Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0007513-70.2004.4.03.6107

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: RUBENS FRANCO DE MELLO FILHO (REPRESENTANTE), HENRIQUE SALGUEIRO FRANCO DE MELLO (REPRESENTANTE), INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA - INCRA
ESPOLIO: RUBENS FRANCO DE MELLO

Advogados do(a) APELANTE: ANTONIO JOSE RIBAS PAIVA - SP35799-A, SERGIO GOMES DE AZEVEDO PECANHA - SP136813-A
Advogados do(a) ESPOLIO: ANTONIO JOSE RIBAS PAIVA - SP35799-A, SERGIO GOMES DE AZEVEDO PECANHA - SP136813-A

APELADO: ILDENIRA DUQUINI FRANCO DE MELLO, RITA HELENA FRANCO DE MELLO, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA - INCRA
ESPOLIO: RUBENS FRANCO DE MELLO

Advogado do(a) APELADO: MANOEL BOMTEMPO - SP25807-A
Advogado do(a) APELADO: LAMARTINE MACIEL DE GODOY - SP46310
Advogados do(a) ESPOLIO: ANTONIO JOSE RIBAS PAIVA - SP35799-A, SERGIO GOMES DE AZEVEDO PECANHA - SP136813-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0007513-70.2004.4.03.6107

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: RUBENS FRANCO DE MELLO FILHO (REPRESENTANTE), HENRIQUE SALGUEIRO FRANCO DE MELLO (REPRESENTANTE), INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA - INCRA
ESPOLIO: RUBENS FRANCO DE MELLO

Advogados do(a) APELANTE: ANTONIO JOSE RIBAS PAIVA - SP35799-A, SERGIO GOMES DE AZEVEDO PECANHA - SP136813-A
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APELADO: ILDENIRA DUQUINI FRANCO DE MELLO, RITA HELENA FRANCO DE MELLO, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA - INCRA
ESPOLIO: RUBENS FRANCO DE MELLO

Advogado do(a) APELADO: MANOEL BOMTEMPO - SP25807-A
Advogado do(a) APELADO: LAMARTINE MACIEL DE GODOY - SP46310
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R E L A T Ó R I O

 

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Trata-se de recursos de apelação interpostos por RUBENS FRANCO DE MELLO (ESPOLIO), representado por HENRIQUE SALGUEIRO FRANCO DE MELLO e por RITA HELENA FRANCO DE MELLO, na qualidade de assistente, e pelo INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA – INCRA e de reexame necessário em face de sentença proferida pela 2ª Vara Federal de Araçatuba/SP que, em sede de ação de desapropriação para fins de reforma agrária, assim decidiu:

DISPOSITIVO

Em face do exposto, e por tudo o mais que consta dos autos, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para declarar incorporado ao patrimônio do expropriante o imóvel rural denominado "Fazenda São Raphael Santana", localizada no município de Lavínia/SP, com área de 736,3678 hectares, objeto da Matrícula Imobiliária n. 10.184 do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Mirandópolis/SP.

Fixo os seguintes valores de indenização, para a data da perícia, ou seja, JUNHO/2014 (assegurado, ainda, o direito de os réus procederem à colheita, até o dia 31/12/2015 de eventual cultura de cana-de-açúcar existente no local):

- terra nua, descontado o passivo ambiental:_R$ 9.590.983,86;

- benfeitorias: R$ 173.376,39;

- TOTAL: R$ 9.764.360,25.

Condeno o expropriante, porque sucumbente, ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios, nos termos do artigo 19 da Lei Complementar n. 76/93, estes fixados no importe correspondente a 5% da diferença entre o preço oferecido e o valor da indenização, atualizados, nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, até a data do pagamento.

Em relação ao pagamento dos honorários periciais, verifico que o autor teve deferido o pedido, formulado à fI. 1538, para concessão de mais 30 dias, cujo prazo, contado da juntada aos autos do mandado de intimação (em 24/09/2015 - fI. 1542) já se esvaiu. Assim sendo, queira o autor proceder ao depósito da importância em no máximo 05 dias, contados da intimação da presente, sob cena de multa diária no importe de R$ 1.000,00 por dia de atraso.

Sem custas, a teor do caput do art. 18 da Lei Complementar n. 76/93.

Juros moratórios de 6% ao ano, na forma do artigo 15-B do Decreto-Lei n 3.365/41.

Juros compensatórios, à razão de 12% ao ano, nos termos do Enunciado n. 113 da súmula de jurisprudência do STJ e Enunciado n. 618 da súmula de jurisprudência do STF. A base de cálculo deverá ser o valor fixado na sentença, porquanto não houve levantamento de 80% das TDA's.

Após o trânsito em julgado, cumpra-se o artigo 14 da Lei Complementar n. 76/93,  obedecida a ordem dos precatórios, conforme art. 100 da Constituição Federal e observe-se o quanto determinado nos artigos 16 e 17 da referida Lei Complementar no tocante ao levantamento do depósito (inclusive o suplementar), expedindo-se em favor do expropriante, no prazo de quarenta e oito horas, mandado translativo do domínio para o Cartório do Registro de Imóveis da localidade, advertindo-se este quanto ao prazo de três dias para o registro, contado da data da apresentação do mandado.

Sentença que está sujeita ao reexame necessário (art. 13, "caput" e § 10, da LC 76/93).

Oficie-se à Fazenda Federal (SRF) para que informe a existência de débitos relativos ao imóvel rural objeto da presente.

Oficie-se ao CRI da localidade para averbar, à margem da matrícula, a existência desta ação de desapropriação, solicitando-se, ainda, o envio, em dez dias, de certidão atualizada do imóvel para juntada aos autos. Comunique-se, por via eletrônica (e-mail), a prolação desta sentença aos Excelentíssimos Relatores dos Agravos de Instrumento interpostos e ainda pendentes de julgamento ([i] AI n. 0005560-10.2014.4.03.0000: [ii] AI n. 0017402-84.2014.4.03.0000: [iii] AI n. 0020327-19.2015.4.03.0000; e [iv] AI n. 0021362-14.2015.4.03.0000 - Relatora JUÍZA CONV. DENISE AVELAR). Publique-se. Registre-se. Intimem-se, inclusive o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL.

Em suas razões recursais, alegam RUBENS FRANCO DE MELLO (ESPOLIO) e RITA HELENA FRANCO DE MELLO, em síntese: (a) a necessidade de substituição do perito; (b) a ausência de passivo ambiental; (c) a nulidade da perícia em face da afronta ao regramento disposto na NB n° 14.653-3 – ABNT; (d) o valor da terra nua está aquém do valor de mercado; (e) a necessidade de inclusão dos danos emergentes e dos lucros cessantes; e (f) a presunção de veracidade e legitimidade da certidão de matrícula do Registro de Imóveis, no tocante à área estimada da propriedade. Pedem o provimento do recurso para “(...) declarar a nulidade do Laudo Pericial acostado aos autos, determinando-se a substituição do Perito Judicial, bem como a realização de nova Prova Pericial, tendo em vista que a que foi apresentada ao Juízo "a quo" está eivada de nulidades, uma vez que deixou de avaliar as benfeitorias reprodutivas; foi elaborada em desconformidade com a Normativa Brasileira - NB no 14.653-3 - ABNT e deixou de avaliar o lucro cessante e o dano emergente; subsidiariamente, requer seja reconhecida a inexistência de passivo ambiental; que o valor da terra nua corresponda a R$ 19.678,18 por hectare, bem como que seja considerada para fins de cálculo da indenização a área do imóvel constante na Matrícula n° 10.184 do Registro de Imóveis da Comarca de Mirandópolis/SP, ou seja, 743,3579 (setecentos e quarenta e três hectares, trinta e cinco área e setenta e nove centiares), em face da presunção de veracidade e legitimidade da certidão da matrícula do Cartório de Registro de Imóveis.

Já o INCRA, em seu recurso, aduz, em suma, a não contemporaneidade do laudo de avaliação da Autarquia (abril/2004) em relação à perícia judicial (junho/2014). Alega a incidência indevida de juros compensatórios na desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária, com violação ao art. 12 da Lei nº 8.629/93. Discute, ainda, a forma de incidência dos juros moratórios. Argumenta que a complementação dos valores, se devidos, relativos às benfeitorias, deverá se submeter ao regime de precatórios após devida execução e que eventual emissão de TDA complementar deverá obedecer a legislação de regência. Por fim, impugna o percentual estabelecido para fins de honorários advocatícios. Pede a reforma do julgado nos pontos atacados no recurso.

O ESPÓLIO DE RUBENS FRANCO DE MELLO e RITA HELENA FRANCO DE MELLO interpuseram agravo de instrumento contra a decisão proferida pelo MM. Juiz Federal da 2ª Vara de Araçatuba/SP, a qual recebeu sua apelação apenas no efeito devolutivo, nos termos da LC 76/93. Decisão proferida pelo e. Desembargador Federal Souza Ribeiro negou seguimento ao recurso.

Com as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.

Parecer do Ministério Público Federal pelo prosseguimento do feito.

O feito foi enviado ao Centro de Conciliação/Mediação para verificação da possibilidade conciliação, a qual, contudo, restou infrutífera.

Sustentação oral em vídeo apresentada por ESPÓLIO DE RUBENS FRANCO DE MELLO e RITA HELENA FRANCO DE MELLO.

É o breve relatório. Passo a decidir.

 

 

 

 

 

 

 

 


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V O T O

 

 

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Inicio o exame dos recursos e da remessa necessária pela questão prejudicial da necessidade de substituição do perito, o que demandaria a realização de nova prova pericial.

Registro, entretanto, que tal questão foi objeto de exame e decisão por esta C. Corte Regional, nos autos do agravo de instrumento nº 0020327-19.2015.403.0000, já transitado em julgado e cujo acórdão, proferido em sede de agravo legal, encontra-se assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. APLICAÇÃO DO ARTIGO 557, CAPUT, DO CPC. AUSÊNCIA DE NOVOS ARGUMENTOS PARA AUTORIZAR A REFORMA DA DECISÃO AGRAVADA.

1. A r. decisão impugnada foi proferida em consonância com o disposto no artigo 557, caput, do Código de Processo Civil.

2. A parte agravante não apresenta argumentos relevantes que autorizem ou justifiquem a reforma da r. decisão agravada.

3. A parte que requer a substituição, deve não só argumentar, mas demonstrar cabalmente a sua necessidade. Caso contrário, descabe a substituição.

4. Da mesma forma, incumbe à parte que alega a comprovação da causa de suspeição e/ou impedimento do perito à realização da prova técnica, nas hipóteses dos artigos 134/135 c.c. art. 138, III, todos do Código de Processo Civil.

5. Com relação, ao pedido subsidiário de nova perícia, há certa contradição. A parte agravante defende que o profissional laureado não tem capacidade técnica e não cumpriu da forma devida seu trabalho, mas se contentaria que ele refizesse o laudo.

6. Agravo legal desprovido.

(TRF 3ª Região, SEGUNDA TURMA, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 565206 - 0020327-19.2015.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA RIBEIRO, julgado em 28/06/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/07/2016 )                                      

Do inteiro teor do julgado acima extraem-se as seguintes observações:

“ (...)

Portanto, a parte que requer a substituição, deve não só argumentar, mas demonstrar cabalmente a sua necessidade. Caso contrário, descabe a substituição.

Da mesma forma, incumbe à parte que alega a comprovação da causa de suspeição e/ou impedimento do perito à realização da prova técnica, nas hipóteses dos artigos 134/135 c.c. art. 138, III, todos do Código de Processo Civil.

(...)

Não é caso também de nova perícia, pois o Código de Processo Civil, em seus artigos 437/438, deixa a critério do Magistrado a sua realização, tendo em vista lhe parecer ou não, a matéria, adequada e suficientemente esclarecida.

(...)”.

Vale lembrar que é vedado à parte rediscutir, no curso do processo, as questões já decididas, a cujo respeito se operou a preclusão (art. 507 do CPC), impedindo, com isso, a retomada de questões já ultrapassadas, o que seria fator de insegurança jurídica e violação à razoável duração do processo. De toda forma, verifica-se que a parte apelante não trouxe qualquer novo elemento, de fato ou de direito, capaz de ensejar o reexame da matéria processual já devidamente solucionada por este Tribunal de forma definitiva.

Ainda no que toca ao laudo pericial, alegam os expropriados a nulidade da perícia em razão de suposta afronta ao regramento disposto na NBR nº 14.653-3- ABNT. Anoto que esta parte da NBR 14.653 especifica procedimentos e requisitos, bem como fornece diretrizes para a avaliação de imóveis rurais, especialmente quanto a: a) instituição de terminologia, definições, símbolos e abreviaturas; b) classificação da sua natureza; c) descrição das atividades básicas; d) definição da metodologia básica; e) identificação do valor; f) especificação das avaliações; g) requisitos básicos de laudos de avaliação.

O exame do laudo pericial, produzido por profissional qualificado e com habilitação técnica, não evidencia qualquer violação à norma técnica acima referida, até porque, como bem afirmou a sentença apelada, “(...) Desacompanhadas de elementos de prova que imprimam um mínimo de credibilidade, o inconformismo ao derredor das conclusões do perito judicial (fls. 1357/1361) não passam de meras alegações infundadas. Ainda que fosse o caso de se conceituar as conclusões do expert como um simples parecer técnico - o que não é a hipótese -, o laudo, ainda assim, não deixaria de funcionar como um importante elemento de prova a embasar a decisão deste Juízo, especialmente se se considerar a circunstância de que os trabalhos do profissional tomaram por base a NBR 14 653 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (8. 987) e os diversos critérios elencados às fls. 985/989 (levantamento topográfico georreferenciado; levantamento topográfico do INCRA; imagem de satélite do Google Earth; planta georreferenciada do imóvel; determinação da situação do imóvel quanto à localização e acesso; condições agropecuárias, ambientais, urbanísticas e socioeconômicas da propriedade: carta do uso do solo; carta de classes de capacidade de uso; pesquisa de mercado conforme certidões de matrículas e em pesquisa de ofertas na região de localização do imóvel etc)”.

Rejeitado o pleito de reconhecimento de nulidade, passo ao exame das demais questões suscitadas nos recursos.

É certo que o direito de propriedade se encontra assegurado pela Constituição Federal que, no entanto, o condicionou ao atendimento de sua função social (art. 5º, incisos XXII e XXIII, da CF/88).

Não se trata, portanto, de um direito absoluto, admitindo-se, com igual amparo constitucional, e sob o fundamento da supremacia do interesse público sobre o privado, a intervenção do Estado na propriedade particular, de modo a atender ao pressuposto de sua função social, elencado no art. 170, III, da CF/88, como um dos princípios que regem a ordem econômica.

A intervenção do Estado na propriedade pode se dar de duas formas básicas: a) restritiva, que sem retirar a propriedade de seu titular, impõe condições ao seu uso (servidão administrativa, requisição, ocupação temporária, limitações administrativas e tombamento); b) supressiva, que transfere, compulsoriamente, para si a propriedade até então pertencente a terceiros, por meio da modalidade única da desapropriação.

No que concerne especificamente à desapropriação, trata-se de um procedimento de direito público, com fundamento no art. 5º, XXIV, da Constituição Federal, por meio do qual será possível a transferência compulsória da propriedade de terceiros ao Poder Público, por razões de utilidade pública, necessidade pública, ou interesse social, mediante justa e prévia indenização.

A regulamentação da desapropriação está contida, essencialmente, em dois diplomas normativos principais: o Decreto-Lei nº. 3.365/1941, que dispõe sobre casos de desapropriação por utilidade pública, e a Lei nº 4.132/1962, que trata dos casos de desapropriação por interesse social, embora outros dispositivos legais e constitucionais versem sobre a matéria (art. 182, § 4º, III, art. 184 e art. 243, da CF; art. 8º, da Lei nº. 10.257/2001; Lei nº 8.629/1993; Lei Complementar nº 76/1993; entre outros).

A desapropriação comporta um procedimento administrativo prévio, no qual o poder público declara que determinado bem será desapropriado (fase declaratória), e chama o proprietário na busca de um acordo a respeito do valor da indenização (fase executória). Não havendo consenso a respeito do montante indenizatório, cumpre ao Poder Público dar início à fase judicial, com a propositura da ação de desapropriação.

São competentes para declarar a utilidade pública ou o interesse social de um determinado bem, para fins de desapropriação, os chefes do poder executivo (Prefeitos, Governadores, Presidente da República), mediante Decreto, e o Poder Legislativo, mediante Lei ou Decreto Legislativo. Embora a administração indireta (autarquias, empresas estatais e fundações públicas) não possa, em regra, declarar a desapropriação de um bem, essa atribuição poderá ser delegada, a exemplo do que ocorre com o DNIT (art. 82, IX, da Lei nº. 10.233/2001), ou com a ANEEL (art. 10, da Lei nº. 9074/1995). Já para executar a desapropriação (legitimatio ad causam), terão competência a Administração direta (União, Estados, municípios e Distrito Federal), a Administração indireta (se a lei que criou o ente assim autorizar), e ainda as concessionárias e permissionárias de serviços públicos, desde que autorizadas por lei ou pelo respectivo contrato, conforme dispõe o art. 3º, do Decreto-Lei nº. 3.365/1941.

Ainda que objeto de alguma controvérsia, vale registrar, que o art. 9º, do Decreto-lei no 3.365/1941 veda ao Poder Judiciário, decidir, na própria ação de desapropriação, sobre a existência ou não da utilidade pública invocada pela Administração. Nada impede, todavia, que essa verificação seja submetida a ação autônoma.

Ajuizada a ação expropriatória, caberá ao expropriado, em contestação, tão somente a discussão sobre eventuais vícios do processo judicial, ou a impugnação do valor oferecido, consoante disciplina do art. 20, do Decreto-lei no 3.365/1941, sendo vedada, portanto, o oferecimento de reconvenção, dada a limitação da matéria impugnável.

É certo que a transferência da propriedade terá lugar mediante o pagamento da indenização. Admite-se, porém, a imissão provisória na posse pelo expropriante, que será deferida, independentemente da citação do réu, se atendidos os requisitos previstos no art. 15, do Decreto-Lei nº. 3.365/1941, ou seja, a alegação de urgência e o depósito do preço oferecido, exceção feita às desapropriações de prédios residenciais urbanos, em que a imissão provisória na posse do bem observará as disposições do Decreto-lei no 1.075/1970.

O art. 33, §2º, do Decreto-Lei nº. 3.365/1941, faculta ao expropriado o levantamento de até 80% do valor inicialmente oferecido. Porém, com a inclusão do art. 34-A, no referido Decreto, pela Lei nº. 13.465/2017, abriu-se a possibilidade de levantamento de 100% do depósito, nos seguintes termos:

Art. 34-A. Se houver concordância, reduzida a termo, do expropriado, a decisão concessiva da imissão provisória na posse implicará a aquisição da propriedade pelo expropriante com o consequente registro da propriedade na matrícula do imóvel.

§ 1º A concordância escrita do expropriado não implica renúncia ao seu direito de questionar o preço ofertado em juízo.

§ 2º Na hipótese deste artigo, o expropriado poderá levantar 100% (cem por cento) do depósito de que trata o art. 33 deste Decreto-Lei.

§ 3º Do valor a ser levantado pelo expropriado devem ser deduzidos os valores dispostos nos §§ 1o e 2o do art. 32 deste Decreto-Lei, bem como, a critério do juiz, aqueles tidos como necessários para o custeio das despesas processuais.

De qualquer forma, o levantamento deverá ser precedido do atendimento, por parte do expropriado, do disposto no art. 34, do Decreto-Lei nº. 3.365/1941, que exige, prova de propriedade, de quitação de dívidas fiscais que recaiam sobre o bem expropriado, e publicação de editais, com o prazo de 10 dias, para conhecimento de terceiros.

Estabelecida a controvérsia sobre o valor da indenização, impõe-se a realização de prova pericial, conforme determina o art. 23, da lei expropriatória, para que então sobrevenha decisão acerca da lide. Sendo a perícia parte inerente ao procedimento, pacífico o entendimento segundo o qual o ônus da antecipação dos respectivos honorários recai sobre o ente expropriante, conforme se observa dos julgados a seguir colacionados:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESAPROPRIAÇÃO. INDENIZAÇÃO. ADIANTAMENTO DOS HONORÁRIOS PERICIAIS. CABIMENTO DO RECURSO. STJ, TEMA 988. ENCARGO DO EXPROPRIANTE. AGRAVO DE INSTRUMENTO IMPROVIDO.1. Ao analisar o Tema 988, o C. STJ fixou a tese de que "O rol do art. 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação". 2. O caso enfrentado nos autos se amolda à hipótese de cabimento do recurso em hipótese não prevista no rol do artigo 1.015 do CPC, tendo em vista a urgência da definição acerca do responsável pelo ônus do adiantamento dos honorários do perito designado pelo juízo para a avaliação do imóvel objeto da desapropriação. 3. A despeito da previsão do artigo 95, caput do CPC, a jurisprudência pátria tem entendido que nas ações de desapropriação, havendo designação de perícia para avaliação do valor a ser pago pelo ente desapropriante, os honorários devem ser adiantados pelo expropriante em razão do dever da Administração de pagar justa indenização previsto pelo artigo 5º, XXIV da Constituição Federal. 4. Agravo de Instrumento improvido. (AI 5023323-26.2020.4.03.0000. RELATOR: Desembargador Federal WILSON ZAUHY FILHO, TRF3 - 1ª Turma, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 18/12/2020)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA. DECRETO-LEI Nº 3.365/41. JUSTA INDENIZAÇÃO. ADIANTAMENTO DOS HONORÁRIOS PERICIAIS. ENCARGO DO EXPROPRIANTE. RECURSO PROVIDO. 1. Conforme estabelece o Decreto-Lei nº 3.365/41, ao despachar a inicial o juiz designará um perito de sua livre escolha para proceder à avaliação dos bens e, não havendo concordância expressa quanto ao preço, o expert deverá apresentar o respectivo laudo técnico de avaliação (artigos 14 e 23). 2. De acordo com o entendimento majoritário, ao qual me alinho, devendo a desapropriação configurar uma operação que não enriqueça nem empobreça o expropriado, mantendo íntegro o seu patrimônio, os encargos decorrentes da prova pericial devem ser suportados pela entidade pública desapropriante. 3. Em caso de discussão quanto ao valor da oferta no processo de desapropriação direta, a determinação de prova pericial é ato de impulso oficial, eis que se trata de elemento de cognição imprescindível para a resolução da demanda, cabendo ao expropriante o adiantamento dos honorários periciais, diante do dever constitucional da Administração de velar pela justa indenização ao proprietário do imóvel a ser expropriado. Precedentes. 4. Agravo de instrumento provido. Agravo interno prejudicado. (AI 5024997-73.2019.4.03.0000. RELATOR: Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, TRF3 - 2ª Turma, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 12/08/2020)

DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE SOCIAL. HONORÁRIOS PERICIAIS. ADIANTAMENTO. RESPONSABILIZAÇÃO. I - Nos termos do parágrafo único do art. 527 do CPC/73, à época em vigor, a decisão que aprecia pedido de efeito suspensivo ao agravo de instrumento, concedendo ou não a antecipação da tutela requerida, somente é passível de reforma no momento do julgamento do agravo, salvo se o próprio relator a reconsiderar, sendo, destarte, descabida a interposição de agravo regimental. II - Hipótese dos autos em que a nova perícia foi determinada a pedido do INCRA, por outro lado sendo pacífico o entendimento do Eg. STJ no sentido de que em ação expropriatória com a dos autos, havendo contestação do valor ofertado, a realização de prova pericial se faz necessária independente de pedido das partes, sendo ônus do expropriante o encargo dela decorrente. Precedentes da Corte Superior. III - Agravo regimental não conhecido e agravo de instrumento desprovido. (AI 0026694-93.2014.4.03.0000. RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL PEIXOTO JUNIOR, TRF3 - SEGUNDA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/10/2019)

A propósito da indenização devida à parte expropriada, deve ser observada a regra fundamental prevista no art. 5º, XXIV, da CF, segundo a qual, a indenização tem que ser prévia, justa e em dinheiro. Será prévia a indenização paga antes da transferência do bem. Será justa a indenização suficiente à preservação do patrimônio do titular do bem atingido, devendo compreender o valor venal do imóvel, e a reparação por eventuais danos, além dos consectários previstos em lei. Finalmente, a indenização será, em regra, na moeda corrente no país, admitindo-se o pagamento por precatório, de eventual diferença acolhida em sentença judicial. Excepcionalmente, no entanto, a indenização não será paga em dinheiro. São hipóteses normalmente associadas ao não atendimento da função social da propriedade, como na desapropriação especial urbana (art. 182, §4º, III, da CF), cujo pagamento se dará mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, ou ainda na desapropriação especial rural (art. 184, da CF), em que o pagamento ocorrerá por meio de títulos da dívida agrária, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão.

No que concerne aos consectários legais, a controvérsia existente nos autos diz respeito às hipóteses em que terá lugar a incidência de juros compensatórios e moratórios.

Sobre o tema, destaco que a incidência de juros compensatórios nas desapropriações encontra disciplina no art. 15-A, do Decreto-Lei nº 3.365/1941 (incluído pela mesma MP nº 2.183/2001), transcrito a seguir para melhor compreensão de sua finalidade:

Art. 15-A No caso de imissão prévia na posse, na desapropriação por necessidade ou utilidade pública e interesse social, inclusive para fins de reforma agrária, havendo divergência entre o preço ofertado em juízo e o valor do bem, fixado na sentença, expressos em termos reais, incidirão juros compensatórios de até seis por cento ao ano sobre o valor da diferença eventualmente apurada, a contar da imissão na posse, vedado o cálculo de juros compostos.  

§ 1º Os juros compensatórios destinam-se, apenas, a compensar a perda de renda comprovadamente sofrida pelo proprietário.  

§ 2º Não serão devidos juros compensatórios quando o imóvel possuir graus de utilização da terra e de eficiência na exploração iguais a zero.                     

§ 3º O disposto no caput deste artigo aplica-se também às ações ordinárias de indenização por apossamento administrativo ou desapropriação indireta, bem assim às ações que visem a indenização por restrições decorrentes de atos do Poder Público, em especial aqueles destinados à proteção ambiental, incidindo os juros sobre o valor fixado na sentença.

Conforme se extrai do dispositivo acima, para que sejam devidos juros compensatórios, deverão estar preenchidos os seguintes requisitos: 1) imissão prévia (provisória) do expropriante na posse do imóvel; 2) graus de utilização (potencial para ser explorado) e de eficiência na exploração (efetivo aproveitamento) do imóvel superiores a zero; 3) comprovação da perda de renda sofrida pelo proprietário; 4) o reconhecimento, pela sentença, de que o valor inicialmente ofertado pelo expropriante é insuficiente para a reparação, fazendo com que o expropriado ficasse privado, ainda que parcialmente, da justa e prévia indenização no período entre a perda da posse (termo inicial) e o efetivo recebimento.

Vale dizer que se a indenização ocorresse de forma prévia à perda da posse, e em quantia justa, suficiente para recompor integralmente o prejuízo decorrente da retirada do bem da esfera patrimonial do expropriado, não haveria que se falar em posterior compensação pela privação do bem. Do contrário, a impossibilidade do exercício dos atributos da propriedade pelo expropriado a partir da imissão do expropriante na posse do imóvel, sem a simultânea e integral indenização, faz nascer o direito à percepção, por meio dos juros compensatórios, da reparação pelo proveito econômico injustamente inviabilizado.

Criação pretoriana, materializada a partir da aprovação pelo E.STF, em 13/12/1963, da Súmula 164, (“no processo de desapropriação, são devidos juros compensatórios desde a antecipada imissão de posse, ordenada pelo juiz, por motivo de urgência”), os juros compensatórios sempre ensejaram discussões acerca de sua natureza e finalidade. Inicialmente destinado a recompor o valor da indenização, afeiçoando-se mais à correção monetária, em seu papel de preservação do poder de compra da moeda, teve sua incidência ampliada a tal ponto de suscitar ainda discussões sobre seu potencial para a reparação de lucros cessantes e danos emergentes.

Atualmente, entendo defensável a tese de que, se o valor correspondente à perda de renda a que se refere o §1º, do art. 15-A, fosse obtido mediante apuração na própria fase instrutória do processo de desapropriação, de modo que a indenização fixada na sentença já compreendesse a integralidade da reparação devida ao expropriado (incluídos lucros cessantes e danos emergentes), bastaria a incidência de juros moratórios sobre a diferença entre a oferta inicial e o montante reconhecido na sentença, desde a imissão prévia na posse, para que a reparação, pelo período em que o poder público permaneceu na posse do bem sem a justa e prévia indenização, se desse em conformidade com o princípio imposto pelo art. 5º, XXIV, da Constituição. Com isso estaria reparada, até com maior grau de precisão, a integralidade da indenização que se buscou por meio do percentual fixo estabelecido a título de juros compensatórios. Aliás, não sendo essa a sistemática adotada em nosso ordenamento, é possível vislumbrar situações em que a aplicação do art. 15-A, do Decreto-Lei nº 3.365/1941, ensejaria dupla reparação para uma mesma causa, notadamente quando determinado prejuízo já integrou a avaliação realizada em juízo, e ainda assim comporá a base de cálculo dos juros compensatórios.

De toda sorte, o critério positivado a ser observado permite duas situações possíveis dentro das condições por ele estabelecidas. Na primeira, a imissão prévia da Administração na posse do imóvel vem acompanhada de oferta de valor aceito pelo expropriado ou reconhecido como correto pela sentença; nesse caso, não incidirão juros compensatórios. Na segunda, a imissão na posse ocorre mediante oferta considerada insuficiente pela sentença; nessa hipótese serão devidos juros compensatórios sobre a diferença do valor reconhecido pela sentença e o ofertado pela Administração, desde a imissão na posse.

Lembro que em razão da limitação do levantamento, pelo expropriado, de até 80% da oferta inicial, imposta pelo art. 33, §2º, do Decreto-Lei nº 3.365/1941, incidirão juros compensatórios sobre os 20% que permaneceram inacessíveis, mesmo se a sentença considerar correta a indenização oferecida pelo expropriante (salvo no caso de levantamento integral autorizado pelo art. 34-A, do mesmo ato normativo). O motivo, conforme visto anteriormente, é justamente a privação do acesso à indenização integral, pelo expropriante, antes da perda da posse.

Sobre a taxa a ser aplicada a título de juros compensatórios, destaco que antes mesmo da atual conformação normativa, sua incidência já ocorria na proporção de 6% ao ano, em referência aos juros previstos no art. 1.062, do Código Civil/1916. Em razão dos índices inflacionários dos anos 1980, o E.STF entendeu por aumentar os juros compensatórios para 12% ao ano, conforme a Súmula 618, de 1984 (“Na desapropriação, direta ou indireta, a taxa dos juros compensatórios é de 12% (doze por cento) ao ano”). Em 11/06/1997, com o art. 3º da Medida Provisória nº 1.577, os juros compensatórios voltaram a ser de 6% ao ano sobre o valor da diferença eventualmente apurada entre o depósito ofertado e o valor total da indenização, a contar da imissão na posse, o que foi mantido pelo art. 15-A, do Decreto-Lei nº 3.365/1941 (observadas as disposições da MP nº 1.774-22/1999, depois alteradas pela MP 1.901-30/1999, com sucessivas reedições, até a MP nº 2.183/2001), com a seguinte redação atual:

Art. 15-A No caso de imissão prévia na posse, na desapropriação por necessidade ou utilidade pública e interesse social, inclusive para fins de reforma agrária, havendo divergência entre o preço ofertado em juízo e o valor do bem, fixado na sentença, expressos em termos reais, incidirão juros compensatórios de até seis por cento ao ano sobre o valor da diferença eventualmente apurada, a contar da imissão na posse, vedado o cálculo de juros compostos.

§ 1º Os juros compensatórios destinam-se, apenas, a compensar a perda de renda comprovadamente sofrida pelo proprietário.

§ 2º Não serão devidos juros compensatórios quando o imóvel possuir graus de utilização da terra e de eficiência na exploração iguais a zero.

§ 3º O disposto no caput deste artigo aplica-se também às ações ordinárias de indenização por apossamento administrativo ou desapropriação indireta, bem assim às ações que visem a indenização por restrições decorrentes de atos do Poder Público, em especial aqueles destinados à proteção ambiental, incidindo os juros sobre o valor fixado na sentença.

Note-se que na ADI 2.332/DF, o E.STF deferiu liminar (em 13/09/2001) para suspender a eficácia da expressão “de até seis por cento ao ano”, contida no caput do art. 15-A, do Decreto-Lei nº 3.365/1941, dando ainda interpretação conforme a Constituição ao dispositivo para estipular, como base de cálculo da incidência dos juros compensatórios, a diferença entre os 80% do preço ofertado (valor cujo levantamento, pelo expropriado, está autorizado pelo art. 33, §2º, do Decreto-Lei nº 3.365/1941) e o montante fixado na sentença. Na mesma oportunidade, o E.STF suspendeu a eficácia dos referidos §§ 1º e 2º do art. 15-A, do Decreto-Lei nº 3.365/1941, já na redação conferida pela MP nº 2.207-43/2000, reeditada até a MP nº 2.183-56/2001. Tratando-se de decisão com efeitos ex nunc, foram preservados os juros de 6% no período compreendido entre 11/06/1997 (MP 1.577/1997) e 13/09/2001 (publicação da liminar na ADI 2.332/DF), voltando a incidir, a partir de então, à taxa de 12% ao ano.

Ocorre que o E.STF mudou seu entendimento no julgamento definitivo da ADI 2.332/DF, como se nota nesta transcrição:

ADMINISTRATIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. REGIME JURÍDICO DOS JUROS COMPENSATÓRIOS E DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NA DESAPROPRIAÇÃO. PROCEDÊNCIA PARCIAL.

(...)

2. É constitucional o percentual de juros compensatórios de 6% (seis por cento) ao ano para a remuneração do proprietário pela imissão provisória do ente público na posse do seu bem, na medida em que consiste em ponderação legislativa proporcional entre o direito constitucional do proprietário à justa indenização (art. 5º, XXIV, CF/88) e os princípios constitucionais da eficiência e da economicidade (art. 37, caput, CF/88).

3. Declaração da inconstitucionalidade do termo “até” e interpretação conforme a Constituição do caput do art. 15-A, de maneira a incidir juros compensatórios sobre a diferença entre 80% do preço ofertado pelo ente público e o valor fixado na sentença.

4. Constitucionalidade dos §§ 1º, 2º e 4º, do art. 15-A, do Decreto-lei nº 3.365/1941, ao determinarem a não incidência dos juros compensatórios nas hipóteses em que (i) não haja comprovação de efetiva perda de renda pelo proprietário com a imissão provisória na posse (§ 1º), (ii)   o imóvel tenha “graus de utilização da terra e de eficiência na exploração iguais a zero” (§ 2º), e (iii) sobre o período anterior “à aquisição da propriedade ou posse titulada pelo autor da ação”. Voto reajustado para expressar o entendimento da maioria.

5. É constitucional a estipulação de parâmetros mínimo e máximo para a concessão de honorários advocatícios, previstos no § 1º, do art. 27, do Decreto-lei nº 3.365/1941.

6. Declaração da inconstitucionalidade da expressão “não podendo os honorários ultrapassar R$ 151.000,00 (cento e cinquenta e um mil reais)” por inobservância ao princípio da proporcionalidade e por possibilitar violação reflexa ao justo preço na indenização do expropriado (art. 5º, XXIV, CF/88).

7. Ação direta julgada parcialmente procedente. Fixação das seguintes teses:

“(i) É constitucional o percentual de juros compensatórios de 6% (seis por cento) ao ano para a remuneração pela imissão provisória na posse de bem objeto de desapropriação;

(ii) A base de cálculo dos juros compensatórios em desapropriações corresponde à diferença entre 80% do preço ofertado pelo ente público e o valor fixado na sentença;

(iii) São constitucionais as normas que condicionam a incidência de juros compensatórios à produtividade da propriedade;

(iv) É constitucional a estipulação de parâmetros mínimo e máximo para a concessão de honorários advocatícios em desapropriações, sendo, contudo, vedada a fixação de um valor nominal máximo de honorários.”

ADI 2332, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 17/05/2018, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-080 DIVULG 15-04-2019 PUBLIC 16-04-2019)

Portanto, em vista das teses vinculantes fixadas nessa ADI 2332, o C.STF reafirmou o conteúdo da Súmula 164, mas reviu a Súmulas 618 (acima transcritas), sobrepondo-se à Súmula 408 do E.STJ (“Nas ações de desapropriação, os juros compensatórios incidentes após a Medida Provisória 1.577 de 11.06.1997 devem ser fixados em 6% ao ano até 13/09/2001 e a partir de então, em 12% ao ano, na forma da Súmula 618 do Supremo Tribunal Federal”). A propósito, a Tese fixada no Tema 126 do E.STJ, que refletia o enunciado da Súmula 408 da mesma corte extrema, foi readequada, por ocasião do julgamento da Pet. 12.344/DF, em 28/10/2020, passando a figurar com a seguinte redação: “O índice de juros compensatórios na desapropriação direta ou indireta é de 12% até 11.6.97, data anterior à publicação da MP 1577/97”.

Por fim, os juros compensatórios, por integrarem o valor da indenização, compõem a base de cálculo de juros moratórios eventualmente incidentes, caso observada a hipótese prevista no art. 15-B, do Decreto-Lei nº 3.365/1941, sem que reste configurado o anatocismo, conforme entendimento cristalizado pela Súmula 102, do E.STJ (“A incidência dos juros moratórios sobre os compensatórios, nas ações expropriatórias, não constitui o anatocismo vedado em lei”).

No que concerne aos juros moratórios, no caso de imissão prévia na posse, na desapropriação por necessidade ou utilidade pública e interesse social (inclusive para fins de reforma agrária), havendo divergência entre o preço ofertado em juízo e o valor do bem fixado na sentença, eles serão devidos, para recompor a perda decorrente do atraso no efetivo pagamento da indenização fixada na decisão final de mérito, à razão de 6% ao ano. A propósito do termo inicial dos juros moratórios, consolidou-se, num primeiro momento, o entendimento segundo o qual sua incidência deveria ocorrer a partir do trânsito em julgado da sentença que os fixou, conforme enunciado da Súmula 70 do, E.STJ (“Os juros moratórios, na desapropriação direta ou indireta, contam-se desde o trânsito em julgado da sentença”). Esse entendimento, contudo, foi revisto a partir da inclusão do art. 15-B, no Decreto-Lei nº 3.365/1941, pela MP nº 2.183/2001, cujos efeitos se prolongam por força do art. 2º da Emenda Constitucional nº 32/2001, que determinou a incidência dos juros moratórios a partir de 1º de janeiro do exercício seguinte àquele em que o pagamento deveria ser feito, nos termos do art. 100 da Constituição. Nesse sentido, trago à colação o seguinte julgado:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO. JUROS MORATÓRIOS. APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE AO TEMPO DO TRÂNSITO EM JULGADO. ART. 15-B DO DECRETO-LEI 3.365/41, INSERIDO PELA MP 1.901-30/99. EMBARGOS PROVIDOS..1. O art. 15-B do Decreto-Lei 3.365/41 determina a incidência dos juros moratórios a partir de 1º de janeiro do exercício seguinte àquele em que o pagamento deveria ser feito, nos termos do art. 100 da Constituição, orientação, inclusive, que se harmoniza com a mais recente jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, no sentido de afastar a mora imputada à Fazenda Pública nas hipóteses em que o pagamento é realizado dentro das determinações constitucionalmente estabelecidas no art. 100 da CF/88..2. A obrigação de efetuar o pagamento da indenização nasce com o trânsito em julgado da sentença, a partir de quando a Fazenda Pública passa a incidir em mora. A lei aplicável, portanto, no que tange ao termo inicial de incidência dos juros moratórios, é a vigente nesse momento. 3. Embargos de divergência providos. (EREsp 586.212/RS, Rel. Ministra  Denise Arruda, , DJ 26.11.2007 p. 110).

Aqui, devem ser ressalvadas as hipóteses de desapropriação realizada por concessionária de serviço público, que não se sujeita ao regime de precatório. Nesses casos, mostra-se inaplicável a regra contida no art. 15-B, do Decreto-Lei n. 3.365/41, incidindo os juros moratórios a partir do trânsito em julgado da sentença, conforme entendimento assentado pelo E. STJ, a exemplo dos julgados transcritos a seguir:

AGRAVO REGIMENTAL. ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA. ART. 535 DO CPC. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE OU ERRO MATERIAL NO ACÓRDÃO RECORRIDO. ART. 435 DO CPC. INEXISTE CERCEAMENTO DE DEFESA. REVER A NECESSIDADE DE ESCLARECIMENTO DE QUESITOS PERICIAIS DEMANDARIA REVOLVIMENTO DE MATÉRIA FÁTICO PROBATÓRIA. SÚMULA 7 DO STJ. REVISÃO DO VALOR DAS BENFEITORIAS. SÚMULA 7 DO STJ. JUROS COMPENSATÓRIOS. DEVIDOS EM RAZÃO DA IMISSÃO PROVISÓRIA NA POSSE. ART. 15-A DO DECRETO-LEI 3.365/41. DESAPROPRIAÇÃO LEVADA A EFEITO POR CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. NÃO SE APLICA O ART. 15-B DO DECRETO-LEI 3.365/41. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Inexiste violação ao art. 535 do CPC, uma vez que o acórdão recorrido não padece de omissão, contradição, obscuridade ou erro material. 2. Quanto ao art. 435 do CPC e alegação de cerceamento de defesa, a análise da necessidade ou não de esclarecimento dos quesitos periciais demandaria revolvimento de matéria fático-probatória, o que encontra óbice no enunciado da Súmula 7 do STJ. 3. Revisar o valor das benfeitorias também demandaria a reapreciação de provas, aplicando-se, portanto a Súmula 7 deste Superior Tribunal de Justiça. 4. Não se aplica o art. 12, V da Lei 8.269/93 ao caso, uma vez que se trata de desapropriação por utilidade pública e não para fins de reforma agrária. 5. Nos termos do art. 15-A do Decreto-Lei 3.365/41, só devem incidir juros compensatórios sobre o valor relativo aos bens que foram objetos de imissão provisória na posse. 6. Este Superior Tribunal de Justiça já firmou o entendimento no julgamento do REsp 1.116.364/PI, sob o rito do art. 543-C do CPC, de Relatoria do Min. CASTRO MEIRA, de que é irrelevante o fato de imóvel ser ou não produtivo para a fixação dos juros compensatórios, pois estes são devidos em razão da perda antecipada da posse. 7. Em se tratando de desapropriação feita por concessionária de serviço público, não sujeita a regime de precatório, não se aplica a regra do art. 15-B do Decreto-Lei 3.365/41, devendo os juros moratórios incidir a partir do trânsito em julgado da sentença. Precedente: REsp 1306397, Rel. Min. ARI PARGENDLER, DJe 27/11/2013. Pelo mesmo motivo, também não há razão para que não se aplicar o art. 475-J do CPC. 8. Agravo regimental desprovido. (AgRg nos EDcl no REsp 1350914/MS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 22/04/2014, DJe 07/05/2014)

ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO LEVADA A EFEITO POR CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. TERMO INICIAL DOS JUROS MORATÓRIOS: TRÂNSITO DA SENTENÇA EM JULGADO. Nas ações a que se refere o art. 15-A, os juros moratórios destinam-se a recompor a perda decorrente do atraso no efetivo pagamento da indenização fixada na decisão final de mérito, e somente serão devidos à razão de até seis por cento ao ano, a partir de 1º de janeiro do exercício seguinte àquele em que o pagamento deveria ser feito, nos termos do art. 100 da Constituição" (DL. 3.365/41, ART. 15). A aludida norma, como se infere do respectivo texto, é inaplicável às ações de desapropriação ajuizadas por concessionárias de serviços públicos, cujas condenações em quantia certa não estão sujeitas ao regime de precatório disciplinado no art. 100 da Constituição Federal. Recurso especial conhecido, mas desprovido. (REsp 1306397/GO, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/11/2013, DJe 27/11/2013)

Por fim, a base de cálculo dos juros moratórios será a diferença entre os 80% do valor da oferta inicial depositada e o valor total da indenização fixado na sentença (vale dizer, o montante que ficou indisponível ao expropriado, e cujo recebimento se dá após o trânsito em julgado). Essa é a orientação do E.STJ, como se nota no seguinte julgados que trago à colação:

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. DESAPROPRIAÇÃO. JUROS MORATÓRIOS. OFENSA À COISA JULGADA. INEXISTÊNCIA. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. BASE DE CÁLCULO DOS JUROS MORATÓRIOS E COMPENSATÓRIOS. DIFERENÇA ENTRE 80% DO VALOR DA OFERTA INICIAL E O DA INDENIZAÇÃO FIXADO NA SENTENÇA. ALÍNEA "C". NÃO DEMONSTRAÇÃO DA DIVERGÊNCIA. (...) 3. Esta Corte possui o entendimento de que os juros de mora e a correção monetária são encargos acessórios da obrigação principal e devem ser incluídos na conta de liquidação, ainda que já homologado o cálculo anterior, inexistindo preclusão ou ofensa à coisa julgada por causa dessa inclusão. É o caso. 4. A base de cálculo dos juros moratórios e compensatórios é a diferença entre os 80% do valor da oferta inicial depositada e o que foi fixado em sentença para a indenização, ou seja, os valores que ficaram indisponíveis ao expropriado, que somente serão recebidos após o trânsito em julgado. Precedente: REsp 1.272.487/SE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 20/4/2015). (...) 7. Recurso Especial não provido. (RESP - RECURSO ESPECIAL - 1685862 2017.01.62569-1, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:26/02/2019)

No caso dos autos, aduzem os expropriados que o valor da terra nua alcançado pelo Perito do Juízo, com a utilização dos elementos de pesquisa, está aquém do valor de mercado.

Entretanto, não vejo razões para que o criterioso trabalho técnico apresentado seja rejeitado para fins de determinação do valor da terra nua, notadamente quando a motivação adotada na sentença está de acordo com as diretrizes legais acerca do tema. A mera discordância dos expropriados, ora apelantes, quanto ao valor da indenização acolhido pela sentença, não justifica seja desconsiderado o laudo pericial produzido por perito imparcial, tecnicamente qualificado e que conta com a confiança do juízo, em prol de alegações genéricas, que não apontam as razões pelas quais que chegaram a conclusão diversa, configurando mero inconformismo sem embasamento técnico que o sustente.

Com efeito, consta do Laudo Pericial (ID 125594918, fls. 76) que o valor unitário da terra nua é de R$13.654,77/ha (treze mil seiscentos e cinquenta e quatro reais e setenta e sete centavos), válido para:  (a) propriedade rural com benfeitorias; (b) propriedade rural com nota agronômica 0,612; e (c) propriedade enquadrada, a título de situação, na condição muito boa. A data-base do cálculo é junho de 2014.

No anexo 9 do Laudo Pericial (ID 125595546, fls. 32/55) encontra-se a Memória de Cálculo do Valor da Terra Nua – Fazenda São Raphael Santana, fundamentando o valor encontrado pelo perito judicial, não havendo elementos de convicção nos autos aptos a demonstrar, de maneira indubitável, que o expert tenha incorrido em algum equívoco.

Os apelantes/expropriados, por outro lado, também sustentam que o Laudo pericial oficial não menciona o valor dos lucros cessantes nem do dano emergente, os quais seriam consequência da interrupção da atividade econômica exercida na propriedade, pois a parceira, a suco-alcooleira RAIZEN não renovou o contrato de exploração agrícola da área.

A questão, contudo, foi adequadamente solucionada pela sentença impugnada, na medida em que, realmente, nada há nos autos que autorize concluir estar a alegada cessação da exploração da área atrelada à pendencia de processo de desapropriação, mesmo porque os réus permaneceram na posse do imóvel desapropriando. Nem mesmo a aventada cessação da exploração agrícola da área pode ser admitida como verdadeira, pois, conforme consta do laudo pericial, "A propriedade avalianda é ocupada integralmente com agricultura comercial de cana-de-açúcar", de forma que nem mesmo há área de vegetação nativa suficiente que possa ser aproveitada para esta finalidade de cultivo agrícola (ID 125594918, fls. 59). As imagens colacionadas às fls. 60, 61, 65 e 106 do ID retro, corroboram o correto afastamento da tese defendida pelos expropriados.

Nesse contexto, sob o aspecto processual, registro que a ocorrência das perdas e danos (assim entendidas como os danos emergentes e os lucros cessantes – art. 402 do CC), devem ser objeto de prova no curso da lide. O ônus da prova, por sua vez, toca àquele que alega ter sofrido o prejuízo material.

Porém, examinando o laudo pericial, extrai-se que o plantio da cana-de-açúcar apenas não foi avaliado por falta das informações necessárias para tanto, uma vez que o assistente técnico e o procurador dos expropriados, não obstante instados a fazê-lo, não forneceram os dados do contrato de arrendamento solicitados pelo perito judicial, conduta que, na prática, inviabilizou a avaliação. Nesse sentido, extrai-se a seguinte informação prestada pelo expert (ID 125594918, fls. 83):

O problema para a avaliação da cana-de-açúcar é a falta de informações, pois quando da vistoria fora solicitado ao Assistente Técnico do Expropriado os dados do arrendamento de cana, dados estes que não foram enviados até o presente momento, mesmo tendo reiterado o pedido em outras ocasiões, via contato telefônico.

Os mesmos dados foram também solicitados ao advogado do Expropriado, conforme ilustra o e-mail abaixo, figura, mas até a presente data não recebemos as informações solicitadas.

Ora, nesse diapasão, até mesmo por conta da vedação ao comportamento contraditório, manifestação da boa-fé no processo, não podem os expropriados se beneficiarem de uma situação embaraçosa que eles próprios criaram com sua conduta omissiva, deixando de colaborar para o cumprimento de um ônus probatório que, em última análise, a eles próprios cabia por força da legislação processual (art. 333 do CPC/1973 correspondente ao art. 373 do CPC/2015). Assim, se nenhum valor foi apurado a título de perdas e danos (lucros cessantes e danos emergentes), isso se deveu ao fato de o imóvel ter permanecido à disposição dos réus para exploração econômica (donde não se poder falar em lucros cessantes relacionados com o processo de expropriação) e à circunstância de não terem eles fornecido as informações necessárias, solicitadas pelo perito judicial (donde não se poder falar em danos emergentes).

Na sequência, cumpre esclarecer que, havendo divergência entre a área medida, levantada pela perícia oficial, e a área registrada, deve prevalecer a primeira, pois elaborada por meios mais precisos pelo expert, sob pena de enriquecimento sem causa do expropriado, que seria indenizado por área superior à efetivamente expropriada (nesse sentido, AC 0037570-62.2004.4.01.3800, JUIZ FEDERAL JOSÉ ALEXANDRE FRANCO, TRF1 - TERCEIRA TURMA, e-DJF1 27/03/2018)

Dessa forma, há de prevalecer a área estimada no laudo pericial, correspondente a 736,3678 (setecentos e trinta e seis hectares trinta e seis ares e setenta e oito centiares), em detrimento da área que consta da certidão do Registro Imobiliário do imóvel desapropriando (Fazenda São Raphael), que é de 743,3579 (setecentos e quarenta e três hectares, trinta e cinco área e setenta e nove centiares). É de se recordar que embora o registro imobiliário goze da presunção de veracidade, esta, por ser meramente relativa, deve ceder diante da prova técnica em sentido diverso.

Passo ao exame da apelação do INCRA. De início, aduz a Autarquia que “Ao elaborar o Laudo Pericial de fls. 976/1310, acolhido pelo juízo para condenar o INCRA no pagamento da indenização, a perita nomeada utilizou como parâmetros de avaliação valores de mercado de junho de 2014 e não aqueles vigentes à data da perícia administrativa acontecida em abril de 2004. Como exaustivamente consignado nos autos, o valor da indenização deverá corresponder ao valor apurado na data da perícia administrativa, sob pena de violação do princípio constitucional da justa indenização (...)”.

Em que pesem as alegações do INCRA, já ficou devidamente esclarecido acima, na fundamentação deste mesmo voto, que “O valor da indenização deve ser contemporâneo à avaliação, tendo como base o laudo adotado pelo juiz para a fixação do justo preço, pouco importando a data da imissão na posse ou mesmo a da avaliação administrativa" (nessa linha, STJ, REsp 1.314.758/CE, Relator(a) Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 24/10/2013)”. Nesse mesmo diapasão, outro recente julgado do C. STJ:

ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DESAPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA. IMISSÃO NA POSSE. VALOR DA INDENIZAÇÃO CONTEMPORÂNEO À DATA DA AVALIAÇÃO JUDICIAL. ART. 26 DO DECRETO-LEI 3.365/41.

1. Nos termos da jurisprudência pacífica do STJ, "o art. 26 do Decreto-Lei 3.365/1941 atribui à justa indenização o predicado da contemporaneidade à avaliação judicial, sendo desimportante, em princípio, o laudo elaborado pelo ente expropriante para a aferição desse requisito ou a data da imissão na posse" (STJ, REsp n. 1.736.823/SP, relator Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 20/8/2018).

2. Hipótese em que o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo reformou a sentença para fixar como valor da indenização o valor encontrado em avaliação provisória elaborada pelo ente expropriante realizada em 2010 no momento da imissão na posse, apesar da aquiescência do próprio ente expropriante - Município de Sorocaba - com o valor da perícia definitiva.

3. Restabelecimento da sentença para fixar o valor da indenização conforme a perícia judicial definitiva nos termos da jurisprudência desta Corte.

Agravo interno improvido.

(AgInt nos EDcl no AREsp n. 1.240.912/SP, relator Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 13/3/2023, DJe de 16/3/2023.)

Importante complementar que não se desconhece entendimento consolidado no sentido de que o órgão julgador pode, em razão de particularidades do caso concreto, e com base no livre convencimento motivado, adotar critério distinto, como, por exemplo, o laudo elaborado administrativamente. Isso só pode ocorrer, porém, em situações nas quais exista um lapso razoavelmente longo entre a imissão na posse e a avaliação pericial judicial, bem como uma valorização imobiliária exorbitante, circunstâncias que não restaram evidenciadas neste caso sob apreciação.

Insurge-se o INCRA, igualmente, contra a incidência de juros compensatórios na desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária. Aponta violação ao art. 12 da Lei nº 8.629/1993, cuja redação é a seguinte:

Art. 12.  Considera-se justa a indenização que reflita o preço atual de mercado do imóvel em sua totalidade, aí incluídas as terras e acessões naturais, matas e florestas e as benfeitorias indenizáveis, observados os seguintes aspectos:                     (Redação dada Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

I - localização do imóvel;                    (Incluído dada Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

II - aptidão agrícola;                     (Incluído dada Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

III - dimensão do imóvel;                  (Incluído dada Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

IV - área ocupada e ancianidade das posses;                    (Incluído dada Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

V - funcionalidade, tempo de uso e estado de conservação das benfeitorias.                     (Incluído dada Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

§ 1o  Verificado o preço atual de mercado da totalidade do imóvel, proceder-se-á à dedução do valor das benfeitorias indenizáveis a serem pagas em dinheiro, obtendo-se o preço da terra a ser indenizado em TDA.                       (Redação dada Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

§ 2o  Integram o preço da terra as florestas naturais, matas nativas e qualquer outro tipo de vegetação natural, não podendo o preço apurado superar, em qualquer hipótese, o preço de mercado do imóvel.                 (Redação dada Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

§ 3o  O Laudo de Avaliação será subscrito por Engenheiro Agrônomo com registro de Anotação de Responsabilidade Técnica - ART, respondendo o subscritor, civil, penal e administrativamente, pela superavaliação comprovada ou fraude na identificação das informações.                      (Incluído dada Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

Tal como já referido anteriormente, em sede de desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária, “Os juros compensatórios destinam-se, apenas, a compensar a perda de renda comprovadamente sofrida pelo proprietário” (art. 15-A, § 1º, do Decreto-Lei nº 3.365/1941) (grifei).

De fato, a perda da propriedade é compensada pelo valor do principal, complementado pela incidência da correção monetária e dos eventuais juros moratórios, caso aquele valor não seja pago no prazo constitucional. De outro lado, os juros compensatórios não têm a função de indenizar o valor da propriedade em si, mas sim o de compensar a perda da renda decorrente da privação da posse e da exploração econômica do imóvel entre a data da imissão na posse pelo Poder Público e a transferência compulsória ao patrimônio estatal, que ocorre com o pagamento do justo preço estabelecido pela sentença.

No caso dos autos, contudo, a comprovação dessa perda de renda sofrida pelos expropriados não existe. Com efeito, ao tratar da questão relativa aos danos emergentes e aos lucros cessantes, isto é, aquilo que os expropriados efetivamente alegam ter perdido e o que razoavelmente afirmam ter deixado de ganhar, registrou expressamente a sentença apelada que da leitura do laudo pericial é possível extrair que o plantio da cana-de-açúcar apenas não foi avaliado por falta de informações, haja vista que o assistente técnico e o procurador dos expropriados não forneceram os dados do arrendamento, a despeito de os mesmos haverem sido reiteradamente solicitados pelo perito do juízo. A conduta omissiva dos expropriados, na realidade, inviabilizou a avaliação acerca da exploração econômica do imóvel desapropriando (fls. 1047/1048).

Anotou, ainda, a decisão recorrida, que não se revela legítimo aos réus se servirem de uma situação de dificuldade probatória que eles próprios criaram, pois se nenhum valor foi apurado a título de lucros cessantes e de danos emergentes, isso se deveu ao fato de o imóvel ter permanecido à disposição dos réus para exploração agrícola (donde não se poder falar em lucros cessantes relacionados com o processo de expropriação) e à circunstância de não terem eles fornecido as informações requeridas pelo perito (donde não se poder falar em danos emergentes).

Do laudo pericial produzido em juízo, por sua vez, consta que o problema para a avaliação da cana-de-açúcar foi a falta de informações, pois quando da vistoria realizada pelo perito, fora solicitado ao assistente técnico dos expropriados que fornecesse os dados do arrendamento de cana, dados estes que não foram enviados até o momento da confecção do laudo, mesmo tendo sido reiterado o pedido em outras ocasiões, via contato telefônico. E prossegue o perito judicial:

(...)

Os mesmos dados foram também solicitados ao advogado do Expropriado, conforme ilustra o e-mail abaixo, figura , mas até a presente data não recebemos as informações solicitadas.

Os e-mails trocados com o Advogado do Expropriado estão no Anexo 10.

Assim sendo, fica impossível fazer a correta avaliação da cultura de cana-de-açúcar da propriedade avalianda, mesmo sabendo que se trata de um arrendamento, pois faltam as seguintes informações básicas:

V valor do arrendamento, em toneladas de cana por unidade de área; V prazo do arrendamento, em anos; V data de início do contrato e arrendamento.

Desta forma, fica impossível avaliar a cultura da cana-de-açúcar existente na propriedade avalianda. Caso sejam apresentadas as informações necessárias, procederar-se ao cálculo do valor econômico da cultura.

(...)

Na sequência, o laudo pericial detalha a avaliação de todas as culturas encontradas na Fazenda São Raphael Santana, chegando ao valor total igual a R$0,00 (zero real) para as benfeitorias reprodutivas.

Vale repetir, neste ponto, que o ônus da prova acerca das perdas e danos (danos emergentes e lucros cessantes) é dos expropriados, que devem demonstrar a perda de renda efetivamente sofrida com o processo expropriatório, a fim de que possam incidir os juros compensatórios. Entretanto, tal como se percebe do exame dos autos, tal prova não foi produzida por culpa exclusiva dos proprietários do imóvel expropriando, os quais, deixando de colaborar para a solução da causa, não forneceram os elementos necessários para que o perito judicial pudesse avaliar os prejuízos sofridos, inclusive no que toca a eventual perda de rendimentos decorrentes da desapropriação. Desta forma, não podem os réus, só agora, pretender se beneficiar da própria conduta omissiva. Nesse sentido, retomo os requisitos necessários para que sejam devidos juros compensatórios: 1) imissão prévia (provisória) do expropriante na posse do imóvel; 2) graus de utilização (potencial para ser explorado) e de eficiência na exploração (efetivo aproveitamento) do imóvel superiores a zero; 3) comprovação da perda de renda sofrida pelo proprietário; 4) o reconhecimento, pela sentença, de que o valor inicialmente ofertado pelo expropriante é insuficiente para a reparação, fazendo com que o expropriado ficasse privado, ainda que parcialmente, da justa e prévia indenização no período entre a perda da posse (termo inicial) e o efetivo recebimento. Assim, a despeito do cultivo de cana-de-açúcar na propriedade exproprianda, por não haver efetiva comprovação da perda de renda sofrida pelos proprietários, não há que se falar em juros compensatórios, devendo ser reformada a sentença neste ponto.

Em relação aos juros moratórios, é preciso deixar claro que a sentença apelada assim os estabeleceu:

Juros moratórios de 6% ao ano, na forma do artigo 15-B do Decreto-Lei n 3.365/41.

Como se sabe, o art. 15-B do Decreto-Lei nº 3.365/1941 prevê a incidência dos juros moratórios da seguinte maneira, “in verbis”:

Art. 15-B Nas ações a que se refere o art. 15-A, os juros moratórios destinam-se a recompor a perda decorrente do atraso no efetivo pagamento da indenização fixada na decisão final de mérito, e somente serão devidos à razão de até seis por cento ao ano, a partir de 1º de janeiro do exercício seguinte àquele em que o pagamento deveria ser feito, nos termos do art. 100 da Constituição.                     (Incluído pela Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

À vista do exposto, tem-se que não procede a irresignação do INCRA, de vez que a sentença fixou os juros moratórios na forma estabelecida pela legislação de regência, ou seja, 6% ao ano, a partir do dia 1º de janeiro do exercício seguinte àquele em que o pagamento deveria ser feito, nos termos do art. 100 da CF.

Lembro, ainda, que os juros compensatórios, por integrarem o valor da indenização, compõem a base de cálculo de juros moratórios eventualmente incidentes, caso observada a hipótese prevista no art. 15-B, do Decreto-Lei nº 3.365/1941, sem que reste configurado o anatocismo, conforme entendimento cristalizado pela Súmula 102, do E.STJ (“A incidência dos juros moratórios sobre os compensatórios, nas ações expropriatórias, não constitui o anatocismo vedado em lei”). Entretanto, tal como mencionado acima, no caso concreto não haverá a incidência de juros compensatórios, à míngua da demonstração da perda de renda sofrida pelos proprietários.

No tocante ao argumento de que a complementação dos valores eventualmente devidos em relação às benfeitorias deverá se submeter ao regime dos precatórios, muito embora a questão esteja aguardando decisão do E. STF no Recurso Extraordinário nº 922.144, com Repercussão Geral reconhecida (Tema nº 865), o certo é que a matéria encontra-se prejudicada no caso concreto, tendo em conta que não se mostra devida complementação alguma nesse sentido. O mesmo se pode dizer acerca da emissão de TDAs complementares, as quais não existem na espécie.

Por fim, tenho que os honorários advocatícios foram estabelecidos pela sentença dentro dos parâmetros legais previstos no art. 19 da Lei Complementar nº 76/93, cuja redação é a seguinte:

 Art. 19. As despesas judiciais e os honorários do advogado e do perito constituem encargos do sucumbente, assim entendido o expropriado, se o valor da indenização for igual ou inferior ao preço oferecido, ou o expropriante, na hipótese de valor superior ao preço oferecido.

§ 1º Os honorários do advogado do expropriado serão fixados em até vinte por cento sobre a diferença entre o preço oferecido e o valor da indenização.

(...)

Não se vislumbra, portanto, razão para sua alteração.

Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação de RUBENS FRANCO DE MELLO (ESPOLIO), e de RITA HELENA FRANCO DE MELLO (assistente) e DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação do INCRA e ao reexame necessário, para excluir do cálculo da indenização a parcela correspondente aos juros compensatórios.

É como voto.

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

APELAÇÃO. REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE SOCIAL PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA. SUBSTITUIÇÃO DO PERITO. QUESTÃO JÁ DECIDIDA. OBSERVÂNCIA DAS DISPOSIÇÕES CONTIDAS NA NBR nº 14.653-3- ABNT. VALOR DA INDENIZAÇÃO. AVALIAÇÃO ADMINISTRATIVA E LAUDO PERICIAL. JUROS MORATÓRIOS E COMPENSATÓRIOS. ÔNUS DA PROVA.

- A questão prejudicial da necessidade de substituição do perito, o que demandaria a realização de nova prova pericial, já foi objeto de exame e decisão por esta C. Corte Regional, nos autos do agravo de instrumento nº 0020327-19.2015.403.0000, já transitado em julgado.

- É vedado à parte rediscutir, no curso do processo, as questões já decididas, a cujo respeito se operou a preclusão (art. 507 do CPC).

- O exame do laudo pericial produzido nos autos não evidencia qualquer violação ao disposto na NBR nº 14.653-3- ABNT, que  especifica procedimentos e requisitos, bem como fornece diretrizes para a avaliação de imóveis rurais, especialmente quanto a: a) instituição de terminologia, definições, símbolos e abreviaturas; b) classificação da sua natureza; c) descrição das atividades básicas; d) definição da metodologia básica; e) identificação do valor; f) especificação das avaliações; g) requisitos básicos de laudos de avaliação.

- No que concerne especificamente à desapropriação, trata-se de um procedimento de direito público, com fundamento no art. 5º, XXIV, da Constituição Federal, por meio do qual será possível a transferência compulsória da propriedade de terceiros ao Poder Público, por razões de utilidade pública, necessidade pública, ou interesse social, mediante justa e prévia indenização.

- A regulamentação da desapropriação está contida, essencialmente, em dois diplomas normativos principais: o Decreto-Lei nº. 3.365/1941, que dispõe sobre casos de desapropriação por utilidade pública, e a Lei nº 4.132/1962, que trata dos casos de desapropriação por interesse social, embora outros dispositivos legais e constitucionais versem sobre a matéria (art. 182, § 4º, III, art. 184 e art. 243, da CF; art. 8º, da Lei nº. 10.257/2001; Lei nº 8.629/1993; Lei Complementar nº 76/1993; entre outros).

- Ajuizada a ação expropriatória, caberá ao expropriado, em contestação, tão somente a discussão sobre eventuais vícios do processo judicial, ou a impugnação do valor oferecido, consoante disciplina do art. 20, do Decreto-lei no 3.365/1941, sendo vedada, portanto, o oferecimento de reconvenção, dada a limitação da matéria impugnável.

- Estabelecida a controvérsia sobre o valor da indenização, impõe-se a realização de prova pericial, conforme determina o art. 23, da lei expropriatória, para que então sobrevenha decisão acerca da lide.

- A propósito da indenização devida à parte expropriada, deve ser observada a regra fundamental prevista no art. 5º, XXIV, da CF, segundo a qual, a indenização tem que ser prévia, justa e em dinheiro. Será prévia a indenização paga antes da transferência do bem. Será justa a indenização suficiente à preservação do patrimônio do titular do bem atingido, devendo compreender o valor venal do imóvel, e a reparação por eventuais danos, além dos consectários previstos em lei. Finalmente, a indenização será, em regra, na moeda corrente no país, admitindo-se o pagamento por precatório, de eventual diferença acolhida em sentença judicial. Excepcionalmente, no entanto, a indenização não será paga em dinheiro. São hipóteses normalmente associadas ao não atendimento da função social da propriedade, como na desapropriação especial urbana (art. 182, §4º, III, da CF), cujo pagamento se dará mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, ou ainda na desapropriação especial rural (art. 184, da CF), em que o pagamento ocorrerá por meio de títulos da dívida agrária, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão.

- A incidência de juros compensatórios nas desapropriações encontra disciplina no art. 15-A, do Decreto-Lei nº 3.365/1941 (incluído pela mesma MP nº 2.183/2001). Para que sejam devidos juros compensatórios, deverão estar preenchidos os seguintes requisitos: 1) imissão prévia (provisória) do expropriante na posse do imóvel; 2) graus de utilização (potencial para ser explorado) e de eficiência na exploração (efetivo aproveitamento) do imóvel superiores a zero; 3) comprovação da perda de renda sofrida pelo proprietário; 4) o reconhecimento, pela sentença, de que o valor inicialmente ofertado pelo expropriante é insuficiente para a reparação, fazendo com que o expropriado ficasse privado, ainda que parcialmente, da justa e prévia indenização no período entre a perda da posse (termo inicial) e o efetivo recebimento.

- No que concerne aos juros moratórios, no caso de imissão prévia na posse, na desapropriação por necessidade ou utilidade pública e interesse social (inclusive para fins de reforma agrária), havendo divergência entre o preço ofertado em juízo e o valor do bem fixado na sentença, eles serão devidos, para recompor a perda decorrente do atraso no efetivo pagamento da indenização fixada na decisão final de mérito, à razão de 6% ao ano. A propósito do termo inicial dos juros moratórios, consolidou-se, a partir da inclusão do art. 15-B, no Decreto-Lei nº 3.365/1941, pela MP nº 2.183/2001, cujos efeitos se prolongam por força do art. 2º da Emenda Constitucional nº 32/2001, que determinou a incidência dos juros moratórios a partir de 1º de janeiro do exercício seguinte àquele em que o pagamento deveria ser feito, nos termos do art. 100 da Constituição.

- Não vejo razões para que o criterioso trabalho técnico apresentado pelo perito judicial não seja acolhido para fins de determinação do valor da terra nua, notadamente quando a motivação adotada na sentença está de acordo com as diretrizes legais acerca do tema. A mera discordância dos expropriados, ora apelantes, quanto ao valor da indenização acolhido pela sentença, não justifica seja desconsiderado o laudo pericial produzido por perito imparcial, tecnicamente qualificado e que conta com a confiança do juízo, em prol de alegações genéricas, que não apontam as razões pelas quais que chegaram a conclusão diversa, configurando mero inconformismo sem embasamento técnico que o sustente.

- A ocorrência das perdas e danos (assim entendidas como os danos emergentes e os lucros cessantes – art. 402 do CC), devem ser objeto de prova no curso da lide. O ônus da prova, por sua vez, toca àquele que alega ter sofrido o prejuízo material. 

- Examinando o laudo pericial, extrai-se que o plantio da cana-de-açúcar apenas não foi avaliado por falta das informações necessárias para tanto, uma vez que o assistente técnico e o procurador dos expropriados, não obstante instados a fazê-lo, não forneceram os dados do contrato de arrendamento solicitados pelo perito judicial, conduta que, na prática, inviabilizou a avaliação.

- Havendo divergência entre a área medida, levantada pela perícia oficial, e a área registrada, deve prevalecer a primeira, pois elaborada por meios mais confiáveis, sob pena de enriquecimento sem causa do expropriado, que seria indenizado por área superior à efetivamente expropriada.

- O valor da indenização deve ser contemporâneo à avaliação, tendo como base o laudo adotado pelo juiz para a fixação do justo preço, pouco importando a data da imissão na posse ou mesmo a da avaliação administrativa.

- Os honorários advocatícios foram estabelecidos pela sentença dentro dos parâmetros legais previstos no art. 19 da Lei Complementar nº 76/93.

- Apelação de RUBENS FRANCO DE MELLO (ESPOLIO), e de RITA HELENA FRANCO DE MELLO (assistente) desprovida. Apelação do INCRA e reexame necessário parcialmente providos, para excluir do cálculo da indenização a parcela correspondente aos juros compensatórios.

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO à apelação de RUBENS FRANCO DE MELLO (ESPOLIO), e de RITA HELENA FRANCO DE MELLO (assistente) e DAR PARCIAL PROVIMENTO à apelação do INCRA e ao reexame necessário, para excluir do cálculo da indenização a parcela correspondente aos juros compensatórios, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.