Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0012867-96.2015.4.03.6105

RELATOR: Gab. 44 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA

APELANTE: JESSE JOSE DOS SANTOS

Advogado do(a) APELANTE: THAIS CARNIEL - SP254425-N

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma
 

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0012867-96.2015.4.03.6105

RELATOR: Gab. 44 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA

APELANTE: JESSE JOSE DOS SANTOS

Advogado do(a) APELANTE: THAIS CARNIEL - SP254425-N

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de Ação Penal Pública Incondicionada fundada em denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal contra JESSÉ JOSÉ DOS SANTOS, pela prática dos crimes definidos nos artigos 241-A e 241-B da Lei 8.069/90, c/c arts. 69 e 71 do Código Penal.

De acordo com a peça acusatória (Id 159540042, p. 03/07), “O denunciado, em datas incertas porém limitadas ao dia 12 de janeiro de 2016, consciente e voluntariamente disponibilizou, trocou, transmitiu publicou, divulgou, adquiriu, armazenou e possuiu em diversas oportunidades, através de sistema de informática, fotografias e vídeos contendo cenas de sexo explícito e cenas pornográficas envolvendo crianças e adolescentes. De modo autônomo, o DENUNCIADO dolosamente armazenou em meio telemático fotografias e vídeos contendo cenas de sexo explícito e cenas pornográficas envolvendo crianças e adolescentes.” .

Consta da denúncia que, no dia 12 de janeiro de 2016, foi cumprido mandado de busca e apreensão com o objetivo de apreender materiais relacionados à pedofilia na residência do acusado e que “Segundo o Laudo nº 34212017 (fis. 118/129), foram encontradas nos discos rígidos examinados 263 (duzentas e sessenta e três) imagens e 06 (seis) vídeos envolvendo cenas de sexo explícito e pornográficas com a participação de crianças e adolescentes.

Tais imagens e vídeos foram encontrados na pasta do aplicativo Emule, o que comprova que os arquivos foram compartilhados pelo DENUNCIADO com outros usuários do programa” (Id159540042, p. 03/07).

Ainda, segundo o MPF, também foram encontradas miniaturas de imagens de cunho pedofílico em arquivos do programa de compartilhamento Shareaza, indicando que outras imagens de pornografia envolvendo crianças e adolescentes também foram compartilhadas pelo acusado por intermédio do referido aplicativo.

A denúncia foi recebida em 30/11/2017 (Id 159540042, p. 08/09).

Regularmente processado o feito, sobreveio sentença, tornada pública em 12/05/2020 (Id 159540042, p. 105/112), por meio da qual o magistrado a quo julgou procedente a pretensão punitiva do Estado e condenou JESSÉ JOSÉ DOS SANTOS pela prática dos crimes previstos nos artigos 241-A e 241-B da Lei 8.069/90, c/c arts. 69 e 71 do Código Penal, à pena privativa de liberdade de 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 22 (vinte e dois) dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salário-mínimo.

Em sede de apelação, JESSÉ JOSÉ DOS SANTOS pleiteia sua absolvição, sob o fundamento na ausência de materialidade do crime previsto no art. 241-A da Lei 8.069/90, pois não haveria prova do compartilhamento de arquivos para terceiros (Id 160554524).

Sustenta também a nulidade da sentença baseada no laudo pericial assinado por apenas um perito.

O Apelante pleiteia, ainda, a aplicação do princípio da consunção entre os crimes, aplicando-se apenas a pena referente ao crime previsto no art. 241-B da Lei 8.069/90.

Contrarrazões da acusação apresentadas no Id 161273236.

Nesta Corte, a Procuradoria Regional da República apresentou parecer opinando pelo desprovimento do apelo defensivo (ID 161321701).

É o relatório.

À revisão.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma
 

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0012867-96.2015.4.03.6105

RELATOR: Gab. 44 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA

APELANTE: JESSE JOSE DOS SANTOS

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APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

 

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V O T O

 

 

 

Da ausência de nulidade

O Apelante aduz a nulidade da sentença baseada no laudo pericial assinado por apenas um perito, nos termos da Súmula 361 do STF.

Todavia, a referida Súmula não se aplica ao caso concreto porque ela se refere ao artigo 159, § 1º, do Código de Processo Penal, que estabelece que “na falta de perito oficial, o exame será realizado por 2 (duas) pessoas idôneas, portadoras de diploma de curso superior preferencialmente na área específica, dentre as que tiverem habilitação técnica relacionada com a natureza do exame”

A contrario sensu, se a perícia for feita por perito oficial, como ocorreu no caso, ela pode ser realizada por apenas um perito.

Nesse sentido, o entendimento da jurisprudência:

 

PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ART. 241-B DA LEI N. 8.069/90 (ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - ECA). PORNOGRAFIA INFANTIL. 1) VIOLAÇÃO AO ART. 159, § 1º, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - CPP. LAUDO PERICIAL ASSINADO POR UM PERITO NÃO OFICIAL. 2) AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. Esta Corte tem entendido pela validade dos exames periciais assinados por apenas um perito oficial, como o caso dos autos. A exigência de o laudo técnico ser assinado por dois peritos se faz somente quando se tratar de especialistas não oficiais (AgRg no AREsp 584.982/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, DJe 21/3/2018).

1.1. Perito oficial é aquele investido no cargo por lei, caracterizando-se como auxiliar da justiça, submetendo-se, inclusive, às mesmas causas de suspeição e impedimento impostas ao magistrado (AgRg no AREsp 584.982/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, DJe 21/3/2018).

1.2. No caso concreto, o laudo pericial no computador foi realizado em laboratório público por uma pessoa idônea, perito não oficial (embora servidor público), motivo pelo qual foi afastada a materialidade delitiva e absolvido o agravado.

2. Agravo regimental desprovido.

(AgRg no AgRg no AREsp n. 1.552.364/RJ, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 6/10/2020, DJe de 13/10/2020.)

 

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. NULIDADE DA PROVA PERICIAL PRODUZIDA. ELABORAÇÃO POR PERITO OFICIAL DO JUÍZO. DESNECESSIDADE DE O LAUDO SER ASSINADO POR DOIS PERITOS OFICIAIS.

1. "[..] esta Corte Superior entende que 'mesmo quando o art. 159 do CPP, com a redação dada pela Lei 8.862/94, exigia que o laudo fosse assinado por dois peritos oficiais, não gerava nulidade o fato de serem os esclarecimentos ao laudo pericial assinados por um único perito oficial' (APn 593/MT, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, CORTE ESPECIAL, julgado em 17/12/2012, DJe 07/02/2013)."

(AgRg no AREsp 1278943/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 07/06/2018, DJe 15/06/2018). NULIDADE. ALEGADO CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERIMENTO DE PRODUÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL REQUERIDA. DECISÃO JUDICIAL FUNDAMENTADA. ILEGALIDADE NÃO CARACTERIZADA.

1. Ao magistrado é facultado o indeferimento, de forma fundamentada, da produção de provas que julgar protelatórias, irrelevantes ou impertinentes, devendo a sua imprescindibilidade ser devidamente justificada pela parte. Doutrina. Precedentes do STJ e do STF. 2. Na hipótese em apreço, verifica-se que foram declinadas justificativas plausíveis para a negativa de repetição do depoimento da testemunha já ouvida anteriormente, circunstância que afasta a alegada ilegalidade.

3. De acordo com o artigo 565 do Código de Processo Penal, "nenhuma das partes poderá argüir nulidade a que haja dado causa, ou para que tenha concorrido, ou referente a formalidade cuja observância só à parte contrária interesse". PLEITO ABSOLUTÓRIO. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. NECESSIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO IMPROVIDO.

1. O colegiado estadual concluiu acerca da suficiência de provas que corroborassem a acusação, destacando as palavras coerentes da vítima, aliada aos demais depoimentos e provas carreadas aos autos, que orientaram no sentido de sua condenação pela prática delitiva.

2. Dessa forma, a pretensão defensiva de absolvição, dependeria de novo exame do conjunto fático-probatório produzido nos autos, providência vedada conforme o enunciado n. 7 da Súmula deste Superior Tribunal de Justiça.

3. Agravo improvido.

(AgRg no AgRg no AREsp n. 411.371/SP, relator Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 6/6/2019, DJe de 12/6/2019.)

 

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PENAL. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. ENUNCIADO N. 182 DA SÚMULA DO STJ. INSURGÊNCIA NÃO CONHECIDA. 1. No caso dos autos, enquanto a decisão de inadmissibilidade assentou a impossibilidade de análise de matéria constitucional na via especial e os óbices das Súmulas n. 7 e 83/STJ, no agravo em recurso especial a defesa limitou-se a repetir os fundamentos apresentados no apelo nobre, deixando de mencionar a impossibilidade de análise de matéria constitucional na via especial e a harmonia da decisão recorrida com a jurisprudência deste Sodalício.

2. Deixando a parte agravante de impugnar especificamente os fundamentos da decisão agravada, é de se aplicar o enunciado n. 182 da Súmula do STJ. HOMICÍDIO QUALIFICADO PELO MOTIVO FÚTIL E PELO RECURSO QUE DIFICULTOU A DEFESA DA VÍTIMA. NULIDADE DA PROVA PERICIAL PRODUZIDA. ELABORAÇÃO POR PERITO OFICIAL DO JUÍZO. DESNECESSIDADE DE O LAUDO SER ASSINADO POR DOIS PERITOS OFICIAIS.

1. Perito oficial é aquele investido no cargo por lei, caracterizando-se como auxiliar da justiça, submetendo-se, inclusive, às mesmas causas de suspeição e impedimento impostas ao magistrado. 2. Esta Corte tem entendido pela validade dos exames periciais assinados por apenas um perito oficial, como o caso dos autos. A exigência de o laudo técnico ser assinado por dois peritos se faz somente quando se tratar de especialistas não oficiais. ALEGADA NULIDADE DA AÇÃO PENAL. SORTEIO DA LISTA DE JURADOS. FALTA DE INTIMAÇÃO DOS DEFENSORES NOMEADOS. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 432 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. ILEGALIDADE NÃO CARACTERIZADA.

1. O artigo 432 do Código de Processo Penal prevê a notificação do Ministério Público, da Ordem dos Advogados do Brasil e da Defensoria Pública para acompanharem o sorteio da lista de jurados, inexistindo qualquer previsão legal para a cientificação dos patronos dos acusados para tal ato.

2. Ainda que assim não fosse, de acordo com o inciso V do artigo 571 da Lei Processual Penal, as nulidades ocorridas após a pronúncia devem ser arguidas logo depois de anunciado o julgamento e apregoadas as partes, sendo que da ata da sessão de julgamento acostada aos autos não se verifica que a defesa tenha se insurgido quanto à falta de notificação pessoal sobre o sorteio dos jurados, pelo que se constata a preclusão do exame do tema. IMPARCIALIDADE DOS JURADOS. RECONHECIMENTO. NECESSIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. IMPOSSIBILIDADE. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ. RECURSO IMPROVIDO.

Tendo a Corte estadual concluído, de forma fundamentada, que as manifestações pacíficas ocorridas durante o julgamento não macularam a imparcialidade dos jurados, desconstituir o entendimento do Tribunal de origem quanto ao ponto exigiria o reexame do conjunto fático-probatório dos autos, providência inviável na via eleita, ante o óbice da Súmula 7/STJ. DECISÃO EM PROCESSO ADMINISTRATIVO DE DEMISSÃO DO AGRAVANTE DO CARGO DE DELEGADO DE POLÍCIA. UTILIZAÇÃO EM PLENÁRIO. NULIDADE DO JULGAMENTO. ARGUMENTO DE AUTORIDADE. INOCORRÊNCIA. ROL TAXATIVO.

AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. O art. 478 do CPP descreve as hipóteses que configuram nulidade processual pela utilização de certas decisões como argumento de autoridade, sendo que a utilização de documentos relacionados à processo de demissão do agravante do cargo de delegado de polícia não se adequa a tais hipóteses, não havendo que se falar em ofensa à ampla defesa e, consequentemente, em nulidade.

2. Nessa toada, a Corte de origem concluiu em harmonia com o entendimento deste Sodalício no sentido de que o rol previsto no art. 478 do Código de Processo Penal é taxativo, não comportando interpretações ampliativas.

3. O princípio pas de nullité sans grief, há muito consagrado por esta Corte Superior, impede a declaração de nulidade sem a demonstração de prejuízo, o que notadamente não se verifica in casu. PLEITO ABSOLUTÓRIO. AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA DO RECURSO QUE DIFICULTOU A DEFESA DA VÍTIMA. IMPOSSIBILIDADE. SOBERANIA DO VEREDICTO DO TRIBUNAL DO JÚRI. DECISÃO CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. RECONHECIMENTO. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO N.º 7 DA SÚMULA DO STJ.

1. No procedimento relativo aos crimes contra a vida, ao órgão recursal se permite apenas a realização de um juízo de constatação acerca da existência de suporte probatório para a decisão tomada pelos jurados integrantes do Tribunal do Júri, somente se admitindo a cassação do veredicto caso este seja flagrantemente desprovido de elementos mínimos de prova capazes de sustentá-lo.

2. A Corte de origem, após aprofundada reapreciação dos elementos constantes dos autos, concluiu, de modo fundamentado, que a versão acolhida pelo Tribunal Popular para condenar o réu pelo crime de homicídio qualificado está amparada no acervo probatório colhido durante a instrução processual.

3. É inviável, por parte desta Corte Superior de Justiça, a análise acerca da aptidão das provas para a manutenção do édito condenatório, porquanto a verificação do conteúdo dos elementos de convicção produzidos no curso do feito implicaria o aprofundado revolvimento de matéria fático-probatória, providência que é vedada na via eleita. Precedentes. DOSIMETRIA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DA SANÇÃO INICIAL ESTABELECIDA. REITERAÇÃO DE PEDIDO. MATÉRIA JÁ DEBATIDA NO ÂMBITO DE HABEAS CORPUS. 1. Caso em que a pretensão de revisão da sanção inicial estabelecida já foi analisada em prévio habeas corpus impetrado nesta Corte Superior, circunstância que impede sua apreciação no âmbito deste agravo em recurso especial, por se tratar de reiteração de pedido.

2. Agravo não conhecido.

(AgRg no AREsp n. 1.260.812/MG, relator Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 7/6/2018, DJe de 15/6/2018.)

 

                        Fica afastada, portanto, a alegação de nulidade.

 

Da materialidade e autoria delitivas

A materialidade e a autoria foram devidamente comprovadas nos autos pelo: i) relatório encaminhado pelo NCMEC (National Center for Missing & Exploited Children) ao GECOP – Grupo Especial de Combate aos Crimes de Ódio e à Pornografia Infantil na Internet, da Polícia Federal do Brasil, noticiando que foram encontrados 7 (sete) arquivos contendo pornografia infantil no Skydrive, armazenadas por usuário titular da conta de e-mail johny12boy@live.com, bem como que este realizou acessos a referido serviço por meio do endereço de IP 186.214.58.68. Após efetuar o georreferenciamento do endereço de IP que o disponibilizava, restou comprovado que os acessos partiam da região de Campinas/SP (Id. 159540040 – pág. 11); ii) auto circunstanciado de busca e arrecadação lavrado em sede do Inquérito Policial n.º 1.098/2013 no qual foram apreendidos 3 HDs no quarto da residência do Apelante (id. 159540040 – pág. 100); iii) Laudo de Perícia Criminal Federal nº 342/2017 (id. 159540041 – pág. 9), que aponta que foram encontradas nos discos rígidos examinados 263 (duzentas e sessenta e três) imagens e 6 (seis) vídeos envolvendo cenas de sexo explícito e pornográficas com a participação de crianças e adolescentes, na pasta do aplicativo Emule, o que comprova que os arquivos foram compartilhados por Jessé com outros usuários do programa. O laudo também aponta que foram encontradas miniaturas de imagens de cunho pedofílico em arquivos do programa de compartilhamento Shareaza, indicando que outras imagens de pornografia envolvendo crianças e adolescentes também foram compartilhadas pelo acusado por intermédio do referido aplicativo.

O auto de prisão em flagrante delito e os depoimentos prestados perante o Juízo pelas testemunhas arroladas pela acusação são elementos que confirmam a autoria.

Ademais, conforme consignado na sentença, não são críveis as alegações do Réu de que não sabia da existência dos arquivos ou do seu compartilhamento, eis que “não há dúvidas de que o réu possui bons conhecimentos de informática e detém conhecimento dos mecanismos de funcionamento dos programas de compartilhamento que foram utilizados em seus equipamentos uma vez que é técnico em informática, com ensino superior completo. Trata-se, portanto, de pessoa com plena capacidade para verificar a existência de arquivos de conteúdo pedofílico contidos em seus discos rígidos, bem como par reconhecer os diversos riscos de não formatar um HD adquirido de terceiros” (Id 159540058).

Fato é que o Laudo de Perícia Criminal Federal nº 342/2017 - NUTEC/DPF/CAS/SP (págs. 09/19 - ID 38792448) atestou que foram encontrados nos discos rígidos examinados 263 (duzentos e sessenta e três) imagens e 6 (seis) vídeos envolvendo cenas de sexo explícito e pornográfico com a participação de crianças e adolescentes. Tais imagens e vídeos foram encontrados na pasta do aplicativo “eMule”, um programa de compartilhamento “peer-to-peer”.

Nesse tipo de programa, conforme apontado pelo MPF, em contrarrazões, usuários realizam o download dos arquivos do computador de outros usuários, e não de um servidor centralizado. Ao terem os arquivos em sua máquina, ficam os arquivos disponíveis para que outros usuários possam obtê-los diretamente de seu computador. Assim, restou claro que além de armazenar os arquivos para si, JESSÉ ainda os disponibilizou para outros usuários.

Ademais, foram encontradas miniaturas de imagens de cunho pedofílico em arquivos do programa “Shareaza”, também “peer-to-peer”, indicando que outras imagens de pornografia envolvendo crianças e adolescentes também foram compartilhadas pelo acusado por intermédio do referido aplicativo.

E a própria utilização de programas “P2P”, por si só, já implica compartilhamento de material, não se fazendo necessária a realização de troca por qualquer outro aplicativo ou rede social.

A perícia também constatou que: “há evidências de que também esteve instalado o programa de compartilhamento de nome Shareaza, pois havia uma pasta de nome ‘Shareaza Downloads’”; que nesta pasta havia o arquivo “Thumbs.db”, que “é criado pelo sistema para armazenar miniaturas das imagens que existem na pasta, com o objetivo de acelerar a visualização de miniaturas dos arquivos quando é feita uma navegação para pasta através de programas como por exemplo o ‘Windows Explorer’”; que “o ‘Thumbs.db’ mantém as miniaturas das imagens mesmo depois que estas são removidas da pasta” e “com isso ele funciona como um histórico de evidências de imagens que foram anteriormente armazenadas na pasta onde ele se encontra”; que “observando o conteúdo deste repositório de miniaturas, mesmo com o tamanho reduzido das imagens, é possível perceber que nesta pasta existiram arquivos de pornografia infantil” (id. 159540041 – pág. 11/12).

Verifica-se, portanto, que os diversos elementos probatórios encontrados no computador demonstram que o apelante armazenava e compartilhava material sexual envolvendo crianças e adolescentes, não sendo crível que ele não tivesse conhecimento a respeito do conteúdo de pornografia infantil que armazenava e compartilhava.

Não há razões, portanto, para reforma da sentença recorrida, uma vez que foram comprovados todos os elementos do tipo penal.

 

Do não aplicação do princípio da consunção

Os crimes descritos nos arts. 241-A e 241-B da Lei nº 8.069/90 constituem condutas distintas e autônomas. O armazenamento de arquivos com conteúdo pedófilo, que caracteriza o tipo penal do art. 241-B do ECA não é etapa ou meio necessário para o compartilhamento de arquivos pedófilos com outras pessoas (art. 241-A), até porque o material armazenado pode ser diverso daquele compartilhado.

No caso, o que se tem é uma conduta permanente autônoma (compartilhar acervo de fotografias e vídeos de pornografia infantil). Não há qualquer relação de dependência ou subordinação entre as condutas, não se cogitando de aplicação do princípio da absorção ou da consunção. Nesse sentido já decidiu a Quarta Seção deste Tribunal:

 

REVISÃO CRIMINAL. NÃO CONHECIMENTO DE UM DOS PEDIDOS FORMULADOS ANTE A EXARAÇÃO DE PROVIMENTO MERITÓRIO PELO C. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 105, I, E, E 108, I, B, AMBOS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PROTEÇÃO À COISA JULGADA E HIPÓTESES DE CABIMENTO. CASO CONCRETO. DANO NO "HD" APREENDIDO. IMPOSSIBILIDADE DE PRODUÇÃO DE CONTRAPROVA. OFENSA AO PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO AFASTADA. PREJUÍZO PELA NEGATIVA DE PRODUÇÃO DE PROVA NOVA REFUTADO. APRESENTAÇÃO ESPONTÂNEA PARA CUMPRIMENTO DA PENA IMPOSTA. NECESSIDADE DE APLICAÇÃO DO ART. 66 DO CÓDIGO PENAL. IMPROCEDÊNCIA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO ENTRE OS DELITOS PREVISTOS NOS ARTS. 241-A E 241-B, AMBOS DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, E AFASTAMENTO DAS FIGURAS DO CRIME CONTINUADO E DO CONCURSO MATERIAL DE INFRAÇÕES. IMPOSSIBILIDADE. PEDIDO REVISIONAL CONHECIDO EM PARTE PARA SER JULGADO IMPROCEDENTE. (...) - Impossível o acolhimento do requerido, uma vez que as condutas típicas insculpidas nos arts. 241-A e 241-B, ambos do Estatuto da Criança e do Adolescente, visam, a despeito de tutelarem nossas crianças e nossos adolescentes, coibir práticas por demais graves ocorrentes na sociedade que não se mostram necessariamente inseridas uma no bojo da outra, podendo, desta feita, ser cometidas em concomitância sem que haja a possibilidade de se reconhecer a ideia de que uma foi crime-meio para a prática criminosa fim. - O art. 241-A pune, basicamente, a conduta daquele que compartilha (por meio das diversas formas descritas nos núcleos constantes do tipo penal), por qualquer meio, inclusive sistema de informática ou telemático, material pornográfico envolvendo criança ou adolescente ao passo que o art. 241-B almeja punir o armazenamento de material pornográfico no contexto envolvendo criança ou adolescente, não havendo, assim, confusão ou superposição entre as condutas imbricadas penalmente a permitir o reconhecimento da consunção. Importante ser destacado que o cometimento de uma das figuras típicas não gera necessariamente a perpetração da outra (donde se conclui a necessidade imperiosa do elemento volitivo, ou seja, de desígnios autônomos para a tipificação de cada qual) da mesma forma que, tendo sido levada a efeito aquela cujo apenamento é mais gravoso, não se nota relação de crime meio X crime fim a permitir o assentamento apenas da prática criminosa final, o que corrobora a impossibilidade de se reconhecer a consunção vindicada. Precedentes deste E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região - Especificamente no que tange ao caso retratado na relação processual penal subjacente, nota-se a impossibilidade de se reconhecer a consunção pugnada na justa medida em que, além de objetividades jurídicas distintas protegidas por cada tipo penal mencionado anteriormente, nota-se a independência tanto de momentos consumativos como de elementos volitivos do revisionando quando da perpetração dos delitos, o que reforça o posicionamento segundo o qual não se deve acolher o requerido ora em apreciação. - Impossível o afastamento, também requerido, da figura do crime continuado em relação ao cometimento do delito previsto no art. 241-A do Estatuto da Criança e do Adolescente tendo em vista a devida comprovação, no bojo do Feito nº 0005850-14.2011.403.6181, de que houve o compartilhamento de 75 arquivos pornográficos, o que enseja a correta regência contida no art. 71 do Código Penal quando da fixação da pena pelo crime indicado, não havendo que se cogitar em crime único (tal qual aduzido) exatamente porque o compartilhamento de 75 arquivos indica o oposto: para cada download de rigor o assentamento de crime autônomo e, diante do cumprimento dos requisitos inerentes ao crime continuado, necessária a exasperação da reprimenda tal qual lançada pelo Eminente Desembargador Federal Relator do feito subjacente. - Revisão criminal conhecida parcialmente e, na parte conhecida, julgado improcedente o pedido. Pedido liminar prejudicado.

(RvC 0004046-17.2017.4.03.0000, Quarta Seção, v.u., Rel. Des. Federal Fausto De Sanctis, j. 16.08.2018, e-DJF3 Judicial 1 24.08.2018)

 

O E. Superior Tribunal de Justiça também já firmou o entendimento no sentido de que os crimes dos arts. 241-A e 241-B do ECA são autônomos, considerando que o crime do art. 241-B do ECA não constitui fase normal ou meio de execução para o delito do art. 241-A do ECA:

 

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PORNOGRAFIA INFANTIL. ARTS. 241-A (DIVULGAR) E 241-B (ARMAZENAR), DA LEI 8.069/90. CONSUNÇÃO DO CRIME DE ARMAZENAR PELO DE DIVULGAR MATERIAL PORNOGRÁFICO. CRIMES AUTÔNOMOS. PRECEDENTES DO STJ. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO IMPROVIDO.

1. Caso em que o agravante armazenou "cerca de 2.300 (dois mil e trezentos) vídeos e 8.000 (oito mil) fotos contendo nudez e/ou sexo explícito envolvendo crianças e/ou adolescentes, bem como compartilhou de 20 (vinte) arquivos do mesmo jaez por meio do programa Ares Galaxy e 1 (um) vídeo de pornografia infantil foi transferido por meio do programa "Skype."

2. "O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que o crime previsto no art. 241-B não configura fase normal nem meio de execução para a prática do delito do art. 241-A, ambos do Estatuto da Criança e do Adolescente, tratando-se de tipos penais autônomos. De fato, é possível que alguém compartilhe sem efetivar armazenamento, como pode realizar o armazenamento sem a transmissão.

Ou seja, são efetivamente verbos e condutas distintas, que podem ter aplicação autônoma" (AgRg no REsp 1875645/PR, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 18/08/2020, DJe 25/08/2020).

3. A análise da incidência de consunção, ou não, entre os delitos dos arts. 241-A e 241-B, da Lei 8.069/90, por tratar de matéria estritamente de direito que foi abordada, no caso específico, pelo Tribunal de origem em contraste com a jurisprudência desta Corte, prescinde do revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos, não havendo falar na incidência da Súmula 7/STJ.

4. Agravo regimental improvido.

(AgRg no REsp n. 1.922.868/SP, relator Ministro Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região), Sexta Turma, julgado em 21/9/2021, DJe de 27/9/2021.)

 

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ARTIGOS 241-A E 241-B, AMBOS DA LEI N. 8.069/90 (ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - ECA). PORNOGRAFIA INFANTIL. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. ARMAZENAR E TRANSMITIR. CONDUTAS AUTÔNOMAS. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. As condutas de armazenamento de arquivos de pornografia infantojuvenil e posterior transmissão parcial dos referidos arquivos denotam autonomia apta a configurar o concurso material, afastando-se a tese defensiva de aplicação do princípio da consunção.

2. Agravo regimental desprovido.

(AgRg no AREsp n. 1.471.304/PR, Quinta Turma, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, j. 10.12.2019, DJe 19.12.2019)

 

AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. ARTS. 241-A e 241-B DO ECA. CONCUSSÃO. CONCURSO FORMAL. UTILIZAÇÃO DO WRIT COMO SUCEDÂNEO DE REVISÃO CRIMINAL. INADMISSIBILIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO VERIFICADO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.

1. A via do habeas corpus mostra-se inadmissível, porque utilizada como sucedâneo de revisão criminal, sendo certo que o REsp n. 1.945.881/RS, interposto contra o acórdão da apelação, foi improvido por esta Corte. A tese do agravante de que o writ poderia ser utilizado como sucedâneo recursal não se aplica à fundamentação contida na decisão ora agravada.

2. O Tribunal a quo, no julgamento dos apelos defensivo e ministerial, reconhecendo a autonomia entre as condutas perpetradas - armazenamento (art. 241-B, do ECA) e disponibilização (art. 241-A, do ECA), aplicou corretamente o concurso material entre os referidos delitos, bem como, ao julgar os segundos embargos de declaração, rechaçou, fundamentadamente, a aplicabilidade do princípio da consunção ou do concurso formal.

3. Agravo regimental improvido.

(AgRg no HC n. 728.639/RS, Sexta Turma, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, j. 16.8.2022, DJe 22.8.2022)

 

No mesmo sentido, a posição do Supremo Tribunal Federal (STF), como se verifica pela leitura da seguinte ementa:

 

AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. ARMAZENAMENTO E DIVULGAÇÃO DE PORNOGRAFIA INFANTIL. CRIMES AUNÔNOMOS. PRETENDIDA ABSORÇÃO. NECESSÁRIO REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. HABEAS CORPUS INDEFERIDO. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

I – São autônomos os delitos de armazenamento de pornografia infantil (ECA, art. 241-B) e divulgação de pornografia infantil (ECA, art. 241-A), quando não houver identidade entre os respectivos conteúdos.

II – Para o acolhimento da tese defensiva ' consunção entre os delitos de armazenamento e divulgação de pornografia infantil ', seria indispensável o reexame de todo conjunto fático-probatório que levou as instâncias inferiores a concluírem pela “ausência de estrita correspondência entre os arquivos armazenados com os que foram divulgados”, fato esse inviável na via estreita do habeas corpus, que não admite dilação probatória.

III – Agravo regimental a que se nega provimento.

(HC 187.900 AgR/SP, Segunda Turma, Rel. Ministro Nunes Marques, j. 17.05.2021, DJe-098, Publicação 24.05.2021)

Por isso, mantenho a condenação do Apelante pela prática, em concurso material, dos crimes tipificados nos arts. 241-A e 241-B da Lei nº 8.069/90, conforme narrados na denúncia.

As penas-bases dos crimes dos arts. 241-A e 241-B da Lei nº 8.069/90 foram aplicadas no mínimo legal, inexistindo circunstâncias atenuantes e agravantes, tendo o crime continuado acertadamente considerado, incidente no mínimo de 1/6 (um sexto), não havendo, pois reparos a serem feitos da sentença de primeiro grau, fixada no total, considerado o concurso material em 04 anos e 08 meses de reclusão, no regime inicial semiaberto, não sendo a hipótese de substituição da pena corporal em restritivas de direito.  

Dispositivo

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação da defesa.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

 

PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. PEDOFILIA. ART. 241-A e 241-B DA LEI Nº 8.069/90. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - ECA. MATERIALIDADE. AUTORIA. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. INAPLICABILIDADE. APELAÇÃO DESPROVIDA.

1. Validade dos exames periciais assinados por apenas um perito oficial, como o caso dos autos. A exigência de o laudo técnico ser assinado por dois peritos se faz somente quando se tratar de especialistas não oficiais.

2. Materialidade e autoria comprovados. A perícia forense provou o armazenamento e compartilhamento de dados com conteúdo pedófilo a partir do computador do apelante.

3. Os arquivos armazenados no computador pessoal do apelante, bem como o compartilhamento de material pedófilo, tudo obtido na análise pericial do seu computador, comprovam que ele realmente tinha conhecimento do conteúdo pedófilo compartilhado na internet.

4. O E. Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento no sentido de que os crimes dos arts. 241-A e 241-B do ECA são autônomos, considerando que o crime do art. 241-B do ECA não constitui fase normal ou meio de execução para o delito do art. 241-A do ECA.  Portanto, revejo meu entendimento para acompanhar a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e aplicar o concurso material de crimes.

5. Apelação da defesa desprovida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu NEGAR PROVIMENTO à apelação da defesa, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.