Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001759-23.2009.4.03.6124

RELATOR: Gab. 18 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, UNIÃO FEDERAL, INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS, CESP COMPANHIA ENERGETICA DE SAO PAULO, RIO PARANÁ ENERGIA S.A

Advogados do(a) APELANTE: ADRIANA ASTUTO PEREIRA - SP389401-A, LARA PORTUGAL DA ROCHA - SP296822-A
Advogado do(a) APELANTE: ALEXANDRE ABBY - SP303656-A

APELADO: JULIO GALBIATTI JUNIOR, CESP COMPANHIA ENERGETICA DE SAO PAULO, MUNICIPIO DE POPULINA, RIO PARANÁ ENERGIA S.A, INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, UNIÃO FEDERAL

Advogados do(a) APELADO: ADRIANA ASTUTO PEREIRA - SP389401-A, LARA PORTUGAL DA ROCHA - SP296822-A
Advogados do(a) APELADO: JOAO CEZAR ROBLES BRANDINI - SP180183-N, JULIO ROBERTO DE SANT ANNA JUNIOR - SP117110-A
Advogado do(a) APELADO: JOAO ALBERTO ROBLES - SP81684-A
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE ABBY - SP303656-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001759-23.2009.4.03.6124

RELATOR: Gab. 18 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, UNIÃO FEDERAL, INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS, CESP COMPANHIA ENERGETICA DE SAO PAULO, RIO PARANÁ ENERGIA S.A

Advogados do(a) APELANTE: ADRIANA ASTUTO PEREIRA - SP389401-A, LARA PORTUGAL DA ROCHA - SP296822-A
Advogado do(a) APELANTE: ALEXANDRE ABBY - SP303656-A

APELADO: JULIO GALBIATTI JUNIOR, CESP COMPANHIA ENERGETICA DE SAO PAULO, MUNICIPIO DE POPULINA, RIO PARANÁ ENERGIA S.A, INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, UNIÃO FEDERAL

Advogados do(a) APELADO: ADRIANA ASTUTO PEREIRA - SP389401-A, LARA PORTUGAL DA ROCHA - SP296822-A
Advogados do(a) APELADO: JOAO CEZAR ROBLES BRANDINI - SP180183-N, JULIO ROBERTO DE SANT ANNA JUNIOR - SP117110-A
Advogado do(a) APELADO: JOAO ALBERTO ROBLES - SP81684-A
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE ABBY - SP303656-A

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R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de Embargos de Declaração opostos por RIO PARANÁ ENERGIA S/A; COMPANHIA ENERGÉTICA DO ESTADO DE SÃO PAULO- CESP, e do INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA, em face de decisão que em sessão realizada em 15 de maio de 2023, a Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitou as preliminares e, no mérito, deu parcial provimento às apelações do MPF, do IBAMA e negou provimento às apelações da UNIÃO FEDERAL, CESP e RPESA.

Sustentam os embargantes, em síntese, a ocorrência de omissão do julgado, no que tange à:   sucessão processual, comprovação de dano e prova pericial, quanto à natureza do imóvel, quanto à análise da legitimidade passiva da CESP, avaliação sobre a nulidade da sentença por ofensa ao contraditório, análise da preliminar de cerceamento de defesa e com relação ao marco temporal  para aplicação do artigo 62 do Código Florestal, (ID. 274641586, 274670491, 275081179).    

Os embargados apresentaram contrarrazões pela rejeição dos embargos.

É o relatório. Decido.

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001759-23.2009.4.03.6124

RELATOR: Gab. 18 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, UNIÃO FEDERAL, INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS, CESP COMPANHIA ENERGETICA DE SAO PAULO, RIO PARANÁ ENERGIA S.A

Advogados do(a) APELANTE: ADRIANA ASTUTO PEREIRA - SP389401-A, LARA PORTUGAL DA ROCHA - SP296822-A
Advogado do(a) APELANTE: ALEXANDRE ABBY - SP303656-A

APELADO: JULIO GALBIATTI JUNIOR, CESP COMPANHIA ENERGETICA DE SAO PAULO, MUNICIPIO DE POPULINA, RIO PARANÁ ENERGIA S.A, INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, UNIÃO FEDERAL

Advogados do(a) APELADO: ADRIANA ASTUTO PEREIRA - SP389401-A, LARA PORTUGAL DA ROCHA - SP296822-A
Advogados do(a) APELADO: JOAO CEZAR ROBLES BRANDINI - SP180183-N, JULIO ROBERTO DE SANT ANNA JUNIOR - SP117110-A
Advogado do(a) APELADO: JOAO ALBERTO ROBLES - SP81684-A
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE ABBY - SP303656-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

V O T O

 

 

Nos termos do art. 1.022, do Código de Processo Civil, os embargos de declaração são cabíveis contra qualquer decisão judicial e possuem a função específica de esclarecer ou integrar o julgado, sanando obscuridades, contradições ou omissões, bem como de corrigir erros materiais.

No julgado não há omissão, obscuridade ou contradição. Devidamente analisadas as questões trazidas a debate, tendo sido o acórdão embargado suficientemente fundamentado, atendendo ao estabelecido no art. 93, inc. IX da CF/88, o qual não pressupõe motivação exaustiva, foi adotado entendimento diverso do pretendido pela parte embargante.

Da simples leitura da decisão embargada verifica-se que, no julgamento dos recursos interpostos na Ação Civil Pública,  foi dado parcial provimento às apelações do MPF, do IBAMA e negado provimento às apelações da UNIÃO FEDERAL, CESP e RPESA, nos seguintes termos, quanto às omissões apontadas:
 

"Ilegitimidade passiva arguida pela CESP e pela empresa  Rio Paraná S/A 

Sobre a ilegitimidade passiva arguida tanto pela CESP como pela RIO PARANÁ ENERGIA S/A, referida questão já foi decidida por esta C. Corte Regional Federal, nos autos nº 0001553-09.2009.4.03.6124, cujo teor do acórdão, peço vênia para transcrever, quanto ao ponto, ratificando-o: 

"DANO AMBIENTAL NA ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE NO ENTORNO DO RESERVATÓRIO DA USINA HIDRELÉTRICA DE ILHA SOLTEIRA:  

DA CONCESSÃO DA UHE DE ILHA SOLTEIRA: a UHE de Ilha Solteira, localizada no Rio Paraná, entre os municípios de Ilha Solteira/SP e Selvíria/MS é a terceira maior usina de energia elétrica no Brasil e a maior no Estado de São Paulo. No ano de 1970, a concessão para exploração da UHE de Ilha Solteira foi outorgada à CESP pela União Federal, por meio do Decreto nº 67.066, de 17/8/1970, sendo prorrogada por mais 20 anos, de 8/7/1995 a 7/7/2015, pela Portaria nº 289/2004 do Ministério das Minas e Energia, que antecedeu o Contrato de Concessão nº 003/2004/ANEEL/CESP (processo nº 48500.005033/00-41). Em 2105, a empresa China Three Gorges Brasil Energia Ltda (CTG BRASIL) /Rio Paraná Energia S/A venceu o processo licitatório aberto pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), obtendo a concessão da UHE de Ilha Solteira por 30 anos, formalizada por meio do Contrato de Concessão nº 01/2016/MME (processo 48500.002243/2015-62), firmado em 5/1/2016.  Ou seja, em 24/7/2009, quando essa ação civil pública foi ajuizada, a concessão da UHE de Ilha Solteira era da CESP e no decorrer da instrução, em 5/1/2016, passou à Rio Paraná Energia S/A. ILEGITIMIDADE PASSIVA SUSCITADA PELA CESP E PELA RIO PARANÁ ENERGIA S/A AFASTADA: não obstante a vasta argumentação dessas corrés, cada qual defendendo a sua ilegitimidade passiva, ambas devem responder a ação. O dano ambiental em questão iniciou-se e tomou corpo ao tempo da CESP. E a Rio Paraná Energia S/A, contratualmente, tornou-se responsável pela APP do entorno da UHE de Ilha Solteira e, nessa esteira, por eventual passivo ambiental. Acrescente-se que os deveres associados à APP, além de  solidários, têm natureza propter rem, aderindo ao título de domínio ou posse (STJ - Súmula 623, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 12/12/2018, DJe 17/12/2018)."  

Com efeito, os deveres associados à área de Preservação Permanente tem natureza propter rem, portanto, adere ao título de domínio ou à posse, no caso dos autos o dano ambiental iniciou-se ao tempo da CESP, a qual fora sucedida em 05/01/2016, pela Rio Paraná S/A, a qual, por contrato, tornou-se responsável pela APP do entorno da UHE e nesta toada eventual passivo ambiental deverá ser imputada a ambas, as quais terão o dever de repará-lo. 

De outro lado, e pelos mesmos fundamentos, não se sustenta a tese de ilegitimidade da CESP, em decorrência de sucessão processual determinada. 

O art. 109 do CPC, repetindo o art. 42 do CPC de 1973, dispôs que “A alienação da coisa ou direito litigioso por ato entre vivos, a título particular, não altera a legitimidade das partes.” Assim, é possível concluir que a assinatura do contrato de concessão não tem o condão de alterar a natureza solidária da responsabilidade ambiental. 

No caso, evidentemente presente a pertinência subjetiva, já que a petição inicial descreve conduta da ré CESP para a ocorrência e perpetuação do alegado dano ambiental ocorrido na região sob sua responsabilidade contratual à época dos fatos, em APP, da qual mantinha o domínio, na forma do art. 14, §1º, da Lei nº 6938/81, o que se coaduna ainda que a previsão geral do art. 942 do Código Civil. 

Neste sentido a assunção da concessão da UHE Ilha Solteira pela Rio Paraná Energia S/A não enseja a exclusão da CESP do processo, mas a inclusão da nova concessionária, formando um litisconsórcio passivo entre proprietário, CESP e RPESA. 

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça segue nessa direção: 

"ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO DOS ARTS. 3o. E 267, VI DO CPC/1973, E ARTS. 186 E 927 DO CC/2002. NEXO CAUSAL DA CONDUTA. INVIABILIDADE DE ANÁLISE SEM SEDE DE RECURSO ESPECIAL. REEXAME DA MOLDURA FÁTICO-PROBATÓRIA DOS AUTOS. ÓBICE DA SÚMULA 7 DA STJ. DEGRADAÇÃO DE ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SOLIDÁRIA ENTRE O POSSUIDOR E O PROPRIETÁRIO DO IMÓVEL. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. AGRAVO INTERNO DA EMPRESA A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 

1. Referente à violação dos arts. 3o. e 267, VI do CPC/1973, e arts. 186 e 927 do CC/2002, verifica-se que sequer foram analisados pelo Tribunal de origem, de modo que carecem de prequestionamento. Incide, no caso, o óbice da Súmula 211 do STJ. 

2. Para alterar a conclusão a que chegou a Corte de origem quanto à existência do nexo de causalidade entre a conduta da empresa e o resultado danoso, seria necessário o reexame do contexto fático-probatório dos autos, circunstância que redundaria na formação de novo juízo acerca dos fatos, e não de valoração dos critérios jurídicos concernentes à utilização da prova e à formação da convicção. 

3. Conforme jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, os deveres associados às Áreas de Preservação Permanente têm natureza de obrigação propter rem, ou seja, aderem ao título de domínio ou posse, podendo ser imputada tanto ao proprietário quanto ao possuidor, independentemente de quem tenha sido o causador da degradação ambiental (AgInt no AREsp. 1.031.389/SP, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe 27.3.2018; REsp. 1.622.512/RJ, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 11.10.2016). 

4. Agravo Interno da Empresa a que se nega provimento. 

(AgInt no AREsp 819.176/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/09/2018, DJe 01/10/2018)." 

A fim de que não pairem quaisquer dúvidas, transcrevo o precedente nº 5009019-85.2021.4.03.0000, proferido pelo Desembargador Federal Johonsom Di Salvo, TRF3 - Sexta Turma, e-DJF3 Judicial 1 data:14/03/2022, em que mantida a legitimidade passiva “ad causam” da CESP e da empresa Rio Paraná S/A: 

Nesse sentido: 

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. ACP. DANO AMBIENTAL. UHE DE ILHA SOLTEIRA. SUCESSÃO PROCESSUAL INDEVIDA. CASO DE INTEGRAÇÃO À LIDE. LITISCONSÓRCIO PASSIVO FACULTATIVO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. 1. A UHE de Ilha Solteira, localizada no Rio Paraná, entre os municípios de Ilha Solteira/SP e Selvíria/MS é a terceira maior usina de energia elétrica no Brasil e a maior no Estado de São Paulo (www.aneel.gov.br). No ano de 1970, a concessão para exploração da UHE de Ilha Solteira foi outorgada à CESP pela UNIÃO FEDERAL, por meio do Decreto nº 67.066, de 17/8/1970, sendo prorrogada por mais 20 anos, de 8/7/1995 a7/7/2015, pela Portaria nº 289/2004 do Ministério das Minas e Energia, que antecedeu o Contrato de Concessão nº 003/2004/ANEEL/CESP (processo nº 48500.005033/00-41). 2. Em 2105, a empresa CHINA THREE GORGES BRASIL ENERGIA LTDA (CTG BRASIL) /RIO PARANÁ ENERGIA S/A venceu o processo licitatório aberto pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), obtendo a concessão da UHE de Ilha Solteira por 30 anos, formalizada por meio do Contrato de Concessão nº 01/2016/MME (processo 48500.002243/2015-62), firmado em 5/1/2016 (www.aneel.gov.br). Ou seja, em 29/10/2008, quando essa ação civil pública foi ajuizada, a concessão da UHE de Ilha Solteira era da CESP e no decorrer da instrução, em 5/1/2016, passou à RIO PARANÁ ENERGIA S/A. 3. Não obstante a vasta argumentação da agravante RIO PARANÁ, e da agravada, CESP - que inclusive interpôs agravo interno -, cada qual defendendo a sua ilegitimidade passiva, ambas devem responder a ação (ACPCiv nº 0001871-26.2008.4.03.6124). 4. O dano ambiental em questão iniciou-se e tomou corpo ao tempo da CESP. E a RIO PARANÁ ENERGIA S/A, contratualmente (Contrato de Concessão nº 01/2016-MME-UHEs Ilha Solteira e Jupiá), tornou-se responsável pela APP do entorno da UHE de Ilha Solteira e, nessa esteira, por eventual passivo ambiental. 5. Os deveres associados à APP, além de solidários, têm natureza propter rem, aderindo ao título de domínio ou posse, conforme entendimento sumulado pelo STJ (Súmula 623). 6. Caso de litisconsórcio passivo facultativo, competindo ao autor, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a opção de litigar em desfavor da CESP ou da RIO PARANÁ ENERGIA S/A ou de ambas. Ocorre que, na singularidade, há divergência entre a Procuradoria da República de Andradina - que concordou com a sucessão processual da CESP pela RIO PARANÁ ENERGIA - a Procuradoria Regional da República que oficia no presente recurso - que pede a manutenção de ambas (CESP e RIO PARANÁ) no polo passivo da ACP, em litisconsórcio. Concluo que a melhor solução, na singularidade, não é sucessão processual, e sim a integração à lide. Precedentes do STJ. 7. Como bem ressaltado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em debate semelhante (ApCiv nº 0001396-36.2009.4.03.6124), ainda que sobre a RIO PARANÁ ENERGIA S/A, na qualidade de nova concessionária da UHE de Ilha Solteira, recaiam as obrigações de fazer atuais e prospectivas, como a efetiva reparação do dano e a fiscalização da APP, sobre a CESP permanece a responsabilidade pela degradação ambiental havida na sua gestão. 8. Esta Corte, em casos análogos, já decidiu pela manutenção da CESP e da RIO PARANÁ ENERGIA S/A, no polo passivo. Precedentes. 9. Posicionamento inicial revisto, para afastar a sucessão processual deferida na decisão recorrida, cabendo a integração à lide da agravante - RIO PARANÁ ENERGIA S/A - em litisconsórcio passivo com a CESP. 10. Agravo de instrumento parcialmente provido. Prejudicado o agravo interno.(AGRAVO DE INSTRUMENTO ..SIGLA_CLASSE: AI 5009019-85.2021.4.03.0000 ..PROCESSO_ANTIGO: ..PROCESSO_ANTIGO_FORMATADO:, ..RELATORC:, TRF3 - 6ª Turma, Intimação via sistema DATA: 14/03/2022 ..FONTE_PUBLICACAO1: ..FONTE_PUBLICACAO2: ..FONTE_PUBLICACAO3:.)." 

Portanto, rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pela CESP e pela RPESA. 

Da ofensa ao contraditório e cerceamento de defesa - Preclusão 

Nenhum cerceamento de defesa se configura à causa, pois, no presente caso, o ônus da prova foi invertido em desfavor do proprietário do imóvel, sendo determinado, em despacho saneador, o adiantamento dos honorários periciais, sob pena de preclusão, com advertência de julgamento do processo no estado em que se encontrava. 

Não houve impugnação por nenhuma das partes, de tal forma que, diante da inércia do proprietário em recolher os honorários, a perícia não foi realizada e a questão tornou-se acobertada pelo manto da preclusão. 

Além disso, a CESP, devidamente intimada, também não se opôs aos termos da decisão saneadora, portanto, não há que se falar em nulidade ou cerceamento de defesa. 

Nesse sentido: 

“PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. FGTS. PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL. PREJUDICIALIDADE PELA INÉRCIA DA EMBARGANTE. PAGAMENTO. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. 
1. Oportunizada à embargante depositar os honorários periciais provisórios para iniciar a produção da perícia, à qual se quedou inerte, caracteriza a preclusão frente ao ônus processual que lhe é imposto legalmente. Não caracterização de cerceamento de defesa. 
...”  
(TRF 3ª Região, QUINTA TURMA,  Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1283935 - 0006402-54.2003.4.03.6182, Rel. JUÍZA CONVOCADA LOUISE FILGUEIRAS, julgado em 06/02/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/02/2017 )."  
 

Não obstante a questão da não realização da perícia estar acobertada pela preclusão, a materialidade dos fatos está demonstrada pelos documentos juntados aos autos, permitindo julgamento adequado da causa e sem prejuízo para as partes. 

Com efeito, neste momento processual, a realização de perícia é diligência prescindível pois o dano em área de preservação permanente  restou comprovado por meio do Auto de Infração nº 263057 - Série D/Termo de Embargo nº 181804/C, lavrado pelo IBAMA,  em que se constatou que o loteamento denominado Condomínio Porto Amaral, localizado no Município de Populina, na margem do Rio Paraná, confrontando-se como Reservatório da UHE Ilha Solteira, foi utilizado sem autorização do órgão competente em Área de Preservação Permanente do Reservatório da UHE de Ilha Solteira, com 81 M2 de área antropizada, impedindo a regeneração natural da vegetação, (ID 212721246 -  pág. 4/5).  

Assim, entende-se pela desnecessidade de realização de perícia, que só procrastinaria o feito, uma vez que comprovada está a existência de dano ambiental em APP. 

Outrossim, as obrigações prospectivas de remoção e/ou recuperação das intervenções antrópicas existentes na APP poderá ser aferida quando da liquidação e cumprimento da sentença, nos termos do artigo 509 do CPC, realizando-se, acaso necessária, eventual perícia a fim de ser verificada a persistência da ilegalidade que deverá ser removida, nos termos do artigo 510 do mesmo Código, bem como a forma como o dano ambiental deverá ser reparado. 

Ausência de interesse processual superveniente do MPF 

A concessionária Rio Paraná Energia S/A aponta que não persiste o interesse processual do Ministério Público Federal no feito, tendo em vista a expedição da Licença de Operação nº 1300/2015 expedida pelo Ibama com validade até 2025, em que se delimitou a APP do entorno do reservatório da UHE Ilha Solteira como a faixa compreendida entre a cota máxima normal de operação e a cota de desapropriação e, neste sentido, tendo a CESP realizado vistoria nos ranchos atingidos e identificado que não há intervenção nesta faixa, teria se perdido o objeto da lide. 

Sem razão, no entanto, vejamos. 

De início, importante de menção que referida preliminar se confunde com o mérito, haja vista ainda pender discussão acerca da delimitação da APP. 

Com efeito, será analisado no mérito e será determinada a reparação de danos, com a condenação dos requeridos em obrigação de não fazer (prospectiva), ou seja, não proceder à degradação da APP, além de obrigação das concessionárias em fiscalizar e tomar medidas proibitivas, desta forma tem-se que o objeto da lide se mantém (tutela mandamental prospectiva), independentemente da discussão acerca da área considerada de preservação permanente, restando clara a manutenção de interesse processual para a continuidade do feito. 

As demais matérias levantadas pelos apelantes em preliminar confundem-se com o mérito, e com ele serão analisadas. 

Afastadas as preliminares, passo ao exame do mérito. 

Mérito: 

Da delimitação da área de preservação permanente 

No caso dos autos, a presente ação foi ajuizada no ano de 2009, ainda na vigência do antigo Código Florestal (Lei nº 4.771/1965). 

No entanto, desde 2012, está vigente o novo Código Florestal - Lei nº 12.621/2012, com substanciais alterações no que toca a delimitação das Áreas de Preservação Permanente. 

Além disso, no julgamento das ADIs nº 4.937/DF, 4.902/DF e 4.903/DF, juntamente com a ADC 42/DF, o STF declarou a constitucionalidade do novo Código Florestal. 

Porém, o Ministério Público pretende ver afastada a aplicabilidade das normas do novo Código Florestal, especificamente o artigo 62, aduzindo que esse firmou novos parâmetros para delimitação de APP no entorno dos reservatórios artificiais das usinas hidrelétricas e quando da propositura da presente Ação Civil Pública a legislação que permeava o tema era a Lei nº 4.771/65 que afirmava em seu artigo 2º, "b", e Resolução CONAMA nº 04/1985, que as APPS ao largo de reservatórios restariam delimitadas em 100 (cem metros). 

Afirma que o artigo 62 da Lei nº 12.651/2012 (Novo Código Florestal), em vigor a partir de 25 de maio de 2012, passou a considerar como área de preservação permanente no entorno dos reservatórios artificiais que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização em data anterior a 25 de  agosto de 2001 somente a faixa compreendida entre o nível máximo de operação até a cota máxima maximorum, assim compreendida como a faixa máxima alcançada pelo reservatório em períodos de grandes cheias. 

Aponta que o artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, e o art. 6º, caput e §§ 1º a 3º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, dispõem que a norma em vigor tem efeito imediato e geral, respeitando sempre o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada. Assim, a irretroatividade da lei nova é regra no silêncio da lei, mas poderá haver retroatividade, se expressa, e não ofender direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada.  

Entende inviável a aplicação do art. 62 do Código Florestal ao caso concreto, porque reduziria sobremaneira a área de preservação permanente ao redor da UHE de Ilha Solteira, caracterizando evidente retrocesso ambiental, uma vez que sob a égide do Código Florestal de 1965, a área de preservação permanente ao redor de reservatórios artificiais de água destinados à geração de energia elétrica era de 100 metros. 

Em outros termos, entende que aplicar a legislação atual ao presente caso seria admitir situação de retrocesso ambiental, o que é vedado em nossa ordem constitucional, devendo-se assegurar, portanto, a proteção ambiental de maior eficácia, em respeito ao direito adquirido ambiental. 

No entanto, deve ser mantida a aplicação das normas do novo Código Florestal, ou seja, da regra trazida pelo artigo 62, que firmou novos parâmetros para delimitação de APP no entorno dos reservatórios artificiais das usinas hidrelétricas, isto porque a validade constitucional do referido artigo foi firmada pelo STF nas supra mencionadas ADIs 4.901; 4902;4.903 e 4.937,  e na ADC nº 42/DF, nos seguintes termos: 

"Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO AMBIENTAL. ART. 225 DA CONSTITUIÇÃO. DEVER DE PROTEÇÃO AMBIENTAL. NECESSIDADE DE COMPATIBILIZAÇÃO COM OUTROS VETORES CONSTITUCIONAIS DE IGUAL HIERARQUIA. ARTIGOS 1º, IV; 3º, II E III; 5º, CAPUT E XXII; 170, CAPUT E INCISOS II, V, VII E VIII, DA CRFB. DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL. JUSTIÇA INTERGERACIONAL. ALOCAÇÃO DE RECURSOS PARA ATENDER AS NECESSIDADES DA GERAÇÃO ATUAL. ESCOLHA POLÍTICA. CONTROLE JUDICIAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS. IMPOSSIBILIDADE DE VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DEMOCRÁTICO. EXAME DE RACIONALIDADE ESTREITA. RESPEITO AOS CRITÉRIOS DE ANÁLISE DECISÓRIA EMPREGADOS PELO FORMADOR DE POLÍTICAS PÚBLICAS. INVIABILIDADE DE ALEGAÇÃO DE VEDAÇÃO AO RETROCESSO. NOVO CÓDIGO FLORESTAL. AÇÕES DIRETAS DE INCONSTITUCIONALIDADE E AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE JULGADAS PARCIALMENTE PROCEDENTES. 1. O meio ambiente é tutelado constitucionalmente pela regra matriz do artigo 225, caput, da Constituição, que dispõe que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. 2. O meio ambiente assume função dúplice no microssistema jurídico, na medida em que se consubstancia simultaneamente em direito e em dever dos cidadãos, os quais paralelamente se posicionam, também de forma simultânea, como credores e como devedores da obrigação de proteção respectiva. 3. O homem é parte indissociável do meio ambiente, uma vez que, por intermédio das interações genéticas biologicamente evolutivas que se sucederam nos últimos milhares de anos, o meio ambiente produziu a espécie humana, cuja vida depende dos recursos nele contidos. Nesse ponto, nem os mais significativos avanços tecnológicos permitirão ao homem, em algum momento futuro, dissociar-se do meio ambiente, na medida em que a atividade humana inventiva e transformadora depende da matéria nele contida, sob todas as suas formas, para se concretizar. 4. A capacidade dos indivíduos de desestabilizar o equilíbrio do conjunto de recursos naturais que lhes fornece a própria existência tem gerado legítimas preocupações, que se intensificaram no último século. Afinal, recursos naturais têm sido extintos; danos irreversíveis ou extremamente agressivos à natureza tornaram-se mais frequentes; disfunções climáticas são uma realidade científica; diversas formas de poluição se alastram pelos grandes centros, entre outras evidências empíricas do que se cognomina crise ambiental. Nesse ínterim, o foco no crescimento econômico sem a devida preocupação ecológica consiste em ameaça presente e futura para o progresso sustentável das nações e até mesmo para a sobrevivência da espécie humana. O homem apenas progride como ser biológico e como coletividade quando se percebe como produto e não como proprietário do meio ambiente. 5. A Declaração das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, editada por ocasião da Conferência de Estocolmo, em 1972, consistiu na primeira norma a reconhecer o direito humano ao meio ambiente de qualidade . 6. Por sua vez, a Conferência Eco-92, no Rio de Janeiro, introduziu o princípio do desenvolvimento sustentável , consubstanciado na necessária composição entre o crescimento socioeconômico e o uso adequado e razoável dos recursos naturais. Essa nova perspectiva demandou aos Estados a construção de políticas públicas mais elaboradas, atentas à gestão eficiente das matérias primas, ao diagnóstico e ao controle das externalidades ambientais, bem como ao cálculo de níveis ótimos de poluição. Todos esses instrumentos atendem a perspectiva intergeracional, na medida em que o desenvolvimento sustentável estabelece uma ponte entre os impactos provocados pelas gerações presentes e o modo como os recursos naturais estarão disponíveis para as gerações futuras. 7. A recente Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Natural (Rio+20), em 2012, agregou ao debate a ideia de governança ambiental global . 8. Paralelamente a esses marcos, são incontáveis os documentos internacionais bilaterais e multilaterais que tem disciplinado questões específicas do meio ambiente. Exemplificadamente, cito a Convenção para Prevenção da Poluição Marinha por Fontes Terrestres (1974), a Convenção para Proteção dos Trabalhadores contra Problemas Ambientais (1977), a Convenção sobre Poluição Transfronteiriça (1979), o Protocolo sobre Áreas Protegidas e Fauna e Flora (1985), a Convenção sobre Avaliação de Impacto Ambiental em Contextos Transfronteiriços (1991), a Convenção da Biodiversidade (1992), o Protocolo de Quioto (1997), dentre outros. 9. Essa movimentação política de âmbito global tem despertado os Estados nacionais e a coletividade para a urgência e a importância da causa ambiental. Comparativamente, 150 constituições atualmente em vigor tratam da proteção ao meio ambiente em seus textos. No Brasil, não obstante constituições anteriores tenham disciplinado aspectos específicos relativos a alguns recursos naturais (água, minérios etc), a Carta de 1988 consistiu em marco que elevou a proteção integral e sistematizada do meio ambiente ao status de valor central da nação. Não à toa, a comunidade internacional a apelidou de Constituição Verde , considerando-a a mais avançada do mundo nesse tema. 10. O caráter transnacional e transfronteiriço das causas e dos efeitos da crise ambiental demanda dos Estados, dos organismos internacionais e das instituições não governamentais, progressivamente, uma atuação mais articulada para transformar a preservação da natureza em instrumento de combate à pobreza e às desigualdades. 11. Por outro lado, as políticas públicas ambientais devem conciliar-se com outros valores democraticamente eleitos pelos legisladores como o mercado de trabalho, o desenvolvimento social, o atendimento às necessidades básicas de consumo dos cidadãos etc . Dessa forma, não é adequado desqualificar determinada regra legal como contrária ao comando constitucional de defesa do meio ambiente (art. 225, caput , CRFB), ou mesmo sob o genérico e subjetivo rótulo de retrocesso ambiental, ignorando as diversas nuances que permeiam o processo decisório do legislador, democraticamente investido da função de apaziguar interesses conflitantes por meio de regras gerais e objetivas. 12. Deveras, não se deve desprezar que a mesma Constituição protetora dos recursos ambientais do país também exorta o Estado brasileiro a garantir a livre iniciativa (artigos 1º, IV, e 170) e o desenvolvimento nacional (art. 3º, II), a erradicar a pobreza e a marginalização, a reduzir as desigualdades sociais e regionais (art. 3º, III; art. 170, VII), a proteger a propriedade (art. 5º, caput e XXII; art. 170, II), a buscar o pleno emprego (art. 170, VIII; art. 6º) e a defender o consumidor (art. 5º, XXXII; art. 170, V) etc . 13. O desenho institucional das políticas públicas ambientais suscita o duelo valorativo entre a tutela ambiental e a tutela do desenvolvimento, tendo como centro de gravidade o bem comum da pessoa humana no cenário de escassez. É dizer, o desenvolvimento econômico e a preservação do meio ambiente não são políticas intrinsecamente antagônicas. 14. A análise de compatibilidade entre natureza e obra humana é ínsita à ideia de desenvolvimento sustentável, expressão popularizada pelo relatório Brundtland, elaborado em 1987 pela Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento. A mesma organização eficiente dos recursos disponíveis que conduz ao progresso econômico, por meio da aplicação do capital acumulado no modo mais produtivo possível, é também aquela capaz de garantir o racional manejo das riquezas ambientais em face do crescimento populacional. Por conseguinte, a proteção ao meio ambiente, no contexto de um desenvolvimento sustentável, não equivale a uma visão estática dos bens naturais, que pugna pela proibição de toda e qualquer mudança ou interferência em processos ecológicos ou correlatos. A história humana e natural é feita de mudanças e adaptações, não de condições estáticas ou de equilíbrio. 15. A preservação dos recursos naturais para as gerações futuras não pode significar a ausência completa de impacto do homem na natureza, consideradas as carências materiais da geração atual e também a necessidade de gerar desenvolvimento econômico suficiente para assegurar uma travessia confortável para os nossos descendentes. 16. Meio ambiente e Desenvolvimento Econômico enceram conflito aparente normativo entre diversas nuances, em especial a justiça intergeracional, demandando escolhas trágicas a serem realizadas pelas instâncias democráticas, e não pela convicção de juízes, por mais bem-intencionados que sejam. (REVESZ, Richard L.; STAVINS, Robert N. Environmental Law. In : Handbook of Law and Economics . A. Mitchell Polinsky; Steven Shavell (ed.). V. 1. Boston: Elsevier, 2007. p. 507) 17. A Jurisdição Constitucional encontra óbice nos limites da capacidade institucional dos seus juízes, notadamente no âmbito das políticas públicas, cabendo ao Judiciário a análise racional do escrutínio do legislador, consoante se colhe do julgado da Suprema Corte Americana FCC v. Beach Communications , Inc. 508 U.S. 307 (1993), em que se consignou que a escolha do legislador não está sujeita ao escrutínio empírico dos Tribunais e pode se basear em especulações racionais não embasadas em provas ou dados empíricos ( Legislative choice is not subject to courtroom factfinding and may be based on rational speculation unsupported by evidence or empirical data ). 18. A capacidade institucional, ausente em um cenário de incerteza, impõe auto-contenção do Judiciário, que não pode substituir as escolhas dos demais órgãos dos Estado por suas próprias escolhas (VERMEULE, Adrian. Laws Abnegation . Cambridge: Harvard University Press, 2016. p. 130, 134-135) 19. O Princípio da vedação do retrocesso não se sobrepõe ao princípio democrático no afã de transferir ao Judiciário funções inerentes aos Poderes Legislativo e Executivo, nem justifica afastar arranjos legais mais eficientes para o desenvolvimento sustentável do país como um todo. 20. A propósito, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal demonstra deferência judicial ao planejamento estruturado pelos demais Poderes no que tange às políticas públicas ambientais. No julgamento do Recurso Extraordinário nº 586.224/SP (Rel. ministro Luiz Fux , julgamento em 05/03/2016), apreciou-se o conflito entre lei municipal proibitiva da técnica de queima da palha da cana-de-açúcar e a lei estadual definidora de uma superação progressiva e escalonada da referida técnica. Decidiu a Corte que a lei do ente menor, apesar de conferir aparentemente atendimento mais intenso e imediato ao interesse ecológico de proibir queimadas, deveria ceder ante a norma que estipulou um cronograma para adaptação do cultivo da cana-de-açúcar a métodos sem a utilização do fogo. Dentre os fundamentos utilizados, destacou-se a necessidade de acomodar, na formulação da política pública, outros interesses igualmente legítimos, como os efeitos sobre o mercado de trabalho e a impossibilidade do manejo de máquinas diante da existência de áreas cultiváveis acidentadas. Afastou-se, assim, a tese de que a norma mais favorável ao meio ambiente deve sempre prevalecer ( in dubio pro natura ), reconhecendo-se a possibilidade de o regulador distribuir os recursos escassos com vistas à satisfação de outros interesses legítimos, mesmo que não promova os interesses ambientais no máximo patamar possível. Idêntica lição deve ser transportada para o presente julgamento, a fim de que seja refutada a aplicação automática da tese de vedação ao retrocesso para anular opções validamente eleitas pelo legislador. 21. O Código Florestal ostenta legitimidade institucional e democrática, sendo certo que a audiência pública realizada nas presentes ações apurou que as discussões para a aprovação da Lei questionada se estenderam por mais de dez anos no Congresso Nacional. Destarte, no âmbito do Parlamento, mais de 70 (setenta) audiências públicas foram promovidas com o intuito de qualificar o debate social em torno das principais modificações relativas ao marco regulatório da proteção da flora e da vegetação nativa no Brasil. Consectariamente, além da discricionariedade epistêmica e hermenêutica garantida ao Legislativo pela Constituição, também militam pela autocontenção do Judiciário no caso em tela a transparência e a extensão do processo legislativo desenvolvido, que conferem legitimidade adicional ao produto da atividade do Congresso Nacional. 22. Apreciação pormenorizada das impugnações aos dispositivos do novo Código Florestal (Lei nº 12.651/2012): (a) Art. 3º, inciso VIII, alínea b , e inciso IX (Alargamento das hipóteses que configuram interesse social e utilidade pública ): As hipóteses de intervenção em áreas de preservação permanente por utilidade pública e interesse social devem ser legítimas e razoáveis para compatibilizar a proteção ambiental com o atendimento a outros valores constitucionais, a saber: prestação de serviços públicos (art. 6º e 175 da CRFB); políticas agrícola (art. 187 da CRFB) e de desenvolvimento urbano (art. 182 da CRFB); proteção de pequenos produtores rurais, famílias de baixa renda e comunidades tradicionais; o incentivo ao esporte (art. 217 da CRFB), à cultura (art. 215 da CRFB) e à pesquisa científica (art. 218 da CRFB); e o saneamento básico (artigos 21, XX, e 23, IX, da CRFB). O regime de proteção das áreas de preservação permanente (APPs) apenas se justifica se as intervenções forem excepcionais, na hipótese de inexistência de alternativa técnica e/ou locacional. No entanto, o art. 3º, inciso IX, alínea g , limitou-se a mencionar a necessidade de comprovação de alternativa técnica e/ou locacional em caráter residual, sem exigir essa circunstância como regra geral para todas as hipóteses. Essa omissão acaba por autorizar interpretações equivocadas segundo as quais a intervenção em áreas de preservação permanente é regra, e não exceção. Ademais, não há justificativa razoável para se permitir intervenção em APPs para fins de gestão de resíduos e de realização de competições esportivas estaduais, nacionais ou internacionais, sob pena de subversão da prioridade constitucional concedida ao meio ambiente em relação aos demais bens jurídicos envolvidos nos dispositivos respectivos; Conclusão : (i) interpretação conforme à Constituição aos incisos VIII e IX do artigo 3º da Lei n. 12.651/2012, de modo a se condicionar a intervenção excepcional em APP, por interesse social ou utilidade pública, à inexistência de alternativa técnica e/ou locacional à atividade proposta, e (ii) declaração de inconstitucionalidade das expressões gestão de resíduos e instalações necessárias à realização de competições esportivas estaduais, nacionais ou internacionais , do artigo 3º, VIII, b , da Lei n. 12.651/2012; (b) Art. 3º, XVII, e art. 4º, IV ( Exclusão das nascentes e dos olhos dágua intermitentes das áreas de preservação permanente): Interpretações diversas surgem da análise sistemática dos incisos I e IV do artigo 4º da Lei n. 12.651/2017. Embora o artigo 4º, inciso IV, apenas tenha protegido o entorno de nascentes e olhos dágua perenes , o art. 4º, inciso I, protege, como áreas de preservação permanente, as faixas marginais de qualquer curso dágua natural perene e intermitente , excluídos os efêmeros (grifo nosso). In casu , a polissemia abrange duas interpretações: a primeira inclui as nascentes e os olhos dágua intermitentes como APPs; a segunda os exclui. Assim, cabe ao STF selecionar a interpretação que melhor maximize a eficácia das normas constitucionais. Considerando que o art. 225, §1º, da Constituição Federal, determina que incumbe ao Poder Público preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e promover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas , a interpretação mais protetiva deve ser selecionada. O Projeto de Lei n. 350/2015 (Autoria do Dep. Fed. Sarney Filho), em trâmite perante a Câmara Federal, prevê alteração nesse sentido no novo Código Florestal. A proteção das nascentes e olhos dágua é essencial para a existência dos cursos dágua que deles se originam, especialmente quanto aos rios intermitentes, muito presentes em áreas de seca e de estiagem; Conclusão : interpretação conforme ao artigo 4º, inciso IV, da Lei n. 12.651/2017, com vistas a reconhecer que os entornos das nascentes e dos olhos d´água intermitentes configuram área de preservação permanente (APP); (c) Art. 3º, XIX (Alteração do conceito de leito regular): A legislação em vigor tão somente modificou o marco para a medição da área de preservação ambiental ao longo de rios e cursos dágua, passando a ser o leito regular respectivo, e não mais o seu nível mais alto. O legislador possui discricionariedade para modificar a metragem de áreas de preservação ambiental, na medida em que o art. 225, § 1º, III, da Constituição, expressamente permite que a lei altere ou suprima espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos ; Conclusão : declaração de constitucionalidade do art. 3º, XIX, do novo Código Florestal; (d) Art. 3º, parágrafo único (Extensão do tratamento dispensado à pequena propriedade ou posse rural familiar aos imóveis com até 4 módulos fiscais): O tamanho da propriedade em módulos fiscais é critério legítimo para a incidência das normas especiais sobre Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal previstas nos artigos 52 e seguintes do novo Código Florestal, quanto mais quando em concurso com outras formalidades, como a inscrição no cadastro ambiental rural (CAR) e o controle e a fiscalização dos órgãos ambientais competentes. Ademais, o módulo fiscal não consiste em unidade de medida baseada apenas no tamanho da propriedade imobiliária, uma vez que reúne uma série de outros critérios socioeconômicos que, uma vez conjugados, atendem às noções de razoabilidade e de equidade atinentes às especificidades da agricultura familiar. Por outro lado, a exigência de demarcação de terras indígenas e da titulação das áreas de povos e comunidades tradicionais, como pressuposto para a aplicação do aludido regime especial, viola o art. 231 da CF e o art. 68 da ADCT. A demarcação e a titulação de territórios têm caráter meramente declaratório e não constitutivo , pelo que o reconhecimento dos direitos respectivos, inclusive a aplicação de regimes ambientais diferenciados, não pode depender de formalidades que nem a própria Constituição determinou, sob pena de violação da isonomia e da razoabilidade; Conclusão : Declaração de inconstitucionalidade das expressões demarcadas e tituladas , do art. 3º, parágrafo único, da Lei n. 12.651/2012; (e) Art. 4º, inciso III e §§ 1º e 4º (Áreas de preservação permanente no entorno de reservatórios artificiais que não decorram de barramento de cursos dágua naturais e de reservatórios naturais ou artificiais com superfície de até um hectare): As alegações dos requerentes sugerem a falsa ideia de que o novo Código Florestal teria extinto as APPs no entorno dos reservatórios dágua artificiais, decorrentes de barramento ou represamento de cursos dágua naturais. No entanto, esses espaços especialmente protegidos continuam a existir, tendo a lei delegado ao órgão que promover a licença ambiental do empreendimento a tarefa de definir a extensão da APP, consoante as especificidades do caso concreto. Essa opção legal evita os inconvenientes da solução one size fits all e permite a adequação da norma protetiva ao caso concreto. Por sua vez, a pretensão de constitucionalização da metragem de Área de Proteção Permanente estabelecida na lei revogada ofende o princípio democrático e a faculdade conferida ao legislador pelo art. 225, § 1º, III, da Constituição, segundo o qual compete à lei alterar, ou até mesmo suprimir, espaços territoriais especialmente protegidos. Pensamento diverso transferiria ao Judiciário o poder de formular políticas públicas no campo ambiental. Conclusão : Declaração de constitucionalidade do art. 4º, III e §§ 1º e 4º, do novo Código Florestal; (f) Art. 4º, § 5º (Uso agrícola de várzeas em pequenas propriedades ou posses rurais familiares): O dispositivo em referência admite o uso agrícola de várzeas na pequena propriedade ou posse rural familiar, assim entendida aquela explorada mediante o trabalho pessoal do agricultor familiar e empreendedor familiar rural, incluindo os assentamentos e projetos de reforma agrária, e que atenda ao disposto no art. 3º da Lei nº 11.326/2006. Não cabe ao Judiciário criar requisitos extras para a permissão legal já estabelecida, limitando os sujeitos beneficiados a comunidades tradicionais ou até mesmo proibindo a utilização de agrotóxicos. A possibilidade excepcional do uso agrícola de várzeas é compatível com a otimização da produtividade sustentável em consonância com realidade dos pequenos produtores do país, sendo a definição de requisitos gerais e abstratos tarefa a ser exercida, por excelência, pelo Poder Legislativo; Conclusão : Declaração da constitucionalidade do art. 4º, §5º, do novo Código Florestal; (g) Art. 4º, incisos I, II, e §6º (Permissão do uso de APPs à margem de rios e no entorno de lagos e lagoas naturais para implantar atividades de aquicultura: O uso de áreas de preservação permanente à margem de rios (art. 4º, I) e no entorno de lagos e lagoas naturais (art. 4º, II) para atividades de aquicultura não encontra óbice constitucional. O legislador estabeleceu rígidos critérios para a admissão da referida atividade, a serem perquiridos em concreto pelo órgão ambiental competente. Havendo autorização legal restrita a pequenas e médias propriedades, proibição a novas supressões de vegetação nativa, necessidade de inscrição no Cadastro Ambiental Rural (CAR), exigência de compatibilidade com os respectivos planos de bacia ou planos de gestão de recursos hídricos, bem como imposição de práticas sustentáveis de manejo de solo e água e de recursos hídricos, é de concluir-se pela plena legitimidade do regime jurídico criado pelo novo Código Florestal, à luz do preceito constitucional que consagra a utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente (art. 186, II, da CRFB); Conclusão : Declaração de constitucionalidade do art. 4º, § 6º, do novo Código Florestal; (h) Artigos 5º, caput e §§ 1º e 2º, e 62 (Redução da largura mínima da APP no entorno de reservatórios dágua artificiais implantados para abastecimento público e geração de energia): O estabelecimento legal de metragem máxima para áreas de proteção permanente no entorno de reservatórios dágua artificiais constitui legítima opção de política pública ante a necessidade de compatibilizar a proteção ambiental com a produtividade das propriedades contíguas, em atenção a imperativos de desenvolvimento nacional e eventualmente da própria prestação do serviço público de abastecimento ou geração de energia (art. 175 da CF). Por sua vez, a definição de dimensões diferenciadas da APP em relação a reservatórios registrados ou contratados no período anterior à MP nº 2166-67/2001 se enquadra na liberdade do legislador para adaptar a necessidade de proteção ambiental às particularidades de cada situação, em atenção ao poder que lhe confere a Constituição para alterar ou suprimir espaços territoriais especialmente protegidos (art. 225, § 1º, III). Trata-se da fixação de uma referência cronológica básica que serve de parâmetro para estabilizar expectativas quanto ao cumprimento das obrigações ambientais exigíveis em consonância com o tempo de implantação do empreendimento; Conclusão: Declaração de constitucionalidade dos artigos 5º, caput e §§ 1º e 2º, e 62, do novo Código Florestal; (i) Artigos 7º, § 3º, e 17, caput e § 3º (Desnecessidade de reparação de danos ambientais anteriores a 22.08.2008 para a obtenção de novas autorizações para suprimir vegetação em APPs e para a continuidade de atividades econômicas em RLs): o legislador tem o dever de promover transições razoáveis e estabilizar situações jurídicas consolidadas pela ação do tempo ao edificar novos marcos legislativos, tendo em vista que a Constituição da República consagra como direito fundamental a segurança jurídica (art. 5º, caput). O novo Código Florestal levou em consideração a salvaguarda da segurança jurídica e do desenvolvimento nacional (art. 3º, II, da CRFB) ao estabelecer uma espécie de marco zero na gestão ambiental do país, sendo, consectariamente, constitucional a fixação da data de 22 de julho de 2008 como marco para a incidência das regras de intervenção em Área de Preservação Permanente ou de Reserva Legal; Conclusão : Declaração de constitucionalidade do art. 7º, § 3º, e do art. 17, caput e § 3º, da Lei n. 12.651/2012 ( vencido o Relator ); (j) Art. 8º, § 2º (Possibilidade de intervenção em restingas e manguezais para a execução de obras habitacionais e de urbanização em áreas urbanas consolidadas ocupadas por população de baixa renda): Ao possibilitar a intervenção em restingas e manguezais para a execução de obras habitacionais e de urbanização em áreas urbanas consolidadas ocupadas por população de baixa renda, o legislador promoveu louvável compatibilização entre a proteção ambiental e os vetores constitucionais de erradicação da pobreza e da marginalização, e redução das desigualdades sociais (art. 3º, IV, da CRFB); de promoção do direito à moradia (art. 6º da CRFB); de promover a construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico (art. 23, IX, da CRFB); de combater as causas da pobreza e os fatores de marginalização, promovendo a integração social dos setores desfavorecidos (art. 23, X, da CRFB); e de estabelecer política de desenvolvimento urbano para ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes (art. 182 da CRFB). Ademais, os empreendimentos respectivos devem sempre vir acompanhados de estudos de impacto ambiental e medidas compensatórias, além das medidas de fiscalização administrativa, consoante a determinação constitucional. Ante a previsão legal desses requisitos estritos e plenamente razoáveis, considerados os interesses em jogo, exige-se do Judiciário uma postura de autocontenção, em homenagem à função constitucionalmente garantida ao Legislativo para resolver conflitos de valores na formulação de políticas públicas. Conclusão : Declaração de constitucionalidade do artigo 8º, § 2º, do novo Código Florestal; (k) Art. 11 (Possibilidade de manejo florestal sustentável para o exercício de atividades agrossilvipastoris em áreas de inclinação entre 25 e 45 graus): A admissão do manejo florestal sustentável e do exercício de atividades agrossilvipastoris em áreas de inclinação entre 25° e 45° se insere na margem de discricionariedade do legislador, máxime quando estabelecidos critérios para a autorização dessas práticas, exigindo dos órgãos ambientais a fiscalização da observância de boas práticas agronômicas, bem como vedando a conversão de novas áreas para as atividades mencionadas. Além disso, a legislação anterior já admitia atividades extrativas nessas áreas de inclinação, estabelecendo como restrição apenas a cláusula aberta da utilização racional. Nesse particular, as atividades agrossilvipastoris, em aperfeiçoamento das práticas agrícolas ortodoxas, são destinadas à otimização das vocações produtivas e ambientais na atividade agrícola; Conclusão: Declaração de constitucionalidade do artigo 11 do novo Código Florestal; (l) Art. 12, §§ 4º e 5º (Possibilidade de redução da Reserva Legal para até 50% da área total do imóvel em face da existência, superior a determinada extensão do Município ou Estado, de unidades de conservação da natureza de domínio público e de terras indígenas homologadas): A redução excepcional e facultativa da área de Reserva Legal em face de existência de unidades de conservação da natureza de domínio público e terras indígenas homologadas acomoda o atendimento de diversos interesses igualmente salvaguardados pela Carta Magna, como a proteção do meio ambiente (art. 225), o reconhecimento dos direitos dos índios (art. 231), o desenvolvimento nacional (art. 3º, II), a redução das desigualdades regionais (art. 3º, III) e a preservação dos entes federativos menores (art. 18). O Judiciário não é órgão dotado de expertise ou legitimidade democrática para definir percentuais de espaços territoriais especialmente protegidos, à medida que o próprio art. 225, § 1º, III, da Constituição atribui essa definição ao Executivo e ao Legislativo. A redução da área de Reserva Legal ocorre em graduação deveras razoável: de 80% (oitenta por cento) para até 50% (cinquenta por cento). Quando o poder público estadual optar pela redução, deverá ouvir o Conselho Estadual de Meio Ambiente, órgão estadual responsável pela análise da viabilidade ecológica dessa iniciativa, e possuir Zoneamento Ecológico-Econômico aprovado. Relativamente aos Municípios, as normas impugnadas visam a possibilitar uma alternativa institucional de manutenção da viabilidade e autonomia da municipalidade que tenha sua área sensivelmente afetada por iniciativa dos Estados (mediante a criação de unidades de conservação estadual), ou da União (seja pela instituição de unidades federais de proteção ambiental, seja pela homologação de terras indígenas). Trata-se, a rigor, de uma cláusula legal que protege o ente municipal de indevida intervenção estadual para além das cláusulas taxativas do art. 35 do texto constitucional; Conclusão: Declaração de constitucionalidade do artigo 12, §§ 4º e 5º, do novo Código Florestal; (m) Art. 12, §§ 6º, 7º e 8º (Dispensa de reserva legal para exploração de potencial de energia hidráulica e construção ou ampliação de rodovias e ferrovias): Na hipótese, a dispensa de reserva legal resulta de opção do legislador amparada pelos benefícios gerados quanto à satisfação dos objetivos constitucionais de prestação de serviços de energia elétrica e de aproveitamento energético dos cursos de água (art. 21, XII, b, da CRFB), de exploração dos potenciais de energia hidráulica (art. 176 da CRFB), de atendimento do direito ao transporte (art. 6º da CRFB) e de integração das regiões do país (art. 43, § 1º, I). Ademais, o novo Código Florestal não afastou a exigência de licenciamento ambiental, com estudo prévio de impacto, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente (art. 225, § 1º, IV, da Constituição); Conclusão : Declaração da constitucionalidade do artigo 12, §§ 6º, 7º e 8º, do novo Código Florestal; (n) Art. 68 (Dispensa de os proprietários que realizaram supressão de vegetação nativa respeitando os percentuais da legislação revogada se adaptarem às regras mais restritivas do novo Código Florestal): A aplicação da norma sob a regra tempus regit actum para fins de definição do percentual de área de Reserva Legal encarta regra de transição com vistas à preservação da segurança jurídica (art. 5º, caput , da Constituição). O benefício legal para possuidores e proprietários que preservaram a vegetação de seus imóveis em percentuais superiores ao exigido pela legislação anterior, consistente na possibilidade de constituir servidão ambiental, Cota de Reserva Ambiental e outros instrumentos congêneres, traduz formato de política pública inserido na esfera de discricionariedade do legislador; Conclusão: Declaração de constitucionalidade do artigo 68 do Código Florestal; (o) Art. 13, § 1º (Possibilidade de redução da reserva legal para até 50% da área total do imóvel rural): A redução ou aumento da Reserva Legal pelo poder público federal, por indicação do Zoneamento Ecológico-Econômico estadual, para fins de regularização em imóveis com área rural consolidada na Amazônia Legal, valoriza as particularidades das áreas, com o intuito de fixar alternativas de uso e gestão que oportunizam as vantagens competitivas do território, contempladas variadas atividades de preservação e desenvolvimento em níveis nacional, regional e local; Conclusão: Declaração de constitucionalidade do artigo 13, § 1º, do novo Código Florestal; (p) Art. 15 (Possibilidade de se computar as Áreas de Preservação Permanente para cômputo do percentual da Reserva Legal, em hipóteses legais específicas): As Áreas de Preservação Permanente são zonas específicas nas quais se exige a manutenção da vegetação, como restingas, manguezais e margens de cursos dágua. Por sua vez, a Reserva Legal é um percentual de vegetação nativa a ser mantido no imóvel, que pode chegar a 80% (oitenta por cento) deste, conforme localização definida pelo órgão estadual integrante do Sisnama à luz dos critérios previstos no art. 14 do novo Código Florestal, dentre eles a maior importância para a conservação da biodiversidade e a maior fragilidade ambiental. Em regra, consoante o caput do art. 12 do novo Código Florestal, a fixação da Reserva Legal é realizada sem prejuízo das áreas de preservação permanente. Entretanto, a incidência cumulativa de ambos os institutos em uma mesma propriedade pode aniquilar substancialmente a sua utilização produtiva. O cômputo das Áreas de Preservação Permanente no percentual de Reserva Legal resulta de legítimo exercício, pelo legislador, da função que lhe assegura o art. 225, § 1º, III, da Constituição, cabendo-lhe fixar os percentuais de proteção que atendem da melhor forma os valores constitucionais atingidos, inclusive o desenvolvimento nacional (art. 3º, II, da CRFB) e o direito de propriedade (art. 5º, XXII, da CRFB). Da mesma forma, impedir o cômputo das áreas de preservação permanente no cálculo da extensão da Reserva Legal equivale a tolher a prerrogativa da lei de fixar os percentuais de proteção que atendem da melhor forma os valores constitucionais atingidos; Conclusão : Declaração de constitucionalidade do artigo 15 do Código Florestal; (q) Art. 28 (Proibição de conversão de vegetação nativa para uso alternativo do solo no imóvel rural que possuir área abandonada): A ausência de vedação específica à conversão para uso alternativo do solo em áreas subutilizadas ou mal utilizadas não ofende a Constituição, mercê de o legislador ter transferido ao órgão ambiental competente a tarefa de apreciar a forma de utilização do imóvel ao decidir sobre o requerimento de autorização para a referida conversão ; Conclusão : Declaração de constitucionalidade do artigo 28 do novo Código Florestal; (r) Arts. 44; 48, § 2º; e 66, §§ 5º e 6º (Cota de Reserva Ambiental CRA): A Cota de Reserva Ambiental (CRA) consiste em mecanismo de incentivos em busca da proteção ambiental, não se limitando às tradicionais e recorrentemente pouco efetivas regras de imposições e proibições ( command-and-control ), por meio da criação de ativos correspondentes à preservação dos recursos ecológicos, de modo que qualquer tipo de degradação da natureza passa também a ser uma agressão ao próprio patrimônio. As soluções de mercado ( market-based ) para questões ambientais são amplamente utilizadas no Direito Comparado e com sucesso, a exemplo do sistema de permissões negociáveis de emissão de carbono ( European Union Permission Trading System ETS ). Um grande caso de sucesso é o comércio internacional de emissões de carbono, estruturado em cumprimento aos limites de emissões fixados pelo Protocolo de Kyoto. A União Europeia, por exemplo, estabeleceu em 2005 um sistema de permissões negociáveis de emissão de carbono, especificando os limites que cada poluidor deve atender, os quais são reduzidos periodicamente ( European Union Permission Trading System ETS ). Ao final de cada ano, as companhias devem possuir permissões suficientes para atender às toneladas de dióxido de carbono e outros gases de efeito estufa emitidos, sob pena de pesadas multas. Dessa forma, a possibilidade de negociação ( cap-and-trade ) incentiva a redução de emissões como um todo e, ao mesmo tempo, possibilita que os cortes sejam feitos em setores nos quais isso ocorra com o menor custo. Nesse sentido, além de atender aos ditames do art. 225 da Constituição, no que se refere à proteção do meio ambiente, esse instrumento introduzido pelo novo Código Florestal também satisfaz o princípio da eficiência, plasmado no art. 37, caput , da Carta Magna. Por fim, a necessidade de compensação entre áreas pertencentes ao mesmo bioma, bem como a possibilidade de compensação da Reserva Legal mediante arrendamento da área sob regime de servidão ambiental ou Reserva Legal, ou, ainda, por doação de área no interior de unidade de conservação, são preceitos legais compatíveis com a Carta Magna, decorrendo de escolha razoável do legislador em consonância com o art. 5º, caput e XXIV, da Constituição; Conclusão : Declaração de constitucionalidade dos artigos 44, e 66, §§ 5º e 6º, do novo Código Florestal; Interpretação conforme a Constituição ao art. 48, §2º, para permitir compensação apenas entre áreas com identidade ideológica ( vencido o relator ); (s) Arts. 59 e 60 (Programas de Regularização Ambiental - PRAs): Os Programas de Regularização Ambiental (PRAs) promovem transição razoável entre sistemas legislativos, revelando técnica de estabilização e de regularização das situações jurídicas já utilizada em outras searas do Direito brasileiro que igualmente envolvem a proteção de bens jurídicos igualmente indisponíveis. Eventual mora dos entes federados na regulamentação dos PRAs deverá ser combatida pelas vias próprias, não fulminando de inconstitucionalidade a previsão do novo Código Florestal. Necessidade de resguardar a interrupção da prescrição punitiva durante a execução do PRA, mediante interpretação conforme dos dispositivos questionados. Conclusão: Interpretação conforme do artigo 59, §§4º e 5º, de modo a afastar, no decurso da atuação de compromissos subscritos nos Programas de Regularização Ambiental, o risco de decadência ou prescrição, seja dos ilícitos ambientais praticados antes de 22.07.2008, seja das sanções dele decorrentes, aplicando-se extensivamente o disposto no §1º do art. 60 da Lei 12.651/2012 ( vencido o relator ); Declaração de constitucionalidade do artigo 60 da Lei n. 12.651/2012 ( vencido o relator ); (t) Art. 66, § 3º (Possibilidade de plantio intercalado de espécies nativas e exóticas para recomposição de área de Reserva Legal): Não existem elementos empíricos que permitam ao Judiciário afirmar, com grau de certeza, que a introdução de espécies exóticas compromete a integridade dos atributos de áreas de Reserva Legal. Tampouco há provas científicas de que utilização de espécies exóticas para o reflorestamento de biomas sempre prejudica as espécies nativas ou causa desequilíbrio no habitat. A autorização legal para a recomposição de áreas de Reserva Legal com plantio intercalado de espécies pode ser justificada em diversas razões de primeira e de segunda ordem: pode ser que o conhecimento da composição original da floresta nativa seja de difícil apuração; a espécie exótica pode apresentar crescimento mais rápido, acelerando a recuperação da floresta; a literatura científica pode conferir mais certeza sobre as características da espécie exótica, como a sua interação com outras espécies ou resposta a pragas, em contraposição ao possível desconhecimento do comportamento da espécie nativa etc . Todos esses elementos devem ser considerados pelo órgão competente do Sisnama ao estabelecer os critérios para a recomposição da Reserva Legal, consoante o cronograma estabelecido pelo art. 66, § 2º, do novo Código Florestal. É defeso ao Judiciário, sob pena de nociva incursão em tarefa regulatória especializada, impor ao Administrador espécies de plantas a serem aplicadas em atividades de reflorestamento. Conclusão : Declaração de constitucionalidade do artigo 66, § 3º, do Código Florestal; (u) Arts. 61-A, 61-B, 61-C, 63 e 67 (Regime das áreas rurais consolidadas até 22.07.2008): O Poder Legislativo dispõe de legitimidade constitucional para a criação legal de regimes de transição entre marcos regulatórios, por imperativos de segurança jurídica (art. 5º, caput , da CRFB) e de política legislativa (artigos 21, XVII, e 48, VIII, da CRFB). Os artigos 61-A, 61-B, 61-C, 63 e 67 da Lei n. 12.651/2012 estabelecem critérios para a recomposição das Áreas de Preservação Permanente, de acordo com o tamanho do imóvel. O tamanho do imóvel é critério legítimo para definição da extensão da recomposição das Áreas de Preservação Permanente, mercê da legitimidade do legislador para estabelecer os elementos norteadores da política pública de proteção ambiental, especialmente à luz da necessidade de assegurar minimamente o conteúdo econômico da propriedade, em obediência aos artigos 5º, XXII, e 170, II, da Carta Magna, por meio da adaptação da área a ser recomposta conforme o tamanho do imóvel rural. Além disso, a própria lei prevê mecanismos para que os órgãos ambientais competentes realizem a adequação dos critérios de recomposição para a realidade de cada nicho ecológico; Conclusão : Declaração de constitucionalidade dos artigos 61-A, 61-B, 61-C, 63 e 67 do Código Florestal; (v) Art. 78-A (Condicionamento legal da inscrição no Cadastro Ambiental Rural CAR para a concessão de crédito agrícola): O condicionamento legal da inscrição no Cadastro Ambiental Rural (CAR) para a concessão de crédito agrícola é um incentivo para que proprietários e possuidores de imóveis rurais forneçam informações ambientais de suas propriedades, a fim de compor base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento. Não há norma constitucional que proíba a concessão de crédito para agricultores sem inscrição em cadastro de cunho ambiental, enquadrando-se a implementação do aludido condicionamento em zona de discricionariedade legislativa; Conclusão : Declaração de constitucionalidade do artigo 78-A do Código Florestal. 23. Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 4901, 4902, 4903 e 4937 e Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 42 julgadas parcialmente procedentes. 
(ADC 42, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 28/02/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-175  DIVULG 12-08-2019  PUBLIC 13-08-2019)." 

No mesmo sentido, aplicando a nova disposição codificada aos fatos pretéritos: 

"EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CONSTITUCIONAL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ADC 42, ADI 4.901, ADI 4.902, ADI 4.903 e ADI 4.937. CONSTITUCIONALIDADE DE DISPOSITIVOS DA LEI 12.651/2012. INEXISTÊNCIA DE QUESTÃO LEGAL OU INFRACONSTITUCIONAL DE CONFLITO DE LEIS NO TEMPO. 1. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento conjunto da ADC 42 e das ADIs 4.901; 4.902; 4.903 e 4.937, Rel. Min. Luiz Fux, analisou a constitucionalidade de dispositivos da Lei 12.651/2012. 2. A não aplicação desses dispositivos, sob o argumento de que o novo código não poderia alcançar fatos pretéritos, resulta esvaziamento da eficácia da referida norma, cuja validade constitucional foi afirmada por este Tribunal. 3. Agravo interno a que se nega provimento. 
(ARE 1322337 AgR, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 11/11/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-235  DIVULG 26-11-2021  PUBLIC 29-11-2021)" 

Nesse sentido, a não aplicação de dispositivos da Lei nº 12.651/2012 sob o argumento de que o novo Código não poderia alcançar fatos pretéritos resultaria em esvaziamento da referida norma, cuja validade constitucional foi afirmada pelo STF. 

Ademais, julgar de forma diversa seria declarar obliquamente a inconstitucionalidade do Novo Código Florestal, decisão que abriria ensejos, perante o STF, de Reclamação para restabelecimento da autoridade da matéria decidida na ADI. 

Nesta toada verifica-se que o entendimento do STF é claro quando declara a constitucionalidade do artigo 62 do Novo Código Florestal que estabelece nova regra para fins de apuração de metragem de APP nos seguintes termos: 

"Art. 62. Para os reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, a faixa da Área de Preservação Permanente será a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum.  

Com efeito, esta Corte Regional tem decidido, com base no entendimento da E. Corte Superior,  que o artigo 62 do Novo Código Florestal tem aplicação pretérita já que o dispositivo, cuja constitucionalidade foi declarada, em sua literalidade, define novos parâmetros às áreas de preservação permanente: “Para os reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à MP nº 2.166-67 de 2001”, sendo este o caso da UHE  de Ilha Solteira, tendo em vista que esta foi outorgada à CESP por meio do Decreto nº 67.066, de 17/08/1970. 

Como supramencionado, a concessão da UHE de Ilha Solteira foi outorgada à CESP, à época sob a denominação Centrais Elétricas de São Paulo S/A, por meio do Decreto nº 67.066, de 17/8/1970, cuja concessão foi prorrogada por mais 20 anos pela Portaria MMe 289/2004, portanto, antes da MP 2.166-67 de 2001. 

Neste sentido deve ser aplicado, por força do caráter vinculante, o entendimento firmado pelo STF na ADI e na ADCS mencionadas.  

Marco temporal 

O IBAMA e a UNIÃO FEDERAL  alegam que o  artigo 62 da Lei nº 12.651/2012 só seria aplicável em áreas consolidadas até 22/7/2008, (ou seja, somente quando não delimitada anteriormente a APP), conforme previsto no caput do artigo 61-A do mesmo diploma legal  e após esse marco temporal a faixa de APP a ser considerada é a definida no licenciamento ambiental do empreendimento, onde não houver ocupação antrópica, nos termos dos artigos 4º, III, e 5º, da Lei nº 12.651/2012, explicitando que outra interpretação equivaleria a um salvo conduto para novas invasões/edificações em APP de reservatórios artificiais, a qual também não deve prevalecer, por ausência de previsão legal.  

Defendem que o marco temporal para aplicação do art. 62 do Novo Código Florestal, seja a data de 22/07/2008, ou então, subsidiariamente, 28/05/2012 (data da entrada em vigor do novo Código Florestal). 

A discussão se limita, então, a incidir para fins da extensão da APP, se prevalece o artigo 5º, caput; ou o artigo 62, ambos do novo Código Florestal. Para tanto, o Juízo deve declarar o discrímen aplicável, a saber, se o marco temporal relativo ao registro do reservatório de água (ou a assinatura do contrato de concessão) se qualifica como anterior ou posterior à vigência da MP 2.166/2001 (24/08/2001). 

Vejamos o disposto nos artigos 4º, III, 5º e 61-A: 

“Art. 4º Considera-se Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei: 

(...) 

III - as áreas no entorno dos reservatórios d’água artificiais, decorrentes de barramento ou represamento de cursos d’água naturais, na faixa definida na licença ambiental do empreendimento;” (...) 

“Art. 5º Na implantação de reservatório d’água artificial destinado a geração de energia ou abastecimento público, é obrigatória a aquisição, desapropriação ou instituição de servidão administrativa pelo empreendedor das Áreas de Preservação Permanente criadas em seu entorno, conforme estabelecido no licenciamento ambiental, observando-se a faixa mínima de 30 (trinta) metros e máxima de 100 (cem) metros em área rural, e a faixa mínima de 15 (quinze) metros e máxima de 30 (trinta) metros em área urbana.” (...) 

"Art. 61-A. Nas Áreas de Preservação Permanente, é autorizada, exclusivamente, a continuidade das atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural em áreas rurais consolidadas até 22 de julho de 2008. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).                 (Vide ADIN Nº 4.937)      (Vide ADC Nº 42)      (Vide ADIN Nº 4.902) 

 No que diz respeito à Área de Preservação Permanente no entorno de reservatórios artificiais de água, o novo Código Florestal, no artigo 4º, III, artigo 5º, e no já mencionado artigo 62, previu três extensões distintas, a depender da circunstância fática: 

"Artigo 4º, III: no entorno dos reservatórios d’água artificiais, decorrentes de barramento ou represamento de cursos d’água naturais, a faixa definida na licença ambiental do empreendimento. 

Artigo 5º: no entorno de reservatório d’água artificial destinado a geração de energia ou abastecimento público, conforme estabelecido no licenciamento ambiental, observando-se a faixa mínima de 30 (trinta) metros e máxima de 100 (cem) metros em área rural, e a faixa mínima de 15 (quinze) metros e máxima de 30 (trinta) metros em área urbana. 

Artigo 62: no entorno de reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à Medida Provisória 2.166-67/2001, a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota “ máxima maximorum”. 

Especificamente no que toca aos reservatórios de água destinados à produção de energia que foram registrados ou tiveram concessões autorizadas antes de 24 de agosto de 2001 (início da vigência da MP 2.166/2001), a APP foi desde logo delimitada como sendo a faixa compreendida entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum, assim compreendida como a faixa máxima alcançada pelo reservatório em períodos de grandes cheias. 

No caso dos autos a assinatura do contrato de concessão da UHE de Ilha Solteira é anterior a 2001. 

Portanto, não subsiste as alegações no sentido de que o artigo 62 teria lugar somente quando não delimitada anteriormente a APP, ou seja, em áreas consolidadas até 22/07/2008, conforme previsto no artigo 61-A do mesmo Diploma Legal, ou em casos em que houvesse ocupações antrópicas na extensão geral do artigo 5º, caput e nos termos do artigo 4º, da Lei nº 12.651/2012. 

Isto porque a legislação é clara ao estabelecer, como único critério para aplicação da exceção à regra geral, o marco temporal da MP 2.661/2001, descabendo ao Poder Judiciário inovar e trazer critérios diversos do previsto legalmente para indicar a aplicação de um ou outro critério. 

O artigo 62 do Código Florestal não faz alusão ao marco temporal do artigo 61-A, em 22/07/2008, portanto referida data deve ser afastada. 

Ainda, não há que se falar em aplicação subsidiária a data da entrada em vigor do novo código florestal, qual seja, 28/05/2012, posto que o registro ou concessão da UHE de Ilha Solteira é anterior a 2001, exatamente nos termos do disposto no artigo 62. 

No mesmo contexto não há que se falar em interpretação de cunho generalista porque o imóvel em discussão  é de propriedade de Júlio Galbiatti Júnior e outros, cuja construção foi erguida em área de preservação permanente em loteamento denominado "Condomínio Porto Amaral", localizado no Município de Populina, na margem do Rio Paraná, confrontando-se com o reservatório da UHE de Ilha Solteira, cujo imóvel fora adquirido em 1998, em que os danos ambientais  foram constatados por meio do Auto de Infração 263057- Série D/Termo de Embargo  nº 181804/C, lavrado pelo IBAMA,(ID. 212721246 - pág. 4/5 e 212721259 - pág. 8/9) 

Do dano ambiental e suas consequências  

O meio ambiente ecologicamente equilibrado é bem comum de uso do povo, cabendo ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo. 

A Constituição Federal trata da proteção ao meio ambiente em seu art. 225, in verbis

"Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. 

§1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: 

I – preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e dos ecossistemas; 

II –preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; 

III –definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; 

(...) 

VII –proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade." (grifos nossos)" 

No que concerne às Áreas de Proteção Permanente, o Código Florestal, Lei 12.651/2012, em seu art. 4º, I, “c”, VI e VII, e artigo 62, estabelecem que, in verbis

“Art. 4º Considera-se Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei: 

I - as faixas marginais de qualquer curso d’água natural, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de: 

a) 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura; 

b) 50 (cinquenta) metros, para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura; 

c) 100 (cem) metros, para os cursos d’água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura; 

d) 200 (duzentos) metros, para os cursos d’água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura; 

e) 500 (quinhentos) metros, para os cursos d’água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros; (…) VI - as restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues; VII - os manguezais, em toda a sua extensão;” 

"Art. 62. Para os reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, a faixa da Área de Preservação Permanente será a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum .  

A presente ação civil pública objetiva a restauração do equilíbrio ecológico em virtude da ocorrência de danos ao meio ambiente, ocasionados por interferência em área de preservação ambiental. Tais danos decorrem das construções irregulares pelo demandado, Sr. Júlio Galbiatti Júnior e outros, denominados rancheiros. 

O suporte fático que ensejou a propositura da ação civil pública foi a constatação de construções irregulares não autorizadas em área de preservação permanente, descritas no auto de infração lavrado pelo Ibama no loteamento denominado "Condomínio Porto Amaral", localizado no Município de Populina, na Margem do rio Paraná, confrontando-se com o reservatório da UHE Ilha Solteira. 

O imóvel em questão possui 289,12M2 de área total, com 81M2 de área autuada sobre Área de Preservação Permanente, sendo que o IBAMA notificou o proprietário da irregularidade da edificação, lavrando Auto de Infração nº263057/D e Termo de Embargo, (ID.212721246- pág. 4/5). 

Importante de menção que as impugnações apresentadas em sede de contestação e em apelação, não são em relação à ausência do dano, como consequência, não há controvérsia nos autos quanto à existência de danos, ou dos limites legais do terreno, ficando inconteste que o rancheiro invadiu área de preservação permanente, consoante Auto de Infração e Termo de embargo juntado aos autos. 

No que diz respeito à reparação do dano ao meio ambiente, o ordenamento jurídico pátrio agasalha a responsabilidade objetiva e impõe o dever de recomposição integral dos prejuízos por parte dos agentes infratores. 

A responsabilidade por dano ambiental, portanto, possui evidenciado caráter objetivo, sendo necessária a presença do nexo e do dano, independentemente do caráter volitivo do agente (dolo/culpa). 

Conforme disposto no § 3° do art. 225: "As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados

A Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, nº 6.938/81, cujo art. 14, § 1º, afirma: "o poluidor é obrigado, independentemente de existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade". 

Por sua vez, o art. 3º, IV, da referida lei, define poluidor como “a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental.” 

Já o art. 4º, VII, dispõe que a Política Nacional do Meio Ambiente visará “à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados, e ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos”. 

Consoante entendimento do STJ, o sistema jurídico de proteção ao meio ambiente, disciplinado em normas constitucionais (CF, art. 225, § 3º) e infraconstitucionais (Lei 6.938/81, arts. 2º e 4º), está fundado, entre outros, nos princípios da prevenção, do poluidor-pagador e da reparação integral. 

A Lei nº 6.938/81, recepcionada pelo texto constitucional de 1988, prevê a responsabilidade civil objetiva do infrator das normas ambientais, ao estabelecer que “é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade

Dos princípios da prevenção, do poluidor-pagador e da reparação integral decorrem, para os destinatários (Estado e comunidade), deveres e obrigações de variada natureza, comportando prestações pessoais, positivas e negativas (fazer e não fazer), bem como de pagar quantia (indenização dos danos insuscetíveis de recomposição in natura), prestações essas que não se excluem, mas, pelo contrário, se cumulam, se for o caso. (REsp 605323 / MG ; RECURSO ESPECIAL 2003/0195051-9 Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI). 

Ademais, ressalta-se que tal entendimento foi firmado pelo STJ por meio do rito previsto no art. 543-C, do CPC/73 (Recurso Especial Representativo de Controvérsia), no sentido de que “a responsabilidade por dano ambiental é objetiva, informada pela teoria do risco integral, sendo o nexo de causalidade o fator aglutinante que permite que o risco se integre na unidade do ato” (...) (REsp 1374284/MG). 

A responsabilidade objetiva ambiental significa que quem danificar o ambiente tem o dever jurídico de repará-lo. 

Mister enfatizar que a obrigação de recuperar a degradação ambiental abrange aquele que é titular da propriedade do imóvel, mesmo que não seja de sua autoria a deflagração do dano, tendo em conta sua natureza propter rem (Neste sentido, v., p. ex., REsp 343.741/PR, Rel. Min. Franciulli Netto, DJU 7.10.2002; REsp 745.363/PR, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJU 18.10.2007; e REsp 453.875/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 11.11.2009). 

No caso dos autos, não há dúvidas sobre a ocorrência de dano ambiental, visto que as construções foram realizadas em APP, o que alterou as características do meio ambiente, por meio de degradação, razão pela qual é devida a indenização. 

Por oportuno, anoto que embora não tenha sido efetuada a perícia, conforme mencionado alhures, as construções em área de preservação permanente foram confirmadas, conforme amplamente demonstrado pelo Auto de Infração, portanto, o dano ambiental deve ser reparado e a extensão da intervenção em APP será apurada em sede de liquidação de sentença. 

Da solidariedade na reparação do dano ambiental 

A responsabilidade civil pela reparação dos danos ambientais adere à propriedade como obrigação propter rem, sendo possível cobrar do atual proprietário as condutas derivadas de danos provocados pelos proprietários antigos, sem prejuízo da cumulação de obrigações de indenizar, não fazer e fazer (Precedentes: STJ, 1ª Turma, AgRg no REsp 1.254.935, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe 28.3.2014; STJ, 2ª Turma, REsp 1.227.139, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 13.4.2012). 

Conforme retro mencionado, nos termos do art. 225, §3º, da Constituição Federal c/c art. 14, §1º e art. 3º, IV da Lei 6.938/81, havendo mais de um causador, todos responderão solidariamente pela reparação do meio ambiente. 

O dano ambiental provocado pelos réus descrito na inicial pelo MPF constatou que, "a permanência das edificações e a utilização de antrópica do local impede o restabelecimento da vegetação na APP ao redor do reservatório, podendo trazer danos ambientais decorrentes do lançamento de efluentes (esgotos) e da utilização do lago da usina sem o competente licenciamento ambiental

Portanto, os danos ambientais foram ocasionados por aqueles que, direta, ou indiretamente contribuíram para a degradação do meio ambiente. 

O(s) rancheiro(s) por ter(em) construído em área de preservação permanente, com degradação do solo, impedindo a regeneração das gramíneas e demais vegetação. 

O Município de Populina por ter autorizado o loteamento incentivando a edificação em área em área sabidamente proibida e protegida pela legislação e Resolução do IBAMA. 

A CESP titular da concessão Pública na exploração econômica do reservatório, geradora de energia elétrica, por ter permitido o uso irregular de área de proteção permanente, não impedindo nem fiscalizando a obra dentro da área de preservação, sendo que o dano se iniciou ao seu tempo. 

A Rio Paraná Energia S/A por ter sucedido a CESP, respondendo da mesma forma que esta.  

Portanto, devem ser providas as apelações do MPF e do IBAMA para reconhecer a responsabilidade solidária de todos os corréus na reparação do dano ambiental. 

Do plano de recuperação ambiental 

No que pertine ao pedido subsidiário de aprovação de um Plano de Recuperação Ambiental (recuperação da área degradada), sob a orientação do IBAMA, tal pleito se mostra plenamente compatível com a natureza do dano causado ao meio ambiente, sob pena de ocorrer o agravamento de tal situação. 

Com efeito, a condenação do poluidor em obrigação de fazer conforme decidido em sentença "destruir e remover qualquer intervenção antrópica existente dentro da APP do imóvel objeto da lide, para fins de recuperação natural da vegetação nativa degradada", imposta diretamente aos rancheiros e, de maneira subsidiária, aos demais requeridos,  não é suficiente para recuperar a área degradada, portanto,  todos os requeridos devem ser condenados na recomposição da área afetada, mediante o reflorestamento e práticas de adequação ambiental devidamente definidos em projeto/plano de recuperação a ser apresentado pelos proprietários do imóvel e aprovação pelos órgãos ambientais, tal como requerido na petição inicial, portanto o recurso do MPF deve ser provido quanto ao ponto. 

Neste sentido: 

"AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL. CONSTRUÇÃO EM APP. DEGRADAÇÃO AMBIENTAL COMPROVADA. QUESTÕES ANALISADAS. OMISSÕES. VIOLAÇÃO DO ART. 535, II, DO CPC/73 NÃO CARACTERIZADA. OCUPAÇÃO EM APP. DEGRADAÇÃO AMBIENTAL CONSTATADA. EFETIVA REPARAÇÃO. NECESSIDADE. PRECEDENTES. 

I - Na origem, o Ministério Público do Estado de São Paulo ajuizou ação civil pública ambiental com o objetivo de compelir os réus na obrigação de não fazer obras em continuidade às já existentes em imóvel situado em APP, onde não teriam sido devidamente observadas as regras ambientais pertinentes, bem como na obrigação de reparar os danos já causados. 

II - As questões foram devidamente analisadas pelo Tribunal a quo, em decisão fundamentada, não se evidenciando as omissões apontadas, sendo de rigor o afastamento da apontada violação do art. 535 do CPC/73. 

III - O acórdão recorrido é claro ao reconhecer a ocupação em APP, bem como a existência de degradação ambiental na hipótese dos autos, não sendo o caso de incidência do óbice sumular n. 7/STJ. 

IV - Nos termos da jurisprudência firmada por esta Corte de Justiça, o princípio que rege as condenações por lesões ao meio ambiente é o da máxima recuperação do dano, não incidindo nessa situação, nenhuma excludente de responsabilidade. Precedentes: REsp n. 176.753/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 11/11/2009; RESP n. 1.374.284/MG. Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 11/12/2013, entre outros. 

V - Os réus devem ser condenados, também, à reparação integral dos danos ambientais relacionados à demolição de toda edificação em APP; à indenização pelos danos ambientais irreparáveis; e, à realização do abandono da APP do entorno do reservatório mantido pelo acórdão recorrido, efetuando-se o licenciamento com projeto de recuperação da área degradada. 

VI - Agravo conhecido, com o provimento do recurso especial. (AREsp 1093640/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/05/2018, DJe 21/05/2018) 

 
 

Ante o exposto, rejeito as preliminares e, no mérito, dou parcial provimento às apelações do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL E DO IBAMA e nego provimento às apelações da UNIÃO FEDERAL, da CESP e da RIO PARANÁ ENERGIA S/A, tudo, nos termos da fundamentação.  

 

E, na ausência dos vícios alegados, não cabem os declaratórios para rediscutir temas devidamente apreciados, devendo a parte manifestar seu inconformismo através dos recursos processuais cabíveis para postular a reforma do julgado nos termos que lhe interessa, bem como descabem os embargos de declaração para o prequestionamento dos dispositivos aventados pela parte embargante.

Ante o exposto, REJEITO os embargos de declaração opostos.

É como voto.
 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. INOCORRÊNCIA DE VÍCIOS. REDISCUSSÃO DO JULGADO.  PREQUESTIONAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO REJEITADO.

- Nos termos do art. 1.022, do Código de Processo Civil, os embargos de declaração são cabíveis contra qualquer decisão judicial e possuem a função específica de esclarecer ou integrar o julgado, sanando obscuridades, contradições ou omissões, bem como de corrigir erros materiais. Vícios inexistentes.

- Devidamente analisadas as questões trazidas a debate, tendo sido o acórdão embargado suficientemente fundamentado, atendendo ao estabelecido no art. 93, inc. IX da CF/88, o qual não pressupõe motivação exaustiva, foi adotado entendimento diverso do pretendido pela parte embargante.

- Não há como prevalecer  a tese de reunião das mais de 500 Ações Civis Pública,  posto que a reunião de processos, no caso, ao invés de ser útil como se pretende, prejudicaria a instrução processual e a celeridade, dada a mencionada diversidade fática relacionada às diversas propriedades e seus diferentes proprietários, os quais tem cada um uma situação particular em relação à utilização do próprio imóvel em área de preservação permanente, o que poderá exigir instrução probatória diferenciada de acordo com o caso concreto, conforme já decidido por esta C. Corte Regional Federal, nos autos do processo nº 0001553-09.2009.4.03.6124, de lavra do Eminente relator Johonsom Di Salvo. 

- Legitimidade passiva da CESP e da Empresa Rio Paraná Energia S/A, questão já decidida por esta C. Corte Regional Federal, nos autos nº 0001553-09.2009.4.03.6124. A assunção da concessão da UHE Ilha Solteira pela Rio Paraná S/A não enseja a exclusão da CESP do processo, mas a inclusão da nova concessionária, formando um litisconsórcio passivo entre proprietário, CESP e RPESA. 

- Nenhum cerceamento de defesa se configura à causa, porque despicienda a produção de prova pericial neste momento processual. No presente caso o ônus da prova foi invertido em desfavor dos proprietários do imóvel, sendo determinado, em despacho saneador, o adiantamento dos honorários periciais, sob pena de preclusão, com advertência de julgamento do processo no estado em que se encontrava. Não houve impugnação por nenhuma das partes, de tal forma que diante da inércia dos proprietárioS em recolher os honorários, a perícia não foi realizada e a questão tornou-se acobertada pelo manto da preclusão. Além disso, a CESP, devidamente intimada, não se opôs aos termos da decisão saneadora, portanto, não há que se falar em nulidade ou cerceamento de defesa. 

- Não obstante a realização da perícia estar acobertada pela preclusão, neste momento processual é diligência prescindível pois o dano em área de preservação permanente  restou comprovado por meio do Auto de Infração nº nº 263057 - Série D/Termo de Embargo nº 181804/C, lavrado pelo IBAMA,  em que se constatou que o loteamento denominado Condomínio Porto Amaral, localizado no Município de Populina, na margem do Rio Paraná, confrontando-se como Reservatório da UHE Ilha Solteira, foi utilizado sem autorização do órgão competente em Área de Preservação Permanente do Reservatório da UHE de Ilha Solteira, com 81 M2 de área antropizada, impedindo a regeneração natural da vegetação.  

- As obrigações prospectivas de remoção/recuperação das intervenções antrópicas existentes na APP poderão ser aferidas quando da liquidação e execução da sentença, nos termos do artigo 509 do CPC, realizando-se, acaso necessária, a mencionada perícia, a fim de ser verificada a persistência da ilegalidade que deverá ser removida, nos termos do artigo 510 do mesmo código, bem como a forma como o dano ambiental deverá ser reparado. 

- Remanesce o interesse processual do Ministério Público Federal no feito,  não havendo que se falar em perda de objeto superveniente, não obstante a expedição da Licença de Operação nº 1300/2015 expedida pelo Ibama com validade até 2025 tendo em vista que será determinada a reparação de danos, com condenação em obrigação não fazer e de fiscalizar  e tomar medidas proibitivas, portanto, o objeto da lide se mantém ( tutela mandamental prospectiva), independente da discussão acerca da área considerada de preservação permanente, restando clara a manutenção de interesse processual para continuidade do feito. 

- Aplicação das normas do novo Código Florestal, ou seja, da regra trazida pelo artigo 62, que firmou novos parâmetros para delimitação de APP no entorno dos reservatórios artificiais das usinas hidrelétricas, isto porque a validade constitucional do referido artigo foi firmada pelo STF nas supra mencionadas ADIs 4.901; 4902;4.903 e 4.937,  e na ADC nº 42/DF. 

- Esta E. Corte Regional tem decidido, com base no entendimento da Corte Superior,  que o artigo 62 do Novo Código Florestal tem aplicação pretérita já que o dispositivo, cuja constitucionalidade foi declarada, em sua literalidade, define novos parâmetros às áreas de preservação permanente: “Para os reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à MP nº 2.166-67 de 2001”, sendo o caso da UHE  de Ilha Solteira, tendo em vista que esta foi outorgada à CESP por meio do Decreto nº 67.066, de 17/08/1970. 

- A tese do IBAMA e a UNIÃO FEDERAL  em que o  artigo 62 da Lei nº 12.651/2012 só seria aplicável em áreas consolidadas até 22/7/2008,  (ou seja, somente quando não delimitada anteriormente a APP), conforme previsto no caput do artigo 61-A do mesmo diploma legal e após esse marco temporal a faixa de APP a ser considerada é a definida no licenciamento ambiental do empreendimento, onde não houver ocupação antrópica, nos termos dos artigos 4º, III, e 5º, da Lei nº 12.651/2012, explicitando que outra interpretação equivaleria a um salvo conduto para novas invasões/edificações em APP de reservatórios artificiais,  deve ser rechaçada, por ausência de previsão legal. 

- Especificamente no que toca aos reservatórios de água destinados à produção de energia que foram registrados ou tiveram concessões autorizadas antes de 24 de agosto de 2001 (início da vigência da MP 2.166/2001), a APP foi desde logo delimitada como sendo a faixa compreendida entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum, assim compreendida como a faixa máxima alcançada pelo reservatório em períodos de grandes cheias. No caso dos autos a assinatura do contrato de concessão da UHE de Ilha Solteira é anterior a 2001, portanto plenamente aplicável os termos do artigo 62 do Código Florestal. 

- Não subsiste as alegações no sentido de que o artigo 62 teria lugar somente quando não delimitada anteriormente a APP, ou seja, em áreas consolidadas até 22/07/2008, conforme previsto no artigo 61-A do mesmo Diploma Legal, ou em casos em que houvesse ocupações antrópicas na extensão geral do artigo 5º, caput e nos termos do artigo 4º, da Lei nº 12.651/2012. Isto porque a legislação é clara ao estabelecer, como único critério para aplicação da exceção à regra geral, o marco temporal da MP 2.661/2001, descabendo ao Poder Judiciário inovar e trazer critérios diversos do previsto legalmente para indicar a aplicação de um ou outro critério. 

- O artigo 62 do Código Florestal não faz alusão ao marco temporal do artigo 61-A, em 22/07/2008, portanto referida data deve ser afastada. 

- O marco temporal relativo ao registro do reservatório de água (ou a assinatura do contrato de concessão) se qualifica como anterior à vigência da MP 2.166/2001 (24/08/2001). Não há que se falar em aplicação subsidiária a data da entrada em vigor do novo código florestal, qual seja, 28/05/2012, posto que o registro ou concessão da UHE de Ilha Solteira é anterior a 2001, exatamente nos termos do disposto no artigo 62. 

- Não há que se falar em interpretação de cunho generalista porque o imóvel em discussão  é de propriedade de Júlio Galbiatti Júnior e outros, cuja construção foi erguida em área de preservação permanente em loteamento denominado "Condomínio Porto Amaral", localizado no Município de Populina, na margem do Rio Paraná, confrontando-se com o reservatório da UHE de Ilha Solteira, cujo imóvel fora adquirido em 1998, em que os danos ambientais  foram constatados por meio do Auto de Infração 263057- Série D/Termo de Embargo  nº 181804/C, lavrado pelo IBAMA

- Consoante entendimento do STJ, o sistema jurídico de proteção ao meio ambiente, disciplinado em normas constitucionais (CF, art. 225, § 3º) e infraconstitucionais (Lei 6.938/81, arts. 2º e 4º), está fundado, entre outros, nos princípios da prevenção, do poluidor-pagador e da reparação integral. 

- Dos princípios da prevenção, do poluidor-pagador e da reparação integral decorrem, para os destinatários (Estado e comunidade), deveres e obrigações de variada natureza, comportando prestações pessoais, positivas e negativas (fazer e não fazer), bem como de pagar quantia (indenização dos danos insuscetíveis de recomposição in natura), prestações essas que não se excluem, mas, pelo contrário, se cumulam, se for o caso. (REsp 605323 / MG ; RECURSO ESPECIAL 2003/0195051-9 Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI). 

A responsabilidade objetiva ambiental significa que quem danificar o ambiente tem o dever jurídico de repará-lo. 

- No caso dos autos não há dúvidas sobre a ocorrência de dano ambiental, visto que as construções foram realizadas em APP, o que alterou as características do meio ambiente, por meio de degradação, razão pela qual é devida a indenização. Por oportuno, embora não tenha sido efetuada a perícia, as construções em área de preservação permanente foram confirmadas, conforme amplamente demonstrado pelo Auto de Infração, portanto, o dano ambiental deve ser reparado e a extensão da intervenção em APP será apurada em sede de liquidação de sentença. 

- A responsabilidade civil pela reparação dos danos ambientais adere à propriedade como obrigação propter rem, sendo possível cobrar do atual proprietário as condutas derivadas de danos provocados pelos proprietários antigos, sem prejuízo da cumulação de obrigações de indenizar, não fazer e fazer (Precedentes: STJ, 1ª Turma, AgRg no REsp 1.254.935, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe 28.3.2014; STJ, 2ª Turma, REsp 1.227.139, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 13.4.2012). 

Nos termos do art. 225, §3º, da Constituição Federal c/c art. 14, §1º e art. 3º, IV da Lei 6.938/81, havendo mais de um causador, todos responderão solidariamente pela reparação do meio ambiente. O  rancheiro por ter construído em área de preservação permanente, com degradação do solo, impedindo a regeneração das gramíneas e demais vegetação. O Município de Populina por ter editado lei incentivando a edificação em área sabidamente proibida e protegida pela legislação e Resolução do IBAMA. A Cesp, titular da concessão Pública na exploração econômica do reservatório, geradora de energia elétrica, por ter permitido o uso irregular de área de proteção permanente, não impedindo nem fiscalizando a obra dentro da área de preservação, sendo que o dano se iniciou ao seu tempo. O Rio Paraná Energia S/A por ter sucedido a CESP, respondendo da mesma forma que esta.  

- Todos os requeridos devem ser condenados na recomposição da área afetada, mediante o reflorestamento e práticas de adequação ambiental devidamente definidos em projeto/plano de recuperação a ser apresentado pelos proprietários do imóvel e aprovação pelos órgãos ambientais, tal como requerido na petição inicial. 

- E, na ausência dos vícios alegados, não cabem os declaratórios para rediscutir temas devidamente apreciados, devendo a parte manifestar seu inconformismo através dos recursos processuais cabíveis para postular a reforma do julgado nos termos que lhe interessa, bem como descabem os embargos de declaração para o prequestionamento dos dispositivos aventados pela parte embargante.

- Embargos de declaração rejeitados.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma, por unanimidade, REJEITOU os embargos de declaração opostos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.