APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000324-21.2021.4.03.6119
RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
APELADO: WINOVER CALL CENTER LTDA
Advogado do(a) APELADO: CRISTIANO RABELLO DE SOUSA - MG76930-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000324-21.2021.4.03.6119 RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: WINOVER CALL CENTER LTDA Advogado do(a) APELADO: CRISTIANO RABELLO DE SOUSA - MG76930-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA (RELATORA): Trata-se de agravo interno interposto pela União Federal contra decisão monocrática que, em sede de habeas data, negou provimento à apelação, para manter a sentença que julgou (...) procedente o pedido formulado nesta ação, com resolução do mérito (art. 487, I, do CPC), e (...) concedeu (...) o HABEAS DATA para determinar à autoridade impetrada que forneça à impetrante suas informações fiscais relativas a pagamento de tributos e contribuições federais constantes dos sistemas Conta Corrente de Pessoa Jurídica – SINCOR, CONTACORPJ, SIEF-COBRANÇA, SAPLI, Extratos das Contribuições Previdenciárias, bem como dos sistemas informatizados de apoio à arrecadação federal já utilizados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, relativamente ao período compreendido entre janeiro de 2016 até o cumprimento desta sentença (ID 156652696). Pretende a reforma da r. decisão agravada, alegando, em síntese, (...) que estão permanentemente disponíveis a todos os contribuintes, os dados por eles próprios informados (...), de modo que fornece a (...) RFB (...) cópia das declarações transmitidas pelo contribuinte, como também disponibiliza consulta e emite comprovantes de arrecadação. Aduz que (...) a impetrante pretende que a RFB forneça informações acerca de eventuais saldos credores para fundamentar pedido de restituição administrativa (...), não (...) havendo (...) interesse (...) em obter Certidão ou declaração acerca da sua situação fiscal quanto aos tributos e contribuições federais administrados pela RFB. Dessa forma, assevera que, (...) a prevalecer a subversão de papéis subentendida na petição inicial, o órgão fazendário estaria compelido a realizar todo o procedimento de verificação dos valores passíveis de serem restituídos ou compensados, o que significaria a realização de procedimentos cabíveis na apreciação da declaração de compensação ou do pedido de restituição, antes mesmo de apresentada a declaração ou pedida a restituição (ID 275815156). Decorrido o prazo para apresentação de contrarrazões, vieram os autos conclusos para julgamento. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000324-21.2021.4.03.6119 RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: WINOVER CALL CENTER LTDA Advogado do(a) APELADO: CRISTIANO RABELLO DE SOUSA - MG76930-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA (RELATORA): Sem razão a agravante. De início, constato a adequação da via eleita para a obtenção do fim pretendido. Com efeito, o habeas data é remédio processual introduzido no ordenamento jurídico pela Constituição da República de 1988, com a finalidade de assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou banco de dados de entidades governamentais ou de caráter público ou retificar dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo (art. 5º, LXXII). O legislador constituinte foi além ao assegurar a proteção do direito de informação. No mesmo art. 5º, XXXIII e XXXIV, assegura o direito dos cidadãos de (...) receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado, bem como o direito de peticionar aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder e o direito de obter certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal. Bem se vê, da análise sistemática do texto constitucional, que a limitação do direito fundamental à informação só se admite em hipóteses excepcionais, devidamente justificadas. Por sua vez, a Lei 9.507, de 12 de novembro de 1997, que regula o direito de acesso a informações e disciplina o rito processual do habeas data, dispõe em seus arts. 7º, I e 8º, parágrafo único, I: Art. 7° Conceder-se-á habeas data: I - para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registro ou banco de dados de entidades governamentais ou de caráter público; (...) Art. 8° A petição inicial, que deverá preencher os requisitos dos arts. 282 a 285 do Código de Processo Civil, será apresentada em duas vias, e os documentos que instruírem a primeira serão reproduzidos por cópia na segunda. Parágrafo único. A petição inicial deverá ser instruída com prova: I - da recusa ao acesso às informações ou do decurso de mais de dez dias sem decisão; No mesmo sentido é o teor do enunciado de Súmula 2 do Superior Tribunal de Justiça: Súmula 2 - não cabe o habeas data (CF, art. 5., LXXII, letra "a") se não houve recusa de informações por parte da autoridade administrativa. Percebe-se, destarte, que a exordial da ação constitucional deve vir instruída com prova da recusa ao acesso às informações ou do decurso de mais de 10 (dez) dias sem decisão, requisito este indispensável para que se configure a prévia pretensão resistida e o correspondente interesse de agir, sob pena de ser reconhecida a carência de ação. No caso vertente, dos fatos descritos na inicial e das informações prestadas pela autoridade impetrada, percebe-se que houve resistência inequívoca na prestação das informações pleiteadas. Com efeito, a fim de obter a concessão de acesso a informações fiscais controladas pela Receita Federal do Brasil, a parte autora, ora apelada, protocolou o Requerimento Administrativo 03005.010319/2021-24, em 15/01/2021, sendo negado o seu pleito, em 22/01/2021, pelo órgão federal. Considerando que tais dados pertencem à esfera fiscal do próprio requerente e que há recusa do Fisco em fornecê-los, é viável a concessão da ordem no presente habeas data. O acesso aos dados sistematizados coaduna-se com o princípio da publicidade ou transparência administrativa consagrado pelo art. 37 da Constituição da República e com o preceito geral de boa-fé que norteia a ordem jurídica. Dessa forma, tratando-se de informações fiscais pertencentes à própria impetrante e admitida a negativa da via administrativa em atender à solicitação do interessado, mostra-se de rigor o reconhecimento do direito líquido e certo em testilha, agindo bem o r. Juízo a quo ao julgar procedente o presente habeas data, com fulcro no art. 487, I do Código de Processo Civil. Nesse mesmo sentido, o seguinte precedente do Pretório Excelso, in verbis: DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ACESSO À INFORMAÇÃO CONTIDA EM ÓRGÃO DE ADMINISTRAÇÃO FAZENDÁRIA. DIREITO DO CONTRIBUINTE. 1. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 673.707-RG, sob a relatoria do Ministro Luiz Fux, assentou que o contribuinte tem direito de obter informações contidas nos registros da Receita Federal do Brasil ou qualquer outro órgão de Administração Fazendária de outras entidades estatais, tendo em vista tratar-se de dados pessoais relativos ao próprio requerente, e que não comprometem a segurança da sociedade ou do Estado. 2. Agravo interno a que se nega provimento. (STF, RE 601.766 AgR, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, j. 29/09/2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe- 16/10/2017) Não é outro o entendimento adotado pela Terceira Turma desta Corte: CONSTITUCIONAL. HABEAS DATA. ACESSO A DADOS DO SINCOR E CONTACORPJ. DIREITO DO CONTRIBUINTE. REMESSA OFICIAL NÃO PROVIDA. 1. À luz da alínea “a” do inciso LXXII do artigo 5º da Constituição Federal e do inciso I do artigo 7º da Lei nº 9.507/97, conceder-se-á habeas data para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público. 2. O Plenário do e. Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do RE 673.707/MG (Tema 582), sob o regime de repercussão geral, firmou entendimento no sentido de que o habeas data é garantia constitucional adequada para a obtenção dos dados concernentes ao pagamento de tributos do próprio contribuinte constantes dos sistemas informatizados de apoio à arrecadação dos órgãos da administração fazendária dos entes estatais. 3. Restou comprovado que o impetrante solicitou à Delegacia da Receita Federal do Brasil em Santos/SP o fornecimento dos registros e anotações mantidos na base de dados dos sistemas de conta corrente pessoa jurídica SINCOR e CONTACORPJ, relativamente aos pagamentos de tributos e contribuições federais e previdenciárias de sua responsabilidade nos últimos 05 (cinco) anos, com a indicação de eventuais créditos constantes em quaisquer destes sistemas, não havendo notícia, nos autos, acerca do fornecimento de aludidas informações, tendo há muito tempo decorrido o prazo de 10 (dez) dias de que trata o inciso I do parágrafo único do artigo 8º da Lei nº 9.507/97, que regula o direito de acesso a informações e disciplina o rito processual do habeas data. 4. Remessa oficial não provida. (TRF 3ª Região, 3ª Turma, RemNecCiv - REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL - 5006074-83.2020.4.03.6104, Rel. Desembargador Federal NERY DA COSTA JUNIOR, julgado em 14/03/2022, Intimação via sistema DATA: 24/03/2022) DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. HABEAS DATA. SISTEMAS DA SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL. DIREITO DO CONTRIBUINTE. RE 673.707/MG. CANAL DE ATENDIMENTO. NEGATIVA AO DIREITO. 1. Encontra-se consolidada a jurisprudência da Suprema Corte firme no sentido do cabimento do habeas data para acesso de dados às informações fiscais do contribuinte, conforme revela o RE 673.707, julgado com repercussão geral. 2. A sentença denegou a ordem, sob o entendimento de que não houve recusa da impetrada, pois informado que o acesso pode ser solicitado por meio do e-CAC ou outras formas de atendimento, via formulário próprio. 3.Em que pese não se tenha provado impedimento de acesso aos dados por meio da plataforma e-CAC ou outro canal, não se justifica negar o fornecimento das informações apontadas, tendo em vista que o pedido foi formulado claramente e levado à atenção da autoridade administrativa. O modo de requisição do pedido não pode implicar negativa à garantia de acesso à informação, direito fundamental previsto no artigo 5º, LXXII, da Constituição Federal. 4. Apelação provida. (TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5005452-69.2019.4.03.6126, Rel. Desembargador Federal LUIS CARLOS HIROKI MUTA, julgado em 24/11/2020, Intimação via sistema DATA: 30/11/2020) Em face do exposto, nego provimento ao agravo interno. É como voto.
E M E N T A
DIREITO CONSTITUCIONAL. AGRAVO INTERNO. HABEAS DATA. ACESSO A INFORMAÇÕES CONSTANTES EM REGISTROS E BANCO DE DADOS DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL. DIREITO DO CONTRIBUINTE DE CONHECIMENTO AOS SEUS DADOS. GARANTIA CONSTITUCIONAL.
1. O habeas data é remédio processual introduzido no ordenamento jurídico pela Constituição da República de 1988, com a finalidade de assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou banco de dados de entidades governamentais ou de caráter público ou retificar dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo (art. 5º, LXXII).
2. Considerando que tais dados pertencem à esfera fiscal do próprio requerente e que há recusa do Fisco em fornecê-los, é viável a concessão da ordem no presente habeas data.
3. O acesso aos dados sistematizados coaduna-se com o princípio da publicidade ou transparência administrativa consagrado pelo art. 37 da Constituição da República e com o preceito geral de boa-fé que norteia a ordem jurídica.
4. Tratando-se de informações fiscais pertencentes à própria impetrante e admitida a negativa da via administrativa em atender à solicitação do interessado, mostra-se de rigor o reconhecimento do direito líquido e certo em testilha.
5. Agravo interno desprovido.