Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000563-83.2011.4.03.6112

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: LUCIMARA DOS SANTOS LOPES, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, UNIÃO FEDERAL, ADALTO LOPES

Advogado do(a) APELANTE: LESLIE CRISTINE MARELLI - SP294380-A
Advogado do(a) APELANTE: VALTER MARELLI - PR38834-A

APELADO: LUCIMARA DOS SANTOS LOPES, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, UNIÃO FEDERAL, ADALTO LOPES

Advogado do(a) APELADO: LESLIE CRISTINE MARELLI - SP294380-A
Advogado do(a) APELADO: VALTER MARELLI - PR38834-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000563-83.2011.4.03.6112

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: LUCIMARA DOS SANTOS LOPES, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, UNIÃO FEDERAL, ADALTO LOPES

Advogado do(a) APELANTE: VALTER MARELLI - SP241316-A
Advogado do(a) APELANTE: LESLIE CRISTINE MARELLI - SP294380-A

APELADO: LUCIMARA DOS SANTOS LOPES, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, UNIÃO FEDERAL, ADALTO LOPES

Advogado do(a) APELADO: VALTER MARELLI - SP241316-A
Advogado do(a) APELADO: LESLIE CRISTINE MARELLI - SP294380-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 JCC

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Apelações interpostas por ADALTO LOPES e por sua mulher LUCIMARA DOS SANTOS LOPES, bem como pelo MINISTERIO PÚBLICO FEDERAL e pela UNIÃO FEDERAL contra sentença por meio da qual foi julgada procedente em parte ação civil pública ajuizada pelo Parquet para o fim de condenar os réus a, verbis (fls. 3 13/318):

 

Julgo procedente em parte a presente ação civil pública, condenando aparte requerida:

1. Ao cumprimento de obrigação de não -fazer, consistente em abster-se de utilizar ou explorar as áreas de várzea e preservação permanente do imóvel localizado na Avenida Erivelton Francisco de Oliveira, antiga Estrada da Balsa, identificado com o número 30-95, no Bairro Beira -Rio, município de Rosana (SP), bem como em abster-se de promover ou permitir a supressão de qualquer tipo de cobertura vegetal do referido imóvel, sem a necessária e indispensável autorização do órgão competente - CBRN ou IBAMA;

2. Ao cumprimento da obrigação de fazer, consistente em demolir todas as construções existentes nas áreas de várzea e preservação permanente inseridas no referido lote, e não previamente autorizadas pelos órgãos ambientais, providenciando, ainda, a retirada de todo o entulho para local aprovado pelo órgão ambiental, no prazo de 30 (trinta) dias; 3. Ao cumprimento da obrigação de fazer consistente em recompor a cobertura florestal da área de preservação permanente do referido lote, no prazo de 06 (seis) meses, pelo plantio racional e tecnicamente orientado de espécies nativas e endêmicas da região, com acompanhamento e tratos culturais, pelo período mínimo de 02 (dois) anos, em conformidade com projeto técnico a ser submetido e aprovado pela CBRJ'T - Coordenadoria de Biodiversidade e Recursos Naturais ou pelo IBAMA, marcando-se prazo para apresentação do projeto junto àqueles órgãos não superior a 30 (trinta) dias; 4. Ao pagamento de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais), multa essa a ser recolhida ao Fundo Federal de Reparação dos Interesses Difusos Lesados, em caráter exclusivo cominatório, em caso de descumprimento total ou parcial da ordem judicial. Indevida condenação em verba honorária. Se na Ação Civil Pública o Ministério Público não paga honorários advocatícios, quando vencido, salvo se agir de má-fé, dentro de absoluta simetria de tratamento e à luz da interpretação sistemática do ordenamento, não pode o "Parquet" beneficiar-se de honorários, quando for vencedor na ação civil pública. Precedentes do C. STJ. Custas na forma da lei.

 

Sustenta Lucimara dos Santos Lopes (fls. 324/338) que:

 a) foi cerceado seu direito de produzir provas (artigo 50, LV, da CF). Não obstante a revelia decorrente da apresentação da contestação fora do prazo, a verdade deve ser perseguida pelo julgador, razão pela qual doutrina e jurisprudência entendem cabível a produção de prova pelo revel;

b) os princípios constitucionais que asseguram meio ambiente equilibrado (art. 225 da CF), propriedade (art. 5º, XXII, CF), moradia (artigos 6° e 7º CF) e lazer (217, § 3º, CF) não se sobrepõem uns aos outros e prevalecem ao artigo 330, I, do CPC;

c) os peritos do DEPRN e do IBAMA não são isentos e a perícia deveria ser acompanhada por assistente técnico;

d) poderia ter sido arguida na fase de instrução que a RESOLUÇAO 369/2004 possibilita a regularização de área urbana consolidada (artigo 9°), consoante as Leis Complementares n°s 20/2007 e 24/2008 do Município de Rosana;

e) poderiam também ser discutidos o § 3º do artigo 19 do Decreto 6514/08, que possibilita que o imóvel não seja demolido quando o desfazimento causar dano ambiental maior, e a Lei n° 6.938/82, que implantou a política nacional de meio ambiente;

f) a ocupação existe há mais de quarenta anos e está em um bairro (Beira -Rio) no perímetro urbano, conforme a citada legislação municipal, o que poderia ser elucidado em audiência pelas testemunhas;

g) a sentença deve ser anulada. Prequestiona os princípios anteriormente mencionados, além do direito ao exercício de qualquer trabalho lícito (art. 50, XII, CF). Se esse não for o entendimento, deve ser declarado que o imóvel não se enquadra no artigo 2° do Código Florestal.

Adauto Lopes apelou às fls. 343/357 com razões idênticas às de sua esposa.

O apelo do Ministério Público Federal está às fls. 401/417. Eis a síntese do seu inconformismo:

a) requereu, na exordial, o pagamento de indenização pelos danos causados ao ambiente, que não foi acolhido por se entender que a restauração é suficiente;

b) devem ser reparados os prejuízos causados ao longo dos anos em decorrência da intervenção antrópica que impediu o restabelecimento da vegetação, ex vi dos artigos 14, § 10, da Lei 6.838/81 e 4°, VII, da Lei n°6938/81;

c) é cabível a cumulação da reparação com a indenização, consoante entendimento do STJ;

d) a prova dos autos é robusta quanto aos estragos ambientais;

e) a responsabilidade pela reparação é objetiva, conforme o artigo 225, § 30, da CF e a Lei n°6.938/81.

Por fim, a União Federal também recorreu (fis. 46 1/466). Pediu a procedência do pedido indenizatório, cujo montante deve ser fixado por perícia em liquidação. Aduziu que não se configura bis in idem com o dever de recompor o ambiente, nos termos da legislação já invocada pelo Parquet e em respeito ao princípio da reparação integral. Prequestionou os artigos 5°, incisos XXII e XXIII, 170, incisos II e III, 225, todos da CF, 2°, "b", da Lei n°4.771/65, 14, 1°, da Lei n°6.938/81 e a Resolução n°302 do CONAMA.

Nas contrarrazões de fis. 418/444, o Ministério Público Federal pede a manutenção da sentença e argumenta que:

a) o feito está fartamente instruído e sobejamente provada a indevida intervenção em área de preservação permanente, de modo que não há que se falar em cerceamento;

b) as contestações foram intempestivas, o que afasta o exame de seu conteúdo sem implicar afronta ao contraditório;

c) o fato de os réus ocuparem o imóvel há mais de vinte anos não legitima a permanência na APP, vale dizer, não se cogita de direito adquirido;

d) desnecessária a demonstração da culpa, porquanto a responsabilidade pelos danos ambientais é objetiva (art. 225, § 3°, CF), de forma que basta a comprovação de sua existência o nexo de causalidade, conforme consta dos autos;

e) a APP no local é de quinhentos metros e é inviável a manutenção da intervenção antrópica;

f) a alegação de que o imóvel está em zona urbana consolidada não afasta a área de preservação permanente, dado que a Carta Magna não a distingue da rural para esse fim;

g) o terreno está sujeito a inundações, o que basta para refutar o argumento dos proprietários de que poderia ser regularizado;

h) não prospera a alegação de que os laudos não são isentos, dado que elaborados por diversos órgãos que não são partes e não têm interesse processual;

i) diferentemente do que afirmam os recorrentes, não há afronta às garantias constitucionais da propriedade, moradia, lazer e trabalho, na medida em que a limitação à intervenção antrópica se ampara na lei e no interesse público de manutenção da flora, fauna e o equilíbrio ecológico. Pede sejam os recursos desprovidos.

A União Federal, nas contrarrazões de fls. 453/458, ressaltou que foi decretada a revelia, todavia o julgador fundamentou a procedência nas provas dos autos produzidas por entes públicos e não havia necessidade de dilação probatória. Não bastasse, não houve demonstração de prejuízo à defesa, indispensável para que fosse reconhecida a nulidade.

Os réus não apresentaram contrarrazões (fl. 477).

Nesta corte, o Ministério Público Federal apresentou o parecer de fis. 484/495 como custos legis, no qual pede o desprovimento do recurso dos réus, o provimento do dos autores e assevera que:

a) preliminarmente, não houve cerceamento, pois o magistrado entendeu desnecessária a produção de mais provas, à vista das já existentes, com base nas quais foi possível formar sua convicção (artigo 436, CPC);

b) os laudos acostados foram elaborados por órgãos públicos imparciais e tecnicamente capacitados, de forma que não há que se falar em falta de isenção;

c) no mérito, a Constituição Federal assegurou o direito ao meio ambiente equilibrado (artigo 225) e previu que os responsáveis por sua degradação podem responder criminal, administrativa e civilmente (§ 3°).

d) a responsabilidade do poluidor é objetiva (artigo 4°, Lei 6938/81);

e) no caso em apreço, a edificação está inteiramente em área de preservação ambiental, nos termos das Resoluções CONAMA 302 e 303, bem como da Lei n° 12.651/12;

f) a exploração indevida da APP viola o princípio da função social da propriedade;

g) segundo a prova pericial, o local em que está a propriedade não caracteriza zona urbana consolidada por não preencher os requisitos da Lei n°11.977/2009 e 65, § 2°, da Lei n° 12.651/12, especialmente por ser sujeito a inundações;

h) os danos ambientais foram constatados pelos experts, de modo que a responsabilidade objetiva decorrente é indeclinável. Assim, a restauração se impõe, inclusive com a demolição das edificações, além do pagamento de indenização pelos prejuízos ao longo do tempo. Em conclusão, opinou fossem providos os recursos do MPF e da União, bem como desprovidos os dos réus. Petição às fls. 499/505 na qual os réus repisam a necessidade de integração do município ao polo passivo da demanda.

Na sessão de julgamento do dia 10/10/2019, a Quarta Turma, à unanimidade, acolheu questão de ordem suscitada pela Des. Fed. Marli Ferreira e deliberou suspender o julgamento do feito até a apreciação pelo STJ do tema repetitivo 1010.

O Ministério Público Federal opôs embargos de declaração (id 12801128), com o objetivo de que fosse esclarecida alegada obscuridade, a fim de que o feito tivesse regular prosseguimento. Na sessão do dia 11/02/21, o recurso foi rejeitado.

Interposto recurso especial pelo Parquet (id 153815579).

Por decisão da Vice-Presidência (id 165079752), foi determinada a restituição do feito a este colegiado, considerado o julgamento realizado pelo STJ sobre o aludido tema 1010. Os autos para lá retornaram, a fim de que fosse resolvido o recurso especial pendente, que foi então declarado prejudicado (id 259508097).  

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000563-83.2011.4.03.6112

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: LUCIMARA DOS SANTOS LOPES, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, UNIÃO FEDERAL, ADALTO LOPES

Advogado do(a) APELANTE: VALTER MARELLI - SP241316-A
Advogado do(a) APELANTE: LESLIE CRISTINE MARELLI - SP294380-A

APELADO: LUCIMARA DOS SANTOS LOPES, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, UNIÃO FEDERAL, ADALTO LOPES

Advogado do(a) APELADO: VALTER MARELLI - SP241316-A
Advogado do(a) APELADO: LESLIE CRISTINE MARELLI - SP294380-A

DECLARAÇÃO DE VOTO

Trata-se de recursos de apelação e reexame necessário, tido por submetido, em Ação Civil Pública, proposta pelo MINISTERIO PUBLICO FEDERAL em face de ADALTO LOPES e LUCIMARA DOS SANTOS LOPES, na qual foi acolhida parcialmente a pretensão para a recuperação de dano ambiental em área de preservação permanente, causada por edificação localizada às margens do Rio Paraná, no bairro Beira Rios, no Município de Rosana/SP.

Na sentença, o r. Juízo a quo reconheceu a faixa protetiva de 500 metros da margem do rio Paraná, uma vez que o imóvel pertencente aos corréus estaria totalmente inserido em área de preservação permanente. Em seus termos (ID Num. 107460811 - Págs. 62):

Conforme bem definido pelo laudo técnico ambiental, o imóvel pertencente aos réus se encontra em Área de Preservação Permanente, situado que se encontra dentro da faixa de 500 metros da margem do rio Paraná.

Segundo o laudo técnico de constatação e avaliação de dano ambiental a área objeto da autuação é considerada de preservação permanente (APP), por se enquadrar no inciso 5, da alínea "a", do artigo 2°, da Lei Federal n° 4771/65 (Código Florestal) e alínea "e", inciso I, do artigo 3º, da Resolução CONANA n° 303/02.

No dispositivo, constam as seguintes determinações:

Julgo procedente em parte a presente ação civil pública, condenando a parte requerida:

1. Ao cumprimento de obrigação de não-fazer, consistente em abster-se de utilizar ou explorar as áreas de várzea e preservação permanente do imóvel localizado na Avenida Erivelton Francisco de Oliveira, antiga Estrada da Balsa, identificado com o n. 30-95, no Bairro Beira-Rio, município de Rosana/SP, bem como em abster-se de promover ou permitir a supressão de qualquer tipo de cobertura vegetal do referido imóvel, sem a necessária e indispensável autorização do órgão competente - CBRN ou IBAMA.

2. Ao cumprimento da obrigação de fazer, consistente em demolir todas as construções existentes nas áreas de várzea e preservação permanente inseridas no referido lote, e não previamente autorizadas pelos órgãos ambientais, providenciando, ainda, a retirada de todo o entulho para local aprovado pelo órgão ambiental, no prazo de 30 dias.

3. Ao cumprimento da obrigação de fazer consistente em recompor a cobertura florestal da área de preservação permanente do referido lote, no prazo de 06 meses, pelo plantio racional e tecnicamente orientado de espécies nativas e endêmicas da região, com acompanhamento e tratos culturais, pelo período mínimo de 02 anos, em conformidade com projeto técnico a ser submetido e aprovado pela CBRN - Coordenadoria de Biodiversidade e Recursos Naturais ou pelo IBAMA, marcando-se prazo para apresentação do projeto junto àqueles órgãos não superior a 30 dias.

4. Ao pagamento de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais), multa essa a ser recolhida ao Fundo Federal de Reparação dos Interesses Difusos Lesados, em caráter exclusivo cominatário, em caso de descumprimento total ou parcial da ordem judicial.

Distribuído os autos ao Exmo. Desembargador Federal André Nabarrete, Sua Excelência ponderou, de início, ser desnecessária a inclusão do Município de Rosana na lide.

Quanto ao mérito, concluiu que “o terreno está inteiramente dentro da área de preservação ambiental, considerada a restrição de 500 metros, segundo a Lei nº 4.771/1965, e que, por outro, não se enquadra como área rural consolidada e não pode vir a ser regularizada, dado que sujeita a inundações, tampouco se verifica, na espécie, qualquer situação passível de exclusão da regra geral, ausente em especial a chamada "exceção da utilidade pública ou interesse social" para se pretender a manutenção da moradia erigida em área de preservação permanente, ainda mais quando não demonstrada a ‘inexistência de alternativa técnica e locacional’ no momento de planejamento da edificação”.

Em razão disso, proferiu o seguinte voto:

Ante o exposto, rejeito a preliminar arguida no apelo dos réus e lhe nego provimento, bem como dou provimento aos recursos do MPF e da União, bem como à remessa oficial, a fim de estabelecer a obrigação ao pagamento de indenização pelo dano ambiental causado, a ser quantificada em liquidação por arbitramento.

Analisando os autos, acompanho a conclusão do eminente Relator de ser desnecessária a inclusão do Município de Rosana neste feito, rejeitando, assim, a referida preliminar. 

Com efeito, o caso em exame trata de danos ambientais causados pelo imóvel dos corréus em suposta área de preservação permanente.

A Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/81) conceitua o poluidor como sendo “a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental” (art. 3º, IV).

Nestes casos, a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que, nas demandas envolvendo dano ambiental, não se faz necessária a formação de litisconsórcio passivo:

PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. USUFRUTUÁRIOS DE IMÓVEL. DEGRADAÇÃO AMBIENTAL. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. INEXISTÊNCIA. AÇÃO RESCISÓRIA. IMPROCEDÊNCIA.

1. O Plenário do STJ decidiu que, "aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça" (Enunciado Administrativo n. 2).

2. É firme nesta Corte Superior a compreensão de que "a responsabilidade por danos ambientais é solidária entre o poluidor direto e o indireto, o que permite que a ação seja ajuizada contra qualquer um deles, sendo facultativo o litisconsórcio. Tal conclusão decorre da análise do inciso IV do art. 3º da Lei 6.938/1981, que considera 'poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental'" (AgInt no AREsp 839.492/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/12/2016, DJe 06/03/2017).

3. Hipótese em que a Corte local acolheu pedido rescisório formulado pela ora agravante para reputar violado o art. 47 do CPC/1973, haja vista a ausência de citação dos usufrutuários de imóvel a cujos proprietários foi imposta obrigação de reparação de degradação ambiental, em ação civil pública, posição que diverge da assentada por este Tribunal.

4. Agravo interno desprovido.

(AgInt no AREsp 1250031/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 28/09/2020, DJe 30/09/2020)

 

PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, OBSCURIDADE, CONTRADIÇÃO OU ERRO MATERIAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA. SÚMULA 7/STJ. SUCESSÃO DE EMPRESAS. REVISÃO DAS PREMISSAS DO ACÓRDÃO. NÃO CABIMENTO. DANO AMBIENTAL. LITISCONSÓRCIO FACULTATIVO.

1. A falta de menção expressa e direta dos dispositivos requeridos pela parte não consiste em violação do conteúdo do art. 535 do CPC/1973 (art. 1.022 do CPC/2015), porquanto o acórdão recorrido fundamentou o seu posicionamento quanto à sucessão processual e sobre a legitimidade da agravante para figurar o polo passivo da lide.

2. O Tribunal a quo firmou como premissa que a empresa solicitou ao juízo a sucessão da empresa que era estabelecida no endereço onde se pretende efetivar a demolição, e, concluindo o acórdão impugnado que a matéria é controvertida, a pretensão recursal que busca infirmar essas premissas esbarra no óbice constante da Súmula 7/STJ.

3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça compreende que, em se tratando "de dano ambiental, mesmo quando presente eventual responsabilidade solidária, não se faz necessária a formação de litisconsórcio" (REsp 1.676.477/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 3/10/2017, DJe 11/10/2017).

4. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt no AREsp 877.793/DF, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/08/2019, DJe 06/09/2019)

No mesmo sentido, esta C. Quarta Turma assim já decidiu:

CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA DA JUSITÇA FEDERAL, LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO E PRESCRIÇÃO REJEITADAS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL CONFIGURADO. OCUPAÇÃO E EDIFICAÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA E PROPTER REM DO POSSUIDOR. FUNÇÃO SÓCIO AMBIENTAL DA PROPRIEDADE. REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. CONDENAÇÃO EM INDENIZAÇÃO PELO DANO CAUSAUDO.

(...)

- A responsabilidade entre poluidores em matéria ambiental é solidária, podendo a ação ser ajuizada contra qualquer deles, não sendo o caso de se reconhecer o litisconsórcio passivo necessário.

(...)

(Ap 0003205-63.2010.4.03.6112, Rel. Desembargadora Federal Mônica Nobre, julgado em 18/04/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/05/2018)

De minha relatoria, cito a Ap 0003995-42.2013.4.03.6112, julgado em 01/08/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:12/09/2018.

Quanto ao mérito, também acompanho o Exmo. Relator no sentido de concluir e que o imóvel discutido se encontra a menos de 500 metros do leito do rio Paraná, em área de preservação permanente, na faixa marginal do curso d'água, violando a previsão do art. 2º da Lei nº 4.771/65.

Com relação aos recursos do MPF e da União, contudo, ouso divergir quanto ao pagamento de indenização por danos ambientais.

A Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/81) estabelece que a indenização pode ser mera alternativa quando não for possível a recuperação ambiental:

Art. 4º - A Política Nacional do Meio Ambiente visará:

(...)

VII - à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados, e ao usuário, de contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos.

No Relatório Técnico Ambiental elaborado pelo Superintendência do Estado de São Paulo do IBAMA, ao responder o quesito a respeito da recuperação ambiental na região, os técnicos responsáveis assim aduziram (ID Num. 107460328 - Pág. 24):

n) O que pode ser feito para recompor a APP?

- Através de um programa de reflorestamento para recomposição da Mata Ciliar original, medida essa visando o princípio da conservação ambiental local, sobretudo no controle eficaz de atividades a serem possivelmente exercidas na referida área;

- Esse reflorestamento tende a recompor os ecossistemas da Mata Ciliar, favorecer a dispersão das espécies da flora local e regional, suprir de alimentos e nutrientes as cadeias alimentares dos ecossistemas terrestres e aquáticos locais, proporcionar condições biológicas a fauna local, controlar os processos erosivos visando a proteção do reservatório, regularizar os fluxos hídricos para o lençol freático, conservar e melhorar a qualidade da água, pela retenção de agentes contaminantes e de sedimentos que podem ser carreados ao curso d' água e valorizar a beleza cônica local e regional.

Assim, como existem provas de que a demolição das construções e o reflorestamento seriam suficientes para reparar o dano ambiental, entendo que se mostra desarrazoada a condenação do recorrido ao pagamento de indenização em dinheiro.

Nesse sentido, o E. Superior Tribunal de Justiça já decidiu que, demostrada a possibilidade de reparação plena da área degradada através da obrigação de fazer e de não fazer, é incabível a reparação indireta:

PROCESSO CIVIL. AMBIENTAL AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. POSSIBILIDADE DE REPARAÇÃO TOTAL DA ÁREA DEGRADADA. PEDIDO INDENIZATÓRIO INDEFERIDO. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.

1. Tratando-se de casos de danos ambientais, é perfeitamente possível a cumulação de indenização em conjunto com obrigação de fazer, entretanto isso não é obrigatório, e está adstrito à possibilidade ou não de recuperação total da área degradada.

2. No caso, conclusão diversa da apresentada pela Corte de origem, a respeito do dever de indenizar o dano ambiental, demanda o reexame do contexto fático-probatória dos autos, o que encontra óbice na Súmula 7 do STJ.

3. Agravo interno não provido.

(AgInt no REsp 1.581.257/SC, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 07/02/2019, DJe 12/02/2019)

 

PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. INDENIZAÇÃO PECUNIÁRIA CUMULADA COM OBRIGAÇÃO DE FAZER. EFETIVA REPARAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA. SÚMULA 7/STJ.

1. Em ação civil pública ambiental, é admitida a possibilidade de condenação do réu à obrigação de fazer ou não fazer cumulada com a de indenizar. Tal orientação fundamenta-se na eventual possibilidade de que a restauração in natura não se mostre suficiente à recomposição integral do dano causado.

2. No entanto, na hipótese dos autos, impossível alterar o entendimento do Tribunal a quo, uma vez que lastreado em prova produzida. Óbice da Súmula 7/STJ.

Agravo não conhecido.

(AgRg no REsp 1.486.195/SC, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 03/03/2016, DJe 11/03/2016)

Quanto à condenação ao pagamento de multa cominatória diária de R$ 500,00 (quinhentos reais), em princípio, tenho que não se mostra cabível em demandas como a presente, uma vez que não há notícia nos autos de resistência fática da parte ré acerca das obrigações impostas na r. sentença.

Contudo, verifico que os corréus não impugnaram especificamente este ponto em seu recurso, razão pela qual não existe via processual apta para a modificação do quanto decidido, sob pena de reformatio in pejus.

Ante o exposto, rejeito a preliminar e nego provimento aos recursos de apelação e ao reexame necessário, tido por submetido.

É como voto.

MARCELO SARAIVA

Desembargador Federal

 


 

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000563-83.2011.4.03.6112

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: LUCIMARA DOS SANTOS LOPES, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, UNIÃO FEDERAL, ADALTO LOPES

Advogado do(a) APELANTE: VALTER MARELLI - SP241316-A
Advogado do(a) APELANTE: LESLIE CRISTINE MARELLI - SP294380-A

APELADO: LUCIMARA DOS SANTOS LOPES, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, UNIÃO FEDERAL, ADALTO LOPES

Advogado do(a) APELADO: VALTER MARELLI - SP241316-A
Advogado do(a) APELADO: LESLIE CRISTINE MARELLI - SP294380-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

Apelações interpostas por ADALTO LOPES e por sua, mulher LUCIMARA DOS SANTOS LOPES, bem como pelo MINISTERIO PUBLICO FEDERAL e pela UNIAO FEDERAL contra sentença por meio da qual foi julgada procedente em parte ação civil pública ambiental ajuizada pelo Parquet.

 

I. DO RESP 1770760/SC

 

Em 10/05/2021, foi publicado o acórdão proferido pelo STJ no REsp 1770760/SC (Tema 1010), em cuja afetação ao regime dos recursos repetitivos houve determinação de suspensão nacional dos processos pendentes. Assim, não há mais óbice ao prosseguimento deste julgamento. O exame da aplicabilidade da tese assentada por aquela corte superior será a seguir examinada.

 

II. DO REEXAME NECESSÁRIO

 O decisum deve ser submetido ao reexame necessário, à semelhança do que se verifica no manejo da ação popular, aplicada por analogia a Lei n° 4.717/65, em razão da interpretação sistemática e teleológica do microssistema de tutela dos interesses coletivos e difusos, nos termos de seu artigo 19, verbis:

"Art. 19. A sentença que concluir pela carência ou improcedência da ação está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal; da que julgar a ação procedente, caberá apelação, com efeito suspensivo ' (Redação dada pela Lei n°6.014/73).

 Nesse sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

"PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PUBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. REEXAME NECESSÁRIO. CABIMENTO. APLICAÇÃO, POR AI'IALOGIA, DO ART. 19 DA LEI 4.717/1965. 1. "Por aplicação analógica da primeira parte do art. 19 da Lei n° 4.717/65, as sentenças de improcedência de ação civil pública sujeitam-se indistintamente ao reexame necessário" (REsp 1.108.542/SC, Rel. Ministro Castro Meira, j. 19.5.2009, Dje 29.5.2009). 2. Agravo Regimental não provido." (STJ, AGREsp 1219033/RJ, ReI. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, v.u., DJe 25/04/2011).

In casu, verifica-se não ter sido contemplada a integralidade dos pedidos formulados em sede do exórdio, porquanto também requereu o Parquet Federal que fossem os réus condenados a pagar indenização pelo dano ambiental. Assim, sob o referido aspecto, far-se-á o reexame necessário da sentença.

 

III. DOS FATOS E DO PROCESSAMENTO

 Narrou o Ministério Público Federal na inicial que, no dia 10/07/2006, foram formalizados auto de infração (fl. 37) e boletim de ocorrência ambiental (fls. 39/40) pela Polícia Ambiental do Estado de São Paulo por ter sido constatada a violação à legislação ambiental, consistente na utilização de área de preservação permanente de 425 m2, que pertence a ADALTO LOPES E LUCIMARA DOS SANTOS LOPES e em que há edificação irregular, fossa séptica, poço semi-artesiano e impermeabilização total do terreno, que, ademais, está inteiramente cercada por muros, situada no Bairro Beira-Rio, Avenida Erivelton Francisco de Oliveira, antiga Estrada da Balsa, Município de Rosana, coordenadas E0.294.283, N 7.507.955m, à margem do Rio Paraná.

O feito foi instruído com procedimento preparatório (n° 270/2010) do Ministério Público Federal. A par dos autos de infração e do boletim de ocorrência, constam laudo técnico de constatação e avaliação de dano ambiental elaborado pelo DEPRN (fls. 46/51), termo de depoimento do réu Adalto Lopes (fls. 55/56), no qual afirmou ser proprietário desde 1988 e juntou o contrato de posse fls. 57/58, auto de constatação feito pelo assistente técnico do Ministério Público do Estado de São Paulo (fls. 75/80) sobre a grande inundação que assolou a região em 2009, outro depoimento de Adauto Lopes (fl. 85), dessa vez na Delegacia de Polícia em Rosana, laudo do Instituto de Criminalística (fls. 89/95) e de avaliação do dano ambiental realizado pelo DEPRN (fls. 97/102), ofícios da Polícia Militar do Estado de São Paulo (fls. 106/1 19) e da Elektro (fls. 126/128) com relato das enchentes em 2009/2010.

Foi indeferida liminar (fls. 136/138) para impedir novas obras e paralisar as eventualmente existentes, cessar qualquer supressão da cobertura vegetal e não conceder a utilização da área a terceiros, sob pena de multa diária de RS 500,00. Determinada também manifestação da União e do IBAMA sobre se tinham interesse na lide.

Às fls. 170/172, a União requereu o ingresso no polo ativo da demanda como assistente litisconsorcial, o que foi deferido à fl. 173.

 O IBAMA, não obstante duas vezes intimado a se manifestar, limitou-se a requerer: "o prosseguimento do feito, até ulterior e eventual pedido de ingresso na lide" (fl. 202), o que não ocorreu posteriormente.

Às fls. 182/196, foi juntado o relatório técnico ambiental feito pelo IBAMA.

Citados, a ré Lucimara dos Santos Lopes requereu o chamamento ao processo do Município de Rosana (fls. 218/224) e contestou às fls. 248/266, bem como Adalto Lopes às fls. 225/245.

O magistrado a quo reconheceu a intempestividade de ambas defesas e indeferiu o pedido de chamamento ao processo (fl. 275). Intimados (fl. 275), não houve irresignação.

À fl. 292, o MPF requereu a juntada de laudo pericial da Polícia Federal n°3871/2011 (fls. 293/309), o que foi deferido. Sobreveio a sentença de fls. 313/318, que julgou procedente em parte a ação, nos termos anteriormente relatados, contra a qual foram interpostos os recursos dos réus e dos autores, ora examinados.

 

IV. DA INTERVENÇÃO DO MUNICÍPIO DE ROSANA

A ré suscitou o chamamento ao processo do Município de Rosana, como visto anteriormente, o que foi indeferido e não foi objeto de recurso. A questão, portanto, já está superada pela preclusão. Ainda que assim não fosse, cumpre ressaltar a desnecessidade de sua integração à demanda, a propósito da existência de um precedente desta Turma (n° 2011.61.12.006911 -7/SP).

Não participei do julgamento do aludido caso, os integrantes da 4ª Turma têm entendimentos dissonantes a respeito e a situação daquela área deu origem a inúmeros processos semelhantes ainda pendentes, de modo consigno minha compreensão sobre a questão.

Naquele julgado, a Turma, à luz do primado da dignidade humana, dos artigos 47 do CPC e 182 da CF, determinou: "necessária intervenção do Município de Rosana, anulo o feito a partir da citação, determinando sua inclusão no feito para se pronunciar sobre seu interesse na lide", de modo que declarou prejudicados os recursos, porque, verbis:

 "é certo que a área em que localiza há décadas o imóvel do réu, ora apelante, é urbana, não havia cobertura florestal na área, e a Prefeitura Municipal de Teodoro Sampaio, à qual pertencia o atual Município de Rosana, abriu a estrada do Pontal, sendo certo que a Prefeitura de Rosana por meio da Lei Municipal Complementar n 24/2008, considerou o bairro Beira -Rio como perímetro urbano (cf doc. de fis. 125/12 7). Nesse local, a área segundo consta teria sido aterrada e drenada, surgindo então o bairro, no ano de 1960, tendo o imóvel sido construído em 1990 e desde 2008 a área é considerada legalmente urbana, dispondo de malha viária com canalização de águas pluviais; rede de abastecimento de água; distribuição de energia elétrica e iluminação pública; serviço de recolhimento de lixo. Somente o Município detém competência para dizer se "em tese" a supressão de APP envolveria interesse social, nos termos da resolução n°369, de 28 de março de 2006."

Primeiramente, destaco que o acórdão não explicita em que polo da demanda haveria a "integração" do município tampouco se como litisconsorte, interessado etc. De qualquer modo, à luz do pedido da presente ação civil pública, nota-se a impropriedade do referido termo adotado na determinação, pois a pretensão de modo algum o atinge, dado que o imóvel é do particular e a responsabilização a ele está limitada. Na verdade, como visto, ao final constou que seria para pronunciar sobre seu interesse na lide. Ora, para esse fim, obviamente que não haveria necessidade de anular o processo, bastaria, eventualmente, converter o julgamento em diligência.

Ainda que se entenda processualmente cabível a "integração" do Município de Rosana, destaco o que consta do Laudo n° 3871/2011 da Polícia Federal (fl. 296):

O parcelamento caracteriza-se pelos seguintes equipamentos públicos e/ou infraestrutura particular:

- ausência de malha viária com canalização de águas;

- ausência de redes de esgotos. Em boa parte dos lotes o descarte é direto no rio Paraná. Em alguns casos são utilizados fossas sépticas ou negras;

- presença de energia elétrica (rede de distribuição, com iluminação pública);

- recolhimento e tratamento de resíduos sólidos urbanos - foi observada a coleta, mas não foi avaliado se o município realizada tratamento dos resíduos;

- rede telefônica - não observada;

- delimitação individual das parcelas (cercas de arame, cercas -vivas ou outros)

A Lei Complementar n° 24/2008 do Município de Rosana, invocada no precedente em comento, estabeleceu unicamente que "fica criada uma expansão urbana do Distrito -sede de Rosana, por força desta lei municipal, em razão de necessidade de regularização da área denominada Beira Rio e que se insere dentro das seguintes medidas (...)." Evidencia-se que não caracteriza a chamada "área urbana consolidada" prevista na Resolução CONAMA 303/2002, vigente à época da lavratura do auto de infração ambiental, tampouco do conceito posteriormente estabelecido pela Lei nº 11.977/2009:

 "Art. 47. Para efeitos da regularização fundiária de assentamentos urbanos, consideram-se:

I (...)

II - área urbana consolidada: parcela da área urbana com densidade demográfica superior a 50 (cinquenta) habitantes por hectare e malha viária implantada e que tenha, no mínimo, 2 (dois) dos seguintes equipamentos de infraestrutura urbana implantados: a) drenagem de águas pluviais urbanas; b) esgotamento sanitário; c) abastecimento de água potável; d) distribuição de energia elétrica; ou e) limpeza urbana, roleta e manejo de resíduos sólidos; (...)

 

O dispositivo transcrito foi revogado pela Lei nº 13.465/2017, que estabeleceu a seguinte definição:

Art. 11. Para fins desta Lei, consideram-se:

I e II - omissis

III - núcleo urbano informal consolidado: aquele de difícil reversão, considerados o tempo da ocupação, a natureza das edificações, a localização das vias de circulação e a presença de equipamentos públicos, entre outras circunstâncias a serem avaliadas pelo Município;

(...)

§ 2º Constatada a existência de núcleo urbano informal situado, total ou parcialmente, em área de preservação permanente ou em área de unidade de conservação de uso sustentável ou de proteção de mananciais definidas pela União, Estados ou Municípios, a Reurb observará, também, o disposto nos arts. 64 65 da Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012 , hipótese na qual se torna obrigatória a elaboração de estudos técnicos, no âmbito da Reurb, que justifiquem as melhorias ambientais em relação à situação de ocupação informal anterior, inclusive por meio de compensações ambientais, quando for o caso.

Por sua vez, os artigos 64 e 65 do Código Florestal mencionado nessa regra dispõe que:

Art. 64. Na Reurb-S dos núcleos urbanos informais que ocupam Áreas de Preservação Permanente, a regularização fundiária será admitida por meio da aprovação do projeto de regularização fundiária, na forma da lei específica de regularização fundiária urbana. (Redação dada pela Lei nº 13.465, de 2017)

(...)

 Art. 65. Na Reurb-E dos núcleos urbanos informais que ocupam Áreas de Preservação Permanente não identificadas como áreas de risco, a regularização fundiária será admitida por meio da aprovação do projeto de regularização fundiária, na forma da lei específica de regularização fundiária urbana. (Redação dada pela Lei nº 13.465, de 2017)

 

No caso dos autos, a densidade demográfica do Bairro Beira-Rio é de 0,27 habitantes/ha, muito abaixo, portanto, da previsão legal tanto da Resolução CONAMA 303/2002 quanto da Lei nº 11.977/2009 para a caracterização do imóvel como urbano consolidado. Outrossim, para que o bairro fosse enquadrado como área urbana informal consolidada, ex vi da Lei nº 13465/2017, somente após eventual aprovação da regularização fundiária pelo órgão ambiental competente seria possível reduzir a APP do local, conforme dispõe o artigo 64 do Código Florestal vigente. Todavia, não há notícia, até o momento, de que a Prefeitura do Município de Rosana tenha realizado a regularização fundiária, nos moldes dessa regra. Aliás, dado que há expressa previsão no artigo 65 de que o procedimento não pode ser levado a efeito em áreas de risco, o imóvel em questão não pode por ele ser abrangido, porquanto sujeito a inundações sazonais, conforme fartamente documentado no anexo e relatado pelo Corpo de Bombeiros também no anexo. 

Evidencia-se que não caracteriza a chamada "área urbana consolidada" prevista na Resolução CONAMA 303/2002, que, ademais, sequer poderia ser reconhecida, dado que a área não preenche os requisitos legais relativos à densidade demográfica mínima e existência de infraestrutura urbana.

Por outro lado, o julgado também alude a que somente o município poderia definir a existência de interesse social na região. No entanto, a Lei n° 4.771/1965, em regra mantida pelo atual Código de 2012, disciplina não serem possíveis intervenções em áreas de preservação permanente - urbanas ou rurais - tampouco a manutenção de edificações, salvo nas taxativas exceções atreladas essencialmente às hipóteses de utilidade pública e interesse social:

Lei n°4.771/1965

"Art. 1". (..)

§ 2". Para os efeitos deste Código, entende-se por: (...)

IV- utilidade pública:

a) as atividades de segurança nacional e proteção sanitário;

 b) as obras essenciais de infraestrutura destinadas aos serviços públicos de transporte, saneamento e energia e aos serviços de telecomunicações e de radiodifusão;

c) demais obras, planos, atividades ou projetos previstos em resolução do Conselho Nacional de Meio Ambiente - CONAMA;

V - interesse social:

a) as atividades imprescindíveis à proteção da integridade da vegetação nativa, tais como: prevenção, combate e controle do fogo, controle da erosão, erradicação de invasoras e proteção de plantios com espécies nativas, conforme resolução do CONAMA; (Incluído pela Medida Provisória n°2.166-67, de 2001)

b) as atividades de manejo agroflorestal sustentável praticadas na pequena propriedade ou posse rural familiar, que não descaracterizem a cobertura vegetal e não prejudiquem a função ambiental da área; e(Incluído pela Medida Provisória n"2.166-67, de 2001)

c) demais obras, planos, atividades ou projetos definidos em resolução do CONAMA; (Incluído pela Medida Provisória n°2.166-67, de 2001)"

"Art. 3°. Consideram-se, ainda, de preservação permanentes, quando assim declaradas por ato do Poder Público, as florestas e demais formas de vegetação natural destinadas: (...)

§ 1. A supressão total ou parcial de florestas de preservação permanente só será admitida com prévia autorização do Poder Executivo Federal, quando for necessária à execução de obras, planos, atividades ou projetos de utilidade pública ou interesse social."

"Art. 4°. A supressão de vegetação em área de preservação permanente somente poderá ser autorizada em caso de utilidade pública ou de interesse social, devidamente caracterizados e motivados em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto. (Redação dada pela Medida Provisória n°2.166-67, de 2001)

§ 1°. A supressão de que trata o caput deste artigo dependerá de autorização do órgão ambiental estadual competente, com anuência prévia, quando couber, do órgão federal ou municipal de meio ambiente, ressalvado o disposto no § 2º deste artigo. (Incluído pela Medida Provisória n°2.166-6 7, de 2001)

§ 2°. A supressão de vegetação em área de preservação permanente situada em área urbana, dependerá de autorização do órgão ambiental competente, desde que o município possua conselho de meio ambiente, com caráter deliberativo e plano diretor, mediante anuência prévia do órgão ambiental estadual competente fundamentada em parecer técnico. (Incluído pela Medida Provisória n°2.166-67, de 2001)

§ 3°. O órgão ambiental competente poderá autorizar a supressão eventual e de baixo impacto ambiental, assim definido em regulamento, da vegetação em área de preservação permanente. (Incluído pela Medida Provisória n°2.166-67, de 2001)

§ 4º O órgão ambiental competente indicará, previamente à emissão da autorização para a supressão de vegetação em área de preservação permanente, as medidas mitigadoras e compensatórias que deverão ser adotadas pelo empreendedor. (Incluído pela Medida Provisória n°2.166- 67, de 2001). ( )"

Lei n°12.651/2012

"Art. 3°. Para os efeitos desta Lei, entende-se por: (..)

VIII - utilidade pública:

a) as atividades de segurança nacional e proteção sanitária;

b) as obras de infraestrutura destinadas às concessões e aos serviços públicos de transporte, sistema viário, inclusive aquele necessário aos parcelamentos de solo urbano aprovados pelos Municípios, saneamento, gestão de resíduos, energia, telecomunicações, radiodifusão, instalações necessárias à realização de competições esportivas estaduais, nacionais ou internacionais, bem como mineração, exceto, neste último caso, a extração de areia, argila, saibro e cascalho;

c) atividades e obras de defesa civil;

d) atividades que comprovadamente proporcionem melhorias na proteção das funções ambientais referidas no inciso II deste artigo;

e) outras atividades similares devidamente caracterizadas e motivadas em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto, definidas em ato do Chefe do Poder Executivo federal;

 IX - interesse social:

a) as atividades imprescindíveis à proteção da integridade da vegetação nativa, tais como prevenção, combate e controle do fogo, controle da erosão, erradicação de invasoras e proteção de plantios com espécies nativas;

b) a exploração agroflorestal sustentável praticada na pequena propriedade ou posse rural familiar ou por povos e comunidades tradicionais, desde que não descaracterize a cobertura vegetal existente e não prejudique a função ambiental da área;

c) a implantação de infraestrutura pública destinada a esportes, lazer e atividades educacionais e culturais ao ar livre em áreas urbanas e rurais consolidadas, observadas as condições estabelecidas nesta Lei;

d) a regularização fundiária de assentamentos humanos ocupados predominantemente por população de baixa renda em áreas urbanas consolidadas, observadas as condições estabelecidas na Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009;

e) implantação de instalações necessárias à captação e condução de água e de efluentes tratados para projetos cujos recursos hídricos são partes integrantes e essenciais da atividade;

f) as atividades de pesquisa e extração de areia, argila, saibro e cascalho, outorgadas pela autoridade competente;

g) outras atividades similares devidamente caracterizadas e motivadas em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional à atividade proposta, definidas em ato do Cheft  do Poder Executivo federal; (...)"

"Art. 7°. A vegetação situada em Area de Preservação Permanente deverá ser mantida pelo proprietário da área, possuidor ou ocupante a qualquer título, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado."

"Art. 8". A intervenção ou a supressão de vegetação nativa em Área de Preservação Permanente somente ocorrerá nas hipóteses de utilidade pública, de interesse social ou de baixo impacto ambiental previstas nesta Lei. (...)

§ 2". A intervenção ou a supressão de vegetação nativa em Área de Preservação Permanente de que tratam os incisos VI e VII do caput do art. 4° poderá ser autorizada, excepcionalmente, em locais onde a função ecológica do manguezal esteja comprometida, para execução de obras habitacionais e de urbanização, inseridas em projetos de regularização fundiária de interesse social, em áreas urbanas consolidadas ocupadas por população de baixa renda. (...)

§ 4" Não haverá, em qualquer hipótese, direito à regularização de futuras intervenções ou supressões de vegetação nativa, além das previstas nesta Lei." (destaques aditados)

Por configurarem rol taxativo, as normas excepcionais devem ser interpretadas de modo restritivo. Ora, a situação descrita pelos peritos, in casu, não se amolda às hipóteses legais, de forma que não há interesse em chamar o município para lide, a fim de deliberar se há interesse social, que, repita-se, até o momento não foi reconhecido pelo ente municipal.

Não bastasse, verifica-se que a Resolução CONAMA nº 369, que dispõe sobre os casos excepcionais de utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental, que possibilitem a intervenção ou supressão de vegetação em APP, também referida na fundamentação do precedente relatado pela Des. Fed. Marli Ferreira, no § 2° do seu artigo 9° veda a regularização de áreas consideradas de risco de inundações:

Art. 9º A intervenção ou supressão de vegetação em APP para a regularização fundiária sustentável de área urbana poderá ser autorizada pelo órgão ambiental competente, observado o disposto na Seção 1 desta Resolução, além dos seguintes requisitos e condições:

§ 2º E vedada a regularização de ocupações que, no Plano de Regularização Fundiária Sustentável, sejam identificadas como localizadas em áreas consideradas de risco de inundações, corrida de lama e de movimentos de massa rochosa e outras definidas como de risco.

Está fartamente demonstrado nos autos (ofícios de fls. 106/119 e 126/128) e foi ratificado pelo IBAMA (fl. 186) que a área é de alto risco de inundações sazonais. Destaco, por oportuno, recente jurisprudência desta corte em caso idêntico:

DIREITO AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. APELAÇÃO CIVEL. REMESSA NECESSÁRIA. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERM4NENTE. DANO AMBIENTAL. PRODUÇÃO DE NOVA PROVA. IN CASU, DESNECESSÁRIA. LA UDOS PERICIAIS EXPEDIDIOS POR TÉCNICOS E ÓRGÃOS COM COMPETÊNCIA LEGAL PARA ANALISAR, DISPOR E OPINAR SOBRE MEIO AMBIENTE. DEVER DE REPARAÇÃO INTEGRAL. EXISTÊNCIA DE CAUSAS EXCLUDENTES DE ILICITUDE. IRRELEVANTE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. OBRIGAÇÃO PROPTER REM REGULARIZÁÇÃO FUNDIÁRIA NÃO COMPROVADA. ÁREA SUJEITA A INUNDAÇÃO. FIXAÇÃO DA ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE EM 500 METROS. RECUPERAÇÃO DA ÁREA AMBIENTAL COM A DEMOLIÇÃO E A REMOÇÃO DE EDIFICAÇÕES. OBRIGATORIEDADE. RECUPERÇÃO DA ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. POSSIBILIDADE. CUMULAÇÃO DO DEVER DE INDENIZAR COM OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER. POSSIBILIDADE. MAJORÁÇÃO DO VALOR INDENIZA TÓRIO E DA MULTA DIÁRIA. DESNECESSÁRIA DIANTE DA POSSIBILIDADE DE REGENERAÇÃO DO MEIO AMBIENTE. JURISPRUDÊNCIA DO C. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DESTA E. CORTE REGIONAL. SENTENÇA MANTIDA, EM PARTE. 1. Sentença submetida à remessa oficial, consoante a jurisprudência assente do C. Superior Tribunal de Justiça e deste E. Tribunal Regional Federal, aplicando-se por analogia a Lei n' 4.717, de 1965, a qual prevê, em seu art. 19, que "a sentença que concluir pela carência ou pela improcedência da ação está sujeira ao duplo grau de jurisdição"; 2. Cinge-se a controvérsia em apurar se o imóvel em questão está edificado sobre Area de Preservação Permanente (APP) localizada às margens do rio Paraná, no bairro Beira -Rio, município de Rosana/SP, com área de abrangência de 500 (quinhentos) ou de 15 (quinze) metros conforme fixado na r. sentença que considerou o local como área urbana consolidada, bem como as possíveis medidas a serem determinadas, em face do reconhecimento de transgressão ambiental; 3. Desnecessária a produção de nova prova pericial, uma vez que os laudos, relatórios e informações técnicas constantes do Procedimento Preparatório, em apenso, foram expedidos por técnicos de órgãos com competência legal para fazê-lo, podendo analisar, dispor e opinar sobre questões relacionadas ao meio ambiente, e dispõem, explicitamente, sobre a efetiva ocorrência do dano, a extensão da área de APP a ser considerada e a possibilidade e forma de restauração da área danificada; 4. Em contrarrazões, os réus não negaram a ocorrência de dano ambiental, apenas afirmam que a APP, naquele local, não deve ser de500 (quinhentos) e sim de 15 (quinze) metros, conforme fixado na r. sentença e nos termos estabelecidos no §2° do art. 65 do Código Florestal, ou seja, como área urbana consolidada, nos moldes do disposto no inciso Ido art. 47 da Lei n°11.977, de 2009; 5. Os laudos, relatórios e informações técnicas constantes do Procedimento Preparatório, em apenso, afirmam que, em razão da largura do rio Paraná ser superior a 600 metros, no trecho relativo à edificação em análise, a Área de Preservação Permanente a ser considerada é de 500 (quinhentos) metros; 6. Em que pese o novo Código Florestal, em seu art. 65, admitir a regularização ambiental dos assentamentos inseridos em área urbana consolidada e que ocupam Area de Preservação Permanente, não sujeitas a alagamentos e inundações, ele também determina que o processo de declaração de área urbana consolidada passa, necessariamente, pelo projeto de regularização fundiária, submetido pelo Poder Público aos órgãos ambientais competentes. A Lei Municipal Complementar que declara o bairro Beira -Rio área urbana, não supre o processo de regularização fundiário, portanto, não pode ser aplicado, à espécie, o art. 65 do Código Florestal. 7. Sendo assim, na ausência de prova da regularização fundiário e por se tratar de área sujeita a inundações, a APP a ser considerada é de 500(quinhentos) metros, conforme estabelece o art. 40, J, "e da Lei n°12.651/2012, e o art. 30, J, "e", da Resolução CONAM4 n°303, de 2012;

8. Os laudos, relatórios e informações técnicas constantes do Procedimento Preparatório, em apenso «fls. 72; 130/131; e 155v, 'i") afirmam que os danos causados pelos réus à APP são plenamente recuperáveis, mas que para isso rodas as edificações existentes no local deverão ser demolidas e o entulho resultante devidamente retirado. Além disso, deverá ser apresentado à autoridade ambiental competente um Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD) para aprovação e fiscalização de sua execução, o que se acompanhará por ocasião da fase de cumprimento de sentença.

9. Conforme jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça, em ação civil pública ambiental admite-se a possibilidade de condenação do réu à obrigação de fazer ou não fazer cumulada com a de indenizar. Tal orientação fundamenta-se na eventual possibilidade de que a restauração in natura não se mostre suficiente à recomposição integral dos danos causado por todos (AgRg no R.Esp 1486195/SC, rei. Mio. Humberto Morrias, segunda turma, DJe de 11/03/2016);

10. E certo que as determinações registradas no dispositivo do r. sentença recorrida acolheram integralmente as recomendações apontadas nos laudos. Assim, o deslinde da causa acena para a total regeneração do local, arcando os réus com todas as despesas dela decorrentes - o que se acompanhará por ocasião da fase de cumprimento de sentença. Diante disso e considerando as condições financeiras dos réus dispensável a majoração do valor da condenação no dever de indenizar e da multa diária fixadas na r. sentença;

11. Decisão em consonância com a jurisprudência das egrégias Terceira e Sexta Turma deste Tribunal sobre a matéria. 12. Dá-se parcial provimento ao reexame necessário e às apelações. (Ap - APELA ÇAO CIVEL - 1916777; Sexta Turma; Rei. Des. Fed. Diva Malerbi; j. em 01/02/2018)

DIREITO AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇAO CIVIL PÚBLICA. REMESSA OFICIAL, TIDA POR INTERPOSTA. ART 475, 1, DO CPC/1973 C/C ART. 19 DA LEI N. 7.347/1 985. INQUÉRITO CIVIL PÚBLICO. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE (APP). RIO PARANÁ. MUNICIPIO DE ROSANA. PROVA PERICIAL NÃO REALIZADA. DESNECESSIDADE. DANO AMBIENTAL. EXTENSÃO. 500 (QUINHENTOS) METROS. EDIFICAÇÃO. DEMOLIÇÃO. RECOMPOSIÇÃO DA COBERTURA VEGETAL. HONORÁRIOS ADVOCA TICIOS INCABIVEIS.

1. Reconhecida a submissão da r. sentença à remessa oficial, conforme o disposto no art. 475, I, do CPC/1973 c/c art. 19 da Lei ° 7.347/1 985.

2. Estando comprovado nos autos, conforme o Laudo de Perícia Criminal Federal 03.871/2011, o fato deque o lote em questão está em Área de Preservação Permanente (APP), cujo parcelamento do solo foi realizado deforma irregular e clandestina, com risco de inundação, a discussão acerca do caráter urbano ou rural da área e sua eventual sujeição às leis municipais de uso e ocupação do solo torna-se despicienda, mesmo porque o parágrafo único do art. 2" da Lei n."4.771/1965 é claro ao dispor que no caso de áreas urbanas (...) observar-se-á o disposto nos respectivos planos diretores e leis de uso do solo, respeitados os princípios e limites a que se refere este artigo. 3. Portanto, a faixa a ser considerada, in casu, deve ser a de 500(quinhentos) metros do leito do Rio Paraná, na forma da legislação ambiental e não a de 15 (quinze) metros de cada lado, conforme prevista no § 2°do art. 65 da Lei n. "12.651/2012. (AC n" 00011 75-50.2013.4.03.6112; Sexta Turma; Rel. Des. Fed. Consuelo Yoshida; j. em 30/11/2017)

DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PUBLICA. DANOAMBIENTAL. EDIFICAÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃOPERMANENTE. RETIRADA DAS EDIFICAÇÕES EXISTENTES NA FAIXA PROTETIVA. INDENIZAÇÃO. CABIMENTO. 1. Trata-se de ação civil pública em que se busca a reparação do dano ambiental causado em área de preservação permanente (APP), às margens do Rio Paraná, consubstanciado na supressão e corte da vegetação, além do impedimento à regeneração natural, em razão da construção de rancho no local.

2. Submete-se ao duplo grau de jurisdição obrigatório a sentença que reconhecer a carência da ação ou julgar improcedente, no todo ou em parte, o pedido deduzido em sede de ação civil pública, por força da aplicação analógica da regra contida no artigo 19 da Lei n. 4.717/65.

3. O imóvel em questão situa-se no bairro Beira Rio, no Município de Rosana, às margens do Rio Paraná.

4. O ponto nodal da questão refere-se à natureza do local em que o rancho foi construído, se consistente em área de preservação permanente (APP), tal como alegado pelo MPF e pela União, ou em área urbana consolidada, consoante reconhecido na sentença.

5. In casu, o imóvel, que dista 65 metros do leito do rio Paraná, foi edificado antes ter sido adquirido, no ano de 1.999, pelos atuais proprietários, época em que estava em vigor a Lei n. 4.771/1965, que já definia como área de preservação permanente a faixa marginal de 500metros para os rios cuja largura fosse superior a 600 metros.

 6. Do cotejo da legislação em comento com o caso concreto versado nos autos, conclui-se que se considera área de preservação permanente, relativamente ao Rio Paraná - o qual possui um leito de mais de 2.300(dois mil e trezentos) metros de largura - a faixa marginal de largura mínima de 500 (quinhentos) metros desde a borda da calha do leito regular.

7. O E. Superior Tribunal de Justiça já firmou o entendimento de que, nos casos de reparação de danos ambientais causados em área de preservação permanente, a obrigação é propter rem, aderindo ao título de domínio ou posse, independente da efetiva autoria da degradação ambiental.

8. Além disso, o reconhecimento por parte do Município de que um determinado local é área urbana consolidada não afasta a aplicação da legislação ambiental, até mesmo porque depende de prévia autorização do órgão ambiental competente, fundamentada em parecer técnico, para supressão da vegetação na área de preservação permanente, o que não ocorreu na hipótese em análise, pois houve a ocupação e construção clandestina, sem qualquer autorização do Poder Público. (..) (AC n°0006056-70.2013.4.03.6112; 3° Turma; Rel. Des. Fed. Nelton dos Santos; j. 18/10/2017)

Em conclusão, in casu, é incontroverso que o imóvel está inteiramente dentro de área de preservação permanente, a qual não se enquadra nem como "urbana consolidada" nem como de interesse social e que tampouco pode ser considerada urbana informal consolidada (artigo 11, III, Lei nº 13465/2017), pois não foi e não pode vir a ser regularizada por estar em várzea sujeita a inundações sazonais. Ademais, a controvérsia sobre o assunto foi recente e definitivamente encerrada pelo Superior Tribunal de Justiça ao apreciar o tema 1010, ocasião em que entendeu que:

RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. AMBIENTAL. CONTROVÉRSIA A ESPEITO DA INCIDÊNCIA DO ART. 4º, I, DA LEI N. 12.651/2012 (NOVO CÓDIGO FLORESTAL) OU DO ART. 4º, CAPUT, III, DA LEI N. 6.766/1979 (LEI DE PARCELAMENTO DO SOLO URBANO). DELIMITAÇÃO DA EXTENSÃO DA FAIXA NÃO EDIFICÁVEL A PARTIR DAS MARGENS DE CURSOS D'ÁGUA NATURAIS EM TRECHOS CARACTERIZADOS COMO ÁREA URBANA CONSOLIDADA.

1. Nos termos em que decidido pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016, aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma nele prevista (Enunciado Administrativo n. 3).

2. Discussão dos autos: Trata-se de mandado de segurança impetrado contra ato de Secretário Municipal questionando o indeferimento de pedido de reforma de imóvel derrubada de casa para construção de outra) que dista menos de 30 (trinta) metros do Rio Itajaí-Açu, encontrando-se em Área de Preservação Permanente urbana. O acórdão recorrido negou provimento ao reexame necessário e manteve a concessão da ordem a fim de que seja observado no pedido administrativo a Lei de Parcelamento do Solo Urbano (Lei n. 6.766/1979), que prevê o recuo de 15 (quinze) metros da margem do curso d´água.

3. Delimitação da controvérsia: Extensão da faixa não edificável a partir das margens de cursos d'água naturais em trechos caracterizados como área urbana consolidada: se corresponde à área de preservação permanente prevista no art. 4°, I, da Lei n. 12.651/2012 (equivalente ao art. 2°, alínea "a", da revogada Lei n. 4.771/1965), cuja largura varia de 30 (trinta) a 500 (quinhentos) metros, ou ao recuo de 15 (quinze) metros determinado no art. 4°, caput, III, da Lei n. 6.766/1979.

4. A definição da norma a incidir sobre o caso deve garantir a melhor e mais eficaz proteção ao meio ambiente natural e ao meio ambiente artificial, em cumprimento ao disposto no art. 225 da CF/1988, sempre com os olhos também voltados ao princípio do desenvolvimento sustentável (art. 170, VI,) e às funções social e ecológica da propriedade.

5. O art. 4º, caput, inciso I, da Lei n. 12.651/2012 mantém-se hígido no sistema normativo federal, após os julgamentos da ADC n. 42 e das ADIs ns. 4.901, 4.902, 4.903 e 4.937.

6. A disciplina da extensão das faixas marginais a cursos d'água no meio urbano foi apreciada inicialmente nesta Corte Superior no julgamento do REsp 1.518.490/SC, Relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe de 15/10/2019, precedente esse que solucionou, especificamente, a antinomia entre a norma do antigo Código Florestal (art. 2º da Lei n. 4.771/1965) e a norma da Lei de Parcelamento do Solo Urbano (art. 4º, III, da Lei n. 6.766/1976), com a afirmação de que o normativo do antigo Código Florestal é o que deve disciplinar a largura mínima das faixas marginais ao longo dos cursos d'água no meio urbano. Nesse sentido: Resp 1.505.083/SC, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, Dje 10/12/2018; AgInt no REsp 1.484.153/SC, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 19/12/2018; REsp 1.546.415/SC, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 28/2/2019; e AgInt no REsp 1.542.756/SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 2/4/2019.

7. Exsurge inarredável que a norma inserta no novo Código Florestal (art. 4º, caput, inciso I), ao prever medidas mínimas superiores para as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente, sendo especial e específica para o caso em face do previsto no art. 4º, III, da Lei n. 6.766/1976, é a que deve reger a proteção das APPs ciliares ou ripárias em áreas urbanas consolidadas, espaços territoriais especialmente protegidos (art. 225, III, da CF/1988), que não se condicionam a fronteiras entre o meio rural e o urbano.

8. A superveniência da Lei n. 13.913, de 25 de novembro de 2019, que suprimiu a expressão “[...] salvo maiores exigências da legislação específica.” do inciso III do art. 4º da Lei n. 6.766/1976, não afasta a aplicação do art. 4º, caput, e I, da Lei n. 12.651/2012 às áreas urbanas de ocupação consolidada, pois, pelo critério da especialidade, esse normativo do novo Código Florestal é o que garante a mais ampla proteção ao meio ambiente, em áreas urbana e rural, e à coletividade.

9. Tese fixada - Tema 1010/STJ: Na vigência do novo Código Florestal (Lei n. 12.651/2012), a extensão não edificável nas Áreas de Preservação Permanente de qualquer curso d’água, perene ou intermitente, em trechos caracterizados como área urbana consolidada, deve respeitar o que disciplinado pelo seu art. 4º, caput, inciso I, alíneas a, b, c, d e e, a fim de assegurar a mais ampla garantia ambiental a esses espaços territoriais especialmente protegidos e, por conseguinte, à coletividade. 10. Recurso especial conhecido e provido. 11. Acórdão sujeito ao regime previsto no art. 1.036 e seguintes do CPC/2015.

Inquestionável, assim, que, ainda que se admitisse a área ora questionada como urbana consolidada, como defendem os réus, nos termos do Código Florestal vigente, haveria que se respeitar a APP delimitada no seu art. 4º, caput, inciso I, alíneas a, b, c, d e e, vale dizer, a faixa que varia de 30 a 500 metros, segundo a largura do curso d’água.

A situação jurídica do rancho, portanto, não pode ser modificada com a integração da municipalidade à demanda e não terá influência no seu desfecho. Diga-se, ainda, que, conquanto o município tenha competência para legislar concorrentemente sobre responsabilidade por dano ao meio ambiente (artigo 24, VIII, CF) e sobre os assuntos de interesse local (artigo 30, I, CF), não pode fazê-lo para restringir ou suprimir diretriz protetiva estabelecida pela legislação federal. Nesse sentido, a lição de Paulo Affonso Leme Machado:

"Ressalte-se que nem o princípio de autonomia municipal possibilita ao Município autorizar obras públicas ou privadas nas áreas destinadas a florestas de preservação permanente, pois estaria derrogando e invadindo a competência da União".

(in Direito Ambiental Brasileiro, 4ª ed. Revista Malheiros, 1992, pag. 420/421)

 

Por fim, a classificação do município como de interesse turístico não interfere com a fundamentação explicitada, tampouco a edição da Lei nº 13.465/2017, na medida em que é incontroverso que o terreno até o momento não está regularizado e descabe a esta corte cogitar sobre situações em tese, futuras e incertas.

Desnecessária, portanto, sob qualquer ângulo, a inclusão do Município de Rosana na lide.

 

V. DO CERCEAMENTO DE DEFESA

Os réus, ora apelantes, alegam nulidade do julgamento. Defendem que, embora revéis, o magistrado deveria ter realizado a instrução com a designação de perícia em que pudessem indicar assistente técnico, porquanto os laudos acostados aos autos não são isentos.

Primeiramente, há que se ressaltar que houve plena possibilidade de defesa, porém não aproveitada oportunamente pelos recorrentes. É certo que, outrossim, se houvesse posteriormente sido designada perícia pelo magistrado, não haveria impedimento para que os revéis dela participassem, inclusive por meio de assistente (artigo 322 do CPC/73). Todavia, o juízo a quo entendeu que a solução do litígio não depende da produção da prova oral ou técnica, mas da simples análise da legislação que disciplina a matéria, sendo suficientes os documentos encartados nos autos (fl. 314v). Cabe examinar, assim, se o julgamento antecipado causou efetivo prejuízo à defesa dos apelantes que caracterize o invocado cerceamento.

A necessidade de realização da prova pericial foi assim justificada na contestação (fl. 266):

Requer a designação judicial para realização de perícia, como meio especial de prova, no local, com a finalidade de esclarecer em definitivo a contenda, especialmente para se verificar a existência e mensurar a o possível dano e a poluição apontadas pelo Parquet, bem como sobre a possibilidade causar dano ambiental maior com a demolição do imóvel, protestando pela formulação de quesitos e indicação de assistente técnico, no prazo legal, nos termos do artigo 421, § 1, do CPC. (grifei)

O objetivo, à evidência, era constatar se houve dano ambiental e se seria eventualmente agravado com a demolição. Não há questionamento algum sobre a largura da APP, a área do imóvel, a existência de edificação ou sua localização inteiramente na referida faixa de preservação. Ora, à vista da inexistência de controvérsia sobre a ocupação indevida e as condições em que se deu, desnecessária a demonstração do prejuízo ao meio ambiente, na medida em que é decorrência direta, como adiante se verá detalhadamente. A demolição também não é questão que dependa de prova sobre seu impacto ambiental, mas imposição legal que também será abordada.

Por outro lado, é certo que, conforme explicitado anteriormente no item II, o feito foi instruído com boletim de ocorrência ambiental e auto de infração ambiental, ambos da Polícia Ambiental do Estado de São Paulo, laudo técnico de constatação e avaliação de dano ambiental elaborado pelo Departamento Estadual de Proteção de Recursos Naturais - DEPRN, auto de constatação n° 226/2009 do assistente técnico das Promotorias de Justiça de Urbanismo e Meio Ambiente, laudo do instituto de criminalística, termo de depoimento de Adalto Lopes ao Ministério Público do Estado de São Paulo, relatório técnico ambiental feito pelo IBAMA e laudo de perícia criminal federal confeccionado pela Polícia Federal. Inegável, assim, que a demanda estava fartamente documentada e havia prova suficiente e absolutamente coincidente sobre a causa de pedir e o ponto central da demanda: a existência de intervenção antropogênica na faixa restrita, fato, ademais, que não é negado pelos recorrentes.

O argumento de que a aludida prova não era isenta não procede, na medida em que elaborada por diversos órgãos que não são partes, não têm interesse processual, são tecnicamente competentes e cuja atuação funda-se em lei.

Os recorrentes também argumentaram que na instrução poderiam ter arguido que a Resolução n° 369/2004 possibilitaria a regularização da área urbana consolidada (artigo 9°), consoante as Leis Complementares n°s 20/2007 e 24/2008 do Município de Rosana, que também poderiam ser discutidos o § 3° do artigo 19 do Decreto 65 14/08, que possibilita que o imóvel não seja demolido quando o desfazimento causar dano ambiental maior, e a Lei n° 6.938/82, que implantou a política nacional de meio ambiente. Tal questionamento claramente não é de ordem fática, mas de direito e, portanto, não carecia de instrução. Por fim, a comprovação que a ocupação existe há mais de quarenta anos e está em um bairro (Beira -Rio) no perímetro urbano, conforme a citada legislação municipal, foi objeto da extensa prova acostada e o que se discute é se essa circunstância legítima a posse e serve de escopo para o afastamento da APP, matéria que dispensa instrução.

Em conclusão, não se caracterizou, in casu, ofensa ao contraditório (artigo 5° LV, CF), tampouco às garantias ao meio ambiente equilibrado (art. 225 da CF), propriedade (art. 5°, XXII, CF), moradia (artigos 6° e 7°, CF), lazer (217, § 3°, CF) e direito ao exercício de qualquer trabalho lícito (art. 5°, XII, CF).

 

VI. DA PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE

A proteção ao meio ambiente (artigo 1°, 1, da LACP) tem status constitucional, a teor do disposto no artigo 225 da Lei Maior. Os agentes infratores, pessoas físicas ou jurídicas, estão sujeitos a sanções civis, penais e administrativas, cuja incidência pode ser cumulativa, ante sua autonomia:

"Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade devida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. § 1 ". Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público. 1 - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; II - preservar a diversidade e a integridade do património genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade devida e o meio ambiente; VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; VII - proteger a fauna e aflora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. § 2"Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei. § 3° - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. § 4° - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais."

Encontra-se disposição similar na Constituição do Estado de São Paulo. Confira-se:

"Artigo 192 - A execução de obras, atividades, processos produtivos e empreendimentos e a exploração de recursos naturais de qualquer espécie, quer pelo setor público, quer pelo privado, serão admitidas se houver resguardo do meio ambiente ecologicamente equilibrado."

A preservação ambiental, assim como do patrimônio público de modo geral, é competência comum dos entes federativos (artigo 23, 1, VI e VII, CF/88). Anote-se que cabe aos Estados, Distrito Federal e Municípios seguir as diretrizes editadas pela União, de modo que não podem reduzir a tutela estabelecida em âmbito de legislação federal, mas somente a incrementar, em observância aos princípios da simetria e da proteção máxima aos direitos de titularidade da coletividade.

A Lei Maior recepcionou a proteção anteriormente existente na esfera da legislação ordinária. Vale destacar as Leis n° 4.771/1965 e n° 6.938/1981 com suas posteriores alterações (e regulamentação pelo Decreto n° 99.274/1990), ressaltada a recente revogação do Código de 1965 com o advento da Lei n° 12.651/2012. Tais diplomas também preceituam a obrigação de toda a sociedade e do poder público quanto à defesa do meio ambiente, além da promoção das correlatas ações necessárias à sua preservação (artigos 1° e 2°, Lei no 6.938/1981).

A novel legislação ambiental também é aplicável a situações de transição por incrementar a defesa do meio ambiente (e.g. artigo 61-A da Lei n° 12.651/2012). Frise-se ser princípio norteador do microssistema dos direitos coletivos a aplicação da norma mais protetiva para sua efetiva tutela, em razão de seu alcance e importância.

De se anotar, também, a regência do tema pelo primado do devido uso da propriedade (artigos 5°, XXII, XXIII, 170, II e III, 182 e 186 da CF/88), a intitulada função socioambiental, a qual permeia a dimensão da tutela ambiental, nos termos do artigo 1.228, § 10, do Código Civil:

"Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente apossua ou detenha. § 1°. O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com assuas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, aflora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas."

A defesa do meio ambiente abarca a apuração da responsabilidade objetiva dos agentes causadores de dano a tal patrimônio, consoante determinação expressa do artigo 4°, inciso VII, c.c. artigo 14, § 10, ambos da citada Lei n° 6.938/1981, além do artigo 2° do atual Código Florestal, a qual foi também inserida na Constituição do Estado de São Paulo, artigo 195, verbis:

Lei n°6.938/1981

 "Art. 4° -A Política Nacional do Meio Ambiente visará: (omissis)

VII - à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos."

 "Art. 14. (omissis)

§ 1°. Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade, O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente."

Lei n°12.651/2012

 "Art. 2°. As florestas existentes no território nacional e as demais formas de vegetação nativa, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes do País, exercendo-se os direitos de propriedade com as limitações que a legislação em geral e especialmente esta Lei estabelecem.

§ 1°. Na utilização e exploração da vegetação, as ações ou omissões contrárias às disposições desta Lei são consideradas uso irregular da propriedade, aplicando-se o procedimento sumário previsto no inciso II do art. 275 da Lei no 5.869, de 1] de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil, sem prejuízo da responsabilidade civil, nos termos do §1°do art. 14 da Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981, e das sanções administrativas, civis e penais." Constituição do Estado de São Paulo

"Artigo 195 - As condutas e atividades lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, com aplicação de multas diárias e progressivas no caso de continuidade da infração ou reincidência, incluídas a redução do nível de atividade e a interdição, independentemente da obrigação dos infratores de reparação aos danos causados."

De tais dispositivos decorre a obrigatoriedade do uso consciente da propriedade, consoante sua função social em amplo aspecto, sob pena de se impor ao agente causador do dano ambiental o dever de reparar ou indenizar pelos prejuízos sucedidos independentemente de culpa. São suficientes, assim, a comprovação de ação ou omissão, a ocorrência do dano e o nexo causal entre ambos. Despiciendo, inclusive, perquirir a respeito da licitude da atividade desenvolvida, porquanto incide na espécie a teoria do risco integral, a fim de coibir a atividade nociva e impor a reparação tanto in natura quanto em pecúnia.

As mesmas diretrizes de proteção ambiental são seguidas pela legislação estadual paulista, destacadas as Leis Estaduais n° 997/76 (e respectivo Decreto n° 8.468/76) e n° 9.509/97.

O direito ambiental brasileiro igualmente não socorre o agente que ocupa determinada área depois de sua degradação, para de tal fato pretender beneficiar-se, pois as obrigações ambientais são propter rem. O atual Código Florestal, a citada Lei n° 12.651/2012, foi ainda mais longe em seu escopo protecionista, ao preceituar, em seu artigo 2°, § 2°, que "as obrigações previstas nesta Lei têm natureza real e são transmitidas ao sucessor, de qualquer natureza, no caso de transferência de domínio ou posse do imóvel rural' Configuram, assim, "limitações administrativas reais" por estatuir as hipóteses legais de uso permitido em numerus clausus e, portanto, não passíveis de ampliação pela via administrativa ou judicial.

A responsabilização pela ocorrência do dano ambiental e correlata aplicação de penalidade também se dá nos termos da Lei n° 9.605/1998, na forma dos artigos a seguir transcritos:

"Art. 38. Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção: Pena - detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente. Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade." "Art. 38-A. Destruir ou danificar vegetação primária ou secundária, em estágio avançado ou médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica ou utilizá-la com infringência das normas de proteção: (Incluído pela Lei n°11428, de 2006). Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente. Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade."

"Art. 48. Impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação: Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa." "Art. 70. Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente."

"Art. 72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções, observado o disposto no art. 6": 1 - advertência: II - multa simples; III - multa diária; IV - apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora, instrumentos, petrechos. equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração; V - destruição ou inutilização do produto; VI -suspensão de venda e fabricação do produto; VII - embargo de obra ou atividade; VIII - demolição de obra; IX - suspensão parcial ou total de atividades; X- (VETADO) XI - restritiva de direitos."

 Impende registrar, também, para o escopo de solucionar a presente lide, as disposições específicas sobre as áreas de preservação permanente. A definição de tais áreas decorre ex lege, ou seja, sua regulamentação, delimitação ou especificação deriva diretamente do ordenamento jurídico, diplomas legais e também infralegais. No tocante aos diplomas regulamentares, registre-se ter o CONAMA competência para "estabelecer normas, critérios e padrões relativos ao controle e à manutenção da qualidade do meio ambiente com vistas ao uso racional dos recursos ambientais, principalmente os hídricos ", nos termos do artigo 8°, VII, da Lei n°6.938/1981.

Para o caso em análise, vale também mencionar a Resolução CONAMA n° 303/2002, a qual reitera o conteúdo da legislação ordinária e, por delegação legal, fixa limites para as áreas protegidas. Lembre-se que tal definição, em âmbito da legislação federal, não impede que venham os parâmetros ali estabelecidos a ser ampliados na esfera regional e local, com prevalência da norma mais protetiva. Segue a transcrição da legislação vigente à época e nos dias atuais:

Lei n°4.771/1965

"Art. 1°. (..)

“§ 2. Para os efeitos deste Código, entende-se por: (...) II - área de preservação permanente: área protegida nos termos dos arts. 2° e 30 desta Lei, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas;

"Art. 2". Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas: (...)

a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será: (...)

3- de 100 (cem) metros para todos os cursos cuja largura seja superior a 200 metros;(redação original)

 4 - de 200 (duzentos) metros para os cursos d'água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura; (redação dada pela Lei n°7.803, de 18.07.1989)

 5- de 500 (quinhentos) metros para os cursos d'água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros;

"Art. 4°, § 1. A supressão total ou parcial de florestas de preservação permanente só será admitida com prévia autorização do Poder Executivo Federal, quando for necessária à execução de obras, planos, atividades ou projetos de utilidade pública ou interesse social."

Resolução CONAMA n°303/2002:

"Art. 3° Constitui Area de Preservação Permanente a área situada: I - em faixa marginal, medida a partir do nível mais alto, em projeção horizontal, com largura mínima, de: a) trinta metros, para o curso d'água com menos de dez metros de largura; b) cinquenta metros, para o curso d'água com dez a cinquenta metros de largura; c) cem metros, para o curso d'água com cinquenta a duzentos metros de largura; d) duzentos metros, para o curso d'água com duzentos a seiscentos metros de largura; e) quinhentos metros, para o curso d'água com mais de seiscentos metros de largura;

 Lei n°12.651/2012

"Art. 40 Considera-se Area de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei: (...)

I- as faixas marginais de qualquer curso d'água natural perene e intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de: (...)

d) 200 (duzentos) metros, para os cursos d'água que tenham de 200(duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;

e) 500 (quinhentos) metros, para os cursos d'água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros; (destaques aditados)

O Código Florestal de 1934 (Decreto n° 23.793/1934) já preceituava ser o meio ambiente de interesse comum a todos e configurar situação limitadora do uso da propriedade. A seu turno, a Lei n°4.771/1965, em regra mantida pelo atual Código de 2012, disciplina não serem possíveis intervenções em áreas de preservação permanente, tampouco a manutenção de edificações. Referidos diplomas, por outro lado, trazem taxativas exceções quanto ao uso tolerado de tal espaço, atreladas essencialmente às hipóteses de utilidade pública e interesse social, os quais foram anteriormente reproduzidos no item III.

 No mesmo sentido dos dispositivos referidos há ainda a Lei n°9.433/97 (institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, regulamenta o inciso XIX do art. 21 da Constituição Federal, e altera o art. 1" da Lei n° 8.001, de 13 de março de 1990, que modificou a Lei n° 7.990, de 28 de dezembro de 1989) e a Resolução CONAMA n° 369/2006 (Dispõe sobre os casos excepcionais, de utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental, que possibilitam a intervenção ou supressão de vegetação em Area de Preservação Permanente APP).

As normas mencionadas, que à evidência se aplicam tanto às áreas rurais como urbanas, contemplam como regra a vedação a qualquer tipo de intervenção em áreas de preservação permanente, como visto. Permitem, excepcionalmente, algumas ações e manutenção de construções eventualmente já erigidas em determinadas situações, seja à luz da legislação vigente à época dos fatos, seja nos termos dos permissivos dos atuais regramentos. No entanto, por serem excepcionais configuram rol taxativo e devem ser interpretadas de modo restritivo.

De igual modo, não se fala em prevalência de eventual direito adquirido ou ato jurídico perfeito quando se afere afronta ao próprio ordenamento à época existente. Prepondera o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, em interpretação harmoniosa dos primados constitucionais, inclusive porque a "anterioridade que deve ser considerada é a da boa qualidade ambiental, o que não implica equívoco interpretativo que gere insegurança jurídica ou injustiça. Como já se disse: "Até porque se se pudesse falar em 'anterioridade ela deveria beneficiar a boa qualidade do meio ambiente, que sem dúvida precedeu toda a instalação fonte de danos e agressões ambientais, sendo de todo inadmissível pretender que a existência e a repetição de emissões poluentes em certo local, mesmo ao longo de seguidas anos, determine a sorte de toda uma região e comprometa indefinidamente, para o futuro, o destino do meio ambiente e da qualidade de vida da população" (MIRRA, Alvaro Luiz Valery. Ação Civil Pública e Reparação do Dano ao Meio Ambiente. São Paulo. Ed. Juarez de Oliveira, 2004, p. 116).

 

VII. DA RESPONSABILIZAÇÃO DOS RÉUS PELA OCORRÊNCIA DO DANO AMBIENTAL

Dessume-se a obrigação de reparar pela ocorrência de dano ambiental quando há atuação em desconformidade aos regramentos de proteção ao meio ambiente e nexo de causalidade entre tal comportamento e o prejuízo causado.

O desmatamento, ocupação ou exploração de área de preservação permanente, bem como a supressão de vegetação ou impedimento à sua regeneração em tais terrenos, configuram dano ecológico in re ipsa, o qual dispensa até mesmo prova técnica de lesividade específica e enseja a obrigação propter rem de restaurar a plenitude ambiental, indenizar pela degradação e igualmente terceiros afetados, sob a sistemática da responsabilidade civil objetiva. Significa, assim, que responde pelo dano não somente aquele que perpetra a ação lesiva como, de igual forma, quem contribui para sua manutenção.

 Não há qualquer conflito entre a questão da preservação ambiental e o direito de propriedade, porquanto este não pode ser desvinculado de sua função socioambiental, a qual abrange os fundamentos e preceitos norteadores já declinados, inclusive a impossibilidade da pretensão ao direito adquirido à degradação ambiental. E indissociável da função socioambiental da propriedade a noção do seu uso de modo a resguardar o meio ambiente equilibrado para a presente e as futuras gerações. Assim, no caso de restar configurado tratar-se de local de preservação permanente, torna-se absolutamente impossível sua ocupação, pois é área da mais alta relevância ecológica, de prioritária proteção.

Tampouco se pode falar em situação consolidada de ocupação de área de preservação permanente para evitar a ordem de desocupação e demolição das edificações nela erigidas, em nome da "razoabilidade e proporcionalidade" ou de um inverossímil dano maior com sua retirada, quando ausente licença ambiental para a supressão de vegetação nativa e ocupação do terreno, nos termos da lei, a revelar situação ab initio irregular. Não são admissíveis pequenas exceções que solapam a mens legis, ao argumento de serem imperceptíveis ou atenderem a interesses locais, pois seu conjunto agride o meio ambiente e causa evidente dano a toda a coletividade.

A título de nota, eventual autorização administrativa para a ocupação de terreno consolidado como área de preservação permanente fora dos casos expressa e excepcionalmente autorizados pelo ordenamento pátrio configuraria ato administrativo nulo, porque editado em afronta à literal disposição dos regramentos atinentes à tutela do meio ambiente ora apontados ou, no mínimo, perderia sua eficácia, dada a impossibilidade de se sustentar o "direito adquirido à degradação ambiental". O Superior Tribunal de Justiça adota posição incisiva nesse sentido, consoante se depreende do julgado a seguir transcrito:

"ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. OCUPAÇÃO E EDIFICAÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. CASAS DE VERANEIO ("RANCHOS"). LEIS 4.771/65 (CÓDIGO FLORESTAL DE 1965), 6.766/79 (LEI DO PARCELAMENTO DO SOLO URBANO) E 6.938/81 (LEI DA POLÍTICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE). DESMEMBRAMENTO E LOTEAMENTO IRREGULAR. VEGETAÇÃO CILIAR OU RIPÁRIA. CORREDORES ECOLÓGICOS. RIO IVINHEMA. LICENCIAMENTO AMBIENTAL. NULIDADE DA AUTORIZAÇÃO OU LICENÇA AMBIENTAL. SILÊNCIO ADMINISTRATIVO. INEXISTÊNCIA, NO DIREITO BRASILEIRO, DE AUTORIZAÇÃO OU LICENÇA AMBIENTAL TÁCITA. PRINCÍPIO DA LEGITIMIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO. SUSPENSÃO DE OFÍCIO DE LICENÇA E DE TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. PRECEDENTES DO STJ. 1. Trata-se, originariamente, de Ação Civil Pública ambiental movida pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul contra proprietários de 54 casas de veraneio ("ranchos"), bar e restaurante construídos em Área de Preservação Permanente - APP, um conjunto de aproximadamente 60 lotes e com extensão de quase um quilômetro e meio de ocupação da margem esquerda do Rio Ivinhema, curso de água com mais de 200 metros de largura. Pediu-se a desocupação da APP, a demolição das construções, o reflorestamento da região afetada e o pagamento de indenização, além da emissão de ordem cominatória de proibição de novas intervenções. A sentença de procedência parcial foi reformada pelo Tribunal de Justiça, com decretação de improcedência do pedido. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE CILIAR 2. Primigênio e mais categórico instrumento de expressão e densificação da "efetividade" do "direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado", a Área de Preservação Permanente ciliar (= APP ripária, ripícola ou ribeirinha), pelo seu prestígio ético e indubitável mérito ecológico, corporifica verdadeira trincheira inicial e última - a bandeira mais reluzente, por assim dizer - do comando maior de "preservar e restaurar as funções ecológicas essenciais", prescrito no art. 225, caput e § 1º, I, da Constituição Federal. 3. Aferrada às margens de rios, córregos, riachos, nascentes, charcos, lagos, lagoas e estuários, intenta a APP ciliar assegurar, a um só tempo, a integridade físico-química da água, a estabilização do leito hídrico e do solo da bacia, a mitigação dos efeitos nocivos das enchentes, a barragem e filtragem de detritos, sedimentos e poluentes, a absorção de nutrientes pelo sistema radicular, o esplendor da paisagem e a própria sobrevivência da flora ribeirinha e fauna. Essas funções multifacetárias e insubstituíveis elevam-na ao status de peça fundamental na formação de corredores ecológicos, elos de conexão da biodiversidade, genuínas veias bióticas do meio ambiente. Objetivamente falando, a vegetação ripária exerce tarefas de proteção assemelhadas às da pele em relação ao corpo humano: faltando uma ou outra, a vida até pode continuar por algum tempo, mas, no cerne, muito além de trivial mutilação do sentimento de plenitude e do belo do organismo, o que sobra não passa de um ser majestoso em estado de agonia terminal. 4. Compreensível que, com base nessa ratio ético-ambiental, o legislador caucione a APP ripária de maneira quase absoluta, colocando-a no ápice do complexo e numeroso panteão dos espaços protegidos, ao prevê-la na forma de superfície intocável, elemento cardeal e estruturante no esquema maior do meio ambiente ecologicamente equilibrado. Por tudo isso, a APP ciliar qualifica-se como território non aedificandi. Não poderia ser diferente, hostil que se acha à exploração econômica direta, desmatamento ou ocupação humana (com as ressalvas previstas em lei, de caráter totalmente excepcional e em numerus clausus, v.g., utilidade pública, interesse social, intervenção de baixo impacto). 5. Causa dano ecológico in re ipsa, presunção legal definitiva que dispensa produção de prova técnica de lesividade específica, quem, fora das exceções legais, desmata, ocupa ou explora APP, ou impede sua regeneração, comportamento de que emerge obrigação propter rem de restaurar na sua plenitude e indenizar o meio ambiente degradado e terceiros afetados, sob regime de responsabilidade civil objetiva. Precedentes do STJ. LICENCIAMENTO AMBIENTAL 6. Se é certo que em licença, autorização ou Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), ao Administrador, quando implementa a legislação ambiental, incumbe agregar condicionantes, coartações e formas de mitigação do uso e exploração dos recursos naturais - o que amiúde acontece, efeito de peculiaridades concretas da biota, projeto, atividade ou empreendimento -, não é menos certo que o mesmo ordenamento jurídico não lhe faculta, em sentido inverso, ignorar, abrandar ou fantasiar prescrições legais referentes aos usos restringentes que, por exceção, sejam admitidos nos espaços protegidos, acima de tudo em APP. 7. Em respeito ao princípio da legalidade, é proibido ao órgão ambiental criar direitos de exploração onde a lei previu deveres de preservação. Pela mesma razão, mostra-se descabido, qualquer que seja o pretexto ou circunstância, falar em licença ou autorização ambiental tácita, mormente por quem nunca a solicitou ou fê-lo somente após haver iniciado, às vezes até concluído, a atividade ou o empreendimento em questão. Se, diante de pleito do particular, o Administrador permanece silente, é intolerável que a partir da omissão estatal e do nada jurídico se entreveja salvo-conduto para usar e até abusar dos recursos naturais, sem prejuízo, claro, de medidas administrativas e judiciais destinadas a obrigá-lo a se manifestar e decidir. 8. Embora o licenciamento ambiental possa, conforme a natureza do empreendimento, obra ou atividade, ser realizado, conjunta ou isoladamente, pela União, Distrito Federal e Municípios, não compete a nenhum deles - de modo direto ou indireto, muito menos com subterfúgios ou sob pretexto de medidas mitigatórias ou compensatórias vazias ou inúteis - dispensar exigências legais, regulamentares ou de pura sabedoria ecológica, sob pena de, ao assim proceder, fulminar de nulidade absoluta e insanável o ato administrativo praticado, bem como de fazer incidir, pessoalmente, sobre os servidores envolvidos, as sanções da Lei dos Crimes contra o Meio Ambiente (arts. 66, 67 e 69-A) e da Lei da Improbidade Administrativa, às quais se agrega sua responsabilização civil em regime de solidariedade com os autores diretos de eventual dano causado. HIPÓTESE DOS AUTOS 9. O Recurso Especial em questão debate, entre outros pontos, os efeitos da suspensão de ofício da Licença de Operação 12/2008, emitida pelo órgão ambiental do Estado de Mato Grosso do Sul e incorporada às razões de decidir do acórdão recorrido. Nos Embargos de Declaração, o Parquet suscita, de maneira expressa, a suspensão de ofício da licença concedida, bem como diversas outras omissões. Em resposta, o respectivo acórdão limita-se a apontar pretensão supostamente infringente, sem examinar as impugnações, todas pertinentes para o deslinde da controvérsia. Por essa razão, vislumbro ofensa ao art. 535 do CPC. Precedentes do STJ em situações análogas. 10. Recurso Especial parcialmente provido para anular o acórdão dos Embargos de Declaração. (destaques aditados)

(STJ, REsp 1245149, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, v.u., DJe 13/06/2013).

In casu, o local sub judice, como visto, à margem do Rio Paraná, configura área de preservação permanente, nos termos do artigo 2º, alínea "a", item 5, da Lei nº 4.771/1965, na redação da Lei nº 7.803/89, vigente ao tempo da lavratura do auto de infração (atual artigo 4º, I, "e", da Lei nº 12.651/2012) e artigo 3º, I, "e", da Resolução CONAMA nº 303/2002, a saber, a margem ciliar de 500 metros, considerado que o curso d'água tem, segundo o laudo do IBAMA (fl. 184), mais de 600 metros de largura no trecho do imóvel.

Consoante atestou o relatório técnico da autarquia federal (fl. 184):

"- as construções, bem como as áreas impermeabilizadas têm início a partir do N.A (nível d'água) em sentido horizontal:

I- uma casa construída em alvenaria com cobertura de telhas de amianto, pia acoplada à casa na lateral, deck cimentado e parte em madeira, portão de madeira e muro de contenção, medindo 07,20 mts de largura por 17,30 m de comprimento, a partir da NA;

II - Uma área coberta com telha de amianto, defronte da casa, pilares de concreto com tubos de PVC, piso impermeabilizado, deck de madeira com muro de contenção, com início a partir da NA;

III - um poço semi-artesiano (sem utilização) e uma caixa d'água, a partido dos 32,00 metros da NA;

IV - Uma fossa negra, construída dentro da faixa dos 17,30 mts da casa (lado esquerdo sentido ao Rio Paraná);

V - Escada de ferro dentro da NA;

C2) Qual a área ocupada pelas construções;

- A área ocupada com construções da edificação, galpão, deck e impermeabilização do solo perfazem o total de 521,60 m2 (16,30 mts de largura por 32,00 de comprimento)"

A perícia do NUCRIN descreveu em detalhes os danos e impactos ambientais (fls. 301/302), da qual se extraem as seguintes passagens:

A permanência de edificações e da utilização antrópica do local impede o restabelecimento da vegetação na APP, podendo trazer novos danos ambientais decorrentes do lançamento de efluentes (esgotos) e assoreamento, entre outros.

O desmate elimina a vegetação nativa promovendo a perda de variabilidade genética, expondo o solo antes protegido pela sombra do dossel florestal e pela camada de líter (folhas e restos vegetais e animais no nível do solo) alterando o micro clima local. (...) Neste caso, tais impactos são ainda mais graves por se tratar de área de mata ciliar, considerada de preservação permanente, pois as intervenções afetam diretamente nas condições ambientais do corpo d'água adjacente (Rio Paraná), favorecendo a erosão das margens e o consequente assoreamento dos cursos d'água a jusante.

(...)

Adicionalmente, por formarem corredores naturais que proporcionam conexões entre os remanescentes de vegetação nativa de uma região, as matas ciliares têm a função de facilitar o trânsito de animais silvestres (...).

Evidencia-se que a infração ora analisada, ocupação não autorizada em área de preservação permanente, não se esgotou com o erigir das construções. Trata-se de conduta infracional continuada, que se protrai no tempo, porquanto contínua a utilização do espaço em desacordo com as normas de proteção ambiental, a agravar cada vez mais os danos ambientais no local, na medida em que impede a natural regeneração da vegetação.

Repise-se, outrossim, por sua importância, que o STJ (tema 1010) sepultou definitivamente a argumentação da defesa no sentido de caracterizar o imóvel como em área urbana, com a finalidade de que lhe fosse reconhecida APP de menor extensão, porquanto restou assentada a aplicabilidade do artigo 4 do Código Florestal mesmo nessa situação, ou seja, in casu, do limite de quinhentos metros.

 

VIII. DA DEFESA DOS APELANTES

Basicamente, os réus, no apelo, sustentaram a nulidade do processo em razão da ausência de perícia oficial, argumento já anteriormente rechaçado. Além, limitaram-se a dizer que, verbis, se esse não for o entendimento, deve ser declarado que o imóvel não se enquadra no artigo 2º do Código Florestal, alegação também amplamente examinada nos itens V e VI.

 

IX. DA INDENIZAÇÃO PELO DANO AMBIENTAL

A proteção integral ao meio ambiente, primado constante do artigo 225, § 3º, da CF/1988, autoriza impor ao agente infrator obrigações de fazer, não fazer e indenizar. Tal cominação cumulativa é plenamente admitida e, ainda, amplamente reconhecida por toda a doutrina e jurisprudência. Pela própria definição constitucional (art. 225, caput, CF), o meio ambiente é primacialmente coletivo e sua proteção, seja da flora ou da fauna, respeita seus aspectos material e espiritual e deve ser considerado no seu conjunto, como é a expressão do legislador: meio ambiente ecologicamente equilibrado e essencial à sadia qualidade de vida. De acordo com José Rubens Morato Leite (2003, p. 249):

Não se aprecia subjetivamente a conduta do poluidor, mas a ocorrência do resultado prejudicial ao homem e a seu ambiente. A atividade poluente acaba sendo uma apropriação pelo poluidor dos direitos de outrem, pois na realidade a emissão é um confisco dos direitos de alguém em respirar ar puro, beber água saudável e viver com tranquilidade.

 

O autor ainda ressalta:

 

O dano extrapatrimonial está muito vinculado ao direito da personalidade, mas não restringido, pois este é conhecido tradicionalmente como atinente à pessoa física e no que concerne ao dano ambiental, abraçando uma caracterização mais abrangente e solidária, tratando-se, ao mesmo tempo, de um direito individual e um direito da coletividade. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado está ligado a um direito fundamental de todos e se reporta à qualidade de vida que se configura como valor imaterial da coletividade. (p. 266-267).

 

Veja-se, a propósito, entendimento do STJ sobre o dano moral coletivo:

 

PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA COIBIR A PRÁTICA RECORRENTE DE POLUIÇÃO SONORA. MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE RECONHECIDA. DANO MORAL COLETIVO. POLUIÇÃO SONORA. OCORRÊNCIA. PRECEDENTES. REDUÇÃO DA INDENIZAÇÃO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. 1. Recurso especial decorrente de ação civil pública em que se discute danos morais coletivos decorrentes de poluição sonora e irregularidade urbanística provocadas por funcionamento dos condensadores e geradores colocados no fundo do estabelecimento das condenadas. 2. Tratando-se de poluição sonora, e não de simples incômodo restrito aos lindeiros de parede, a atuação do Ministério Público não se dirige à tutela de direitos individuais de vizinhança, na acepção civilística tradicional, e, sim, à defesa do meio ambiente, da saúde e da tranqüilidade pública, bens de natureza difusa. O Ministério Público possui legitimidade para propor Ação Civil Pública com o fito de prevenir ou cessar qualquer tipo de poluição, inclusive sonora, bem como buscar a reparação pelos danos dela decorrentes. Nesse sentido: REsp 1.051.306/MG, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, Rel. p/ Acórdão Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/10/2008, DJe 10/09/2010. 3. "Tratando-se de poluição sonora, e não de simples incômodo restrito aos lindeiros de parede, a atuação do Ministério Público não se dirige à tutela de direitos individuais de vizinhança, na acepção civilística tradicional, e, sim, à defesa do meio ambiente, da saúde e da tranqüilidade pública, bens de natureza difusa" (REsp 1.051.306/MG, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, Rel. p/ Acórdão Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/10/2008, DJe 10/09/2010.). 4. "O dano moral coletivo, assim entendido o que é transindividual e atinge uma classe específica ou não de pessoas, é passível de comprovação pela presença de prejuízo à imagem e à moral coletiva dos indivíduos enquanto síntese das individualidades percebidas como segmento, derivado de uma mesma relação jurídica-base. (...) O dano extrapatrimonial coletivo prescinde da comprovação de dor, de sofrimento e de abalo psicológico, suscetíveis de apreciação na esfera do indivíduo, mas inaplicável aos interesses difusos e coletivos". Nesse sentido: REsp 1.410.698/MG, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/06/2015, DJe 30/06/2015; REsp 1.057.274/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/12/2009, DJe 26/02/2010. 5. A Corte local, ao fixar o valor indenizatório em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), o fez com base na análise aprofundada da prova constante dos autos. A pretensão da ora agravante não se limita à revaloração da prova apreciada do aresto estadual, mas, sim, ao seu revolvimento por este Tribunal Superior, o que é inviável. Incidência da Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça. Nesse sentido: AgRg no AREsp 430.850/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 07/03/2014. Agravo regimental improvido. ..

(AGARESP 201501613818; Rel. Min. HUMBERTO MARTINS; 2ª Turma; DJE DATA:14/09/2015)

 

Ressalte-se, ademais, que aquela corte entende que não há óbice à cumulação da obrigação de reparar a área e de indenizar:

 

"ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL . AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DESMATAMENTO E EDIFICAÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE, SEM AUTORIZAÇÃO DA AUTORIDADE AMBIENTAL . DANO S CAUSADOS À BIOTA. INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 4º, VII, E 14, § 1º, DA LEI 6.938/1981, E DO ART. 3º DA LEI 7.347/85. PRINCÍPIOS DA REPARAÇÃO INTEGRAL, DO POLUIDOR-PAGADOR E DO USUÁRIO-PAGADOR. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER (REPARAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA) E DE PAGAR QUANTIA CERTA (INDENIZAÇÃO). REDUCTION AD PRISTINUM STATUM. DANO AMBIENTAL INTERMEDIÁRIO, RESIDUAL E MORAL COLETIVO. ART. 5º DA LEI DE INTRODUÇÃO AO CÓDIGO CIVIL. INTERPRETAÇÃO IN DUBIO PRO NATURA DA NORMA AMBIENTAL . 1. Cuidam os autos de Ação Civil Pública proposta com o fito de obter responsabilização por dano s ambientais causados pela supressão de vegetação nativa e edificação irregular em Área de Preservação Permanente. O juiz de primeiro grau e o Tribunal de Justiça de Minas Gerais consideraram provado o dano ambiental e condenaram o réu a repará-lo; porém, julgaram improcedente o pedido indenizatório pelo dano ecológico pretérito e residual. 2. A jurisprudência do STJ está firmada no sentido da viabilidade, no âmbito da Lei 7.347/85 e da Lei 6.938/81, de cumulação de obrigações de fazer, de não fazer e de indenizar (REsp 1.145.083/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 4.9.2012; REsp 1.178.294/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 10.9.2010; AgRg nos EDcl no Ag 1.156.486/PR, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 27.4.2011; REsp 1.120.117/AC, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 19.11.2009; REsp 1.090.968/SP, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 3.8.2010; REsp 605.323/MG, Rel. Ministro José Delgado, Rel. p/ Acórdão Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJ 17.10.2005; REsp 625.249/PR, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJ 31.8.2006, entre outros). 3. Recurso Especial parcialmente provido para reconhecer a possibilidade de cumulação de indenização pecuniária com as obrigações de fazer e não fazer voltadas à recomposição in natura do bem lesado, devolvendo-se os autos ao Tribunal de origem para que fixe, in casu, o quantum debeatur reparatório do dano já reconhecido no acórdão recorrido." (destaques aditados)

(STJ, REsp 1328753, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, v.u., DJe 03/02/2015

 

"ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. QUEIMADA EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. DANOS CAUSADOS AO MEIO AMBIENTE. PRINCÍPIOS DA REPARAÇÃO INTEGRAL E DO POLUIDOR-PAGADOR. CUMULAÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER (REPARAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA) E DE PAGAR QUANTIA CERTA ( INDENIZAÇÃO ). POSSIBILIDADE. NATUREZA PROPTER REM. ART. 3º DA LEI 7.347/1985. INTERPRETAÇÃO DA NORMA AMBIENTAL. 1. A jurisprudência do STJ está firmada no sentido de que a necessidade de reparação integral da lesão causada ao meio ambiente permite a cumulação de obrigações de fazer, de não fazer e de indenizar, que têm natureza propter rem. Precedentes: REsp 1.178.294/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, j. 10/8/2010; REsp 1.115.555/MG, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, j. 15/2/2011; AgRg no REsp 1170532/MG, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, j. 24/8/2010; REsp 605.323/MG, Rel. para acórdão Ministro Teori Albino Zavascki, j. 18/8/2005, entre outros. 2. Recurso Especial parcialmente provido para que se reconheça a possibilidade, em tese, de cumulação de indenização pecuniária com as obrigações de fazer voltadas à recomposição in natura do bem lesado, devolvendo-se os autos ao Tribunal a quo para que verifique se, na hipótese, há dano indenizável e fixe o eventual quantum debeatur." (destaques aditados)

(STJ, REsp 1164587, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, v.u., DJe 13/04/2012).

 

Em consequência, cabível não só a restauração ambiental, como de igual modo o pagamento de indenização pecuniária, porque dita condenação: "cumpre dois objetivos principais: dar uma resposta econômica aos danos sofridos pela vítima (o indivíduo e a sociedade) e dissuadir comportamentos semelhantes do poluidor ou de terceiros" (Edis Milaré, Direito do Ambiente - A Gestão Ambiental em foco. Doutrina. Jurisprudência. Glossário. São Paulo. RT, 2007, p. 818). Diga-se, outrossim, que a restauração busca assegurar o reequilíbrio ecológico para efeitos futuros, ao passo que a indenização tem por escopo a reparação dos malefícios causados ao meio ambiente ao longo do tempo passado, em decorrência do uso ilegal da APP, que, no caso dos autos, remonta a mais de duas décadas.

Em relação à quantificação do dano ambiental, é pacífico o entendimento da jurisprudência no sentido da possibilidade de fixação do valor indenizatório por ocasião da liquidação por arbitramento (artigo 509 do CPC; artigos 475-C e 475-D do CPC/1973). Nesse sentido, colacionam-se os julgados a seguir do C. Superior Tribunal de Justiça:

 

"RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CONDENATÓRIA POR DANOS EXTRAPATRIMONIAIS E PATRIMONIAIS - INCÊNDIO INICIADO NA ÁREA DE PROPRIEDADE DO RÉU QUE ATINGIU O IMÓVEL RURAL DO AUTOR - SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA - CORTE LOCAL QUE, AO RECONHECER A RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL DO RÉU (ART. 3º, INC. IV E ART. 14, § 1º, DA LEI 6.938/81), CONDENA-O AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS PATRIMONIAIS, A SEREM QUANTIFICADOS EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA - INSURGÊNCIA RECURSAL DA PARTE RÉ. DANOS AMBIENTAIS INDIVIDUAIS OU REFLEXOS (POR RICOCHETE) - RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA - APLICAÇÃO DO DISPOSTO NO ARTIGO 14, § 1º, DA LEI Nº 9.938/81, E, OUTROSSIM, EM VIRTUDE DA VIOLAÇÃO A DIREITOS DE VIZINHANÇA - RECONHECIMENTO DO DEVER DE INDENIZAR IMPUTÁVEL AO PROPRIETÁRIO DO IMÓVEL.

(omissis)

5. Recurso especial conhecido em parte e, na extensão, não provido." (destaques aditados)

(STJ, REsp 1381211, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, v.u., DJe 19/09/2014);

"CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RENOVATÓRIA DE LOCAÇÃO COMERCIAL AJUIZADA POR SUBLOCATÁRIA DE "POSTO DE GASOLINA". PROCEDÊNCIA. EXCLUSÃO DA EMPRESA DISTRIBUIDORA DE COMBUSTÍVEIS DA RELAÇÃO LOCATÍCIA. MANUTENÇÃO DOS EQUIPAMENTOS NO IMÓVEL. NOVA AÇÃO, AJUIZADA PELOS PROPRIETÁRIOS CONTRA A ANTIGA LOCATÁRIA, OBJETIVANDO A RETIRADA DOS EQUIPAMENTOS, A REGULARIZAÇÃO DA SITUAÇÃO DO IMÓVEL NO ÓRGÃO MUNICIPAL DE MEIO AMBIENTE, O PAGAMENTO DE INDENIZAÇÕES POR DANOS MATERIAIS E MORAIS E A RECONSTRUÇÃO DO PISO. LIMINAR DEFERIDA PARA DETERMINAR A REMOÇÃO DOS EQUIPAMENTOS EM CINCO DIAS E A REALIZAÇÃO DE AVALIAÇÃO AMBIENTAL DA ÁREA, COM EFETIVA LIMPEZA DO IMÓVEL, EM TRINTA DIAS, SOB PENA DE MULTA DIÁRIA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA, CONCLUSIVA NO SENTIDO DE QUE NÃO TERIA SIDO CUMPRIDA A LIMINAR QUANTO À LIMPEZA DO LOCAL. DIREITO À INDENIZAÇÃO RECONHECIDO, MAS APENAS EM RELAÇÃO AOS DANOS MATERIAIS, EM VALOR A SER APURADO EM PROCEDIMENTO DE LIQUIDAÇÃO. SENTENÇA CONFIRMADA NO JULGAMENTO DAS APELAÇÕES. RENOVAÇÃO DO JULGAMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, DETERMINADA PELA QUINTA TURMA DO STJ NO RESP Nº 1.041.697/RS. DECLARATÓRIOS PARCIALMENTE ACOLHIDOS PARA SANAR OMISSÃO. NOVA VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC QUE NÃO FICOU CONFIGURADA. PROVA PERICIAL PRODUZIDA NO PROCEDIMENTO DE LIQUIDAÇÃO. DOCUMENTO QUE, CONQUANTO MENCIONADO, NÃO FOI UTILIZADO COMO RAZÃO DE DECIDIR PELO ACÓRDÃO DOS EMBARGOS. RESPONSABILIDADE PELA RETIRADA DOS EQUIPAMENTOS. MATÉRIA CUJA ANÁLISE DEMANDA O REEXAME DE FATOS E DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. ÓBICE DAS SÚMULAS NOS 5 E 7 DO STJ. ALEGADA VIOLAÇÃO DE NORMA CONTIDA EM RESOLUÇÃO. INADMISSIBILIDADE DO RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS. PEDIDO DE QUE O VALOR SEJA DEFINIDO EM LIQUIDAÇÃO. POSSIBILIDADE. ALEGAÇÃO DE QUE NÃO TERIA FICADO COMPROVADO O PREJUÍZO MENCIONADO PELOS AUTORES. REAPRECIAÇÃO DE MATÉRIA DE FATO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. IMPEDIMENTO À EXPLORAÇÃO DO IMÓVEL QUE SOMENTE FICOU CONFIGURADO A PARTIR DA DEVOLUÇÃO DAS CHAVES AOS PROPRIETÁRIOS. ALTERAÇÃO DO TERMO INICIAL DA INDENIZAÇÃO. PROCEDÊNCIA DA ALEGAÇÃO. CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE LIMPEZA DO LOCAL NO PRAZO DEFINIDO NA LIMINAR. PRAZO SUJEITO ÀS DETERMINAÇÕES DO ÓRGÃO MUNICIPAL DE MEIO AMBIENTE. PONTO QUE NÃO FOI OBJETO DE DEBATE E DECISÃO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM DEVIDO À PRECLUSÃO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. DISCUSSÃO SOBRE O CUMPRIMENTO DA LIMINAR NO CONCERNENTE À RETIRADA DOS EQUIPAMENTOS. ENTENDIMENTO DA SENTENÇA REFORMADO PELO TRIBUNAL NO NOVO JULGAMENTO DOS EMBARGOS. RESSARCIMENTO DOS VALORES DESPENDIDOS PELOS AUTORES NA RETIRADA DOS TANQUES REMANESCENTES. REFORMATIO IN PEJUS CONFIGURADA. MULTA DIÁRIA. PEDIDO DE REDUÇÃO DO VALOR, SOB A ALEGAÇÃO DE QUE SERIA EXCESSIVO. MATÉRIA CUJA DISCUSSÃO DEVERÁ AGUARDAR A DEFINIÇÃO, NO PROCEDIMENTO DE LIQUIDAÇÃO, A RESPEITO DO MOMENTO EM QUE FOI CUMPRIDA A ORDEM DE LIMPEZA DO TERRENO.

(omissis)

12. Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, parcialmente provido." (destaques aditados)

(STJ, REsp 1372596, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Quinta Turma, v.u., DJe 02/05/2013).

 

É essa a interpretação a ser dada ao pleito formulado, pois o autor não restringiu a realização da perícia à fase de conhecimento, até mesmo porque plenamente cabível sua realização na fase de liquidação, como visto, nomeado expert pelo próprio Juízo onde será cumprido o decisum condenatório. O pedido deve ser interpretado de forma a alcançar a maior proteção jurídica possível e a máxima efetividade do provimento exarado. Consoante o entendimento assente do C. STJ: "O pedido deve ser extraído da interpretação lógico-sistemática da petição inicial, a partir da análise de todo o seu conteúdo (AgRg no Ag 784.710/RJ, 3ª Turma, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe de 06.10.2010. No mesmo sentido: REsp 1.159.409/AC, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJe de 21.05.2010; e AgRg no Ag 1.175.802/MG, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 15.03.2010). Conforme se ressaltou no julgamento do REsp 1.107.219/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 23.09.2010, 'os pedidos devem ser interpretados como manifestações de vontade, de forma a tornar o processo efetivo, o acesso à justiça amplo e justa a composição da lide'. Vale menção, ainda, a ressalva feita no julgamento do AgRg no REsp 737.069/RJ, 3ª Turma, Rel. Min. Sidnei Beneti, DJe de 24.11.2009, de que 'não viola os arts. 128 e 460 do CPC a decisão que interpreta de forma ampla o pedido formulado pelas partes, pois o pedido é o que se pretende com a instauração da demanda'. Os precedentes acima denotam a posição consolidada do STJ quanto à necessidade de se conferir ao pedido uma exegese sistêmica, que guarde consonância com o inteiro teor da petição inicial, de maneira a conceder à parte o que foi efetivamente requerido, sem que isso implique decisão extra ou ultra petita" (STJ, REsp 1162643, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, v.u., DJe 17/08/2012).

 

X. CONCLUSÃO

Assim, deflui do conjunto probatório com total segurança, por um lado, que o terreno está inteiramente dentro da área de preservação ambiental, considerada a restrição de 500 metros, segundo a Lei nº 4.771/1965, e que, por outro, não se enquadra como área rural consolidada e não pode vir a ser regularizada, dado que sujeita a inundações, tampouco se verifica, na espécie, qualquer situação passível de exclusão da regra geral, ausente em especial a chamada "exceção da utilidade pública ou interesse social" para se pretender a manutenção da moradia erigida em área de preservação permanente, ainda mais quando não demonstrada a "inexistência de alternativa técnica e locacional" no momento de planejamento da edificação. A construção que se mostra desde sua concepção em desacordo à correlata normatização não pode ser beneficiada pela complacência do poder público mediante autorização de sua manutenção, justamente por violar ab initio o interesse público. Logo, verifica-se caracterizada a atuação ilegítima dos requeridos, consistente na manutenção de edificação e respectiva estrutura em violação aos normativos de proteção ao meio ambiente apontados, bem como estabelecido o nexo de causalidade entre sua conduta e o resultado lesivo, de maneira que é imperiosa a correspondente responsabilização pelo dano ambiental causado, com todas suas consequências, tais como a imposição de demolição, a restauração e a indenização.

 

XI. DO DISPOSITIVO

Ante o exposto, rejeito a preliminar arguida no apelo dos réus e lhe nego provimento, bem como dou provimento aos recursos do MPF e da União, bem como à remessa oficial, a fim de estabelecer a obrigação ao pagamento de indenização pelo dano ambiental causado, a ser quantificada em liquidação por arbitramento.

É o voto.

 

André Nabarrete

Desembargador Federal

 

 

 

 

 

 

 

 

 


E M E N T A

 

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANOS AMBIENTAIS. ÁREAS DE VÁRZEA E PRESERVAÇÃO PERMANENTE. OBRIGAÇÃO DE NÃO-FAZER. DEMOLIÇÃO DAS CONTRUÇÕES EXISTENTES. RECOMPOSIÇÃO DA COBERTURA VEGETAL. MULTA DIÁRIA.

1. Trata-se de recursos de apelação e reexame necessário, tido por submetido, em Ação Civil Pública, proposta pelo MINISTERIO PUBLICO FEDERAL em face de ADALTO LOPES e LUCIMARA DOS SANTOS LOPES, na qual foi acolhida parcialmente a pretensão para a recuperação de dano ambiental em área de preservação permanente, causada por edificação localizada às margens do Rio Paraná, no bairro Beira Rios, no Município de Rosana/SP.

2. Na sentença, o r. Juízo a quo reconheceu a faixa protetiva de 500 metros da margem do rio Paraná, uma vez que o imóvel pertencente aos corréus estaria totalmente inserido em área de preservação permanente. Em seus termos (ID Num. 107460811 - Págs. 62): Conforme bem definido pelo laudo técnico ambiental, o imóvel pertencente aos réus se encontra em Área de Preservação Permanente, situado que se encontra dentro da faixa de 500 metros da margem do rio Paraná.

3. Segundo o laudo técnico de constatação e avaliação de dano ambiental a área objeto da autuação é considerada de preservação permanente (APP), por se enquadrar no inciso 5, da alínea "a", do artigo 2°, da Lei Federal n° 4771/65 (Código Florestal) e alínea "e", inciso I, do artigo 3º, da Resolução CONANA n° 303/02.

4. Desnecessária a inclusão do Município de Rosana neste feito, rejeitando, assim, a referida preliminar. Com efeito, o caso em exame trata de danos ambientais causados pelo imóvel dos corréus em suposta área de preservação permanente. A Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/81) conceitua o poluidor como sendo “a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental” (art. 3º, IV). Nestes casos, a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que, nas demandas envolvendo dano ambiental, não se faz necessária a formação de litisconsórcio passivo.

5. O imóvel discutido se encontra a menos de 500 metros do leito do rio Paraná, em área de preservação permanente, na faixa marginal do curso d'água, violando a previsão do art. 2º da Lei nº 4.771/65.

6. A Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/81) estabelece que a indenização pode ser mera alternativa quando não for possível a recuperação ambiental.

7. No Relatório Técnico Ambiental elaborado pelo Superintendência do Estado de São Paulo do IBAMA, ao responder o quesito a respeito da recuperação ambiental na região, os técnicos responsáveis assim aduziram (ID Num. 107460328 - Pág. 24): n) O que pode ser feito para recompor a APP? - Através de um programa de reflorestamento para recomposição da Mata Ciliar original, medida essa visando o princípio da conservação ambiental local, sobretudo no controle eficaz de atividades a serem possivelmente exercidas na referida área; - Esse reflorestamento tende a recompor os ecossistemas da Mata Ciliar, favorecer a dispersão das espécies da flora local e regional, suprir de alimentos e nutrientes as cadeias alimentares dos ecossistemas terrestres e aquáticos locais, proporcionar condições biológicas a fauna local, controlar os processos erosivos visando a proteção do reservatório, regularizar os fluxos hídricos para o lençol freático, conservar e melhorar a qualidade da água, pela retenção de agentes contaminantes e de sedimentos que podem ser carreados ao curso d' água e valorizar a beleza cônica local e regional.

8. Assim, como existem provas de que a demolição das construções e o reflorestamento seriam suficientes para reparar o dano ambiental, entendo que se mostra desarrazoada a condenação do recorrido ao pagamento de indenização em dinheiro.

9. Nesse sentido, o E. Superior Tribunal de Justiça já decidiu que, demostrada a possibilidade de reparação plena da área degradada através da obrigação de fazer e de não fazer, é incabível a reparação indireta.

10. Quanto à condenação ao pagamento de multa cominatória diária de R$ 500,00 (quinhentos reais), em princípio, tenho que não se mostra cabível em demandas como a presente, uma vez que não há notícia nos autos de resistência fática da parte ré acerca das obrigações impostas na r. sentença.

11. Contudo, verifico que os corréus não impugnaram especificamente este ponto em seu recurso, razão pela qual não existe via processual apta para a modificação do quanto decidido, sob pena de reformatio in pejus.

12. Preliminar rejeitada. Recursos de apelação e ao reexame necessário, tido por submetido, improvidos.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu rejeitar a preliminar arguida no apelo dos réus e negar-lhe provimento, nos termos do voto do Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE (Relator), com quem votaram a Des. Fed. MARLI FERREIRA e o Des. Fed. MARCELO SARAIVA. Por maioria, decidiu negar provimento ao reexame necessário, tido por submetido, nos termos do voto do Des. Fed. MARCELO SARAIVA, com quem votaram a Juíza Fed. Conv. DIANA BRUNSTEIN e o Juiz Fed. Conv. SAMUEL MELO. Vencidos o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE (Relator) e a Des. Fed. MARLI FERREIRA, que davam provimento à remessa oficial. E, por maioria, decidiu negar provimento aos recursos de apelação do MPF e da União, nos termos do voto do Des. Fed. MARCELO SARAIVA, com quem votaram a Juíza Fed. Conv. DIANA BRUINSTEIN e o Juiz Fed. Conv. SAMUEL MELO. Vencidos o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE (Relator) e a Des. Fed. MARLI FERREIRA, que davam provimento aos recursos do MPF e da União, a fim de estabelecer a obrigação ao pagamento de indenização pelo dano ambiental causado, a ser quantificada em liquidação por arbitramento. Lavrará o acórdão o Des. Fed. MARCELO SARAIVA. A Juíza Fed. Conv. DIANA BRUNSTEIN votou na forma do art. 942, §1.º do CPC. O Juiz Fed. Conv. SAMUEL MELO (Gab. Des. Fed. MAIRAN MAIA da 6ª Turma), votou na forma dos artigos 53 e 260, § 1º do RITRF3 Ausente, justificadamente, em razão de férias, a Des. Fed. MÔNICA NOBRE (substituída pela Juíza Fed. Conv. DIANA BRUNSTEIN), nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.