Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0024741-93.2015.4.03.6100

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY

APELANTE: DNIT-DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRAEST DE TRANSPORTES

APELADO: CHUBB DO BRASIL COMPANHIA DE SEGUROS

Advogado do(a) APELADO: JOSE CARLOS VAN CLEEF DE ALMEIDA SANTOS - SP273843-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0024741-93.2015.4.03.6100

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY

APELANTE: DNIT-DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRAEST DE TRANSPORTES

 

APELADO: CHUBB DO BRASIL COMPANHIA DE SEGUROS

Advogado do(a) APELADO: JOSE CARLOS VAN CLEEF DE ALMEIDA SANTOS - SP273843-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de apelação interposta pelo DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRAESTRUTURA DE TRANSPORTES - DNIT contra sentença proferida em ação ordinária movida em face dele por CHUBB DO BRASIL COMPANHIA DE SEGUROS objetivando a condenação da ré ao ressarcimento de valores despendidos com cobertura securitária em razão de acidente automobilístico ocorrido em rodovia federal.

Narra a autora em sua inicial que, em 15/12/2012, um veículo segurado trafegava pela Rodovia BR 262, altura do KM 264, sentido Araxá/MG, na altura do município de Campos Altos/MG, quando seu condutor foi surpreendido pela presença de uma vaca que perambulava pela via, da qual não conseguiu desviar. Pretende ser ressarcida da importância de R$ 68.041,74 (sessenta e oito mil e quarenta e um reais e setenta e quatro centavos), referente ao pagamento de indenização securitária, já descontado o valor da alienação do salvado (ID 274260804 - pág. 04/31).

Contestação pela ré (ID 274260804 - pág. 91/151).

Foram ouvidas duas pessoas, uma na qualidade de testemunha e outra como informante do Juízo (ID 274260806 - pág. 122/124 e 254/256).

A parte autora desistiu da oitiva de uma terceira testemunha em razão da dificuldade de localizá-la (ID 274260811).

Em sentença prolatada em 23/01/2023, o Juízo de Origem julgou procedente o pedido para condenar a ré ao pagamento da importância de R$ 68.041,74 (sessenta e oito mil, quarenta e um reais e setenta e quatro centavos), acrescida de correção monetária e juros, desde o evento danoso, utilizando-se os índices previstos na Resolução nº 267/2013 do CJF e obedecido, no que couber, o artigo 1º. F da Lei 9.494/99, excluídos os índices da poupança (Recurso Extraordinário nº 870.947). Condenou a ré, ainda, ao pagamento dos honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação (ID 274260818).

O DNIT apela aduzindo, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva ad causam, aos argumentos de que o dono do animal é quem deve responder pelo infortúnio, de que não lhe cabe cercar toda a extensão da rodovia federal, que isso seria impossível, e que quem tem atribuição para retirar semoventes da via é a Polícia Rodoviária Federal. No mérito, defende a improcedência do pedido, sustentando que o acidente não decorreu da má conservação da rodovia ou da inobservância de quaisquer dos seus deveres, que houve culpa exclusiva do dono do animal ou do condutor do veículo, ou culpa concorrente de ambos, ou que se configurou caso fortuito ou de força maior (ID 274260820).

Contrarrazões pela autora (ID 274260824).

É o relatório.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0024741-93.2015.4.03.6100

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY

APELANTE: DNIT-DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRAEST DE TRANSPORTES

 

APELADO: CHUBB DO BRASIL COMPANHIA DE SEGUROS

Advogado do(a) APELADO: JOSE CARLOS VAN CLEEF DE ALMEIDA SANTOS - SP273843-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

V O T O

 

Pretende a companhia seguradora autora ser ressarcida pela autarquia federal ré pelos valores despendidos com cobertura securitária em razão de acidente automobilístico ocorrido em rodovia federal.

Incontroversa a ocorrência do acidente e o pagamento da cobertura securitária, o cerne da controvérsia trazida pelo recurso diz com a responsabilidade civil da ré, autarquia federal.

Cumpre ressaltar que, muito embora o Código Civil preveja a responsabilidade do proprietário do animal pelos danos por este causados (art. 936), tenho que tal previsão não afasta, de plano, a responsabilidade civil da Administração Pública, eis que é evidente a relação do dano com a prestação do serviço público.

No que se refere à responsabilidade civil do Estado quanto a atos omissivos, não se desconhece a existência de divergência doutrinária e jurisprudencial acerca da necessidade, ou não, de comprovação do dolo ou culpa da Administração Pública quanto ao evento danoso.

Não obstante, no caso dos autos, a responsabilidade civil da autarquia ré se evidencia tanto pela perspectiva subjetiva como, com maior razão, pelo ângulo objetivo, se assim considerada.

Isto porque cabe a ela, enquanto responsável pela manutenção, conservação, restauração e reposição de vias, terminais e instalações (art. 82, I, da Lei n° 10.233/2001), zelar pelas devidas condições de trafegabilidade destas vias, aí incluído, naturalmente, o dever de fiscalização quanto a eventuais invasões de pista por coisas semoventes e de sua remoção nestas hipóteses.

Neste ponto, cumpre afastar a alegação defensiva de que tais providências caberiam à Polícia Rodoviária Federal, posto que àquele órgão incumbem as atividades correlatas à fiscalização quanto a infrações de trânsito e de combate à criminalidade, nos termos do art. 1º do Decreto n° 1.655/1995.

Mesmo a atribuição à Polícia Rodoviária Federal da tarefa de remoção de animais de rodovia federal (art. 1°, III, do Decreto nº 1.655/1995) não afasta a responsabilidade civil do DNIT, uma vez que essa remoção está relacionada ao seu dever de manutenção das condições de trafegabilidade da via.

Trago à colação precedentes desta Corte Regional em casos que guardam similitude fática com a presente demanda:

"DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO. PRESENÇA DE ANIMAL NA VIA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO DNIT. ATRIBUIÇÕES DA POLÍCIA RODOVIÁRIA FEDERAL QUE NÃO AFASTAM SEU DEVER DE INDENIZAR. MATÉRIAS EXPRESSAMENTE ENFRENTADAS. DIREITO DE REGRESSO EM FACE DO PROPRIETÁRIO OU DETENTOR DO ANIMAL. OMISSÃO.

1. Este Colegiado decidiu, fundamentadamente, que o acidente discutido nos autos teve como causas diretas e imediatas (i) o descumprimento, pelo DNIT, de seu dever de manutenção das condições de trafegabilidade da via e (ii) o excesso de velocidade em que trafegava o condutor do veículo acidentado, razões pelas quais manteve o julgamento de parcial procedência do pedido para condenar a ré a ressarcir à autora metade do valor pago a terceiro a título de cobertura securitária, descontada a alienação do salvado, apenas modificando os honorários fixados no decisum.

2. A atribuição à Polícia Rodoviária Federal da tarefa de remoção de animais de rodovia federal (art. 1°, III, do Decreto nº 1.655/1995) não afasta a responsabilidade civil do DNIT, uma vez que inobservado seu dever de manutenção das condições de trafegabilidade da via, como decidido no acórdão embargado.

3. As presentes alegações acerca das atribuições do DNIT e da PRF e da culpa do condutor pelo evento revelam tão somente o inconformismo da parte com o quanto decidido.

4. Embora o Código Civil preveja a responsabilidade do dono ou detentor do animal pelos danos por este causados (art. 936), tal previsão não afasta a responsabilidade civil da administração pública, considerando que a relação do dano com a prestação do serviço público é evidente. Fica ressalvado, no entanto, o direito de regresso do DNIT em face do proprietário ou detentor do animal envolvido no acidente, a ser exercido pelas vias processuais próprias a tanto.

5. Embargos de declaração do DNIT parcialmente conhecidos e, nessa extensão, parcialmente acolhidos para explicitar que o artigo 936 do Código Civil não afasta a responsabilidade civil da administração pública pelo ressarcimento pleiteado nestes autos, ressalvado o direito de regresso do DNIT em face do proprietário do animal envolvido no acidente, a ser exercido pelas vias processuais próprias a tanto" (destaquei).

(TRF da 3ª Região, Embargos de Declaração na Apelação Cível n° 0021098-93.2016.4.03.6100/SP, Rel. Desembargador Federal Wilson Zauhy, Primeira Turma, julgamento em 03/05/2022, DJEN: 10/05/2022).  

DIREITO ADMINISTRATIVO, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO. PAGAMENTO DE COBERTURA SECURITÁRIA PELA AUTORA A TERCEIRO SEGURADO. SUB-ROGAÇÃO E PRETENSÃO DE RESSARCIMENTO EM FACE DO DNIT. ANIMAL NA VIA. RESPONSABILIDADE CIVIL DA REQUERIDA. RESSALVADO DIREITO DE REGRESSO EM FACE DO PROPRIETÁRIO DO ANIMAL. APELAÇÃO PROVIDA.

1. A matéria devolvida a este Tribunal diz com o direito de a companhia seguradora autora ser ressarcida pela autarquia federal ré pelos valores despendidos com cobertura securitária em razão de acidente automobilístico ocorrido em rodovia federal.

2. Muito embora o Código Civil preveja a responsabilidade do proprietário do animal pelos danos por este causados (art. 936), tenho que tal previsão não afasta, de plano, a responsabilidade civil da Administração Pública, eis que é evidente a relação do dano com a prestação do serviço público.

3. A responsabilidade civil da autarquia ré se evidencia tanto pela perspectiva subjetiva como, com maior razão, pelo ângulo objetivo, se assim considerada. Isto porque cabe a ela, enquanto responsável pela manutenção, conservação, restauração e reposição de vias, terminais e instalações (art. 82, I, da Lei n° 10.230/2001), zelar pelas devidas condições de trafegabilidade destas vias, aí incluído, naturalmente, o dever de fiscalização quanto a eventuais invasões de pista por coisas semoventes e de sua remoção nestas hipóteses. Precedentes desta Corte.

4. O acidente discutido nos autos foi causado por ato omissivo culposo da autarquia ré, ao não impedir nem promover a retirada de animal da pista, tampouco instalar a devida sinalização da presença de animais na pista, sendo que o infortúnio se deu pela invasão da rodovia por um cavalo.

5. Sentença reformada para se reconhecer a responsabilidade civil da autarquia ré pelo acidente automobilístico discutido nos autos e, portanto, o seu dever de ressarcir a empresa autora pela cobertura securitária paga por ela em razão do evento, ressalvado seu direito de regresso contra o proprietário do animal causador do dano.

6. Apelação provida.

(TRF da 3ª Região, Apelação Cível n° 5017959-77.2018.4.03.6100/SP, Rel. Desembargador Federal Wilson Zauhy, Primeira Turma, e-DJF3: 19/05/2020). 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ERRO MATERIAL. AÇÃO DE RESSARCIMENTO. SEGURADORA. DANO MATERIAL. DIREITO PRIVADO. COMPETÊNCIA DAS TURMAS INTEGRANTES DA PRIMEIRA SEÇÃO DESTA CORTE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DA PARTE AUTORA ACOLHIDOS. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DA PARTE RÉ PARCIALMENTE ACOLHIDOS.

1. Os embargos de declaração destinam-se a sanar omissão, obscuridade, contradição ou erro material de que esteja eivado o julgado.

2. O acórdão embargado incorreu em erro material no que toca à condenação da ré ao pagamento de honorários advocatícios, equívoco que passa a ser sanado para que conste que "a ré passa a ser integralmente vencida na demanda, devendo arcar com honorários advocatícios em favor da parte autora".

3. O caso dos autos versa sobre o pagamento de indenização por dano material em favor da parte autora, empresa do ramo de seguros, a título de ressarcimento de valor pago por ela a terceiro, um segurado que sofreu acidente de trânsito. Desta forma, resta evidente que a matéria e a natureza da relação jurídica litigiosa são de direito privado, sendo certo que a natureza pública do DNIT e o fato deste órgão atuar na implementação da "política formulada para a administração da infra-estrutura do Sistema Federal de Viação", nos termos do art. 80 da Lei n° 10.233/2001, ou na prestação de serviços públicos relacionados à infraestrutura viária tocam apenas indiretamente com a presente lide, de sorte que se conclui pela competência da Primeira Seção - da qual esta Primeira Turma é integrante - para o processamento e julgamento do feito, nos termos do art. 10, § 1º, II do Regimento Interno desta Corte.

4. Outrossim, não há que se falar em omissão quanto à teoria de responsabilidade civil adotada no acórdão, eis que se consignou expressamente que "no caso dos autos, a responsabilidade civil da autarquia ré se evidencia tanto pela perspectiva subjetiva como, com maior razão, pelo ângulo objetivo, se assim considerada". Sendo assim, irrelevante a fixação da teoria de responsabilidade civil adotada, já que se asseverou que o dever de indenizar estará presente independentemente da necessidade de aferição ou não de culpa da requerida no caso concreto.

5. O julgado foi expresso ao afirmar que cabe ao DNIT, "enquanto responsável pela manutenção, conservação, restauração e reposição de vias, terminais e instalações (art. 82, I, da Lei n° 10.230/2001), zelar pelas devidas condições de trafegabilidade destas vias, aí incluído, naturalmente, o dever de fiscalização quanto a eventuais invasões de pista por coisas semoventes e de sua remoção nestas hipóteses", bem como ao afastar a alegação de que "tais providências caberiam à Polícia Rodoviária Federal, posto que àquele órgão incumbem as atividades correlatas à fiscalização quanto a infrações de trânsito e de combate à criminalidade, nos termos do art. 1º do Decreto n° 1.655/1995".

6. O decisum consignou expressamente que a responsabilidade do proprietário do animal pelos danos por este causados, tal como prevista no art. 936 do Código Civil, não afasta, de plano, a responsabilidade civil da Administração Pública, eis que é evidente a relação direta do dano com a prestação do serviço público.

7. Muito embora não se verifique a contradição alegada pelo DNIT - já que se registrou que "o acidente discutido nos autos foi causado por ato omissivo culposo da autarquia ré, ao não impedir nem promover a retirada de animal da pista" -, vê-se que o acórdão incorreu em omissão ao não explicitar que fica ressalvado ao réu o seu direito de regresso em face do proprietário do animal, nos termos dos art. 934 e 936 do Código Civil, a ser perseguido pelas vias processuais próprias, omissão que se passa a sanar.

4. Embargos de declaração da parte autora acolhidos.

5. Embargos de declaração da parte ré parcialmente acolhidos.

(TRF da 3ª Região, Embargos de Declaração na Apelação Cível n° 0021914-51.2011.4.03.6100/SP, Rel. Desembargador Federal Wilson Zauhy, Primeira Turma, e-DJF3: 13/09/2018) (destaquei).

A dinâmica dos fatos discutidos nesses autos foi assim descrita em Boletim de Ocorrência lavrado pela Polícia Rodoviária Federal, transcrito em sentença (ID 274260818):

"Conforme declarações dos condutores e vestígios colhidos no local, V1/Chevrolet Agile LTZ, placa HJI-6527, seguia pela faixa da esquerda da BR 262, KM 364, sentido crescente quando colidiu com uma vaca que estava solta na pista. Após a colisão V1 perdeu o controle e colidiu na cerca de proteção do lado direito da pista e o animal ficou caído no meio da faixa da esquerda. Logo atrás seguia V2/BMW 325i PH11, placa HMT-5859, que não conseguiu desviar do animal e colidiu no mesmo. Após essa colisão V2 perdeu o controle e saiu da pista para o canteiro central".

O veículo segurado pela autora é o descrito como “V2” no boletim de ocorrência.

Ouvido como testemunha nestes autos, o Sr. Osmar Diniz França, condutor do veículo segurado, assim declarou (ID 274260806 - pág. 123/124):

“(...)

Inquirida declarou o seguinte: que é sócio e representante da empresa Osmar França Shows e Promoções Ltda e viajava com veículo da empresa, em 2012; que se tratava de um veículo BMW; que na BR 262, KM 365, num trecho entre Betim e Juatuba, um animal saiu subitamente à direita, passou na frente de um caminhão que subia a rodovia, sentido Pará de Minas, mas foi atingido por outro veículo e caiu bem na parte frontal do veículo dirigido pelo depoente; que não foi possível evitar a colisão pois tudo aconteceu muito rápido; que o depoente não sofreu lesões; que as ocupantes do outro carro não sofreram lesões, nem a ex esposa do depoente que também viajava na BMW; que a BMW sofreu perda total e ficou imediatamente incapaz de prosseguir a viagem; que o animal morreu na colisão e imediatamente acorreram populares que dividiram o animal em pedaços e retiraram-se da estrada; que o depoente tirou fotos do celular de todo o ocorrido as quais entregou à Seguradora; que não foi possível descobrir quem era o proprietário do bovino; que o depoente recebeu todo o valor do seguro firmado com a seguradora, não tendo qualquer interesse na causa; que acredita que o boi ou vaca pertencia a alguma propriedade limítrofe da rodovia e escapou por algum buraco na cerca.

Dada à palavra à Advogada do autor, às suas perguntas respondeu o seguinte: que o trecho em que ocorreu o acidente é uma área rural; que não sabe se no local havia cercas e ressalta que o acidente ocorreu por volta de 01 h da madrugada; que na época não havia sinalização advertindo da presença de animais na pista; que não tem conhecimento de outros acidentes por causa da presença de animais naquele trecho; que no dia do acidente o tempo tava bom, ou seja, não chovia; que a pista estava em boas condições; que o depoente seguia atrás de um outro veículo de passeio e o depoente e o outro veículo ultrapassavam um caminhão; que o animal saltou à frente do caminhão, foi atingido pelo carro que estava à frente e parou à frente do veículo depoente, danificando-o;

(...)”.

Transcrevo também o teor do depoimento da Sra. Dalva Moreira Saliba, condutora do outro veículo mencionado no boletim de ocorrência que foi ouvida como informante (ID 274260806 - pág. 255/256):

“(...)

Dada a palavra ao (a) procurador (a), do (a) autor(a), respondeu: que sofreu um acidente no seu veículo quanto do abalroamento contra um boi; que possui um veículo Agge da Chevrolet; que estava na estrada na BR 262, sentido Belo Horizonte Juatuba e próximo a Juatuba; que estava atrás de um caminhão aguardando o momento certo de ultrapassá-lo e quando deu a seta para avançar tomou a pista da esquerda e" não viu mais nada" uma vez que houve neste momento a batida com o boi, tendo danificado a frente de seu veículo; que acredita que os fatos ocorreram por volta de 23:45 horas; que não estava chovendo e que antes de entrar na pista da esquerda olhou e não viu o boi, mas apenas carros distantes que estavam vindo em sua direção; que sabe dizer que mais um carro colidiu com o animal, mas não sabe dizer qual; que não sabe dizer ao certo se o trecho do acidente pertence a zona rural, mas acredita que não; que não sabe dizer se havia cerca às margens da rodovia para impedir que animais passassem; qu a no local não há sinalização sobre possibilidade de animais na via; que a via não era iluminada na época dos fatos; que depois do acidente ouviu dizer que naquela via teria havido um outro acidente com animal; que a sinalização da via estava correta e era bem sinalizada. Nada mais.

Dada a palavra ao(a) procurador (a) do (a) autor (a), respondeu: que não sabe dizer ao certo a velocidade que estava no momento do acidente, mas esclarece que estava andando na primeira marcha atrás do caminhão e para ultrapassar passou para a segunda marcha; que não pode dizer qual velocidade se encontrava o segundo veículo que bateu contra o animal, porque quando deu-se por si, já havia batido; que não sabe dizer se algum particular ou policiais tentaram identificar a propriedade do animal; que não chegou perto do animal e não pode informar a existência de marcas identificadoras e distintivas do mesmo. Nada mais”.

O Juízo Sentenciante formou o seu convencimento pela procedência do pedido, como revela o seguinte trecho da fundamentação adotada em sentença (ID 274260818):

“(...)

Da análise dos elementos de prova produzidos nos autos, em especial do boletim de ocorrência e dos depoimentos testemunhais, não remanescem dúvidas acerca da causa imediata do acidente, a saber, colisão do veículo com um animal que circulava indevidamente no meio da rodovia. Sem qualquer prova em contrário produzida nos autos, o obstáculo existente em local inesperado e sem qualquer sinalização ou advertência de perigo de animais provocou o acidente, não existindo qualquer evidência de que não tenha sido empregado, pela vítima, o zelo exigível na condução do veículo.  

Igualmente, com base no cenário fático, não merece prosperar a alegação do Réu de que a culpa seria do autor/condutor que, por não ter tempo para realizar manobra de desvio do animal, estaria trafegando em alta velocidade, uma vez se tratar de mera hipótese argumentativa, pois não há qualquer referência no Boletim de Ocorrência do acidente de trânsito realizado pela Policia Rodoviária Federal de eventual culpa do motorista por violação de regras de trânsito, como excesso de velocidade (eventuais marcas de frenagem brusca) ou uso de bebida alcoólica, nem de deveres de diligência e cuidado na direção do veículo. Não pode pretender o Réu, com base em suposta culpa exclusiva da vítima e sem qualquer demonstração fática do que se alega, esquivar-se de sua responsabilidade.  

Com relação à responsabilidade do dono do animal, prevista no artigo 936 do Código Civil, é certo que a ele incumbia zelar para evitar que o animal escapasse, cercando a sua propriedade. Entretanto, não há identificação do proprietário do animal, não havendo como atribuir-lhe responsabilidade. Isso, porém, não afasta a responsabilidade da Administração Pública, que somente poderia ser afastada se houvesse comprovação de culpa exclusiva de terceiro, o que não ocorreu no caso concreto.

Nesse sentido, colaciono julgado da Egrégia Corte do Tribunal Regional Federal da 3ª Região:

(...)

Portanto, neste cenário fático, e em sintonia com as provas e fundamentos já declinados, resta evidente a negligência do DNIT quanto aos encargos que lhe são impostos pela Lei nº 10.233/2001, em especial os deveres de fiscalização e sinalização de advertência acerca da possibilidade de animais na pista, ademais da ausência de qualquer indício de culpa atribuível ao condutor do veículo acidentado, razão pela qual é cabível a indenização pretendida no presente caso, sob pena de se transferir integralmente à vítima o ônus de suportar acidentes dessa natureza.  

Conclui-se, assim, pelo reconhecimento de responsabilidade civil da autarquia-Ré, porquanto é responsável pela manutenção, conservação, restauração e reposição de vias, terminais e instalações, nos termos do art. 82, I, da Lei n° 10.230/2001, assim como zelar pelas devidas condições de trafegabilidade destas vias, estando aí incluído, naturalmente, o dever de fiscalização e de impedimento de passagem de animais para a rodovia, através de grades de proteção. 

(...)”.

Com efeito, os elementos dos autos são convincentes no sentido de que um veículo deslocou-se para a faixa da esquerda para ultrapassar um caminhão e ali atingiu o animal, que igualmente veio a ser atingido pelo veículo segurado, que também realizava essa ultrapassagem.

As regras de experiência comum permitem afirmar que é bastante crível a tese de que ambos os condutores não tenham avistado o animal, especialmente por se tratar de via não iluminada, o acidente ter ocorrido no período noturno, durante uma ultrapassagem (ao que consta, feita com as devidas cautelas) e, como se sabe, o animal não contar com itens refletores.

Também não vislumbro qualquer elemento que aponte, sequer minimamente, para uma possível culpa concorrente do condutor do veículo segurado.

Diversamente, tudo o quanto visto até aqui indica uma condução segura de sua parte, tendo a causa direta e imediata do acidente sido a inesperada presença de uma vaca na faixa esquerda da via.

Sendo assim, a tese defensiva de que o condutor não teria observado seus deveres de cautela e de que trafegaria em excesso de velocidade, embora relevante, não encontra respaldo em nenhum elemento coligido aos autos.

Tenho por demonstrado, portanto, que o acidente foi causado pela presença de uma vaca na via, atingida por um primeiro veículo e depois pelo automóvel segurado.

Desta forma, demonstrado nos autos que a causa direta e imediata do infortúnio discutido nos autos foi a presença de animal na pista em que trafegava o veículo e que a seguradora autora pagou cobertura securitária em razão deste acidente, sub-rogando-se "nos direitos e ações que competirem ao segurado contra o autor do dano" (art. 786, caput, do Código Civil), de rigor a condenação do DNIT ao pagamento de indenização por dano material correspondente ao valor pago pela autora em razão do sinistro, ressalvado o direito de regresso da requerida em face do dono dos animais envolvidos no acidente, a ser exercido pelas vias próprias.

Dos honorários advocatícios

Majoro os honorários advocatícios devidos pela apelante para 12% sobre o valor atualizado da condenação, com fundamento no art. 85, § 11, do CPC/2015.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e majorar os honorários advocatícios devidos pela apelante para 12% sobre o valor atualizado da condenação.

É como voto.



E M E N T A

DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO. PRESENÇA DE ANIMAL NA VIA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO DNIT. COMPANHIA SEGURADORA. SUB-ROGAÇÃO. 

1. Pretende a companhia seguradora autora ser ressarcida pela autarquia federal ré pelos valores despendidos com cobertura securitária em razão de acidente automobilístico ocorrido em rodovia federal.

2. A responsabilidade civil da autarquia ré se evidencia tanto pela perspectiva subjetiva como, com maior razão, pelo ângulo objetivo, se assim considerada. Isto porque cabe a ela, enquanto responsável pela manutenção, conservação, restauração e reposição de vias, terminais e instalações (art. 82, I, da Lei n° 10.230/2001), zelar pelas devidas condições de trafegabilidade destas vias, aí incluído, naturalmente, o dever de fiscalização quanto a eventuais invasões de pista por coisas semoventes e de sua remoção nestas hipóteses. Precedentes desta Corte.

3. Afastada a alegação defensiva de que tais providências caberiam à Polícia Rodoviária Federal, posto que àquele órgão incumbem as atividades correlatas à fiscalização quanto a infrações de trânsito e de combate à criminalidade, nos termos do art. 1º do Decreto n° 1.655/1995. 

4. A atribuição à Polícia Rodoviária Federal da tarefa de remoção de animais de rodovia federal (art. 1°, III, do Decreto nº 1.655/1995) não afasta a responsabilidade civil do DNIT, uma vez que essa remoção está relacionada ao seu dever de manutenção das condições de trafegabilidade da via. Precedentes desta Corte.

5. Demonstrado nos autos que a causa direta e imediata do infortúnio discutido nos autos foi a presença de animais na pista em que trafegava o veículo e que a seguradora autora pagou cobertura securitária em razão deste acidente, sub-rogando-se "nos direitos e ações que competirem ao segurado contra o autor do dano" (art. 786, caput, do Código Civil), correta a condenação do DNIT ao pagamento de indenização por dano material correspondente ao valor pago pela autora em razão do sinistro, ressalvado o direito de regresso da requerida em face do dono dos animais envolvidos no acidente, a ser exercido pelas vias próprias.

6. Honorários advocatícios devidos pela apelante majorados para 12% sobre o valor atualizado da condenação, com fundamento no art. 85, § 11, do CPC/2015.

7. Apelação não provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação e majorou os honorários advocatícios devidos pela apelante para 12% sobre o valor atualizado da condenação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.