Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma

HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5023288-61.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI

IMPETRANTE: NEWLEY ALEXANDRE DA SILVA AMARILLA
PACIENTE: IVANILDO DA CUNHA MIRANDA

Advogado do(a) IMPETRANTE: NEWLEY ALEXANDRE DA SILVA AMARILLA - MS2921-A
Advogado do(a) PACIENTE: NEWLEY ALEXANDRE DA SILVA AMARILLA - MS2921-A

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CORUMBÁ/MS - 1ª VARA FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma
 

HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5023288-61.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI

IMPETRANTE: NEWLEY ALEXANDRE DA SILVA AMARILLA
PACIENTE: IVANILDO DA CUNHA MIRANDA

Advogado do(a) IMPETRANTE: NEWLEY ALEXANDRE DA SILVA AMARILLA - MS2921-A
Advogado do(a) PACIENTE: NEWLEY ALEXANDRE DA SILVA AMARILLA - MS2921-A

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CORUMBÁ/MS - 1ª VARA FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

R E L A T Ó R I O

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL CONVOCADO DÉCIO GIMENEZ:

Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado por Newley Alexandre da Silva Amarilla, em favor de IVANILDO DA CUNHA MIRANDA, contra ato do Juízo Federal da 1ª Vara Federal de Corumbá/MS (ID 278697885, p. 90-91), o qual, em 26/07/2023, rejeitou os embargos declaratórios defensivos opostos em face de decisão que, em 28/04/2023, no âmbito da Ação Penal n. 5000535-48.2020.4.03.6004, deferira o pedido de perícia sobre as imagens de satélite reproduzidas no laudo técnico de constatação elaborado por engenheiro agrimensor e de segurança contratado pela defesa ou ainda sobre as imagens de satélite contemporâneas aos fatos narrados na denúncia, provenientes do INPE, a ser providenciada notadamente pela própria Polícia Federal (ID 278697885, p. 37-41), sob alegada violação da ampla defesa e da imparcialidade necessária à elaboração de tal trabalho técnico, ora objetivando que a referida perícia venha a ser realizada por equipe de perícia especializada e imparcial, frente às conclusões antagônicas entre o laudo pericial elaborado pela Polícia Federal e o laudo técnico confeccionado por profissional habilitado contratado pelo paciente, no tocante à identificação do  foco inicial de incêndio, isto é, se ocorrido em área interna ou vizinha à propriedade rural do paciente, denominada Fazenda Bonsucesso (ID 278696081).

Consta dos autos que o paciente e o corréu Caue Cordeiro Vicente foram denunciados pela suposta prática delitiva descrita nos artigos 40 e 41, ambos da Lei 9.605/98 (crimes de dano indireto a unidade de conservação de proteção integral correspondente ao Parque Nacional do Pantanal Mato-Grossense, e de incêndio em floresta em torno do referido parque nacional – Fato 1 e Fato 2, respectivamente, em tese perpetrados pelos corréus, em 22/06/2020, a partir de uso do fogo originado na Fazenda Bonsucesso, localizada no Município de Corumbá/MS), no âmbito da Ação Penal n. 5000535-48.2020.4.03.6004  (ID 278697884, p. 138-152), tendo sido a referida denúncia recebida pelo Juízo Federal de origem em 13/07/2022 (ID 278697884, p. 342-345).

Em decisão proferida em 28/04/2023, o Juízo Federal de origem afastou as hipóteses de absolvição sumária previstas no artigo 397 do CPP, bem como determinou o prosseguimento do feito. Na mesma ocasião, deferiu “o pedido de perícia sobre as imagens de satélite, conforme solicitado pela defesa”, ordenando oficiar-se à Polícia Federal para que providenciasse a análise pericial requerida até a data da audiência de instrução e julgamento designada para 23/08/2023 (ID 278697885, p. 37-41).

Irresignada, a defesa dos corréus opôs, em 19/05/2023, embargos de declaração em face da r. decisão, alegando obscuridade no tocante à determinação judicial para que a perícia sobre as imagens de satélite viesse a ser realizada pela Polícia Federal (em vez de “empresa ou perito judicial especializado na área e que não tenha relação com a presente ação penal”), o que a seu ver traria evidente prejuízo à defesa ao impossibilitar uma imparcial confrontação entre as conclusões do laudo pericial e informações técnicas que acompanharam a denúncia (elaborados pela própria Polícia Federal – ID 278697431, p. 9-15, 31-36, 47-58 e 59-63; ID 278697884, p. 11-14 e 15-33; e ID 278697885, p. 49-86) e o laudo técnico de constatação elaborado pelo engenheiro agrimensor e de segurança Márcio Sales Palmeira a pedido dos coacusados (ID 278697885, p. 14-30), já que, enquanto o trabalho técnico realizado pela Polícia Federal aponta que os focos de queimada foram iniciados no interior da propriedade rural de um dos corréus, o trabalho técnico contratado apresentado junto à resposta à acusação aponta que os focos de incêndio se iniciaram em local diverso (ID 278697885, p. 44-46).

Em 18/08/2023, o Juízo Federal de origem veio a rejeitar tais embargos declaratórios defensivos, entendendo que “não é possível afirmar que a Polícia Federal é um órgão parcial, já que sua função não é propriamente de acusação, mas sim de investigação nos termos do art. 144, § 1º, I, da CF”, até mesmo porque, “caso a Polícia Federal não pudesse elaborar laudos técnicos por ser parcial, a persecução penal seria absolutamente inviabilizada”. Ademais, observou que “nada impede que o próprio réu, às suas próprias expensas, produza a prova ou conteste tecnicamente a prova produzida pela PF, a qual será submetida ao contraditório” (ID 278697885, p. 90).

Segundo o impetrante (ID 278696081), haveria constrangimento ilegal configurado no caso concreto, em razão da r. decisão que, em 18/08/2023, no âmbito da Ação Penal n. 5000535-48.2020.4.03.6004, rejeitou os embargos declaratórios defensivos opostos em face de decisão que, em 28/04/2023, havia deferido o pedido de perícia sobre as imagens de satélite requerida pela defesa em sede de resposta à acusação (ID 278697885, p. 2-12), tendo, contudo, determinado sua realização por parte da Polícia Federal, o que ao ver da impetração violaria a imparcialidade necessária à elaboração de tal trabalho técnico, na medida em que os laudos periciais e informações técnicas que acompanharam a denúncia foram elaborados pela própria Polícia Federal.

Requer o deferimento do pedido liminar, “para o fim de determinar a imediata cessação do constrangimento ilegal imposto ao paciente, suspendendo-se o andamento processual até que se profira decisão de mérito neste habeas corpus” (considerando a determinação da autoridade coatora no sentido de que a perícia deve ser finalizada até o dia da audiência de instrução e julgamento designada para o dia 23/08/2023), e, ao final, pretende a concessão definitiva da ordem de habeas corpus, “para o fim de fazer cessar o constrangimento ilegal causado ao paciente – traduzido pela determinação de perícia pela Polícia Federal –, determinando-se a realização do trabalho técnico por equipe de perícia especializada e imparcial” (ID 278696081).

O pedido liminar foi indeferido (ID 278874524).

A autoridade impetrada prestou as informações por mim requisitadas (ID 279035915).

 Em parecer, a Procuradoria Regional da República opinou pela denegação da ordem (ID 279126101).

É o relatório. 

 

 


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11ª Turma
 

HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5023288-61.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI

IMPETRANTE: NEWLEY ALEXANDRE DA SILVA AMARILLA
PACIENTE: IVANILDO DA CUNHA MIRANDA

Advogado do(a) IMPETRANTE: NEWLEY ALEXANDRE DA SILVA AMARILLA - MS2921-A
Advogado do(a) PACIENTE: NEWLEY ALEXANDRE DA SILVA AMARILLA - MS2921-A

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CORUMBÁ/MS - 1ª VARA FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

V O T O

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL CONVOCADO DÉCIO GIMENEZ:

No caso dos autos, a decisão que, em 18/08/2023, rejeitou os embargos declaratórios defensivos opostos em face da decisão sob ID 278697885 (p. 37-41), no bojo da Ação Penal n. 5000535-48.2020.4.03.6004, foi assim fundamentada (ID 278697885, p. 90):

Trata-se de Embargos de Declaração opostos pela defesa dos réus contra decisão do juízo que determinou a realização de perícia, por parte da Polícia Federal, nas imagens de satélite constantes na defesa (ID 288083887). Aduz a defesa que a Polícia Federal não seria detentora de imparcialidade necessária à elaboração do trabalho técnico e requer a determinação de que a perícia seja realizada por empresa ou perito judicial especializado na área e que não tenha relação com a presente ação penal. Instado a se manifestar, o Ministério Público Federal não se opôs ao requerimento da defesa (ID 288854623). Vieram os autos conclusos. Em que pese a manifestação do MPF, considerando que a Polícia Federal é o órgão investigatório que possui aparato técnico para esse tipo de análise, indefiro o pedido da defesa. Entendo, inclusive, que não é possível afirmar que a Polícia Federal é um órgão parcial, já que sua função não é propriamente de acusação, mas sim de investigação nos termos do art. 144, §1º, I, da CF. Aliás, caso a Polícia Federal não pudesse elaborar laudos técnicos por ser parcial, a persecução penal seria absolutamente inviabilizada. Saliente-se que nada impede que o próprio réu, às suas próprias expensas, produza a prova ou conteste tecnicamente a prova produzida pela PF, a qual será submetida ao contraditório. Intimem-se. Corumbá, data e assinatura, conforme certificação eletrônica

Com efeito, entendo não avultar flagrante ilegalidade na decisão ora impugnada sob ID 278697885 (p. 90), que, de maneira suficientemente fundamentada, indeferiu o pleito defensivo que objetivava a determinação de que a perícia sobre as imagens de satélite mencionadas em sede de resposta à acusação viesse a ser realizada por empresa ou perito judicial especializado e que não tivesse qualquer relação com a presente ação penal (em lugar de ser providenciada pela própria Polícia Federal), não havendo de se confundir o desempenho independente da função constitucional da Polícia Judiciária Federal “de apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei”, nos termos do artigo 144, § 1º, I, da Constituição Federal, com a parcialidade inerente à atuação do órgão acusatório, enquanto titular exclusivo da ação penal pública, nos moldes do artigo 129, I, da Constituição Federal, ora representado pelo Ministério Público Federal.

No caso concreto, ainda na fase inquisitorial, antes do oferecimento da denúncia pelo Ministério Público Federal em 08/09/2021 (ID 98295056), os peritos oficiais da Polícia Federal vieram a produzir documentos de análise pericial acerca dos dados contidos em Informações de Polícia Judiciária sobre focos de incêndios na região do Pantanal, visando atender à solicitação do Delegado de Polícia Federal Daniel Oswaldo Silva e Rocha, no âmbito do Inquérito Policial nº 2020.0083988- DPF/CRA/MS, em sintonia com o disposto no artigo 159 do Código de Processo Penal, in verbis:

Art. 159.  O exame de corpo de delito e outras perícias serão realizados por perito oficial, portador de diploma de curso superior. § 1º  Na falta de perito oficial, o exame será realizado por 2 (duas) pessoas idôneas, portadoras de diploma de curso superior preferencialmente na área específica, dentre as que tiverem habilitação técnica relacionada com a natureza do exame. § 2º Os peritos não oficiais prestarão o compromisso de bem e fielmente desempenhar o encargo. § 3º  Serão facultadas ao Ministério Público, ao assistente de acusação, ao ofendido, ao querelante e ao acusado a formulação de quesitos e indicação de assistente técnico. § 4º O assistente técnico atuará a partir de sua admissão pelo juiz e após a conclusão dos exames e elaboração do laudo pelos peritos oficiais, sendo as partes intimadas desta decisão. § 5º  Durante o curso do processo judicial, é permitido às partes, quanto à perícia:  I – requerer a oitiva dos peritos para esclarecerem a prova ou para responderem a quesitos, desde que o mandado de intimação e os quesitos ou questões a serem esclarecidas sejam encaminhados com  antecedência  mínima de 10 (dez) dias, podendo apresentar as respostas em laudo complementar; II – indicar assistentes técnicos que poderão apresentar pareceres em prazo a ser fixado pelo juiz ou ser inquiridos em audiência. § 6º  Havendo requerimento das partes, o material probatório que serviu de base à perícia será disponibilizado  no  ambiente do órgão oficial, que manterá sempre sua guarda, e na presença de perito oficial, para exame pelos assistentes, salvo se for impossível a sua conservação. § 7º Tratando-se de perícia complexa que abranja mais de uma área de conhecimento especializado, poder-se-á designar a atuação de mais de um perito oficial, e a parte indicar mais de um assistente técnico.           

Enquanto agentes do Estado, os peritos oficiais de natureza criminal, responsáveis pela realização de laudos periciais, na forma do artigo 159 do CPP, gozam de independência funcional assegurada pelo artigo 2º da Lei 12.030/2009: "Art. 2º No exercício da atividade de perícia oficial de natureza criminal, é assegurado autonomia técnica, científica e funcional, exigido concurso público, com formação acadêmica específica, para o provimento do cargo de perito oficial". Na mesma linha, o artigo 2º-D da Lei 9.266/1996, que veio a ser incluído pela Lei 13.047/2014, estatui, em seu caput, que "os ocupantes do cargo de Perito Criminal Federal são responsáveis pela direção das atividades periciais do órgão", sendo-lhes conferida "autonomia técnica e científica no exercício de suas atividades periciais", conforme estabelecido em seu parágrafo único.

Conforme bem salientado pelo Juízo Federal de origem (ID 278697885, p. 90), em consonância com o parecer da Procuradoria Regional da República (ID 279126101), não vislumbro in caso eventuais impedimentos para que os próprios réus, às suas próprias expensas, produzissem a prova pretendida ou mesmo contestassem tecnicamente a prova produzida pela Polícia Federal, sob o crivo do contraditório, não tendo o impetrante até então trazido aos autos quaisquer elementos que apontem para possível parcialidade ou incapacidade técnica dos peritos e demais agentes da Polícia Federal que atuaram especificamente no caso concreto, notadamente no tocante à confecção das Informações de Polícia Judiciária n. 042/2020, n. 049/2020 e n. 050/2020 (datadas de 11/08/2020, 26/08/2020 e 27/08/2020, respectivamente, todas assinadas pelo agente de Polícia Federal Ewerton Primon - ID 39579062, p. 4-18, 42-53 e 54-58, PJE TRF3 - 1º grau), bem como da Informação Técnica n. 058/2020-SETEC/SR/PF/MS (elaborada em 19/08/2020, pelo perito criminal federal Luiz Fernando Gouvêa Luthold - ID 39579062, p. 26-41) e ainda do Laudo Pericial n. 814/2021/SETEC/SR/PF/MS (datado de 25/05/2021 e desta vez assinado digitalmente por dois peritos criminais federais, a saber, Luiz Fernando Gouvêa Luthold e Silvio Cesar Paulo), com base nas imagens de satélite em questão, que veio a ser juntado aos autos originários pela Polícia Federal somente em 21/08/2023 (ID 298505431, PJE TRF3 - 1º grau).

Ante o exposto, denego a ordem de habeas corpus.



E M E N T A

HABEAS CORPUS. CRIMES DOS ARTIGOS 40 E 41, AMBOS DA LEI 9.605/98. DECISÃO EM SEDE DE EMBARGOS DECLARATÓRIOS DEFENSIVOS MANTENDO A DETERMINAÇÃO JUDICIAL PARA QUE A POLÍCIA FEDERAL PROVIDENCIASSE A ANÁLISE PERICIAL SOBRE AS IMAGENS DE SATÉLITE ENTÃO REQUERIDA PELA DEFESA EM RESPOSTA À ACUSAÇÃO, NO ÂMBITO DE AÇÃO PENAL EM CURSO. IMPETRAÇÃO VISANDO À DETERMINAÇÃO DE TRABALHO TÉCNICO A SER REALIZADO POR EQUIPE DE PERÍCIA ESPECIALIZADA DIVERSA DA POLÍCIA FEDERAL, SOB A ALEGAÇÃO GENÉRICA DE IMPARCIALIDADE DE TAL ÓRGÃO E VIOLAÇÃO DA AMPLA DEFESA. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE NA HIPÓTESE. INDEPENDÊNCIA DA POLÍCIA FEDERAL, NO EXERCÍCIO DE SUAS ATRIBUIÇÕES PREVISTAS NO ARTIGO 144, § 1º, I, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, NÃO SE CONFUNDINDO COM O ÓRGÃO ACUSATÓRIO ORA REPRESENTADO PELO PARQUET FEDERAL. AUTONOMIA TÉCNICA, CIENTÍFICA E FUNCIONAL DOS PERITOS OFICIAIS, ENQUANTO AGENTES DO ESTADO, NO EXERCÍCIO DE SUAS ATIVIDADE PERICIAIS, NOS MOLDES DO ARTIGO 2º DA LEI 12.030/2009  E DO ARTIGO 2º-D DA LEI 9.266/1996. ORDEM DENEGADA.

1. Segundo a impetração, o paciente estaria sofrendo constrangimento ilegal, em razão da r. decisão que, em 18/08/2023, no âmbito da Ação Penal n. 5000535-48.2020.4.03.6004, rejeitou os embargos declaratórios defensivos opostos em face de decisão que, em 28/04/2023, havia deferido o pedido de perícia sobre as imagens de satélite requerida pela defesa em sede de resposta à acusação (ID 278697885, p. 2-12), tendo, contudo, determinado sua realização por parte da Polícia Federal, o que ao ver da impetração violaria a imparcialidade necessária à elaboração de tal trabalho técnico, na medida em que os laudos periciais e informações técnicas que acompanharam a denúncia foram elaborados pela própria Polícia Federal. No mérito, pretende a concessão definitiva da ordem de habeas corpus, “para o fim de fazer cessar o constrangimento ilegal causado ao paciente – traduzido pela determinação de perícia pela Polícia Federal –, determinando-se a realização do trabalho técnico por equipe de perícia especializada e imparcial”.

2. A despeito do sustentado pelo impetrante, entendeu-se não avultar flagrante ilegalidade na decisão ora impugnada, que, de maneira suficientemente fundamentada, indeferiu o pleito defensivo que objetivava a determinação de que a perícia sobre as imagens de satélite mencionadas em sede de resposta à acusação viesse a ser realizada por empresa ou perito judicial especializado e que não tivesse qualquer relação com a presente ação penal (em lugar de ser providenciada pela própria Polícia Federal), não havendo de se confundir o desempenho independente da função constitucional da Polícia Judiciária Federal “de apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei”, nos termos do artigo 144, § 1º, I, da Constituição Federal, com a parcialidade inerente à atuação do órgão acusatório, enquanto titular exclusivo da ação penal pública, nos moldes do artigo 129, I, da Constituição Federal, ora representado pelo Ministério Público Federal.

3. No caso concreto, ainda na fase inquisitorial, antes do oferecimento da denúncia pelo Ministério Público Federal em 08/09/2021 (ID 98295056), os peritos oficiais da Polícia Federal vieram a produzir documentos de análise pericial acerca dos dados contidos em Informações de Polícia Judiciária sobre focos de incêndios na região do Pantanal, visando atender à solicitação do Delegado de Polícia Federal Daniel Oswaldo Silva e Rocha, no âmbito do Inquérito Policial nº 2020.0083988- DPF/CRA/MS, em sintonia com o disposto no artigo 159 do Código de Processo Penal.

4. Enquanto agentes do Estado, os peritos oficiais de natureza criminal, responsáveis pela realização de laudos periciais, na forma do artigo 159 do CPP, gozam de autonomia técnica, científica e funcional, no exercício de suas atividades periciais, consoante assegurado pelo artigo 2º da Lei 12.030/2009 e pelo artigo 2º-D da Lei 9.266/1996, que veio a ser incluído pela Lei 13.047/2014.

5. Conforme bem salientado pelo Juízo Federal de origem (ID 278697885, p. 90), em consonância com o parecer da Procuradoria Regional da República (ID 279126101), não se vislumbraram in caso eventuais impedimentos para que os próprios réus, às suas próprias expensas, produzissem a prova pretendida ou mesmo contestassem tecnicamente a prova produzida pela Polícia Federal, sob o crivo do contraditório, não tendo o impetrante até então trazido aos autos quaisquer elementos que apontem para possível parcialidade ou incapacidade técnica dos peritos e demais agentes da Polícia Federal que atuaram especificamente no caso concreto, notadamente no tocante à confecção das Informações de Polícia Judiciária n. 042/2020, n. 049/2020 e n. 050/2020 (datadas de 11/08/2020, 26/08/2020 e 27/08/2020, respectivamente, todas assinadas pelo agente de Polícia Federal Ewerton Primon - ID 39579062, p. 4-18, 42-53 e 54-58, PJE TRF3 - 1º grau), bem como da Informação Técnica n. 058/2020-SETEC/SR/PF/MS (elaborada em 19/08/2020, pelo perito criminal federal Luiz Fernando Gouvêa Luthold - ID 39579062, p. 26-41) e ainda do Laudo Pericial n. 814/2021/SETEC/SR/PF/MS (datado de 25/05/2021 e desta vez assinado digitalmente por dois peritos criminais federais, a saber, Luiz Fernando Gouvêa Luthold e Silvio Cesar Paulo), com base nas imagens de satélite em questão, que veio a ser juntado aos autos originários pela Polícia Federal somente em 21/08/2023 (ID 298505431, PJE TRF3 - 1º grau).

6. Ordem denegada.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu DENEGAR A ORDEM de habeas corpus, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.