APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5019548-36.2020.4.03.6100
RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
APELADO: CLINICA UROLOGICA MIGUEL SROUGI S/S
Advogados do(a) APELADO: FABIO MESQUITA PEREIRA SROUGE - SP329749-A, NATALIA AFFONSO PEREIRA - SP326304-A
OUTROS PARTICIPANTES:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5019548-36.2020.4.03.6100 RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: CLINICA UROLOGICA MIGUEL SROUGI S/S Advogados do(a) APELADO: FABIO MESQUITA PEREIRA SROUGE - SP329749-A, NATALIA AFFONSO PEREIRA - SP326304-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de embargos de declaração (ID 272969059) opostos pela União Federal (Fazenda Nacional) em face de v. acórdão (ID 271485447) que, por unanimidade, deu parcial provimento à apelação da União Federal e à remessa oficial, apenas para reconhecer que a compensação dos valores indevidamente recolhidos deve observar o disposto no art. 26-A, da Lei nº 11.457/2007, incluído pela Lei nº 13.670/2018. O v. acórdão foi proferido em sede de mandado de segurança impetrado por Clínica Urológica Miguel Srougi Ltda. contra ato do Sr. Delegado da Receita Federal do Brasil em São Paulo, objetivando provimento jurisdicional no sentido de recolher o IRPJ e a CSLL, mediante a aplicação do percentual de presunção do lucro de 8% e 12%, sobre os serviços de urologia tipicamente hospitalares (cirurgias, exames, procedimentos menos invasivos, tratamentos de doenças como câncer e outras), nos termos da Lei nº 9.249/1995 e conforme jurisprudência pátria sobre o tema, de modo que serão excluídas da benesse apenas as receitas decorrentes de simples consultas médicas e outras atividades administrativas. Pugna, ainda, pelo reconhecimento do seu direito ao ressarcimento integral dos valores pagos a maior à partir de março de 2020, ocasião em que já detinha todos os requisitos legais para fazer jus a aplicação do percentual de presunção reduzido do lucro, sob a forma de restituição administrativa assegurada pelos artigos 73 e 74 da Lei nº 9.430/96 e art. 165, I do CTN , de modo que os referidos créditos deverão ser atualizados pela Taxa Selic desde o seu pagamento indevido e até a sua devolução efetiva. Para melhor compreensão, transcreve-se a ementa do v. acórdão embargado: “MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUTÁRIO. IRPJ. CSLL. LEI 9.249/95. REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.727/08. ALÍQUOTAS DE 8% E 12%. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS HOSPITALARES. RESP 1.116.399/BA. PRAZO PRESCRICIONAL. LC 118/05. RE 566.621/RS. COMPENSAÇÃO. ART. 26-A DA LEI N° 11.457/2007. OBSERVÂNCIA. 1. Não há que se falar da necessidade de que a prestação do serviço hospitalar se faça em instalação própria, consoante consta expressamente do art. 4º, §2º, II, alínea “a”, e §10, da IN RFB 1.515/14, com a redação dada pela IN RFB 1.556/15. 2. Da simples leitura das Instruções Normativas se constata que houve desbordo de sua função meramente regulamentar, apresentando limitações não previstas em lei para a incidência das alíquotas de 8% e 12% para IRPJ e CSLL, respectivamente; ademais, o REsp 1.116.399/BA, em cuja observância as INs teriam sido editadas, segundo a ré, não excepciona as hipóteses administrativamente expressas, somente excluindo do escopo legal “as simples consultas médicas”. 3. Quanto ao requisito relacionado ao atendimento das normas da Anvisa, adoto nas minhas razões de decidir entendimento existente nesta E. Corte no sentido de que a comprovação deve se dar através de alvará de funcionamento, expedido pela vigilância sanitária estadual ou municipal, conforme o caso, nos termos do próprio entendimento da administração tributária, constante na IN RFB nº 1.700/17, artigo 33, § 3º. 4. No caso dos autos, verifico que a impetrante carreou aos autos licença de funcionamento da vigilância sanitária (ID n° 251868042), atendendo assim ao requisito relacionado ao atendimento das normas da Anvisa. 5. Destaco, ainda, que esta E. Turma já se manifestou sobre o tema observando que a legislação em vigor não define, especificamente a quais normas deve o contribuinte submeter-se. Ademais disso, inexiste indicação nos autos de que a impetrante não atenda às normas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, cabendo ao Fisco trazer elementos que indiquem o descumprimento de tais regras. 6. O prazo prescricional para pleitear judicialmente a compensação de indébito é de cinco anos, contados da data do pagamento indevido, para ações ajuizadas após 09.06.2005, consoante o caso em tela, uma vez ajuizada a presente demanda em 01.10.2020 (ID n° 251868038). Destarte, sujeitos à compensação os valores indevidamente pagos a título de IRPJ e CSLL a partir de 01.10.2015. 7. Cumpre salientar, ainda, que a presente demanda foi proposta após a entrada em vigor da Lei nº 13.670/2018, que revogou o art. 26 da Lei nº 11.457/2007, não se aplicando mais a vedação da compensação dos valores recolhidos indevidamente com as contribuições sociais elencadas no artigo 11, parágrafo único, alíneas "a", "b" e "c" da Lei nº 8.212/1991. No entanto, deve-se observar as condições previstas no art. 26-A da Lei nº 11.457/2007, incluído pela Lei nº 13.670/2018. 8. Vale dizer, não são compensáveis a) as contribuições previdenciárias do contribuinte que não utilizar o e-Social; b) débitos apurados anteriormente ao e-Social e c) créditos das contribuições relativos a períodos anteriores à utilização do e-Social. Em suma: só se admite a compensação indistinta de créditos novos com débitos novos, não se aplicando retroativamente a legislação, cabendo ao Fisco a análise do implemento das condições necessárias para a referida compensação, no âmbito administrativo, inclusive quanto à inscrição do contribuinte no e-Social. 9. Apelação da União Federal e remessa oficial parcialmente providas.” A embargante, em suas razões, alega que o v. acórdão foi contraditório, pois no próprio relatório consta que o pedido de ressarcimento é a partir de março de 2020 e que o próprio MM. Juízo a quo assegurou o recolhimento a partir de março, porém na fundamentação reconheceu a prescrição quinquenal. Alega, ainda, que o v. acórdão foi omisso, pois a fim de fazer jus às alíquotas minoradas de IRPJ e CSLL é preciso que a prestadora de serviços se encontre organizada sob a forma de sociedade empresária (excluídas, portanto, as sociedades simples e os empresários individuais), tenha alvará sanitário (art. 15, § 1º, inc. III, alínea “a”, da Lei 9.249/1995, com a redação dada pela Lei 11.727/2008) e atenda às normas da ANVISA mediante alvará da vigilância sanitária estadual ou municipal, no entanto, o Auto de Licença de Funcionamento (ID n° 251868042), no qual consta “CNAE: 8630-5/01 - Atividade médica ambulatorial com Versão CNAE: 2.3 recursos para realização de procedimentos cirúrgico”, foi emitido em 13/08/2020 e não há prova nos autos de que, anteriormente à referida data, possuía a parte impetrante licença. Por fim, no âmbito da remessa necessária (art. 14, §1º, da Lei nº 12.016/2009), deixou o v. acórdão de considerar que a sentença assegurou ao impetrante a restituição administrativa dos valores que teriam sido recolhidos a maior, em afronta ao disposto no art. 100 da CF. Prequestiona a matéria para fins de interposição de recurso especial ou extraordinário. Intimada, a parte embargada manifestou-se nos autos (ID 273538748). É o relatório.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5019548-36.2020.4.03.6100 RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: CLINICA UROLOGICA MIGUEL SROUGI S/S Advogados do(a) APELADO: FABIO MESQUITA PEREIRA SROUGE - SP329749-A, NATALIA AFFONSO PEREIRA - SP326304-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Como é cediço, os embargos de declaração, a teor do disposto no art. 1.022 do CPC, somente têm cabimento nos casos de obscuridade ou contradição (inc. I) ou de omissão (inc. II). Conforme o disposto no v. acórdão, as alíquotas de IRPJ e CSLL incidentes no caso concreto são previstas pelos art. 15, caput e §1º, III, alínea “a”, e art. 20, ambos da Lei nº 9.249/1995, com redação dada pela Lei nº 11.727/2008. Não há que se falar, ainda, da necessidade de que a prestação do serviço hospitalar se faça em instalação própria, consoante consta expressamente do art. 4º, §2º, II, alínea “a”, e §10, da IN RFB nº 1.515/2014, com a redação dada pela IN RFB nº 1.556/2015. No caso concreto, não assiste razão à União Federal; da simples leitura das Instruções Normativas se constata que houve desbordo de sua função meramente regulamentar, apresentando limitações não previstas em lei para a incidência das alíquotas de 8% e 12% para IRPJ e CSLL, respectivamente; ademais, o REsp nº 1.116.399/BA, em cuja observância as INs teriam sido editadas, segundo a ré, não excepciona as hipóteses administrativamente expressas, somente excluindo do escopo legal “as simples consultas médicas”. Quanto ao requisito relacionado ao atendimento das normas da Anvisa, adoto nas minhas razões de decidir entendimento existente nesta E. Corte no sentido de que a comprovação deve se dar através de alvará de funcionamento, expedido pela vigilância sanitária estadual ou municipal, conforme o caso, nos termos do próprio entendimento da administração tributária, constante na IN RFB nº 1.700/2017, artigo 33, § 3º. No caso dos autos, verifico que a impetrante carreou aos autos licença de funcionamento da vigilância sanitária (ID n° 251868042), a partir de março de 2020, atendendo assim ao requisito relacionado ao atendimento das normas da Anvisa. Destaco, ainda, que esta E. Turma já se manifestou sobre o tema observando que a legislação em vigor não define, especificamente a quais normas deve o contribuinte submeter-se. Ademais disso, inexiste indicação nos autos de que a impetrante não atenda às normas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, cabendo ao Fisco trazer elementos que indiquem o descumprimento de tais regras. Quanto à prescrição, retifico a fundamentação do v. acórdão embargado, sob pena de reformatio in pejus, leia-se: “Desse modo, o prazo prescricional para pleitear judicialmente a compensação de indébito é a partir de março de 2020, contados da data do pagamento indevido. Destarte, sujeitos à compensação os valores indevidamente pagos a título de IRPJ e CSLL a partir de 03.2020.” Com relação a autorização de restituição administrativa, com razão a embargante. Quanto ao pedido de restituição de valores, deve-se consignar que o mandado de segurança não é a via adequada para obter efeitos patrimoniais pretéritos à impetração, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal pacificado por meio das Súmulas nº 269 e nº 271, porquanto a legislação de regência não prevê fase de liquidação no âmbito mandamental, razão pela qual não cabe a restituição administrativa de indébito fiscal. Além disso, a restituição administrativa de indébito fiscal decorrente de decisão judicial possibilitaria pagamento em pecúnia ao contribuinte, em flagrante violação ao disposto no artigo 100, da Constituição Federal. Precedentes do STF (RE nº 1372080/SP, Relator Ministro Gilmar Mendes, j. em 27/04/2022, Data de Publicação: 03/05/2022 e RE nº 1367549/SP, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, j. em 24/02/2022, Data de Publicação: 02/03/2022). Todavia, no julgamento do RE nº 889.173/MS (Tema 831 do STF), o e. STF determinou que os pagamentos devidos pela Fazenda Pública em razão de decisão judicial proferida em ação mandamental devem se dar mediante a expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o valor da condenação, nos termos do artigo 100 da Constituição Federal, apenas quanto ao montante apurado entre a data da impetração do mandado de segurança e a da efetiva implementação da ordem concessiva de segurança. A respeito: STF - ARE: 1393633/PR, Relator Min. NUNES MARQUES, Data de Julgamento: 02/03/2023, DJe-043 DIVULG 07/03/2023 PUBLIC 08/03/2023). Desse modo, revejo posicionamento anterior e passo a adotar a orientação firmada pelo E. STF, a fim de consignar a impossibilidade da utilização da via administrativa para restituição de indébito fiscal reconhecido judicialmente, mantido o direito à compensação de acordo com os critérios apontados e a expedição de precatório/requisitório nos moldes do Tema 831 do E. STF. No mais, pretende a embargante ou rediscutir matéria já decidida, o que denota o caráter infringente dos presentes embargos, ou, a título de prequestionamento, que esta E. Corte responda, articuladamente, a quesitos ora formulados. Ora, desconstituir os fundamentos do acórdão embargado implicaria, “in casu”, em inevitável reexame da matéria, incompatível com a natureza dos embargos declaratórios. A respeito, trago à colação aresto citado por Theotônio Negrão em “Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor”, Editora Saraiva, 35ª ed., 2003, p. 593, “in verbis”: “Os embargos de declaração não constituem recurso idôneo para corrigir os fundamentos de uma decisão (Bol AASP 1.536/122).” Sob outro aspecto, o julgador não está adstrito a examinar, um a um, todas as normas legais ou argumentos trazidos pelas partes, bastando que decline fundamentos suficientes para lastrear sua decisão (RSTJ 151/229, TRF/3ªR, Proc. 93.03.028288-4, 4ª T., DJ 29.04.1997, p. 28722 e RJTJESP 115/207). Diante do exposto, acolho parcialmente os embargos de declaração, para sanar a omissão apontada, apenas para reconhecer indevido o pedido de restituição do indébito na via administrativa, bem como a compensação do indébito é a partir de março de 2020. É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO OU CONTRADIÇÃO EXISTENTE. IRPJ E CSL. PRESCRIÇÃO. RESTITUIÇÃO ADMINISTRATIVA. NÃO CABIMENTO. EMBARGOS PARCIALMENTE ACOLHIDOS.
1. Existindo no acórdão embargado omissão ou contradição a serem sanadas, acolhem-se os embargos opostos sob tais fundamentos.
2. Quanto ao pedido de restituição de valores, deve-se consignar que o mandado de segurança não é a via adequada para obter efeitos patrimoniais pretéritos à impetração, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal pacificado por meio das Súmulas nº 269 e nº 271, porquanto a legislação de regência não prevê fase de liquidação no âmbito mandamental, razão pela qual não cabe a restituição administrativa de indébito fiscal. Além disso, a restituição administrativa de indébito fiscal decorrente de decisão judicial possibilitaria pagamento em pecúnia ao contribuinte, em flagrante violação ao disposto no artigo 100, da Constituição Federal. Precedentes do STF (RE nº 1372080/SP, Relator Ministro Gilmar Mendes, j. em 27/04/2022, Data de Publicação: 03/05/2022 e RE nº 1367549/SP, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, j. em 24/02/2022, Data de Publicação: 02/03/2022).
3. Todavia, no julgamento do RE nº 889.173/MS (Tema 831 do STF), o e. STF determinou que os pagamentos devidos pela Fazenda Pública em razão de decisão judicial proferida em ação mandamental devem se dar mediante a expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o valor da condenação, nos termos do artigo 100 da Constituição Federal, apenas quanto ao montante apurado entre a data da impetração do mandado de segurança e a da efetiva implementação da ordem concessiva de segurança. A respeito: STF - ARE: 1393633/PR, Relator Min. NUNES MARQUES, Data de Julgamento: 02/03/2023, DJe-043 DIVULG 07/03/2023 PUBLIC 08/03/2023).
4. Desse modo, revejo posicionamento anterior e passo a adotar a orientação firmada pelo E. STF, a fim de consignar a impossibilidade da utilização da via administrativa para restituição de indébito fiscal reconhecido judicialmente, mantido o direito à compensação de acordo com os critérios apontados e a expedição de precatório/requisitório nos moldes do Tema 831 do E. STF.
5. Prescrição do indébito, a partir de 03.2020, quando preenchidos os requisitos.
6. Demais omissões ou contradições não existentes.
7. Embargos parcialmente acolhidos.