Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002481-23.2020.4.03.6144

RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA

APELANTE: COMPANHIA NACIONAL DE ALCOOL

Advogados do(a) APELANTE: EDUARDO PEREZ SALUSSE - SP117614-A, LUIZ HENRIQUE VANO BAENA - SP206354-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002481-23.2020.4.03.6144

RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA

APELANTE: COMPANHIA NACIONAL DE ALCOOL

Advogados do(a) APELANTE: LUIZ HENRIQUE VANO BAENA - SP206354-A, SERGIO RICARDO NUTTI MARANGONI - SP117752-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

A Excelentíssima Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora):

Trata-se de mandado de segurança impetrado pela COMPANHIA NACIONAL DE ÁLCOOL objetivando o afastamento das restrições impostas pelo artigo 1º, §7º da Lei nº 12.859/2013, c/c o artigo 45 da IN/RFB nº 1.717/2017 quanto à utilização dos créditos acumulados de PIS e de COFINS, seja por meio de compensação com débitos de quaisquer tributos administrados pela Receita Federal, seja por meio do ressarcimento em dinheiro.

Aduz a impetrante em sua inicial que, dedicando-se à industrialização, comercialização e distribuição de produtos derivados de álcool, apura mensalmente saldo credor das contribuições ao PIS e à COFINS, na aquisição de insumos utilizados na fabricação ou produção de bens destinados à venda, ex vi do artigo 3º, da Lei nº 10.637/2002 e do artigo 3º da Lei nº 10.833/2003.

Esclarece que, diante da essencialidade da mercadoria produzida e comercializada pela impetrante, o legislador previu uma “pauta fiscal diferenciada”, que reduz a base de cálculo incidente na operação de venda, para desonerar o produto da tributação, caracterizando espécie de isenção parcial.

Assim, sustenta que tal benefício não atinge sua finalidade se o crédito gerado na entrada (aquisição de insumos) não puder ser utilizado pela impetrante, uma vez que passa a ser custo do contribuinte.

Alega, ainda, que essa restrição acaba por infringir o princípio da isonomia, sob o argumento de que tanto a isenção total quanto a isenção parcial (redução da base de cálculo – in casu) do PIS e da COFINS na saída, possuem funções equivalentes; - desonerar a tributação; - e por isso acabam culminando no acúmulo de créditos decorrentes da aquisição dos insumos não consumidos na operação, diante da venda isenta ou “base de cálculo reduzida”. E, ao impedir o uso desses créditos apenas quando decorrentes das operações que gozam de isenção parcial na saída (redução da base de cálculo), torna as contribuições ao PIS e à COFINS monofásicas e cumulativas, fazendo incidir o tributo em cascata.

Esclarece que o artigo 16 da Lei nº 11.116/2005 possibilita que os créditos acumulados de PIS/COFINS sejam utilizados por meio de ressarcimento ou compensação de tributos, mas que a autoridade fiscal entende que esse dispositivo seria aplicável apenas às hipóteses de isenção integral.

Entendendo que a isenção parcial e a integral constituem benefícios fiscais semelhantes, a redução da base de cálculo abrange o disposto no artigo 17 da Lei nº 11.033/2004, possibilitando a utilização dos créditos na forma do artigo 16 da Lei nº 11.116/2005.

Acrescenta que admitir a manutenção do crédito na isenção integral, que gera um acúmulo de créditos e não admitir o mesmo para isenção parcial, que gera o mesmo acúmulo de créditos, fere os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

Indeferida a liminar e prestadas as informações, sobreveio a r. sentença monocrática decretando a extinção do feito, com fulcro no artigo 487, II, do CPC, c/c artigo 23 da Lei nº 12.016/2009, reconhecendo a ocorrência de decadência do direito à impetração.

Inconformada, recorre a impetrante, sob  a alegação de que se trata de mandado de segurança preventivo e não repressivo, ou seja, o ato coator que pretende afastar ainda não foi concretizado, havendo o justo receio de que a recorrida o pratique, especialmente em razão da existência do impedimento previsto no artigo 1º, §7º, da Lei nº 12.859/2013 c/c o artigo 45 da IN/RFB nº 1.717/2017, que impede o aproveitamento dos créditos excedentes gerados pela sistemática aplicável à industrialização e venda de produtos de álcool.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte para julgamento.

O i. representante do Ministério Público Federal opinou pelo prosseguimento do feito.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002481-23.2020.4.03.6144

RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA

APELANTE: COMPANHIA NACIONAL DE ALCOOL

Advogados do(a) APELANTE: LUIZ HENRIQUE VANO BAENA - SP206354-A, SERGIO RICARDO NUTTI MARANGONI - SP117752-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES: 

 

 

V O T O

 

 

A Excelentíssima Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora):

Tenho que assiste razão à impetrante quanto à decadência.

Dispõe o artigo 23 da Lei nº 12.016/2009:

“Art. 23. O direito de requerer mandado de segurança extinguir-se-á decorridos 120 (cento e vinte) dias, contados da ciência, pelo interessado, do ato impugnado.”

No entanto, o e. Superior Tribunal de Justiça já firmou entendimento no sentido de que, nos casos de mandado de segurança preventivo, objetivando a discussão sobre a sistemática de recolhimento de tributos, é inaplicável o prazo decadencial de 120 dias, previsto no artigo transcrito.

A propósito:

“TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PRETENSÃO DE AFASTAMENTO DA EXIGÊNCIA DA CONTRIBUIÇÃO AO FUNDO ESTADUAL DE TRANSPORTE - FET, PREVISTA NA LEI 3.617/2019, DO ESTADO DO TOCANTINS. ILEGITIMIDADE DO SECRETÁRIO DE ESTADO DA FAZENDA PARA FIGURAR, COMO AUTORIDADE IMPETRADA, NO POLO PASSIVO DO MANDADO DE SEGURANÇA. PRECEDENTES DO STJ. EXTINÇÃO DO PROCESSO, DE OFÍCIO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, RESTANDO PREJUDICADO O RECURSO ORDINÁRIO.

I. Trata-se, na origem, de Mandado de Segurança ajuizado contra o Secretário da Fazenda do Estado do Tocantins, a princípio perante o Juízo de Direito da 1ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Palmas/TO, com o objetivo de assegurar o alegado direito líquido e certo da parte impetrante de não se sujeitar à exigência da contribuição ao Fundo Estadual de Transporte - FET, prevista na Lei 3.617/2019, do Estado do Tocantins. Após decisão declinatória de competência, os autos foram remetidos ao Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins, para o processo e julgamento originário da ação mandamental. No âmbito do Tribunal de Justiça, inicialmente, os pedidos de liminar e de emenda à petição inicial - para que passasse a figurar, como autoridade impetrada, o Superintendente de Administração Tributária da Secretaria da Fazenda do Estado do Tocantins, em substituição ao Secretário de Estado da Fazenda - restaram indeferidos, mediante decisão monocrática, em face da qual foram apresentados, sucessivamente, Embargos de Declaração, monocraticamente rejeitados, e Agravo interno. Sobreveio o acórdão que julgou prejudicado o Agravo interno e denegou o Mandado de Segurança, por considerar incidente, na espécie, o óbice da Súmula 266/STF ("Não cabe mandado de segurança contra lei em tese"), e também por entender consumado o prazo decadencial de 120 (cento e vinte) dias, previsto no art. 23 da Lei 12.016/2009, a contar da data da publicação da Lei estadual 3.617, de 18/12/2019, de vez que a impetração do mandamus deu-se em 27/05/2020, ensejando a interposição do presente Recurso Ordinário.

II. A Primeira Seção do STJ, ao julgar, sob o rito dos recursos repetitivos, o REsp 1.119.872/RJ, firmou o entendimento de que, ‘no pertinente a impetração de ação mandamental contra lei em tese, a jurisprudência desta Corte Superior embora reconheça a possibilidade de mandado de segurança invocar a inconstitucionalidade da norma como fundamento para o pedido, não admite que a declaração de inconstitucionalidade, constitua, ela própria, pedido autônomo’ (STJ, REsp 1.119.872/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 20/10/2010). In casu, a petição inicial traz, como causa de pedir, a tese de inconstitucionalidade da legislação que instituiu a exação. Isso, porém, não significa que o mandamus impugna lei em tese. Ao contrário, trata-se de pretensão de declaração incidental de inconstitucionalidade da norma, em controle difuso, para afastar a exigência fiscal, o que pode ser veiculado, quer em Mandado de Segurança, quer em Ação Ordinária.

III. Na forma da jurisprudência do STJ, não se aplica o prazo de decadência, previsto no art. 23 da Lei 12.016/2009 (art. 18 da Lei 1.533/51), em se tratando de impetração de mandado de segurança de natureza preventiva, sendo firme a orientação desta Corte, outrossim, no sentido de que, havendo obrigação de trato sucessivo, que se renova periodicamente, o marco inicial para a contagem do prazo decadencial não pode ser a data de publicação da lei instituidora da obrigação. Em tal sentido: STJ, EREsp 546.259/PR, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, DJU de 12/09/2005; AgRg no Ag 1.160.776/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 13/11/2009; RMS 22.577/MT, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 21/10/2010; REsp 1.474.606/PE, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, DJe de 06/10/2017; AgRg no REsp 742.767/MG, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, DJU de 03/10/2005; EREsp 1.164.514/AM, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, DJe de 25/02/2016; AgRg no AREsp 36.550/RJ, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, DJe de 12/08/2016.

IV. No caso - em que a arrecadação da contribuição ao Fundo Estadual de Transporte - FET, prevista na Lei 3.617/2019, do Estado do Tocantins, dá-se ‘nos mesmos formatos que o ICMS’, ou seja, ‘uma obrigação tributária periódica, mensal’ -, extrai-se da petição inicial o caráter preventivo do Mandado de Segurança, especialmente no pedido para que 'a autoridade impetrada, como representante tributário do Estado do Tocantins, e/ou quem lhe represente visando à arrecadação tributária, não pratique qualquer ato seja informativo, coativo ou punitivo, contra a Impetrante ou terceiros transportadores, relativo à cobrança da contribuição referida, bem como que se permita a plena fruição de benefícios fiscais (isenção, redução de base de cálculo, crédito presumido, entre outros) independentemente da contribuição ou não ao FET'. Assim, não há que se falar em decadência do direito à impetração do Mandado de Segurança, por se tratar de ação mandamental com caráter preventivo. No entanto, mesmo que afastados os fundamentos do acórdão recorrido, ainda assim o processo deve ser extinto, de ofício, sem resolução do mérito, por motivação diversa.

V. De acordo com os arts. 485, VI, § 3º, 337, XI, § 5º, 1.013 e 1.028 do CPC/2015 c/c os arts. 34 da Lei 8.038/90 e 247 do RISTJ, este Tribunal, no exercício de sua competência recursal ordinária, pode, de ofício, extinguir o processo de Mandado de Segurança, sem resolução do mérito, quando a parte impetrante for carecedora de ação, por ausência de qualquer das condições da ação mandamental. Ainda que o Tribunal de origem haja considerado presentes os pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo, bem como as condições da ação, o STJ pode reconhecer, de ofício, a ausência de qualquer pressuposto processual ou condição da ação, não havendo que se falar, nessa hipótese, em ofensa ao princípio que veda a reformatio in pejus.

VI. Sendo preventivo o mandado de segurança, desnecessária a existência concreta de ato coator, porquanto o receio de ato que venha a violar o direito líquido e certo da parte impetrante é suficiente a ensejar a impetração. Entretanto, in casu, diante da argumentação constante da impetração, não se verifica a existência de possíveis atos de efeitos concretos, a serem praticados pelo Secretário de Estado da Fazenda - a justificar a competência originária do Tribunal de Justiça -, tendentes a violar ou ameaçar suposto direito líquido e certo da parte impetrante, a dar ensejo à impetração, ainda que na forma preventiva. Com efeito, a parte impetrante não aponta ato algum, de efeitos concretos, a ser praticado pela autoridade que se aponta coatora - o Secretário de Estado da Fazenda -, a justificar a competência originária do Tribunal de Justiça.

VII. A Primeira Seção do STJ, ao julgar o MS 4.839/DF (Rel. Ministro ARI PARGENDLER, DJU de 16/02/98), deixou anotado que ‘a autoridade coatora, no mandado de segurança, é aquela que pratica o ato, não a que genericamente orienta os órgãos subordinados a respeito da aplicação da lei no âmbito administrativo; mal endereçado o writ, o processo deve ser extinto sem julgamento de mérito’.

VIII. A Primeira Turma do STJ, ao julgar o AgRg no RMS 36.846/RJ (Rel. Ministro ARI PARGENDLER, DJe de 07/12/2012), decidiu que, no regime do lançamento por homologação, a iminência de sofrer o lançamento fiscal, acaso não cumpra a legislação de regência, autoriza o sujeito passivo da obrigação tributária a impetrar mandado de segurança contra a exigência que considera indevida. Nesse caso, porém, autoridade coatora é aquela que tem competência para o lançamento ex officio, que, certamente, não é o Secretário de Estado da Fazenda.

IX. A mais recente jurisprudência da Segunda Turma do STJ orienta-se no sentido de que o Secretário de Estado da Fazenda não possui legitimidade para figurar, como autoridade coatora, em mandado de segurança que visa afastar a exigência de tributo. Nesse sentido: AgRg no RMS 42.792/CE, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe de 11/03/2014; RMS 54.996/RN, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, DJe de 17/06/2019; AgInt no RMS 35.432/RJ, Rel. Ministro OG FERNANDES, DJe de 19/11/2020; RMS 62.373/MT, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, DJe de 01/07/2021. No mesmo sentido os seguintes precedentes da Primeira Turma desta Corte: RMS 16.708/TO, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJU de 18/04/2005; AgInt no RMS 51.519/MG, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, DJe de 16/12/2016; AgInt no RMS 46.013/RJ, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, DJe de 29/08/2016; AgInt no RMS 55.310/RN, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, DJe de 31/10/2018; AgInt no RMS 49.232/MS, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, DJe de 18/05/2016.

X. Sobre a teoria da encampação, a Primeira Seção do STJ, nos autos do MS 10.484/DF (Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, DJU de 26/09/2005), firmou o entendimento de que tal teoria apenas se aplica ao mandado de segurança quando preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos: (a) existência de vínculo hierárquico entre a autoridade que prestou informações e a que ordenou a prática do ato impugnado; (b) manifestação a respeito do mérito, nas informações prestadas; (c) ausência de indevida modificação ampliativa de competência jurisdicional absoluta. Inaplicabilidade, no caso, da teoria da encampação, pois a indevida presença do Secretário de Estado da Fazenda, no polo passivo deste Mandado de Segurança, implicou modificação da competência jurisdicional, disciplinada pela Constituição do Estado do Tocantins.

XI. Julgado extinto o presente Mandado de Segurança, sem resolução do mérito, logicamente não cabe ao STJ pronunciar-se sobre o mérito da causa ou do Recurso Ordinário, porquanto tal pronunciamento seria incompatível com a aludida decisão.

XII. Extinção do Mandado de Segurança, de ofício, sem resolução do mérito, com fundamento no art. 485, VI, § 3º, do CPC/2015. Mandado de Segurança denegado.

XIII. Recurso Ordinário prejudicado.”

(RMS n. 67.109/TO, Relatora Ministra Assusete Magalhães, DJe de 3/11/2021)

“AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS. LEIS 10.637/2002 E 9.718/1998. DECADÊNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO INTERNO DA FAZENDA NACIONAL DESPROVIDO.

1. Apesar da argumentação da parte agravante quanto à aplicabilidade da Súmula 7/STJ à espécie, impõe-se observar que o Recurso Especial dedicou-se a tema exclusivamente de direito, ao discorrer sobre a afronta aos arts. 1o. e 18 da Lei 1.533/1951, defendendo a natureza preventiva da impetração que visa a afastar as alterações introduzidas pela Lei 10.637/2002.

2. No mais, a decisão agravada seguiu o entendimento consolidado nesta Corte Superior de que, em casos de Mandado de Segurança preventivo, com o objetivo de se discutir a sistemática de recolhimento de tributos, é inaplicável o prazo decadencial de 120 dias, previsto no art. 18 da Lei 1.553/1951. Vejam-se, por oportuno, alguns julgados desta diretriz judicante: EREsp. 653.393/RJ, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJU 1.10.2007; EREsp. 467.653/MG, Rel. Min. ELIANA CALMON, DJU 12.5.2004; REsp. 1.216.972/AM, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJU 3.2.2011; REsp. 833.709/PE, Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, DJ 10.8.2006.

3. O raciocínio é perfeitamente aplicável à hipótese dos autos, de forma que, tratando-se de Mandado de Segurança preventivo, com o objetivo de se afastar as alterações introduzidas pela Lei 10.637/2002, a fim de não sofrer penalidade pelo recolhimento da contribuição ao PIS, relativamente aos meses de competência de dezembro/2002 em diante, na forma prevista pela Lei 9.715/1998, é inaplicável o prazo decadencial de 120 dias, previsto no art. 18 da Lei 1.553/1951.

4. Agravo Interno da Fazenda Nacional desprovido.”

(AgInt no REsp n. 1.200.535/RJ, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe de 6/4/2017)

Ante o exposto, é de se anular a sentença para afastar a decadência da impetração.

Outrossim, especificamente neste caso concreto, inaplicável o artigo 1013, § 3º, do CPC, por não se encontrar a causa madura para julgamento, sob pena de conhecimento originário de questões a respeito das quais sequer houve um começo de apreciação, nem mesmo implícita, pelo Juízo singular.

De fato, não se trata de exame incompleto das questões discutidas, caso em que esta Corte poderia analisá-las e integrar o julgamento, nos termos do art. 1013, §3º, do CPC, mas sim de ausência de discussão e completa omissão acerca dos fundamentos expostos na inicial.

Não houve nos autos manifestação acerca da matéria de fundo, mas tão somente quanto à decadência do direito à impetração.

Ademais disso, inobstante na legislação comum a decadência constitua hipótese de resolução de mérito (artigo 487, II do CPC), no mandado de segurança ela alcança apenas o procedimento, ou seja, sem qualquer análise do mérito da relação material deduzida em juízo, ex vi do artigo 23 da Lei nº 12.016/2009, razão pela qual a teoria da causa madura somente se aplica quando atendidos os requisitos do artigo 1013, §3º, I, do CPC.

Nesse sentido, a jurisprudência do e. Superior Tribunal de Justiça:

“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA. RECONHECIMENTO DA DECADÊNCIA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. NATUREZA DECADENCIAL DO ART. 23 DA LEI 12.016/2009. SÚMULA 632/STF. AGRAVO INTERNO DA AUTARQUIA FEDERAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. Trata-se de ação de mandado de segurança, com pedido de tutela provisória liminar, impetrado por B. T. INDÚSTRIA DE MADEIRA LTDA. contra o INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS-IBAMA para suspensão de penalidade de embargo de atividade e anulação de auto de infração. O Juízo inaugural concedeu parcialmente a ordem para determinar o imediato desembargo das atividades empresariais da impetrante. O Tribunal de origem, em reexame necessário, declarou a decadência e extinguiu o processo sem resolução do mérito, reformando a sentença (fls. 212).

2. Com razão a conclusão do Tribunal de origem acerca da extinção do processo sem resolução de mérito após a declaração da decadência. Isso porque , o art. 23 da Lei 12.016/2009 (antigo art. 18 da Lei 1.533/1951) prescreve que o direito de requerer mandado de segurança se extinguirá decorridos 120 dias contados da ciência pelo interessado do ato impugnado.

3. Cuida-se de prazo de natureza decadencial em que, se transcorrido o prazo de 120 dias da ciência do ato impugnado, perderá a parte o direito de impetrar mandado de segurança, ficando, todavia, resguardado o direito material da parte, que poderá utilizar as vias ordinárias para perseguir o seu direito. Não foi outro o entendimento firmado no enunciado sumular 632/STF, o qual tem o seguinte teor: é constitucional lei que fixa o prazo de decadência para a impetração de mandado de segurança.

4. Esta Corte Superior firmou entendimento segundo o qual a extinção do feito sem julgamento do mérito somente se dá no caso de decadência da impetração (RMS 44.246/RJ, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/08/2015, DJe 04/09/2015).

5. O reconhecimento da decadência gera a extinção do processo sem resolução do mérito, diversamente do elencado no art. 487, II, do CPC/2015, pois o que se retira da parte impetrante, ora agravada, é somente o acesso à via mandamental, tendo em vista que o direito material ficará inabalável, caso não tenha transcorrido o prazo de lei civil para sua discussão em ação própria, nos termos do art. 19 da Lei 12.016/2019.

6. Agravo interno da autarquia federal a que se nega provimento.”

(AgInt no AgInt no AREsp n. 1.492.505/PA, Relator Ministro Manoel Erhardt (Desembargador Convocado do TRF5), DJe de 8/6/2022)

Na hipótese dos autos, frise-se, a matéria de fundo não foi sequer tangenciada nos autos, nem nas informações da autoridade impetrada, motivo pelo qual o presente writ não está em condições de imediato julgamento. Logo, imperiosa a anulação da sentença, a fim de que o juízo de origem esgote a prestação jurisdicional.

Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação para anular a sentença e determinar o retorno dos autos ao Juízo a quo, a fim de dar prosseguimento ao feito em seus ulteriores termos.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


VOTO DO DES. FEDERAL JOHONSOM di SALVO:

Em homenagem a impossibilidade de supressão de instâncias, entendo que o § 4º do art. 1013 (Quando reformar sentença que reconheça a decadência ou a prescrição, o tribunal, se possível, julgará o mérito, examinando as demais questões, sem determinar o retorno do processo ao juízo de primeiro grau) veiculando uma exceção ("sempre que possível") deve ser interpretado sem largueza, de modo a conferir a evidente importância que a sentença de mérito detém.

O dispositivo, para mim, é de duvidosa constitucionalidade, de sorte que mantenho o entendimento de que deva ser aplicado "cum granulum salis", especialmente, como é o caso dos autos, em que se trata de matéria de direito a respeito da qual existe divergência no seio desta Terceira Região.

Bem por isso, embora se possa falar em "causa madura" (seja lá o que isso for...), a espécie recomenda que o tema seja, em primeiro lugar, apreciado na instância de origem, eis que a Turma - corretamente - afasta a decadência.

Por tal motivo, peço vênia a divergência para acompanhar a d. relatoria.

DECLARAÇÃO DE VOTO

 

Apelação da parte impetrante contra sentença que reconheceu a decadência do direito à impetração e extinguiu o feito com fulcro no artigo 487, inciso II, do CPC, c.c. o artigo 23 da Lei nº 12.016/2019.

A relatora Des. Fed. Marli Ferreira deu parcial provimento à apelação para anular a sentença e determinar o retorno dos autos ao Juízo a quo, a fim de dar prosseguimento ao feito. Divirjo parcialmente e passo a expor as razões do voto dissonante.

Concordo com a eminente relatora quanto ao afastamento da decadência, bem como quanto à necessidade de reforma da sentença.

Constata-se, todavia, que os autos já se encontram em termos para julgamento nesta instância, uma vez que a relação processual já se formou adequadamente, inclusive com a apresentação de informações e de parecer ministerial.

Nos termos do artigo 1.013 do CPC:

Art. 1.013. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.

§ 1º Serão, porém, objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desde que relativas ao capítulo impugnado.

§ 2º Quando o pedido ou a defesa tiver mais de um fundamento e o juiz acolher apenas um deles, a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento dos demais.

§ 3º Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando:

I - reformar sentença fundada no art. 485 ;

II - decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa de pedir;

III - constatar a omissão no exame de um dos pedidos, hipótese em que poderá julgá-lo;

IV - decretar a nulidade de sentença por falta de fundamentação.

§ 4º Quando reformar sentença que reconheça a decadência ou a prescrição, o tribunal, se possível, julgará o mérito, examinando as demais questões, sem determinar o retorno do processo ao juízo de primeiro grau.

(grifo nosso)

 

Destaque-se, por fim, que o precedente indicado no voto apenas ressalta a possibilidade de extinção sem resolução do mérito à vista de que a decadência do direito de impetrar mandado de segurança não atinge o direito material da parte, que poderá utilizar as vias ordinárias para demandar, mas nada diz a respeito do julgamento de causa que, processualmente, se encontra em termos para a apreciação da corte, nos termos em que autoriza o aludido dispositivo legal.

Ante o exposto, acompanho a relatora quanto ao afastamento da decadência, porém divirjo quanto ao retorno dos autos à origem, pois cabível o julgamento nesta instância com fulcro no artigo 1013, §4º, do CPC.

É como voto.

ANDRÉ NABARRETE – DESEMBARGADOR FEDERAL

 

 

 


E M E N T A

 

PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA. OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA DE TRATO SUCESSIVO. CARÁTER PREVENTIVO DO WRIT. ANULAÇÃO DA SENTENÇA .ARTIGO 1013 DO CPC. INAPLICABILIDADE.

Na forma da jurisprudência consolidada do e. Superior Tribunal de Justiça, em se tratando de mandado de segurança preventivo, no qual se discute obrigação de trato sucessivo, que se renova periodicamente, não se aplica o prazo decadencial de 120 (cento e vinte) dias previsto no artigo 23 da Lei nº 12.016/2009 (RMS nº 67.109/TO, Rel. Min. Assussete Magalhães, DJe 03/11/2021). Sentença anulada.

Inaplicável o artigo 1013, § 3º, do CPC, quando a causa não se encontra madura para julgamento, sob pena de conhecimento originário de questões a respeito das quais sequer houve um começo de apreciação, nem mesmo implícita, pelo Juízo singular. No caso concreto, não se trata de exame incompleto das questões discutidas, hipótese em que esta Corte poderia analisá-las e integrar o julgamento, nos termos do art. 1013, §3º, do CPC, mas sim de ausência de discussão e completa omissão acerca dos fundamentos expostos na inicial. Não houve nos autos manifestação acerca da matéria de fundo, mas tão somente quanto à decadência do direito à impetração.

Inobstante na legislação comum a decadência constitua hipótese de resolução de mérito (artigo 487, II do CPC), no mandado de segurança ela alcança apenas o procedimento, ou seja, sem qualquer análise do mérito da relação material deduzida em juízo, ex vi do artigo 23 da Lei nº 12.016/2009, razão pela qual a teoria da causa madura somente se aplica quando atendidos os requisitos do artigo 1013, §3º, I, do CPC.

Apelação parcialmente provida para anular a sentença e determinar o retorno dos autos ao juízo de primeiro grau, a fim de que o mandado de segurança prossiga até seus ulteriores termos.

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, Na sequência do julgamento, para finalização nos termos do art. 942, do CPC, após o voto do Des. Fed. SOUZA RIBEIRO no sentido de acompanhar o voto da relatora, foi proferido o seguinte resultado: A Quarta Turma, por maioria, decidiu dar parcial provimento à apelação para anular a sentença e determinar o retorno dos autos ao Juízo a quo, a fim de dar prosseguimento ao feito em seus ulteriores termos, nos termos do voto da Des. Fed. MARLI FERREIRA (Relatora), com quem votaram a Juíza Fed. Conv. DIANA BRUNSTEIN, o Des. Fed. JOHONSOM DI SALVO e o Des. Fed. SOUZA RIBEIRO. Vencido o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE, que acompanhou a Relatora quanto ao afastamento da decadência, porém divergia quanto ao retorno dos autos à origem, pois cabível o julgamento nesta instância com fulcro no artigo 1013, §4º, do CPC. Fará declaração de voto o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE. O Des. Fed. MARCELO SARAIVA declarou seu impedimento. A Desembargadora Federal MÔNICA NOBRE absteve-se de votar por estar ausente na leitura do relatório, sendo substituída, à época, pela Juíza Federal Convocada DIANA BRUNSTEIN. O Des. Fed. JOHONSOM DI SALVO e o Des. Fed. SOUZA RIBEIRO, ambos da 6ª Turma, votaram na forma dos artigos 53 e 260, § 1º do RITRF3. , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.