Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo
14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0001959-77.2020.4.03.6307

RELATOR: 40º Juiz Federal da 14ª TR SP

RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RECORRIDO: LEONOR LEIKO TATEISHI

Advogado do(a) RECORRIDO: WLADIMIR RAPHAEL COLUCCI - SP67783-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo
14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0001959-77.2020.4.03.6307

RELATOR: 40º Juiz Federal da 14ª TR SP

RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

RECORRIDO: LEONOR LEIKO TATEISHI

Advogado do(a) RECORRIDO: WLADIMIR RAPHAEL COLUCCI - SP67783-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de recurso interposto pelo INSS (parte ré) em face da sentença que julgou PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido de concessão de pensão por morte, reconhecendo a existência de união estável, por conseguinte, a condição de companheira do segurado falecido, fixando a DIB do benefício na data de citação do INSS.

Nas razões recursais, o INSS argumenta que “(...) não restou demonstrada a convivência duradoura, pública e contínua com o de cujus, estabelecida com objetivo de constituição de família, até a data do óbito do pretenso instituidor.

Assinala que “(...) a prova juntada à exordial é insuficiente para a comprovação da alegada união estável”, e ainda que “(...) não há prova relevante da alegada união em período anterior a 24 meses do óbito, conforme ordena o §5º do art. 16, da lei 8.213/91. junta apenas documentos antigos ou produzidos após o óbito.

Postula a reforma da r. sentença para que seja julgada improcedente a pretensão autoral.

Contrarrazões apresentadas.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo
14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0001959-77.2020.4.03.6307

RELATOR: 40º Juiz Federal da 14ª TR SP

RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

RECORRIDO: LEONOR LEIKO TATEISHI

Advogado do(a) RECORRIDO: WLADIMIR RAPHAEL COLUCCI - SP67783-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

A pensão por morte consubstancia em benefício pago aos dependentes do segurado, homem ou mulher, que falecer aposentado ou não, conforme previsão inscrita no art. 201, inciso V da Nossa Lei Maior e no art.74 da Lei nº 8.213/91.

Referido benefício independe de carência, isto significa que independe de número mínimo de contribuições pagas pelo segurado.

Sendo assim, os requisitos necessários à concessão do benefício são dois: a) - qualidade de dependente do beneficiário que pleiteia a prestação; b) - qualidade de segurado do "de cujus".

No que tange à qualidade de dependente, devemos nos ater ao que preleciona o artigo 16 da Lei n. 8.213/91, vejamos:

Art. 16 - São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependente do segurado:

I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave; 

II - os pais;

III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave.

Ressalte-se que para os dependentes integrantes da primeira classe (como é o caso da esposa/companheira), a dependência econômica é presumida, nos termos do art. 16, I e § 4º, da Lei 8.213/91, entendendo-se essa presunção como absoluta, pois decorre dos deveres de assistência mútua inerentes à união estável.

É o que prevê o Tema 226 da TNU: “A dependência econômica do cônjuge ou do companheiro relacionados no inciso I do art. 16 da Lei 8.213/91, em atenção à presunção disposta no § 4º do mesmo dispositivo legal, é absoluta”.

Do caso concreto:

A controvérsia reside em torno da duração da união estável havida entre a autora e segurado falecido, considerando que o INSS concedeu pensão por morte com prazo de 04 (quatro) meses.

A r. sentença recorrida decidiu o pedido inicial de modo exauriente, analisando todas as questões suscitadas pelas partes. Pela pertinência, transcrevo trechos do decisium no que interessa à espécie:

(...)

“A parte autora pleiteia o restabelecimento de pensão por morte de IVAN PELLEGATTI, na qualidade de companheiro(a), pois teve o benefício, NB 185.098.316-7, concedido por apenas quatro meses (extinção em 11/10/2019) pela ausência de comprovação de dois anos de união estável.

A concessão de pensão por morte deve observar os requisitos da lei vigente à época do óbito, não se aplicando legislação posterior, ainda que mais benéfica (súmula STJ 340). O óbito ocorreu em 11/06/2019, na vigência da Medida Provisória nº 871/19, portanto o reconhecimento da qualidade de dependente exige a apresentação de início de prova material, complementada por prova oral idônea.

Foram juntados documentos suficientes que configuram início de prova material de união estável entre a parte autora e o segurado instituidor por pelo menos dois anos antes do óbito, nos termos do art. 16, § 6.º, da Lei n.º 8.213/91, entre os quais destaco:

- certidão de casamento do falecido com Marilú Maranho Tassetto, na qual consta averbação do divórcio consensual em 30/05/2015;

- solicitação de alteração no Plano de Aposentadoria (BrasilprevEstilo LPVGBL, matricula 3097572-7) da parte autora, datada de 19/03/2019, na qual consta o falecido como beneficiário na condição de companheiro; e

- comprovante de residência em nome do instituidor (Companhia Paulista de Força e Luz - CPFL), data de vencimento em 01/02/2019, no qual consta o endereço Rua Dr. Damiao Pinheiro Machado, 930, TP 1, AP 164, CEP: 18603-560, Botucatu/SP, o mesmo do comprovante de residência (Claro Clube), data de vencimento em 15/07/2019, em nome da parte autora.

Designada audiência de instrução e julgamento os depoimentos da parte autora e das testemunhas mostraram-se coesos e convincentes, confirmando a alegada união estável iniciada por pelo menos dois anos antes e até a data do óbito (art. 16, §§ 5.º e 6.º, da Lei n.º 8.213/91).

A qualidade de segurado é incontroversa, já que na data do falecimento o instituidor recebia benefício previdenciário.

Da análise da prova documental em conjunto com a convincente prova oral é razoável considerar que a parte autora foi companheira do falecido por mais de dois anos até a morte, razão pela qual, nascida em 1957, faz jus ao benefício vitalício desde a data do óbito (arts. 74, I, e 77, V, c, 6, Lei n.º 8.213/91).

Julgo procedente o pedido para condenar o réu a restabelecer a pensão por morte à parte autora com data do início do benefício – DIB em 12/10/2019, o que extingue o processo com resolução do mérito nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil. Deverá o INSS, no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias após o trânsito em julgado, apresentar demonstrativo discriminado e atualizado do crédito (enunciado FONAJEF 129) com correção monetária e juros conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal, compensando-se eventuais valores pagos administrativamente ou referentes a benefícios inacumuláveis.”

(...) 

O falecimento do instituidor da pensão ocorreu após o novo regramento inaugurado pela MP 879/2019 (convertida na Lei nº 13.846/2019), que inclui o parágrafo 5º, no art. 16, da Lei 8.213/1991, evidenciando a necessidade de comprovação da união estável mediante início de prova material.

Há legislação previdenciária rol de documentos essenciais a comprovação da união estável (art. 22, §3º do Decreto nº 3.048/1999), de igual forma, ato infralegal do INSS enumerou, de forma exemplificativa, relação dos documentos relevantes que evidenciam a união estável que se pretende comprovar (Portaria DIRBEN/INSS nº 991/2022), veja-se:

Art. 8º A partir de 1º de julho de 2020, com a publicação do Decreto nº 10.410, para fins de comprovação da união estável e da dependência econômica, conforme o caso, deverão ser apresentados, no mínimo, 2 (dois) dos seguintes documentos, nos processos pendentes de análise:

I - certidão de nascimento de filho havido em comum;

II - certidão de casamento religioso;

III - declaração do imposto de renda do segurado, em que conste o interessado como seu dependente;

IV - disposições testamentárias;

V - declaração especial feita perante tabelião;

VI - prova de mesmo domicílio;

VII - prova de encargos domésticos evidentes e existência de sociedade ou comunhão nos atos da vida civil;

VIII - procuração ou fiança reciprocamente outorgada;

IX - conta bancária conjunta;

X - registro em associação de qualquer natureza, onde conste o interessado como dependente do segurado;

XI - anotação constante de ficha ou livro de registro de empregados;

XII - apólice de seguro da qual conste o segurado como instituidor do seguro e a pessoa interessada como sua beneficiária;

XIII - ficha de tratamento em instituição de assistência médica, da qual conste o segurado como responsável;

XIV - escritura de compra e venda de imóvel pelo segurado em nome de dependente;

XV - declaração de não emancipação do dependente menor de 21 (vinte e um) anos;

XVI - certidão de casamento emitida no exterior, na forma do art. 10;

XVII - sentença judicial proferida em ação declaratória de união estável, ainda que a decisão judicial seja posterior ao fato gerador; ou

XVIII - quaisquer outros que possam levar à convicção do fato a comprovar.

§1º A relação dos documentos dispostos no caput é exemplificativa, podendo ser complementada ou substituída por outros documentos que formem convicção quanto ao fato que se pretende comprovar.

§2º Os 2 (dois) documentos a serem apresentados conforme disposto no caput, podem ser do mesmo tipo ou diferentes, desde que demonstrem a existência de vínculo ou dependência econômica, conforme o caso, entre o segurado e o dependente.

§3º Para fato gerador a partir de 18 de junho de 2019, data da publicação da Lei nº 13.846, as provas de união estável e de dependência econômica exigem início de prova material contemporânea dos fatos em período não superior a 24 (vinte e quatro) meses anterior à data do óbito ou do recolhimento à prisão do segurado, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no regulamento.

§4º Para que o benefício de pensão por morte seja concedido ao(à) companheiro(a) por período superior a 4 (quatro) meses, é necessário que ao menos uma das provas de união estável tenha sido produzida em período superior a 24 (vinte e quatro) meses anteriores ao óbito.

§5º Não é requisito obrigatório na comprovação de união estável a apresentação de provas de mesmo domicílio.

De se ressaltar que, “a coabitação não constitui requisito necessário para a configuração da união estável, devendo encontrarem-se presentes, obrigatoriamente, outros relevantes elementos que denotem o imprescindível intuito de constituir uma família” (PEDILEF 0002850-83.2016.4.01.3821, Rel Juiz Federal PAULO CEZAR NEVES JUNIOR, julgado em 08.03.2022; AgRg no AREsp n. 649.786, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 04.08.2015), assim, a identidade de endereço é firme indicador, mas não elemento concreto e seguro que evidencie a união estável alegada, assim sendo, há necessidade de outro substrato probatório a corroborar a relação conjugal.

Tendo o óbito ocorrido em 11/06/2019, o início de prova material deve ser produzido/estar delimitado entre junho/2017 a junho/2019.

Em relação as declarações apresentadas, de nenhum efeito na seara previdenciária, pois, não irradiam efeitos para além do signatário, nos termos do art. 408 do CPC. Lado outro, print ou cópia de tela e fotos, isoladamente considerados, não são provas seguras para a comprovação de união estável. Em outras palavras, deles não emergem elementos que evidenciem a união estável alegada.

A certidão de óbito e casamento com estado civil do falecido como “divorciado” e estado civil de “solteira” da parte autora decorrente da certidão de nascimento, analisadas conjuntamente, apenas permitem concluir que não havia impedimentos/óbice legais para que o segurado falecido mantivesse união estável com qualquer pessoa, inclusive com a parte autora.

Há robustos elementos probatórios que sinalizam pela existência de união estável em período superior a dois anos, especialmente: (i) plano de previdência privada, de titularidade da autora, que consta o falecido como beneficiário na condição de companheiro; (ii) cartão de associado de clube social, constando o falecido como dependente da autora; (iii) notas fiscais de compras de bens móveis (ano 2017 e 2018), em nome da autora e do falecido, indicando que era domiciliados no mesmo endereço.

Ademais, a prova testemunhal (vizinhos e pessoas próximas) se mostrou coerente, corroborando a existência de união estável como entidade familiar entre a autora e o segurado falecido, desde ano de 2016, cuja convivência perdurou até o passamento do de cujus.

Em assim sendo, considerando o início de prova material, complementada pela prova oral -- e tendo em vista que a defesa não foi apta à desconstituição/modificação/extinção do direito autoral --, reputo comprovada a união estável estabelecida entre o finado e a parte autora por período superior a dois anos.

Ressalte-se que para os dependentes integrantes da primeira classe (como é o caso da esposa/companheira), a dependência econômica é presumida, nos termos do art. 16, I e § 4º, da Lei 8.213/91, entendendo-se essa presunção como absoluta, pois decorre dos deveres de assistência mútua inerentes à união estável. É o que prevê o Tema 226 da TNU: “A dependência econômica do cônjuge ou do companheiro relacionados no inciso I do art. 16 da Lei 8.213/91, em atenção à presunção disposta no § 4º do mesmo dispositivo legal, é absoluta”.

Em relação à duração do benefício, o pagamento deve ocorrer de forma vitalícia, nos termos do art. 77, § 2º, inciso V, da Lei 8.213/1991 e art. 1º da Portaria ME nº 424/2020, pois, ao tempo do óbito, a parte autora contava com 61 (sessenta e um) anos de idade e a união estável é superior a vinte e quatro meses.

Diante do exposto, nego provimento ao recurso do INSS.

Condeno o INSS (recorrente vencido) ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 55, caput, da Lei 9.099/1995 c/c art. 85, § 3º, inciso I, do CPC, incidentes sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de mérito, conforme Súmula 111/STJ e Tema 1.105/STJ. A parte ré ficará dispensada desse pagamento se a parte autora não for assistida por advogado. Em sendo assistida pela DPU, subsiste a condenação no pagamento de honorários sucumbenciais, conforme diretriz firmada no Tema 1.002/STF

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. COMPROVAÇÃO DA EXISTÊNCIA DE UNIÃO ESTÁVEL ENTRE A AUTORA E O SEGURADO FALECIDO. RELAÇÃO CONJUGAL SUPERIOR A 02 (DOIS) ANOS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL SUFICIENTE AO RECONHECIMENTO DO DIREITO. PROVA TESTEMUNHAL CORROBORA À PRETENSÃO AUTORAL. SENTENÇA MANTIDA PELOS SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS.

1. A pretensão autoral repousa na concessão do benefício de pensão por morte, em razão do falecimento do segurado instituidor, que aduz ter sido seu companheiro. Proferida sentença de parcial procedência no Juizado de origem, concedendo o benefício de pensão por morte.

2. Óbito do segurado instituidor ocorreu após a Lei nº 13.846/2019, quando a legislação previdenciária passou a exigir início de prova material para a comprovação de união estável, para efeito de concessão de pensão por morte, não considerando suficiente a apresentação de prova testemunhal. Razoável início de prova material não se confunde com prova plena, ou seja, constitui indício que deve ser complementado pela prova testemunhal.

3. A contemporaneidade do início de prova material (24 meses antes do óbito) não representa imposição de que o documento esteja datado dentro desse interregno, podendo ser aceito documentos anteriores ao biênio legal que, comprovadamente, fazem referência a circunstâncias e relações jurídicas cujos efeitos se estenderam até a data do óbito.

4. Conforme delineado em sentença, há robustos elementos probatórios que sinalizam pela existência de união estável em período superior a dois anos, e ainda, pela prova testemunhal, que se mostrou coerente, corroborando a existência de união estável como entidade familiar entre a autora e o segurado falecido, cuja convivência perdurou até o passamento do de cujus.

5. Recurso que se nega provimento. Sentença confirmada por seus próprios fundamentos. 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Quarta Turma Recursal do Juizado Especial Federal da Terceira Região -- Seção Judiciária de São Paulo --, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.