APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000815-03.2022.4.03.6116
RELATOR: Gab. 18 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO
APELANTE: EDISON JOAQUIM GARRIDO
Advogado do(a) APELANTE: RODRIGO VALENTIM PORTELA - SP187162-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM PRESIDENTE PRUDENTE
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000815-03.2022.4.03.6116 RELATOR: Gab. 18 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO APELANTE: EDISON JOAQUIM GARRIDO Advogado do(a) APELANTE: RODRIGO VALENTIM PORTELA - SP187162-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM PRESIDENTE PRUDENTE OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação interposta por EDISON JOAQUIM GARRIDO EPP em face da r. sentença que, denegou a segurança, extinguindo o feito com fulcro no artigo 487, I, do Código de Processo Civil, em mandado de segurança, objetivando seja reconhecido o direito líquido e certo da impetrante de, mesmo sendo optante pelo Simples Nacional e não possuindo cadastro no CADASTUR, usufruir dos benefícios instituídos pelo Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE), pela Lei nº 14.148/21, notadamente o direito de aplicar a alíquota zero sobre o IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, pelo prazo de 60 (sessenta) meses previsto em seu artigo 4º. Em suas razões de recurso, pleiteia a parte apelante, a reforma do decisum, sustentando, em síntese, ter direito ao benefício fiscal de alíquota zero para determinados tributos instituído pela Lei nº 14.148, de 2021, pois exerce a atividade de restaurante e similares. Alega que, ao regulamentar a matéria por meio da Portaria ME nº 7.163/2021, o Ministério da Economia extrapolou os limites legais, pois além de meramente publicar os CNAEs (como determina a lei) trouxe limitações ao enquadramento no PERSE que não estão previstas na lei de regência (Lei nº 14.148/2021), afrontando o princípio da estrita legalidade. Por fim, aduz que a Lei nº 14.148.2021 não traz qualquer restrição para a aplicação do benefício fiscal de isenção para as empresas do Simples Nacional e proceder de tal forma acarreta violação ao princípio da Isonomia Tributária, previsto no art. 150, II, da Constituição Federal. Com as contrarrazões, vieram os autos a essa Corte. Manifestação do Ministério Público Federal, pelo prosseguimento do feito. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000815-03.2022.4.03.6116 RELATOR: Gab. 18 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO APELANTE: EDISON JOAQUIM GARRIDO Advogado do(a) APELANTE: RODRIGO VALENTIM PORTELA - SP187162-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM PRESIDENTE PRUDENTE OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Cinge-se a controvérsia no direito da impetrante, optante pelo Simples Nacional, à inclusão no programa de benefício fiscal da Lei 14.148/2021, independentemente da existência de cadastro no Cadastur. Pois bem. A Lei nº 14.148/2021, dentre outras providências, criou o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), com o intuito de mitigar os prejuízos sofridos pelo setor de eventos, em decorrência do estado de calamidade pública reconhecido em face da pandemia da Covid-19. A própria lei instituidora determinou que ato normativo do Ministério da Economia publicaria os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), assim abrangidos na definição de “setor de eventos”. Nesse sentido dispõe o seu art. 2º, in verbis: Art. 2º Fica instituído o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), com o objetivo de criar condições para que o setor de eventos possa mitigar as perdas oriundas do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020. § 1º Para os efeitos desta Lei, consideram-se pertencentes ao setor de eventos as pessoas jurídicas, inclusive entidades sem fins lucrativos, que exercem as seguintes atividades econômicas, direta ou indiretamente: I - realização ou comercialização de congressos, feiras, eventos esportivos, sociais, promocionais ou culturais, feiras de negócios, shows, festas, festivais, simpósios ou espetáculos em geral, casas de eventos, buffets sociais e infantis, casas noturnas e casas de espetáculos; II - hotelaria em geral; III - administração de salas de exibição cinematográfica; e IV - prestação de serviços turísticos, conforme o art. 21 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008. § 2º Ato do Ministério da Economia publicará os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que se enquadram na definição de setor de eventos referida no § 1º deste artigo. (grifo nosso) Assim, a Portaria ME nº 7.163/2021 definiu em seus Anexos os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas –CNAE que se consideram “setor de eventos”, para fins do disposto no § 1º do art. 2º da Lei nº 14.148/2021, fixando em seu art. 1º o seguinte: Art. 1° Definir os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE que se consideram setor de eventos nos termos do disposto no § 1° do art. 2° da Lei n° 14.148, de 3 de maio de 2021, na forma dos Anexos I e II. § 1° As pessoas jurídicas, inclusive as entidades sem fins lucrativos, que já exerciam, na data de publicação da Lei n° 14.148, de 2021, as atividades econômicas relacionadas no Anexo I a esta Portaria se enquadram no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos - Perse. § 2° As pessoas jurídicas que exercem as atividades econômicas relacionadas no Anexo II a esta Portaria poderão se enquadrar no Perse desde que, na data de publicação da Lei n° 14.148, de 2021, sua inscrição já estivesse em situação regular no Cadastur, nos termos do art. 21 e do art. 22 da Lei n° 11.771, de 17 de setembro de 2008. (grifo nosso) Vê-se também que a lei que instituiu o Perse indicou como pertencentes ao “setor de eventos” as pessoas jurídicas que exerçam, dentre outras atividades econômicas, a prestação dos serviços turísticos, nos exatos termos do art. 21 da Lei nº 11.771/2008, o qual dispõe o seguinte: Art. 21. Consideram-se prestadores de serviços turísticos, para os fins desta Lei, as sociedades empresárias, sociedades simples, os empresários individuais e os serviços sociais autônomos que prestem serviços turísticos remunerados e que exerçam as seguintes atividades econômicas relacionadas à cadeia produtiva do turismo: I - meios de hospedagem; II - agências de turismo; III - transportadoras turísticas; IV - organizadoras de eventos; V - parques temáticos; e VI - acampamentos turísticos. Parágrafo único. Poderão ser cadastradas no Ministério do Turismo, atendidas as condições próprias, as sociedades empresárias que prestem os seguintes serviços: I - restaurantes, cafeterias, bares e similares; (...) (grifo nosso) Em complemento à Portaria ME nº 7.163/2021, foi editada a Instrução Normativa RFB n. 2.114/2022, que também regulamentou o referido benefício fiscal (trecho): Art. 4º O benefício fiscal a que se refere o art. 1º aplica-se às pessoas jurídicas de que tratam os §§ 1º e 2º do art. 1º da Portaria ME nº 7.163, de 2021, desde que: I - apurem o IRPJ pela sistemática do Lucro Real, do Lucro Presumido ou do Lucro Arbitrado; e II - em 18 de março de 2022: a) estivessem exercendo as atividades econômicas constantes do Anexo I da Portaria ME nº 7.163, de 2021, para fins de aplicação do benefício a receitas ou resultados decorrentes dessas atividades; ou b) estivessem com inscrição em situação regular no Cadastur, para fins de aplicação do benefício a receitas ou resultados decorrentes de atividades econômicas constantes do Anexo II da Portaria ME nº 7.163, de 2021. Parágrafo único. O benefício fiscal não se aplica às pessoas jurídicas tributadas pela sistemática do Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Simples Nacional), de que trata a Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006. A norma acima apenas explicitou a vedação disposta no art. 24 da Lei n. 123, de 14 de dezembro de 2006. Confira-se: Art. 24. As microempresas e as empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional não poderão utilizar ou destinar qualquer valor a título de incentivo fiscal. Parágrafo único. Não serão consideradas quaisquer alterações em bases de cálculo, alíquotas e percentuais ou outros fatores que alterem o valor de imposto ou contribuição apurado na forma do Simples Nacional, estabelecidas pela União, Estado, Distrito Federal ou Município, exceto as previstas ou autorizadas nesta Lei Complementar. § 1o Não serão consideradas quaisquer alterações em bases de cálculo, alíquotas e percentuais ou outros fatores que alterem o valor de imposto ou contribuição apurado na forma do Simples Nacional, estabelecidas pela União, Estado, Distrito Federal ou Município, exceto as previstas ou autorizadas nesta Lei Complementar. (Redação dada pela Lei Complementar nº 155, de 2016) Produção de efeito § 2o (VETADO). (Incluído pela Lei Complementar nº 155, de 2016) Pode-se concluir, portanto, que a concessão dos benefícios do Perse alcança as pessoas jurídicas prestadoras de serviços turísticos regularmente cadastradas no Ministério do Turismo (CADASTUR). A exigência do cadastro junto ao Ministério do Turismo não decorre da Portaria ME nº 7.163/2021, mas sim da própria Lei nº 11.771/2008, que inclusive fixa os requisitos e condições para tal, mormente se considerado o disposto em seu art. 22, in verbis: Art. 22. Os prestadores de serviços turísticos estão obrigados ao cadastro no Ministério do Turismo, na forma e nas condições fixadas nesta Lei e na sua regulamentação. No caso dos autos, a ora apelante tem como atividade econômica aquela relativa ao código “56.11-2-01 - Restaurantes e similares” (ID 270926782), a qual consta no Anexo II da Portaria ME nº 7.163/2021. A par disso, a mesma se encontra enquadrada no Simples Nacional. Oportuno registrar que a adesão ao Simples Nacional decorre de livre e espontânea vontade do contribuinte, fazendo uso da faculdade que lhe garante a lei, não existindo qualquer forma de obrigatoriedade ou compulsoriedade nessa opção. Aderindo, porém, o contribuinte o faz de acordo com as condições impostas, disciplinadas na forma da Lei Complementar nº 123/2006, não lhe sendo dado alterá-lo da maneira e forma que melhor lhe aproveite. De outra parte, entretanto, acrescente-se, ainda, que, à época da instituição do Perse, a apelante não se encontrava regularmente cadastrada no Ministério do Turismo (CADASTUR), conforme estabelecido no art. 21, parágrafo único, I, da Lei nº 11.771/2008. Por conseguinte, por qualquer ângulo analisado, quer pela ausência de cadastro no Ministério do Turismo (Cadastur), quer pela adesão realizada pela impetrante ao Simples Nacional, não há como acolher a pretensão deduzida. Nesse sentido, brilhantemente dispôs o Juizo a quo: “(...) Assim, consideradas em conjunto as Leis nºs 14.148, de 2021 e 11.771, de 2008, e a Portaria ME nº 7.163, de 2021, conclui-se que a impetrante, por não ser cadastrada até a data da publicação da primeira lei no Ministério do Turismo, não se enquadra como beneficiária do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse). Não cabe, nesse contexto, a invocação do princípio da isonomia, uma vez que, a rigor, as atividades desenvolvidas pela impetrante não são idênticas àquelas tipicamente de turismo, sendo equiparadas apenas por força de lei, desde que atendida a condição do cadastramento no Ministério do Turismo (Cadastur). Ademais, a exigência feita pela inciso IV do artigo 2º da Lei nº 14.148, de 2021, de que poderiam beneficiar-se do 'Perse' as pessoas jurídicas que exercessem a atividade de prestação de serviços turísticos, conforme o artigo 21 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008 é não apenas razoável, mas necessária, sob pena de não poder ser calculado o impacto fiscal do referido programa, já que, como dito, a atividade da impetrante não é atividade típica da "cadeia produtiva do turismo". Acresce-se que o cadastramento de atividades não típicas da "cadeia produtiva do turismo” (caso da impetrante) nunca se tratou de uma formalidade sem importância, pois a própria Lei nº 11.771, de 2008, já evidenciava que seria ele requisito para obter acesso a benefícios do Poder Público: Lei nº 11.771, de 2008: Art. 33. São direitos dos prestadores de serviços turísticos cadastrados no Ministério do Turismo, resguardadas as diretrizes da Política Nacional de Turismo, na forma desta Lei: I - o acesso a programas de apoio, financiamentos ou outros benefícios constantes da legislação de fomento ao turismo; (...) Enfim, como visto, a Portaria ME nº 7.163, de 2021, não estabelece nenhuma "exigência não prevista em lei", limitando-se a detalhar e esclarecer exatamente aquilo que já estava indicado no artigo 2º, inc. IV e §2 da Lei nº 14.148, de 2021 e artigo 21, parágrafo único, inciso I da Lei nº 11.771, de 2008. (...).” É de se frisar que, em se tratando de benefício fiscal outorgado ao contribuinte, as deduções fiscais devem obedecer aos critérios e condições previamente estabelecidos na lei e sobre os quais paira interpretação restritiva, consoante disposto no art. 111 do CTN. Dessa forma, a impetrante não preencheu requisitos da legislação para usufruir dos benefícios previstos no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos. Por conseguinte, de rigor a manutenção da r. sentença. Por fim, anoto que eventuais outros argumentos trazidos nos autos ficam superados e não são suficientes para modificar a conclusão baseada nos fundamentos ora expostos. Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação. É como voto.
E M E N T A
TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. APELAÇÃO. PROGRAMA ESPECIAL DE RETOMADA DO SETOR DE EVENTOS - PERSE. LEI 14.148/2021. PRÉVIA INSCRIÇÃO NO CADASTUR. OBRIGATORIEDADE. PORTARIA ME Nº 7.163/2021. EMPRESA OPTANTE PELO SIMPLES NACIONAL. IMPOSSIBILIDADE DE ADESÃO.
- A concessão dos benefícios do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos –Perse, instituído pela Lei nº 14.148/2021, alcança as pessoas jurídicas prestadoras de serviços turísticos regularmente cadastradas no Ministério do Turismo (CADASTUR). A exigência do cadastro junto ao Ministério do Turismo não decorre da Portaria ME nº 7.163/2021, mas sim da própria Lei nº 11.771/2008, sendo legítima tal exigência.
- A restrição imposta à empresa optante pelo Simples Nacional ao benefício fiscal de alíquota zero das contribuições ao PIS, da COFINS, do IRPJ e da CSLL previsto pela legislação ordinária, trazida pela Instrução Normativa RFB n. 2.114/2022, apenas explicita a vedação disposta no art. 24, §1º, da LC nº 123/2006.
- A adesão ao Simples Nacional decorre de livre e espontânea vontade do contribuinte, fazendo uso da faculdade que lhe garante a lei, não existindo qualquer forma de obrigatoriedade ou compulsoriedade nessa opção. Aderindo, porém, o contribuinte o faz de acordo com as condições impostas, disciplinadas na forma da Lei Complementar nº 123/2006, não lhe sendo dado alterá-lo da maneira e forma que melhor lhe aproveite.
- Recurso de apelação não provido.