APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0042250-24.1998.4.03.6103
RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY
APELANTE: JAIRO PACIORNIK COSLOVSKY, EDISON REY SILVEIRA, ANA PAULA DE VASCONCELOS PADRAO, FABIO WAJNGARTEN, SOPHIE CARELLI WAJNGARTEN, VERA LUCIA FIGUEIREDO MARQUES RICARDO, LUIZ CARLOS MARQUES RICARDO, ALEXANDRE MARQUES RICARDO, MICHELE SLONGO MARQUES RICARDO
Advogados do(a) APELANTE: FABIANO DIAS DE MENEZES - SP216362-A, LUIS FELIPE STOCKLER - SP142058-A
Advogado do(a) APELANTE: FABIANO DIAS DE MENEZES - SP216362-A
APELADO: UNIÃO FEDERAL, ESTADO DE SAO PAULO, MUNICIPIO DE SAO SEBASTIAO
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0042250-24.1998.4.03.6103 RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY APELANTE: JAIRO PACIORNIK COSLOVSKY, EDISON REY SILVEIRA, ANA PAULA DE VASCONCELOS PADRAO, FABIO WAJNGARTEN, SOPHIE CARELLI WAJNGARTEN, VERA LUCIA FIGUEIREDO MARQUES RICARDO, LUIZ CARLOS MARQUES RICARDO, ALEXANDRE MARQUES RICARDO, MICHELE SLONGO MARQUES RICARDO Advogados do(a) APELANTE: FABIANO DIAS DE MENEZES - SP216362-A, LUIS FELIPE STOCKLER - SP142058-A APELADO: UNIÃO FEDERAL, ESTADO DE SAO PAULO, MUNICIPIO DE SAO SEBASTIAO R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação interposta por JAIRO PACIORNIK COSLOVSKY, EDISON REY SILVEIRA, ANA PAULA DE VASCONCELOS PADRÃO, FABIO WAJNGARTEN, SOPHIE CARELLI WAJNGARTEN, VERA LUCIA FIGUEIREDO MARQUES RICARDO, LUIZ CARLOS MARQUES RICARDO, ALEXANDRE MARQUES RICARDO e MICHELE SLONGO MARQUES RICARDO em face da sentença que rejeitou o pedido de declaração do domínio sobre o imóvel situado na Avenida Dr. Francisco Loup, 1.957, Distrito de Maresias, São Sebastião-SP, formulado contra UNIÃO FEDERAL e MUNICÍPIO DE SÃO SEBASTIÃO, bem como os condenou ao pagamento de honorários no importe de 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa (ID 167902496). Alegam, em suma, que o julgado não observou que a sentença proferida na ação discriminatória n. 0000001-13.1939.8.26.0587, que declarou a área onde o imóvel usucapiendo se insere como devoluta, reservou o direito dos particulares à justificação da posse a qualquer tempo. Afirmam que a sua posse, mansa e pacífica, somada à de seus antecessores, já dura mais de cem anos, e os requisitos para a usucapião estão presentes desde antes da vigência do Decreto-Lei Estadual 14.916/1945. Sustentam que o município permaneceu inerte na regularização da área e praticou diversos atos contraditórios ao longo dos anos, tais como a cobrança de tributos e a aprovação de projeto residencial, o que evidencia a renúncia à afetação pública do bem e a aceitação da prescrição aquisitiva. No mais, aduzem que os honorários arbitrados são excessivos, pois o réu se manifestou nos autos apenas uma vez. Ao final, postulam: a) a reforma da sentença para acolher o pedido inicial; ou b) a fixação dos honorários proporcionalmente ao trabalho realizado pela parte apelada (ID 167902500). Contrarrazões do Município (ID 167902517). Parecer do Ministério Público Federal pela não intervenção no caso (ID 220803027). Convertido o julgamento em diligência “para colher manifestação das partes sobre a legislação municipal superveniente, informando de maneira objetiva se remanesce interesse recursal no julgamento da lide ante a nova possibilidade de se entabular acordos envolvendo as terras devolutas municipais” (ID 252148271), somente os apelantes se manifestaram (ID 253373635 e ID 272683517). É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0042250-24.1998.4.03.6103 RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY APELANTE: JAIRO PACIORNIK COSLOVSKY, EDISON REY SILVEIRA, ANA PAULA DE VASCONCELOS PADRAO, FABIO WAJNGARTEN, SOPHIE CARELLI WAJNGARTEN, VERA LUCIA FIGUEIREDO MARQUES RICARDO, LUIZ CARLOS MARQUES RICARDO, ALEXANDRE MARQUES RICARDO, MICHELE SLONGO MARQUES RICARDO Advogados do(a) APELANTE: FABIANO DIAS DE MENEZES - SP216362-A, LUIS FELIPE STOCKLER - SP142058-A APELADO: UNIÃO FEDERAL, ESTADO DE SAO PAULO, MUNICIPIO DE SAO SEBASTIAO V O T O Cinge-se a controvérsia, essencialmente, quanto à prescritibilidade do imóvel retro mencionado, em razão de estar inserido na área descrita na matrícula n. 46.682 do CRI de São Sebastião (ID 167902327), de titularidade daquele Município. Segundo se depreende dos autos, referida área (denominada “Gleba 6A”), integra o 2º Perímetro de Terras Devolutas Estaduais de São Sebastião, objeto de ação discriminatória ajuizada em 1939 pelo Estado de São Paulo (autos n. 0000001-13.1939.8.26.0587) e sentenciada em 10/04/1944, nos seguintes termos (f. 66-79, ID 167902310): JULGO procedente, em parte, a presente ação para reconhecer, como reconheço, nos termos do pedido da Autora, devolutas as terras compreendidas no perímetro discriminando, com exclusão das áreas havidas como do domínio particular. Ficam os interessados, cujos direitos foram reconhecidos, sujeitos à fase demarcatória para verem localizadas, extremadas e medidas suas terras dentro da força dos respectivos títulos e, outrossim (sic), ressalvo a todos os demais ocupantes a justificação de posse, nos termos da lei. Custas e despezas (sic) judiciais, em proporção, pelos vencidos. Publique-se na audiência designada, para os fins de direito. Datilografei. A fase demarcatória prevista na sentença se encerrou apenas em 2015, conforme relatado pelo Oficial de Registro de Imóveis de São Sebastião ao juízo (ID 167902312, f. 48-49). Nesse período, foi editado o Decreto-Lei Complementar n. 9/1969 de São Paulo, pelo qual foram transferidas ao patrimônio municipal as terras devolutas localizadas dentro do raio de oito quilômetros do ponto central da sede do Município e seis quilômetros contados do ponto central dos distritos (art. 60, parágrafo único). Por encontrar-se dentro do círculo distrital de Maresias, como informado nos autos pela Fazenda Estadual (f. 181-182, ID 167902310), a área foi atribuída ao Município de São Sebastião. Após expedida e aditada a carta da sentença discriminatória em 2016, esta foi prenotada naquele CRI em 31/10/2018, assim como a convenção administrativa celebrada entre os entes estadual e municipal em 05/07/2018, que definiu a titularidade deste sobre a área designada como “Gleba 6A” e matriculada sob o n. 46.682. Considerando a inequívoca (e incontroversa) sobreposição do imóvel usucapiendo com área devoluta municipal devidamente discriminada e registrada, o magistrado sentenciante concluiu pela impossibilidade de declaração da usucapião, por tratar-se de imóvel público imprescritível, nos termos dos arts. 183, § 3º[1], e 191, parágrafo único[2], da Constituição Federal de 1988; dos arts. 102[3], do Código Civil de 2002, e 67[4], do Código Civil de 1916; e da Súmula 340[5] do STF (ID 167902496). Contra a sentença os apelantes sustentam, essencialmente, a possibilidade de justificação da posse e reconhecimento do domínio ante a ressalva expressa na sentença discriminatória; o exercício da posse em caráter particular por seus antecessores há mais de cem anos, antes da vigência do Código Civil de 1916 e do Decreto-Lei n. 14.916/1945 do Estado de São Paulo; e o comportamento contraditório do Município de São Sebastião ao tributar e aprovar projetos de construção, admitindo o domínio particular sobre bem que agora pretende reconhecer como público, assim como a sua inércia em regularizar a área em mais de oito décadas desde aquela sentença. Tenho, porém, que os argumentos deduzidos na apelação não são aptos a infirmar a conclusão alcançada na sentença recorrida. E isso porque, inicialmente, a cadeia possessória evidenciada nos autos remonta ao ano de 1953, e não 1856, como arguido pelos autores. Veja-se – e aqui não se considera as cessões ocorridas no curso da ação –, do título mais recente até o mais antigo: – Escritura de cessão de direitos possessórios outorgada por Tenda Empreendimentos Imobiliários LTDA. a José Ricardo Franco Montoro, Carlos Cesar Rios, Thais Figueiredo Magalhães Rios, Sérgio Machado Assumpção, Maria Isabel de Souza Aranha Melaragno, David Coury Neto, Douglas Coury e Maria Aparecida Coury, autores originários desta demanda, em 11/06/1990, referente a “dois terrenos, ambos de frente para a Estrada de Rodagem SP-55, que liga São Sebastião e Bertioga, nesta escritura designados com ÁREA I e ÁREA II, situados no Bairro de MARESIAS, distrito do mesmo nome (...) encerrando a área total de 4.648,84 m² (quatro mil, seiscentos e quarenta e oito metros e oitenta e quatro decímetros quadrados) (...)” (ID 167902309, f. 24-32). – Escritura de cessão e transferência de direitos possessórios outorgada por Konrad Ernest Bongertz e Paula Maria Bongertz a Tenda Empreendimentos Imobiliários LTDA., em 10/10/1986, referente a “terreno situado no Bairro de Maresias, distrito do mesmo nome, deste município e comarca de São Sebastião, Estado de São Paulo, medindo de frente para terrenos de Marinha 24,00 metros, com igual medida de frente na linha de fundos, por 100,00 metros mais ou menos (...), fechando a área de 2.400,00 metros quadrados (...)” (f. 35-37). – Escritura de cessão de direitos hereditários e possessórios outorgada por Alexandre Birmoser, Edla Birmoser, Felix Jean José Van Deursen e Karin Mary Elizabeth Von Thiesenhousen Van Deursen a Konrad Ernes Bongertz e Paula Maria Bongertz, em 30/08/1974, referente ao imóvel retro (f. 58-60). – Escritura de cessão de direitos hereditários e possessórios outorgada por Maria Catarina dos Santos, Benedita dos Santos Pereira, Epaminondas Constantino dos Santos, Maria Francisca dos Santos, Julia Santos Pires, Agostinho Pires, Celina dos Santos Reclusa, João Reclusa, Malvina dos Santos Bueno, Benedito Ferreira Bueno, Tereza da Silva Souza e Antonio Evangelista de Souza a Alexandre Birmoser e Felix Jean José Van Deursen, em 28/10/1969, referente ao imóvel retro indicado (f. 61-63). – Escritura de cessão e transferência de direitos possessórios outorgada por Lupércio Marques de Assis e Haydee Ferreira de Assis a Tenda Empreendimentos Imobiliários LTDA., em 09/10/1986, referente a um terreno de “de frente para a Estrada SP-55, que liga Bertioga à São Sebastião, Atual Avenida Francisco Loup (...), fechando a área de 2.016 metros quadrados (...)” (f. 33-34). – Escritura de promessa de cessão e transferência de posse outorgada por Leda Amaral Pereira de Magalhães, Marcelo Ernesto Pereira de Magalhães, Vera Helena Ferreira de Magalhães Leal, Ruy Leal, Maria Luiz Pereira de Magalhães Nigro, Norberto Nigro, Sergio Paulo Pereira de Magalhães, Maria Carmen Pereira de Magalhães, Fabio Luiz Pereira de Magalhães, Flávia Maria Calabi Pereira de Magalhães, Eduardo Carlos Pereira de Magalhães e Déa Maneo Pereira de Magalhães a Lupércio Marques de Assis, Eduardo Carlos Pereira Magalhães e Lázara Carpinelli Amaral, em 19/06/1973, referente aos direitos herdados de Eduardo Pereira Magalhães sobre o imóvel descrito como “20% da Praia de Maresias (...), medindo dito imóvel 330 alqueires ou seja 798,60 hectares (...)” (f. 48-52). – Escritura de cessão e transferência de posse outorgada por Ismael Ignácio de Moura Negrini e Maria do Rosário da Costa Aguiar Negrini a Eduardo Pereira de Magalhães, Antonio Pereira de Magalhães, Haroldo de Siqueira, Nilo Andrade Amaral e Celso Fortes do Amaral, de 24/09/1953, referente ao imóvel retro (f. 54-57). Embora o título supra indique que Ismael e Maria do Rosário Negrini teriam adquirido a posse sobre o imóvel de seu dono originário, conforme descrito no Registro Paroquial 267, f. 74, Livro 140, do Registro de Terras da Paróquia de São Sebastião existente na 1ª Seção do Departamento do Arquivo do Estado de São Paulo, em 20/05/1856, referido registro não veio aos autos, nem há informação de quem seria tal dono e a que título a posse teria sido transferida. Os documentos de ID 167902331, certidões de registros paroquiais que comprovariam a posse particular sobre a área desde 1856, não se referem ao título originário expressamente indicado na cadeia possessória, mas sim aos Registros Paroquiais n. 32, f. 10v-11, de 22/04/1856, e 206, f. 58v-60, de 15/05/1856, sem que nada evidencie, no seu teor, que possui qualquer relação com as terras em discussão ou com alguma das pessoas que antecederam os autores. Considerando como termo inicial da posse a data do instrumento mais antigo nos autos (1953), quando a área já havia sido reconhecida como devoluta há nove anos (a sentença é de 1944), e que a natureza pública do imóvel constou expressamente da cessão de direitos celebrada entre os Negrini e Eduardo Pereira de Magalhães (f. 55, ID 167902309), é de se considerar que, desde o início, era de conhecimento dos ocupantes que eventual aquisição do domínio dependeria da justificação da posse nos termos da sentença discriminatória, ou de sua regularização na forma prevista pelo ente público titular das terras devolutas. E, quanto à primeira hipótese, tem-se que, no julgamento da ação discriminatória, à luz da Lei n. 601/1850 (Lei de Terras) e o Decreto Estadual n. 6.473/1934, foram reconhecidas como terras do domínio particular as adquiridas por título legítimo até 02/08/1878 e as apossadas por tempo não inferior a 30 anos antes da promulgação do Código Civil 1916 – art. 2º, “a” e “c”, do Decreto –, conforme fundamentação desenvolvida às f. 69-70 (ID 167902310). As posses particulares consideradas legítimas na sentença o foram por cumprir os requisitos das normas supra, portanto, são anteriores à ação discriminatória de 1939. E, não constando do feito título dominial anterior a 1953 com relação à área dos autores, não há como reputá-la particular nos termos da legislação citada. A sentença ainda reconheceu o direito dos demais ocupantes das terras declaradas devolutas à justificação da posse nos termos da lei. Quanto a isso, após a prolação da sentença, foi editado o Decreto-Lei Estadual n. 14.916/1945, que revogou o Decreto n. 6.473/1934 e assim dispôs sobre as terras devolutas e particulares no Estado: Artigo 1.º - São terras devolutas as que passaram para o domínio patrimonial do Estado na conformidade do art. 64 da Constituição Federal de 24 de fevereiro de 1891 e não se incorporaram ao domínio particular em nenhum dos casos do artigo seguinte. Artigo 2.º - O Estado reconhece e declara como terras do domínio particular, independentemente de legitimação ou revalidação: a) as adquiridas de acordo com a lei n. 601, de 18 de setembro de 1850, decreto n. 1.318, de 30 de janeiro de 1854 e outras leis, decretos e concessões de caráter federal; b) as alienadas, concedidas ou como tais reconhecidas pelo Estado; c) as assim declaradas por sentença judicial com força da cousa julgada; d) as que na data em que entrar em vigor este decreto-lei se acharem em posse continua a incontestada, com justo título e boa-fé, por termo não menor de vinte anos; e) as que na data em que entrar em vigor este decreto-lei acharem em posse pacífica e ininterrupta por trinta anos, independente de justo título e boa-fé. f) as tuteladas por sentença declaratória, nos termos do art. 148 da Constituição Federal de 10 de novembro de 1937. Parágrafo único - A posse a que o Estado condiciona sua liberalidade não pode constituir latifúndio e depende do efetivo aproveitamento e morada do possuidor ou de quem o represente. No caso, os apelantes sustentam ter cumprido o lapso temporal previsto nas alíneas “d” e “e” a, portanto, o imóvel usucapiendo seria de domínio particular. Contudo, para que assim fosse, seria necessária a demonstração da posse ao menos desde 06/08/1925 (vinte anos antes do decreto-lei – alínea “d”) – o que, como já dito, não se comprovou. E, não preenchidos os requisitos legais, a área ocupada pelos autores não é protegida pelas ressalvas constantes da sentença. Havendo ocupação particular sobre terras públicas discriminadas e registradas, é juridicamente impossível a aquisição do domínio pela prescrição, por expressa vedação constitucional e legal, constante dos dispositivos retro transcritos. Nesse sentido, vale citar os seguintes julgados do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que já se debruçou por diversas vezes sobre ações de usucapião de áreas abrangidas pela ação discriminatória n. 0000001-13.1939.8.26.0587: AÇÃO DE USUCAPIÃO – Terreno integrante do 2º perímetro de São Sebastião, reconhecido como terra devoluta por meio da ação discriminatória nº 01/39 (proc. No. 0000001-13.1939.8.26.0587) – Inviabilidade de usucapião de bem público - Apelante que alega ter posse do imóvel, somado o tempo com o dos antecessores, há mais de 100 anos - Ausência de demonstração do preenchimento do requisito temporal – Acessio possessionis condicionado à continuidade da posse – Ausência de demonstração do exercício da posse pelos antecessores da autora por 30 anos até a entrada em vigor do Decreto-Lei Estadual nº 14.916/45 – Recurso desprovido. (AC n. 1001667-28.2019.8.26.0587, Rel. Des. Marcus Vinicius Rios Gonçalves, 6ª Câmara de Direito Privado, j. 17/07/2020) USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO. Insurgência da empresa autora contra sentença de improcedência. Manutenção. Bem público não é suscetível de prescrição aquisitiva. Artigos 183, § 3º, da CF. Ausência de demonstração, por prova suficientemente segura, da existência de posse desde 1856. Registro paroquial que não se presta a conceder direitos possessórios. Mera declaração unilateral. Precedentes. Existência, ademais, de sentença declaratória e demarcatória da região como terra devoluta, já transitada em julgado. Recurso não provido. (APL 1002666-54.2014.8.26.0587, Rel. Des. Carlos Alberto de Salles, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 09/10/2018) USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA – Cerceamento de Defesa – Inexistência - Bem público - Imóvel usucapiendo inserido no 2º Perímetro de São Sebastião, reconhecido como área devoluta, em ação discriminatória (processo n. 0000001.13.1939.8.26.0587), que tramitou pela Comarca de São Sebastião por décadas, não se cuidando de mera presunção de ser terra devoluta por não estar registrado o imóvel - A imprescritibilidade de bens públicos é matéria de ordem pública, podendo ser conhecida de ofício, inexistindo preclusão pela não impugnação oportuna pelo Poder Público no prazo da contestação – Não são passíveis de usucapião os bens públicos – Inexistência de prova de que o imóvel em discussão insere-se em área de domínio privado - Improcedência da ação - Recurso desprovido. (AC 1000572-02.2015.8.26.0587, Rel. Des. Alcides Leopoldo, 4ª Câmara de Direito Privado, j. 25/07/2019) Não obstante a Corte possua também precedentes em sentido contrário, em tais casos, houve efetiva demonstração da posse pelo lapso temporal necessário à incorporação das terras ao domínio particular, nos termos da legislação de regência, o que não ocorreu no presente feito, como já se explanou. Ademais, entendo que não se poderia considerar que houve inércia do Poder Público estadual ou municipal na reivindicação e destinação pública do imóvel – argumento também deduzido no apelo e utilizado em julgados favoráveis à tese recursal –, uma vez que a ação discriminatória foi proposta em 1939, pelo menos 14 anos antes do início da posse demonstrada nos autos. Ainda que a fase demarcatória tenha se prolongado por mais de 70 anos, além de tratar-se de um procedimento, por si só, complexo e extenso – haviam diversas áreas particulares dentro do perímetro a serem delimitadas naquele feito –, inexistem quaisquer elementos nos autos que permitam atribuir tal demora à ação ou omissão estatal. Além disso, com a finalização daquele procedimento judicial – expedição da carta de sentença em 01/06/2015 e seu aditamento em 28/07/2016 –, a matrícula foi aberta pouco mais de dois anos depois (31/10/2018) e a área já foi objeto de diversos atos administrativos de afetação pública (ID 167902327), não se configurando inércia por parte do ente municipal. Eventuais insurgências quanto à regularidade dos registros realizados pelo Oficial de Registro de Imóveis de São Sebastião deve ser oposta pelas vias administrativas e/ou judiciais cabíveis e não se confundem com o objeto da presente demanda. No mais, também descabe falar em comportamento contraditório no cadastro e tributação do imóvel ocupado por particulares quando este ainda não era registrado em nome de qualquer ente público (a presumir sua imunidade tributária) e ainda não havia certeza, por ausência de conclusão da demarcação, quanto às áreas que efetivamente seriam atribuídas ao Município. Por tudo isso, tenho que, sim, desde o ajuizamento da ação discriminatória, há patente interesse público sobre as terras devolutas registradas no 2º Perímetro de São Sebastião e que eventual usucapião daquelas áreas depende da prova de que o imóvel foi legitimamente incorporado ao domínio particular nos termos da lei, conforme ressalvou a sentença. Não sendo esse o caso dos autos, descabe a declaração da usucapião, devendo os autores, caso pretendam, proceder à aquisição do domínio nos termos da legislação editada pelo Município acerca da ocupação de terras devolutas municipais, notadamente a Lei 2.511/2017 e alterações posteriores. Eventual discussão acerca da natureza confiscatória da taxa de aquisição prevista em tais diplomas, igualmente, foge do objeto da presente ação, que se limita à análise da prescrição aquisitiva. Portanto, a sentença que rejeitou a pretensão deve ser mantida. Por fim, quanto ao pedido subsidiário de arbitramento dos honorários de sucumbência, acerca da matéria, vinha decidindo pela possibilidade de uma apreciação equitativa dos critérios do art. 85, § 2º, do CPC e da observância do disposto no § 8º do mesmo dispositivo, com fundamento nos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, a fim de que a verba não fosse estipulada em valor irrisório ou excessivo. Nesse sentido, o seguinte precedente: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. BAIXA COMPLEXIDADE DO FEITO. AUSÊNCIA DE PROVEITO ECONÔMICO IMEDIATO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ARBITRAMENTO POR EQUIDADE. POSSIBILIDADE. ART. 85, §§ 2° E 8° DO CPC/2015. HONORÁRIOS RECURSAIS. INAPLICABILIDADE. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. 1. O arbitramento dos honorários advocatícios deve basear-se nos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade e resultar de uma apreciação equitativa dos critérios contidos no artigo 85, § 2º do Novo Código de Processo Civil, bem como observar o disposto no artigo 85, § 8º do mesmo diploma legal, de modo que não sejam estipulados em valor irrisório ou excessivo. 2. Não houve proveito econômico imediato às partes, mesmo com o julgamento de procedência do pedido, dada a sua natureza (exibição de documentos), de sorte que é cabível o arbitramento de honorários advocatícios por equidade, nos termos do artigo 85, § 8° do Código de Processo Civil de 2015.. 3. Considerando a baixa complexidade da causa, que versou sobre pedido de exibição de documentos, bem como que não houve proveito econômico imediato à parte executada, reputo adequado o arbitramento do valor da verba honorária em R$ 500,00 (quinhentos reais), nos termos do artigo 85, §§ 2º e 8º, do Novo Código de Processo Civil. 4. Deixa-se de aplicar a regra contida no § 11 do artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015 em desfavor da apelante, eis que não houve condenação desta parte em verba honorária em sentença (STJ, EDcl no AgInt no RESP n° 1.573.573 RJ. Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze. Terceira Turma. DJe 08/05/2017). 5. Apelação não provida. (TRF3, ApCiv n. 5014044-20.2018.4.03.6100, Rel. Des. Federal WILSON ZAUHY, 1ª Turma, j. 12/03/2021, DJEN 19/03/2021) Não obstante tal entendimento, como se sabe, em recente julgamento proferido sob o rito dos recursos repetitivos, o C. Superior Tribunal de Justiça fixou tese no sentido da impossibilidade de arbitramento dos honorários com base no art. 85, § 8º, do CPC, nas hipóteses em que os valores da condenação, do proveito econômico ou da causa são elevados, devendo, nesses casos, observar-se estritamente os percentuais previstos no § 2º do citado dispositivo legal. Veja-se a ementa do citado julgamento: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL SOB O RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. ART. 85, §§ 2º, 3°, 4°, 5°, 6º E 8º, DO CPC. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. VALORES DA CONDENAÇÃO, DA CAUSA OU PROVEITO ECONÔMICO DA DEMANDA ELEVADOS. IMPOSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO POR APRECIAÇÃO EQUITATIVA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. RECURSO JULGADO SOB A SISTEMÁTICA DO ART. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015, C/C O ART. 256-N E SEGUINTES DO REGIMENTO INTERNO DO STJ. 1. O objeto da presente demanda é definir o alcance da norma inserta no § 8º do artigo 85 do CPC, a fim de compreender as suas hipóteses de incidência, bem como se é permitida a fixação dos honorários por apreciação equitativa quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. 2. O CPC/2015 pretendeu trazer mais objetividade às hipóteses de fixação dos honorários advocatícios e somente autoriza a aplicação do § 8º do artigo 85 - isto é, de acordo com a apreciação equitativa do juiz - em situações excepcionais em que, havendo ou não condenação, estejam presentes os seguintes requisitos: 1) proveito econômico irrisório ou inestimável, ou 2) valor da causa muito baixo. Precedentes. 3. A propósito, quando o § 8º do artigo 85 menciona proveito econômico "inestimável", claramente se refere àquelas causas em que não é possível atribuir um valor patrimonial à lide (como pode ocorrer nas demandas ambientais ou nas ações de família, por exemplo). Não se deve confundir "valor inestimável" com "valor elevado". 4. Trata-se, pois, de efetiva observância do Código de Processo Civil, norma editada regularmente pelo Congresso Nacional, no estrito uso da competência constitucional a ele atribuída, não cabendo ao Poder Judiciário, ainda que sob o manto da proporcionalidade e razoabilidade, reduzir a aplicabilidade do dispositivo legal em comento, decorrente de escolha legislativa explicitada com bastante clareza. 5. Percebe-se que o legislador tencionou, no novo diploma processual, superar jurisprudência firmada pelo STJ no que tange à fixação de honorários por equidade quando a Fazenda Pública fosse vencida, o que se fazia com base no art. 20, § 4º, do CPC revogado. O fato de a nova legislação ter surgido como uma reação capitaneada pelas associações de advogados à postura dos tribunais de fixar honorários em valores irrisórios, quando a demanda tinha a Fazenda Pública como parte, não torna a norma inconstitucional nem autoriza o seu descarte. 6. A atuação de categorias profissionais em defesa de seus membros no Congresso Nacional faz parte do jogo democrático e deve ser aceita como funcionamento normal das instituições. Foi marcante, na elaboração do próprio CPC/2015, a participação de associações para a promoção dos interesses por elas defendidos. Exemplo disso foi a promulgação da Lei n. 13.256/2016, com notória gestão do STF e do STJ pela sua aprovação. Apenas a título ilustrativo, modificou-se o regime dos recursos extraordinário e especial, com o retorno do juízo de admissibilidade na segunda instância (o que se fez por meio da alteração da redação do art. 1.030 do CPC). 7. Além disso, há que se ter em mente que o entendimento do STJ fora firmado sob a égide do CPC revogado. Entende-se como perfeitamente legítimo ao Poder Legislativo editar nova regulamentação legal em sentido diverso do que vinham decidindo os tribunais. Cabe aos tribunais interpretar e observar a lei, não podendo, entretanto, descartar o texto legal por preferir a redação dos dispositivos decaídos. A atuação do legislador que acarreta a alteração de entendimento firmado na jurisprudência não é fenômeno característico do Brasil, sendo conhecido nos sistemas de Common Law como overriding. 8. Sobre a matéria discutida, o Enunciado n. 6 da I Jornada de Direito Processual Civil do Conselho da Justiça Federal - CJF afirma que: "A fixação dos honorários de sucumbência por apreciação equitativa só é cabível nas hipóteses previstas no § 8º, do art. 85 do CPC." 9. Não se pode alegar que o art. 8º do CPC permite que o juiz afaste o art. 85, §§ 2º e 3º, com base na razoabilidade e proporcionalidade, quando os honorários resultantes da aplicação dos referidos dispositivos forem elevados. 10. O CPC de 2015, preservando o interesse público, estabeleceu disciplina específica para a Fazenda Pública, traduzida na diretriz de que quanto maior a base de cálculo de incidência dos honorários, menor o percentual aplicável. O julgador não tem a alternativa de escolher entre aplicar o § 8º ou o § 3º do artigo 85, mesmo porque só pode decidir por equidade nos casos previstos em lei, conforme determina o art. 140, parágrafo único, do CPC. 11. O argumento de que a simplicidade da demanda ou o pouco trabalho exigido do causídico vencedor levariam ao seu enriquecimento sem causa - como defendido pelo amicus curiae COLÉGIO NACIONAL DE PROCURADORES GERAIS DOS ESTADOS E DO DISTRITO FEDERAL / CONPEG - deve ser utilizado não para respaldar apreciação por equidade, mas sim para balancear a fixação do percentual dentro dos limites do art. 85, § 2º, ou dentro de cada uma das faixas dos incisos contidos no § 3º do referido dispositivo. 12. Na maioria das vezes, a preocupação com a fixação de honorários elevados ocorre quando a Fazenda Pública é derrotada, diante da louvável consideração com o dinheiro público, conforme se verifica nas divergências entre os membros da Primeira Seção. É por isso que a matéria já se encontra pacificada há bastante tempo na Segunda Seção (nos moldes do REsp n. 1.746.072/PR, relator para acórdão Ministro Raul Araújo, DJe de 29/3/2019), no sentido de que os honorários advocatícios sucumbenciais devem ser fixados no patamar de 10% a 20%, conforme previsto no art. 85, § 2º, inexistindo espaço para apreciação equitativa nos casos de valor da causa ou proveito econômico elevados. 13. O próprio legislador anteviu a situação e cuidou de resguardar o erário, criando uma regra diferenciada para os casos em que a Fazenda Pública for parte. Foi nesse sentido que o art. 85, § 3º, previu a fixação escalonada de honorários, com percentuais variando entre 1% e 20% sobre o valor da condenação ou do proveito econômico, sendo os percentuais reduzidos à medida que se elevar o proveito econômico. Impede-se, assim, que haja enriquecimento sem causa do advogado da parte adversa e a fixação de honorários excessivamente elevados contra o ente público. Não se afigura adequado ignorar a redação do referido dispositivo legal a fim de criar o próprio juízo de razoabilidade, especialmente em hipótese não prevista em lei. 14. A suposta baixa complexidade do caso sob julgamento não pode ser considerada como elemento para afastar os percentuais previstos na lei. No ponto, assiste razão ao amicus curiae Instituto Brasileiro de Direito Processual - IBDP, quando afirma que "esse dado já foi levado em consideração pelo legislador, que previu 'a natureza e a importância da causa' como um dos critérios para a determinação do valor dos honorários (art. 85, § 2º, III, do CPC), limitando, porém, a discricionariedade judicial a limites percentuais. Assim, se tal elemento já é considerado pelo suporte fático abstrato da norma, não é possível utilizá-lo como se fosse uma condição extraordinária, a fim de afastar a incidência da regra". Idêntico raciocínio se aplica à hipótese de trabalho reduzido do advogado vencedor, uma vez que tal fator é considerado no suporte fático abstrato do art. 85, § 2º, IV, do CPC ("o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço"). 15. Cabe ao autor - quer se trate do Estado, das empresas, ou dos cidadãos - ponderar bem a probabilidade de ganhos e prejuízos antes de ajuizar uma demanda, sabendo que terá que arcar com os honorários de acordo com o proveito econômico ou valor da causa, caso vencido. O valor dos honorários sucumbenciais, portanto, é um dos fatores que deve ser levado em consideração no momento da propositura da ação. 16. É muito comum ver no STJ a alegação de honorários excessivos em execuções fiscais de altíssimo valor posteriormente extintas. Ocorre que tais execuções muitas vezes são propostas sem maior escrutínio, dando-se a extinção por motivos previsíveis, como a flagrante ilegitimidade passiva, o cancelamento da certidão de dívida ativa, ou por estar o crédito prescrito. Ou seja, o ente público aduz em seu favor a simplicidade da causa e a pouca atuação do causídico da parte contrária, mas olvida o fato de que foi a sua falta de diligência no momento do ajuizamento de um processo natimorto que gerou a condenação em honorários. Com a devida vênia, o Poder Judiciário não pode premiar tal postura. 17. A fixação de honorários por equidade nessas situações - muitas vezes aquilatando-os de forma irrisória - apenas contribui para que demandas frívolas e sem possibilidade de êxito continuem a ser propostas diante do baixo custo em caso de derrota. 18. Tal situação não passou despercebida pelos estudiosos da Análise Econômica do Direito, os quais afirmam com segurança que os honorários sucumbenciais desempenham também um papel sancionador e entram no cálculo realizado pelas partes para chegar à decisão - sob o ponto de vista econômico - em torno da racionalidade de iniciar um litígio. 19. Os advogados devem lançar, em primeira mão, um olhar crítico sobre a viabilidade e probabilidade de êxito da demanda antes de iniciá-la. Em seguida, devem informar seus clientes com o máximo de transparência, para que juntos possam tomar a decisão mais racional considerando os custos de uma possível sucumbência. Promove-se, dessa forma, uma litigância mais responsável, em benefício dos princípios da razoável duração do processo e da eficiência da prestação jurisdicional. 20. O art. 20 da "Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro" (Decreto-Lei n. 4.657/1942), incluído pela Lei n. 13.655/2018, prescreve que, "nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão". Como visto, a consequência prática do descarte do texto legal do art. 85, §§ 2º, 3º, 4º, 5º, 6º e 8º, do CPC, sob a justificativa de dar guarida a valores abstratos como a razoabilidade e a proporcionalidade, será um poderoso estímulo comportamental e econômico à propositura de demandas frívolas e de caráter predatório. 21. Acrescente-se que a postura de afastar, a pretexto de interpretar, sem a devida declaração de inconstitucionalidade, a aplicação do § 8º do artigo 85 do CPC/2015, pode ensejar questionamentos acerca de eventual inobservância do art. 97 da CF/1988 e, ainda, de afronta ao verbete vinculante n. 10 da Súmula do STF. 22. Embora não tenha sido suscitado pelas partes ou amigos da Corte, não há que se falar em modulação dos efeitos do julgado, uma vez que não se encontra presente o requisito do art. 927, § 3º, do CPC. Isso porque, no caso sob exame, não houve alteração de jurisprudência dominante do STJ, a qual ainda se encontra em vias de consolidação. 23. Assim, não se configura a necessidade de modulação dos efeitos do julgado, tendo em vista que tal instituto visa a assegurar a efetivação do princípio da segurança jurídica, impedindo que o jurisdicionado de boa-fé seja prejudicado por seguir entendimento dominante que terminou sendo superado em momento posterior, o que, como se vê claramente, não ocorreu no caso concreto. 24. Teses jurídicas firmadas: i) A fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória nesses casos a observância dos percentuais previstos nos §§ 2º ou 3º do artigo 85 do CPC - a depender da presença da Fazenda Pública na lide -, os quais serão subsequentemente calculados sobre o valor: (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa. ii) Apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo. 25. Recurso especial conhecido e provido, devolvendo-se o processo ao Tribunal de origem, a fim de que arbitre os honorários observando os limites contidos no art. 85, §§ 3°, 4°, 5° e 6º, do CPC, nos termos da fundamentação. 26. Recurso julgado sob a sistemática do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015 e art. 256-N e seguintes do Regimento Interno do STJ. (STJ – REsp n. 1.850.512/SP, Rel. Min. Og Fernandes, Corte Especial, j. 16/3/2022, DJe 31/5/2022) Na espécie, considerando o valor atribuído à causa (R$ 211.056,30 – ID 167902309, f. 21), não há que se falar em proveito econômico inestimável ou valor da causa muito baixo para justificar a aplicação do § 8º do art. 85 ou o estabelecimento de percentuais inferiores ao previsto no § 2º do mesmo dispositivo. Assim, correta a sentença ao fixar os honorários sucumbenciais no percentual mínimo previsto na lei processual. Ante o exposto, CONHEÇO E NEGO PROVIMENTO à apelação, mantendo a sentença recorrida em todos os seus termos. Com fulcro no art. 85, § 11, do CPC, majoro os honorários advocatícios devidos pelos autores para 11% (onze por cento) sobre o valor atualizado da causa. É como voto. [1] Art. 183. (...) § 3º Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião. [2] Art. 191. (...) Parágrafo único. Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião. [3] Art. 102. Os bens públicos não estão sujeitos a usucapião. [4] Art. 67. Os bens [públicos] de que trata o artigo antecedente só perderão a inalienabilidade, que lhes é peculiar, nos casos e forma que a lei prescrever. [5] “Desde a vigência do Código Civil [de 1916], os bens dominicais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião.”
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. IMÓVEL INSERIDO EM ÁREA DE TERRAS DEVOLUTAS RECONHECIDAS EM AÇÃO DISCRIMINATÓRIA MOVIDA PELO ESTADO DE SÃO PAULO. POSTERIOR TRANSFERÊNCIA AO PATRIMÔNIO DO MUNICÍPIO DE SÃO SEBASTIÃO. IMPRESCRITIBILIDADE DO IMÓVEL PÚBLICO DEMARCADO E REGISTRADO. POSSE INICIADA APÓS O RECONHECIMENTO DAS TERRAS DEVOLUTAS. INCORPORAÇÃO AO DOMÍNIO PARTICULAR ANTES DA EDIÇÃO DO DECRETO -LEI ESTADUAL 14.916/1945. INEXISTÊNCIA DE INÉRCIA ESTATAL. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. TEMA REPETITIVO 1076/STJ. AUSÊNCIA DE PROVEITO ECONÔMICO INESTIMÁVEL OU VALOR DA CAUSA MUITO BAIXO. IMPOSSIBILIDADE DE ARBITRAMENTO POR EQUIDADE. RECURSO NÃO PROVIDO.
1. Controvérsia acerca da prescritibilidade de imóvel inserido na área descrita na matrícula de n. 46.682 do CRI de São Sebastião, reconhecida como devoluta nos autos da ação discriminatória n. 0000001-13.1939.8.26.0587.
2. A fase demarcatória na referida ação se encerrou apenas em 2015 e, nesse período, a área retro foi transferida do patrimônio do Estado de São Paulo ao Município de São Sebastião por força do disposto no art. 60, parágrafo único, do Decreto-Lei Complementar n. 9/69. Expedida e aditada a carta da sentença em 2016, esta foi prenotada no Registro de Imóveis em 31/10/2018, com a abertura da matrícula supra indicada.
3. Contra a sentença que julgou improcedente a pretensão por versar sobre bem imóvel público devidamente discriminado e registrado, os apelantes sustentam, essencialmente, a possibilidade de reconhecimento do domínio particular ante a ressalva expressa na sentença discriminatória; o exercício da posse por seus antecessores há mais de cem anos; a conduta contraditória do Município de São Sebastião ao tributar e aprovar projetos de construção, admitindo o domínio particular sobre bem que agora pretende reconhecer como público, assim como a sua inércia em regularizar a área em mais de oito décadas desde aquela sentença.
4. Os argumentos deduzidos no apelo, contudo, não se sustentam. Tomando como termo inicial da posse a data do instrumento de transmissão mais antigo nos autos (1953), quando a área já havia sido reconhecida como devoluta há nove anos (a sentença é de 1944), fato que constou expressamente da referida cessão de direitos, é de se considerar que era de conhecimento dos ocupantes que eventual aquisição do domínio dependeria da justificação da posse nos termos da lei, ou de sua regularização na forma prevista pelo ente público titular das terras devolutas.
5. Quanto a isso, nos termos do Decreto-Lei Estadual n. 14.916/1945, são reconhecidas como de domínio particular as terras que na data de sua entrada em vigor se acharem em posse contínua e incontestada, com justo título e boa-fé, por termo não menor de vinte anos, ou que, na mesma data, se acharem em posse pacífica e ininterrupta por trinta anos, independente de justo título e boa-fé.
6. Para tanto, seria necessária a demonstração da posse sobre o imóvel usucapiendo ao menos desde 06/08/1925, o que, como já dito, não é o caso dos autos. E, não preenchidos os requisitos legais, a área ocupada pelos autores não é protegida pelas ressalvas constantes da sentença.
7. Havendo ocupação particular sobre terras públicas discriminadas e registradas, a aquisição do domínio pela prescrição revela-se juridicamente impossível, por expressa vedação constitucional e legal, nos termos dos arts. 183, § 3º, e 191, parágrafo único, da Constituição Federal de 1988; dos arts. 102, do Código Civil de 2002, e 67, do Código Civil de 1916; e da Súmula 340 do STF. Precedentes.
8. Descabe falar em inércia do Poder Público na reivindicação e destinação pública do imóvel, uma vez que a ação discriminatória foi proposta em 1939 e, ainda que a fase demarcatória tenha se prolongado por mais de 70 anos, além de tratar-se de um procedimento, por si só, complexo e extenso – haviam diversas áreas particulares dentro do perímetro a serem delimitadas naquele feito –, inexistem quaisquer elementos nos autos que permitam atribuir tal demora à ação ou omissão estatal.
9. Além disso, com a finalização do procedimento judicial, o imóvel foi registtrado pouco mais de dois anos depois e a área já foi objeto de diversos atos administrativos de afetação pública, não se configurando inércia por parte do ente municipal.
10. No mais, também não se verifica comportamento contraditório no cadastro e tributação do imóvel ocupado por particulares quando este ainda não era registrado em nome de qualquer ente público (a presumir sua imunidade tributária) e não havia certeza, ante a não conclusão da demarcação, quanto às áreas que efetivamente seriam atribuídas ao Município.
11. Portanto, a sentença que rejeitou a pretensão deve ser mantida.
12. Quanto ao arbitramento dos honorários sucumbenciais (pedido subsidiário), em recente julgamento proferido sob o rito dos recursos repetitivos, o Superior Tribunal de Justiça fixou tese no sentido da impossibilidade de arbitramento dos honorários com base no art. 85, § 8º, do CPC, nas hipóteses em que os valores da condenação, do proveito econômico ou da causa são elevados, devendo, nesses casos, observar-se estritamente os percentuais previstos no § 2º do citado dispositivo legal.
13. No caso, considerando o valor atribuído à causa, não há que se falar em proveito econômico inestimável ou valor da causa muito baixo para justificar a aplicação do § 8º do art. 85 ou o estabelecimento de percentuais inferiores ao previsto no § 2º do mesmo dispositivo. Assim, correta a sentença ao fixar os honorários sucumbenciais no percentual mínimo previsto na lei processual.
14. Recurso não provido.