Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5031117-05.2018.4.03.6100

RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: JORGE ALBERTO SILVA REGO, COMISSAO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR

Advogados do(a) APELANTE: GIOVANNA ANTONELLA PANNUTO BURTI - SP337424-A, JORGE HENRIQUE DE OLIVEIRA SOUZA - SP185779-A, SEBASTIAO BOTTO DE BARROS TOJAL - SP66905-A, SERGIO RABELLO TAMM RENAULT - SP66823-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL, INSTITUTO DE PESQUISAS ENERGETICAS E NUCLEARES, COMISSAO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR, JORGE ALBERTO SILVA REGO

Advogados do(a) APELADO: GIOVANNA ANTONELLA PANNUTO BURTI - SP337424-A, JORGE HENRIQUE DE OLIVEIRA SOUZA - SP185779-A, SEBASTIAO BOTTO DE BARROS TOJAL - SP66905-A, SERGIO RABELLO TAMM RENAULT - SP66823-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5031117-05.2018.4.03.6100

RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: JORGE ALBERTO SILVA REGO, COMISSAO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR

Advogados do(a) APELANTE: GIOVANNA ANTONELLA PANNUTO BURTI - SP337424-A, JORGE HENRIQUE DE OLIVEIRA SOUZA - SP185779-A, SEBASTIAO BOTTO DE BARROS TOJAL - SP66905-A, SERGIO RABELLO TAMM RENAULT - SP66823-A
APELADO: UNIÃO FEDERAL, INSTITUTO DE PESQUISAS ENERGETICAS E NUCLEARES, COMISSAO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR, JORGE ALBERTO SILVA REGO

Advogados do(a) APELADO: GIOVANNA ANTONELLA PANNUTO BURTI - SP337424-A, JORGE HENRIQUE DE OLIVEIRA SOUZA - SP185779-A, SEBASTIAO BOTTO DE BARROS TOJAL - SP66905-A, SERGIO RABELLO TAMM RENAULT - SP66823-A

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de apelações à sentença de improcedência em ação ajuizada para anulação do PAD 01342000029/2018-11 e consequentemente, da pena de demissão, reintegrando o autor à função ocupada com recebimento de salário desde o afastamento ou, subsidiariamente, alteração da sanção aplicada para suspensão de trinta dias sem vencimentos. Foi fixada verba honorária de 10% do valor atualizado da causa, “vedada a destinação da verba a membro da advocacia pública ou ao Conselho Curador de Honorários Advocatícios”, diante da inconstitucionalidade “incidentur tantum” do § 19 do artigo 85, CPC e, por arrastamento, dos artigos 27 a 36 da Lei 13.327/2016.

Alegou a Comissão Nacional de Energia Nuclear que: (1) os artigos 22 e 23 da Lei 8.906/1994 prescrevem que a verba honorária pertence aos advogados, inclusive públicos conforme artigo 3º, § 1º; (2) o atual Código de Processo Civil previu expressamente direito a honorários de sucumbência por advogados públicos (artigo 18, § 19), dependente apenas da respectiva regulamentação através de lei, tendo sido editada a Lei 13.327/2016; (3) se a parte que deu causa ao processo judicial contra a União e suas autarquias e fundações públicas federais é vencida, deve arcar com honorários advocatícios, pertencentes aos advogados públicos federais, nos termos dos artigos 22 e 23 da Lei 8.906/1994, 85, § 19 do CPC e 27 e 29 da Lei 13.327/2016; (4) não há inconstitucionalidade formal no artigo 85, § 19, CPC, que apenas ratificou os artigos 22 e 23 da Lei 8.906/1994, em interpretação autêntica, afastando qualquer dúvida que poderia existir sobre a titularidade da verba por advogados públicos; (5) a Suprema Corte reconhece, com efeito vinculante, que honorários advocatícios pertencem ao advogado da vencedora da demanda (SV 47); (6) sujeitam-se os advogados públicos à Lei 8.906/1994 com igualdade de diritos em relação aos privados quando atuam em Juízo (ADI 2652/DF), e nas Reclamações 5.133, 7.181 e 13.195 foi afirmado que procuradores federais estão incluídos na Lei 8.906/1994; (7) não há inconstitucionalidade material no artigos 85, § 19 CPC e 27 e 29 da Lei 13.327/2016, pois são compatíveis com o direito de todos os advogados a titularidade de honorários de sucumbência, conforme artigos 3º, 22 e 23 da Lei 8.906/1994, mais de uma vez referendados pela Suprema Corte; (8) princípios não revogam regras, a menos por defeasibility ou “superabilidade”, e fundamentação adotada a partir de convicções próprias sobre princípio da moralidade não têm respaldo em norma jurídica; (9) existe decisão específica, que reconhece inexistente violação ao princípio da moralidade na percepção de verba honorária por advogados públicos (RE 407.908); (10) a percepção de verba honorária não é incompatível com o regime remuneratório do subsídio, na medida em que não há ônus para o Estado; (11) qualquer decisão judicial que declare inconstitucional o artigo 85, § 19, CPC, deve necessariamente observar a cláusula de reserva de plenário prevista no artigo 97 da CF, conforme reafirmado na Súmula Vinculante 10; (12) a jurisprudência é firme quanto aos advogados públicos terem direito à verba honorária nas causas que patrocinam; (13) honorários advocatícios não constituem receita pública, não podendo a administração pública apropriar-se da verba honorária que não lhe pertence; e (14) honorários de sucumbência são eventuais, variáveis e devidos pela parte vencida na disputa judicial.

Alegou o autor que: (1) é absolutamente nula a decisão do PAD, por ofensa ao contraditório e ampla defesa, pois não foi intimado da oitiva das testemunhas Jair Mengatti e Ronaldo Veronesi, arroladas pela comissão processante (artigos 153, 156 da Lei 8.112/90; artigos 2º, 26, 27, parágrafo único, 28 e 46 da Lei 9.784/1999; e artigo 5º, LV, da CF); (2) houve cerceamento porque dispensada a oitiva da testemunha essencial ao deslinde do caso, Benedita de Abreu; (3) nulidade da pena aplicada por ofensa ao princípio da proporcionalidade e razoabilidade, por não terem sido analisadas circunstâncias atenuantes, como falta de antecedentes, tempo de serviço, e proposta da comissão processante e diretores do IPEN/CNEN pela pena alternativa de suspensão sem remuneração por trinta dias; (4) “por impossibilidade técnica e de logística de produção, não houve nenhuma adulteração dos produtos ou documentos fiscais (verdadeiro “crime impossível”), não havendo o que se falar em conduta irregular por parte do apelante que tenha ocasionado dano à administração pública”, pelo que requereu acolhimento dos pedidos iniciais.

Alegou a União, em recurso adesivo, que: (1) é constitucional previsão legal de honorários advocatícios para advogados públicos federais, direcionados ao Conselho Curador dos Honorários Advocatícios - CCHA da AGU; (2) a Lei 13.105/2015 adotou a titularidade originária dos honorários por advogados e membros da AGU, nos termos da Lei 13.327/2016; (3) a jurisprudência ampara a percepção dos honorários por advogados públicos; (4) tais valores não têm origem nos cofres públicos, mas na sucumbência do vencido; (5) o repasse da verba honorária deriva da sucumbência, que não decorre necessariamente do exercício do cargo, pois se trata de verba eventual; (6) há compatibilidade de cumulação dos subsídios, originados dos cofres públicos, com honorários, suportados pelo particular vencido na ação; (7) os honorários de sucumbência são, por natureza, eventuais, variáveis e autônomos, com cominação sujeita ao sucesso na demanda, tendo natureza sui generis e seu repasse representa retribuição condicionada e derivada do êxito na atuação; (8) o artigo 32 da Lei 13.327/2016, afastando efeito previdenciário de verba honorária de sucumbência, reforça não se tratar de verba remuneratória; (9) o repasse de verbas de sucumbência revela opção do Executivo de retribuir desempenho de representantes judiciais, de forma consentânea com princípios da moderna administração gerencial e incentivo à produtividade; e (10) a constitucionalidade dos artigos 85, § 19, CPC, e 27 a 36 da Lei 13.327/2016, que tratam da percepção de honorários pelos advogados públicos federais é discutida na ADI 6.053, tendo sido proferida decisão pela constitucionalidade.

Houve contrarrazões.

É o relatório.

 

 


 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5031117-05.2018.4.03.6100

RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: JORGE ALBERTO SILVA REGO, COMISSAO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR

Advogados do(a) APELANTE: GIOVANNA ANTONELLA PANNUTO BURTI - SP337424-A, JORGE HENRIQUE DE OLIVEIRA SOUZA - SP185779-A, SEBASTIAO BOTTO DE BARROS TOJAL - SP66905-A, SERGIO RABELLO TAMM RENAULT - SP66823-A
APELADO: UNIÃO FEDERAL, INSTITUTO DE PESQUISAS ENERGETICAS E NUCLEARES, COMISSAO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR, JORGE ALBERTO SILVA REGO

Advogados do(a) APELADO: GIOVANNA ANTONELLA PANNUTO BURTI - SP337424-A, JORGE HENRIQUE DE OLIVEIRA SOUZA - SP185779-A, SEBASTIAO BOTTO DE BARROS TOJAL - SP66905-A, SERGIO RABELLO TAMM RENAULT - SP66823-A

 

 

 

 

 

 V O T O

 

 

Senhores Desembargadores, ante a prejudicialidade da matéria, cabe, por primeiro, apreciar o pedido de declaração de nulidade do processo administrativo disciplinar e respectiva decisão que aplicou demissão ao autor da demanda.

A garantia do devido processo legal, com respeito aos princípios do contraditório e ampla defesa, tem amparo constitucional, sendo obrigatória tanto nos processos judiciais como administrativos (artigo 5º, LV, CF). No plano legal, o ditame constitucional tem previsão específica para processos administrativos disciplinares nos artigos 143 e 153 da Lei 8.112/1990.

A propósito das garantias constitucionais, decidiu a Suprema Corte que “A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição” (Súmula Vinculante 5/STF, editada em 2008), razão pela qual, inclusive, foi cancelada em maio/2021 a Súmula 343/STJ, suscitada pelo autor.

No caso, o processo administrativo disciplinar (ID’s 149100631, 149100782 e 149100783) foi instaurado em 04/01/2018 para apurar conteúdo de mensagens eletrônicas enviadas pelo autor à médica do Centro Bionuclear de Diagnóstico Ltda por correio eletrônico institucional do IPEN – Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares, nos seguintes termos (ID 149100631, f. 6/7):

 

Mensagem de Jorge Alberto para Benedita Abreu, em 29/11/2017, 14h43

“Assunto: MENSAGEM DO JORGE PARA DRA. BENEDITA

Prezada Dra. Benedita

(estou enviando esta mensagem conforme conversado com sua secretária)

Venho mais uma vez solicitar seu patrocínio, se possível, para a seguinte questão.

Como é de conhecimento de todos, estamos passando por dificuldades para que a Radiofarmácia do IPEN cumpra com suas obrigações para honrar como com seus compromissos de fornecimento de radiofármacos para cerca de 400 clientes.

Especificamente neste ano, não tivemos repasse para algumas despesas miúdas e de pronto pagamento, inclusive, até o ano retrasado nós tínhamos uma pequena verba para fazer frente a estas despesas, no entanto, foi suspenso este item no nosso orçamento.

Tive que auxiliar de alguma forma nosso setor, e do meu próprio bolso, fui adquirindo toner para nossas impressoras para que não ficássemos sem a emissão dos documentos para a remessa dos materiais.

Estas despesas totalizaram R$ 5.000,00 (cinco mil e pouco) e está sendo bastante difícil que eu possa ser reembolsado.

Nestes termos, venho consultar se mais uma vez se você poderia auxiliar da seguinte forma:

Repasse de R$ 5.000,00 para minha pessoa.

Contrapartida:

Seriam enviados três geradores nas próximas semanas de 750 mCi, mas nós iríamos calibrar EFETIVAMENTE geradores de 1.500 mCi.

Sairiam as Notas Fiscais com cobrança e toda a documentação pertinente, apenas os geradores seriam cobrados 750 mCi mas calibrados para 1.500 mCi.

Ex.

[...]

Total da diferença: R$ 7.158,00

Total a ser patrocinado: R$ 5.000,00

Dra. Benedita, sinta-se à vontade se ficar muito difícil esta colaboração, apenas lembrei-me da sua pessoa devido ao longo tempo de conhecimento entre o IPEN e sua empresa.

Jorge Alberto Silva Rêgo

Banco do Brasil - Agência [...]

C/C [...]

CPF [...]” (grifamos)

 

Mensagem de Jorge para bionuclear, em 05/12/2017, 14h22

“Assunto: MENSAGEM DO JORGE – IPEN - PARA DRA. BENEDITA ABREU

Prezada Dra.

Recebeu minha mensagem?

Agradeço a atenção e entenderei totalmente se não for possível este patrocínio.

Abrs em todos da Bionuclear

Jorge Alberto“

 

Seguiu-se juntada mensagem de esclarecimentos do autor ao Superintendente do IPEN (ID 149100631, f. 8):

 

“São Paulo, 20 de dezembro de 2017

Prezado Dr Wilson Calvo

Superintendente do IPEN

Fui chamado pelo Dr. Jair Mengatti, relatando fato ocorrido referente a e-mail enviado para a empresa Bionuclear tendo como médica responsável a Dra. Benedita Abreu.

Concordo que trata-se de fato grave, tendo em vista que transparece que obtive vantagem indevida com produtos da Radiofarmácia do IPEN.

Sendo difícil justificar o texto enviado, vou tentar explicar o ocorrido.

Todos sabem da minha dedicação com a Radiofarmácia do IPEN, em especial o atendimento para os pacientes e clientes que utilizam nossos produtos.

Durante o tempo que estou na Radiofarmácia, participei de vários congressos da SBMN, e em anos anteriores, nunca tivemos verba oficial para fazer frente a esses congressos.

Alguns clientes patrocinavam nossas inscrições, montagem de estande e outras despesas pertinentes, no entanto, durante dois congressos que participamos (Salvador e São Paulo (HC e outro), não tínhamos conseguido o total para fazer frente aos eventos.

Confesso que de maneira ingênua e na ânsia de ajudar de alguma forma, disponibilizei valores de minha conta para completar os custos, tendo onerado mais de 8.000,00 reais na época.

Volto a frisar que essas explanações não justifica o ato em si, apenas estou procurando não deixar uma impressão de improbidade, e nestes termos tomarei a providência de efetuar a devolução do valor recebido para a Dra. Benedita.

Informo também que não foi enviado nenhum gerador nos termos descritos no meu e-mail.

Informo também que devido ao fato de esgotamento ref. aos serviços que executo na programação dos radiofármacos, solicito minha transferência para outra área da Radiofarmácia (produção), afastando qualquer dúvida quanto à comercialização dos radiofármacos.

Se possível, queira me desculpar pelo transtorno causado principalmente para o Dr. Jair Mengatti.” (grifamos)

 

A comissão processante emitiu ata de instalação e início de trabalhos em 10/01/2018, definindo preliminarmente ouvir Ronaldo Veronesi e Jair Mengatti, solicitar afastamento cautelar do autor por trinta dias (artigo 147 da Lei 8.112/1990), emitindo notificação ao servidor processado para vistas do processo (ID 149100631, f. 22).

Em 10/01/2018 o servidor foi pessoalmente  notificado da instauração do processo disciplinar e do direito de acompanhá-lo, pessoalmente ou por procurador, arrolar e reinquirir testemunhas, produzir provas e contraprovas e requerer cópia integral dos autos, sem prejuízo do direito de vista, “assegurado durante o expediente de funcionamento da Comissão” (ID 149100631, f. 27).

As duas testemunhas acima citadas foram ouvidas na manhã de 16/01/2018 (ID 149100631, f. 31/5), sendo lavrado no horário do almoço do mesmo dia “termo de ciência de tomada de depoimentos” assinado pelo autor e pelo presidente da Comissão, com o seguinte teor: “compareceu o Sr. Jorge Alberto Silva Rego, que tendo conhecimento que não foi convocado oficialmente para acompanhar a tomada de depoimento dos senhores Jair Mengatti do Centro de Radiofarmácia – CR e Ronaldo Veronesi da Gerência Comercial do IPEN, para por livre vontade tomar conhecimento e dar ciência nos termos depoimento prestados, considerando-os do seu entendimento e concordância, dispensando a Comissão de outras providência com relação aos citados depoimentos” (idem, f. 36).

Conquanto o ato processual praticado não tenha, de fato, observado previamente formalidades legais necessárias, é fato que, ciente dos direitos respectivos, o servidor não postulou pela reinquirição das testemunhas na sua presença, nem mesmo quando da apresentação de sua defesa. Ademais, de tal ato não resultou nenhum prejuízo ao autor - pelo que não se cogita de nulidade procedimental -, pois, ao contrário do sustentado, a decisão administrativa proferida não se respaldou em tais depoimentos, que nada acrescentaram à apuração dos fatos, sobretudo desfavoravelmente ao servidor – razão pela qual, inclusive, este deu-se por satisfeito com mera ciência posterior -, até porque a conduta infracional praticada já havia sido por este confessada por escrito antes mesmo de aberto o  processo disciplinar (ID 149100631, f. 8) e ainda depois na sua própria peça de defesa e no respectivo termo de interrogatório (idem, f. 62/5 e 77/9).

No ponto, registre-se que a decisão administrativa impugnada, considerando o constante do processo disciplinar, adotou o Parecer 01099/2018/CONJUR-MCTIC/CGU/AGU, com a seguinte fundamentação (ID 149100783, f. 46/72):

 

“Quanto ao mérito, assiste razão à Comissão. Foram reunidas provas suficientes para a conclusão de que o sr. Jorge Alberto Silva Rego solicitou e recebeu, no exercício de suas atribuições, quantia em dinheiro de particular para benefício próprio. Constam nos autos as seguintes provas:

a) e-mail enviado no dia 29 de novembro de 2017 e reforçado no dia 05 de dezembro de 2017 [...]

b) justificativa formalizada perante o Diretor do IPEN/SP [...]

c) termo de interrogatório perante a Comissão disciplinar [...]

d) comprovante de devolução da quantia indevidamente recebida [...]

Em sua defesa, o servidor indiciado afirmou que a quantia recebida se tratava de empréstimo pessoal concedido pela Dra. Benedita Abreu, representante da empresa Centro Bionuclear de Diagnóstico Ltda, pois se trata de pessoa de sua confiança. Eis alguns fragmentos da defesa:

[...]

Não procedem as argumentações da defesa. As provas reunidas no processo afastam a alegação de empréstimo pessoal. O e-mail dirigido à empresa Centro Bionuclear de Diagnósticos Ltda não deixa dúvidas de que o servidor, aproveitando de suas atribuições funcionais, solicitou a particular a quantia em dinheiro para patrocínio pessoal. O servidor utilizou seu e-mail funcional e mencionou dificuldades ligadas ao IPEN no momento da solicitação do repasse. Foi registrada a promessa de contrapartida em favor da empresa para que o dinheiro fosse liberado ao servidor, deixando claro que a quantia pleiteada viria da empresa e não de pessoa ligada ao indiciado. A devolução da quantia foi efetivada em favor da empresa e não à Dra. Benedita Abreu.

Diante do conjunto probatório, não resta dúvida de que o servidor Jorge Alberto Silva Rego solicitou da empresa privada Centro Bionuclear de Diagnósticos Ltda, cliente do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares – IPEN/SP na aquisição de produtos radiofármacos, a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), para benefício próprio, e ofereceu em contrapartida a adulteração de produtos e de documentos em favorecimento à empresa, conforme concluiu o colegiado.”

 

Percebe-se que a decisão administrativa não fez qualquer referência aos depoimentos das testemunhas Jair Mengatti e Ronaldo Veronesi. Contudo, ainda que assim não fosse, eventual decretação de nulidade não alcançaria todo o processo disciplinar, como pretendido, restringindo-se apenas a tais depoimentos, a serem desconsiderados quando do juízo de valor a ser exercido ou, quando muito, desentranhados dos autos, o que, de qualquer forma, não afetou o resultado do processo, pois, conforme destacado, não serviram de razões ou fundamento à decisão proferida, justamente pela irrelevância no esclarecimento dos fatos e na imposição de penalidade ao servidor.

Quanto à oitiva de Benedita Abreu, do Centro Bionuclear de Diagnóstico Ltda, a comissão processante decidiu em 22/01/2018 por sua inquirição mediante “convite” por e-mail (ID 149100631, f. 47/52). Em ata de reunião de 16/02/2018, consta que a comissão processante deliberou “descartar o pedido de esclarecimentos feitos através de convite por telefone e e-mail (conforme anexos) a Dra. Benedita Abreu da empresa Centro Bionuclear de Diagnóstico Ltda, [...] tendo em vista que a mesma, após contato telefônico, apesar de não se opor a prestar os esclarecimentos a esta comissão, não deu retorno positivo quanto ao depoimento sobre os fatos objeto do e-mail de 5 de dezembro de 2017, do sr. Jorge Alberto Silva Rego destinado à referida empresa e sua representante”.

Foi, então, designada na mesma ocasião data para interrogatório do servidor, devidamente notificado (idem, f. 53 e 55).

Interrogado e formalmente indiciado, o servidor foi citado em 29/03/2018 para ofertar defesa escrita, com abertura de vista dos autos (ID 149100631, f. 74/6). Na defesa ofertada em 03/04/2018, confirmou que solicitou à médica Benedita Abreu “empréstimo pessoal de R$ 5.000,00 que seria pago assim que tivesse condições. Essa solicitação foi devido a vários descontos efetuados em meus proventos em dezembro de 2017. Para que esse empréstimo fosse realizado, foi acertado com a médica da Bionuclear Diagnóstico Ltda seria necessário apresentar junto à administração desta clínica justificativa para a remessa do valor. Foi também informado via telefone que sob hipótese nenhuma seriam enviados geradores de tecnécio com cobrança menor e atividade maior [...] Tendo sido uma questão pessoal entre minha pessoa e o Centro Bionuclear de Diagnósticos Médicos Ltda, o empréstimo solicitado foi quitado em 22/01/2018 conforme recibo de depósito anexado neste termo” (idem, f. 77/9).

Como se observa, mesmo após tomar ciência de todo o processado, inclusive da dispensa de inquirição da médica Benedita Abreu, o servidor não postulou, em defesa, pela oitiva de qualquer testemunha, tendo apenas anexado à peça processual extensa relação de documentos e notas fiscais com objetivo de comprovar que não houve adulteração nos equipamentos fornecidos.

Não se verifica, assim, qualquer irregularidade na conduta da comissão processante, visto que, neste contexto, a oitiva de tal testemunha revelou-se, de fato, absolutamente desnecessária à apuração dos fatos, até porque, ainda que viesse, em tese, a confirmar a versão de empréstimo pessoal ao autor, tal declaração não teria força probante suficiente para sobrepor-se à prova documental dos autos, sobretudo o teor do e-mail por meio do qual solicitada a quantia indevida, dadas as versões conflitantes apresentadas pelo autor para justificar tal conduta – ora para custear aquisição de toner para impressora (ID 149100631, f. 6), ora para patrocinar congressos (idem, f. 8), ora para empréstimo pessoal (idem, f. 63 e 77) -, além de que, conforme afirmado pelo próprio servidor, “a médica responsável e proprietária da clínica é pessoa de minha confiança de longa data” (idem, f. 77)

Quanto à impugnação à penalidade aplicada, sem consideração das circunstâncias atenuantes, em observância à proporcionalidade e razoabilidade, observa-se que a conduta do autor foi enquadrada nas infrações disciplinares previstas nos artigos 117, IX, e 132, IV e XI, da Lei 8.112/1990 (ID 149100783, f. 62), que assim dispõem:

 

“Art. 117. Ao servidor é proibido:

[...]

IX - valer-se do cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função pública;

[...]

Art. 132. A demissão será aplicada nos seguintes casos:

[...]

IV - improbidade administrativa;

[...]

XI - corrupção;

[...]

XIII - transgressão dos incisos IX a XVI do art. 117.”

 

Diante de tal previsão legal, observou a sentença que, “em que pesem os argumentos do autor com relação à eficiência no desempenho de suas funções e à falta de precedentes comportamentais negativos, tais fatos, esperados no desempenho regular do serviço público, por sinal, não ilidem a aplicação da penalidade de demissão, por ausência de amparo legal” (ID 149100828, f. 5).

A propósito, é assente a jurisprudência da Corte Superior no sentido de que “a autoridade administrativa não dispõe de discricionariedade para aplicar ao servidor pena diversa de demissão quando caraterizadas as hipóteses previstas no artigo 132 da Lei 8.112/1990” (Súmula 650/STJ).

Não obstante, no que se refere à aplicação do artigo 128 da Lei 8.112/1990 (“Art. 128. Na aplicação das penalidades serão consideradas a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para o serviço público, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes funcionais”) à espécie, constou expressamente da fundamentação da decisão administrativa que:

 

“Quanto ao enquadramento dos fatos, verifica-se que o servidor Jorge Alberto Silva Rego, no exercício de suas atribuições junto ao setor de atendimento aos clientes do Serviço de Produção de Radiofármacos do IPEN/SP, valeu-se do cargo para solicitar repasse de quantia à empresa cliente na aquisição de radiofármacos e prometeu vantagem como contrapartida.

O servidor recebeu a quantia pleiteada. A inexistência de prova quanto à efetivação da contrapartida não descaracteriza a irregularidade da conduta. [...]

[...]

Além disso, o acusado praticou ato de improbidade administrativa ao solicitar e receber vantagem patrimonial indevida em razão do exercício do cargo, conforme descrito no artigo 9º, inciso, I, da Lei 8.429, de 2 de junho de 1992 [...]

[...]

A restituição da quantia indevidamente recebida não descaracteriza a prática do ato de improbidade administrativa [...]

[...]

A conduta do acusado configura, ainda, ato de corrupção, conforme conceituação descrita no artigo 317 da Lei 2.848/40 – Código Penal, nos seguintes termos:

[...]

Cabível, portanto, o enquadramento da conduta do servidor Jorge Alberto Silva Rego nos termos do artigo 117, inciso IX, e do artigo 132, incisos IV e XI, todos da Lei 8.112/1990 [...]

[...]

Quanto à aplicação da penalidade, devem ser observados os termos do artigo 128, da Lei 8.112/1990 [...]

[...]

O artigo 132, caput, da Lei 8.112/90 prevê a aplicação da penalidade de demissão para os casos de improbidade administrativa, corrupção, bem como transgressão aio inciso IX, do artigo 117 [...]

[...]

No presente caso, a conduta do acusado mostra-se bastante grave na medida em que o servidor atuava no setor de atendimento aos clientes do IPEN/SP e, aproveitando-se do relacionamento advindo do exercício das atribuições funcionais, solicitou quantia em dinheiro com a promessa de adulteração de produtos fornecidos pelo poder público. O servidor utilizou os meios institucionais de comunicação para solicitar vantagem indevida. Além disso, a mensagem eletrônica encaminhada ao particular contém cálculo comparativo do valor da adulteração dos produtos frente à quantia solicitada (fls. 05/06), o que demonstra o interesse pessoal em detrimento do interesse público.

Quanto aos antecedentes, a Pasta Funcional do servidor Jorge Alberto Silva Rego não atesta o registro de penalidades ou de elogios nos seus assentamentos funcionais (fls. 11/18 – SEI 12/20).

Assim, observados os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, bem como analisados os requisitos do artigo 128, da Lei 8.112/90, verifica-se que o servidor Jorge Alberto Rego tornou-se passível de sofrer a penalidade de demissão, nos termos previstos no artigo 132, caput, e incisos IV, XI e XIII, da Lei 8.112/1990.

[...]

A conduta do servidor Jorge Alberto Rego restou cabalmente comprovada nos autos e foi analisada segundo os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Como visto, trata-se de conduta grave para a qual a legislação aplicável aos servidores públicos federais atribuiu a penalidade de demissão. É necessário, portanto, conferir aplicação ao princípio da legalidade, para reconhecer o cabimento da penalidade expulsiva, em conformidade com o entendimento da Advocacia-Geral da União. (grifamos)

 

Tal fundamentação administrativa alinha-se ao que firmado pela Corte Superior, ao adotar o entendimento de que, "concretizada a infração administrativa grave, não é possível mitigar a aplicação da pena de demissão legalmente prevista" (STJ, AgInt no RMS 56.025/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 26/09/2018). Consoante a jurisprudência do STJ, "não se está negando vigência ao art. 128 da Lei 8.112/1990 ('Na aplicação das penalidades serão consideradas a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para o serviço público, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes funcionais'), pois tais critérios de dosimetria são direcionados para as hipóteses em que a própria lei dá margem discricionária, o que não é o caso das hipóteses de demissão (art. 132 da Lei 8.112/1990)" (STJ, REsp 1.685.571/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 16/10/2017)” (MS 17.796, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Rel. p/ Acórdão Min. ASSUSETE MAGALHÃES, DJe de 19/11/2019).

Ademais, acresça-se que na própria mensagem que ensejou instauração do processo disciplinar, o servidor realçou expressamente que “Venho mais uma vez solicitar seu patrocínio, se possível, [...] Nestes termos, venho consultar se mais uma vez se você poderia auxiliar [...]” (ID 149100631, f. 6/7), a revelar que a aplicação de penalidade mais branda por falta de registro de antecedentes funcionais não poderia deixar de considerar o contexto mais gravoso da própria conduta que foi admitida pelo servidor, indicando reiteração ou insistência na solicitação indevida de vantagem.  

Por todo o exposto, não se verifica, pois, hipótese de nulidade do processo administrativo disciplinar ou da pena aplicada, tendo sido observados os princípios do contraditório, ampla defesa, legalidade, proporcionalidade e razoabilidade invocados, pelo que se confirma a sentença neste ponto.

No tocante aos honorários de sucumbência, a sentença assim decidiu:

 

“Dos honorários de sucumbência:

Ressalvando o entendimento anterior deste juízo, é evidente a inconstitucionalidade da percepção dos honorários sucumbenciais por parte dos advogados públicos (artigos 85§19º, do CPC c/c artigos 27 a 36 da Lei 13.327/2016).

Com efeito, a remuneração dos membros da Advocacia Pública ocorre com base no “regime de subsídio”, estabelecido pela Emenda Constitucional 19/1998 (arts. 39, §§4º e 8º c/c art. 135, ambos da CF), o qual prevê que os servidores organizados em carreira devem ser remunerados exclusivamente por meio de subsídio em parcela única, como é o caso dos advogados públicos.

É vedado, assim, o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de remuneração, ou qualquer outra espécie remuneratória, à exceção das verbas indenizatórias e daquelas previstas no §3º do art. 39 da CF (décimo terceiro salário, adicional noturno, salário família, etc).

Por sua vez, ao se falar em parcela única, resta claro que o constituinte derivado proibiu a divisão do subsídio em duas partes, uma fixa e outra variável.

Sob qualquer ângulo que se analise a questão, é absoluta, pois, a incompatibilidade entre o regime de subsídio com o recebimento de honorários sucumbenciais por parte dos advogados públicos.

Afinal, os honorários ostentam nítido caráter remuneratório e de contraprestação de serviços prestados no curso do processo, até mesmo estando sujeitos a incidência de imposto de renda (Lei 13.327/16).

Permitir que tais servidores públicos possam perceber honorários como uma verba privada, diversa do subsídio, conduziria à inevitável conclusão de que os valores não estariam sujeitos ao teto constitucional, fomentando uma situação de privilégio e de desequilíbrios não justificáveis em um contexto republicano.

Ademais, é falaciosa qualquer alegação no sentido de que a verba honorária não seria verba pública, pois sempre ingressou nos cofres públicos sem qualquer condicionamento de posterior restituição ou recuperação de empréstimos ou valores cedidos pelo governo.

Imperioso destacar que é a Administração que arca com todas as despesas físicas e de pessoal necessárias ao desempenho das atribuições dos advogados da União, Procuradores da Fazenda Nacional, Procuradores Federais, do Banco Central do Brasil, havendo nítido conflito de interesses entre o ente estatal e o advogado público.

É certo, ainda, que tais agentes são muito bem remunerados para desempenhar suas funções institucionais, por meio dos subsídios, como previsto pela Constituição.

Não se pode admitir, assim, que a pretexto da execução de uma receita privada, os patronos executem a cobrança em juízo revestidos na qualidade de agentes públicos.

A utilização da estrutura física e de pessoal da Advocacia- Geral de União para o exercício de uma pretensão privada viola, pois, os princípios basilares da Administração Pública, em especial a moralidade e a impessoalidade.

Convém ressaltar que a inconstitucionalidade da destinação dos honorários de sucumbência aos advogados públicos já foi reconhecida no âmbito do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, em incidente próprio (autos nº 0011142-13.2017.4.02.0000).

Em conclusão, admitir a percepção dos honorários de sucumbência por parte dos advogados públicos conduziria ao sepultamento do princípio republicano, em uma aberrante sobreposição de interesses particulares sobre o interesse público, com o qual essa magistrada não pode anuir.

Pelo exposto, declaro, “incidenter tantum”, a inconstitucionalidade do §19º do art. 85 do CPC e dos arts. 27 a 36 da Lei 13.327/16, de modo que a quantia devida a título de honorários deverá ser destinada ao Tesouro Nacional.

[…]

Os honorários devidos à parte vencedora deverão ser destinados ao Tesouro Nacional, sendo vedada a destinação da verba a membro da advocacia pública ou ao Conselho Curador de Honorários Advocatícios, nos termos da fundamentação.”

 

A verba honorária de sucumbência aos advogados públicos foi prevista no Código de Processo Civil, que a condicionou à regulamentação por lei específica:

 

“Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.
[...]

§ 19. Os advogados públicos perceberão honorários de sucumbência, nos termos da lei.”

 

Sobreveio, então, a Lei 13.327/2016 dispondo que:

 

“Art. 27. Este Capítulo dispõe sobre o valor do subsídio, o recebimento de honorários advocatícios de sucumbência e outras questões que envolvem os ocupantes dos cargos:

I - de Advogado da União;

II - de Procurador da Fazenda Nacional;

III - de Procurador Federal;

IV - de Procurador do Banco Central do Brasil;

V - dos quadros suplementares em extinção previstos no art. 46 da Medida Provisória nº 2.229-43, de 6 de setembro de 2001.

Art. 28. O subsídio dos ocupantes dos cargos de que trata este Capítulo é o constante do Anexo XXXV desta Lei.

Art. 29. Os honorários advocatícios de sucumbência das causas em que forem parte a União, as autarquias e as fundações públicas federais pertencem originariamente aos ocupantes dos cargos de que trata este Capítulo.

Parágrafo único. Os honorários não integram o subsídio e não servirão como base de cálculo para adicional, gratificação ou qualquer outra vantagem pecuniária.

Art. 30. Os honorários advocatícios de sucumbência incluem:

I - o total do produto dos honorários de sucumbência recebidos nas ações judiciais em que forem parte a União, as autarquias e as fundações públicas federais;

II - até 75% (setenta e cinco por cento) do produto do encargo legal acrescido aos débitos inscritos na dívida ativa da União, previsto no art. 1º do Decreto-Lei nº 1.025, de 21 de outubro de 1969 ;

III - o total do produto do encargo legal acrescido aos créditos das autarquias e das fundações públicas federais inscritos na dívida ativa da União, nos termos do § 1º do art. 37-A da Lei nº 10.522, de 19 de julho de 2002.

Parágrafo único. O recolhimento dos valores mencionados nos incisos do caput será realizado por meio de documentos de arrecadação oficiais.

Art. 31. Os valores dos honorários devidos serão calculados segundo o tempo de efetivo exercício no cargo, para os ativos, e pelo tempo de aposentadoria, para os inativos, com efeitos financeiros a contar da publicação desta Lei, obtidos pelo rateio nas seguintes proporções:

I - para os ativos, 50% (cinquenta por cento) de uma cota-parte após o primeiro ano de efetivo exercício, crescente na proporção de 25 (vinte e cinco) pontos percentuais após completar cada um dos 2 (dois) anos seguintes;

II - para os inativos, 100% (cem por cento) de uma cota-parte durante o primeiro ano de aposentadoria, decrescente à proporção de 7 (sete) pontos percentuais a cada um dos 9 (nove) anos seguintes, mantendo-se o percentual fixo e permanente até a data de cessação da aposentadoria.

§ 1º O rateio será feito sem distinção de cargo, carreira e órgão ou entidade de lotação.

§ 2º Para os fins deste artigo, o tempo de exercício efetivo será contado como o tempo decorrido em qualquer um dos cargos de que trata este Capítulo, desde que não haja quebra de continuidade com a mudança de cargo.

§ 3º Não entrarão no rateio dos honorários:

I - pensionistas;

II - aqueles em licença para tratar de interesses particulares;

III - aqueles em licença para acompanhar cônjuge ou companheiro;

IV - aqueles em licença para atividade política;

V - aqueles em afastamento para exercer mandato eletivo;

VI - aqueles cedidos ou requisitados para entidade ou órgão estranho à administração pública federal direta, autárquica ou fundacional.

Art. 32. Os honorários não integrarão a base de cálculo, compulsória ou facultativa, da contribuição previdenciária.

 

A propósito, a Suprema Corte, na ADI 6.053, julgada em 24/06/2020, considerou constitucional a percepção de honorários de sucumbência por advogados públicos com adoção de interpretação conforme à Constituição Federal aos artigos 23 da Lei 8.906/1994, 85, § 19, da Lei 13.105/2015, e 27 e 29 a 36 da Lei 13.327/2016, para reputar compatível tal percepção com o subsídio, desde que não excedentes ao teto dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, conforme dispõe o artigo 37, XI, da Constituição Federal.

Eis a ementa do julgado:

 

ADI 6.053, Relator p/acórdão Min. ALEXANDRE DE MORAES, DJe 16/07/2020: “CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. INTERDEPENDÊNCIA E COMPLEMENTARIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS PREVISTAS NOS ARTIGOS 37, CAPUT, XI, E 39, §§ 4º E 8º, E DAS PREVISÕES ESTABELECIDAS NO TÍTULO IV, CAPÍTULO IV, SEÇÕES II E IV, DO TEXTO CONSTITUCIONAL. POSSIBILIDADE DO RECEBIMENTO DE VERBA DE HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA POR ADVOGADOS PÚBLICOS CUMULADA COM SUBSÍDIO. NECESSIDADE DE ABSOLUTO RESPEITO AO TETO CONSTITUCIONAL DO FUNCIONALISMO PÚBLICO. 1. A natureza constitucional dos serviços prestados pelos advogados públicos possibilita o recebimento da verba de honorários sucumbenciais, nos termos da lei. A CORTE, recentemente, assentou que “o artigo 39, § 4º, da Constituição Federal, não constitui vedação absoluta de pagamento de outras verbas além do subsídio” (ADI 4.941, Rel. Min. TEORI ZAVASCKI, Relator p/ acórdão, Min. LUIZ FUX, DJe de 7/2/2020). 2. Nada obstante compatível com o regime de subsídio, sobretudo quando estruturado como um modelo de remuneração por performance, com vistas à eficiência do serviço público, a possibilidade de advogados públicos perceberem verbas honorárias sucumbenciais não afasta a incidência do teto remuneratório estabelecido pelo art. 37, XI, da Constituição Federal. 3. AÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE."

 

Feito controle concentrado de constitucionalidade pela Suprema Corte não remanesce espaço para prevalência de decisão contrária à proclamada, pelo que se reforma, no ponto, a sentença quanto à destinação da verba honorária devida pela sucumbência do autor para adequação à legislação vigente, nos termos da jurisprudência firmada. 

Pela sucumbência recursal, o autor deve suportar condenação adicional, nos termos do artigo 85, § 11, CPC, no equivalente a 5% do valor da causa atualizado, a ser acrescida à sucumbência fixada pela sentença pelo decaimento na instância de origem.

Ante o exposto, nego provimento à apelação do autor, e dou provimento aos apelos da CNEN e União, nos termos supracitados.

É como voto.



E M E N T A

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. PROCESSO DISCIPLINAR. SERVIDOR PÚBLICO. DEMISSÃO. NULIDADES AFASTADAS. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA AOS ADVOGADOS PÚBLICOS. CONSTITUCIONALIDADE. ADI 6.053.

1. A garantia do devido processo legal, com respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa constitui preceito constitucional, de observância obrigatória tanto nos processos judiciais quanto nos administrativos (artigo 5º, LV, CF). O ditame constitucional tem previsão legal específica para os processos administrativos disciplinares, conforme artigos 143 e 153 da Lei 8.112/1990.

2. A propósito das garantias constitucionais, decidiu a Suprema Corte que “A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição” (Súmula Vinculante 5/STF, editada em 2008), razão pela qual, inclusive, foi cancelada em maio/2021 a Súmula 343/STJ.

3. Embora ouvidas duas testemunhas sem prévia notificação do servidor, não foi pleiteada reinquirição quando da ciência do fato nem posteriormente em defesa escrita, não resultando, ademais, em prejuízo, pois irrelevantes os depoimentos para a formação de culpa e condenação, até porque o próprio autor confessou a infração. 

4. Não houve nulidade pela dispensa da testemunha, pois não foi o autor quem a indicou e, ciente de que não foi colhido tal depoimento, a defesa não requereu a produção de tal prova, de modo a corroborar a alegação de prejuízo. O depoimento de tal testemunha no contexto probatório, face à prova documental produzida, foi avaliada como dispensável, tanto que, diante da dispensa, não houve oportuna impugnação. 

5. A conduta infracional foi enquadrada nos artigos 117, IX, e 132, IV e XI, da Lei 8.112/1990 e, embora não considerada a falta de antecedentes negativos, circunstâncias atenuantes não seriam suficientes para afastar a aplicabilidade da demissão em função da gravidade da conduta em si, em consonância com a jurisprudência no sentido de que “a autoridade administrativa não dispõe de discricionariedade para aplicar ao servidor pena diversa de demissão quando caraterizadas as hipóteses previstas no artigo 132 da Lei 8.112/1990” (Súmula 650/STJ); "uma vez concretizada a infração administrativa grave, não é possível mitigar a aplicação da pena de demissão legalmente prevista" (AgInt no RMS 56.025)"; e "não se está negando vigência ao art. 128 da Lei 8.112/1990 ('Na aplicação das penalidades serão consideradas a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para o serviço público, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes funcionais'), pois tais critérios de dosimetria são direcionados para as hipóteses em que a própria lei dá margem discricionária, o que não é o caso das hipóteses de demissão (art. 132 da Lei 8.112/1990)" (STJ, REsp 1.685.571/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 16/10/2017)” (MS 17.796).

6. A Suprema Corte, na ADI 6.053, julgada em 24/06/2020, declarou constitucional a percepção de verba honorária de sucumbência por advogados públicos, em interpretação conforme à Constituição aos artigos 23 da Lei 8.906/1994, 85, § 19, da Lei 13.105/2015 e 27 e 29 a 36 da Lei 13.327/2016, se não excedido o teto constitucional (artigo 37, XI)

7. Pela sucumbência recursal, o autor deve suportar condenação adicional, nos termos do artigo 85, § 11, CPC, no equivalente a 5% do valor da causa atualizado, a ser acrescida à sucumbência fixada pela sentença pelo decaimento na instância de origem.

8. Apelação do autor desprovida e apelações da CNEN e União providas.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação do autor, e deu provimento aos apelos da CNEN e União, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.