Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009691-21.2006.4.03.6107

RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO

APELANTE: UNIMED DE ARACATUBA - COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO

Advogado do(a) APELANTE: BENEDICTO CELSO BENICIO JUNIOR - SP131896-A

APELADO: CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA - CADE

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009691-21.2006.4.03.6107

RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO

APELANTE: UNIMED DE ARACATUBA - COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO

Advogado do(a) APELANTE: BENEDICTO CELSO BENICIO JUNIOR - SP131896-A

APELADO: CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA - CADE

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 Cuida-se de apelação, em embargos à execução de fazer, deduzidos pela Unimed de Araçatuba – Cooperativa de Trabalho Médico em face do Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE, visando à desconstituição do título executivo apurado no PA 08000.011922/97-04, que impôs a suspensão de conduta anticoncorrencial (exclusividade dos Médicos), considerando indevida a imposição de multa e carecendo de legalidade determinação por intervenção.
A r. sentença, ID 122222617 - Pág. 228, proferida sob a égide do CPC/1973, julgou improcedentes os embargos, asseverando que a Lei 9.656/1998, art. 18, inciso III, não permite a exclusividade defendida pela parte embargante, bem como a Lei 5.764/1973, que admite cláusula de exclusividade, a ser anterior à CF/1988, afrontando, portanto, a livre concorrência, não se tratando apenas de relação privada cooperativa, mas afeta interesse coletivo de usuários e se qualifica como domínio de mercado relativo à prestação de serviços médicos, possuindo a intervenção judicial previsão no art. 69 e seguintes, Lei 8.884/1994. Sujeitou a parte embargante ao pagamento de honorários, no importe de 10% sobre o valor da causa.
Apelou a Unimed, 108229967 - Pág. 7, alegando, em síntese, validade da cláusula de fidelidade cooperativa, porque em consonância com a Lei 5.764/1971, restando indevida a intervenção estatal, vedada constitucionalmente, art. 5º, XVIII, tratando-se de voluntária adesão do Médico, portanto está obrigado a cumprir o estatuto, igualmente existindo amparo no Código Civil.
Apresentadas as contrarrazões, ID 108229967 - Pág. 62, sem preliminares, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009691-21.2006.4.03.6107

RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO

APELANTE: UNIMED DE ARACATUBA - COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO

Advogado do(a) APELANTE: BENEDICTO CELSO BENICIO JUNIOR - SP131896-A

APELADO: CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA - CADE

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

Nenhum reparo a comportar a r. sentença.
De proêmio, destaque-se não caber ao Judiciário o exame acerca do mérito administrativo apurado pelo CADE, mas apenas a aferição formal sobre a legalidade do ato impugnado :

“ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. CADE. FORMAÇÃO DE CARTEL CARACTERIZADA. PENA DE MULTA. REDUÇÃO. SUCUMBÊNCIA MÍNIMA. APELAÇÕES NÃO PROVIDAS.
...
8. Ausente qualquer ilegalidade na conclusão do CADE, a qual se encontra devidamente embasada. Veja-se que ao Judiciário não cabe adentrar no mérito administrativo, mas tão somente analisar a decisão no tocante à sua legalidade.
...
(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000461-84.2017.4.03.6105, Rel. Desembargador Federal ANTONIO CARLOS CEDENHO, julgado em 05/08/2021, Intimação via sistema DATA: 06/08/2021)

Com efeito, importante registrar que a Carta Magna de 1988, em seu art. 170, inciso IV, prevê que a ordem econômica é balizada pelo princípio da livre concorrência, significando dizer que qualquer tentativa de uniformizar o mercado, ou direcionar a demanda de dado segmento mercadológico, atenta, veementemente, contra referido sistema.
Tanto assim o ser que objetivamente harmônica a previsão da Lei de Repressão às Infrações contra a Ordem Econômica com os Princípios Gerais da Atividade Econômica, erigidos pela Constituição Federal.
Ora, a norma infraconstitucional nada mais fez do que instrumentalizar o mecanismo para que o Estado pudesse proteger a livre concorrência e a economia local de condutas abusivas, em prejuízo da coletividade e da própria Administração.
No caso concreto, diferentemente do que defendido pela parte apelante, em procedimento administrativo pautado por robustez de provas, apurou o CADE a prática anticoncorrencial adotada pela Unimed, no que toca à cláusula de fidelidade dos Médicos cooperados, assim não poderiam prestar serviços a concorrentes.
É dizer, de clareza solar que, com referida medida, direta ou indiretamente, monopoliza a Unimed Araçatuba o rol de Médicos, pois o profissional não poderá laborar para outrem.
Em outras palavras, em que pese suscite o polo apelante possibilidade da exclusividade se embasando na Lei 5.764/1973 e no CCB, a CF/1988 inaugurou novos preceitos e, na colidência de normas, interpretação harmônica do sistema merece ser empregada, tanto quanto averiguação de enquadramento à novel sistemática constitucional, por isso soçobra a exegese recursal, pois o interesse público e coletivo direcionam para a veemente ilicitude da exclusividade, tomando-se por base a atividade médica em pauta.
Ou seja, fidelizar o Médico e impedi-lo de laborar para outra empresa a se traduzir na imposição a que determinado usuário fique obrigado a contratar os serviços exclusivos da Unimed, para que possa ter atendimento por intermédio de um convênio, ceifando a possibilidade de outras empresas adentrarem ao mercado (gera concorrência), o que pode impactar no preço do serviço, na qualidade e no direito do cidadão de escolher, franqueando diversidade de acesso ao essencial serviço de saúde, por estes motivos plena de legalidade a intervenção estatal promovida, a impedir límpido ato antijurídico, praticado pela Unimed.
Ao norte da ilegalidade do agir do polo recorrente, esta C. Corte :

“EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. ADMINISTRATIVO. COOPERATIVA MÉDICA. CLÁUSULA DE EXCLUSIVIDADE DE EXERCÍCIO PROFISSIONAL. UNIMILITÂNCIA. INFRAÇÃO AO ARTIGO 18, III, DA LEI Nº 9.656/98. MULTA. LEGITIMIDADE. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
...
9. Insta salientar que o § 4º do artigo 29 da Lei nº 5.764/71 não legitima a manutenção de cláusula de exclusividade, desde o advento da Constituição Federal de 1.988, por incompatibilidade com os princípios da livre iniciativa (art. 170, caput), livre concorrência (art. 170, IV), defesa do consumidor (art. 170, V), liberdade de associação (art. 8º) e o direito de todos à saúde (art. 196).
...
(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 0007354-25.2016.4.03.6102, Rel. Desembargador Federal NERY DA COSTA JUNIOR, julgado em 08/09/2021, DJEN DATA: 16/09/2021)

“DIREITO ECONÔMICO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO RETIDO NÃO CONHECIDO POR FALTA DE REITERAÇÃO. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA AFASTADA: JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE COM BASE NOS ELEMENTOS DOS AUTOS QUE PERMITEM AO MAGISTRADO A FORMAÇÃO DE SEU CONVENCIMENTO. COOPERATIVA MÉDICA. CLÁUSULA ESTATUTÁRIA DE EXCLUSIVIDADE DE EXERCÍCIO PROFISSIONAL, IMPOSTA AOS COOPERADOS (UNIMILITÂNCIA): ATO DE DESPREZO CONTRA A CONSTITUIÇÃO FEDERAL E AS LEIS, IMPORTANDO EM AMESQUINHAMENTO DE PROFISSÕES REGULAMENTADAS E EM PREJUÍZO À SOCIEDADE, NA BUSCA DE LUCROS PELA DOMINAÇÃO DE MERCADOS DE PLANOS DE SAÚDE. NULIDADE. COMPROVAÇÃO DA PRÁTICA DA UNIMILITÂNCIA POR MEIO DE "CIRCULAR" ENVIADA AOS COOPERADOS. MANUTENÇÃO DA AUTUAÇÃO E DA MULTA APLICADA PELA AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR COM AMPARO NO ART. 18, III, DA LEI Nº 9.656/1998. PRÁTICA VIOLADORA DOS PRINCÍPIOS, FUNDAMENTOS E OBJETIVOS DA ORDEM ECONÔMICA. LEGITIMIDADE DA RESOLUÇÃO NORMATIVA ANS Nº 175, DE 22.09.2008. VERBA HONORÁRIA MANTIDA. APELO IMPROVIDO.
...
7. O art. 18, III, da Lei nº 9.656/98, ao contrário do que sustenta a apelante, veda à operadora de plano de saúde, independentemente de sua natureza jurídica constitutiva (art. 1º, § 1º, I), impor contratos de exclusividade ou de restrição à atividade profissional aos contratados. Referido dispositivo, editado em consonância com a ordem econômica instituída pela Constituição Federal de 1.988, fundada na livre iniciativa, na livre concorrência e na defesa do consumidor, deve ser aplicado à apelante, mesmo tendo sendo ela uma cooperativa de trabalho e ainda que o seu estatuto seja anterior ao novel diploma. Sim, pois o fato de a apelante ostentar a qualidade de cooperativa e, por isso, submeter-se às regras da Lei nº 5.764/71, não a exime de, na qualidade de operadora de planos de saúde, cumprir as condições estabelecidas na Lei nº 8.656/98, já que os regimes não são excludentes, mas complementares.
8. Ademais, o dispositivo no qual a apelante ampara a sua pretensão - art. 29, § 4º, da Lei nº 5.764/71 - já não legitimava a manutenção de cláusula de exclusividade desde o advento da Constituição Federal de 1.988, por incompatibilidade com os princípios da livre
iniciativa (art. 170, caput), livre concorrência (art. 170, IV), defesa do consumidor (art. 170, V), liberdade de associação (art. 8º) e o direito de todos à saúde (art. 196). Por isso mesmo, o estatuto social da apelante, datado em 15 de abril de 1998, com última alteração em 2004, já não devia mais conter cláusulas do tipo da questionada nesses autos, por afronta manifesta à Constituição Federal.
9. A unimilitância ainda encontra óbice nas regras do art. 20, I, II e IV e 21, IV e V, ambos da Lei nº 8.884/94.
10. A obrigação de não fazer - não impor contrato de exclusividade - decorre do art. 18, III, da Lei nº 9.656/98 e, principalmente, do texto Constituição Federal, sendo graciosa a alegação de violação ao art. 5º, II, da Constituição Federal. Por outro lado, o fato de o estatuto social da autora ser anterior ao novel diploma não lhe assegura o direito de manter um regime antigo, que inclusive afronta os princípios, fundamentos e objetivos da ordem econômica, o sistema de defesa do consumidor e o direito à saúde consagrados na Constituição Federal.
11. Por fim, é nenhum o direito da apelante, cooperativa que evidentemente desempenha atividade econômica, de se escudar na regra do art. 5º, XVIII, da Constituição Federal para afastar o controle do Estado sobre atividade manifestamente nociva a direitos dos consumidores e violadora de princípios fundamentais da ordem econômica.
12. A não interferência do Estado no funcionamento das cooperativas - que ao contrário do que supõe a autora e algumas de suas congêneres, não são entidades que se colocam acima das leis e do interesse público - cessa a partir do momento em que praticam atos nocivos à sociedade brasileira e às profissões regulamentadas, como é o caso da prática da unimilitância destinada à dominação do mercado de planos de saúde privados.
13. Verba honorária mantida.
14. Apelo improvido.”
(TRF 3ª Região, SEXTA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1468028 - 0028237-77.2008.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOHONSOM DI SALVO, julgado em 26/11/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/12/2015 )

Ausentes honorários recursais, por sentenciada a causa sob a égide do CPC/1973, EDcl no AgInt no REsp 1573573/RJ, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 04/04/2017, DJe 08/05/2017.
Por conseguinte, em âmbito de prequestionamento, refutados se põem os demais ditames legais invocados em polo vencido, art. 5º, XVIII, CF, arts. 1.093 e 1.096, CCB, arts. 29, § 4º e 33, Lei 5.764/1971, que objetivamente a não socorrerem, com seu teor e consoante este julgamento, ao mencionado polo (artigo 93, IX, CF).
Ante o exposto, pelo improvimento à apelação, tudo na forma retro estatuída.
É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

EMBARGOS À OBRIGAÇÃO DE FAZER – CONSTITUCIONAL – ADMINISTRATIVO – CADE – CLÁUSULA DE FIDELIDADE/EXCLUSIVIDADE DE MÉDICO VINCULADO À UNIMED DE ARAÇATUBA-SP : ILEGALIDADE – MALFERIMENTO À LIVRE CONCORRÊNCIA – IMPROCEDÊNCIA AOS EMBARGOS – IMPROVIMENTO À APELAÇÃO PRIVADA
1 - Destaque-se não caber ao Judiciário o exame acerca do mérito administrativo apurado pelo CADE, mas apenas a aferição formal sobre a legalidade do ato impugnado. Precedente.
2 - Importante registrar que a Carta Magna de 1988, em seu art. 170, inciso IV, prevê que a ordem econômica é balizada pelo princípio da livre concorrência, significando dizer que qualquer tentativa de uniformizar o mercado, ou direcionar a demanda de dado segmento mercadológico, atenta, veementemente, contra referido sistema.
3 - Tanto assim o ser que objetivamente harmônica a previsão da Lei de Repressão às Infrações contra a Ordem Econômica com os Princípios Gerais da Atividade Econômica, erigidos pela Constituição Federal.
4 - A norma infraconstitucional nada mais fez do que instrumentalizar o mecanismo para que o Estado pudesse proteger a livre concorrência e a economia local de condutas abusivas, em prejuízo da coletividade e da própria Administração.
5 - Diferentemente do que defendido pela parte apelante, em procedimento administrativo pautado por robustez de provas, apurou o CADE a prática anticoncorrencial adotada pela Unimed, no que toca à cláusula de fidelidade dos Médicos cooperados, assim não poderiam prestar serviços a concorrentes.
6 - De clareza solar que, com referida medida, direta ou indiretamente, monopoliza a Unimed Araçatuba o rol de Médicos, pois o profissional não poderá laborar para outrem.
7 - Em que pese suscite o polo apelante possibilidade da exclusividade se embasando na Lei 5.764/1973 e no CCB, a CF/1988 inaugurou novos preceitos e, na colidência de normas, interpretação harmônica do sistema merece ser empregada, tanto quanto averiguação de enquadramento à novel sistemática constitucional, por isso soçobra a exegese recursal, pois o interesse público e coletivo direcionam para a veemente ilicitude da exclusividade, tomando-se por base a atividade médica em pauta.
8 - Fidelizar o Médico e impedi-lo de laborar para outra empresa a se traduzir na imposição a que determinado usuário fique obrigado a contratar os serviços exclusivos da Unimed, para que possa ter atendimento por intermédio de um convênio, ceifando a possibilidade de outras empresas adentrarem ao mercado (gera concorrência), o que pode impactar no preço do serviço, na qualidade e no direito do cidadão de escolher, franqueando diversidade de acesso ao essencial serviço de saúde, por estes motivos plena de legalidade a intervenção estatal promovida, a impedir límpido ato antijurídico, praticado pela Unimed. Precedente.
9 - Ausentes honorários recursais, por sentenciada a causa sob a égide do CPC/1973, EDcl no AgInt no REsp 1573573/RJ, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 04/04/2017, DJe 08/05/2017.
10 – Improvimento à apelação. Improcedência aos embargos.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.