Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0025978-65.2015.4.03.6100

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: ASSOCIACAO DE BENEFICENCIA E FILANTROPIA SAO CRISTOVAO

Advogados do(a) APELANTE: CASSIO RODRIGO DE ALMEIDA - SP207281-A, FELIPE INACIO ZANCHET MAGALHAES - SP212574-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0025978-65.2015.4.03.6100

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: ASSOCIACAO DE BENEFICENCIA E FILANTROPIA SAO CRISTOVAO

Advogados do(a) APELANTE: CASSIO RODRIGO DE ALMEIDA - SP207281-A, FELIPE INACIO ZANCHET MAGALHAES - SP212574-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Trata-se de apelação interposta por ASSOCIAÇÃO DE BENEFICÊNCIA E FILANTROPIA SÃO CRISTÓVÃO contra sentença que julgou improcedentes os pedidos deduzidos em ação ordinária que visava anular a NFLD nº 35.109.557-2 (processo administrativo nº 35364.005313/2006-5), lavrada em virtude de a fiscalização caracterizar como empregados, no período de janeiro/1992 a setembro/2001, os médicos exercentes de atividade no Hospital e Maternidade São Cristóvão. Condenou a parte-autora ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa (art. 85, §§3°, I e 4°, III do CPC).

Sustenta a recorrente, em síntese, que: a) ao contrário do aduzido na r. sentença, o laudo pericial produzido nos autos do processo conexo nº 0010401-86.2011.403.6100 comprova a ausência dos requisitos previstos no art. 3º da CLT; b) entendendo que a perícia contábil e administrativa produzida naqueles autos não seria apta a refletir a inexistência da relação de emprego, o Juízo a quo deveria ter indeferido sua juntada, bem como determinado a realização de nova perícia, nos termos do art. 480 do CPC; c) os contratos de prestação de serviço acostados aos autos comprovam a inexistência dos elementos caracterizadores da relação de emprego entre a apelante e seus médicos; d) a obediência dos médicos ao Corpo Clínico não caracteriza subordinação jurídica, nem implica relação empregatícia, conforme decisão no processo nº 026150008.2009.5.02.0028; e) a instalação do Corpo Clínico decorre de exigência constante do Decreto n. 20.931/1932 e da Resolução CFM n. 1.418/97, de 8 de agosto de 1997, do Conselho Federal de Medicina; f) o acatamento de determinadas regras internas por parte dos médicos visa tão somente a concretização dos princípios e regras estabelecidas pelo Código de Ética Médico que regulamenta o exercício da profissão, o que não se confunde com subordinação ou qualquer outro elemento caracterizador de vínculo empregatício; g) nos autos do processo administrativo n. 35366.002882/2005-04 (fls. 1.089/1.091 do feito conexo), houve indicação individualizada de todos os médicos listados no DEBCAD n. 39.105.578-0 e o respectivo documento que descaracterizava, de forma inequívoca, a relação de emprego confirmada na sentença ora impugnada; h) no cumprimento das Diligências n.s 09219721 e 093169431,  a apelada revisou o lançamento tributário com exclusão de valores da DEBCAD n. 35.109.577-2; i) houve o requerimento para apresentação do procedimento administrativo na inicial, sem que tenha havido apreciação do juízo a quo, razão pela qual este foi juntado nos embargos de declaração, de modo que a não apreciação deste acarreta cerceamento de defesa. Requer a concessão de efeito suspensivo ao recurso.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte. 

É o breve relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0025978-65.2015.4.03.6100

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: ASSOCIACAO DE BENEFICENCIA E FILANTROPIA SAO CRISTOVAO

Advogados do(a) APELANTE: CASSIO RODRIGO DE ALMEIDA - SP207281-A, FELIPE INACIO ZANCHET MAGALHAES - SP212574-A

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OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Inicialmente, não vislumbro o alegado cerceamento de defesa. De fato, embora a parte-autora tenha requerido, na petição inicial do presente feito, a juntada do expediente administrativo n. 35364.005313/2006-57 (NFLD n. 2 53.109.557-2), não instruiu a exordial com cópia integral deste e, ao ser intimada para especificar as provas que pretendia produzir, requereu apenas a produção de prova pericial.

Nesse ponto, registre-se a existência de jurisprudência consolidada no E.STJ no sentido de que “preclui o direito à prova se a parte, intimada para especificar as que pretendia produzir, não se manifesta oportunamente, e a preclusão ocorre mesmo que haja pedido de produção de provas na inicial ou na contestação, mas a parte silencia na fase de especificação.” (AgRg no AREsp 645.985/SP, Rel. Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 16/06/2016, DJe 22/06/2016).

Nesse mesmo sentido, confiram-se os seguintes julgados daquela Corte Superior: AgInt no AgInt no AREsp 1737707/SP, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 30/8/2021, DJe 2/9/2021); AgInt no AREsp n. 950.804/SP, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 18/2/2020, DJe de 12/3/2020; AgInt no AREsp n. 2.048.388/RS, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 9/11/2022, DJe de 18/11/2022.

Destarte, não tendo reiterado, no momento de especificação das provas, a prova documental consistente no processo administrativo da autuação impugnada, não há que se falar em cerceamento de defesa.

Quanto ao mérito, a lide posta nos autos diz respeito à caracterização de relação de emprego ou de trabalho autônomo terceirizado, tendo como consequência a existência (ou não) de obrigação tributária concernente à contribuição previdenciária patronal.

O art. 12, I, "a", da Lei nº 8.212/1991, define como segurado obrigatório da Previdência Social o empregado, assim considerado aquele que presta serviço de natureza urbana ou rural à empresa, em caráter não eventual, sob sua subordinação e mediante remuneração (inclusive como diretor empregado). Esse preceito da Lei nº 8.212/1991 é coerente com o no art. 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (Decreto-Lei nº 5.452, de 1º/05/1943), in verbis:

Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.

Considerando o contido no art. 3º da CLT e no art. 12, I, "a", da Lei nº 8.212/1991 (compreendidos à luz do art. 110 do CTN), para que se configure a relação de emprego é necessário que se façam presentes, concomitantemente subordinação, não-eventualidade (permanência, habitualidade), pessoalidade e remuneração. À falta de um deles, restará descaracterizado o vínculo laboral e, portanto, estará a empresa desobrigada de recolher o tributo exigido.

A distinção entre a relação de emprego e a de trabalho autônomo depende essencialmente (mas não só) da subordinação e da não-eventualidade (permanência e habitualidade – Tema 20/STF). Caberá ao Fisco o ônus de demonstrar relação de emprego se existirem registros formais de trabalho como terceirizado ou autônomo, servindo-se da primazia da realidade em contraste com elementos formais (art. 9° da CLT). Havendo autuação fiscal fundamentada, o ônus caberá ao autuado dada a presunção de veracidade e de validade dos atos administrativos (o mesmo em se tratando de inscrição em dívida ativa e em CDA).

A subordinação jurídica pode ocorrer mesmo quando o trabalho é prestado fora das dependências da empresa (ex: trabalhador em domicílio), se restar comprovada a submissão a ordens do empregador, exigência de produção mínima e fiscalização do trabalho (essa última pode ocorrer mesmo de forma indireta, mediante aferição de qualidade do trabalho desenvolvido).

A respeito do tema, trago à colação os seguintes precedentes deste E. TRF da 3ª Região:


AGRAVO LEGAL. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. MULTA TRABALHISTA. VÍNCULO TRABALHISTA NÃO DEMONSTRADO. TRABALHADORES AUTÔNOMOS. RECOLHIMENTO DE FGTS. INEXIGIBILIDADE. AUTO DE INFRAÇÃO E CDA DESCONSTITUÍDOS. AGRAVO IMPROVIDO. 1. De acordo com a legislação trabalhista, os elementos necessários à configuração da relação de emprego são subordinação, habitualidade, pessoalidade e onerosidade. À falta de um destes elementos, restará descaracterizado o vínculo empregatício e, portanto, estará desobrigada a empresa de promover o recolhimento de depósitos fundiários a que estaria obrigada caso os elementos previstos no referido artigo estivessem presentes. 2. In casu, verifico que os documentos dos autos referem-se aos trabalhadores elencados no auto de infração, e dão conta de que os mesmos mantêm vínculo empregatício com outras empresas, ou possuem microempresa, atuando, portanto, como prestadores de serviço ou autônomos. 3. Afastado o fato imponível (vínculo empregatício), afasta-se a presunção de certeza e liquidez da CDA, título executivo extrajudicial que embasou a execução fiscal. Precedentes. 4. No tocante ao prequestionamento ressalto que, estando a decisão devidamente fundamentada, não está o Magistrado obrigado a analisar todos os pontos aduzidos pela parte. Precedentes. 5. Agravo legal improvido.
(AC 2004.03.99.018530-0, SEXTA TURMA, Relatora Desembargadora Federal CONSUELO YOSHIDA, julgado em 26/03/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:10/04/2015)

 

EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. DÉBITOS DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. MOTORISTAS DE TÁXI CONTRATADOS POR EMPRESA LOCADORA. INCONSTITUCIONALIDADE DO PRO LABORE RECONHECIDA PELO E. STF. INOCORRÊNCIA DE VÍNCULO DE EMPREGO. TRABALHO DE NATUREZA AUTÔNOMA. HONORÁRIOS. PRECEDENTES. 1. São inconstitucionais as expressões "autônomos e administradores" e "avulsos, autônomos e administradores" contidas, respectivamente no inciso I do art. 22 da Lei nº 8.212/91. 2. Não há relação de emprego entre empresas locadoras de táxis e motoristas autônomos por ela contratados, os quais assumem os riscos da atividade econômica. Neste caso, não incide contribuição previdenciária, sobretudo se não existe demonstração de fraude no contrato. 3. É do INSS o ônus da prova do vínculo empregatício, no momento da fiscalização. O agente não pode agir de maneira ilegal ou arbitrária, nem chegar a conclusões precipitadas. 4. O embargante logrou demonstrar, de maneira razoável, que os "taxistas" prestaram serviços na condição de autônomos, não se sujeitando aos requisitos legais da relação de emprego - subordinação, permanência (habitualidade) e onerosidade. 5. Militam em favor desta tese especialmente os contratos de locação de táxi, pelos quais se observa que os motoristas - registrados como autônomos - assumem os riscos da atividade de transporte de passageiros, responsabilizando-se pela manutenção do veículo e despesas com combustível. 6. Em relação a estas avenças, não existem indicativos de fraude, nem vícios de qualquer espécie, que poderiam macular a autonomia da vontade. 7. Nenhuma prova em sentido contrário restou produzida pelo INSS. 8. Honorários advocatícios a serem suportados pelo INSS, a teor do art. 20, § 4º, do CPC, em apreciação eqüitativa. 9. Apelo do devedor provido.
(AC n. 0000539-25.2000.4.03.6182, JUDICIÁRIO EM DIA - TURMA A, Relator JUIZ Federal CONVOCADO CESAR SABBAG, julgado em 10/06/2011, e-DJF3 Judicial 1 DATA:01/07/2011)

 

TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. VENDEDORES AUTÔNOMOS. VÍNCULO EMPREGATÍCIO. PROVA. INEXISTÊNCIA. TRIBUTO INDEVIDO. APELAÇÃO DO INSS E REMESSA OFICIAL IMPROVIDAS. I - A embargante comprovou que os vendedores que lhe prestavam serviços o faziam na qualidade de autônomos (pessoas jurídicas), inclusive emitindo os correspondentes recibos de pagamentos e notas fiscais. É certo que a empresa pagava ajuda de custo e comissões aos vendedores, porém tal fato não é suficiente por si só para configurar a relação de emprego (CLT, art. 3º). II - Ilidida a presunção de liquidez e certeza da certidão de dívida ativa, é de rigor a procedência dos embargos. III - Apelação do INSS e remessa oficial improvidas.
(APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA n. 1201990-76.1995.4.03.6112, JUDICIÁRIO EM DIA - TURMA B, Relator Juiz Federal Convocado NELSON PORFIRIO, julgado em 27/05/2011, e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/06/2011)

A Súmula 331/TST proibia a terceirização de atividades-fim e responsabilizava o contratante pelas obrigações trabalhistas referentes aos empregados da empresa terceirizada, mas esse entendimento foi revisto no Tema 725/STF, no qual foi firmada a seguinte Tese: "É lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da contratante." (Tema 725). Na ocasião, a Excelsa Corte reputou inconstitucional a Súmula 331/TST, por violação à livre iniciativa e à liberdade contratual. Eis a ementa do julgado:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA COM REPERCUSSÃO GERAL. DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO DO TRABALHO. CONSTITUCIONALIDADE DA “TERCEIRIZAÇÃO”. ADMISSIBILIDADE. OFENSA DIRETA. VALORES SOCIAIS DO TRABALHO E DA LIVRE INICIATIVA (ART. 1º, IV, CRFB). RELAÇÃO COMPLEMENTAR E DIALÓGICA, NÃO CONFLITIVA. PRINCÍPIO DA LIBERDADE JURÍDICA (ART. 5º, II, CRFB). CONSECTÁRIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA (ART. 1º, III, CRFB). VEDAÇÃO A RESTRIÇÕES ARBITRÁRIAS E INCOMPATÍVEIS COM O POSTULADO DA PROPORCIONALIDADE. DEMONSTRAÇÃO EMPÍRICA DA NECESSIDADE, ADEQUAÇÃO E PROPORCIONALIDADE ESTRITA DE MEDIDA RESTRITIVA COMO ÔNUS DO PROPONENTE DESTA. RIGOR DO ESCRUTÍNIO EQUIVALENTE À GRAVIDADE DA MEDIDA. RESTRIÇÃO DE LIBERDADE ESTABELECIDA JURISPRUDENCIALMENTE. EXIGÊNCIA DE GRAU MÁXIMO DE CERTEZA. MANDAMENTO DEMOCRÁTICO. LEGISLATIVO COMO LOCUS ADEQUADO PARA ESCOLHAS POLÍTICAS DISCRICIONÁRIAS. SÚMULA 331 TST. PROIBIÇÃO DA TERCEIRIZAÇÃO. EXAME DOS FUNDAMENTOS. INEXISTÊNCIA DE FRAGILIZAÇÃO DE MOVIMENTOS SINDICAIS. DIVISÃO ENTRE “ATIVIDADE-FIM” E “ATIVIDADE-MEIO” IMPRECISA, ARTIFICIAL E INCOMPATÍVEL COM A ECONOMIA MODERNA. CISÃO DE ATIVIDADES ENTRE PESSOAS JURÍDICAS DISTINTAS. ESTRATÉGIA ORGANIZACIONAL. INEXISTÊNCIA DE CARÁTER FRAUDULENTO. PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL DA LIBERDADE DE DESENHO EMPRESARIAL (ARTS. 1º, IV, E 170). CIÊNCIAS ECONÔMICAS E TEORIA DA ADMINISTRAÇÃO. PROFUSA LITERATURA SOBRE OS EFEITOS POSITIVOS DA TERCEIRIZAÇÃO. OBSERVÂNCIA DAS REGRAS TRABALHISTAS POR CADA EMPRESA EM RELAÇÃO AOS EMPREGADOS QUE CONTRATAREM. EFEITOS PRÁTICOS DA TERCEIRIZAÇÃO. PESQUISAS EMPÍRICAS. NECESSÁRIA OBSERVÂNCIA DE METODOLOGIA CIENTÍFICA. ESTUDOS DEMONSTRANDO EFEITOS POSITIVOS DA TERCEIRIZAÇÃO QUANTO A EMPREGO, SALÁRIOS, TURNOVER E CRESCIMENTO ECONÔMICO. INSUBSISTENTÊNCIA DAS PREMISSAS DA PROIBIÇÃO JURISPRUDENCIAL DA TERCEIRIZAÇÃO. INCONSTITUCIONALIDADE DOS INCISOS I, III, IV E VI DA SÚMULA 331 DO TST. AFASTAMENTO DA RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA CONTRATATE POR OBRIGAÇÕES DA CONTRATADA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO. 1. Recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida para examinar a constitucionalidade da Súmula n.º 331 do Tribunal Superior do Trabalho, no que concerne à proibição da terceirização de atividades-fim e responsabilização do contratante pelas obrigações trabalhistas referentes aos empregados da empresa terceirizada. 2. Interesse recursal subsistente após a aprovação das Leis nº. 13.429, de 31 de março de 2017, e 13.467, de 13 de julho de 2017, as quais modificaram a Lei n.º 6.019/1974 para expressamente consagrar a terceirização das chamadas “atividades-fim”, porquanto necessário não apenas fixar o entendimento desta Corte sobre a constitucionalidade da tese esposada na Súmula nº. 331 do TST quanto ao período anterior à vigência das referidas Leis, como também deliberar a respeito da subsistência da orientação sumular do TST posteriormente às reformas legislativas. 3. A interpretação jurisprudencial do próprio texto da Carta Magna, empreendida pelo Tribunal a quo, revela a admissibilidade do apelo extremo, por traduzir ofensa direta e não oblíqua à Constituição. Inaplicável, dessa forma, a orientação esposada na Súmula nº 636 desta Egrégia Corte. Mais além, não tem incidência o verbete sumular nº 283 deste Egrégio Tribunal, porquanto a motivação de cunho legal do aresto recorrido é insuficiente para validar o acórdão de forma autônoma. 4. Os valores do trabalho e da livre iniciativa, insculpidos na Constituição (art. 1º, IV), são intrinsecamente conectados, em uma relação dialógica que impede seja rotulada determinada providência como maximizadora de apenas um desses princípios, haja vista ser essencial para o progresso dos trabalhadores brasileiros a liberdade de organização produtiva dos cidadãos, entendida esta como balizamento do poder regulatório para evitar intervenções na dinâmica da economia incompatíveis com os postulados da proporcionalidade e da razoabilidade. 5. O art. 5º, II, da Constituição consagra o princípio da liberdade jurídica, consectário da dignidade da pessoa humana, restando cediço em sede doutrinária que o “princípio da liberdade jurídica exige uma situação de disciplina jurídica na qual se ordena e se proíbe o mínimo possível” (ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 177). 6. O direito geral de liberdade, sob pena de tornar-se estéril, somente pode ser restringido por medidas informadas por parâmetro constitucionalmente legítimo e adequadas ao teste da proporcionalidade. 7. O ônus de demonstrar empiricamente a necessidade e adequação da medida restritiva a liberdades fundamentais para o atingimento de um objetivo constitucionalmente legítimo compete ao proponente da limitação, exigindo-se maior rigor na apuração da certeza sobre essas premissas empíricas quanto mais intensa for a restrição proposta. 8. A segurança das premissas empíricas que embasam medidas restritivas a direitos fundamentais deve atingir grau máximo de certeza nos casos em que estas não forem propostas pela via legislativa, com a chancela do debate público e democrático, restando estéreis quando impostas por construção jurisprudencial sem comprovação inequívoca dos motivos apontados. 9. A terceirização não fragiliza a mobilização sindical dos trabalhadores, porquanto o art. 8º, II, da Constituição contempla a existência de apenas uma organização sindical para cada categoria profissional ou econômica, mercê de a dispersão territorial também ocorrer quando uma mesma sociedade empresarial divide a sua operação por diversas localidades distintas. 10. A dicotomia entre “atividade-fim” e “atividade-meio” é imprecisa, artificial e ignora a dinâmica da economia moderna, caracterizada pela especialização e divisão de tarefas com vistas à maior eficiência possível, de modo que frequentemente o produto ou serviço final comercializado por uma entidade comercial é fabricado ou prestado por agente distinto, sendo também comum a mutação constante do objeto social das empresas para atender a necessidades da sociedade, como revelam as mais valiosas empresas do mundo. É que a doutrina no campo econômico é uníssona no sentido de que as “Firmas mudaram o escopo de suas atividades, tipicamente reconcentrando em seus negócios principais e terceirizando muitas das atividades que previamente consideravam como centrais” (ROBERTS, John. The Modern Firm: Organizational Design for Performance and Growth. Oxford: Oxford University Press, 2007). 11. A cisão de atividades entre pessoas jurídicas distintas não revela qualquer intuito fraudulento, consubstanciando estratégia, garantida pelos artigos 1º, IV, e 170 da Constituição brasileira, de configuração das empresas para fazer frente às exigências dos consumidores, justamente porque elas assumem o risco da atividade, representando a perda de eficiência uma ameaça à sua sobrevivência e ao emprego dos trabalhadores. 12. Histórico científico: Ronald H. Coase, “The Nature of The Firm”, Economica (new series), Vol. 4, Issue 16, p. 386-405, 1937. O objetivo de uma organização empresarial é o de reproduzir a distribuição de fatores sob competição atomística dentro da firma, apenas fazendo sentido a produção de um bem ou serviço internamente em sua estrutura quando os custos disso não ultrapassarem os custos de obtenção perante terceiros no mercado, estes denominados “custos de transação”, método segundo o qual firma e sociedade desfrutam de maior produção e menor desperdício. 13. A Teoria da Administração qualifica a terceirização (outsourcing) como modelo organizacional de desintegração vertical, destinado ao alcance de ganhos de performance por meio da transferência para outros do fornecimento de bens e serviços anteriormente providos pela própria firma, a fim de que esta se concentre somente naquelas atividades em que pode gerar o maior valor, adotando a função de “arquiteto vertical” ou “organizador da cadeia de valor”. 14. A terceirização apresenta os seguintes benefícios: (i) aprimoramento de tarefas pelo aprendizado especializado; (ii) economias de escala e de escopo; (iii) redução da complexidade organizacional; (iv) redução de problemas de cálculo e atribuição, facilitando a provisão de incentivos mais fortes a empregados; (v) precificação mais precisa de custos e maior transparência; (vi) estímulo à competição de fornecedores externos; (vii) maior facilidade de adaptação a necessidades de modificações estruturais; (viii) eliminação de problemas de possíveis excessos de produção; (ix) maior eficiência pelo fim de subsídios cruzados entre departamentos com desempenhos diferentes; (x) redução dos custos iniciais de entrada no mercado, facilitando o surgimento de novos concorrentes; (xi) superação de eventuais limitações de acesso a tecnologias ou matérias-primas; (xii) menor alavancagem operacional, diminuindo a exposição da companhia a riscos e oscilações de balanço, pela redução de seus custos fixos; (xiii) maior flexibilidade para adaptação ao mercado; (xiv) não comprometimento de recursos que poderiam ser utilizados em setores estratégicos; (xv) diminuição da possibilidade de falhas de um setor se comunicarem a outros; e (xvi) melhor adaptação a diferentes requerimentos de administração, know-how e estrutura, para setores e atividades distintas. 15. A terceirização de uma etapa produtiva é estratégia de organização que depende da peculiaridade de cada mercado e cada empresa, destacando a opinio doctorum que por vezes a configuração ótima pode ser o fornecimento tanto interno quanto externo (GULATI, Ranjay; PURANAM, Phanish; BHATTACHARYA, Sourav. "How Much to Make and How Much to Buy? An Analysis of Optimal Plural Sourcing Strategies." Strategic Management Journal 34, no. 10 (October 2013): 1145–1161). Deveras, defensável à luz da teoria econômica até mesmo a terceirização dos Conselhos de Administração das companhias às chamadas Board Service Providers (BSPs) (BAINBRIDGE, Stephen M.; Henderson, M. Todd. “Boards-R-Us: Reconceptualizing Corporate Boards” (July 10, 2013). University of Chicago Coase-Sandor Institute for Law & Economics Research Paper No. 646; UCLA School of Law, Law-Econ Research Paper No. 13-11). 16. As leis trabalhistas devem ser observadas por cada uma das empresas envolvidas na cadeia de valor com relação aos empregados que contratarem, tutelando-se, nos termos constitucionalmente assegurados, o interesse dos trabalhadores. 17. A prova dos efeitos práticos da terceirização demanda pesquisas empíricas, submetidas aos rígidos procedimentos reconhecidos pela comunidade científica para desenho do projeto, coleta, codificação, análise de dados e, em especial, a realização de inferências causais mediante correta aplicação de ferramentas matemáticas, estatísticas e informáticas, evitando-se o enviesamento por omissão de variáveis (“omitted variable bias”). 18. A terceirização, segundo estudos empíricos criteriosos, longe de “precarizar”, “reificar” ou prejudicar os empregados, resulta em inegáveis benefícios aos trabalhadores em geral, como a redução do desemprego, diminuição do turnover, crescimento econômico e aumento de salários, permitindo a concretização de mandamentos constitucionais como “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais”, “redução das desigualdades regionais e sociais” e a “busca do pleno emprego” (arts. 3º, III, e 170 CRFB). 19. A realidade brasileira, apurada em estudo específico, revela que “os trabalhadores das atividades de Segurança/vigilância recebem, em média, 5% a mais quando são terceirizados”, que “ocupações de alta qualificação e que necessitam de acúmulo de capital humano específico, como P&D [pesquisa e desenvolvimento] e TI [tecnologia da informação], pagam salários maiores aos terceirizados”, bem como afirmou ser “possível que [em] serviços nos quais os salários dos terceirizados são menores, o nível do emprego seja maior exatamente porque o ‘preço’ (salário) é menor” (ZYLBERSTAJN, Hélio et alii. “Diferencial de salários da mão de obra terceirizada no Brasil”. In: CMICRO - Nº32, Working Paper Series, 07 de agosto de 2015, FGV-EESP). 20. A teoria econômica, à luz dessas constatações empíricas, vaticina que, verbis: “Quando a terceirização permite às firmas produzir com menos custos, a competição entre firmas que terceirizam diminuirá os preços dos seus produtos. (...) consumidores terão mais dinheiro para gastar com outros bens, o que ajudará empregos em outras indústrias” (TAYLOR, Timothy. “In Defense of Outsourcing”. In: 25 Cato J. 367 2005. p. 371). 21. O escrutínio rigoroso das premissas empíricas assumidas pela Corte de origem revela insubsistentes as afirmações de fraude e precarização, não sendo suficiente para embasar a medida restritiva o recurso meramente retórico a interpretações de cláusulas constitucionais genéricas, motivo pelo qual deve ser afastada a proibição, em homenagem às liberdades fundamentais consagradas na Carta Magna (art. 1º, IV, art. 5º, II, e art. 170). 22. Em conclusão, a prática da terceirização já era válida no direito brasileiro mesmo no período anterior à edição das Leis nº. 13.429/2017 e 13.467/2017, independentemente dos setores em que adotada ou da natureza das atividades contratadas com terceira pessoa, reputando-se inconstitucional a Súmula nº. 331 do TST, por violação aos princípios da livre iniciativa (artigos 1º, IV, e 170 da CRFB) e da liberdade contratual (art. 5º, II, da CRFB). 23. As contratações de serviços por interposta pessoa são hígidas, na forma determinada pelo negócio jurídico entre as partes, até o advento das Leis nº. 13.429/2017 e 13.467/2017, marco temporal após o qual incide o regramento determinado na nova redação da Lei n.º 6.019/1974, inclusive quanto às obrigações e formalidades exigidas das empresas tomadoras e prestadoras de serviço. 24. É aplicável às relações jurídicas preexistentes à Lei n.º 13.429, de 31 de março de 2017, a responsabilidade subsidiária da pessoa jurídica contratante pelas obrigações trabalhistas não adimplidas pela empresa prestadora de serviços, bem como a responsabilidade pelo recolhimento das contribuições previdenciárias devidas por esta (art. 31 da Lei n.º 8.212/93), mercê da necessidade de evitar o vácuo normativo resultante da insubsistência da Súmula n.º 331 do TST. 25. Recurso Extraordinário a que se dá provimento para reformar o acórdão recorrido e fixar a seguinte tese: “É lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante.
(RE 958252, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 30/08/2018, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-199  DIVULG 12-09-2019  PUBLIC 13-09-2019) (g. n.)

No caso dos autos, a parte-autora pretende anular a NFLD nº 35.109.577-2, lavrada em 24/10/2001 pelos motivos a seguir expostos, de acordo com o relatório fiscal (id. 61745794 - Pág. 87/88, grifei):

1. Os valores constantes da NFLD - Notificação Fiscal de Lançamento de Debito, abrangendo as competências 0192 a 1298, referem-se a contribuições devidas face a caracterização como segurados-empregados, os profissionais médicos que exerceram atividade no Hospital e Maternidade São Cristóvão (CNPJ 60.975.174/0003), no período 0192 a 0901, tendo sido considerados pelo contribuinte como trabalhadores autônomos.

2. A fiscalização procedeu a caracterização dos médicos nominalmente constantes do relatório de fatos geradores, tendo formado sua convicção considerando os requisitos essenciais à relação empregatícia, a saber:

a) Pessoalidade:

os serviços executados pelos médicos constantes do relatório de fatos geradores revestiram-se do requisito da pessoalidade porque foram prestados por pessoas certas, específicas, conforme comprova o relação fornecida pelo contribuinte (conforme cópia do Auto Paulista), exercendo a medicina direta e pessoalmente.

b) Onerosidade:

a onerosidade do trabalho restou comprovada pelas folhas de pagamento aos médicos, examinadas pela fiscalização, onde constam os salários pagos em retribuição aos serviços executados.

c) Continuidade:

tendo a fiscalização abrangido o período 0192 a 0901, examinadas as relações de retenção de Imposto de Renda e folhas de pagamento aos referidos profissionais, constata-se que os profissionais, em sua maioria , prestou serviços durante todo o período, ininterruptamente, não se cogitando em eventualidade do serviços.

A habitualidade também se evidencia pela escala de médicos que prestam serviços publicada no periódico "Auto Paulista".

d) Subordinação:

em se tratando de atividade altamente intelectualizada, como é o exercício da medicina, sutil é a delimitação da subordinação diante do caso concreto.

A fiscalização constatou e concluiu que o contrato entre os médicos e a Sociedade de Beneficência e Filantropia São Cristóvão é um contrato de trabalho. Os médicos são subordinados na acepção técnica do termo.

Os referidos profissionais, elencados no relatório de fatos geradores, exercem suas atividades subordinados à Diretoria Clinica, a escala de horários fixadas pela Diretoria (7:30 as 10:30; 11:00 às 14:00 e 14:30 às 17:30) demonstra a exigência do horário do início do trabalho e o controle do cumprimento do mesmo, ainda que dentro da referida escala, seja permitido ao profissional adequar a sua disponibilidade de agendamentos, o profissional efetua os atendimentos em escala fixa. Eventuais cancelamentos no atendimento por parte dos médicos são efetuados mediante o impresso "solicitação de cancelamento"(cópia anexa), onde o médico deve fazer constar o motivo da solicitação. Saliento, que se trata de solicitação e não de comunicado, fato que também aponta no sentido da subordinação hierárquica.

Durante a ação fiscal, constatei, ainda que, eventuais reclamações de pacientes são encaminhadas ao SAC - Serviço de Atendimento ao Cliente, onde é feita uma triagem, estando sempre a conduta médica sujeita à consideração da diretoria clinica ou da coordenadoria do setor de atendimento, o que demonstra inequivocamente a subordinação.

Face o exposto, a fiscalização concluiu pela existência de elementos hábeis para a caracterização da relação empregatícia, afastada a autonomia, onde o profissional detém o poder de direção de sua própria atividade.

 

De acordo com os elementos dos autos, ao apreciar o recurso interposto pela parte-autora, a Segunda Seção de Julgamento do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais reconheceu a decadência das contribuições apuradas até a competência 09/1996, mantendo, contudo, o reconhecimento da relação de emprego. Essa decisão foi mantida pela Câmara Superior de Recursos Fiscais ao negar provimento ao recurso especial fazendário referente à decadência reconhecida (id. Num. 61745795 - Pág. 26/32, 36/42).

A parte-autora requereu a juntada, nos presentes autos, como prova emprestada, do laudo pericial contábil produzido na ação anulatória nº 0010401-86.2011.403.6100, a qual visa desconstituir a NFLD nº 35.109.578-0, na qual foram lançadas as “contribuições supostamente devidas face à caracterização como segurados-empregados, os profissionais médicos que exercem atividade no Hospital e Maternidade São Cristóvão (CNPJ 60.975.174/0003), tendo sido considerados pelo contribuinte como trabalhadores autônomos, no período de janeiro de 1999 a setembro de 2001”, e em relação à qual foi reconhecida a conexão do presente feito em primeiro grau. Em consulta aos autos da mencionada ação anulatória, verifica-se que a NFLD neles impugnada foi lavrada em decorrência da mesma fiscalização que originou a autuação combatida no presente feito, tendo o relatório fiscal da NFLD nº 35.109.578-0 sido vertido nos seguintes termos (id. 58721926 – pág. 142/143 daqueles autos):

1. Os valores constantes da NFLD - Notificação Fiscal de Lançamento de Debito, abrangendo as competências 0199 a 0901, referem-se a contribuições , devidas face a caracterização como segurados-empregados, os profissionais médicos que exerceram atividade no Hospital e Maternidade São Cristóvão (CNPJ 60.975.174/0003), no período 0192 a 0901, tendo sido considerados pelo contribuinte como trabalhadores autônomos.

2. A fiscalização procedeu a caracterização dos médicos nominalmente constantes do relatório de fatos geradores, tendo formado sua convicção considerando os requisitos essenciais à relação empregatícia, a saber:

a) Pessoalidade:

os serviços executados pelos médicos constantes do relatório de fatos geradores revestiram-se do requisito da pessoalidade porque foram prestados por pessoas certas, específicas, conforme comprova o relação fornecida pelo contribuinte (conforme cópia do Auto Paulista), exercendo a medicina direta e pessoalmente.

b) Onerosidade:

a onerosidade do trabalho restou comprovada pelas folhas de pagamento aos médicos, examinadas pela fiscalização, onde constam os salários pagos em retribuição aos serviços executados.

c) Continuidade:

tendo a fiscalização abrangido o período 0192 a 0901, examinadas as relações de retenção de Imposto de Renda e folhas de pagamento aos referidos profissionais, constata-se que os profissionais, em sua maioria , prestou serviços durante todo o período, ininterruptamente, não se cogitando em eventualidade do serviços. A habitualidade também se evidencia pela escala de médicos que prestam serviços publicada no periódico "Auto Paulista".

d) Subordinação:

em se tratando de atividade altamente intelectualizada, como é o exercício da medicina, sutil é a delimitação da subordinação diante do caso concreto.

A fiscalização constatou e concluiu que o contrato entre os médicos e a Sociedade de Beneficência e Filantropia São Cristóvão é um contrato de trabalho. Os médicos são subordinados na acepção técnica do termo.

Os referidos profissionais, elencados no relatório de fatos geradores, exercem suas atividades subordinados à Diretoria Clínica, a escala de horários fixadas pela Diretoria (7:39 as 10:30; 11:00 às 14:00 e 14:30 às 17:30) demonstra a exigência do horário do início do trabalho e o controle do cumprimento do mesmo, ainda que dentro da referida escala, seja permitido ao profissional adequar a sua disponibilidade de agendamentos, o profissional efetua os atendimentos em escala fixa.

Eventuais cancelamentos no atendimento por parte dos médicos são efetuados mediante o impresso "solicitação de cancelamento"(cópia anexa), onde o médico deve fazer constar o motivo da solicitação. Saliento, que se trata de solicitação e não de comunicado, fato que também aponta no sentido da subordinação hierárquica. Durante a ação fiscal, constatei, ainda que, eventuais reclamações de pacientes são encaminhadas ao SAC - Serviço de Atendimento ao Cliente, onde é feita uma triagem, estando sempre a conduta médica sujeita à consideração da diretoria clínica ou da coordenadoria do setor de atendimento, o que demonstra inequivocamente a subordinação.

Face o exposto, a fiscalização concluiu pela existência de elementos hábeis ara a caracterização da relação empregatícia, afastada a autonomia, onde o profissional detém o poder de direção de sua própria atividade.

Por sua vez, o laudo pericial produzido na ação anulatória nº 0010401-86.2011.403.6100 (id. 61745796 - Pág. 144/179) explicitou a metodologia usada nos seguintes termos:

Em suma, buscou-se pela contabilidade da empresa, a verificação da relação empregatícia: pessoalidade, onerosidade, continuidade e subordinação.

Desta forma, foram conferidos, os livros diários dos exercícios de 1.999 até setembro de 2.001, com o intuito de verificação dos lançamentos contábeis dos honorários pagos aos médicos, objeto da notificação de lançamento fiscal da Ré, para verificação se os referidos profissionais, eram autônomos.

Operacionalmente foram conferidos, por amostragem vários profissionais médicos, quanto aos agendamentos de pacientes, com o intuito de verificar o período laborativa.

Nesta mesma linha foram, também, verificado, por amostragem os funcionários celetistas, para verificar administrativamente o “módus operandis” do controle trabalhista.

E ao efetuar a análise contábil e administrativa da documentação apresentada, o expert assim se manifestou quanto aos requisitos caracterizadores da relação de emprego:

B) Pessoalidade — Analisando-se os documentos verifica-se que é efetivamente comprovada a pessoalidade do profissional, visto ser ele responsável por sua conduta no momento da prestação de serviços;

C) Não-Eventualidade -- o referido profissional, obedece uma eventualidade operacional, visto somente prestar consultas médicas, quando existem pacientes agendados, e assim mesmo, em horário pré-determinado pelo mesmo. Para comprovação técnica, por amostragem encontra-se anexado ao presente laudo em forma digital, relatórios de pacientes agendados.

D) Onerosidade -- foram conferidos os 'diários, juntados em mídia digital, verificando-se que os valores pagos aos respectivos Médicos, são contabilizados m conta especifica, Honorários Médicos, ‘diferentemente dos funcionários celetistas, cujos valores são contabilizados como Folha de Pagamento.

E) Subordinação — não existe qualquer subordinação administrativa, à hierarquia superior, visto que pela própria função o referido profissional, tem autonomia e responsabilidade intrínseca sobre os serviços prestados. Assim, a perícia junta em mídia digital, por amostragem registro de pontos dos funcionários celetistas.

Em seguida, a conclusão do mencionado laudo pericial foi vazada nos seguintes termos:

1-) Deixa claro a perícia que foi considerado as alegações das partes, o respectivo trabalho foi elaborado tecnicamente apurando-se a operacionalidade contábil e administrativa da Autora, onde reserva-se o direito de não se adentrar ao âmbito de mérito.

2-) O exposto do laudo, no item Definições —Técnicas Contábeis, serviram de base técnica para a averiguar o item da• Analise Contábil e Administrativa.

3-) Conclusivamente, sempre observando o âmbito técnico, dentro das definições de contribuinte autônomo, o Auto de Infração não se enquadra dentro das normas estipuladas pelo próprio INSS,' sendo que todos os , contribuintes, que deram origem ao fato gerador utilizado para a emissão do respeito auto, tratam-se de profissionais autônomos, cujo recolhimento é de' Sua responsabilidade.

A leitura dos relatórios fiscais das NFLDs nºs 35.109.577-2 e 35.109.578-0 demonstram que a fiscalização utilizou a mesma fundamentação para caracterizar como empregados os médicos que prestaram serviços à parte-autora nos períodos de 01/1992 a 12/1998 e de 01/1999 a 09/2001, respectivamente.

Assim, considerando que a fiscalização abrangeu o período de 01/1992 a 09/2001, analisou toda a documentação do período, afirmou que a maioria dos médicos averiguados prestou serviços durante todo o período e descaracterizou os contratos de prestação de serviço desses profissionais para considerá-los empregados, entendo que a perícia realizada na ação anulatória pode ser utilizada no caso em análise, a despeito de a documentação analisada pelo expert não se referir ao período da NFLD ora em discussão, pois se infere dos autos que a parte-autora agiu continuamente da mesma forma em relação aos médicos durante todo o período da fiscalização.

Partindo-se, portanto, dessa premissa, confrontando-se os relatórios fiscais com as conclusões da perícia elaborada na ação anulatória nº 0010401-86.2011.403.6100, verifica-se que a subordinação é o elemento a ser investigado para verificar a caracterização ou não da relação de emprego entre os médicos prestadores de serviço e a parte-autora.

De fato, a fiscalização entendeu presente a subordinação porque as atividades dos médicos estariam subordinadas à Diretoria Clínica, a qual também fixa a escala de horários a ser seguida por eles.

A sentença também considerou a existência de subordinação em razão do Regimento do Corpo Clínico do Hospital e Maternidade São Cristóvão previa subordinação dos médicos aos órgãos diretivos do hospital e aos coordenadores de equipe, conforme dispositivos abaixo transcritos:

Art. 1° - O corpo clínico é constituído pelos médicos que desempenham suas atividades nas instalações do Hospital e Maternidade São Cristóvão, respondendo individualmente, civil, penal e eticamente por seus atos profissionais.

(...)

Art. 4° - As Clínicas e Serviços funcionarão preferencialmente sob a direção de um Coordenador de Equipe.

Parágrafo único — Sob a direção de cada Coordenador de Equipe, desempenham atividades tantos médicos quantos forem julgados necessários pelas Diretorias Médicas do HMSC, com a concordância da Superintendência do Hospital.

(...)

Art. 100 - São órgãos Diretivos do Corpo Médico:

a) Diretoria Técnica Médica;

b) Diretoria Clínica;

c) Conselho Técnico Médico;

d) Comissão de Ética Médica;

e) Comissões Permanentes ou Temporárias

t) Assembleia Geral.

Ocorre o próprio art. 1º do Regimento do Corpo Clínico do Hospital e Maternidade São Cristóvão, acima transcrito, estabelece que os médicos respondem individualmente, civil, penal e eticamente por seus atos profissionais. Além disso, a existência de diretor técnico é exigência do Decreto nº 20.931/1932 (cuja hierarquia de lei decorre da vigência do período de exceção da época), o qual assim estabelece em seu art. 28:

Art. 28 Nenhum estabelecimento de hospitalização ou de assistência médica pública ou privada poderá funcionar, em qualquer ponto do território nacional, sem ter um diretor técnico e principal responsável, habilitado para o exercício da medicina nos termos do regulamento sanitário federal.

No requerimento de licença para seu funcionamento deverá o diretor técnico do estabelecimento enviar à autoridade sanitária competente a relação dos profissionais que nele trabalham, comunicando-lhe as alterações que forem ocorrendo no seu quadro.

Ademais, as previsões do Regimento Interno do Hospital e Maternidade São Cristóvão acima transcritas indicam previsão de ordem técnica, de controle de procedimentos médicos e hospitalares.

Assim, da leitura dos dispositivos supracitados não vislumbro a existência de relação de subordinação jurídica entre os médicos e o Diretor Clínico, mas sim de responsabilidade técnica deste último pelas atividades realizadas no âmbito hospitalar, ou seja, de sua conformidade com as normas legais e administrativas aplicáveis.

Por outro lado, no que diz respeito à contratação de médicos para exercício de atividade-fim, como já explanado anteriormente, no julgamento do Tema 725/STF restou decidido que “a prática da terceirização já era válida no direito brasileiro mesmo no período anterior à edição das Leis nº. 13.429/2017 e 13.467/2017, independentemente dos setores em que adotada ou da natureza das atividades contratadas com terceira pessoa, reputando-se inconstitucional a Súmula nº. 331 do TST, por violação aos princípios da livre iniciativa (artigos 1º, IV, e 170 da CRFB) e da liberdade contratual (art. 5º, II, da CRFB).” Assim, tal fato não é suficiente para caracterizar a relação de emprego.

Destarte, os elementos constantes dos autos demonstram a inexistência de subordinação dos médicos contratados, o que, por sua vez, afasta a caracterização de relação de emprego reconhecida pela fiscalização, devendo ser anulada a NFLD nº 35.109.577-2.

No mesmo sentido ora decidido, colaciono os seguintes julgados:

AGRAVO INTERNO. DECISÃO MONOCRÁTICA. ART. 557 DO CPC/1973. HOSPITAL. PROFISSIONAIS CONTRATADOS POR MEIO DE OUTRAS EMPRESAS. TERCEIRIZAÇÃO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. AUTO DE INFRAÇÃO. REFORMA DA DECISÃO AGRAVADA. PROVIMENTO DA APELAÇÃO. AGRAVO PROVIDO.

- A lide posta nos autos diz respeito a aspectos de direito e de fato pertinentes à NFLD nº 31.913.280-3, especificamente sobre a natureza jurídica da tarefas médicas, vale dizer, se há relação de emprego ou se resta configurada prestação de serviços. E, permeando essa lide, há o dever de o Fisco justificar sua autuação (uma vez que o lançamento tributário, no caso concreto, depende de elementos de fato) e, por consequência, o ônus da prova do contribuinte em afastar a presunção de veracidade e de validade das afirmações da fiscalização.

- A Súmula nº 331 do E.TST tinha orientação restritiva da terceirização de serviços, mas sobreveio a Tese firmada pelo E.STF no Tema 725, segundo a qual “É lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da contratante”. 

- Segundo o laudo pericial, não há prova de que os médicos que prestaram serviço para a agravante mantinham com ela vínculo empregatício, haja vista a ausência de subordinação e pessoalidade, características da relação de emprego. A autuação não apresenta provas suficientes para embasar a sua conclusão, limitando-se a fundamentos genéricos, com menção a apenas uma das prestadoras de serviços, apoiando-se na conclusão de que os serviços estavam relacionados às atividades-fim da agravante.

-Agravo interno provido para dar provimento à apelação, julgando procedente o pedido.

(TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 0020203-31.1999.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, julgado em 29/07/2022, DJEN DATA: 03/08/2022)

                                       

EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL - NÃO-CONFIGURAÇÃO DO EMPREGATÍCIO VÍNCULO DO COTEJADO MÉDICO EM FACE DE SUA CONTRATAÇÃO PERANTE A EXECUTADA - ÔNUS EMBARGANTE ATENDIDO - PROCEDÊNCIA AOS EMBARGOS

1. Refletem os autos choque entre angulação puramente teórica, apego da parte apelante, em face do realismo a envolver o recorrido, âmbito no qual deseja, sem sucesso, apegar-se o INSS à equivocada premissa segundo a qual a profissão de Médico, em unidade de radioterapia, em essência já a afastar relação de autônomo trabalho.

2. Contra tais teóricos argumentos fazendários, por si insuficientes à capital consistência que deva brotar de um procedimento fiscal pretensamente vencedor, revela o bojo do feito prestou seu lavor o Médico em questão em ritmo aleatório, em expressa contratação como prestamista ao tomador aqui recorrido, cuja paga, sob forma de participação proporcional a seus atendimentos, a assim claramente demonstrar a cuidar de sua vida por si implicado profissional, não sob a desejada subordinação jurídica cotidiana, certa e inexorável.

3. Objetivamente ausentes os elementos inerentes a um vínculo empregatício (artigo 3º, CLT), que anseia o Erário caracterizar e não o consegue, frágil, insista-se, a tanto seu procedimento.

4. No embate "realidade versus teoria autárquica", julgando-se a demanda consoante o contido nos autos, artigo 131, CPC, de sucesso se põe a empreitada embargante, como bem julgada nos termos da r. sentença recorrida, a qual assim fez Justiça ao caso vertente.

5. Improvimento à apelação. Procedência aos embargos.

(TRF 3ª Região, SEGUNDA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1037816 - 0707764-65.1995.4.03.6106, Rel. JUIZ CONVOCADO SILVA NETO, julgado em 06/07/2010, e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/09/2010 PÁGINA: 355)

 

EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. PRESUNÇÃO DE LIQUIDEZ E CERTEZA DA CDA. ART. 3º DA LEI 6.830/80. HOSPITAL. NATUREZA DA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. CONTRATAÇÃO DE PESSOAS JURÍDICAS. REMUNERAÇÃO COM VALOR E PERIODICIDADE VARIÁVEL. ART. 3.º DA CLT. RELAÇÃO DE EMPREGO NÃO CONFIGURADA. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. COBRANÇA INDEVIDA. SALÁRIO-EDUCAÇÃO. CONTRIBUIÇÕES AO SAT E A TERCEIROS. PRECEDENTES. 1 - Em face do disposto no artigo 14 da Lei n. 13.105/2015, aplica-se a esse processo o CPC/73. 2 - A juntada do processo administrativo é ônus da parte, que pode requerer cópias autenticadas ou certidões diretamente no órgão competente (Lei nº 6.830/80, artigo 41). Somente em caso de comprovada recusa da repartição, a requisição deve ser feita pelo Juízo. No caso em tela, não procede a alegação de cerceamento de defesa, pois o processo administrativo foi juntado aos autos pela parte embargada, ficando comprovada a apresentação de defesa na esfera administrativa. 3 - Somente a prova inequívoca afasta a presunção de certeza e liquidez da dívida regularmente inscrita (art. 3.º da Lei 6.830/80). 4 - No caso em tela, a execução fiscal subjacente está respaldada em CDAs compostas dos elementos exigidos pelo artigo 2º, §5.º, da Lei nº 6.830/80. 5 - Constam das CDAs e dos discriminativos de débito inscrito todos os elementos essenciais e respectivos fundamentos legais, de tal sorte que resta descabida a alegação de nulidade por irregularidades formais. 6 - Extrai-se do Relatório da Notificação Fiscal de Lançamento de Débito - NFLD DEBCAD n.º 32.006.792-0, de 31.07.96, (fls. 41/48) que, na execução fiscal subjacente aos presentes embargos, está em cobrança o débito de "contribuições suplementares de Empresa e Segurados destinados à Seguridade Social e a Terceiros e não recolhidas nas épocas próprias, incidentes sobre valores líquidos pagos a médicos que prestaram serviços ao hospital através de empresa interposta". Os médicos foram considerados pelo Instituto Previdenciário, como empregados, para o fim de cobrança das contribuições à Seguridade Social. 7 - Nos termos do artigo 3º. da CLT, "Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário". 8 - No caso em tela, o perito judicial inspecionou os documentos contábeis da embargante e examinou a vasta documentação, inclusive todos os contratos de prestação de serviços profissionais firmados pela embargante e concluiu que houve dissimulação de relação de emprego, por meio de empresa interposta. 9 - Restou comprovado nos autos, por meio dos depoimentos testemunhais, que não havia pessoalidade nem subordinação jurídica, pois os médicos e os outros profissionais, integrantes dos quadros societários das pessoas jurídicas contratadas, podiam fazer-se substituir por outros, sem prévia anuência da embargante, submetendo-se, tão-somente, às normas regulamentadoras da profissão, estabelecidas pelos Conselhos Federal e Regional. 10 - A terceirização da atividade-fim da embargante, por si só, não é suficiente para caracterizar o vínculo empregatício dos profissionais e a natureza salarial dos pagamentos, pois, para tanto, devem estar presentes, concomitantemente, todos os requisitos da relação de emprego. Precedentes. 11 - Insurgiu-se, ainda, a embargante, em suas razões de apelação, contra a cobrança oriunda da NFLD nº 32.006.137-0, na qual foram lançadas a contribuição ao SAT - Seguro de Acidentes do Trabalho e as contribuições a terceiros, Salário-educação e serviços sociais. 12 - A constitucionalidade da cobrança do Salário-educação restou pacificada no julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, do Recurso Extraordinário 660.933, em que foi reconhecida a repercussão geral, nos termos do artigo 543-B do Código de Processo Civil de 1973. 13 - As contribuições sociais a terceiros possuem natureza de contribuição de intervenção no domínio econômico, que dispensa o requisito da existência de benefício ao contribuinte, pelo que devem ser pagas pelas empresas com fundamento no princípio da solidariedade social, previsto no artigo 195, "caput", da Constituição Federal. Constitucionalidade reconhecida pelo STF, no julgamento do RE 749.185/SC. 14 - A contribuição ao SEBRAE é devida pelas empresas que recolhem contribuições ao SESC, SESI, SENAC e SENAI, inclusive empresas prestadoras de serviços, independentemente do seu porte (micro, pequena ou média empresa) ou de serem ou não beneficiárias diretas das contribuições ou dos programas desenvolvidos pelo SEBRAE. No julgamento do Recurso Extraordinário nº 635.682, o Plenário do Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade da contribuição ao SEBRAE . 15 - Igualmente, a contribuição ao SAT já teve a constitucionalidade reconhecida pelo Pretório Excelso, em sessão plenária, já assentou a constitucionalidade da respectiva cobrança (STF, RE nº 343.446, Tribunal Pleno, Relator Ministro Carlos Velloso, DJ 04/04/2003, pág. 01388; ARE 1025504 AgR, Relator: Min. Luiz Fux, Primeira Turma, Processo Eletrônico DJe-124 Divulg 09-06-2017, Public 12-06-2017). 16 - O Superior Tribunal de Justiça, além de sumular a matéria, posicionou-se favoravelmente à regulamentação da contribuição ao SAT, por meio de decreto. Súmula 351: "A alíquota de contribuição para o Seguro de Acidente do Trabalho (SAT) é aferida pelo grau de risco desenvolvido em cada empresa, individualizada pelo seu CNPJ, ou pelo grau de risco da atividade preponderante quando houver apenas um registro." 17 - Tendo em vista a sucumbência recíproca, os honorários serão suportados pelos seus respectivos patronos. 18 - Apelação parcialmente provida, tão-somente, para declarar a nulidade da Notificação Fiscal de Lançamento de Débito - NFLD nº 33.006.792-0 e a inexigibilidade da CDA respectiva, ficando reconhecida a sucumbência recíproca.

(APELAÇÃO CÍVEL - 1719333 ..SIGLA_CLASSE: ApCiv 0055893-69.1999.4.03.6182 ..PROCESSO_ANTIGO: 199961820558937 ..PROCESSO_ANTIGO_FORMATADO: 1999.61.82.055893-7, JUÍZA CONVOCADA NOEMI MARTINS, TRF3 - DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/12/2017 ..FONTE_PUBLICACAO1: ..FONTE_PUBLICACAO2: ..FONTE_PUBLICACAO3:.)

Ante o exposto, dou provimento à apelação, para determinar a anulação da NFLD nº 35.109.577-2, invertendo-se os ônus da sucumbência.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. RELAÇÃO DE EMPREGO. REQUISITOS. TRABALHO AUTÔNOMO. DISTINÇÃO. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. LEI Nº 8.212/1991. CLT. CTN. ATIVIDADE-FIM. TERCEIRIZAÇÃO. POSSIBILIDADE. AUTUAÇÃO FISCAL. HOSPITAL. CONTRATAÇÃO DE MÉDICOS. AUSÊNCIA DE SUBORDINAÇÃO.

- Preliminar de cerceamento de defesa rejeitado, pois, embora a parte-autora tenha requerido, na petição inicial do presente feito, a juntada do expediente administrativo n. 35364.005313/2006-57 (NFLD n. 2 53.109.557-2), não instruiu a exordial com cópia integral deste e, ao ser intimada para especificar as provas que pretendia produzir, requereu apenas a produção de prova pericial, tendo precluído direito àquela outra prova. Precedentes do E.STJ.

- Considerando o contido no art. 3º da CLT e no art. 12, I, "a", da Lei nº 8.212/1991 (compreendidos à luz do art. 110 do CTN), para que se configure a relação de emprego é necessário que se façam presentes, concomitantemente subordinação, não-eventualidade (permanência, habitualidade), pessoalidade e remuneração. À falta de um deles, restará descaracterizado o vínculo laboral e, portanto, estará a empresa desobrigada de recolher o tributo exigido.

- A distinção entre a relação de emprego e a de trabalho autônomo depende essencialmente (mas não só) da subordinação e da não-eventualidade (permanência e habitualidade – Tema 20/STF). Caberá ao Fisco o ônus de demonstrar relação de emprego se existirem registros formais de trabalho como terceirizado ou autônomo, servindo-se da primazia da realidade em contraste com elementos formais (art. 9° da CLT). Havendo autuação fiscal fundamentada, o ônus caberá ao autuado dada a presunção de veracidade e de validade dos atos administrativos (o mesmo em se tratando de inscrição em dívida ativa e em CDA).

- A Súmula 331/TST proibia a terceirização de atividades-fim e responsabilizava o contratante pelas obrigações trabalhistas referentes aos empregados da empresa terceirizada, mas esse entendimento foi revisto no Tema 725/STF, no qual foi firmada a seguinte Tese: "É lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da contratante." (Tema 725).

- No caso dos autos, a leitura dos relatórios fiscais das NFLDs nºs 35.109.577-2 (em discussão nos presentes autos0 e 35.109.578-0 (objeto da ação anulatória nº 0010401-86.2011.403.6100) demonstra que a fiscalização utilizou a mesma fundamentação para caracterizar como empregados os médicos que prestaram serviços à parte-autora nos períodos de 01/1992 a 12/1998 e de 01/1999 a 09/2001, respectivamente. Assim, considerando que a fiscalização abrangeu o período de 01/1992 a 09/2001, analisou toda a documentação do período, afirmou que a maioria dos médicos averiguados prestou serviços durante todo o período e descaracterizou os contratos de prestação de serviço desses profissionais para considerá-los empregados, a perícia realizada na mencionada ação anulatória pode ser utilizada no caso em análise, a despeito de a documentação analisada pelo expert não se referir ao período da NFLD ora em discussão, pois se infere dos autos que a parte-autora agiu da mesma forma em relação aos médicos durante todo o período da fiscalização.

- Confrontando-se os relatórios fiscais com as conclusões da perícia elaborada na ação anulatória nº 0010401-86.2011.403.6100, verifica-se que a subordinação é o elemento a ser investigado para verificar a caracterização ou não da relação de emprego entre os médicos prestadores de serviço e a parte-autora. Ocorre que as previsões do Regimento Interno do Hospital e Maternidade São Cristóvão citados pela fiscalização e na sentença impugnada indicam previsão de ordem técnica, de controle de procedimentos médicos e hospitalares, não se vislumbrando a existência de relação de subordinação jurídica entre os médicos e o Diretor Clínico, mas sim de responsabilidade técnica deste último pelas atividades realizadas no âmbito hospitalar, ou seja, de sua conformidade com as normas legais e administrativas aplicáveis. Ademais, a existência de diretor técnico é exigência do art. 28 do Decreto nº 20.931/1932. 

- No que diz respeito à contratação de médicos para exercício de atividade-fim, como já explanado anteriormente, no julgamento do Tema 725/STF restou decidido que “a prática da terceirização já era válida no direito brasileiro mesmo no período anterior à edição das Leis nº. 13.429/2017 e 13.467/2017, independentemente dos setores em que adotada ou da natureza das atividades contratadas com terceira pessoa, reputando-se inconstitucional a Súmula nº. 331 do TST, por violação aos princípios da livre iniciativa (artigos 1º, IV, e 170 da CRFB) e da liberdade contratual (art. 5º, II, da CRFB).” Assim, tal fato não é suficiente para caracterizar a relação de emprego, de modo que, inexistente a subordinação, deve ser afastado o vínculo empregatício reconhecido pela fiscalização, anulando-se a NFLD nº 35.109.577-2.

- Preliminar rejeitada. Apelo provido.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.