Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5017504-06.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 19 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS

AGRAVANTE: FORTEBRAS ARTIGOS PARA PRESENTES LTDA

Advogado do(a) AGRAVANTE: DANIEL BETTAMIO TESSER - SP208351-A

AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5017504-06.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 19 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS

AGRAVANTE: FORTEBRAS ARTIGOS PARA PRESENTES LTDA

Advogado do(a) AGRAVANTE: DANIEL BETTAMIO TESSER - SP208351-A

AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de agravo de instrumento interposto em face da r. decisão que, em sede de ação pelo rito comum, indeferiu pedido de tutela provisória de urgência para continuidade do procedimento de desembaraço aduaneiro, mediante a liberação de mercadorias importadas.

Por sua vez, insurge-se a parte agravante sustentando em síntese que: (i)- na hipótese de constatação de subfaturamento dos produtos importados, impossível a retenção, tendo em vista que a infração sujeita-se a pena de multa; (ii)- há mais de um ano da retenção não há auto de infração lavrado; (iii)- “enquanto a Fiscalização deixa a Agravante de mãos atadas, condicionando a liberação ao pagamento das multas concomitantemente à retenção – sem a lavratura do Auto de Infração, as despesas de armazenagem seguem crescendo exponencialmente”; (iv)- “no que tange à eventual garantia, vale ressaltar ainda ser um reflexo da diferença tributária porventura constituída pela Agravada, que, no caso concreto, limitar-se-ia aos tributos, ao passo que as multas, por sua vez, não podem ser cobradas da mesma maneira, sobretudo por disporem de ferramentas próprias para tanto, especialmente condicionando a liberação das mercadorias ao seu pagamento”; (v)- “reside a ilegalidade na retenção de mercadorias como meio coercitivo ao recolhimento de diferenças tributárias e multas aduaneiras”; (vi)- “Devido à incessante retenção – que já perdura há mais de um ano, a Agravante já realizou o pagamento de R$ 125.135,27 a título de armazenagem [...]. Sem prejuízo dos valores pagos, encontram-se pendentes novas cobranças referentes à armazenagem no valor de R$ 290.800,15 (mais do que a própria operação)”.

Com tais fundamentos, pede o provimento do recurso para “a imediata liberação dos bens amparados pela Declaração de Importação n° 22/0915128-6, i) sem a prestação de garantias; ou, subsidiariamente, ii) mediante Carta Fiança no valor das diferenças tributárias, excluídas as multas, ou iii) depósito judicial, também no valor das diferenças tributárias, excluídas as multas”.

O requerimento de antecipação dos efeitos da tutela recursal foi indeferido.

Pedido de reconsideração.

Com contraminuta.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5017504-06.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 19 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS

AGRAVANTE: FORTEBRAS ARTIGOS PARA PRESENTES LTDA

Advogado do(a) AGRAVANTE: DANIEL BETTAMIO TESSER - SP208351-A

AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

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V O T O

 

 

 

Nos termos do artigo 294 do CPC, “a tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência”, sendo que, conforme preveem os artigos 300 e 311 do CPC:

Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

§ 1 o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.

§ 2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.

§ 3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.  (g.n.)

Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:

I - ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte;

II - as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante;

III - se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa;

IV - a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável.

Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente.

Nesse sentido, tratando-se o pedido formulado pela agravante de tutela de urgência, mister se faz a demonstração, pela parte postulante, da probabilidade do direito e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo.

Por probabilidade do direito, deve-se entender a subsunção clara e inequívoca da norma geral e abstrata ao caso individual e concreto debatido nos autos, não dispensando ao órgão julgador maiores aprofundamentos sobre a matéria, mormente porquanto a análise que se faz, em tal momento, é de cognição sumária do mérito.

Cumpre destacar que a finalidade precípua de tal remédio processual é, em apertada síntese, assegurar que a parte que efetua o pedido potencialmente procedente não será prejudicada por eventual morosidade dos trâmites processuais, evitando, assim, que, neste ínterim, obtenha algum dano ou que haja prejuízo à tutela final.

Consigne-se, ainda, que a norma processual civil estabelece mais um requisito para a concessão da tutela de urgência, qual seja, a reversibilidade dos efeitos da decisão (artigo 300, parágrafo 3º, CPC), sendo possível, em determinadas hipóteses, a responsabilização por prejuízos que a efetivação da tutela causar à parte adversa (artigo 302 do CPC).

De todo o exposto, conclui-se que a tutela antecipada em caráter de urgência se configura medida excepcional no sistema jurídico vigente, razão pela qual deve ser deferida somente em hipóteses restritas, nas quais restar demonstrada, de forma patente, o preenchimento dos requisitos retromencionados.

No caso dos autos, a agravante ajuizou a ação em face de ato administrativo que interrompeu despacho aduaneiro referente à importação de 37.020 (trinta e sete mil e vinte) unidades de máquinas de barbear e máquinas de cortar cabelo em variados modelos, tendo-as registrado sob a Declaração de Importação n° 22/0915128-6.

Em resumo, a agravante sustenta que incabível a exigência “de multas e diferenças tributárias como condição à liberação dos bens”.

Por sua vez, a r. decisão agravada indeferiu a tutela provisória de urgência, em síntese, mediante os seguintes argumentos:

    [...].

    De início, para a compreensão dos temos nos quais posta a demanda, é preciso levar em conta que:

    (a) A demandante, segundo exposto no item 17 da peça vestibular, não impugna, na presente demanda, o motivo do ato administrativo (subfaturamento).

    (b) A parte autora não está discutindo judicialmente a aplicação das multas, conforme item 72 da exordial.

    Desse modo, a irresignação centra-se na morosidade administrativa e na ausência de fundamento jurídico para a retenção das mercadorias, distinguindo-se o caso subjacente ao apreciado pelo STF ao enfrentar o tema 1.042 do caso dos autos.

    É a suma do pleito liminar.

    Apesar do custo e risco aos bens, reputa-se ausente a probabilidade do direito necessária para, mormente na ausência de oitiva da parte contrária, deferir-se qualquer das medidas emergenciais postuladas.

    Isso porque, ao contrário da distinção feita pela demandante, o que parece é que o precedente do STF reformou julgado coincidente com a interpretação sustentada pela parte autora, posicionando-se no sentido oposto.

     Ao contrário do TRF4, o STF não fez distinção quando caberia ou não a retenção e nem condicionou a retenção à ulterior pena de perdimento, mas ao pagamento do quanto devido. Veja-se:

     

    IMPORTAÇÃO – TRIBUTO E MULTA – MERCADORIA – DESPACHO ADUANEIRO – ARBITRAMENTO – DIFERENÇA – CONSTITUCIONALIDADE. Surge compatível com a Constituição Federal o condicionamento, do desembaraço aduaneiro de bem importado, ao pagamento de diferença tributária apurada por arbitramento da autoridade fiscal. (STF, RE 1.090.591, julg. 16.09.2020)

     

    Do voto do Ministro relator:

     

    “Conheço do recurso extraordinário e o provejo para, reformando o acórdão impugnado, assentar compatível, com a Lei Maior, o condicionamento do desembaraço aduaneiro de mercadoria importada ao pagamento de diferença de tributo e multa decorrente de arbitramento implementado pela autoridade fiscal. Ficam invertidos os ônus de sucumbência. Majoritário o enfoque, eis a tese: “É constitucional vincular o despacho aduaneiro ao recolhimento de diferença tributária apurada mediante arbitramento da autoridade fiscal.”

     

    Aliás, dessa mesma interpretação comunga o TRF3 no aresto que segue assim ementado:

     

    DESEMBARAÇO ADUANEIRO (ANÉIS DE TUNGSTÊNIO). VALORES LANÇADOS EM DECLARAÇÃO DE IMPORTAÇÃO INFERIORES AOS CORRENTEMENTE PRATICADOS EM OPERAÇÕES DE IMPORTAÇÃO SEMELHANTES. PARALISAÇÃO DO DESPACHO ADUANEIRO. NOTIFICAÇÃO DO IMPORTADOR PARA RETIFICAÇÃO DA DECLARAÇÃO DE IMPORTAÇÃO E RECOLHIMENTO DE DIFERENÇAS TRIBUTÁRIAS.  RECOLHIMENTO DO TRIBUTO COMO CONDIÇÃO PARA DESEMBARAÇO DOS BENS. LEGALIDADE. TEMA 1.042 DO STF. RECURSO NÃO PROVIDO.

    1. O Supremo Tribunal Federal, por sua composição plenária, firmou orientação no sentido de que o pagamento do tributo é parte integrante do processo de desembaraço aduaneiro da mercadoria, sem o qual ela não pode ser internalizada no território nacional (RE 1090591, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 16/09/2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-242 DIVULG 02-10-2020 PUBLIC 05-10-2020). Assim, não é possível o desembaraço aduaneiro sem o cumprimento das obrigações fiscais, pois a paralisação do despacho aduaneiro para pagamento de crédito administrativo ou tributário tem previsão legal.

    2. É impertinente a discussão, nesta fase, sobre eventual aplicação da pena de perdimento da mercadoria importada, pois, como ressoa claro do ato administrativo, a fase ainda é inicial, podendo o impetrante manifestar inconformidade, aguardar o lançamento do tributo e eventuais penalidades, apresentar defesa administrativa e, até mesmo, naquela mesma via, ofertar caução para liberação da mercadoria (providência aqui requerida). Precedentes.

    3. Caso em que a autoridade não nega que o critério preferencial de fixação do valor aduaneiro é o do valor da transação do produto internalizado no mercado nacional, tal como reclamado pela impetrante, mas justifica a paralisação do despacho aduaneiro (não há que se falar em apreensão de mercadorias) em razão dos valores declarados (US$ 0,65 – sessenta e cinco centavos de dólar por anel de tungstênio) não serem compatíveis com aqueles que o próprio exportador anuncia serem os correntemente praticados no mercado, ou mesmo de outras operações semelhantes realizadas na mesma época, razão pela qual teve de se valer de outros métodos, igualmente listados no AVA-GATT, para arbitrar o valor/preço correspondente ao valor real da mercadoria/bem adquirido no exterior, procedendo à notificação da empresa importadora para que adaptasse o documento aduaneiro a valores entre US$ 4,00 e US$ 4,90, que são aqueles que encontram equivalência/suporte em relação de produtos apresentados pelo próprio exportador HUAMEICHENG WATCH AND JEWELRY LIMITED.

    4. Constatada irregularidade praticada pelo importador no procedimento de internalização de bem no mercado nacional, a autoridade aduaneira pode interromper o despacho aduaneiro, desconsiderar o valor indicado na declaração de importação e arbitrar o valor aduaneiro consoante os métodos previstos no AVA-GATT, cabendo ao impetrante, se assim entender, manifestar inconformidade, na via administrativa, seguindo-se o procedimento administrativo a ser instaurado, ocasião em que poderá apresentar defesa e, se presentes os requisitos, lhe será possibilitada a apresentação de garantia para liberação dos bens importados. Precedentes.

    5. Recurso não provido. (TRF3, 5007875-94.2021.4.03.6105, julg. 16.12.2022)

     

    Note-se, ainda, que não, ao menos em cognição sumária, não haveria sequer correlação lógica entre não ser aplicável a pena de perdimento e ser proibida a retenção até que se pague o quanto devido.

    Pelo contrário.

    O perdimento implicaria, outrossim, na impossibilidade de internalização mesmo que pago o quanto devido.

    Destaque-se, por oportuno, que ao condicionar a liberação da mercadoria ao recolhimento do crédito tributário e da multa correspondente, a autoridade impetrada não ofende os termos da súmula nº 323 do Supremo Tribunal Federal.

    Assim está redigido o enunciado da referida súmula, in verbis:

     

    “É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos.”

     

    Tal súmula foi aprovada em 13 de dezembro de 1963 e publicada em anexo ao Regimento Interno da Suprema Corte no ano seguinte (1964) por refletir a jurisprudência predominante do STF.

    Na época, era comum aos fiscos estaduais apreenderem mercadorias desacompanhadas de nota fiscal como garantia de recolhimento do imposto sobre circulação de mercadorias – ICM, o que, segundo o STF, implicaria legislar sobre processo civil, competência privativa da União Federal já sob a égide da ordem constitucional de 1946 (art. 5º, XV, “a”).

    Mais especificamente, verifica-se do precedente que fundamentou a edição da súmula nº 323 (Recurso Extraordinário nº 39.933-AL, julg. 09.01.1961), que o caso concernia a tributo municipal criado sob o título de indenização para construção e conservação de estradas incidente sobre a saída de qualquer mercadoria da Município de Major Isidoro-AL, sob pena de sua apreensão.

    Assentou-se, no julgamento, a inconstitucionalidade do artigo 75 da lei tributária municipal, por entender que “não é lícita a apreensão de mercadorias”, tendo em vista o parecer do Procurador-Geral da República de que “não lhe cabe [ao Município], na espécie, fazer justiça de mão própria se a lei estabelece a ação executiva fiscal, para a cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública em geral”, mantendo-se parcialmente o acórdão do Tribunal de Justiça de Alagoas na parte em que reconhece que “os municípios não têm competência para dispor sobre apreensão de [trecho faltante] ou bens, como meio de forçar o pagamento de seus tributos e multas”.

    Assim, depreende-se que a jurisprudência que ensejou a súmula se fundou mais na inconstitucionalidade, por vício de origem, de normas estaduais e municipais que impunham a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para cobrança de tributos, por falecer a tais entes federados competência legislativa para criar meios de cobrança de tributos alternativos à execução fiscal prevista em lei federal, do que a uma inadequação material da utilização da apreensão como meio coercitivo para cobrança face às disposições da Constituição de 1946, vigente à época.

    De todo modo, ao longo das décadas o enunciado amplo da súmula se destacou dos detalhes de seus precedentes e passou a ser invocado para afastar a apreensão de mercadorias independentemente da discussão acerca da competência legislativa do ente para dispor sobre a execução fiscal, ao argumento, em suma, de que o Fisco dispõe de meios hábeis à exigência do crédito tributário, notadamente o lançamento e a execução fiscal, tornando inadequada a apreensão de mercadorias para a mesma finalidade, diante da ofensa aos princípios constitucionais atinentes às liberdades econômicas.

    Nesse sentido:

     

    TRIBUTÁRIO. APREENSÃO DE MERCADORIA. DECRETO 24.569/97. TRANSPORTE DESACOMPANHADO DE DOCUMENTAÇÃO A COMPROVAR O RECOLHIMENTO ANTECIPADO DE TRIBUTO. QUESTÕES ASSENTADAS NO ACÓRDÃO RECORRIDO COM BASE NAS PROVAS E EM NORMAS INFRACONSTITUCIONAIS. SÚMULA 279 DO STF. OFENSA INDIRETA À CONSTITUIÇÃO. FORMA OBLÍQUA DE COBRANÇA DE DÉBITO FISCAL. INCONSTITUCIONALIDADE. SÚMULAS 70, 323 E 547 DO STF. QUESTÃO DIVERSA DA ANALISADA NA ADI 395/SP. PROPRIEDADE DA MERCADORIA APREENDIDA NÃO CONTESTADA. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. […] - A orientação deste Tribunal, manifestada nas Súmulas 70, 323 e 547, é no sentido de repelir formas oblíquas de cobrança de débitos fiscais que constituam ofensa à garantia constitucional do livre exercício de trabalho, ofício, profissão e de qualquer atividade econômica, tendo em vista o fato de o Fisco possuir meio próprio para cobrança de seus créditos, qual seja, a execução fiscal. III - Na ADI 395/SP, Rel. Min. Cármen Lúcia, foi declarada a constitucionalidade de dispositivo que permite a apreensão de mercadorias desacompanhadas de documentação fiscal idônea, mas que, por outro lado, limita essa retenção até a comprovação da legitimidade de sua posse pelo proprietário. Situação diversa da analisada nos autos, em que se pretende, por meio da retenção, o recolhimento do tributo devido. IV - No caso dos autos, a identificação do proprietário da mercadoria é certa e, pelo que se extrai dos autos, a regularização da documentação se resolve pela comprovação do recolhimento do tributo devido, requisito que não pode ser obtido por meio da apreensão do bem em questão. V - Agravo regimental a que se nega provimento.

    (STF, 2ª Turma, Agravo Regimental no Agravo em Recurso Extraordinário nº 753.929, rel. Min. Ricardo Lewandowski, publ. 01.04.2014 ).

     

    Ocorre que, se tal interpretação se ajusta, na atual ordem constitucional, aos casos de cobrança de tributos em geral, sua aplicação não é automática às hipóteses de exigência do prévio recolhimento – ou acautelamento – dos tributos para o desembaraço aduaneiro.

    Isso porque no despacho aduaneiro, a liberdade econômica deve ser sopesada não apenas com o interesse arrecadatório estatal, mas também com seu fim de garantir a proteção da economia e do mercado interno, alçado a patrimônio nacional por força do já mencionado artigo 219 da Constituição Federal, in verbis:

     

    “Art. 219. O mercado interno integra o patrimônio nacional e será incentivado de modo a viabilizar o desenvolvimento cultural e sócio-econômico, o bem-estar da população e a autonomia tecnológica do País, nos termos de lei federal.”

     

    Assim, verifica-se que o próprio STF, antes mesmo do julgamento do tema nº 1042, distinguia as hipóteses, permitindo a retenção das mercadorias importadas no curso do despacho aduaneiro até o recolhimento dos tributos, federais e estaduais, incidentes sobre a operação, conforme os seguintes precedentes:

     

    “ICMS INCIDENTE SOBRE MERCADORIAS IMPORTADAS. FATO GERADOR. ELEMENTO TEMPORAL. CF/88, ART. 155, § 2º, IX, A. Afora o acréscimo decorrente da introdução de serviços no campo da abrangência do imposto em referência, até então circunscrito à circulação de mercadorias, duas alterações foram feitas pelo constituinte no texto primitivo (ar. 23, § 11, da Carta de 1969), a primeira, na supressão das expressões: ‘a entrada, em estabelecimento comercial, industrial ou produtor, de mercadoria importada do exterior por seu titular’; e, a segunda, em deixar expresso caber ‘o imposto ao Estado onde estiver situado o estabelecimento destinatário da mercadoria’. Alterações que tiveram por conseqüência lógica a substituição da entrada da mercadoria no estabelecimento do importador para o do recebimento da mercadoria importada, como aspecto temporal do fato gerador do tributo, condicionando-se o desembaraço das mercadorias ou do bem importado ao recolhimento, não apenas dos tributos federais, mas também do ICMS incidente sobre a operação. Legitimação dos Estados para ditarem norma geral, de caráter provisório, sobre a matéria, de conformidade com o art. 34, § 8º, do ADCT/88, por meio do Convênio ICM 66/88 (art. 2º, I) e, conseqüentemente, do Estado de São Paulo para fixar o novo momento da exigência do tributo (Lei nº 6.374/89, art. 2º, V). Acórdão que, no caso, dissentiu dessa orientação. Recurso conhecido e provido.”

    (STF, pleno, Recurso Extraordinário nº 192.711-SP, rel. Min. Ilmar Galvão, julg. 23.10.1996, publ. DJ 18.04.1997 – g.n.).

     

    “TRIBUTÁRIO. ICMS. IMPORTAÇÃO DE MERCADORIAS. DESEMBARAÇO. ART. 155, § 2º, IX, A, DA CF/88. ART. 2º, I, DO CONVÊNIO ICM 66/88. ART. 1º, § 2º, V, E § 6º, DA LEI FLUMINENSE Nº 1.423/89. A Constituição de 1988 suprimiu, no dispositivo indicado, a referência que a Carta anterior (EC 03/83, art. 23, II, § 11) fazia à "entrada, em estabelecimento comercial, industrial ou produtor, da mercadoria importada"; e acrescentou caber "o imposto ao Estado onde estiver situado o estabelecimento destinatário da mercadoria", evidenciando que o elemento temporal referido ao fato gerador, na hipótese, deixou de ser o momento da entrada da mercadoria no estabelecimento do importador. Por isso, tornou-se incompatível com o novo sistema a norma do art. 1º, II, do DL 406/68, que dispunha em sentido contrário, circunstância que legitimou a edição, pelos Estados e pelo Distrito Federal, em conjunto com a União, no exercício da competência prevista no art. 34, § 8º, do ADCT/88, de norma geral, de caráter provisório, sobre a matéria; e, por igual, a iniciativa do Estado do Rio de Janeiro, de dar-lhe conseqüência, por meio da lei indicada. Incensurável, portanto, em face do novo regime, o condicionamento do desembaraço da mercadoria importada à comprovação do recolhimento do tributo estadual, de par com o tributo federal, sobre ela incidente. Recurso conhecido e provido, para o fim de indeferir o mandado de segurança.”

    (STF, pleno, Recurso Extraordinário nº 193.817-RJ, rel. Min. Ilmar Galvão, julg. 23.10.1996, publ. DJ 10.08.2001 – g.n.).

     

    “AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAODINÁRIO. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. EXIGÊNCIA DE TRIBUTOS. CARÁTER INFRACONSTITUCIONAL DA CONTROVÉRSIA. SÚMULA 279/STF. O Plenário do Supremo Tribunal Federal já decidiu que o fato gerador do ICMS, incidente sobre mercadoria importada, ocorre por ocasião do recebimento da mercadoria, no respectivo desembaraço aduaneiro (RE 193.817, Rel. Min. Ilmar Galvão). Nessas condições, não fica constatada nenhuma coação indireta na exigência, fundada em Lei, do recolhimento dos tributos relativos ao desembaraço aduaneiro de bens importados. Agravo regimental a que se nega provimento.”

    (STF, pleno, Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 810.035-CE, rel. Min. Roberto Barroso, julg. 07.04.2015, publ. DJe 23.04.2015).

     

    Além do mais, a retenção do bem em caso de exigência fiscal no curso do despacho aduaneiro está prevista na legislação, conforme se depreende, contrario sensu, do artigo 51, §2º, do Decreto-Lei nº 37/1966 e do artigo 39 do Decreto-Lei nº 1.455/1976:

     

    “Art. 51 - Concluída a conferência aduaneira, sem exigência fiscal relativamente a valor aduaneiro, classificação ou outros elementos do despacho, a mercadoria será desembaraçada e posta à disposição do importador. (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 01.09.1988)

    § 1º - Se, no curso da conferência aduaneira, houver exigência fiscal na forma deste artigo, a mercadoria poderá ser desembaraçada, desde que, na forma do regulamento, sejam adotadas as indispensáveis cautelas fiscais. (Incluído pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 01.09.1988)

    § 2º - O regulamento disporá sobre os casos em que a mercadoria poderá ser posta à disposição do importador antecipadamente ao desembaraço.” (Incluído pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 01.09.1988) (g.n.).

    “Art 39. O Ministro da Fazenda definirá os casos em que poderá ser admitida, mediante as garantias que entender necessárias, a liberação de mercadorias importadas objeto de litígios fiscais, antes da decisão final.”

     

    Assim, no despacho aduaneiro, a regra é o pagamento dos tributos e multas incidentes sobre a operação, ou ao menos o seu acautelamento mediante prestação de garantia, antes do desembaraço da mercadoria, como finalidade de salvaguardar o mercado interno.

    Havendo exigência de diferenças tributárias e multas decorrentes de procedimento de arbitramento por valoração aduaneira não impugnados nos autos, eis que serão objeto de insurgência administrativa, não há irregularidade na retenção das mercadorias.

    Ante o exposto, INDEFIRO A TUTELA PROVISÓRIA requerida.

     [...].

 

Pois bem.

Em que pese os argumentos sustentados pela agravante, em sede de cognição não exauriente, não vislumbro razões para a reforma da r. decisão.

De acordo com a documentação relativa ao Procedimento Fiscal referente a DI n°22/0915128-6 (ID 276487081 p. 87 e ss.), em resumo, a fiscalização concluiu que:

 

"A Declaração de Importação(DI) nº 22/0915128-6 - registrada em 16/05/2022 pelo importador FORTEBRAS ARTIGOS PARA PRESENTES LTDA (CNPJ 09.578.373/0004-61), declarando na condição de exportador a empresa YIWU SHENGYUE IMPORT & EXPORT TRADE CO., LTD e fabricante a empresa YIWU KEMEI ELECTRIC APPLIANCE CO., LTD, ambas localizadas na República Popular da China - foi parametrizada no CANAL VERMELHO de conferência aduaneira pela equipe de análise de riscos da Receita Federal do Brasil, por apresentar indícios de subfaturamento em relação aos preços dos produtos, evidenciados pela declaração de valores significativamente inferiores aos praticados no comércio mundial, na importação de mercadorias idênticas e/ou semelhantes.

[...].

Diante dos fatos, conclui-se que os preços declarados na presente operação não refletem os reais valores dos produtos ora importados.

Esse quadro probatório compromete sobremaneira a VERACIDADE da declaração do importador e a AUTENTICIDADE dos documentos instrutivos do despacho. A prestação de informações inverídicas quanto ao preço das mercadorias importadas caracteriza SUBFATURAMENTO (FRAUDE DE VALOR) mediante falsidade ideológica da fatura comercial, já que os valores (irreais) faturados e declarados notoriamente não correspondem à verdade, conforme explanado. Cumpre destacar que o subfaturamento sempre consiste em um ato fraudulento, nos termos do art. 72, in fine, da Lei nº 4.502/1964, pois não se concebe o desígnio de subfaturar o preço de uma mercadoria importada sem conhecimento e vontade de REDUZIR O MONTANTE DOS TRIBUTOS DEVIDOS. O mesmo se diga quanto à falsidade documental. Em ambos os casos é manifesta a intenção de ludibriar o fisco, sem guarida para a hipótese de mero erro. Desse modo, a conduta descrita enquadra-se no conceito de FRAUDE, uma vez que o sujeito promove a falsificação (no mínimo, ideológica) do documento comprobatório do valor aduaneiro (fatura comercial), sendo esse valor a base de cálculo dos tributos incidentes na operação de importação. A IN SRF nº 327/2003, que disciplina a aplicação das regras do Acordo de Valoração Aduaneira (AVA-GATT), em seu art. 38 esclarece que tais disposições internacionais devem ser afastadas nos casos em que se verifique elemento indiciário de fraude, sonegação ou conluio envolvendo o valor aduaneiro declarado. As penas cominadas pela legislação nacional vigente são a MULTA ADMINISTRATIVA de 100% sobre a diferença entre o preço declarado e o efetivamente praticado ou arbitrado, no caso de subfaturamento (art. 88, parágrafo único, da MP nº 2.158-35/2001) - sem prejuízo da exigência dos tributos, da multa de ofício prevista no art. 44 da Lei nº 9.430/1996 e dos acréscimos legais cabíveis - e o PERDIMENTO das mercadorias, na hipótese de qualquer documento necessário ao seu desembaraço tiver sido falsificado ou adulterado (art. 105, VI, do Decreto-Lei nº 37/1966). A PRINCÍPIO, consoante o Ato Declaratório PGFN nº 4/2018 ("falsidade ideológica consistente no subfaturamento do valor da mercadoria na declaração de importação") e ausentes outros elementos indiciários de infração punível com a pena de perdimento, aplica-se a PENALIDADE PECUNIÁRIA prevista no art. 88, parágrafo único, da MP nº 2.158-35/2001. Para tanto, o art. 88, caput, da MP nº 2.158-35/2001 determina que, no caso de fraude, sonegação ou conluio em que não seja possível apurar o preço efetivamente praticado na importação, o PREÇO da mercadoria será ARBITRADO pela autoridade fiscal segundo os critérios estabelecidos nos incisos do caput do mesmo artigo. O primeiro critério de arbitramento é o "PREÇO DE EXPORTAÇÃO PARA O PAÍS, DE MERCADORIA IDÊNTICA OU SIMILAR"(art. 88, I, da MP nº 2.158- 35/2001). Foram utilizados como PARADIGMA, para fins de arbitramento dos preços declarados nesta operação, valores declarados por outros importadores brasileiros, na importação de produtos idênticos e/ou semelhantes produzidos pelo mesmo fabricante e os reais valores praticados pelo próprio fabricante YIWU KEMEI ELECTRIC APPLIANCES CO. LT, conforme anúncios constantes do site www.alibaba.com.

Diante do exposto, fica o importador INTIMADO a: 1) RETIFICAR os PREÇOS das mercadorias, conforme ARBITRADOS; 2) RECOLHER a MULTA DE 100% (cód. 2185) SOBRE AS DIFERENÇAS ENTRE O PREÇO DECLARADO E O PREÇO ARBITRADO das mercadorias (art. 703 do RA/2009); 3) RECOLHER as DIFERENÇAS DE TRIBUTOS (códs. II-2892, IPI-3345, PIS4562, COFINS-4685), mais a MULTA de 150% REDUZIDA para 75% (arts. 725, II, e 732, I, do RA/2009) e os JUROS DE MORA (art. 748 do RA/2009); 4) RECOLHER a MULTA DE 1% (cód. 2185) sobre o NOVO VALOR ADUANEIRO por prestação de informação inexata do VUCV e VMLE (art. 711, III, e § 1º, do RA/2009; SCI Cosit nº 26/2013 c/c Anexo Único da IN SRF nº 680/2006, itens 27, 42.5 e 43.2); 5)ANEXAR a MEMÓRIA DE CÁLCULO DETALHADA ao PUCOMEX. A mercadoria objeto de EXIGÊNCIA FISCAL de QUALQUER NATUREZA, formulada no curso do despacho aduaneiro, somente será DESEMBARAÇADA após o respectivo CUMPRIMENTO. Em caso de não atendimento, o despacho poderá ter prosseguimento com a formalização de NOVAS EXIGÊNCIAS FISCAIS, AUTO DE INFRAÇÃO (SEM redução da multa de ofício) e REPRESENTAÇÃO FISCAL PARA FINS PENAIS dirigida ao MIN. PÚBLICO FEDERAL".

Posteriormente, restou lavrado o auto de infração ( ID 276487081 p. 45 e ss.). Todavia, sua legalidade não é objeto da ação, conforme explicitou a parte autora em sua inicial (ID 276487076 p. 6 e ss.). Limita-se a controvérsia quanto à impossibilidade de condicionar o desembaraço aduaneiro ao recolhimento ou garantia dos valores devidos.

Acerca da matéria, cabe destacar que o C. STF, no julgamento do tema 1042 – RE nº 1090591/SC, fixou a seguinte tese de repercussão geral: “É constitucional vincular o despacho aduaneiro ao recolhimento de diferença tributária apurada mediante arbitramento da autoridade fiscal”.

Diante disso, depreende-se que o recolhimento ou a garantia dos encargos tributários refere-se ao procedimento próprio da internalização da mercadoria importada, não se confundindo com simples método coercitivo para pagamento de tributos, constrangimento ilegal, cerceamento da atividade empresarial ou sanção política.

Nesse sentido:

E M E N T A  

AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. LIBERAÇÃO DE MERCADORIA. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. PRESTAÇÃO DE GARANTIA. RECURSO DA UNIÃO PROVIDO.

1. No caso presente, consta que, inicialmente, houve a concessão parcial da liminar para que a autoridade impetrada desse regular prosseguimento e concluísse o processo de desembaraço aduaneiro, então suspenso, no prazo das informações, realizando a eventual liberação das mercadorias, caso correta a tributação já recolhida, ou realizasse o respectivo lançamento.

2. Intimada, a autoridade impetrada afirmou que o valor exigido segundo a Instrução Normativa é de R$ 278.887,04 (duzentos e setenta e oito mil oitocentos e oitenta e sete reais e quatro centavos), tendo a impetrante realizado o depósito judicial no valor de R$ 64.482,70 (sessenta e quatro mil quatrocentos e oitenta e dois reais e setenta centavos).

3. No entanto, a decisão agravada não se alinhou ao entendimento firmado pelo C. Supremo Tribunal Federal, em sede vinculante, no Tema 1042 da Repercussão Geral, cuja inteligência deve prevalecer na cognição em sede liminar, para afastar a aplicação da Súmula 323/STF e condicionar o prosseguimento do despacho aduaneiro e o desembaraço de mercadoria importada ao recolhimento das diferenças fiscais ou à prestação de garantia suficiente.

4. Assim, de rigor seja reconhecido o cabimento da exigência da prestação de garantia como condição para o prosseguimento do despacho aduaneiro, em conformidade com a jurisprudência firmada na E. 6ª Turma desta Corte.

5. Agravo de Instrumento a que se dá provimento.

(TRF 3ª Região, 6ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5007817-39.2022.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal VALDECI DOS SANTOS, julgado em 15/05/2023, Intimação via sistema DATA: 19/05/2023)

                                           

 

E M E N T A

 

AGRAVO INTERNO. MANDADO DE SEGURANÇA. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. LIBERAÇÃO DE MERCADORIAS. AUSÊNCIA DE CAUÇÃO. LIMINAR SATISFATIVA. ART. 1º DA LEI Nº 2.770/1956. AUSÊNCIA DE DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. DEPÓSITO JUDICIAL REALIZADO POSTERIORMENTE. FATO NOVO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. RECURSO IMPROVIDO.

1. No tocante ao fato novo apresentado em petição pela agravante diretamente a esta Corte (depósito do valor integral dos tributos e multas cobrados), inclusive após a intimação da pauta de julgamento do agravo interno, observo que não foi apreciado na decisão agravada, sendo vedado a este Tribunal sobre ele se manifestar neste momento processual. A matéria referente à existência de depósito judicial, portanto, é inepta, por veicular pedido que não pode ser atendido por esta Turma, porquanto implica supressão de instância.

2. A interlocutória agravada ofende o art. 1º da Lei nº 2.770/1956 (“Nas ações e procedimentos judiciais de qualquer natureza, que visem obter a liberação de mercadorias, bens ou coisas de qualquer espécie procedentes do estrangeiro, não se concederá, em caso algum, medida preventiva ou liminar que, direta ou indiretamente importe na entrega da mercadoria, bem ou coisa”).

3. O art. 1º da Lei n. 2.770/56 permanece vigente e, portanto, deve ser aplicado.

4. A decisão de natureza precária (tutela antecipada) tem o mesmo objeto do pedido final da parte e sua concessão esgota de modo irreversível o objeto da demanda, o que ofende o § 3º do art. 1º da Lei nº 8.437/92, o qual diz que “não será cabível medida liminar que esgote, no todo ou em parte, o objeto da ação”.

5. A declaração de inconstitucionalidade do §2º do art. 7º da Lei nº 12.016/09 nada tem a ver com a situação dos autos, vez que não foi este o fundamento adotado pelo Relator para o provimento do recurso da União.

6. Além disso, a liberação das mercadorias em casos como o mencionado nos autos apenas é possível desde que condicionada à prestação de caução, nos termos da legislação de regência, notadamente artigo 51, §§ 1º e 2º, do DL 37/66 e artigo 571 do Regulamento Aduaneiro.

7. Em destaque, nem se diga que a apreensão da mercadoria se deu para “obrigar” o pagamento de tributação incidente sobre a operação de internalização; é que foi constatado o descompasso entre classificação dada pelo importador e o quanto se verifica, em “canal vermelho”, pela SRF; de modo que se trata de retenção para fins de conferência aduaneira. O caso dos autos revela que não se cuida de apreensão de mercadorias como meio coercitivo (vedado na Súmula 323/STF), mas sim de regular negativa do desembaraço aduaneiro enquanto não se acharem satisfeitas as condições previstas na legislação aduaneira para a internalização de mercadorias alienígenas.

8. O depósito do montante integral é necessário para o efeito de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, nos termos do art. 151, inciso II do CTN, mas, como dito, a matéria deve ser apreciada primeiro pelo Juízo a quo.

9. Agravo interno desprovido.

(TRF 3ª Região, 6ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5017988-55.2022.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 25/02/2023, Intimação via sistema DATA: 28/02/2023)

                                           

 

E M E N T A

DIREITO ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO. ESCAVADEIRA. IMPORTAÇÃO FRACIONADA. INTERRUPÇÃO DO DESPACHO ADUANEIRO. RECLASSIFICAÇÃO. RECOLHIMENTO DE TRIBUTOS. APLICAÇÃO DE MULTAS. APREENSÃO INDIRETA. NÃO COMPROVAÇÃO.  APELAÇÃO DESPROVIDA.

1. No caso dos autos, não demonstrada por prova pré-constituída arbitrariedade da autoridade coatora na exigência de reclassificação, não se revela ilegal a exigência de recolhimento dos tributos, com as respectivas multas, bem como a suspensão do despacho aduaneiro até o cumprimento da exigência por parte da interessada. Precedentes do C. STF.

2. A situação sub judice não se encarta nos parâmetros de incidência da Súmula nº 323 do C. STF. Nos termos do artigo 571, § 1º, I, do Decreto nº 6.759/2009, o pagamento dos créditos tributários apurados no curso da conferência aduaneira é condição para o aperfeiçoamento do desembaraço, não se confundindo, desse modo, com hipótese de sanção política.

3. A verificação dos tributos devidos, em cada situação (artigo completo e conjunto de partes e peças separadas), demandaria dilação probatória, com acompanhamento de perícia contábil, não se prestando a ação mandamental para esse fim.

4. Por permanecer hígida a presunção de veracidade de que goza o ato administrativo impugnado, de rigor a manutenção da sentença que denegou a ordem.

5. Apelação desprovida.

(TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5005380-17.2020.4.03.6104, Rel. Desembargador Federal MAIRAN GONCALVES MAIA JUNIOR, julgado em 16/12/2022, Intimação via sistema DATA: 28/12/2022)

                                       

                                       

Dessa feita, nada obstante a declaração lançada pela autoridade fiscal seja pela caracterização de “SUBFATURAMENTO (FRAUDE DE VALOR) mediante falsidade ideológica da fatura comercial, já que os valores (irreais) faturados e declarados notoriamente não correspondem à verdade”, sem adentrar a possível falsidade material de documentação, ou eventual sujeição a pena de perdimento, ao menos na análise da tutela provisória de urgência, depreende-se a legalidade da exigência de recolhimento ou garantia dos encargos tributários para continuidade do desembaraço aduaneiro.

Nesse sentido:

EMENTA: TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO. RETORNO DO STJ. NOVO JULGAMENTO. OMISSÕES. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. RETENÇÃO DE MERCADORIAS EM RAZÃO DE SUBFATURAMENTO. LEVANTAMENTO DE VALORES DADOS EM GARANTIA. PROVIMENTOS DOS EMBARGOS SEM ALTERAÇÃO DE RESULTADO. 1. Tem-se que a Súm. 323 do STF não restou superada pelo Tema 1.042, apenas tratam de situações distintas. A Súm. 323 do STF teve como precedente o RE 39.933. Esse julgado veiculava hipótese em que a mercadoria transportada dentro do território nacional era apreendida para coagir o contribuinte a quitar seus débitos tributários. Tratava-se, no caso, de verdadeira sanção política. Nesse passo, veio a Súm. 323 do STF para vedar o emprego de sanções políticas como meio coercitivo para pagamento de tributos 2. O Tema 1.042 do STF assim como o presente caso não versam sobre retenção de mercadoria como coerção política ao pagamento de tributos, mas sim de impossibilidade da conclusão do despacho aduaneiro antes de preenchidos todos os requisitos legais para a internalização dos bens, entre os quais se incluem o pagamento dos respectivos encargos tributários. Se o importar não comprova o preço declarado na Declaração de Importação (DI), não resta ao fisco alternativa senão arbitrar valor conforme os critérios legais. Não se trata de sanção política, pois o procedimento de importação compreende etapas que vão além da questão fiscal. Especificamente o imposto de importação tem função predominantemente extrafiscal, por ser muito mais um instrumento de proteção da indústria nacional do que de arrecadação de recursos financeiros. 3. Assim, o condicionamento do desembaraço da mercadoria importada ao pagamento dos impostos incidentes sobre a operação de importação não se pode considerar como sanção política, constrangimento ilegal ou cerceamento das atividades da empresa. Trata-se, efetivamente, de condição necessária para a regular internalização das mercadorias importadas no País. Dessa forma, não existe ilegalidade na retenção das mercadorias. 4. Nos termos da legislação aduaneira, constatada, durante a conferência aduaneira, ocorrência que impeça o prosseguimento do despacho, o seu curso deve ser interrompido, não sendo cabível o desembaraço da mercadoria diante da necessidade de reclassificação fiscal, até que o crédito tributário seja atendido ou sejam oferecidas garantias.  5. Assim, a  garantia exigida pela autoridade aduaneira para o efeito de viabilizar o prosseguimento do despacho aduaneiro e consequente liberação das mercadorias retidas (no valor da diferença dos tributos apurados acrescidos das multas aplicadas), está em conformidade com a tese estabelecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o Tema nº 1.042 da repercussão geral, sendo desimportante tratar-se de hipótese de subfaturamento simples ou qualificado.   (TRF4, AC 5027458-92.2014.4.04.7201, PRIMEIRA TURMA, Relatora CARLA EVELISE JUSTINO HENDGES, juntado aos autos em 08/03/2023) negritei.

 

E M E N T A

    ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ADUANEIRO. PEDIDO DE LIBERAÇÃO DE MERCADORIA. RETENÇÃO DAS MERCADORIAS. TEMA 1042 – RE nº 1090591/SC. APELAÇÃO DA UNIÃO E REMESSA OFICIAL PROVIDAS.

    - Trata-se de mandado de segurança, impetrado por CRIAÇÕES J. GIL LTDA. EPP, contra ato do INSPETOR DA ALFÂNDEGA NO PORTO DE SANTOS, objetivando provimento que determine a liberação das mercadorias importadas, cuja operação foi amparada pela DI  19/1314912-0, sem atendimento da exigência fiscal para recolhimento da diferença de tributos e multa.

    - Revendo posicionamento anterior e considerando o julgamento recente do E. Supremo Tribunal Federal, Tema 1042 – RE nº 1090591/SC, que fixou a tese: "É constitucional vincular o despacho aduaneiro ao recolhimento de diferença tributária apurada mediante arbitramento da autoridade fiscal", mostra-se necessária a análise caso a caso dos motivos da retenção.

    - Posto isto, anote-se que, no caso concreto, a autoridade fiscal no curso do despacho aduaneiro foi constatado que o valor das transações das mercadorias declaradas na DI nº 19/1314912-0 estava muito abaixo do praticado, gerando suspeita acerca da idoneidade do valor aduaneiro.

    - Após a devida análise da documentação apresentada pela importadora e o comparativo com outras importações realizadas para o mesmo produto INOVYN, foi realizado o arbitramento do valor aduaneiro, nos termos da legislação.

    - A legislação aduaneira prevê que a mercadoria só pode ser desembaraçada após o cumprimento de todas as exigências fiscais e etapas no despacho aduaneiro. Caso deseje, o importador pode desembaraçar a mercadoria mediante a prestação de garantia. Precedentes.

    - Assim, a autoridade coatora agiu dentro da legalidade, não sendo inadequada a exigência de caução para a liberação das mercadorias descritas na DI n.º 19/1314912-0.

    - Apelação e remessa oficial providas.

     

    (TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5006231-90.2019.4.03.6104, Rel. Desembargador Federal MONICA AUTRAN MACHADO NOBRE, julgado em 28/11/2022, Intimação via sistema DATA: 06/12/2022)                                           

     

    E M E N T A

    DIREITO ADUANEIRO. FISCALIZAÇÃO. FRAUDE E SUSPEITA DE SUBFATURAMENTO. IMPORTAÇÃO DE TECIDOS. NOTIFICAÇÃO PARA PRESTAÇÃO DE ESCLARECIMENTOS. DETERMINAÇÃO PENDENTE DE CUMPRIMENTO. INTERRUPÇÃO DO DESPACHO ADUANEIRO. ARTIGO 570, § 2°, DECRETO 6.759/2009. SÚMULA 323/STF IMPERTINENTE. CABIMENTO DA EXIGÊNCIA DE CAUÇÃO. PORTARIA MF 389/1976.

    1. Ao tempo do registro da DI, já havia procedimentos, junto à Aduana, contra empresas do grupo econômico HONEYTEX HIGH QUALITY TEXTILE AND PRINTING (Pacífico Sul Comercial e Exportadora Ltda; Highlight Comércio de Tecidos, Imp e Exp Ltda, Acenza Comércio de Plásticos e Tecidos Ltda; Lotusblume Comercial Têxtil Ltda e Guaraci Têxtil Eireli), para “auditoria dos tecidos importados pelas empresas do grupo Honeytex”, com intimação para juntada de documentação e esclarecimentos, conforme constou do “Termo n° 08 – Início de Fiscalização e Intimação”.

    2. Relativamente à “Highlight Comércio de Tecidos, Imp e Exp Ltda”, o procedimento administrativo TDPF-F 0819500-2021-00893-6 tratou especificamente da auditoria dos tecidos que importou, incluindo na investigação a importação referente à DI 21/1892677-3 (artigo 2°, § 1°, da IN RFB 1.986/2020) com intimação, em 15/10/2021, para esclarecimentos e juntada de documentos, conforme “Termo de Constatação e Intimação” enviado posteriormente, no âmbito do TDPF-F 0819500-2021-00893-6, para reiterar a notificação anterior, dado o silêncio da  investigada. Assim, foi intimada a autora da inclusão da DI 21/1892677-3 no “procedimento de fiscalização utilizado no combate às fraudes aduaneiras”, previamente instaurado para auditar tecidos, que importou, com suspeita de subfaturamento, em ato devidamente motivado, interrompendo-se o despacho aduaneiro para esclarecimentos e instrução documental, não prestados, motivando o decurso de prazo, ora impugnado.

    3. Embora alegada retenção indevida, houve, na verdade, interrupção do despacho aduaneiro, em conformidade com o tratamento previsto no Regulamento Aduaneiro. Apurados indícios de declaração a menor de valores de importação, com prática de subfaturamento e sem esclarecimentos por parte da autora, a interrupção do despacho aduaneiro é procedimento regular com expresso respaldo no artigo 570, § 2º, do Decreto 6.759/2009.

    4. A existência de previsão legal para paralisação impede, pois, o manejo da Súmula 323/STF, por múltiplos fundamentos. Primeiro, porque em 12/02/2021 a Suprema Corte julgou, com repercussão geral, o Tema 1.042, consolidando tese de que “É constitucional vincular o despacho aduaneiro ao recolhimento de diferença tributária apurada mediante arbitramento da autoridade fiscal”. Em segundo lugar, porque não se trata de "apreensão" de mercadorias, mas paralisação de despacho aduaneiro, na medida em que obstado desembaraço aduaneiro, a afastar a incidência do verbete.

    5. Mesmo que a medida fosse entendida como equivalente à apreensão, não se autorizaria conclusão diversa. O datado verbete (editado há mais de cinquenta anos, anteriormente, pois, ao Código Tributário Nacional, ao Decreto-Lei 37/1966 e ao Decreto-Lei 1.455/1976, que atualmente regem a matéria) tem por escopo obstar efetiva retenção ou apreensão de bens sem lastro hierárquico-normativo suficiente (como era o caso discutido no RE 39.933, vértice de tal súmula, que não tratava de direito aduaneiro, mas, sim, de taxa municipal indenizatória por despesas com rodovias) para exigir-se pagamento de tributo.

    6. No caso dos autos, porém, a paralisação do despacho aduaneiro para pagamento, discussão ou caucionamento de crédito administrativo ou tributário tem lastro normativo expresso, recepcionado pela Constituição, com estatura de legislação ordinária federal (artigo 51, §§1º e 2º, do Decreto-lei 37/1966, e artigo 39 do Decreto-Lei 1.455/1976), a afastar o enquadramento da conduta como ilegalmente coercitiva.

    7. O prosseguimento do despacho aduaneiro não exige pagamento do tributo exigido, nos casos em que o único óbice ao desembaraço aduaneiro for a existência de crédito em aberto a favor da Administração. O procedimento pode ser concluído com mera oferta de garantia, nos termos da Portaria 389/1976 do Ministério da Fazenda (admitida para tal fim, inclusive, fiança-bancária). Logo, não procede supor que a conclusão do despacho aduaneiro exija pagamento da diferença de tributos, devidos em razão do subfaturamento ilegal da importação.

    8. Nem se alegue que a juntada pela autora, em fevereiro/2022, de laudo da ABIT, afastaria a conclusão de que esta deixou de fornecer elementos solicitados à fiscalização, pois há pedido específico, identificando dados e documentos exigidos pela fiscalização, que não se refere a laudo mercadológico, como visto acima.

    9. Inviável cogitar de inexistência de controvérsia em relação ao preço das mercadorias na “adição 002” da DI 21/1892677-3, por supostamente serem qualitativamente iguais às da adição declarada em outra DI, em que redigido laudo mercadológico, pois, além deste não conter especificação quanto a tratar-se do tecido denominado “COLONNA PD”, não há como atestar a identidade entre produtos por mera visualização de descrição contida nas DI's, inclusive porque, conforme constou do “Termo n° 08 – Início de Fiscalização e Intimação”, “as descrições dos produtos na importação são genéricas, não permitindo sua perfeita identificação” (Id 254896657, f. 01).

    10. O cenário fático-probatório externa, pois, a percepção de que é razoável, adequada e aplicável, segundo parâmetro normativo próprio, a exigência de caução para prosseguimento do despacho aduaneiro para liberação da importação sobre a qual recaem indícios de subfaturamento, não esclarecidos devidamente apesar de intimações fiscais que se destinaram a permitir a elucidação do fato controvertido.

    11. Logo, ainda que se alegue não ser cabível perdimento, disto não resulta a ilegalidade da exigência de caução para retomada do despacho aduaneiro em garantia ao interesse fiscal e aduaneiro na pendência da resolução da controvérsia sobre o subfaturamento da importação, nos termos da jurisprudência apontada.

    12. Agravo de instrumento provido e pedido de reconsideração à antecipação de tutela prejudicado.

    (TRF 3ª Região, 3ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5022975-37.2022.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal LUIS CARLOS HIROKI MUTA, julgado em 02/12/2022, Intimação via sistema DATA: 06/12/2022)

                                                

    PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ART. 1.022, CPC. OMISSÃO. MERCADORIA IMPORTADA. FISCALIZAÇÃO ADUANEIRA. SUBFATURAMENTO. MULTA. PREVISÃO LEGAL. VINCULAÇÃO DO DESPACHO ADUANEIRO AO RECOLHIMENTO DA DIFERENÇA APURADA. ACOLHIMENTO COM EFEITOS INFRINGENTES. SEGURANÇA DENEGADA.

    1. Trata-se de determinação da Corte Superior para que sejam novamente julgados os embargos de declaração opostos ao acórdão desta Turma, a fim de ser sanada a omissão apontada em relação à revisão aduaneira.

    2. Conforme disposto no Decreto 6.759/2009 na redação dada pela Lei 8.010/2013, não será desembaraçado o bem importado cuja exigência de crédito tributário, no curso da conferência aduaneira esteja pendente de atendimento, salvo nas hipóteses autorizadas pelo Ministério da Fazenda, mediante a prestação de garantia (art. 571).

    3. Presente a hipótese de vinculação do despacho aduaneiro ao recolhimento da diferença tributária apurada mediante arbitramento pela atividade fiscal, quando constatado subfaturamento em produtos importados - como no caso dos autos - havendo norma específica prevendo a multa de 100% (cem por cento) sobre a diferença apurada entre o valor real e o declarado, nos termos do art. 108, parágrafo único, do DL 37/66.

    4. Não é cabível qualquer discussão quanto aos valores arbitrados em sede de mandado de segurança. Trata-se de procedimento com previsão legal quando constatado no curso da conferência aduaneira erro de fato que torna duvidoso o valor declarado do bem importado, para fins de posterior desembaraço aduaneiro. A autuação fiscal goza de presunção de certeza e liquidez, somente passível de desconstituição em processo de conhecimento com a respectiva instrução probatória.

    5. O Plenário do STF, em 04 de setembro de 2020, deu provimento a recurso extraordinário para reconhecer como constitucional a retenção de bem importado até a regularização da situação fiscal. Condicionar a entrada de um bem importado à regularização da situação tributária, no momento da entrada no País não caracteriza sanção política, constrangimento ilegal ou violação à livre iniciativa. Apreciando o Tema 1042 da repercussão geral no RE 1.090.591 foi exarada a seguinte tese: "É constitucional vincular o despacho aduaneiro ao recolhimento de diferença tributária apurada mediante arbitramento da autoridade fiscal".

    6. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos infringentes para denegar a segurança.

    (TRF 3ª Região, SEXTA TURMA, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 3633340 - 0006986-44.2015.4.03.6104, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL DIVA MALERBI, julgado em 03/12/2020, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/12/2020)

     

    EMENTA

    MANDADO DE SEGURANÇA. INGRESSO DE MERCADORIAS. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. APREENSÃO. RECLASSIFICAÇÃO FISCAL. LIBERAÇÃO SEM CAUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DESPROVIMENTO DA APELAÇÃO.

    1. Verifica-se que a conferência aduaneira é necessária para averiguação da mercadoria importada a fim de evitar discrepâncias entre o quanto declarado e o quanto importado, sempre com vistas a evitar sonegação ou incongruências fiscais.

    2. No caso em exame, consta dos autos que as mercadorias descritas na DI nº17/1030398-2 foram retidas, porquanto, teria havido subfaturamento. A impetrante, por sua vez, pretende obter provimento judicial que autorize o desembaraço das mercadorias importadas, sem o pagamento da taxa de armazenagem e sem necessidade de prestação de caução a ser ofertada no bojo da presente demanda.

    3. No caso dos autos, a Receita Federal do Brasil determinou a reclassificação das mercadorias importadas, com o consequente recolhimento de multa e da diferença dos tributos devidos.

    4. O Decreto 6.759/2009, o qual Regulamenta a administração das atividades aduaneiras, a fiscalização, o controle e a tributação das operações de comércio exterior, dispõe, em seu artigo 564, os objetivos da conferência aduaneira, conforme se verifica:“Art. 564. A conferência aduaneira na importação tem por finalidade identificar o importador, verificar a mercadoria e a correção das informações relativas a sua natureza, classificação fiscal, quantificação e valor, e confirmar o cumprimento de todas as obrigações, fiscais e outras, exigíveis em razão da importação.Parágrafo único. A fim de determinar o tipo e a amplitude do controle a ser efetuado na conferência aduaneira, serão adotados canais de seleção (Norma Relativa ao Despacho Aduaneiro de Mercadorias, Artigos 64 e 65, aprovada pela Decisão do Conselho do Mercado Comum - CMC nº 50, aprovada no âmbito do Mercosul, de 2004, e internalizada pelo Decreto nº 6.870, de 2009). (Incluído pelo Decreto nº 8.010, de 2013)

    5. O artigo 565, do mesmo decreto, traz, por sua vez, os locais de realização da conferência, nos termos seguintes:“Art. 565. A conferência aduaneira poderá ser realizada na zona primária ou na zona secundária (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 49, com a redação dada pelo Decreto-Lei no 2.472, de 1988, art. 2o).§ 1o A conferência aduaneira, quando realizada na zona secundária, poderá ser feita:I - em recintos alfandegados;II - no estabelecimento do importador:a) em ato de fiscalização; oub) como complementação da iniciada na zona primária; ou III - excepcionalmente, em outros locais, mediante prévia anuência da autoridade aduaneira.”

    6. A Secretaria da Receita Federal, ao disciplinar a matéria por meio da Instrução Normativa 680/2006, fixa, eu seu artigo 21, os canais de passagem das mercadorias, bem como o que a análise fiscal levará em consideração por ocasião da entrada da mercadoria. Ao que consta nos autos, a divergência se deu, porquanto, teria havido subfaturamento.

    7. Sem ingressar na discussão afeta ao correto enquadramento das mercadorias cuja internação se pretende, é certo que a exigência de reclassificação fiscal não pode ser entendida como meio coercitivo para pagamento de tributos (Súmula 323/SFT) já que existe previsão na legislação de interrupção do despacho aduaneiro para regularização nos termos do artigo 570 do Regulamento Aduaneiro, aprovado pelo Decreto 6.759, de 05/02/2009.

    8. Com efeito, a legislação aduaneira prevê procedimento próprio para nacionalização de importação, devendo ser observada, em homenagem ao princípio da legalidade, ainda que suspensa a exigibilidade do crédito tributário. Além disso, caso não queira aguardar a tramitação regular do procedimento, em observância ao devido processo legal o contribuinte pode valer-se da faculdade de pagar ou garantir o crédito tributário decorrente da reclassificação tarifária.

    9. O recolhimento dos tributos, ou, ainda, a prestação de garantia na via administrativa como condição de procedibilidade para o prosseguimento do despacho aduaneiro, bem como a suspensão do despacho aduaneiro até o cumprimento da exigência por parte da interessada não se revela ilegal.

    10. Apelação não provida.

    (TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5002405-27.2017.4.03.6104, Rel. Desembargador Federal ANTONIO CARLOS CEDENHO, julgado em 24/07/2020, Intimação via sistema DATA: 29/07/2020)

Nesse cenário, não se vislumbra a presença dos requisitos para a concessão da tutela provisória de urgência.

Diante do exposto, nego provimento ao agravo de instrumento, restando prejudicado o requerimento de reconsideração.

É como voto.

 

 



E M E N T A

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. CÍVEL. MERCADORIAS IMPORTADAS. SUBFATURAMENTO. DESEMBARAÇO ADUANEIRO.

1. A tutela antecipada em caráter de urgência se configura medida excepcional no sistema jurídico vigente, razão pela qual deve ser deferida somente em hipóteses restritas, nas quais restar demonstrada, de forma patente, o preenchimento dos requisitos retromencionados.

2. De acordo com a documentação relativa ao Procedimento Fiscal, em resumo, a fiscalização concluiu que “os preços declarados na presente operação não refletem os reais valores dos produtos ora importados”.  Posteriormente, restou lavrado o auto de infração. Todavia, sua legalidade não é objeto da ação, conforme explicitou a parte autora em sua inicial. Limita-se a controvérsia quanto à impossibilidade de condicionar o desembaraço aduaneiro ao recolhimento ou garantia dos valores devidos.

3. O C. STF, no julgamento do tema 1042 – RE nº 1090591/SC, fixou a seguinte tese de repercussão geral: “É constitucional vincular o despacho aduaneiro ao recolhimento de diferença tributária apurada mediante arbitramento da autoridade fiscal”.

4. Diante disso, depreende-se que o recolhimento ou a garantia dos encargos tributários refere-se ao procedimento próprio da internalização da mercadoria importada, não se confundindo com simples método coercitivo para pagamento de tributos, constrangimento ilegal, cerceamento da atividade empresarial ou sanção política. Precedentes desta Colenda Sexta Turma.

5. Dessa feita, nada obstante a declaração lançada pela autoridade fiscal seja pela caracterização de “SUBFATURAMENTO (FRAUDE DE VALOR) mediante falsidade ideológica da fatura comercial, já que os valores (irreais) faturados e declarados notoriamente não correspondem à verdade”, sem adentrar a possível falsidade material de documentação, ou eventual sujeição a pena de perdimento, ao menos na análise da tutela provisória de urgência, depreende-se a legalidade da exigência de recolhimento ou garantia dos encargos tributários para continuidade do desembaraço aduaneiro. Precedentes.

6. Agravo de instrumento a que se nega provimento.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo de instrumento, restando prejudicado o requerimento de reconsideração, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.