitiva. De acordo com as provas produzidas, atuou no grupo de modo evidente por menos tempo que outros, o que não afasta as consequências mais negativas que o normal, pois agiu em pelo menos sete carregamentos, correspondendo a valor significativo, sabendo-se que cada caminhão carregava 200 caixas de 50 pacotes cada uma”. A vítima é o Estado, que não influenciou na prática do defiro. Dado o referido contexto, a pena-base foi fixada acima do mínimo legal, em 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão.

Na segunda fase, não há circunstâncias agravantes. A confissão de Naiara, desde o momento da prisão, é circunstância atenuante, cabendo a redução de 1/3 (um terço), porém com observância à Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça. A pena foi fixada em 2 (dois) anos de reclusão.

Na terceira fase, o Juízo a quo aplicou a causa de aumento do art. 71 do Código Penal, “de acordo com o tempo de sua franca atuação, que é bem menor que o de outros e incluído o episódio de sua prisão”. Majorou a pena em 1/4 (um quarto), elevando-a para 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão. Em face do disposto no art. 29, § 1º, do Código Penal, reduziu a pena em 1/6 (um sexto). O papel de Naiara era de confiança - abria o armazém para as cargas ilícitas até fora do horário de expediente -, porém, era corriqueiro no esquema, sendo de menor importância se comparado com outros”. Estabeleceu a pena em 2 (dois) anos e 1 (um) mês de reclusão.

Aplicou a causa de diminuição especifica do art. 4º da Lei n. 12.850/13. Há pedido expresso da acusação de redução da pena em 1/2 (metade). Tendo em vista a análise prévia à dosimetria sobre a eficácia do acordo de colaboração premiada, o Juízo a quo diminuiu a pena em 1/2 (metade), para 1 (um) ano e 15 (quinze) dias de reclusão. Fixou a pena de multa em 5 (cinco) dias-multa, “valor proporcional à pena privativa de liberdade aplicada (artigos 49, caput, e 59, ambos do CP), e o dia-multa no valor de um trinta avos (1/30) do salário mínimo nacional em razão da situação econômica da ré”.

As partes não se insurgiram contra a dosimetria da pena.

Lei n. 12.850/13, art. 2º. Na primeira fase da dosimetria, anotou o Juízo a quo que a culpabilidade de Naiara supera o normal para o tipo, justificando a fixação da pena acima do mínimo, devido à própria dimensão do crime contra a Administração Pública. Salientou que a elevação da pena deve ocorrer de modo menos intenso que a de Gilson e José Luiz. A ré não possui antecedentes criminais. Nada há de relevante quanto aos motivos da prática do crime. Não há elementos quanto à conduta social e personalidade que possa desaboná-la. As circunstâncias foram as normais. As consequências de modo geral foram graves, devendo ser sopesado que a ré atuou por período de tempo menor que outros. Não houve colaboração da vítima, o Estado, para a prática do delito. Em razão do exposto, majorou a pena-base para 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão.

Na segunda fase da dosimetria, não há circunstância agravante. Incide a atenuante da confissão espontânea. Reduzida a pena em 1/3 (um terço), até o limite mínimo (STJ, Súmula n. 231), a pena restou fixada em 3 (três) anos de reclusão.

Na terceira fase da dosimetria, não incidem causas de aumento. Quanto ao concurso de pessoas, a participação da ré foi de menor importância que a de outros, incidindo a causa de diminuição do art. 29, § 1º, do Código Penal, com redução de 1/6 (um sexto). Pena provisória de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão. Presente a causa de diminuição do art. 42 Lei n. 12.850/13, conforme requerido pela acusação em alegações finais e segundo o acordado pelas partes. Em decorrência, diminuiu pela 1/2 (metade) a pena de Naiara, fixando-a definitivamente em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão. Multa de 4 (quatro) dias-multa, “valor proporcional à pena privativa de liberdade aplicada (artigos 49, caput, e 59, ambos do Código Penal) e dia-multa no valor de um trinta avos (1/30) do salário mínimo nacional”.

As partes não se insurgiram contra a dosimetria da pena.

Concurso material. Em face da aplicação do disposto no art. 69 do Código Penal, a soma das penas resultou em 2 (dois) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 9 (nove) dias-multa, no mínimo valor unitário legal.

Regime inicial aberto.

Para efeito do previsto no art. 387, §§ 1º e 2º, do Código de Processo Penal, anotou o Juízo a quo que Naiara foi presa em 11.09.17 e posta em liberdade em 11.10.17 (Autos n. 0005718-33.2017.403.6120), “tendo permanecido encarcerada cautelarmente por 1 (um) mês, o que não altera o regime inicial, que será o aberto, também por força do acordo de colaboração premiada”. Preenchidos os requisitos do art. 44 do Código Penal, a pena privativa de liberdade foi substituída por 2 (duas) penas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas e pagamento de prestação pecuniária de 1 (um) salário mínimo (Id n. 157677141, item 5.6).

Não houve insurgência das partes.

Valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração. CPP, art. 387, IV. Pedido expresso na denúncia. Exigibilidade. Ressalvado meu entendimento de que se trata de norma processual, que define a competência do juiz criminal para determinar um valor mínimo, o Superior Tribunal de Justiça entende que a fixação de valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, prevista no art. 387, IV, do Código de Processo Penal, com a redação da Lei n. 11.719/08, é norma de direito material, não tem efeitos retroativos e exige que a acusação deduza o pedido na denúncia a fim de garantir o contraditório e o devido processo legal:

 

PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO. FURTO QUALIFICADO. REPARAÇÃO DE DANOS. PEDIDO DE CONDENAÇÃO DO RÉU NÃO DEDUZIDO NA DENÚNCIA. OFENSA AO PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA. FLAGRANTE ILEGALIDADE EVIDENCIADA. WRIT NÃO CONHECIDO E ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. (...)

2. Nos termos da jurisprudência desta Corte, "este Superior Tribunal, em relação à fixação de valor mínimo de indenização a título de danos morais, nos termos do art. 387, IV, do Código de Processo Penal, entende que se faz indispensável o pedido expresso do ofendido ou do Ministério Público, este firmado ainda na denúncia, sob pena de violação ao princípio da ampla defesa". (AgRg no REsp 1.626.962/MS, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, DJe 16/12/2016).

3. Writ não conhecido e habeas corpus concedido, de ofício, tão somente para afastar a condenação à reparação dos danos causados ao ofendido, ficando mantido, no mais, o teor da sentença.

(STJ, HC n. 428.490, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 13.03.18)

 

RECURSO ESPECIAL (...). REPARAÇÃO DE DANOS À VÍTIMA. ART. 387, INCISO IV, CPP. PEDIDO EXPRESSO. NECESSIDADE. QUANTUM LÍQUIDO E CERTO. NÃO EXIGÊNCIA. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO (...).

3 - A aplicação do instituto disposto no art. 387, inciso IV, do CPP, referente à reparação de natureza cível, quando da prolação da sentença condenatória, requer a dedução de um pedido expresso do querelante ou do Ministério Público, em respeito às garantias do contraditório e da ampla defesa.

4 - Neste caso houve pedido expresso por parte do Ministério Público, na exordial acusatória, o que é suficiente para que o juiz sentenciante fixe o valor mínimo a título de reparação dos danos causados pela infração.

5 - Assim sendo, não há que se falar em iliquidez do pedido, pois o quantum há que ser avaliado e debatido ao longo do processo, não tendo o Parquet o dever de, na denúncia, apontar valor líquido e certo, o qual será devidamente fixado pelo Juiz sentenciante.

6 - Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido.

(STJ, REsp n. 1.265.707, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, j. 27.05.14)

 

AGRAVO REGIMENTAL (...). REPARAÇÃO CIVIL MÍNIMA. ART. 387, IV, DO CPP. PEDIDO DO OFENDIDO OU DO ÓRGÃO MINISTERIAL. LEGALIDADE. MINISTÉRIO PÚBLICO PLEITEOU A FIXAÇÃO DE VALOR PARA A REPARAÇÃO DO DANO NA DENÚNCIA.

POSSIBILIDADE. RESPEITADA A OPORTUNIDADE DE DEFESA AO RÉU. REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 83/STJ.

1. A mais significativa inovação legislativa introduzida pela Lei n. 11.719/2008, que alterou a redação do inciso IV do art. 387 do Código de Processo Penal, possibilitou que na sentença fosse fixado valor mínimo para a reparação dos prejuízos sofridos pelo ofendido em razão da infração, a contemplar, portanto, norma de direito material mais rigorosa ao réu.

2. Para que seja fixado na sentença o início da reparação civil, com base no art. 387, IV, do Código de Processo Penal, deve haver pedido expresso do ofendido ou do Ministério Público e ser possibilitado o contraditório ao réu, sob pena de violação do princípio da ampla defesa (...).

(STJ, AgRg no REsp n. 1.383.261, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 17.10.13)

 

PENAL E PROCESSO PENAL (...). OFENSA AO ART. 387, IV, DO CPP. FIXAÇÃO DO QUANTUM MÍNIMO PARA REPARAÇÃO DE DANOS À VÍTIMA. NECESSIDADE DE PEDIDO FORMAL DO PARQUET OU DO OFENDIDO. ACÓRDÃO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1 - Este Tribunal sufragou o entendimento de que deve haver pedido expresso e formal, feito pelo parquet ou pelo ofendido, para que seja fixado na sentença o valor mínimo de reparação dos danos causados à vítima, a fim de que seja oportunizado ao réu o contraditório e sob pena de violação ao princípio da ampla defesa.

2 - Agravo regimental a que se nega provimento.

(STJ, AgRg no AREsp n. 389.234, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 08.10.13)

 

Do caso dos autos. O Juízo a quo apontou a discrepância entre os valores atribuídos aos cigarros pela Receita Federal e pelo perito no laudo merceológico, concluindo pela necessidade de maiores discussões sobre o assunto, “inclusive pelo volume de informações nestes autos e para que a defesa possa efetivamente debater sobre o tema”. No que diz respeito ao valor mínimo para a reparação do dano (CPP, art. 387, IV), afirmou o Juízo a quo que deixaria de fixá-lo porque a Receita Federal tem meios próprios e eficazes para recuperar o prejuízo, com oportunidade de contraditório que evitará possível bis in idem ou excesso. Acrescentou que os cigarros desviados são de importação proibida e não poderiam ser comercializados, a corroborar a afirmação de controvérsia sobre os cálculos. Por fim, acrescentou o Juízo a quo que o Ministério Público Federal requereu o perdimento de bens, cujos valores devem ser considerados na recuperação de ativos.

Em apelação, o Ministério Público Federal sustenta que deve ser fixado o valor mínimo para a reparação dos danos causados pela infração. Ressalta que após auditoria ao Depósito de Materiais, a Receita Federal atribuiu valores aos cigarros desviados, os quais não devem ser afastados porque discrepantes do laudo merceológico.

Ocorre que não consta dos autos que o Ministério Público Federal tenha requerido, até a prolação da sentença conjunta, a reparação pelos danos causados pela infração em nenhuma das ações penais, de modo que descabida a sua fixação, nos termos do entendimento jurisprudencial acima referido.

Perdimento de bens. O Juízo a quo decretou o perdimento dos seguintes bens de José Luiz Alves Moreira:

 

7.4) Decreto o perdimento dos seguintes imóveis em favor da União, por se tratar de produto ou proveito da infração, cuja propriedade é atribuída a José Luiz. A listagem está em conformidade com relação de bens de fls. 1.881/1.898 deste processo e elementos constantes dos autos da representação criminal n. 0000340-62.2018.403.6120:

01 (um) imóvel de matrícula nº 12.452 - Unidade autônoma nº 1002, 10º andar, 13º pavimento do Edifício Clemente de Faria, situado na rua Rio Branco, 7-19, Bauru/SP, com área útil de 30,9825 m2, área comum 8,3653 m2, Rg-12.452 de 03.02.2017,22 CRI de Bauru/SP;

01 (um) imóvel do lote 8, da quadra G, do loteamento denominado jardim Ouro Verde, Baru/SP, rua Prof Isac Portal Roldan, 5-74, com 330m2, estando ainda registrado no nome dos loteadores Joaquim Araujo Souza e sua mulher Rosa Sardinha Araujo Souza. Neste terreno existe a edificação de um barracão ocupando quase a totalidade do lote, ainda não averbado na matrícula – 1º CRI de Imóveis de Bauru/SP;

10 % (dez por cento) do imóvel de matrícula nº 30.989, consistente em uma área de cerca de 3500 metros quadrados localizada na rua Gio Batta Forneti, 3-120, Bauru/SP, 1º CRI de Bauru/SP;

7.5) Decreto o perdimento dos seguintes veículos em favor da União, por se tratar de produto ou proveito da infração, cuja propriedade é atribuída a José Luiz. A listagem está em conformidade com relação de bens de fls. 1.881/1.898 deste processo e elementos constantes dos autos da representação criminal n. 0000340-62.2018.403.6120:

01 (um) veículo Dodge Journey R/T, placas AYY-5439;

01 (uma) motocicleta Honda CG150 FAN, placas AUP-7383;

01 (um) veículo VW Passat CC 3.6 FSI, placas BCC 7100;

01 (um) veículo Volvo VM 260 6X2R, placas ARV-1684;

01 (um) veículo Citroen C4 20GLXA5PF, placas EKT-5506;

01 (um) veículo REB/BOBY Terra Nova BT 13, placas EQX-7190;

01 (um) veículo Ford Royale 1.8 1 GL, placas CEG-6887;

01 (um) veículo Honda Preludes S, placas CAT-4321.

(...)

7.7) Decreto o perdimento em favor da União de imóvel e veículo pertencente a terceiro (Amanda Roberta de Oliveira, CPF 413.451-898-93), mas que na verdade são de propriedade de José Luiz:

01 (um) imóvel de matrícula nº 353 - Sítio Fujimoto - Fazenda Itaguapeva, bairro de Salto, zona rural Ibiuna/SP, 16 alqueires e 7.312 m2, ou 39,4 hectares, localizada na estrada velha da capela azul, R.66/353,18.04.2017, código do imóvel rural 637.033.010.634.8 - CRI de Ibiúna/SP;

01 (um) veículo Volkswagen Fusca 1300 L, placas AEI-5560 (Id n. 15767741)

 

Houve, ainda, decretação do perdimento de bens em poder de Érika Cristina (item 7.6 da sentença) e de veículo que estaria no nome de Daiane de Brito Ferreira, mas que pertence a Gilson de Souza (item 7.8 da sentença).

No que diz respeito à AGL Armazéns Gerais e Logística, foi decretado o perdimento de imóveis e veículos. Consignou o Juízo a quo que apesar de os imóveis estarem em nome de terceiros, “o esquema apontado pelo MPF de utilização por Gilson de pessoas conhecidas ou "laranjas" é bastante plausível, dado o vultoso volume financeiro movimentado em geral e o elevado número de transações com veículos e imóveis. Os imóveis foram adquiridos contemporaneamente ao período dos crimes” (item 7.9 da sentença). Foi decretado o perdimento de valores e bens de Capital Segurança e Vigilância Ltda., inclusive os apreendidos em poder de terceiro (Demontier Raimundo Ferreira) (itens 7.10 e 7.11 da sentença). Não foi decretado o perdimento de cotas do capital social de PLS Vigilância e Segurança Ltda. (CNPJ n. 18.133.588/0001-17 e n. 18.133.58810002-06), por não ser finalidade útil, em especial devido ao valor meramente escritural (item 7.14 da sentença).

Por fim, o Juízo a quo decretou o perdimento de 1 (uma) aeronave que estaria em nome de Elemar Giusue Frison, de 12 (doze) imóveis localizados em Curitiba (PR), Araraquara (SP), Piraquara (PR) e Bauru (SP), de 5 (cinco) veículos, além de valores de pequena monta, por ser nítida a propriedade de Gilson de Souza, ainda que em nome de terceiros (item 7.14 da sentença).

Em apelação, José Luiz Alves Moreira sustenta ser indevida decretação de perdimento de seus bens, pois não restou comprovada a aquisição por meios ilícitos. Os demais réus não se insurgiram contra a decretação de perdimento de bens.

O Ministério Público Federal requer a extensão do perdimento aos bens de Wida Indústria e Comércio de Embalagens Ltda., uma vez que as provas dos autos indicam que a empresa pertence de fato a Gilson de Souza, que após a prisão em flagrante dos corréus procurou afastar os seus bens de uma possível constrição judicial, a impor a conclusão de que os valores advindos da comercialização ilícita dos cigarros foram utilizados pela empresa (CP, art. 91, II)

Não merece reparo a decretação de perdimento de bens de José Luiz Alves Moreira.

Conforme apontou o Juízo a quo, as inúmeras diligências realizadas junto a Cartórios de Registro de Imóveis, interceptações telefônicas e quebra de sigilo bancário, demonstraram o expressivo patrimônio pertencente a José Luiz, sem comprovação da origem lícita dos recursos utilizados para a aquisição dos bens no período em que houve desvio de mercadorias do Depósito de Materiais.

No que diz respeito aos bens de Wida Indústria e Comércio de Embalagens Ltda., o Juízo a quo não decretou o perdimento dos seguintes bens: “R$ 530,66 (quinhentos e trinta reais e sessenta centavos) depositados no Banco Itaú, 1 (uma) máquina matriz de alça de marca HECE, 1 (um) variador eletromagnético 130T5, n. 87094076, marca Transitol, 1 (uma) máquina HECE w-1 1502, tipo CSLB, modelo SC700EC, 1 (uma) polimáquina modelo POCSuFE09, número de série 3453, 1 (uma) máquina HECE n. 1869, tipo CSFR, modelo SC5wFRII, 1 (uma) Magmar Ind. E Comércio de Máquinas, modelo EXAB50 nº 753, 1 (uma) impressora flexográfica n. 99, modelo solution 8, ano 2005, OF 49342005, apreendidos às fls. 631 (encontram-se na sede da empresa, em Curitiba - PR - termo de fiel depositário às fls. 271 da Ação Penal nº 0005309-57-20l7.403.612)”. (sentença, item 7.15).

Em que pese a alegação do Ministério Público Federal de que Wida Indústria e Comércio de Embalagens pertenceria de fato a Gilson de Souza, não há elementos suficientes nos autos à comprovação de que a empresa tenha sido constituída, em outubro de 2013, com recursos de atividades ilícitas. A circunstância de Gilson de Souza ter se retirado do contrato social após a prisão em flagrante dos corréus, assim como o fato de a empresa estar instalada no mesmo prédio em que funcionava o escritório de AGL Armazéns Gerais e Logística Ltda., não são suficientes à conclusão de que os maquinários da empresa tenham sido adquiridos com recursos ilícitos.

Portanto, mantenho o perdimento de bens nos termos em que decretado pelo Juízo a quo.

Em relação à empresa Wida, cumpre registrar que o Juízo a quo decretou o perdimento de “1 (um) veículo BIGFOOT preto, placas HRA-5688, apreendido às fls. 631 (encontra-se na sede da empresa, em Curitiba -PR - termo de fiel depositário às fls. 271 da Ação Penal nº 0005309- 57.2017.403.6120). Ponderou que se trata de veículo incomum, que não guarda relação lógica com a empresa Wida e o recibo de compra no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais) foi encontrado na residência de Demontier Raimundo Ferreira, amigo de Gilson de Souza, tudo indicando tratar-se de bem de Gilson adquirido com proveitos do crime (Id n. 15767142, itens 7.15 e 7.16).

Ante o exposto, REJEITO a preliminar de nulidade, NEGO PROVIMENTO às apelações criminais de José Luiz Alves Moreira, Sival Miranda dos Santos, Alexandra Barbosa Camargo, Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação criminal de Gilson de Gilson de Souza, apenas para afastar a agravante do art. art. 61, I, do Código Penal na dosimetria da pena do delito do art. 312 do Código Penal, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação de Fábio Henrique Alberghini, a fim de reduzir para 1 (um) ano, 11 (onze) meses de reclusão e 9 (nove) dias-multa, no mínimo valor unitário legal, a pena que lhe foi aplicada pela prática do delito do art. 312 do Código Penal e DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação do Ministério Público Federal para majorar a pena aplicada a Gilson de Souza pela prática do delito do art. 312 do Código Penal e do art. 2º da Lei n. 12.850/13 para 10 (dez) anos, 10 (dez) meses e 42 (quarenta e dois) dias-multa, no valor unitário de 1/3 (um terço) do salário mínimo, para majorar a pena aplicada a José Luiz Alves Moreira pela prática do delito do art. 312 do Código Penal e do art. 2º da Lei n. 12.850/13 para 6 (seis) anos, 4 (quatro) meses de reclusão e 25 (vinte e oito) dias-multa, no valor unitário de 1/6 (um sexto) dos salário mínimo, para majorar a pela aplicada a Sival Miranda dos Santos pela prática do delito do art. 312 do Código Penal e do art. 2º da Lei n. 12.850/13 para 6 (seis) anos de reclusão e 25 (vinte e cinco) dias-multa, no mínimo valor unitário legal, para majorar a pena aplicada a Alexandra Barbosa Camargo pela prática do delito do art. 312 do Código Penal e do art. 2º da Lei n. 12.850/13 para 5 (cinco) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 20 (vinte) dias-multa e para majorar a pena aplicada a Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira pela prática do delito do art. 312 do Código Penal e do art. 2º da Lei n. 12.850/13 para 5 (cinco) anos, 6 (seis) meses e 22 (vinte e dois) dias-multa, no mínimo valor unitário legal. Mantidos os demais termos da sentença.

É o voto.

 


E M E N T A

PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO PENAL. CRIMES DOS ARTS. 312, C.C. 327, § 1º, DO CP E 2º DA LEI 12.850/2013. PRELIMINAR DE NULIDADE AFASTADA. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONTRADAS. DESVIO DE CIGARROS CONTRABANDEADOS. EMPRESA CONTRATADA PELA RECEITA FEDERAL PARA DAR DESTINAÇÃO AOS PRODUTOS ILÍCITOS. PECULATO DESVIO POR EQUIPARAÇÃO. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA CONFIGURADA. ESTRUTURA ORDENADA E DIVISÃO DE TAREFAS. ABSOLVIÇÃO DO CORRÉU CONTRATADO COMO MOTORISTA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO DOLO. DOSIMETRIA DA PENA. REDUÇÃO DAS PENAS-BASE. AFASTADA AGRAVANTE DO ART. 61, I, DO CP. CONTINUIDADE DELITIVA. CONCURSO MATERIAL. REGIME SEMIABERTO APÓS A DETRAÇÃO. PARCIAL PROVIMENTO DOS RECURSOS.

1. Verifica-se dos autos que a tipificação no crime de peculato por equiparação se deu em razão do réu Gilson ser proprietário da empresa AGL Armazéns Gerais e Logística, que fora contratada pela Receita Federal para administrar o Depósito de Materiais da Delegacia de Receita Federal de Araraquara/SP, enquanto os demais réus eram empregados ou prestavam serviços para a empresa de Gilson.

2. O "peculato-desvio" (artigo 312, caput, 2ª parte, do Código Penal) ocorre quando o agente emprega o bem em fim diverso daquele a que era destinado, se aperfeiçoando com a mudança de direção, alteração do destino ou aplicação, deslocamento de dinheiro, valor ou bem, em proveito próprio ou alheio. Desta feita, a partir do momento que a ordem de dentro da empresa era o desvio dos cigarros contrabandeados que estavam no depósito da Receita Federal e seriam objeto de destruição, está configurado o crime de peculato na modalidade desvio.

3. A equiparação a servidor público se dá em razão dos réus estarem prestando serviço típico de uma instituição pública e, em razão dessa condição, darem destinação diversa à mercadoria da que foi acordada.

4. Da mesma forma, mostra-se acertada a tipificação no crime do artigo 2º da Lei 12.850/2013, não se vislumbrado a desclassificação para o crime do artigo 288 do CP, porquanto restaram amplamente demonstradas a estrutura ordenada e a organização de tarefas entre os integrantes, estando bem delimitada a função de cada integrante dentro do esquema criminoso.

5. Observa-se que restaram demonstradas a materialidade e autoria dos crimes por parte dos réus.

6. Entretanto, em relação ao motorista não há nos autos elementos suficientes acerca de seu envolvimento na prática delitiva. Ao que parece, o réu foi apenas contratado por duas vezes para realizar o transporte das mercadorias, não fazendo parte da empresa.

7. Não se observa nos interrogatórios do corréus e nas conversas interceptadas indicativos de que o motorista tinha conhecimento da prática delitiva, estando a condenação baseada no fato de que a retirada da mercadoria se deu em horário incomum, sem qualquer documento de saída e com entrega em um posto de serviços em São Paulo. Ademais, não incorreu em nenhuma elementar do tipo penal, pois não tinha a intenção de desviar a mercadoria, mas sim transportá-la até o local indicado na contratação, não recebendo nada além pela mercadoria desviada, como os demais réus.

8. Dosimetria. Redução das penas-base. Na segunda fase, correto o entendimento de afastar a agravante do art. 61, inciso I, do Código Penal, uma vez que já foi considerada na fase anterior a circunstância de ser "dirigente das atividades". Continuidade delitiva reconhecida. Reconhecimento da participação de menor importância para uma das rés.

9. Regime semiaberto.

10. Preliminar rejeitada e parcial provimento dos recursos.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, Prosseguindo o julgamento, após o voto-vista do Des. Fed. Paulo Fontes, a Quinta Turma, por unanimidade, decidiu rejeitar a preliminar de nulidade e, no mérito, dar parcial provimento ao recurso de Gilson de Souza para afastar a agravante do artigo 61, inciso I, do Código Penal para o crime do artigo 312 do CP, e, por maioria, reduzir as penas-base e fixar regime inicial semiaberto após a detração para Gilson de Souza; por maioria, dar parcial provimento aos recursos de José Luiz Alves Moreira, Sival Miranda dos Santos, Alexandra Barbosa Camargo, Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira, para reduzir as penas-base; dar provimento ao recurso de Fábio Henrique Alberghini, para absolvê-lo do crime do art. 312 do CP; dar parcial provimento, em menor extensão, ao recurso da acusação, tão somente para afastar o reconhecimento da incidência do artigo 29, § 1º, do CP; e, por fim, reduzir a pena-base do crime do artigo 2º da Lei 12.850/2013 para a ré Naiara de Almeida Santos. As penas restam fixadas da seguinte forma: a) Para Gilson de Souza (Autos n. 0005309- 57.2017.4.03.6120) fica estabelecida a pena total de 08 (oito) anos e 07 (sete) meses de reclusão e 37 (trinta e sete) dias-multa, no valor unitário de 1/15 (um quinze avos) do salário mínimo. Fixado o regime semiaberto após a detração do art. 387, § 2º, do CPP; b) Para José Luiz Alves Moreira (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120) fica estabelecida a pena total de 06 (seis) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 25 (vinte e cinco) dias-multa, no valor unitário de 1/25 (um vinte e cinco avos) do salário mínimo; c) Para Sival Miranda dos Santos (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120 e n. 0005556-38.2017.4.03.6120) fica estabelecida a pena total de 06 (seis) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 25 (vinte e cinco) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo; d) Para Alexandra Barbosa Camargo (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120 e n. 0005556-38.2017.4.03.6120) fica estabelecida a pena total de 05 (cinco) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 20 (vinte) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo; e) Para Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120) fica estabelecida a pena total de 05 (cinco) anos e 06 (seis) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 22 (vinte e dois) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo; f) Para Naiara de Almeida Santos (Autos n. 0005309-57.2017.4.03.6120 e n. 0005556-38.2017.4.03.6120) fica estabelecida a pena total de 02 (dois) anos, 03 (três) meses e 15 (dias) de reclusão, em regime inicial aberto, e 09 (nove) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo. Substituída a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e em prestação pecuniária de 01 (um) salário mínimo, nos termos do voto do Des. Fed. Paulo Fontes, acompanhado pela Juíza Federal Louise Filgueiras, vencido o Relator Des. Fed. André Nekatschalow que NEGAVA PROVIMENTO às apelações criminais de José Luiz Alves Moreira, Sival Miranda dos Santos, Alexandra Barbosa Camargo, Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira, DAVA PARCIAL PROVIMENTO à apelação de Fábio Henrique Alberghini, a fim de reduzir para 1 (um) ano, 11 (onze) meses de reclusão e 9 (nove) dias-multa, no mínimo valor unitário legal, a pena que lhe foi aplicada pela prática do delito do art. 312 do Código Penal e DAVA PARCIAL PROVIMENTO à apelação do Ministério Público Federal para majorar a pena aplicada a Gilson de Souza pela prática do delito do art. 312 do Código Penal e do art. 2º da Lei n. 12.850/13 para 10 (dez) anos, 10 (dez) meses e 42 (quarenta e dois) dias-multa, no valor unitário de 1/3 (um terço) do salário mínimo, para majorar a pena aplicada a José Luiz Alves Moreira pela prática do delito do art. 312 do Código Penal e do art. 2º da Lei n. 12.850/13 para 6 (seis) anos, 4 (quatro) meses de reclusão e 25 (vinte e oito) dias-multa, no valor unitário de 1/6 (um sexto) dos salário mínimo, para majorar a pena aplicada a Sival Miranda dos Santos pela prática do delito do art. 312 do Código Penal e do art. 2º da Lei n. 12.850/13 para 6 (seis) anos de reclusão e 25 (vinte e cinco) dias-multa, no mínimo valor unitário legal, para majorar a pena aplicada a Alexandra Barbosa Camargo pela prática do delito do art. 312 do Código Penal e do art. 2º da Lei n. 12.850/13 para 5 (cinco) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 20 (vinte) dias-multa e para majorar a pena aplicada a Érika Cristina de Oliveira Alves Moreira pela prática do delito do art. 312 do Código Penal e do art. 2º da Lei n. 12.850/13 para 5 (cinco) anos, 6 (seis) meses e 22 (vinte e dois) dias-multa, no mínimo valor unitário legal e mantinha os demais termos da sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.