Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0004755-30.2009.4.03.6112

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, JOSE EDUARDO GOMES DE MORAES, GLEUBER SIDNEI CASTELAO, HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, JOSE CLAUDIO VIEIRA, IZABEL CRISTINA DAS NEVES

Advogados do(a) APELANTE: FIDELCINO MACENO COSTA - SP52520-A, LUIZ APARECIDO DA SILVA - SP271787-A
Advogado do(a) APELANTE: RODRIGO CESAR BAPTISTA LINHARES - SP194445-A
Advogados do(a) APELANTE: JOAO BAPTISTA MIMESSE GONCALVES - SP141630-A, SOPHIA GIOVANINI GONCALVES - SP176166-A
Advogados do(a) APELANTE: GABRIELA ARAUJO DAS NEVES - SP341812-A, KELVIN FUZZI ALVES DA SILVA - SP351195-A

APELADO: JOSE EDUARDO GOMES DE MORAES, GLEUBER SIDNEI CASTELAO, HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, JOSE CLAUDIO VIEIRA, IZABEL CRISTINA DAS NEVES, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
PROCURADOR: PROCURADORIA DA REPÚBLICA-EM SÃO PAULO

Advogado do(a) APELADO: RODRIGO CESAR BAPTISTA LINHARES - SP194445-A
Advogados do(a) APELADO: GABRIELA ARAUJO DAS NEVES - SP341812-A, KELVIN FUZZI ALVES DA SILVA - SP351195-A
Advogados do(a) APELADO: JOAO BAPTISTA MIMESSE GONCALVES - SP141630-A, SOPHIA GIOVANINI GONCALVES - SP176166-A
Advogados do(a) APELADO: FIDELCINO MACENO COSTA - SP52520-A, LUIZ APARECIDO DA SILVA - SP271787-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma
 

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0004755-30.2009.4.03.6112

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, JOSE EDUARDO GOMES DE MORAES, GLEUBER SIDNEI CASTELAO, HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, JOSE CLAUDIO VIEIRA, IZABEL CRISTINA DAS NEVES

Advogados do(a) APELANTE: FIDELCINO MACENO COSTA - SP52520-A, LUIZ APARECIDO DA SILVA - SP271787-A
Advogado do(a) APELANTE: RODRIGO CESAR BAPTISTA LINHARES - SP194445-A
Advogados do(a) APELANTE: JOAO BAPTISTA MIMESSE GONCALVES - SP141630-A, SOPHIA GIOVANINI GONCALVES - SP176166-A
Advogados do(a) APELANTE: GABRIELA ARAUJO DAS NEVES - SP341812-A, KELVIN FUZZI ALVES DA SILVA - SP351195-A

APELADO: JOSE EDUARDO GOMES DE MORAES, GLEUBER SIDNEI CASTELAO, HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, JOSE CLAUDIO VIEIRA, IZABEL CRISTINA DAS NEVES, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
PROCURADOR: PROCURADORIA DA REPÚBLICA-EM SÃO PAULO

Advogado do(a) APELADO: RODRIGO CESAR BAPTISTA LINHARES - SP194445-A
Advogados do(a) APELADO: GABRIELA ARAUJO DAS NEVES - SP341812-A, KELVIN FUZZI ALVES DA SILVA - SP351195-A
Advogados do(a) APELADO: JOAO BAPTISTA MIMESSE GONCALVES - SP141630-A, SOPHIA GIOVANINI GONCALVES - SP176166-A
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OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:

Trata-se de apelações criminais interpostas pelo Ministério Público Federal e por JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, brasileiro e nascido em 23.10.1967, GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, brasileiro e nascido em 20.02.1974, HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, brasileira e nascida em 04.10.1948, JOSÉ CLAUDIO VIEIRA, brasileiro e nascido em 28.10.1953 e IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO, brasileira e nascida em 20.11.1968, em face da r. sentença (Id 163020299 – fls. 47/63), publicada em 26.11.2019 e proferida pelo Exmo. Juiz Federal Newton José Falcão, da 2ª Vara Federal de Presidente Prudente/SP, que julgou procedente o pedido para condená-los pela prática do crime previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal, cada qual à pena privativa de liberdade de 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, a ser cumprida inicialmente em regime ABERTO, porém substituída por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas e entrega mensal de cestas básicas a instituição de caridade, cujos destinatários serão indicados pelo r. Juízo das Execuções Penais, bem como pagamento de 33 (trinta e três) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos.

Consta da denúncia, oferecida também em desfavor de PEDRO APARECIDO TRAVA MUNHOZ, brasileiro e nascido em 22.02.1965:

Consta do incluso procedimento administrativo investigatório que no período de 16 de outubro de 2007 até 31 de dezembro de 2009, na sede da Federação das Associações de Assentados e Agricultores Familiares do Oeste Paulista - FAAFOP, situada na Rua José M. Espínola, nº 667, em Mirante do Paranapanema-SP, nesta Subseção Judiciária de Presidente Prudente, os imputados JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, PEDRO APARECIDO TRAVA MUNHOZ, HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, JOSÉ CLAUDIO VIEIRA e IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO, agindo em concurso, com unidade de desígnios e identidade de propósitos, obtiveram, para eles e para outrem, vantagem ilícita, consistente em R$ 1.373.598,28 (um milhão e trezentos e setenta e três mil e quinhentos e noventa e oito reais e vinte e oito centavos), em prejuízo do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA, induzindo a erro os responsáveis pela liberação do dinheiro e analise da prestação de contas do convênio no 19000/2007 e seus três aditivos, mediante meio fraudulento.

Apurou-se que a Federação das Associações de Assentados e Agricultores Familiares do Oeste Paulista - FAAFOP foi constituída aos 27 de agosto de 2006, conforme ata da assembleia geral de fundação (fls. 45/48) e respectivo estatuto social (fls. 49/69), obtendo seu registro no cadastro nacional da pessoa jurídica em 08 de novembro de 2006, de acordo com a informação da Receita Federal colacionada aos autos a fls. 72, tendo os denunciados JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, como Presidente, HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, como Vice-Presidente, GLEUBER SIDNEI CASTELÃO como contador, PEDRO APARECIDO TRAVA MUNHOZ como 1º Secretário de Administração e Finanças, ISABEL CRISTINA NEVES RIBEIRO como 2- Secretaria de Administração e Finanças e JOSÉ CLAUDIO VIEIRA como Conselheiro Fiscal.

Sua constituição se deu com o objetivo de receber e utilizar fraudulentamente verbas públicas federais oriundas do INCRA, em benefício próprio e alheio.

A estratégia idealizada era a de que uma associação/entidade recente, não ostentaria restrições para celebração de convênios com o INCRA, permitindo-se assim o recebimento de verbas públicas, sempre com a intenção de sua utilização fora do plano de trabalho estipulado para o repasse.

Dando sequência ao plano criminoso, JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, sempre com intenção de fraudar o uso dos recursos, o que era do conhecimento e anuência dos demais imputados, todos ocupantes de funções essenciais dentro da entidade, representando a Federação das Associações de Assentados e Agricultores Familiares do Oeste Paulista – FAAFOP e o INCRA, representado pelo Superintendente Regional Raimundo Pires Silva, assinaram em 16 de outubro de 2007, o convênio INCRA/CRT/SP/No 19000/2007, tendo por objeto fomentar a produção de oleaginosas nos assentamentos do Estado de São Paulo, no âmbito do Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel do Governo Federal, diversificar a produção nos assentamentos, aumentar a renda das famílias e contribuir para o aumento da biodiversidade nos assentamentos do Estado de São Paulo (fls. 96/109).

Por meio do referido convênio, que tinha data de vigência estabelecida de 18 de outubro de 2007 a 31 de outubro de 2008, foram liberados a Federação das Associações de Assentados e Agricultores Familiares do Oeste Paulista - FAAFOP, em 18 de outubro de 2007, para a execução dos serviços previstos no Plano de Trabalho, a quantia inicial de R$ 622.400,00 (seiscentos e vinte e dois mil e quatrocentos reais), conforme se vê a fls. 122/123, tendo ocorrido o desvio do dinheiro para finalidades diversas da constante do plano de trabalho.

Posteriormente, em 01 de abril de 2008, a Federação das Associações de Assentados e Agricultores Familiares do Oeste Paulista - FAAFOP, novamente representada pelo imputado JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, apresentou ao INCRA pedido de novo aporte de recursos (fls. 131).

Assim, em 11 de abril de 2008, antes da prestação de contas da primeira liberação, foi celebrado o 1° Termo Aditivo, entre a Federação das Associações de Assentados e Agricultores Familiares do Oeste Paulista - FAAFOP, mais uma vez representada pelo imputado JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, que continuava agindo com intenção inequívoca de obtenção da vantagem ilícita, sempre com conhecimento e anuência dos demais denunciados e o INCRA, representado pelo Superintendente Raimundo Pires Silva (fls. 144/145),

Neste primeiro aditivo ao Convênio INCRA/CRT/SP/No 19000/2007, foram liberados à Federação das Associações de Assentados e Agricultores Familiares do Oeste Paulista - FAAFOP, em 16 de abril de abril de 2008, mais R$ 351.198,25 (trezentos e cinquenta e um mil e cento e noventa e oito reais e vinte e cinco centavos), para utilização específica e exclusiva no objeto conveniado e seu Plano de Trabalho (fls. 154/159), o que também não ocorreu, ante o desvio do dinheiro e uso diverso do pactuado.

Posteriormente, em 03 de outubro de 2008, a imputada HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO protocolou junto ao INCRA pedido de prorrogação de vigência do convênio (fls. 218), tendo sido celebrado em 07 de outubro de 2008, o 2º Termo Aditivo, entre a Federação das Associações de Assentados e Agricultores Familiares do Oeste Paulista - FAAFOP, desta vez representada pela imputada HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, que mantinha a intenção de ocasionar lesão patrimonial, sempre com anuência e conhecimento de todos os demais integrantes do grupo criminoso, e o INCRA, representado mais uma vez por Raimundo Pires Silva, prorrogando-se a vigência de Convênio INCRA/CRT/SP/No 19000/2007 até 31 de março de 2009 com atualização do Plano de Trabalho, o que foi publicado no DOU em 08 de outubro de 2008 (fls. 267/284).

Mais adiante, em 17 de novembro de 2008, foi celebrado pela Federação das Associações de Assentados e Agricultores Familiares do Oeste Paulista - FAAFOP, novamente representada pela imputada HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, que continuava com intenção de obtenção de vantagem ilícita, ainda com conhecimento e anuência dos demais e o INCRA, representado por Raimundo Pires Silva, o 3º Termo Aditivo ao Convênio INCRA/CRT/SP/No 19000/2007, com período de vigência até 31 de dezembro de 2009, com a liberação em 18 de novembro de 2008 de mais R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais), tudo vinculado ao objeto e Plano de Trabalho do referido convênio (fls. 304/320).

Portanto, o valor total liberado para atender a Convênio INCRA/CRT/SP/No 19000/2007 e seus três aditivos foi de R$ 1.373.598,28 (um milhão, trezentos e setenta e três mil, quinhentos e noventa e oito reais e vinte e oito centavos), que foram ilicitamente utilizados pelos réus, em proveito próprio e alheio, em total desconformidade com o objeto e plano de trabalho.

Aliás, tanto o objeto como o plano de trabalho, sempre foram elaborados pelo grupo criminoso denunciado de modo vago, impreciso e obscuro, com intenção de facilitar a fraude, impedir a fiscalização e desviar os recursos públicos recebidos, como apontado no laudo pericial de fls. 1158/1178, abaixo parcialmente transcrito:

(...)

Este total de R$ 1.373.598,28 (um milhão, trezentos e setenta e três mil, quinhentos e noventa e oito reais e vinte e oito centavos), provenientes do INCRA, foi disponibilizado a Federação das Associações de Assentados e Agricultores Familiares do Oeste Paulista - FAAFOP, no Banco do Brasil, agência nº 2718-9, conta corrente nº 20497-8, sendo que todo o montante depositado foi movimentado com a emissão de cheques, com as assinaturas dos imputados JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, PEDRO APARECIDO TRAVA MUNHOZ, HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, JOSÉ CLAUDIO VIEIRA e IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO, contando o grupo ainda com a participação de GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, responsável, dentro da estrutura criminosa montada, por apresentar a falsa prestação de contas de parte dos recursos utilizados, tendo todos total e inequívoca consciência de que o dinheiro proveniente do INCRA não era utilizado na finalidade estipulada no convênio, com desvio em proveito próprio e de terceiros.

Seguindo o plano criminoso estabelecido, os imputados HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO e GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, sempre com o conhecimento e anuência dos demais denunciados, apresentaram de modo fraudulento ao INCRA em 14 de agosto de 2008, um relatório de execução físico -financeira (fls. 183), relatório da execução e despesa (fls. 184) e uma relação de pagamentos, com indicação dos favorecidos e valores recebidos por cada um, em relação aos valores gastos pela Federação das Associações de Assentados e Agricultores Familiares do Oeste Paulista - FAAFOLI, com prestação de contas inverídica, para dar ares de legalidade aos desvios cometidos, referente ao Convênio INCRA/CRT/SP/No 19000/2007, no que diz respeito aos gastos realizados no período de 18 de outubro de 2007 a 31 de dezembro de 2007 (fls. 185/187).

As informações prestadas são falsas e tinham a finalidade de manter em erro o INCRA acerca dos valores liberados pelo convênio, de modo a garantir a obtenção da vantagem ilícita.

A título de exemplo, reproduzo depoimento de algumas pessoas que foram relacionadas pela Federação das Associações de Assentados e Agricultores Familiares do Oeste Paulista - FAAFOP, como beneficiarias do verbas oriundas do Convênio INCRA/CRT/SP/No 19000/2007 e que negaram qualquer ligação ou recebimento de verba da referida FAAFOP.

Otávio Heizo Uchiyama, inquirido a fls. 878/879, assim se manifestou:

(...)

José Paulo Ferreira, também evidenciou o modo fraudulento de obtenção das notas fiscais (fls.  890):

(...)

Reinquirido a fls. 1017, apontou mais uma vez. o modo como se dava a fraude:

(...)

CRÉLIO PEREIRA SILVA, também destacou a fraude (fls. 900):

(...)

Vê-se que Gleuber Sidnei Castelão, José Eduardo e Pedro Trava participaram do processo de formação dos fictícios pagamentos, mostrando assim, que tinham poder de decisão no esquema criminoso arquitetado.

Geraldo Bispo Soares, inquirido a fls. 907, também confirmou a fraude:

(...)

Mario Brito Godinho, inquirido a fls. 915, também negou o recebimento de valores da FAAFOP:

(...)

O laudo pericial de fls. 1158/1178 evidencia o modo criminoso como foi feita a prestação de contas encaminhada por HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO e GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, comprovando que sequer houve a juntada de recibos ou emissão de notas fiscais, pelos supostos beneficiários do dinheiro e a total discrepância existente entre os apontados beneficiários e quem efetivamente recebeu os cheques.

No quadro V deste laudo pericial, que passa a fazer parte integrante desta denúncia, é destacada a relação de todos os beneficiários apontados por HILDA e GLEUBER, como recebedores do dinheiro utilizado, mostrando que a maior parte sequer emitiu um recibo ou uma nota fiscal comprovando a execução de qualquer serviço.

Ainda, o quadro VIII, do referido laudo pericial, que também passa a integrar esta denúncia, deixa claro a enorme discrepância existente entre a relação de credores e a quem o cheque foi efetivamente pago.

Além de não existir comprovação documental da execução da maior parte dos serviços que justificaram os alegados pagamentos, em relação a tantos outros, há absoluta desconformidade entre os cheques emitidos e os recibos juntados.

Vejamos (fls. 1158/1178):

(...)

Outro fator a identificar a fraude é a tentativa de justificar os gastos com recibos emitidos em data bem distantes do saque efetuado (fls. 1158/1178):

(...)

Mas as ilicitudes e fraudes não pararam por aí, uma vez que a maior parte dos cheques foi sacada na boca do caixa, impedindo o conhecimento da real utilização de dinheiro público. Vejamos (fls. 1158/1178):

(...)

Bem por isso, há evidente fraude na prestação parcial de contas, utilizada com clara intenção de iludir os funcionários do INCRA quanto ao modo como o dinheiro público foi efetivamente utilizado. Do mesmo modo, percebendo que a prestação de contas realizada não tinha surtido o efeito desejado, os denunciados deixaram de prestar contas quanto ao restante do dinheiro recebido.

Não resta ainda que enorme parte dos cheques emitidos foram destinados à própria FAAFOP, gerida pelos denunciados, com utilização fraudulenta do dinheiro.

Vejamos o resumo dos gastos e a conclusão do laudo pericial (fls. 1158/1178):

(...)

Para uma adequada individualização da conduta de cada denunciado, em relação a responsabilidade pela emissão dos cheques assinados, transcreve-se abaixo a relação, com imputação de responsabilidade, acerca de cada cheque emitido, com uso fraudulento do dinheiro público (fls. 1184/1188):

(...)

A Controladoria Geral da União também procedeu à análise do Convênio nº 19000/2007 e seus três aditivos, tendo constatado a existência de inúmeros elementos de convicção, que indicam a intenção de fraude, desde a celebração do convênio e seus aditivos, bem como a completa ausência de comprovação da utilização do dinheiro público recebido no objeto e plano de trabalho previsto no convênio, conforme reprodução parcial abaixo (fls. 1223/1260):

(...)

Deste modo, concluiu a Controladoria Geral da União (fls. 1258/1259):

(...)

Assim, não resta dúvida da prática delitiva aqui imputada, tendo ocorrido indevida e ilícita utilização do dinheiro recebido do INCRA, sem comprovação de seu uso na finalidade pactuada no convênio, o que ocasiona prejuízo à autarquia e vantagem ilícita a terceiros.

JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES foi o articulador principal do golpe, sendo o presidente da FAAFOP no período da celebração do convênio, por ele assinado, tendo total responsabilidade pela correta aplicação do dinheiro público, o que, com consciência e vontade deixou de fazer, sendo o responsável direto pela emissão de cheques que totalizaram R$ 1.080.393,71 (um milhão e oitenta mil e trezentos e noventa e três reais e setenta e quatro centavos), o que permitiu a obtenção de vantagem ilícita pelo grupo criminoso e também por terceiros, em prejuízo do INCRA. Mesmo apôs seu afastamento formal da entidade, para concorrer ao cargo de vereador de município de Teodoro Sampaio, continuou articulando com os demais denunciados o desvio do dinheiro público.

GLEUBER SIDNEI CASTELÃO teve papel essencial dentro da estrutura criminosa, sendo responsável por realizar os pagamentos com desvio dos recursos públicos, inclusive dentro de seu escritório de contabilidade e também por emitir recibos inidôneos em favor e em nome da FAAPOP, tendo ainda sido responsável pela apresentação de documentos ao INCRA, que simulavam a correta aplicação do dinheiro. Tinha total conhecimento da aplicação irregular da verba pública e aderiu a conduta do grupo criminoso, de modo a participar da obtenção da vantagem ilícita por parte de terceiros, em prejuízo ao INCRA.

PEDRO APARECIDO TRAVA MUNHOZ também desempenhou papel essencial no desvio do dinheiro público. Junto com José Eduardo, foi responsável direto pela assinatura de inúmeros cheques que totalizaram R$ 1.080.393,74 (um milhão e oitenta mil e trezentos e noventa e três reais e setenta e quatro centavos), o que permitiu a obtenção de vantagem ilícita pelo grupo criminoso e também por terceiros, em prejuízo do INCRA. Também foi responsável, dentro da divisão de tarefas estipulada por obter documentos que indicassem o uso do dinheiro, de modo a manter o INCRA em erro, permitindo assim, a continuidade da obtenção da vantagem ilícita por parte de terceiros. Tinha total conhecimento do modo ilícito como o dinheiro público estava sendo utilizado.

HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO assumiu a presidência da FAAFOP após José Eduardo afastar-se para candidatar-se a vereador. No comando da entidade, ciente desde o princípio da utilização ilícita do dinheiro, foi responsável pela assinatura de dois termos aditivos, que permitiram o levantamento de enorme parcela de recursos públicos, não evidenciando adequadamente o modo de utilização do dinheiro, com clara intenção de manter em funcionamento a esquema criminoso. Foi responsável direta pela emissão de cheques, que totalizaram R$ 106.283,02 (cento e seis mil e duzentos e oitenta e três reais e dois centavos). Acrescente-se que assinou os cheques para a FAAFOP a pedido de José Eduardo, tendo feito a emissão em branco, o que comprova de vez que aderiu ao plano criminoso, permitindo a utilização do dinheiro de modo fraudulento, o que ocasionou vantagem ilícita a terceiros, em prejuízo do INCRA.

JOSÉ CLÁUDIO VIEIRA atuou como membro do Conselho Fiscal da FAAFOP e também como tesoureiro. Foi responsável pela emissão de cheques, que totalizaram R$ 146.000,00 (cento e quarenta e seis mil reais), permitindo assim, a obtenção de vantagem ilícita por parte de terceiros. Do mesmo modo, foi beneficiado indevidamente com pagamentos diretos da FAAFOP. Como integrante do corpo de direção da entidade, tinha conhecimento desde o princípio da ilicitude da utilização do dinheiro público, aderindo a conduta praticada pelos demais integrantes. Assinou cheques, mesmo sem poderes para tanto, mostrando sua total obediência ao grupo criminoso.

IZABEL CRISTIMA DAS NEVES RIBEIRO, por sua vez, atuou como 2ª Secretária de Finanças e Administração da FAAFOP, tendo emitido em conjunto com Hilda cheques que totalizaram R$ 106.283,02 (cento e seis mil e duzentos e oitenta e três reais e dois centavos). Mesmo afastada de sua função na entidade, continuou a assinar cheques , a pedido de José Eduardo. Os cheques foram assinados em branco, mostrando ter total conhecimento do uso ilícito de dinheiro público, aderindo a conduta dos demais integrantes, o que ocasionou a obtenção de vantagem ilícita por parte de terceiros, em prejuízo ao INCRA.

Resta clara a organização do grupo, hierarquia estrutural, planejamento, divisão de tarefas, tudo com objetivo único de obtenção de lucros, face ao desvio do dinheiro público, tendo em vista a aplicação da verba federal em finalidade totalmente diversa da pactuada, sem obediência aos requisitos legais, em benefício de todos eles e de terceiros (Id 163020294 – fls. 05/31).

 

Tipificação: art. 171, § 3º, do Código Penal.

A denúncia foi recebida em 01.07.2013 (Id 163020294 – fl. 33).

Citado por edital, PEDRO APARECIDO TRAVA MUNHOZ não compareceu nem constituiu advogado, motivo pelo qual foram suspensos o processo e o curso do prazo prescricional em relação a ele, assim como determinou-se o desmembramento dos autos (Id 163020296 – fl. 16).

Sobreveio a r. sentença, que condenou JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, JOSÉ CLAUDIO VIEIRA e IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO pela acusação relacionada à prática do crime previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal.

Em suas razões de recurso, o órgão de acusação pleiteia a exasperação da pena-base, para que seja fixada em pelo menos 03 anos de reclusão, dada “a gravidade do ato praticado, que prejudica importante programa social de reforma agrária, destinado aos trabalhadores rurais assentados, o que compromete toda a política pública prevista”. Aduz, ainda, que a pena substitutiva de entrega mensal de cestas básicas a instituição de caridade constitui, na verdade, a de prestação pecuniária, cujo valor, então, requer seja fixado em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Postula, enfim, a fixação do valor mínimo de R$ 1.373.598,2 (um milhão, trezentos e setenta e três mil e quinhentos e noventa e oito reais e vinte e oito centavos) a título de reparação do dano (Id 163020299 – fls. 92/108 e Id 163020300 – fls. 01/10).

GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, por sua vez, postula a absolvição, ao argumento de que os elementos de convicção produzidos no curso da persecução penal não demonstram, com segurança, a existência do dolo. Subsidiariamente, requer o reconhecimento da participação de menor importância, bem como a estipulação da pena no mínimo legal (Id 163020299 – fls. 72/86).

JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES e HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO requerem também a absolvição, para o que sustentam que o dolo não foi comprovado. Subsidiariamente, postulam a fixação da pena no mínimo legal, assim como a substituição da substitutiva de entrega de cestas básicas por outra, ou que o valor seja estipulado em “20% (vinte por cento) calculada sobre o salário mínimo da época dos fatos, na quantidade de 01 (um) pagamento a cada três meses, durante o período de substituição da pena”, bem como a não aplicação da pena de multa ou que seja fixada somente em 01 (um) dia-multa e, enfim, a concessão dos benefícios da justiça gratuita, ao argumento de que não possuem condições financeiras de arcar com tais obrigações (Id 163020300 – fls. 33/38 e 39/46).

IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO, por seu turno, pede apenas a absolvição por ausência de comprovação do dolo (Id 163020300 – fls. 56/66).

JOSÉ CLAUDIO VIEIRA, enfim, requer também a absolvição, para o que aduz que o elemento subjetivo do tipo penal em apreço não foi demonstrado. Caso mantida a condenação, postula o abrandamento da pena-base, para o que aduz que foi estipulada acima do mínimo legal a partir de considerações genéricas acerca da gravidade do crime (Id 163020300 – fls. 68/75).

Recebidos os recursos, com contrarrazões (Id 163020300 – fls. 48/55, 77/82, 90/107, 109/111, 113/115 e Id 163020304), subiram os autos a esta Egrégia Corte.

Oficiando nesta instância, a Procuradoria Regional da República opinou pelo provimento do reclamo veiculado pelo órgão de acusação e pelo desprovimento daqueles manejados pelos réus (Id 165410106).

É o relatório.

À revisão.

 

 


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PROCURADOR: PROCURADORIA DA REPÚBLICA-EM SÃO PAULO

Advogado do(a) APELADO: RODRIGO CESAR BAPTISTA LINHARES - SP194445-A
Advogados do(a) APELADO: GABRIELA ARAUJO DAS NEVES - SP341812-A, KELVIN FUZZI ALVES DA SILVA - SP351195-A
Advogados do(a) APELADO: JOAO BAPTISTA MIMESSE GONCALVES - SP141630-A, SOPHIA GIOVANINI GONCALVES - SP176166-A
Advogados do(a) APELADO: FIDELCINO MACENO COSTA - SP52520-A, LUIZ APARECIDO DA SILVA - SP271787-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:

O Ministério Público Federal ofereceu denúncia em face de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, JOSÉ CLAUDIO VIEIRA, IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO e PEDRO APARECIDO TRAVA MUNHOZ pela prática do crime previsto no art. art. 171, § 3º, do Código Penal, uma vez que teriam obtido vantagem ilícita consistente no recebimento de R$ 1.373.598,28 (um milhão, trezentos e setenta e três mil e quinhentos e noventa e oito reais e vinte e oito centavos) em prejuízo do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA, para o que, mediante meio fraudulento, induziram a erro os responsáveis pela liberação do valor à Federação das Associações de Assentados e Agricultores Familiares do Oeste Paulista – FAAFOP (que os réus integravam em posições essenciais), situada no Município de Mirante do Paranapanema/SP, valor este obtido através do convênio INCRA/CRT/SP n° 19000/2007 e seus três aditivos. O convênio, com vigência inicial estabelecida de 18.10.2007 a 31.10.2008, tinha como objetivo declarado fomentar a produção de oleaginosas nos assentamentos do Estado de São Paulo no âmbito do Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel do Governo Federal, diversificar a produção, contribuir para o aumento da biodiversidade e aumentar a renda das famílias. À época da assinatura, os denunciados ocupavam as seguintes posições na FAAFOP:

- JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES: Presidente;

- HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO: Vice-Presidente;

- GLEUBER SIDNEI CASTELÃO: Contador;

- PEDRO APARECIDO TRAVA MUNHOZ: 1º Secretário de Administração e Finanças;

- IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO: 2ª Secretária de Administração e Finanças;

- JOSÉ CLAUDIO VIEIRA: Conselheiro Fiscal;

 

Por meio de referido convênio foram inicialmente liberados à FAAFOP R$ 622.400,00 (seiscentos e vinte e dois mil e quatrocentos reais).

Posteriormente, em 01.04.2008, a FAAFOP, ainda representada por JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, apresentou ao INCRA novo pedido de aporte de recursos, o que resultou no primeiro aditivo, celebrado antes mesmo da primeira (e única) prestação de contas (que sequer abarcou todo o período de vigência inicial do convênio, uma vez que abrangeu apenas o ano de 2007), através do qual foram liberados mais R$ 351.198,25 (trezentos e cinquenta e um mil e cento e noventa e oito reais e vinte e cinco centavos).

Em 03.10.2008, HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, que passara a exercer a Presidência da FAAFOP, protocolou pedido de prorrogação do convênio junto ao INCRA, de maneira que foi então celebrado o segundo termo aditivo e estendida a validade do convênio até 31.03.2009. Embora JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES não representasse mais a entidade, também teria tomado parte em tal fraude, assim como nas seguintes.

Mais adiante, em 17.11.2008, foi celebrado entre a FAAFOP, novamente representada por HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, e o INCRA, o terceiro termo aditivo, com período de vigência até 31.12.2009 e a entrega de mais R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais), sempre mediante vinculação ao objeto e Plano de Trabalho do convênio.

Somados, os valores resultaram na liberação indevida de R$ 1.373.598,28 (um milhão, trezentos e setenta e três mil e quinhentos e noventa e oito reais e vinte e oito centavos). Tal valor foi disponibilizado à FAAFOP em conta corrente do Banco do Brasil, e todos os denunciados teriam assinado cheques para movimentação dos recursos, à exceção de GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, a quem, entretanto, teria incumbido a elaboração de falsa prestação de contas. Com efeito, mencionado réu e HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO apresentaram ao INCRA, em 14.08.2008, relatórios de execução físico-financeira e de execução e despesa, bem como relação de pagamentos, na qual constava indicação dos supostamente favorecidos e valores recebidos da FAAFOP por cada um, relativa ao período de 18.10.2007 a 31.12.2007 (além de apresentar diversas falhas, tratou-se da única prestação de contas apresentada pela FAAFOP, que sequer abarcou todo o período inicial de vigência do convênio com o INCRA).

Descreve ainda a inicial acusatória que, conforme apurado em Informação Técnica elaborada por contador da Procuradoria da República no Município de Presidente Prudente/SP (documento ao qual a denúncia se refere como laudo pericial), o objeto da FAAFOP e o plano de trabalho previsto no convênio foram elaborados de modo impreciso e obscuro, justamente com a intenção de facilitar a fraude.

Com efeito, apurou-se posteriormente que alguns dos supostamente favorecidos pelos repasses da FAAFOP, como Otávio Heizo Uchiyama, José Paulo Ferreira, Crélio Pereira Silva, Geraldo Bispo Soares e Mario Brito Godinho não receberam os valores indicados.

Como destaca a mencionada Informação Técnica, na prestação de contas elaborada por GLEUBER SIDNEI CASTELÃO e HILDA PEREIRA DOS SANTOS não constam, na maioria dos casos, recibos ou notas fiscais, a demonstrar a discrepância entre os supostos beneficiários e quem realmente recebeu os cheques. Em outras situações, há desconformidade entre os cheques emitidos e os recibos juntados, ou, ainda, nestes consta data de emissão distante daquela em que o saque foi efetuado, o que indica tentativa fraudulenta de tentar justificar os gastos. Ademais, segundo o órgão de acusação, a maior parte dos cheques foi sacada no caixa, de maneira a obstaculizar o conhecimento da real destinação do dinheiro público. Como se isso não bastasse, os denunciados sequer prestaram contas quanto ao restante do dinheiro recebido.

Integra a denúncia, ainda, Relatório da Controladoria-Geral da União sobre o convênio INCRA/CRT/SP n° 19000/2007 e seus três aditivos, que constatou, da mesma maneira, a ausência de comprovação da utilização dos recursos públicos e a existência de diversos indícios de fraude.

Por fim, as condutas dos réus foram assim individualizadas pelo órgão de acusação:

- JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES: “o articulador principal do golpe, sendo o presidente da FAAFOP no período da celebração do convênio, por ele assinado (...) sendo o responsável direto pela emissão de cheques que totalizaram R$ 1.080.393,71 (um milhão e oitenta mil e trezentos e noventa e três reais e setenta e quatro centavos)”;

- HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO: “assumiu a presidência da FAAFOP após José Eduardo afastar-se para candidatar-se a vereador” e “foi responsável pela assinatura de dois termos aditivos”, assim como “responsável direta pela emissão de cheques, que totalizaram R$ 106.283,02 (cento e seis mil e duzentos e oitenta e três reais e dois centavos). Acrescente-se que assinou os cheques para a FAAFOP a pedido de José Eduardo, tendo feito a emissão em branco, o que comprova de vez que aderiu ao plano criminoso”;

- GLEUBER SIDNEI CASTELÃO: “responsável por realizar os pagamentos com desvio dos recursos públicos, inclusive dentro de seu escritório de contabilidade e também por emitir recibos inidôneos em favor e em nome da FAAFOP, tendo ainda sido responsável pela apresentação de documentos ao INCRA, que simulavam a correta aplicação do dinheiro”;

- PEDRO APARECIDO TRAVA MUNHOZ: “junto com José Eduardo, foi responsável direto pela assinatura de inúmeros cheques que totalizaram R$ 1.080.393,74 (um milhão e oitenta mil e trezentos e noventa e três reais e setenta e quatro centavos)”, bem como, “dentro da divisão de tarefas estipulada por obter documentos que indicassem o uso do dinheiro”;

- IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO: “atuou como 2ª Secretária de Finanças e Administração da FAAFOP, tendo emitido em conjunto com Hilda cheques que totalizaram R$ 106.283,02 (cento e seis mil e duzentos e oitenta e três reais e dois centavos). Mesmo afastada de sua função na entidade, continuou a assinar cheques, a pedido de José Eduardo. Os cheques foram assinados em branco, mostrando ter total conhecimento do uso ilícito de dinheiro público, aderindo a conduta dos demais integrantes”;

- JOSÉ CLAUDIO VIEIRA: “atuou como membro do Conselho Fiscal da FAAFOP e também como tesoureiro. Foi responsável pela emissão de cheques, que totalizaram R$ 146.000,00 (cento e quarenta e seis mil reais)”.

Citado por edital, PEDRO APARECIDO TRAVA MUNHOZ não compareceu nem constituiu advogado, motivo pelo qual foram suspensos o processo e o curso do prazo prescricional em relação a ele, assim como determinou-se o desmembramento dos autos.

Sobreveio a r. sentença, que condenou JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, JOSÉ CLAUDIO VIEIRA e IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO pela acusação relacionada à prática do crime previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal.

Em suas razões de recurso, o órgão de acusação pleiteia a exasperação da pena-base, para que seja fixada em pelo menos 03 anos de reclusão, dada “a gravidade do ato praticado, que prejudica importante programa social de reforma agrária, destinado aos trabalhadores rurais assentados, o que compromete toda a política pública prevista”. Aduz, ainda, que a pena substitutiva de entrega mensal de cestas básicas a instituição de caridade constitui, na verdade, a de prestação pecuniária, cujo valor, então, requer seja fixado em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Postula, enfim, a fixação do valor mínimo de R$ 1.373.598,28 (um milhão, trezentos e setenta e três mil e quinhentos e noventa e oito reais e vinte e oito centavos) a título de reparação do dano.

GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, por sua vez, postula a absolvição, ao argumento de que os elementos de convicção produzidos no curso da persecução penal não demonstram, com segurança, a existência do dolo. Subsidiariamente, requer o reconhecimento da participação de menor importância, bem como a estipulação da pena no mínimo legal.

JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES e HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO requerem também a absolvição, para o que sustentam que o dolo não foi comprovado. Subsidiariamente, postulam a fixação da pena no mínimo legal, assim como a substituição da substitutiva de entrega de cestas básicas por outra, ou que o valor seja estipulado em “20% (vinte por cento) calculada sobre o salário mínimo da época dos fatos, na quantidade de 01 (um) pagamento a cada três meses, durante o período de substituição da pena”, bem como a não aplicação da pena de multa ou que seja fixada somente em 01 (um) dia-multa e, enfim, a concessão dos benefícios da justiça gratuita, ao argumento de que não possuem condições financeiras de arcar com tais obrigações.

IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO, por seu turno, pede apenas a absolvição por ausência de comprovação do dolo.

JOSÉ CLAUDIO VIEIRA, enfim, requer também a absolvição, para o que aduz que o elemento subjetivo do tipo penal em apreço não foi demonstrado. Caso mantida a condenação, postula o abrandamento da pena-base, para o que sustenta que foi estipulada acima do mínimo legal a partir de considerações genéricas acerca da gravidade do crime.

 

MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS E DOLO

A materialidade do crime de estelionato majorado encontra-se demonstrada principalmente pelos seguintes documentos:

- Notícia-crime apresentada à Procuradoria da República em Presidente Prudente/SP, segundo a qual “um grupo de pessoas ligadas a José Rainha Junior, que fazem parte de uma Federação das Associações de assentados e agricultores, sede em Mirante do Paranapanema – SP e a Associação Amigos de Teodoro Sampaio, sede em T. Sampaio, que juntas já pegaram  R$ 3.256.593,25 (três milhões, duzentos e cinquenta e seis mil, quinhentos e noventa e três reais e vinte e cinco centavos) do Governo Federal, estariam pegando notas sem a prestação de serviços e consumos, para prestar contas de recursos federais com a finalidade de desenvolver projeto de Biodiesel e também do projeto das casas populares” (Id 163020226 – fls. 18/23);

- Solicitação enviada pela Federação das Associações de Assentados e Agricultores Familiares do Oeste Paulista – FAAFOP à Superintendência Regional do INCRA em São Paulo/SP para celebração de convênio relativo ao cultivo de oleaginosas para a produção de biodiesel em assentamentos rurais do Estado de São Paulo e documentos anexos, tais como ata da assembleia geral de fundação da Federação, seu estatuto social e registro no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (no qual consta que sua sede está localizada no Município de  Mirante do Paranapanema/SP) (Id 163020226 – fls. 27/94 e 163020227 – fls. 1/15);

- Convênio INCRA/CRT/SP n° 19000/2007 (subscrito por JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, na qualidade de Presidente da FAAFOP, e por Raimundo Pires Silva, na condição de Superintendente Regional do INCRA em São Paulo), cujo objeto foi definido como “fomentar a produção de oleaginosas nos assentamentos do Estado de São Paulo, no âmbito do Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel do Governo Federal, diversificar a produção nos assentamentos, aumentar a renda das famílias e contribuir para o aumento da biodiversidade nos assentamentos do Estado de São Paulo”. Entre as obrigações assumidas pela FAAFOP, destacam-se as de “prestar contas à CONCEDENTE dos recursos financeiros descentralizados, observando a Legislação Federal pertinente e os prazos estabelecidos neste Convênio” e de “confeccionar e apresentar à CONCEDENTE ‘Relatório de Cumprimento do Objeto’ contendo cópia do Plano de Trabalho aprovado e Relatório de Execução Físico-Financeira”. Além disso, na cláusula terceira do instrumento constou que “para a execução dos serviços previstos neste Convênio, o valor total é de R$ 622.400,00 (seiscentos e vinte e dois mil e quatrocentos reais), sendo que o valor será repassado pelo INCRA” (Id 163020227 – fls. 16/22).

- Documentos relacionados à celebração do convênio, tais como plano de trabalho e determinação de pagamento de R$ 622.400,00 (seiscentos e vinte e dois mil e quatrocentos reais) à FAAFOP, bem como a respectiva nota de empenho (Id 163020227 – fls. 23/43);

- Solicitação de novo aporte de recursos financeiros à FAAFOP e documentos anexos, primeiro termo aditivo (subscrito por JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, na qualidade de Presidente da FAAFOP), autorização de liberação de R$ 351.198,25 (trezentos e cinquenta e um mil e cento e noventa e oito reais e vinte e cinco centavos) e respectiva nota de empenho (Id 163020227 – fls. 51/79);

- Pedido de prorrogação de vigência do convênio e segundo termo aditivo (subscritos por HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, na qualidade de Presidente em Exercício da FAAF OP) (Id 163020228 – fls. 53/78 e Id 163020229 – fls. 1/13);

- Solicitação de nova prorrogação de vigência do convênio e terceiro termo aditivo (subscritos por HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, na qualidade de Presidente da FAAFOP), autorização de liberação de R$ 400.000 (quatrocentos mil reais) e respectiva nota de empenho (Id 163020229 – fls. 20/44);

- Relatórios de execução físico-financeira e de execução da despesa relativos ao período de 18.10.2007 a 31.12.2007, subscritos por HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO e GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, assim como relação de pagamentos a unidades executoras anexa (Id 163020227 – fls. 103/107);

- Informação Técnica elaborada por Analista de Contabilidade da Procuradoria da República no Município de Presidente Prudente/SP, com detalhamento de previsão de custos apresentada no Plano de Trabalho por ocasião da solicitação do convênio e aditivos (Quadros I e II), relação de justificativas, “elaboradas em termos vagos, sem a indicação de fatos e ou situações concretas e mensuráveis, fundamentais e imprescindíveis para as análises, decisões, acompanhamento e controle do Órgão concedente” (Quadro III), valores recebidos, listados por data (Quadro IV) e lista de correspondência entre cada cheque e favorecido informado na relação de pagamentos fornecida pela FAAFOP (mencionada no item anterior), conforme recibos comprobatórios apresentados, com indicação das situações em que não foram fornecidas quaisquer cópias de comprovantes (aproximadamente metade do total) e demais irregularidades constatadas (Quadros V, VI, VII e VIII e considerações que os acompanham e lista subsequente) (Id 163020289 – fls. 92/104 e Id 163020290 – fls. 1/8). Registra a Informação Técnica que “as justificativas apresentadas pelo Convenente ao solicitar recursos financeiros adicionais sempre foram elaboradas em termos vagos, sem a indicação de fatos e ou situações concretas e mensuráveis, fundamentais e imprescindíveis para as análises, decisões, acompanhamento e controle do Órgão concedente”. Aponta o documento ainda, no que diz respeito à prestação de contas parcial apresentada pela FAAFOP, diversas ocorrências em que foram apresentadas cópias de recibos sem número, assim como casos de pagamento antecipado pelos serviços e contratações sem licitação. De modo exemplificativo, colaciona-se o seguinte excerto: “Na comprovação do pagamento informado como efetuado a José Paulo Ferreira Teodoro Sampaio – ME, através do cheque 850039 – R$ 6.000,00 de 16.11.07, foi apresentada cópia da Nota Fiscal n° 000080 mencionando ‘Locação de 05 computadores no período de outubro de 2007 a março de 2008’. Sendo o referido cheque liquidado no caixa do Banco do Brasil em 16.11.2007 e os serviços de locação abrangem de 10/07 a 03/08, está caracterizado pagamento antecipado. No entanto, na cópia do referido cheque consta emissão e endosso a favor da FAAFOP, inferindo recebimento direto no caixa pelos próprios emitentes (Id 163020289 – fl. 97, destaque nosso). Merece realce, também, a constatação subsequente, segundo a qual “na comprovação do pagamento do cheque 850007 – R$ 23.850,00 de 26.10.07, foram apresentadas diversas notas fiscais com data de emissão posteriores aos pagamentos de até 248 dias”. Salienta-se, ainda, a desproporção do valor supostamente aplicado no período da prestação de contas parcial e aquele remanescente: “Em demonstração exata, o processo de prestação de contas refere-se ao período de execução de 18.10.2007 a 31.12.2007, ou 74 dias, nos quais foram consumidos R$ 434.465,52. O prazo para aplicação de R$ 622.400,00 previsto no projeto era de um ano, ou R$ 1.728,88 diários, implicando em 74 dias de execução o total de R$ 127.937,12. Assim, foram despendidos a maior R$ 306.528,40. De outra forma, em 20,6% (74 dias) do prazo inicial do convênio (360 dias) foram gastos 70% (R$ 434.465,52) dos recursos alocados (R$ 622.400,00). Infere-se, no mínimo, ocorrências de pagamentos antecipados. Ressaltamos que são serviços de locação previstos/contratados para o período, sendo, dessa forma, invariáveis na quantidade”. Quanto à forma de pagamento dos serviços listados na prestação de contas parcial, “a maioria, 77,10%, ou R$ 334.955,79, em cheques liquidados no caixa”, modalidade que “permite saques em dinheiro. Enseja possibilidade de movimentações sem identificação do favorecido, ou preposto”. Além disso, “dos 130 pagamentos constantes na Relação de Pagamentos foram apresentados apenas 70 recibos e notas fiscais como comprovantes. Destes comprovantes, 20 apresentam datas de emissão posteriores às dos pagamentos efetivamente realizados, conforme registros no extrato da conta corrente, em defasagem de 01 até 248 dias. Esse fato implica, no mínimo, pagamento antecipado e não cumprimento da etapa de ‘liquidação da despesa’, que precede o ato da efetivação do pagamento e que é a completa verificação do direito do credor, isto é, se todas as condições acordadas para a transação foram cumpridas e devidamente lastreadas com os documentos fiscais de praxe (artigo 63 da Lei 4320/64)”. Ademais, “o relatório de cumprimento do objeto foi elaborado em termos genéricos, não conciliando os valores despendidos com as atividades desenvolvidas no período a que se refere (18.10.2007 a 31.12.07), apenas repetindo, com variações, termos usados no projeto e plano de trabalho. O INCRA, Superintendência em São Paulo, ratificou referido relatório acrescentando vagamente que as atividades estão em ‘plena execução’ e considerou cumprido o objeto do convênio no período”. Apontou a Informação Técnica, ainda, a existência de discrepâncias, em determinados cheques, entre as pessoas apontadas como favorecidas e aquelas informadas na relação de credores. Na mesma direção, “dos gastos realizados no período de contas prestadas (R$ 434.465,52), R$ 57.474,39, ou 13,23% foram efetuados através de 11 cheques cujo favorecido foi o próprio emitente (FAAFOP), todos liquidados no caixa”. Da mesma forma, “dos gastos realizados no período de contas não prestadas (R$ 924.903,24), R$ 491.776,96, ou 53,17% foram efetuados através de 38 cheques cujo favorecido foi o próprio emitente (FAAFOP), todos liquidados no caixa. Assim, concluiu-se que “os documentos apresentados pelo convenente para prestação de contas, sendo insuficientes com incongruências e inconsistências, não cumpriram a finalidade de informar e convencer sobre a correta e regular aplicação dos recursos recebidos e o conveniente alcance dos objetivos propostos” (Id 163020290 – fl. 03).

- Parecer Técnico elaborado pelo mesmo servidor público com relação detalhada de responsabilidade pelos cheques emitidos pela FAAFOP e quadros nos quais os cheques foram agrupados por signatário (todos os denunciados, à exceção de GLEUBER SIDNEI CASTELÃO) (Id 163020290 – fls. 14/18);

- Relatório de Demandas Especiais elaborado pela Controladoria-Geral da União (por solicitação da Delegacia da Polícia Federal em Presidente Prudente/SP), que analisou o convênio entre a FAAPOP e o INCRa (Id 163020291 – fls. 6/36 e Id 163020292 – fls. 1/8) e, em suas conclusões, apontou as seguintes irregularidades:

 

a) Ausência de projeto e plano de trabalho com etapas, atividades, metas e cronograma financeiro detalhado envolvendo todos os recursos previstos para este projeto.

b) Utilização de recursos de forma antieconômica.

c) Pagamentos antecipados e pagamentos sem os respectivos comprovantes de despesa.

d) Ausência de licitação.

e) Inadimplência quanto às Prestações de Contas.

f) Fatos apontados na denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal à Autarquia sem a devida apuração pela Comissão de Sindicância.

g) Comissão de Sindicância analisou documentos referentes a outro convênio firmado na mesma data, com outra entidade, cujo presidente é o mesmo que o da FAAFOP.

h) Ausência de controle centralizado com dados referentes ao acompanhamento de cada família participante do projeto.

i) Ausência de evidências da produção e comercialização da mamona nas quantidades apresentadas nos relatórios anexados ao processo e

j) Ausência de estudo conclusivo com base em dados devidamente comprovados e documentados a respeito da viabilidade do projeto.

Cabe observar que a ausência de definição clara das atividades que deveriam ser desenvolvidas, os custos e prazos relativos a essas atividades, bem como a insuficiente definição de metas a serem atingidas impediram a análise da pertinência da relação de pagamentos e documentos de despesa apresentados pela FAAFOP com o objeto do convênio e a avaliação do alcance do objetivo do convênio. Comprovantes de despesas, aliás, que careciam de informações mínimas para serem considerados admissíveis. A situação é agravada pela existência de outro Convênio com objeto similar e a mesma precariedade de definição das atividades a serem realizadas.

Da forma como foi apresentado o projeto, não é possível identificar as atividades que deveriam ter sido executadas, seu custo e prazo de execução. A falta de definição de critérios objetivos para mensuração da execução e dos resultados do Convênio é uma porta aberta para o desperdício dos recursos públicos.

Também a ausência de controle centralizado, com dados devidamente tabulados referentes ao acompanhamento que deveria ser feito a cada família participante do projeto, com informações como data de preparo do solo, recebimento de insumos, dados referentes ao plantio, colheita e comercialização e comprovantes da venda da produção, impedem que se avalie a viabilidade e a efetiva execução do projeto. A conclusão do Instituto que considerou que as metas foram cumpridas não tem base documental. A meta única definida não espelha a execução do Convênio e o cumprimento do seu objeto.

4.1. A demandante, Delegacia de Polícia Federal em Presidente Prudente, não apresentou à CGU ação específica a ser analisada.

4.2. Sobre as demais ações de controle realizadas, cujo montante examinado corresponde a R$1.373.898,28, com a ressalva de que a única Prestação de Contas anexada ao processo analisado apresenta apenas R$434.465,52, foram identificadas as seguintes situações:

4.2.1. Falhas sem dano ao erário

a) Item 3.1.1.01 - pg. 7 - Deficiência de planejamento na análise e aprovação do Convênio.

b) Item 3.1.1.02 - pg. 9 - Celebração de Convênio com Entidade em desacordo com a Lei de Diretrizes Orçamentárias do Exercício de 2007, Lei nº 11.439, de 29 de dezembro de 2006.

c) Item 3.1.1.03 - pg. 9 - Ausência de justificativa técnica para a celebração de dois convênios com finalidades semelhantes e sem a definição clara das ações a serem realizadas em cada convênio.

d) Item 3.1.1.04 - pg. 11 - Celebração de Convênio com entidade que não tem previsão estatutária para as atividades previstas no Plano de Trabalho do Convênio e sem a demonstração de sua estrutura técnica e administrativa.

e) Item 3.1.1.05 - pg. 11 - Projeto Básico sem planilha de custos para o valor total previsto pela entidade. Plano de Trabalho sem detalhamento da execução física considerando-se o valor total previsto pela entidade. Falta de planilhas de custos e memórias de cálculo para os valores pactuados nos Termos Aditivos.

f) Item 3.1.1.06 - pg. 15 - Ausência de elementos que permitam verificar o cumprimento do objeto do Convênio.

g) Item 3.1.1.07 - pg. 21 - Prestação de contas não apresentada no prazo. Não atendimento ao disposto no artigo 35, parágrafo único, da Instrução Normativa STN nº 01/1997.

h) Item 3.1.1.08 - pg. 23 - Ausência de realização de processos licitatórios.

i) Item 3.1.1.09 - pg. 25 - Contratação antieconômica de locação de veículos e pagamento antecipado de despesas sem a comprovação da prestação dos serviços.

j) Item 3.1.1.10 - pg. 27 - Deficiência na comprovação de realização dos serviços e ausência de retenção do Imposto de Renda e da seguridade social.

l) Item 3.1.1.11 - pg. 30 - Falhas na atuação da Comissão de Sindicância: inclusão de documentos de despesas relativos a outro convênio e ausência de verificação dos fatos apontados na denúncia.

Cabe destacar que os documentos apresentados para a apuração dessas falhas não possibilitam o cálculo do dano direto ao Erário, embora permitam concluir que houve desperdício de recursos públicos na medida em que impedem a correta avaliação da sua utilização (Id 163020292 – fls. 6/8).

 

Merecem transcrição, ainda, os seguintes trechos do corpo do documento, uma vez que, embora extensos, fornecem importante contexto para a perfeita compreensão dos fatos e demonstram a real dimensão das irregularidades constatadas:

“3.1.1.01. Constatação 01:

Deficiência de planejamento na análise e aprovação do Convênio

(...) não se localizou uma análise sobre o cronograma de execução do Convênio. Essa análise é importante para definir se as ações previstas serão executadas nos momentos mais adequados.

No presente caso, fomento de uma atividade agrícola, é necessário apurar qual a melhor época para o plantio.

(...)

O cronograma de execução não detalha essas necessidades e, com a celebração do Termo de Convênio dentro do período de semeadura, sobressai a deficiência na avaliação do cronograma de execução.

Os efeitos da deficiência na análise aparecem no Processo Administrativo: alegação de urgência para a não realização de processos licitatórios; plantio em época inadequada resultando em baixa produtividade e perda de produção.

(...)

 

3.1.1.02. Constatação 02:

Celebração de Convênio com Entidade em desacordo com a Lei de Diretrizes Orçamentárias do Exercício de 2007, Lei n° 11.439, de 29 de dezembro de 2006.

a) Fato

A LDO estabeleceu em sua Subseção II - Das Vedações e das Transferências para o Setor Privado, Artigo 36, Inciso IV:

‘Art. 36. Sem prejuízo das disposições contidas nos arts. 32, 33, 34 e 35 desta Lei, a destinação de recursos a entidades privadas sem fins lucrativos dependerá ainda de:

(...)

IV - declaração de funcionamento regular, inclusive com inscrição no CNPJ, da entidade beneficiária nos últimos 3 (três) anos, emitida no exercício de 2007 por 3 (três) autoridades locais, e comprovante de regularidade do mandato de sua diretoria’.

No presente caso, a Autarquia celebrou Convênio com entidade que foi fundada em 27 de agosto de 2006 (...). Portanto, o período de funcionamento regular da Entidade era inferior ao período mínimo estabelecido pela LDO.

(...)

3.1.1.03. Constatação 03:

Ausência de justificativa técnica para a celebração de dois convênios com finalidades semelhantes e sem a definição clara das ações a serem realizadas em cada convênio.

a) Fato

A Autarquia celebrou os Convênios nº 19.000/2007 (Federação das Associações de Assentados e Agricultores Familiares do Oeste Paulista - FAAFOP) e n° 22.000/2007 (Associação Amigos de Teodoro Sampaio) com similaridades em vários aspectos:

I. Objeto:

Convênio nº 19.000/2007: "fomentar a produção de oleaginosas nos assentamentos do estado de São Paulo, no âmbito do Programa Nacional de produção e uso de Biodiesel do Governo Federal, diversificar a produção nos assentamentos, aumentar a renda das famílias e contribuir para o aumento da biodiversidade nos assentamentos no Estado de São Paulo;

Convênio n° 22.000/2007: "cumprir determinação do MDA na implantação do programa, para viabilizar projeto para produção de Biodiesel, bem como diversificar a produção, ampliar as fontes de renda e contribuir para o aumento da biodiversidade em assentamentos no Estado de São Paulo;

II. Proposta:

As duas propostas apresentadas originam-se de um mesmo texto-base com pequenas modificações em alguns parágrafos;

III. Presidente das Entidades:

As duas Entidades eram presididas pela mesma pessoa à época da celebração dos Convênios: J.E.G.M., CPF: 092.899.239-14;

IV. período de funcionamento das Entidades, inferior ao mínimo estipulado na lei de Diretrizes Orçamentárias do Exercício de 2007, Lei n° 11.439, de 29 de dezembro de 2006;

- FAAFOP fundada em 27 de agosto de 2006 e abertura do CNPJ em 8 de novembro de 2006;

- AATS fundada em 12 de setembro de 2006 e abertura do CNPJ em 16 de novembro de 2006;

V. data de celebração dos Convênios:

- Os dois Convênios foram celebrados em 16 de outubro de 2007;

VI. Planos de Trabalho:

Os Planos de Trabalhos dos dois Convênios possuem na Justificativa da Proposição diversos parágrafos idênticos; as metas são interrelacionadas (1.200 famílias e 2.400 hectares); e a mesma falta de detalhamento nas ações a serem executadas;

VII. ausência de correlação entre os estatutos das Entidades e os Objetos dos Convênios:

(...)

3.1.1.04. Constatação 04:

Celebração de Convênio com entidade que não tem previsão estatutária para as atividades previstas no Plano de Trabalho do Convênio e sem a demonstração de sua estrutura técnica e administrativa.

(...)

3.1.1.05. Constatação 05:

Projeto Básico sem planilha de custos para o valor total previsto pela entidade. Plano de Trabalho sem detalhamento da execução física considerando-se o valor total previsto pela entidade. Falta de planilhas de custos e memórias de cálculo para os valores pactuados nos Termos Aditivos, no valor de R$751.198,25.

(...)

O convênio foi firmado pelo Incra/SP sem que houvesse detalhamento do projeto integral ou qualquer questionamento quanto à ausência desse detalhamento.

(...)

3.1.1.06. Constatação 06:

Ausência de elementos que permitam verificar o cumprimento do objeto do Convênio.

(...)

Como o objetivo é o fomento de uma atividade agrícola, esperava-se que fossem fixadas metas e produtos que permitiriam avaliar a viabilidade do Projeto. Entretanto, a única meta fixada no Convênio foi a de serviços de infra-estrutura de produção de oleaginosa/biodiesel em 2.400 hectares com custo estimado de R$ 622,400.00. Não foram estipuladas metas ou controles para: produtividade e preços de comercialização, elementos essenciais para a avaliação da viabilidade do projeto e sua eventual replicação em outros locais.

Observando-se o Processo Administrativo não se localizou uma análise de viabilidade econômica do Projeto. Foram encontrados apenas alguns elementos dispersos na documentação que não permitem avaliar a viabilidade do Projeto.

(...)

De outro modo, considerando-se o total dos recursos repassados por meio do convênio ora analisado, R$ 1.373.598,28, o déficit foi de R$ 432.798,28.

Dessa forma, alguns serviços realizados nessa primeira etapa não serão necessários em safras posteriores, e há, certamente, benefícios sociais advindos da realização do Projeto, porém, não há uma análise que quantifique e aglutine todos esses elementos e identifique o resultado financeiro do Projeto, sua viabilidade econômica ou a eventual necessidade de auxílios financeiros com sua fonte de recursos, além da influência da variação de preços praticados no mercado para a mamona, que seria a conclusão do Objeto do Convênio.

(...)

3.1.1.07. Constatação 07:

Prestação de contas não apresentada no prazo. Não atendimento ao disposto no artigo 35, parágrafo único, da Instrução Normativa STN n° 01/1997.

a) Fato

A Prestação de Contas foi apresentada em 14/08/2008, referente ao período de 18/10/2007 a 31/12/2007, no valor de R$ 434.465.52. O primeiro repasse ocorreu em 16/10/07 no valor de R$ 622.400,00. Portanto, não houve prestação de contas do valor total ao valor inicial repassado.

(...)

Assim, a FAAFOP deveria ter apresentado a Prestação de Contas parcial referente ao valor de R$ 622.400,00, inicialmente repassados para que pudesse receber a 3ª parcela no valor de R$ 400.000,00, repassada em 18.11.2008.

(...)

3.1.1.08. Constatação 08:

Ausência de realização de processos licitatórios.

a) Fato

Na Prestação de Contas apresentada em 14 de agosto de 2008, a Convenente apresentou as seguintes justificativas para a não realização de processos licitatórios. Correspondência de 30 de junho de 2009, folha 178 do Processo:

‘Referente ao convênio 19.000-2007, a contratação da Empresa Cunha Pardo Veículos Ltda, referente ao aluguel dos veículos foi realizada em caráter de urgência. Para o andamento do projeto, diante de nossa dificuldade de obter esse tipo de serviço em nossa cidade e até mesmo em nossa região, foi realizado um orçamento com mais duas empresas, e o menor preço foi o da empresa citada acima, não sendo possível ser realizada a licitação’

 

E, em correspondência datada de 30 de junho de 2009, rasurada para outubro de 2008, folha 233 do Processo a Convenente informa:

‘Em 22 de outubro de 2007 foi liberado os Recursos do Convênio 19000-2007 para o preparo de solo, prazo esse fora das condições ideais do início da execução do projeto, atrasando o preparo das áreas e impossibilitando o plantio do (sic) mamona no período ideal. Mesmo assim, em caráter de urgência foram contratados os tratores para dar andamento ao preparo de solo (Gradagem, aplicação de Calcário e Nivelação) e plantio da mamona para os 2.400 hectares, conforme especificado no projeto, os tratores são de assentados e diante da urgência não foi possível efetuar a licitação e os próprios assentados são os tratoristas autônomos e receberam por hectare trabalhado, e por isso não existem recolhimentos dos encargos trabalhistas.

Quanto ao fornecimento de combustível não foi possível efetuar a licitação, pois havia um único posto para o fornecimento de combustível no local’.

 

A alegação de urgência para a não realização dos processos licitatórios não possui fundamento legal. O que se verifica no Processo é a falta de planejamento da celebração e execução do Convênio. O Plano de Trabalho deveria prever os prazos para a realização das licitações e concatená-las com os períodos indicados para a semeadura.

Assim, verificou-se que foram pagos valores de R$30.000,00 a R$40.000,00 a 5 pessoas, totalizando R$175.705,27, o que equivale, aproximadamente, ao trabalho em 450 hectares de terra, contratados sem licitação. Cabe observar que, dentre essas 5 pessoas, apenas uma reside em assentamento, as outras 4 pessoas têm seu endereço na zona urbana e além disso, uma delas compõe o quadro societário da empresa de CNPJ 08.087.28210001 -18, conforme verificou-se no sistema CPF e CNPJ da Receita Federal, de tal forma que essas 4 pessoas não possuem a condição de assentados, contrariando a afirmação do INCRA/SP.

Quanto à aquisição de combustíveis, a entidade não forneceu maiores detalhes quanto à existência de um único posto para o fornecimento de combustível no local, porém, foram apresentadas notas fiscais de três empresas diferentes:

(...)

3.11.09. Constatação 09:

Contratação antieconômica de locação de veículos e pagamento antecipado de despesas sem a comprovação da prestação dos serviços, no valor de R$ 116.500,00.

(...)

A locação de veículos, além de ter sido efetuada sem o devido processo licitatório, também caracterizou-se pela não demonstração de sua economicidade.

(...)

Com relação às propostas apresentadas, observou-se que no cadastro da Receita Federal, a atividade econômica da empresa contratada é ‘comércio a varejo de automóveis’ em vez de ‘locação de automóveis sem condutor’; a segunda proposta, em papel não timbrado, apresenta inconsistência entre o CNPJ apresentado, 03.191.61010001-08, e o endereço indicado na proposta: Rua Dr. Jesuíno Maciel, 2.105, São Paulo – SP, distante 600 km da Convenente, uma vez que o endereço desse CNPJ encontra-se na cidade do Rio de Janeiro e não há indicação de filiais no estado de São Paulo.

Os valores de mercado para os veículos indicados na proposta vencedora são respectivamente: (...) Esses valores de mercado totalizam R$72.715,00, de tal forma que se esses veículos fossem comprados ainda sobrariam R$43.785,00.

Assim, embora a escolha entre locação e aquisição de veículos deva considerar alguns custos como seguro, manutenção, eventuais vantagens fiscais etc., não há no Processo qualquer estudo que indique a locação de veículos como a opção mais econômica para este caso.

Também não é indicada a razão para a escolha de veículos com 5 a 10 anos de uso, uma vez que, de um modo geral, as locadoras de veículos não se utilizam de veículos velhos, pois o custo da manutenção torna-se muito alto.

Outro fator a ser destacado é o pagamento antecipado da locação dos veículos. Segundo a relação de pagamentos, o valor total da locação, R$ 116.500,00, foi pago em 16 de novembro de 2007, contra a apresentação de uma nota fiscal, embora a proposta da empresa se refira a um ano de locação. Não há no contrato qualquer menção à forma de pagamento do valor contratado.

Ainda com relação ao contrato, cabe observar que o mesmo faz referência ao Anexo I no qual constariam as placas dos veículos locados bem como a data de início e término da locação, porém o Anexo I está em branco.

(...)

A análise superficial do contrato deve-se à escassez de documentos no Processo Administrativo montado pelo Concedente. Não foram localizados: descrição dos automóveis efetivamente utilizados, atestados de execução do serviço e documentos que evidenciem a prestação do serviço contratado.

Também cabe observar que na proposta do convênio, a Proponente estimou o valor referente à locação de automóveis em R$ 60.000,00, para 5 veículos e um período de 12 meses, sem detalhamento dos veículos que seriam locados. A despesa com este item foi quase 100% superior ao previsto pela entidade.

(...)

3.1.1.10 Constatação 10:

Deficiência na comprovação de realização dos serviços e ausência de retenção do Imposto de Renda e da contribuição para a Seguridade Social.

(...)

Cabe destacar que o cheque n° 850007 serviu para o pagamento de diversas despesas. O cheque foi compensado em 26 de outubro de 2007. Na relação de pagamentos são indicados 14 recibos diferentes cobrindo o período de 9 de novembro de 2007 até 30 de junho de 2008. Esse fato indica a movimentação de recursos fora da conta corrente do Convênio.

Os recibos de pessoas físicas apresentados não correspondem ao total de despesas.

(...)

A descrição do serviço no recibo é muito genérica e refere-se a contratos que estariam anexos aos recibos, porém não estão no processo. Também não foram apresentados documentos que atestem a execução dos serviços nas diversas propriedades. A execução dos serviços teria sido comprovada pelas visitas realizadas pelos técnicos, porém o serviço de assistência técnica não pertence ao escopo do Convênio examinado e as informações estão dispersas por centenas de páginas referentes às visitas efetuadas sem qualquer tratamento de organização e consolidação de informações.

Além disso, a maioria dos recibos apresenta divergência entre o seu valor nominal e os valores declarados dos cheques, impedindo o relacionamento dos cheques com os recibos.

(...)

Assim, conclui-se que a documentação apresentada é insuficiente para comprovar a execução e o pagamento das despesas relativas ao Convênio.

Outro aspecto a ser considerado, diz respeito ao custo unitário dos serviços. Pela documentação apresentada não foi possível estabelecer que os valores pagos estariam de acordo com os valores praticados no mercado.

(...)

Também cabe observar que os pagamentos às pessoas físicas, conforme resposta do INCRA/SP, seriam referentes aos assentados que prestaram serviços com tratores, porém observou-se que há pagamentos para sócio da empresa de CNPJ 08.087.282/0001-18 e pagamentos a pessoas físicas cujo cadastro no sistema CPF indica endereço na zona urbana da cidade” (Id 163020291 – fls. 08/35).

 

Em síntese, segundo a apuração realizada pela Controladoria-Geral da União, a Federação das Associações de Assentados e Agricultores Familiares do Oeste Paulista – FAAFOP foi criada pouco mais de um ano antes da celebração do convênio com o INCRA – ao contrário dos três  anos de antecedência exigidos pela Lei de Diretrizes Orçamentárias então vigente –, convênio este cujo plano de trabalho não possuía detalhamento suficiente para permitir o acompanhamento da execução do seu objeto, o que deu causa a diversas irregularidades, entre as quais a ausência de realização de processos licitatórios, causada pela falta de planejamento tanto durante a elaboração dos termos do convênio quanto no curso de sua execução, inclusive com locação de veículos por preço superior àquele que teria sido pago se tivessem sido comprados e sem que os veículos supostamente locados sequer tenham sido individualizados. Além disso, foi apresentada uma única prestação de contas, que sequer abarcou todo o período inicial de vigência do convênio e possuía diversas falhas, destacando-se a divergência entre o valor nominal dos recibos apresentados e os valores declarados nos cheques, de maneira a dificultar o estabelecimento da correspondência entre uns e outros. O convênio com a FAAFOP, enfim, foi assinado na mesma data em que outro, com objeto similar, foi celebrado com a Associação Amigos de Teodoro Sampaio, entidade também presidida por JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES. E como destacado no relatório elaborado pela Controladoria-Geral da União, não apenas o respectivo plano de trabalho possuía os mesmos defeitos, consistentes na ausência de detalhamento que permitisse o devido acompanhamento da execução do objeto, como até mesmo as duas propostas apresentadas originavam-se de um mesmo texto-base, com pequenas modificações em alguns parágrafos. Aliás, consta dos autos cópia da denúncia apresentada nos autos n° 0008446-18.2010.4.03.6112 contra José Rainha Júnior (apontado como o mentor do esquema criminoso, que articulava a criação de associações com o objetivo de desviar recursos repassados pelo INCRA, embora nelas não figurasse formalmente) e GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, entre outros, em razão de fraudes cometidas em tal convênio (Id 163020289 – fls. 68/83).

Comprova a existência do crime, ainda, a prova oral coligida ao processo, embora em extensão menor do que aquela narrada na denúncia. Com efeito, durante a apuração dos fatos foram tomadas declarações de mais de trinta pessoas listadas como beneficiárias na prestação de contas parcial apresentada por GLEUBER SIDNEI CASTELÃO e HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, algumas das quais relataram jamais terem recebido qualquer valor da FAAFOP ou que a quantia auferida não correspondia ao que foi registrado. Outras, entretanto, disseram que não se recordavam com precisão dos serviços prestados naquela época. E a maior parte, em sentido contrário ao narrado na denúncia, disse que realmente prestou serviços à Federação e confirmou o recebimento de valores.

No que diz respeito àqueles que negaram o auferimento de ao menos parte dos valores relacionados na prestação de contas parcial apresentada pela FAAFOP, destacam-se inicialmente as declarações de Otávio Heizo Uchiyama, que, ouvido na fase inquisitiva da persecução penal, relatou:

QUE o declarante afirma que não se recorda se foi processado criminalmente ou se já respondeu a inquérito policial anteriormente; QUE o declarante afirma que é o proprietário do Auto Posto Uchiyama & Uci-Uyama Ltda, com endereço na Rua Paes Leme, 219, Andradina/SP; QUE além do declarante, também é sócia do auto posto a pessoa de Mioko Funikawa Uchuyama; QUE o declarante afirma que não recebeu pagamentos da Federação das Associações de Assentados e Agricultores do Oeste Paulista; QUE indagado sobre a relação de pagamento efetuada para sua empresa por meio da nota fiscal nº 011575, em 19/12/2007, no valor de R$ 1.003,38, nota fiscal 01663, emitida em 31/01/2008, no valor de R$ 2.699,95, nota fiscal nº 011944, emitida em 15/04/2008, no valor de R$ 1.792,00, respondeu que com relação às duas últimas notas fiscais, não recebeu os pagamentos até a presente data, sendo que com relação à primeira, precisaria verificar junto ao setor administrativo financeiro de sua empresa; QUE o declarante afirma que as notas fiscais expedidas foram decorrentes da venda de combustível gasolina e diesel; QUE o declarante não se recorda dos veículos que foram abastecidos em seu auto posto, nos termos das notas fiscais acima mencionadas, bem como não se recorda das pessoas responsáveis pelos pagamentos; QUE o declarante afirma que o combustível vendido à FAAFOP não foi garantido por qualquer cheque pré-datado, aduzindo que vendeu fiado em vista de pedido feito pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Andradina; QUE o declarante não se recorda do nome da pessoa da Associação dos Trabalhadores Rurais que teria pedido a ele que realizasse a venda fiado; QUE o declarante nega que tenha acordado com representantes da Federação das Associações de Assentados e Agricultores do Oeste Paulista eventual desvio de verba federal repassada pelo INCRA fazendo uso de sua empresa para tal finalidade; QUE o declarante indagado sobre a existência de execução ou ação de cobrança ajuizada em face da Federação das Associações de Assentados e Agricultores do Oeste Paulista, a fim de reaver os valores devidos e discriminados nas notas fiscais de nº 011944 e 011663, respondeu que apenas encaminhou o nome da federação para o Serviço de Proteção ao Crédito; QUE indagado por qual motivo realizou as vendas de combustível na confiança, sem exigir quaisquer garantias de seu pagamento, mais uma vez respondeu que o fez a pedido do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Andradina; QUE o declarante respondeu que desconhece as pessoas com os apelidos de Castelinho ou Castelão, e Sabugo; QUE o declarante afirma que seu auto posto comercializa biodiesel, misturado no diesel; QUE o declarante afirma que o biodiesel adquirido por seu estabelecimento tem origem na Ciapetro, Small, negando que tenha adquirido o combustível da FAAFOP ou da Associação dos Assentados (Id 163020286 – fls. 27/28).

 

Sob o crivo do contraditório, disse que a pedido do sindicato rural de Andradina/SP, a quem costumava fornecer combustível, abasteceu veículos para a FAAFOP, que se comprometeu a efetuar o pagamento posteriormente, mas não o fez em pelo menos duas das três ocasiões em que o combustível foi fornecido. Disse que as notas fiscais eram emitidas no momento do abastecimento, para que depois houvesse a cobrança, mas indagado acerca do motivo pelo qual as três notas fiscais apresentadas na prestação de contas da FAAFOP relativas a abastecimento no posto de gasolina que administrava tinham sido expedidas somente cinquenta e quatro, noventa e sete e cento e setenta e dois dias após o abastecimento, disse não se recordar (Id 277316242).  

Givaldo Bispo Soares, por sua vez, na fase inquisitiva, relatou:

QUE o declarante afirma que prestou serviços para a FAAPOP nos anos de 2007 e 2008, tendo sido contratado pela pessoa de Vaguimar; QUE o declarante prestou serviços de colheita de mamonas e que recebia o valor de R$ 90,00 por tonelada; QUE o declarante recebeu aproximadamente R$ 3.000,00 pelos serviços prestados para a FAAPOP; QUE o declarante nega ter recebido o montante total discriminado na relação de pagamento acostada aos autos às fls. 185/187 (R$ 7.809,00); QUE o declarante afirma que os pagamentos eram realizados em dinheiro e cheque, negando que tenha recebido o montante de R$ 7.809,00; QUE indagado sobre o que poderia estar acontecendo, o declarante afirmou que desconhece, já que nunca recebeu esse montante (Id 163020286 – fl. 60).

 

Sob o crivo do contraditório, confirmou que prestou serviços à Federação, mas por pouco tempo, e que recebeu em torno de R$ 3.000,00 (três mil reais), pagos em cheque. Disse, ademais, que não foi contratado diretamente pela FAAFOP, mas sim por dois técnicos do INCRA responsáveis pela área, os quais, por sua vez, acredita que foram contratados pela Federação (mídia audiovisual à fl. 1.645 dos autos físicos).

Na mesma direção foram as palavras de José Paulo Ferreira em Delegacia de Polícia:

O declarante afirma que nunca prestou serviço para a FAAFOP - Federação das Associados Assentados e Agricultores Familiares do Oeste Paulista; QUE o declarante afirma que prestou serviço para a Associação de Amigos de Teodoro Sampaio/SP; QUE possui os blocos de notas fiscais emitidas no mês de 2007; QUE o declarante afirma que não recebeu R$ 6.000,00 de serviços prestados para a FAAFOP, conforme se verifica na relação de pagamentos acostada às fls. 185 a 187 dos autos; QUE o declarante se sente indignado ao saber que da relação de pagamentos da FAAFOP, consta que ele teria recebido o valor de R$ 6.000,00; QUE o declarante acredita que as pessoas de Castelinho, José Rainha, Vaguimar, além de outros, tenham utilizado seu nome para justificar desvio de recursos; QUE o declarante afirma que atualmente está desempregado e passa por dificuldades financeiras; QUE o declarante afirma que para ter recebido um valor de R$ 6.000,00 deveria ter prestado um serviço equivalente à instalação de uma rede de computadores interligando 10 salas, inclusive fornecendo todo o material para a parte contratante, serviço esse que jamais executou para a FAAFOP, bem como durante toda sua vida profissional (Id 163020286 – fl. 41);

 

Embora não tenha sido ouvido sob o crivo do contraditório, reinquirido ainda na fase policial, repisou:

QUE, o reinquirido nega que tenha emitido a nota fiscal n° 000080, cuja cópia encontra-se acostada à fls. 729 dos autos; QUE o reinquirido nega que a caligrafia seja sua, bem como aduz que a referida nota foi preenchida pela pessoa de GLAUBER CASTELINHO, haja vista que seu bloco de notas fiscais encontrava-se em poder desta pessoa; QUE o reinquirido afirma que a pessoa de GLAUBER CASTELINHO era o contador de sua empresa, CONTATO TELECOM, e ficava de posse dos blocos de notas fiscais; QUE o reinquirido afirma que jamais locou computadores para a FAAPOP, afirmando que possui apenas um microcomputador, que ganhou do engenheiro JURANDIR (...) (Id 163020287 – fl. 105).

 

Merecem transcrição, ainda, as palavras de Mário Brito Godinho:

QUE o declarante afirma que nunca prestou serviços para a Federação das Associações de Assentados e agricultores familiares do oeste paulista (FAAFOP), afirmando que nem mesmo compõe os quadros da Federação; QUE jamais recebeu quaisquer pagamentos por serviços prestados à FAAFOP (Id 163020286 – fl. 68).

 

Em audiência de instrução e julgamento, repisou que não prestou qualquer serviço para a FAAFOP e disse que recebeu proposta para o plantio de mamonas para produção de biodiesel, mas a recusou (Id 277316271).

José Ângelo de Almeida, por fim, apontou a discrepância entre os valores recebidos e aqueles registrados na prestação de contas apresentada pela FAAPOP:

QUE o declarante afirma que trabalha na agricultura; QUE prestou serviços para a FAAPOP no preparo de terreno para plantio de mamona; QUE recebeu pagamentos da FAAPOP no valor de R$ 2.500,00; QUE o declarante nega que tenha recebido os valores descritos as fls. 185/187 (relação de pagamentos da FAAFOP), totalizando R$ 4.100,00 (fl. 185) e R$ 320,00 (fl. 187); QUE o declarante se recorda que recebeu o pagamento de R$ 2.500,00 por meio de um cheque do Banco do Brasil; QUE o declarante também afirma que não assinou recibo em nome da FAAPOP (Id 163020287 – fl. 99).

 

Entre aqueles que confirmaram terem recebido pagamentos da FAAFOP nos valores por esta discriminados, por outro lado, Falconieri Alves de Brito, em Delegacia de Polícia, relatou:

QUE indagado sobre o fato de ter recebido pagamentos da FAAFOP respondeu afirmativamente, tendo recebido pelo serviço prestado de preparo de solo para plantação de mamona; QUE o declarante afirma que recebeu mais de R$ 10.000,00, ou melhor, aproximadamente R$ 14.000,00; QUE o declarante afirma que assinou recibos mas não se recorda onde os mesmos estejam; QUE o declarante confirma que os recibos de fls. 544, 545 e 551 foram assinados por ele; QUE à época os pagamentos foram realizados pela pessoa de PEDRO TRAVA no escritório localizado em Teodoro Sampaio/SP; QUE os pagamentos foram realizados por meio de cheques (Id 163020287 – fl. 18).

 

Em audiência de instrução e julgamento, declarou que prestou serviços de gradeação, tombagem e calcarização da terra para a FAAFOP, pelos quais recebeu em torno de R$ 14.000,00 (catorze mil reais) (mídia audiovisual à fl. 1.645 dos autos físicos).

Na mesma direção, João Pereira da Luz, na fase policial, expôs que “prestou serviços para a FAAFOP em 2007/2008, para o plantio de mamona, sendo que teria recebido à época R$ 160,00 por hectare preparado, num total de 46 hectares” e que “recebeu os pagamentos em cheque da pessoa de José Eduardo”. Consta ainda de sua oitiva que, “indagado sobre a relação de pagamentos apresentada pela FAAFOP acostada aos autos às fls. 185/187 o declarante concorda com os valores apresentados (total de R$ 4.500,00)” (Id 163020286 – fl. 62). Ouvido novamente em Delegacia de Polícia, disse que “reconhece ter assinado os recibos cujas cópias encontram-se acostadas aos autos às fls. 579 e 602” (Id 163020288 – fl. 45)

Sob o crivo do contraditório, detalhou que prestou serviços à FAAFOP no preparo do solo com um trator, com calcarização e adubação para o plantio de mamona, pelo que recebeu em cheque, embora não se recordasse do valor (mídia audiovisual à fl. 1.645 dos autos físicos).

De igual maneira, Sidnei Silvério relatou que “prestou serviços para a FAAFOP referente ao preparo de solo para o plantio da mamona”, para o que “recebeu ao total aproximadamente R$ 4.000,00 pelos serviços”, assim como confirmou ter assinado recibos relativos a tal atividade e reconheceu suas assinaturas naqueles acostados aos autos (Id 163020287 – fl. 85).

Em audiência de instrução e julgamento, relatou que prestou serviços à FAAFOP com um trator, em onze lotes, pelo que recebeu R$ 400,00 (quatrocentos reais) por lote, pagos em cheque e em dinheiro (277316275).

Além disso, entre aqueles que, embora ouvidos somente em Delegacia de Polícia, também disseram que prestaram serviços à Federação, podem ser destacadas, a título ilustrativo, as seguintes declarações:

- Antônio Valtude Menezes:

Que o Declarante é agricultor, atividade que exerceu a vida inteira; QUE o Declarante afirma que prestou serviços para a FAAFOP preparando o solo para plantio da mamona; QUE o Declarante pegou 22 lotes para prepara-lo para o plantio, ao custo aproximado de R$ 600,00; QUE o Declarante afirma que recebeu o valor aproximado de R$ 13.200,00 parcelado em 3 vezes; QUE o Declarante que assinou recibos em favor da FAAFOP pelos serviços prestados; QUE segundo o Declarante o pagamento foi realizado através de cheques do Banco do Brasil; QUE o Declarante afirma que recebeu os cheques das pessoas de JOSÉ EDUARDO e PEDRO TRAVA (Id 163020288 – fl. 18);

 

- José Milton Gaspar Santana:

Já prestou serviços para a FAAFOP preparando o solo para cultivo de mamona, utilizando o trator de seu cunhado de lido "Bil", confirmando que recebeu os valores constantes às fis. 1851187; QUE os pagamentos foram realizados por meio de cheques, mas o declarante não dispõe dos respectivos comprovantes (Id 163020286 – fl. 74);

 

- Roberto Aparecido Costa:

QUE o declarante afirma que prestou serviços de preparo de solo para a FAAFOP; QUE o serviço prestado foi para o plantio de mamona; QUE o declarante se recorda de ter recebido pagamento da FAAFOP pelo serviço prestado: QUE o declarante confirma que recebeu valores em cheque, possuindo até mesmo documentos que comprovam o recebimento dos valores; QUE o declarante sabe que os que lhes foram passados por um outro assentado teria sido acordados (sic) com as pessoas de José Eduardo, Castelão e Vaguimar, mas o declarante afirma que não possui qualquer contato com tais pessoas (Id 163020286 – fl. 69);

 

QUE o declarante apresenta por ocasião de sua reinquirição cópias de recibos em favor da FAAFOP, pelos serviços prestados por ele de preparo de solo para plantação de mamona; QUE o declarante também apresenta cópia de um cheque emitido pela FAAFOP como forma de pagamento pelos serviços prestados (Id 163020288 – fl. 33)

 

José Carlos da Silva:

QUE a ocupação do declarante é a lavoura; QUE sempre trabalhou com lavoura; QUE o declarante confirma que prestou serviços para a FAAPOP preparando o solo para plantação de mamona, há aproximadamente três anos; QUE o declarante afirma que à época teria recebido aproximadamente R$ 1.500,00 pela prestação dos serviços; QUE o declarante afirma que se recorda de ter assinado recibo por pagamento recebido da FAAPOP uma vez; QUE o declarante confirma que a assinatura lançada na cópia do recibo anexado às fls. 552 é sua; QUE o declarante informa que os pagamentos pelos serviços prestados a FAAPOP foram feitos EDU, CASTELINHO e PEDRO TRAVA, e os pagamentos teriam sido realizados por cheques do Banco do Brasil ou Bradesco (Id 163020287 – fl. 77);

 

- Roosevelt Teófilo da Cunha:

QUE o declarante afirma que a empresa Castell Veículos firmou um contrato de locação de cinco veículos com a FAAFOP; QUE o declarante afirma que foram locados cinco veículos VW/Gol, a R$ 60,00 por dia, para cada veículo, com vigência de 01 (um) ano; QUE, por ocasião de sua oitiva o declarante apresenta o contrato de locação de veículos firmado entre a empresa Cunha Parto Veículos Ltda e a FAAFOP; QUE indagado a respeito do representante da FAAFOP que teria assinado o contrato sobredito, o declarante afirmou que não teve contato direto com referida pessoa, não se recordando seu nome; QUE na verdade o declarante retifica o que foi dito acima, afirmando que o contrato foi firmado com a pessoa de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MOARES; QUE o declarante afirma que o contrato foi cumprido na íntegra, com realização do pagamento com valor total de R$ 116.500,00, e devolução de todos os veículos após um ano; QUE o declarante afirma que os pagamentos foram feitos por meio de cheque, do Banco do Brasil, não se recordando no momento quem teria sido o emitente, acreditando que tenha sido feito em nome da FAAFOP (Id 163020287 – fl. 87);

 

Na mesma direção foram as palavras de José Amilton Lopes (Id 163020286 – fl. 29 e Id 163020287 – fl. 102); José Celerindo de Almeida (Id 163020287 – fls. 25 e 80); Sérgio Matsuo Koyama (Id 163020285 – fl. 67 e Id 163020287 – fl. 86); Antônio Braga Silveira (Id 163020285 – fl. 72 e Id 163020287 – fl. 103); Marcelo Dias Rafacho (Id 163020287 – fl. 43 e Id 163020288 – fl. 8); José Balbino Souza (Id 163020286 – fl. 65); Manoel Aparecido de Melo (Id 163020286 – fl. 70); Sidnei Sérgio do Nascimento (Id 163020286 – fl. 72); Edson Ferreira da Silva (Id 163020287 – fl. 72); Rivaldo Egildo Ferreira (Id 163020287 – fl. 83) e Luciano Ferreira de Araújo (Id 163020288 – fl. 29). Note-se, ainda, que embora tais indivíduos não tenham sido ouvidos em juízo, alguns foram reinquiridos em Delegacia de Polícia e confirmaram suas declarações iniciais, ou seja, de que receberam valores da FAAPOP, sem terem apontado qualquer discrepância com aqueles registrados na prestação de contas da Federação.

Claudioci Santos Menezes (Id 163020286 – fl. 49 e Id 163020287 – fl. 34), José Francisco Filho (Id 163020286 – fl. 53) e Cristiane Freire Aguiari Mori (Id 163020287 – fl. 73), por sua vez, apresentaram versões imprecisas, segundo as quais não se recordavam ao certo se haviam recebido valores da FAAFOP.

Por fim, Crélio Pereira da Silva declarou inicialmente que era conselheiro fiscal da FAAFOP e que nunca recebeu pagamentos da Federação, mas que sua função consistia em intermediar os pagamentos realizados às pessoas que prestavam serviços a ela (Id 163020286 – fl. 53). Reinquirido ainda em Delegacia de Polícia, reiterou suas afirmações iniciais, mas disse que “na verdade assinou recibos em favor da FAAFOP”. Assim, “indagado a respeito do fato de ter assinado recibos, na condição de conselheiro fiscal da FAAFOP, por serviços que jamais executou em favor desta, aduzindo que teria assinado os recibos no lugar das pessoas de JOSÉ VENTURINO, ANTONIO ALVES e GILBERTO, respondeu que ocorreu um falha (sic)” (Id 163020288 – fls. 10), o que reiterou quando foi ouvido uma terceira vez, na condição de interrogado (Id 163020288 – fls. 12/13).

Sob o crivo do contraditório, repisou que participou do conselho fiscal da FAAFOP e declarou que recebeu aproximadamente R$ 11.000,00 (onze mil reais) para o pagamento de tratoristas que havia contratado para trabalharem em um assentamento, como intermediário da mão de obra (mídia audiovisual à fl. 1.638 dos autos físicos).

É bem verdade que, como apontado na Nota Técnica elaborada pela Procuradoria da República no Município de Presidente Prudente/SP, “as justificativas apresentadas pelo Convênio ao solicitar recursos financeiros adicionais sempre foram elaboradas em termos vagos, sem a indicação de fatos e ou situações concretas e mensuráveis, fundamentais e imprescindíveis para as análises, decisões, acompanhamento e controle do Órgão concedente” (Id 163020289 – fl. 93), como destacado no Quadro III do mencionado documento. Não pode ser desconsiderado, ainda, que, realizado o confronto entre os cheques pagos aos supostos favorecidos, seus valores e as cópias de recibos apresentadas, como consta na extensa lista apresentada no Quadro V do documento e nas considerações subsequentes, foram constatadas irregularidades como apresentação de cópias de recibos sem número ou emissão de notas fiscais com data muito posterior aos pagamentos, liquidação de cheques no caixa do banco, de modo a permitir “o saque em espécie, a transferência do valor para outras contas ou, ainda, quitação de contas e depósitos a contas diversas” e, em muitos casos (aproximadamente metade), ausência de qualquer comprovação de serviços prestados.

Cumpre, ainda, transcrever trecho atinente às conclusões da análise:

- Os números, valores e datas dos cheques informados como utilizados nos pagamentos conferem com os registros efetuados na conta corrente bancária.

- Não foram apresentados comprovantes para todos os pagamentos constantes na ‘Relação de Pagamentos’. Constam, inclusive, comprovantes com favorecidos diferentes do informado na referida relação de pagamentos.

- Nota fiscal apresentada fora do processo de prestação de contas sobre locação de veículos no valor de R$ 116.500,00 discrimina o período de locação até novembro de 2008, fora do período de prestação de contas, caracterizando pagamento antecipado. Contraria, inclusive, o contrato de locação firmado onde, na cláusula 9, foi acordado pagamento mensal da locação. O valor pago supera em 94,17% o (R$ 60.000,00) no Plano de Trabalho do convênio para período idêntico.

- Não foi observada a obrigatoriedade da realização de licitação para a contratação dos serviços de aluguel de veículos. Tampouco foi apresentado despacho de adjudicação. A entidade limitou-se a apresentar justificativa singela e carente de comprobatórios.

- Nota fiscal apresentada sobre a locação de 5 computadores no valor de R$ 6.000,00 discrimina o período de locação até março de 2008, fora do período de prestação de contas, caracterizado pagamento antecipado.

- Na comprovação do pagamento do cheque 850007 – R$ 23.850,00, liquidado no caixa do banco, constam diversas notas fiscais com datas de emissão de até 248 dias após o pagamento do cheque. Constam, inclusive, contas/faturas como pagas "em dinheiro".

- A maioria dos cheques utilizados nos pagamentos, 77,10%, foram liquidados no caixa, o que permite saques em dinheiro sem a real identificação do favorecido.

- Examinando as cópias dos 130 cheques de emissão da FAAFOP utilizados nos pagamentos, verifica-se que 69 deles foram emitidos e liquidados com favorecidos diversos dos constantes na "Relação de Credores".

- Dos R$ 434.465,52 utilizados no período, R$ 116.500,00 ou 26,8% foram utilizados em pagamento de serviços de locação de veículos; 5,5% ou R$ 23.850,00 gastos em combustíveis e R$ 6.000,00, 1,40% em aluguel de computadores. Referidos gastos representam 33,7% do total despendido no período.

- No período de prestação de contas, 18.10.07 a 31.12.07, dos cheques emitidos, 11 (onze) constam como favorecido o próprio emitente, ou seja, a FAAFOP, totalizando R$ 57.474,30. Todos os cheques foram liquidados no caixa do banco, o que enseja pagamentos em dinheiro. Todos foram emitidos e endossados com as assinaturas de José Eduardo Gomes de Moraes e Pedro Aparecido Trava Munhoz, respectivamente, Diretor Presidente e Secretário de Finanças e Administração da FAAFOP.

- No período de não prestação de contas, 01.01.08 a 31.12.09, R$ 491.776,96, equivalentes a 53,17% dos R$ 924.903,24 gastos, foram realizados através de 38 (trinta e oito) cheques emitidos a favor do próprio emitente, FAAFOP, e todos liquidados no caixa, o que enseja pagamentos em dinheiro.

-No geral, de 18.10.07 a 31.12.09, dos R$ 1.373.598,25 recebidos pelo convenente, 40% ou R$ 549.251,35, foram gastos através de cheques constando como favorecido o próprio emitente.

- Da vigência do convênio, 18.10.2007 a 31.12.2009, foram prestadas contas do período de 18.10.2007 a 31.12.2007 quando foram consumidos R$ 434.465,52. No período de 01.01.2008 a 31.12.2009, foram gastos R$ 924.903,24, totalizando R$ 1.359.368,76. Dos R$ 1.373.598,25 recebidos do INCRA, no período de 18/10/2007 a 18/11/2008, restaram R$ 14.229,49 a conferir.

- As cópias dos cheques examinadas constam nos Vol 14 e 15, fls. 3490 a 3736 e 3742 a 3992.

- O relatório de cumprimento de objeto foi apresentado em termos genéricos e não informa a real situação das atividades conveniadas. Guilherme Cyrino Carvalho do INCRA em São Paulo, à vista do referido relatório, considerou cumprido o objeto do convênio, informando vagamente que as atividades estão em plena execução. Em 08.09.2008, o INCRA de São Paulo cadastrou no SIAFI a situação do convênio como 'contas comprovadas' ou 'adimplente'. Em 07.06.2010, foi cadastrada no SIAFI a situação 'inadimplente' por atraso na prestação de contas. Persiste, atualmente, a situação 'inadimplente' no SIAFI.

- Pelo exposto, conclui-se que os documentos apresentados pelo convenente para a prestação de contas, sendo insuficientes, com incongruências e inconsistências, não cumprem a finalidade de informar e convencer sobre a correta e regular aplicação dos recursos recebidos e o conveniente alcance dos objetivos propostos (Id 163020290 – fls. 2/3).

 

Posto isso, ouvido na fase inquisitiva da persecução penal, JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES declarou:

QUE o Declarante faz parte da FAAFOP, sendo esta criada para prestar auxílio a assentados do Pontal do Paranapanema/SP: QUE na realidade a FAAFOP é uma Federação das demais associações criadas no Pontal do Paranapanema; QUE a FAAFOP foi criada pois percebeu que havia a necessidade de auxiliar as demais associações de assentados que foram criadas no Pontal do Paranapanema, sendo essas algo em torno de 50 (cinquenta); QUE a FAAFOP foi idealizada por um grupo de pessoas envolvidas com movimentos sociais em Teodoro Sampaio/SP e região, sendo ele composto pelo Declarante, Presidente das demais associações, JOSÉ RAINHA JUNIOR, VAGUIMAR NUNES DA SILVA, SÉRGIO PANTALEÃO, GLEUBER CASTELÃO, PEDRO TRAVA entre outros; QUE a FAAFOP foi criada em 26/08/2006, ocasião em que foi escolhida a primeira diretoria, fls. 47 e 48; QUE a diretoria eleita em 26/08/2006 é a mesma da atualidade, sendo que a mesma foi eleita por um mandato, salvo engano de 04 ou 06 anos; QUE o anteprojeto do estatuto social apresentado na assembleia em 26/09/2006 foi produzido pelo declarante e demais pessoas acima citadas, utilizando-se para tal de pesquisas na "internet" e outros estatutos; QUE em 16/10/2007 a FAAFOP conseguiu um convênio para o desenvolvimento da produção de oleaginosas no Pontal do Paranapanema/SP, ocasião em que obtiveram do INCRA a quantia aproximada de R$ 600.000,00 (seiscentos mil reais); QUE ao que tem conhecimento o projeto ainda está vigente, devendo encerrar-se em 31/12/2009; QUE o convênio era para auxiliar alguns assentados na plantação de oleaginosas em seus lotes, bem como na venda das mesmas para a produção do Biodiesel; QUE o projeto de plantação de oleaginosas foi levado ao conhecimento das autoridades em Brasília/DF, ocasião em que estavam presentes o Declarante, Gleuber Castelão, José Rainha Junior, SR do INCRA em São Paulo, Presidente do INCRA, Representantes do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Andradina, Ministro do Desenvolvimento Agrário entre outros; QUE a reunião ocorreu no Ministério do Desenvolvimento Agrário; QUE o projeto já utilizou o valor repassado e encontra-se em fase de prestação de contas; QUE não sabe informar qual o valor total repassado para o projeto; QUE não assinou a prestação de contas no dia 14/08/2008 (fls. 167) haja vista que solicitou seu afastamento da FAAFOP por seis meses antes da eleição municipal de 05/10/2008; QUE sua licença perdurou até a eleição de 05/10 sendo que após tal data voltou para a presidência da mesma; QUE na sua concepção a prestação de contas apresentada em 14/09/2008 não estava fora do prazo e ainda com relação as demais prestação de contas possui o prazo até 31/12/2009; QUE o INCRA liberou R$ 400.000,00 - quatrocentos mil reais (segundo aditivo), devido ao período da entre-safra; QUE não sabe informar quem assinou o quarto temo aditivo do convênio, não sabendo também a data da assinatura do mesmo; QUE o terceiro termo aditivo foi assinado por HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, haja vista que mesmo tendo retomado a presidência da associação após 05/10/2007, acabou se afastando da FAAFOP, isto em decorrência de um desentendimento político que teve com José Rainha Junior; QUE desde o seu afastamento passou a não mais controlar a entrada e saída de valores da FAAFOP; QUE o controle da mesma passou para a CooperBioOeste a qual é presidida por VAGUIMAR NUNES; QUE atualmente, como consta como Presidente da FAAFOP, voltou a frequentar o escritório da COOPERBIOOESTE pois segundo o INCRA a responsabilidade pela prestação de contas é do Declarante; QUE quem está auxiliando na prestação de contas da FAAFOP é a pessoa de Marcos Cascata; QUE a conta da FAAFOP era movimentada pelo Declarante e por Pedro Trava; QUE a intenção da FAAFOP, com relação ao projeto da oleaginosa, é a apresentação de contas ao INCRA após o dia 31/12/2009 (Id 163020285 – fls. 09/10, destaques nossos).

 

Novamente interrogado em Delegacia de Polícia, asseverou:

QUE, o interrogado continua sendo presidente da FAAFOP, afirmando que assumiu o cargo de presidente no ano de 2007; QUE o interrogado confirma que já era o presidente da FAAFOP na ocasião que foi firmado o convênio SIAFI n° 594389, no valor de R$ 622.400,00 (processo INCRA n° 54190.00344112007-87); QUE o interrogado afirma que já foi processado criminalmente por invadir terras, aduzindo que nunca foi preso; QUE o interrogado afirma que os pagamentos efetuados pela FAAFOP às pessoas relacionadas às fls. 185/187 dos autos condizem com a verdade, aduzindo que todas as pessoas teriam sido beneficiadas pelos serviços prestados; QUE indagado sobre a pessoa de JOSÉ PAULO FERREIRA, declarante de fl. 890, respondeu que conhece o mesmo, afirmando que teria prestado serviços à FAAFOP e recebido os pagamentos; QUE o interrogado se recorda que JOSÉ PAULO FERREIRA prestou serviços de manutenção de telefones; QUE questionado a respeito do fato de JOSÉ PAULO FERREIRA ter declarado à fl. 890  “que jamais recebeu R$ 6.000,00 por serviços prestados â FAAFOP”, respondeu que é um direito dele afirmar isso; QUE indagado a respeito da pessoa de CRÉLIO PEREIRA SILVA, alegou desconhecimento, conquanto o mesmo seja conselheiro fiscal da FAAFOP; QUE indagado a respeito do fato de CRÉLIO PEREIRA SILVA ter negado o recebimento do valor de RS 11.000,00, conforme relação anexada aos autos às fls. 185/187 e recibo acostado à fl. 566 dos autos, respondeu que não se recorda de tal pessoa, bem como de qualquer pagamento que tenha sido realizado em seu nome: QUE o interrogado não sabe informar por qual motivo a FAAFOP emitiu recibo (fl. 566) em favor de CRELIO PEREIRA SILVA, conselheiro fiscal da Federação; QUE indagado sobre o fato de ter praticado crime de falsidade ideológica ao emitir o sobredito recibo, já que CRÉLIO PEREIRA SILVA jamais prestou serviços para a FAAFOP, uma vez que era conselheiro fiscal, alegou desconhecimento; QUE indagado a respeito das declarações prestadas por GIVALDO BISPO SOARES à fl. 907, segundo as quais ele teria negado o recebimento do montante declarado às fl. 185/187, aduzindo que teria recebido aproximadamente R$ 3.000,00, e não R$ 7.809,00, respondeu que é um direito de GIVALDO alegar que recebeu menos; QUE desconhece a pessoa de MARIO BRITO GODINHO, declarante cujo termo está acostado à fl. 815; QUE segundo o interrogado, as pessoas responsáveis por realizar os pagamentos em nome da FAAFOP eram WAGMAR NUNES, JOSÉ RAINHA JUNIOR e GLEUBER CASTELÃO, além do próprio interrogado: QUE indagado a respeito do declarante CLAUDIOCI SANTOS MENEZES, fl. 960, respondeu que não se recorda de tal pessoa; QUE o interrogado afirma que a pessoa de GLEUBER CASTELÃO era o responsável por emitir recibos em nome da FAAFOP; QUE perguntado sobre a pessoa de CRISTIANE FREIRE AGUIARI MORI, sócia gerente do AUTO POSTO MEGA PRIMUS LTDA, respondeu que não se recordava dela: QUE perguntado sobre o fato de estar sendo executado no fórum da comarca de Teodoro Sampaio/SP em razão de ter contraído dividas em nome da FAAFOP, por abastecimentos realizados no AUTO POSTO MEGAPRIMUS LTDA, respondeu que de fato está sendo acionado na justiça; QUE indagado a respeito do declarante JOSÉ ANGELO DE ALMEIDA (fl. 1011), respondeu que não se recorda de tal pessoa; QUE questionado a respeito do fato de JOSÉ ANGELO ter alegado ter recebido um valor inferior ao declarado pela FAAFOP às fls. 185/197, afirmou que não há recibos em seu nome; QUE o interrogado nega que tenha preenchido a nota fiscal cuja cópia encontra-se acostada à fl. 729 dos autos: QUE perguntado sobre o fato de o declarante JOSÉ PAULO FERREIRA ter locado cinco computadores para a FAAFOP, conforme consta da cópia de nota fiscal acostada à fl. 729 dos autos, respondeu que não se recorda; QUE questionado sobre a afirmação de JOSÉ PAULO FERREIRA à fl. 1017, segundo o qual jamais teria locado computadores para a FAAFOP, bem como indagado sobre a possível falsificação da nota fiscal cuja cópia está anexada à fl. 729 dos autos, respondeu que não foi ele quem preencheu a nota e que se houve falsidade, desconhece o falsificador; QUE segundo o interrogado, a pessoa responsável por intermediar verbas junto ao INCRA é JOSÉ RAINHA JUNIOR; QUE segundo o interrogado, JOSÉ RAINHA procurou as pessoas de RAIMUNDO PIRES, superintendente regional do INCRA em São Paulo, e conseguiu a verba para o convênio SIAFI 594389, processo INCRA n. 54190.00344112007-87; QUE indagado sobre as pessoas responsáveis por realizar os pagamento em nome da FAAFOP às pessoas relacionadas às fls. 185/187, respondeu que era o próprio interrogado e PEDRO TRAVA, ficando a pessoa de JOSÉ RAINHA JUNIOR responsável pela intermediação dos pagamentos e obtenção de verbas janto ao INCRA; QUE segundo o interrogado a pessoa de GLEUBER SIDNEI CASTELÃO prestava serviços administrativos para a FAAFOP, inclusive tendo realizado pagamentos às pessoas relacionadas às fls. 185/187; QUE indagado sobre o destino dado à diferença eventualmente existente entre o valor recebido do INCRA e os valores declarados às fls. 185/187 pela FAAFOP, respondeu que irá procurar as pessoas que declararam não ter recebido o montante apresentado, para pedir explicações; QUE segundo o interrogado, o INCRA abriu uma tomada de contas especial para investigar as denúncias de desvio de verba (Id 163020289 – fls. 14/17, destaques nossos).

 

Em audiência de instrução e julgamento, confirmou que presidiu a FAAFOP, criada com o intuito específico de captação de recursos públicos para os assentamentos de agricultores da região. Aduziu que José Rainha Júnior era a pessoa que, em razão das relações políticas que possuía, encarregava-se de buscar as verbas. Sustentou que todos os recursos fornecidos pelo INCRA através do convênio foram devidamente aplicados, mas reconheceu que não foi feita a respectiva prestação de contas integral. Alegou que, em razão de uma cirurgia, afastou-se da entidade e deixou cheques assinados de boa-fé, mas ao retornar percebeu que não tinham sido prestadas contas, do que resultou um desentendimento com José Rainha Júnior e a recusa em assinar novos cheques a partir de então. Indagado acerca da razão pela qual a prestação de contas não foi efetuada, sustentou que primeiro o trabalho era realizado e depois as contas seriam prestadas. Perguntado sobre o papel que HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO exercia na FAAFOP, disse que ela foi procurada por ocasião da criação da federação, já que buscavam a participação de assentados no corpo administrativo, e que ela assumiu a presidência quando ficou doente, mas aduziu que ela, assim como IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO (2ª Secretária de Administração e Finanças) e JOSÉ CLAUDIO VIEIRA (Conselheiro Fiscal) nunca participaram das reuniões que eram realizadas em São Paulo/SP. Quanto a GLEUBER SIDNEI CASTELÃO (contador), disse que não se recordava se ele participava da entidade. Disse ainda que houve ocasiões em que “chegou um aditivo” e não sabia como, bem como que lhe disseram que a prestação de contas seria feita posteriormente. Indagado sobre o motivo pelo qual significativa quantidade de cheques foram emitidos em nome da própria FAAFOP, com saque em dinheiro na boca do caixa, respondeu que uma das orientações que recebeu foi de que isso poderia ser feito. Na mesma direção, disse que eram emitidos cheques nominais e que o tratorista ou quem havia plantado a semente de mamona sacava o dinheiro na boca do caixa. A respeito das situações em que notas fiscais foram emitidas muito depois dos cheques, alegou desconhecer questões contábeis, mas que recebeu orientações em São Paulo/SP, na sede do INCRA, de que isso poderia ser feito. Aduziu, ademais, que jamais orientou qualquer corréu a assinar cheques em branco (Id 277349034).

HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, por seu turno, inicialmente asseverou:

QUE a declarante é assentada do assentamento Santa Zélia desde 1999; QUE em data que não se recorda, porém há mais de dois anos, foi convidada por JOSÉ EDUARDO para fazer parte da FAAFOP; QUE conhece JOSÉ EDUARDO desde a época que eram acampados do MST; QUE quando foi anunciada como vice-presidente da Federação estava em uma reunião em Mirante do Paranapanema/SP, onde além de José Eduardo, estavam ex-integrantes do MST, estando presente inclusive JOSÉ RAINHA JÚNIOR; QUE não sabe informar quais são os projetos encabeçados pela FAAFOP; QUE não sabe informar também qual o montante de verba liberado para os projetos; QUE não participa da administração da federação, sendo que com o afastamento de JOSÉ EDUARDO para a disputa eleitoral, assinou por algumas vezes documentos levados em seu lote pela pessoa de MARCOS CASCATA; QUE não sabe informar onde é a sede da FAAFOP neste município; QUE não sabe informar ainda quais documentos assinou, mas em algumas vezes lhe informaram que eram prestações de contas; QUE como membro da FAAFOP não recebe nenhuma ajuda de custo, nem mesmo para despesa com combustível; QUE chegou a participar de três reuniões onde o assunto foi o biodiesel, sendo que duas delas ocorreram no POUSO DA GARÇA, com aproximadamente oitenta pessoas; QUE nestes dois encontros almoçaram no local às custas da FAAFOP; QUE outra reunião ocorreu na FAZENDA SANTA CARMEN, porém não houve almoço; QUE quando das reuniões não havia tendas instaladas para proteção solar; QUE não sabe informar se a FAAFOP fez locação de veículos, porém ouviu dizer que tais locações ocorreram; QUE por ser leiga, acabava por assinar documentos sem ter conhecimento do teor destes; QUE ao ser indagada o motivo pelo qual assinou o primeiro aditivo do convênio 19.000/2007 no valor de R$ 351.198,25, alega que assinou a pedido de MARCOS CASCATA, porém não sabia do que se tratava; QUE não se recorda de ter assinado a prestação de contas no valor de R$ 622.400,00, em 14 de agosto de 2008; QUE não se recorda também de ter assinado em 30 de junho de 2008 a justificativa para não realização de licitação na contratação de tratores para o preparo do solo no convênio 19.000/2007; QUE não se recorda também de ter assinado em 30 de junho de 2008 a justificativa para a não realização de licitação referente ao aluguel de veículos da empresa CUNHAPAR VEÍCULOS LTDA.; QUE não se recorda ainda de ter assinado o terceiro aditivo em 17/11/2008 solicitando R$ 400.000,00; QUE se recorda neste ato que a solicitação desses R$ 400.000,00 foi para pagar despesas do convênio; QUE quando na presidência da FAAFOP, assinou diversas folhas de cheque em branco para MARCOS CASCATA; QUE era notório que a prestação de contas da FAAFOP era feita por JOSÉ EDUARDO, CASTELINHO E CASCATA; QUE nunca foi informada qual a finalidade dos cheques assinados em branco, não havendo qualquer indicativo do pagamento no canhoto do talonário; QUE no assentamento da declarante, ou seja, Santa Zélia, estão assentadas cento e quatro famílias, sendo que nenhuma delas atualmente planta mamona no projeto de cultivo de oleaginosas; QUE é assentada há dez anos, conhece centenas de assentados, e não sabe informar neste ato um lote sequer onde esteja sendo cultivada a mamona ou o pinhão-manso (Id 163020283 – fls. 15/16, destaques nossos).

 

Em audiência de instrução e julgamento, confirmou que participou da FAAFOP na qualidade de Vice-Presidente, posição que lhe foi anunciada sem qualquer ajuste prévio por JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES em uma reunião com assentados – “a senhora vai nos ajudar” – e que aceitou, uma vez que acreditava que atuaria em benefício da comunidade. Disse que chegou a ocupar a Presidência da entidade durante algum tempo, em razão de afastamentos de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, quando este teve problemas de saúde e quando se candidatou a vereador, períodos durante os quais confirmou ter assinado cheques em branco. Questionada sobre a razão para tanto, sustentou que, embora participasse formalmente do corpo administrativo da federação, não tomava parte em nenhum “movimento”, limitando-se a assinar documentos e cheques conforme lhe solicitassem. Quando fazia indagações a respeito, lhe respondiam que os cheques seriam utilizados para pagar despesas com tratores e funcionários. Aduziu desconhecer qualquer prestação de contas ou desvio de valores, pois tudo o que faziam, “faziam lá na cidade e a gente não ficava nem sabendo”. Questionada sobre a assinatura de dois termos aditivos que viabilizaram o repasse de recursos, repisou que desconhecia o que era feito e que jamais foi a São Paulo/SP, de modo que assinava os documentos em seu sítio em Teodoro Sampaio/SP, que eram levados por Marcos Cascata, e talvez por JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES (sem recordar-se ao certo quanto a este). Disse, ainda, que IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO também assinou cheques. Relatou, enfim, que JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES continuou no comando da federação mesmo quando esteve formalmente afastado (Id 277349039).

O réu GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, em Delegacia de Polícia, asseverou:

QUE o declarante é técnico em contabilidade e morador em Teodoro Sampaio/SP; QUE salvo engano, em 2006 foi convidado por José Eduardo Gomes de Moraes para fazer parte da Associação Amigos de Teodoro Sampaio; QUE José Eduardo era pessoa ligada ao MST e a José Rainha Júnior, tendo informado ao declarante que havia um projeto habitacional, o qual poderia ser desenvolvido por entidades não governamentais; QUE segundo soube José Eduardo e José Rainha Júnior obtiveram a informação do projeto na CEF quando estiveram em Brasília; QUE com o retorno destes de Brasília, os mesmos criaram várias Associações e a Federação das Associações (FAAFOP); QUE apesar de não se recordar o número exato, tem certeza que foram mais de dez as associações criadas; QUE figura como 1º Tesoureiro na Associação Amigos de Teodoro Sampaio, sendo esta a única associação da qual faz parte da diretoria; (...) QUE após fazer parte da diretoria da Associação, começou a ser convidado para viajar a São Paulo e a Brasília com o grupo liderado por José Rainha; QUE participou de reuniões no INCRA, no Ministério do Desenvolvimento Agrário, no Palácio do Planalto entre outros lugares sempre na companhia de José Rainha Júnior; QUE era este quem demonstrava bom relacionamento político e conseguiu a liberação de verbas para os projetos implantados pela Associação; QUE após uma briga política entre José Eduardo e José Rainha Júnior, em dezembro de 2008, o declarante e José Eduardo foram afastados da Associação e apesar de um ser o presidente e o outro o tesoureiro não tiveram mais acesso aos gastos da Associação e às verbas recebidas; (...) QUE o imóvel locado pela Associação e a linha telefônica instalada serviam também a outras associações e também à FAAFOP; (...) QUE com relação ao inquérito policial 105/2009 esclarece o que segue: QUE este projeto, ou seja, produção do biodiesel em assentamentos foi criado após o projeto da reforma e ampliação das casas e este surgiu em uma reunião política em Brasília onde José Rainha Júnior, acompanhado de José Eduardo, do declarante, lideranças de Presidente Venceslau e Andradina, expôs o projeto ao Ministro do Desenvolvimento Agrário, ao presidente do INCRA e outros técnicos de secretaria; QUE foi em Brasília que foi acertado também os valores que seriam liberados ao convênio e montante de famílias agraciadas; QUE num primeiro momento foram incluídas no projeto 1.200 famílias, sendo 1.000 do Pontal e 200 de Andradina; QUE ao que tem conhecimento o projeto nunca foi monitorado e vistoriado pelo INCRA; QUE esse projeto era para ser desenvolvido pela FAAFOP, todavia, no INCRA em São Paulo decidiu-se em repassar um certo montante da verba para a FAAFOP e o resto para a Associação Amigos de Teodoro Sampaio; QUE o valor, salvo engano, ultrapassa o valor de três milhões de reais; QUE na realidade quem tocou o projeto foi a FAAFOP e os engenheiros agrônomos, técnicos agrícolas e administrativos prestavam serviços tanto para a FAAFOP quanto para a Associação as quais inclusive funcionavam no mesmo espaço físico; QUE os aditivos também eram decorrentes de acordos políticos e como já salientado as justificativas eram produzidas pelo próprio INCRA; QUE as prestações de contas eram produzidas no escritório da Associação e recebia orientação do INCRA para que assinasse; QUE quando da primeira prestação de contas deste convênio, 21/07/2008, José Eduardo já estava afastado concorrendo ao cargo de vereador e era Marcos Cascata o responsável pela montagem da prestação de contas; QUE o declarante apenas as assinava; QUE os demais aditivos também foram por acordos políticos e as justificativas eram feitas pelo INCRA; (...) QUE não sabe informar quantos seminários foram promovidos pela Associação Amigos de Teodoro Sampaio, todavia, estes também eram confundidos com os seminários montados pela FAAFOP; QUE na realidade os seminários pertenciam à FAAFOP e demais associações envolvidas; (...) QUE não sabe informar se foram utilizadas notas fiscais frias para justificar despesas; QUE não sabe como está a prestação de contas do convênio em relação ao INCRA; QUE não sabe quantos assentados foram visitados por técnicos do projeto, não sabendo também quantos plantaram oleaginosas; QUE não sabe informar onde está sendo armazenada a produção; QUE não sabe informar quanto é produzido; QUE não sabe informar onde a produção é vendida (Id 163020283 – fls. 86/91).

 

Novamente interrogado em Delegacia de Polícia, declarou:

QUE o declarante não faz parte da FAAFOP; QUE conhece os criadores da mesma, sendo eles JOSÉ EDUARDO, PEDRO TRAVA, JOSÉ RAINHA JUNIOR, VAGUIMAR NUNES e outros não recordados; QUE a mesma foi idealizada em 2006 e seria para prestar apoio às diversas associações criadas no Pontal do Paranapanema; QUE se recorda que estava presente na Assembleia realizada 26/08/2006 onde foi escolhida a diretoria da FAAFOP, sendo que na ocasião, constou em ata que o mesmo teria sido o presidente da Assembleia Geral; QUE se fazia presente no local a convite de JOSÉ EDUARDO, o qual, na ocasião, mantinha relações de amizade com o declarante; QUE inclusive, alguns dias após a criação da FAAFOP foi criada a Associação Amigos de Teodoro Sampaio/SP, a qual JOSÉ EDUARDO foi escolhido seu presidente e o declarante tesoureiro; QUE o mesmo JOSÉ EDUARDO havia sido escolhido dias antes como presidente da FAAFOP; QUE não participou da criação do Ante Projeto do estatuto social da FAAFOP, sabendo que o mesmo foi copiado por seus idealizadores, todavia, não sabe informar de onde foi feita tal cópia; QUE não sabe informar se a diretoria da FAAFOP ainda é a mesma eleita em 26/08/2006; QUE não participou do projeto desenvolvido pela FAAFOP para a produção de oleaginosas em assentamentos do Pontal; QUE participaram do projeto os criadores da Federação e, ao que tem conhecimento, os membros da Diretoria; QUE o convênio tido pela FAAFOP em 16/10/2007 o foi após uma reunião realizada em Brasília, onde estava presente o declarante, JOSÉ RAINHA JÚNIOR, o ministro do Desenvolvimento Agrário, o Presidente do INCRA, o Superintendente do INCRA em São Paulo, JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, e algumas pessoas representando os assentados da região de Andradina/SP; QUE na ocasião, JOSÉ RAINHA JUNIOR apresentou o projeto aos presentes e a viabilidade do mesmo; QUE não sabe informar se o projeto já foi encerrado ou ainda está em vigência; QUE o nome do projeto, ou seja, "Fomentar a Produção de Oleaginosas e Diversificar as Produções nos Assentamentos" foi sugerido pelo INCRA; QUE ao que tem conhecimento, o projeto seria para orientar os produtores e acompanhar a produção das oleaginosas, bem como auxiliá-los na venda da produção; QUE ao que tem conhecimento, alguns assentados, efetivamente, plantaram oleaginosas; QUE não sabe informar qual valor que já foi repassado pelo INCRA para a FAAFOP desenvolver o projeto em questão; QUE com relação à prestação de contas de fls. 167 a 203 informa que não foi o responsável pela mesma, todavia, foi informado por JOSÉ EDUARDO que o INCRA havia lhe comunicado que seria necessária a assinatura do contador, motivo pelo qual acabou assinando para o mesmo as tabelas de fls. 185 a 187; QUE a prestação era feita com base nos modelos encaminhados pelo INCRA, sendo que a tabela de fls. 185/187 lhe foram entregues prontas, tendo conhecimento que esta foi produzida no escritório da FAAFOP localizado em Mirante do Paranapanema/SP; QUE no seu entender, a prestação de contas foi feita em 14/08/2008, porque as anteriormente encaminhadas apresentavam falhas e somente quando sanadas estas é que houve o protocolo no INCRA; QUE a assinatura da prestação de contas é da vice-presidente HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO porque na ocasião JOSÉ EDUARDO estava afastado por motivos políticos; QUE apesar de afastado, em JOSÉ EDUARDO quem efetivamente "corria atrás" dos negócios da FAAFOP, não sabendo informar se HILDA tinha conhecimentos das despesas lançadas na prestação de contas; QUE as prestações de contas eram feitas com orientações do INCRA não sabendo informar porque a mesma se referiu apenas ao período de 18/10/2007 a 31/12/2007 e não até o período em que foi produzida, ou seja, 14/08/2008; QUE não sabe informar o motivo pelo qual o INCRA liberou R$ 400.000,00 (segundo aditivo), sem que a Federação tivesse prestado contas do valor aproximado de R$ 950.000,00 antes recebido, todavia, sabe que as liberações de valores eram políticas e ocorriam após contatos feitos pelos idealizadores e fundadores da FAAFOP com o INCRA/SP; QUE não sabe informar quem assinou o quarto Temo Aditivo do projeto, não sabendo também a data em que este foi feito e o motivo pelo qual está em nome de Hilda Pereira; QUE não sabe o período de afastamento do presidente JOSÉ EDUARDO, todavia, se recorda que foi um afastamento de 6 meses, sendo que o retorno era previsto após o término das eleições municipais (05/10/2008); QUE não sabe informar quem é o atual responsável pela prestação de contas do projeto, todavia, essa informação poderá ser obtida na Sub-sede da FAAFOP em Teodoro Sampaio/SP, a qual ao que tem conhecimento, fica no mesmo endereço da COOPERBIOESTE; QUE não sabe informar o contador responsável pela prestação de contas da FAAFOP no momento; QUE foi afastado da Associação Antigos de Teodoro Sampaio e, portanto, não mais manteve contatos com JOSÉ EDUARDO, JOSÉ RAINHA JÚNIOR, VAGUIMAR NUNES, SÉRGIO PANTALEÃO e outros, envolvidos em projetos no Pontal do Paranapanema, desde dezembro de 2008; QUE ao que tem conhecimento, após uma discussão ocorrida em dezembro de 2008, por motivos políticos, entre JOSÉ EDUARDO e JOSÉ RAINHA JUNIOR, o primeiro passou, assim como o declarante, a não mais ter acesso a repasse de verbas e utilização destas, sendo que, a partir de então, o projeto foi encampado pela COOPERBIOESTE, cooperativa presidida por VAGUIMAR NUNES DA SILVA, pessoa de confiança de JOSÉ RAINHA JUNIOR; QUE ao que tem conhecimento, a movimentação da conta corrente da FAAFOP, referente ao projeto das oleaginosas, era de responsabilidade de JOSÉ EDUARDO e PEDRO TRAVA (presidente e tesoureiro) (Id 163020285 – fls. 04/06, destaques nossos).

 

Em um terceiro interrogatório na fase inquisitiva da persecução penal, aduziu:

QUE o interrogado afirma que auxiliava na emissão de recibos em nome da FAAFOP; QUE o interrogado afirma que os recibos emitidos em nome da FAAFOP tinham relação com pagamentos de verbas recebidas do INCRA; QUE o interrogado afirma que nunca foi processado criminalmente, nunca foi preso e nem indiciado em inquérito policial; QUE indagado a respeito dos pagamentos efetuados pela FAAFOP às pessoas relacionadas às fls. 185/185 dos autos, o interrogado respondeu que dos documentos apresentados para a organização da sobredita relação de pagamento, pode afirmar que condizem com a verdade; QUE indagado por qual motivo não afirmou no início deste interrogatório que seria o contador da FAAFOP, conforme se verifica na assinatura lançada em seu nome nas fls. 185/187, respondeu que de fato assinou na condição de contador porque o INCRA exigia que um profissional da área assinasse em nome da FAAFOP; QUE indagado sobre a pessoa de JOSÉ PAULO FERREIRA, declarante de fl. 890, respondeu que a conhece, afirmando que teria prestado serviços como eletricista à FAAFOP, não sabendo dizer quanto teria recebido em pagamento; QUE perguntado sobre o fato de JOSÉ PAULO FERREIRA ter recebido o valor de R$ 6.000,00 por serviços prestados à FAAFOP, respondeu que não se recorda; QUE indagado sobre a relação de pagamentos de fls. 185, na qual consta o pagamento efetuado a JOSÉ PAULO FERREIRA TEODORO SAMPAIO ME, no valor de R$ 6.000,00, respondeu que não se recorda do pagamento nem mesmo do serviço prestado; QUE o interrogado não se recorda da quantidade de computadores utilizados na sede da FAAFOP em Mirante do Paranapanema/SP, nem na subsede de Teodoro Sampaio/SP; QUE o interrogado afirma que não sabe dizer se os computadores eram comprados ou locados; QUE o interrogado afirma que nunca ficou com bloco ou talão de nota fiscal da empresa de JOSÉ PAULO FERREIRA; QUE indagado a respeito da pessoa de CRÉLIO PEREIRA SILVA, alegou desconhecimento; QUE o interrogado afirma que desconhece o fato de CRÉLIO PEREIRA SILVA ter negado o recebimento do valor de R$ 11.000,00, conforme relação anexada aos autos às fls. 185/187 e recibo acostado à fl. 566 dos autos; QUE indagado sobre o fato de ter praticado crime de falsidade ideológica ao emitir um recibo em nome de CRÉLIO PEREIRA SILVA, sendo que este jamais prestou serviços para a FAAFOP, uma vez que era conselheiro fiscal, alegou desconhecimento; QUE o interrogado nega ter emitido o recibo de fl. 566 em nome de CRÉLIO PEREIRA SILVA; QUE indagado a respeito das declarações prestadas por GIVALDO BISPO SOARES à fl. 907, segundo as quais ele teria negado o recebimento do montante declarado à fl. 185/187, aduzindo que teria recebido aproximadamente R$ 3.000,00, e não R$ 7.809,00, respondeu que desconhece esse fato; QUE desconhece a pessoa de MARIO BRITO GODINHO, declarante cujo termo está acostado à fl. 915; QUE segundo o interrogado, as pessoas responsáveis por realizar os pagamentos em nome da FAAFOP eram WAGMAR NUNES, JOSÉ EDUARDO GOMES, PEDRO TRAVA e eventuais conselheiros regionais; QUE o interrogado afirma que JOSÉ RAINHA JUNIOR era o líder, encarregado de buscar o dinheiro em Brasília/DF e São Paulo/SP, sendo encarregado ainda de acompanhar o projeto no campo; QUE o interrogado desconhece que JOSÉ RAINHA JUNIOR realizava pagamentos em nome da FAAFOP; QUE segundo o interrogado, JOSÉ RAINHA JUNIOR foi buscar verbas junto ao Superintendente do INCRA no estado de SP, RAIMUNDO PIRES, conhecido como “BOMBRIL”; QUE o interrogado nega que tenha assinado recibos em nome de outras pessoas, alegando que não se recorda, por nome, da pessoa de CLAUDIOCI SANTOS MENEZES (fl. 960); QUE indagado novamente sobre sua participação em pagamentos realizados pela FAAFOP às pessoas relacionadas às fl. 185/187, conforme afirmado pelo interrogado JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, respondeu que, de fato, esteve presente nos pagamentos realizados; QUE indagado sobre o destino dado à diferença eventualmente existente entre o valor recebido do INCRA e os valores declarados às fls. 185/187 pela FAAFOP, respondeu que eventual diferença é de seu desconhecimento, já que não acompanhava, em campo, os serviços prestados; QUE o interrogado desconhece a existência de procedimento administrativo aberto pelo INCRA para investigar as contas da FAAFOP (Id 163020289 – fls. 06/08, destaques nossos).

 

Sob o crivo do contraditório, aduziu que após a criação de diversas associações na região do Pontal de Paranapanema, percebeu-se que era necessária a existência de uma Federação que as contemplasse, o que resultou no surgimento da FAAFOP. Uma vez que atuava em um escritório de contabilidade próximo à residência de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, este perguntou-lhe se tinha interesse em participar de um projeto habitacional, o que aceitou, pois possuía envolvimento com política na cidade, do que se seguiu o cadastramento dos beneficiários e, posteriormente, o projeto de produção de biodiesel a partir do plantio de oleaginosas. Declarou que quem obtinha a liberação dos recursos era José Rainha Junior, mas que, por ser técnico contábil, diversas vezes pediram-lhe que assinasse prestações de contas, ressalvando que nunca participou da administração da Federação ou de questões relacionadas à origem e destinação dos recursos. Disse que, como contador, “caiu na besteira de assinar”, o que foi “o grande erro de sua vida”, e que recebia os documentos prontos, os quais inclusive lhe eram submetidos com a justificativa de que era o INCRA que tinha solicitado a assinatura. Declarou que JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, como Presidente da FAAFOP, assinava os cheques que a Federação emitia, o que o interrogando jamais fez. Indagado se, como técnico contábil, não percebeu que parte dos recibos tinham sido emitidos muito depois dos cheques, repisou que não elaborou a planilha relativa à prestação de contas irregular, limitando-se a assiná-la. Perguntado, em seguida, se compreendia que ao agir assim estava conferindo aparência de legalidade a um documento que, segundo ele próprio alegou, não sabia se correspondia à verdade, disse que sim, mas sustentou que apenas o assinou porque o Superintendente Regional do INCRA estava presente durante uma reunião realizada em São Paulo/SP e lhe assegurou que tudo era legítimo. Indagado sobre o trecho de suas declarações na fase inquisitiva da persecução penal no qual afirma que estava presente quando os pagamentos foram realizados, disse que foi convocado a prestar esclarecimentos na Delegacia de Polícia Federal sem aviso prévio e que estava transtornado, de modo que não se recordava com precisão do que disse naquele momento, mas garantiu que não participou de pagamentos nem fez contratação de serviços (Id 277349037).

 

JOSÉ CLÁUDIO VIEIRA, por sua vez, foi ouvido em Delegacia de Polícia na condição de testemunha, ocasião em que, indagado somente sobre o recebimento de valores da FAAFOP, declarou:

QUE o declarante confirma que já prestou serviços para a FAAFOP, preparando o solo para o plantio de mamona; QUE o declarante afirma que prestou serviço para a FAAFOP com mais 9 pessoas, sendo que ao final receberam a quantia aproximada de R$ 21.000,00; QUE o declarante afirma que os pagamentos eram realizados pelo EDU e por Castelinho, contador do escritório da FAAFOP; QUE o declarante confirma ter assinado recibos em favor da FAAFOP pelos pagamentos realizados; QUE o declarante confirma que a cópia de recibo acostada à fl. 548 dos autos foi assinada por ele em favor da FAAFOP; QUE por fim o declarante afirma que os pagamentos eram realizados por meio de cheques, sendo que Edu era o presidente da FAAFOP, Castelinho era o contador e Pedro Tavares era o tesoureiro (Id 163020287 – fl. 79, destaques nossos).

 

Em juízo, sustentou que lhe pediram que ocupasse uma posição no Conselho Fiscal da FAAFOP quando JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES se afastou para concorrer a um cargo político, mas que, na realidade, à época sequer sabia em que função havia sido colocado. Aduziu não ter conhecimento sobre os valores liberados através do convênio com o INCRA e que assinou cheques em branco a pedido de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES e HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, que eram os responsáveis por tudo o que acontecia. Disse que ficou preocupado por estar assinando cheques em branco, mas que ficou combinado que “o Edu não iria fazer besteira”, motivo pelo qual confiou nele. Rememorou que os cheques eram assinados na residência de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, onde, em determinada ocasião, os três assinaram um talão inteiro em branco. Além disso, em outras duas ou três ocasiões, quando estava trabalhando, levaram cheques em branco para que assinasse. Declarou que JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES e PEDRO APARECIDO TRAVA MUNHOZ eram os responsáveis pela gestão da Federação e que o primeiro, mesmo depois de seu afastamento formal em razão de atividade política, continuou no comando – “era o cabeça da Federação” –, assim como ainda decidia a destinação do dinheiro. Recordou-se, ainda, que embora HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO estivesse junto por ocasião da assinatura dos cheques, era JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES que pedia que fossem assinados, sob a justificativa de que seriam usados para despesas com pessoal. Disse, enfim, que recebeu R$ 21.000,00 (vinte e um mil reais) como pagamento por serviços realizados com trator (Id 277349043).

Por fim, IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO, ouvida somente em juízo, confirmou que atuou como 2ª Secretária de Administração e Finanças na FAAFOP e sustentou que, após assinar cheques em branco, passou a desconfiar de alguma irregularidade e pediu seu afastamento a JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, que não aceitou a solicitação, mas cedeu após algum tempo. Disse que era JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES que pedia que assinasse os cheques, assim como Wagmar, Francisco “Babalu” e José Rainha Junior. Quando os questionava a respeito da utilização dos cheques, respondiam que eram destinados a engenheiros, técnicos de manutenção e ao pagamento de aluguéis, e asseguravam que maiores detalhes seriam repassados em uma reunião, que, entretanto, nunca ocorria. Disse que, embora tivesse ciência de que o que fazia era irregular, supunha que os recursos seriam empregados corretamente. Indagada, enfim, se HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO também assinava cheques em branco, respondeu que sim, mas repisou que era JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES que o pedia (Id 277349046).

Ainda no que diz respeito à prova oral produzida no curso da persecução penal, cumpre, enfim, transcrever trecho das declarações prestadas por PEDRO APARECIDO TRAVA MUNHOZ, ouvido somente em Delegacia de Polícia (em razão do desmembramento do processo):

(...) QUE indagado a respeito das pessoas responsáveis por realizar os pagamentos questionados nos autos, respondeu que além do próprio interrogado, JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, conhecido como EDU, também assinava os cheques; QUE o interrogado afirma ainda que os pagamentos foram realizados no escritório de contabilidade de GLEUBER SIDNEI CASTELÃO (...) (Id 163020289 – fl. 28)

 

Feito o relato da prova produzida no transcurso da persecução penal, o cotejo entre tais elementos demonstra, sem qualquer dúvida razoável, que os réus JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES e GLEUBER SIDNEI CASTELÃO agiram com plena consciência das circunstâncias que permeavam o repasse de verbas do INCRA à FAAFOP através do convênio n° 19000/2007 e seus aditivos, de modo a induzir a autarquia federal em erro, mediante o emprego de fraude consistente, por parte do primeiro, que presidia a federação, na emissão de cheques em branco cuja destinação declarada, conforme prestação de contas parcial assinada pelo segundo, que exercia a função de técnico contábil, diversas vezes não correspondia à realidade, o que, já indicado pelas irregularidades indicadas nas análises documentais produzidas na fase inquisitiva da persecução penal (Informação Técnica elaborada por Analista de Contabilidade da Procuradoria da República no Município de Presidente Prudente/SP, Parecer Técnico elaborado pelo mesmo servidor público com relação detalhada de responsabilidade pelos cheques emitidos pela FAAFOP e Relatório de Demandas Especiais elaborado pela Controladoria-Geral da União, documentos cujas constatações e conclusões foram relatadas detalhadamente por ocasião da análise da materialidade delitiva), foi comprovado pela prova oral produzida em Delegacia de Polícia e sob o crivo do contraditório, uma vez que diversas pessoas indicadas como destinatários de pagamentos realizados pela FAAFOP expuseram que jamais receberam qualquer valor da entidade, o que demonstra, com total certeza, o desvio de recursos transferidos à federação pelo INCRA.

A título ilustrativo, como já exposto, segundo a prestação de contas parcial assinada por HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO e GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, um dos pagamentos teria sido feito a José Paulo Ferreira Teodoro Sampaio – ME em razão da locação de computadores. Ocorre que, além de constar na cópia do respectivo cheque “emissão e endosso a favor da FAAFOP, inferindo recebimento direto no caixa pelos próprios emitentes” (como destacado na Nota Técnica elaborada pela Procuradoria da República no Município de Presidente Prudente/SP), José Paulo Ferreira negou veementemente o recebimento de qualquer valor da FAAFOP: “o declarante afirma que nunca prestou serviço para a FAAFOP - Federação das Associados Assentados e Agricultores Familiares do Oeste Paulista (...); QUE o declarante afirma que não recebeu R$ 6.000,00 de serviços prestados para a FAAFOP, conforme se verifica na relação de pagamentos acostada às fls. 185 a 187 dos autos; QUE o declarante se sente indignado ao saber que da relação de pagamentos da FAAFOP, consta que ele teria recebido o valor de R$ 6.000,00; QUE o declarante acredita que as pessoas de Castelinho, José Rainha, Vaguimar, além de outros, tenham utilizado seu nome para justificar desvio de recursos (...) QUE o declarante afirma que para ter recebido um valor de R$ 6.000,00 deveria ter prestado um serviço equivalente à instalação de uma rede de computadores interligando 10 salas, inclusive fornecendo todo o material para a parte contratante, serviço esse que jamais executou para a FAAFOP, bem como durante toda sua vida profissional (Id 163020286 – fl. 41). Reinquirido ainda em Delegacia de Polícia, aduziu que “a referida nota foi preenchida pela pessoa de GLAUBER CASTELINHO, haja vista que seu bloco de notas fiscais encontrava-se em poder desta pessoa” e detalhou “a pessoa de GLAUBER CASTELINHO era o contador de sua empresa, CONTATO TELECOM, e ficava de posse dos blocos de notas fiscais” (Id 163020287 – fl. 105).

Da mesma maneira, Otávio Heizo Uchiyama, tanto na etapa pré-processual quanto em juízo, negou ter recebido o pagamento devido por abastecimento de veículos da FAAFOP em ao menos duas de três ocasiões. Mário Brito Godinho, na mesma direção, aduziu, em ambas as etapas da persecução penal, que jamais recebeu qualquer valor da federação, e Givaldo Bispo Soares e José Ângelo de Almeida, por fim, apontaram discrepância entre os valores apontados na prestação de contas parcial e aqueles efetivamente auferidos.

Deve ser frisado, aliás, que tais irregularidades foram constatadas a partir da análise da única prestação de contas apresentada pela entidade, que sequer abrangeu todo o período inicial de vigência do convênio, ou seja, um ano. A extensão e a gravidade das falhas apontadas tanto na Informação Técnica elaborada pelo Ministério Público Federal quanto no Relatório da Controladoria-Geral da União permitem inferir, com segurança, que a fraude se estendeu durante todo o período de vigência do Convênio n° 19000/2007.

Mais uma vez, importa sintetizar algumas das irregularidades apontadas no primeiro dos mencionados documentos: justificativas para a formalização do convênio e seus aditivos  “elaboradas em termos vagos, sem a indicação de fatos e ou situações concretas e mensuráveis, fundamentais e imprescindíveis para as análises, decisões, acompanhamento e controle do Órgão concedente”; situações em que não foram fornecidas quaisquer cópias de comprovantes dos gastos relacionados na prestação de contas parcial (aproximadamente metade do total); diversas ocorrências em que foram apresentadas cópias de recibos sem número, assim como casos de pagamento antecipado pelos serviços e contratações sem licitação; notas fiscais com datas de emissão posteriores às dos supostos pagamentos em até 248 dias; desproporção entre o valor supostamente aplicado no período da prestação de contas parcial e aquele remanescente (em 74 dias, o que representa pouco mais de 20% do período inicial de vigência de um ano, teriam sido gastos R$ 434.465,52 do total de R$ 622.400,00 inicialmente alocados, ou seja, 70%); 77% dos cheques foram liquidados no caixa, de modo a permitir saques em dinheiro e movimentações sem identificação do favorecido ou preposto; e discrepâncias entre as pessoas apontadas em cheques como favorecidas e aquelas informadas nas relações de credores.

Ora, seria absolutamente fantasioso supor que tais anormalidades cingiram-se ao período abarcado pela prestação de contas parcial do período inicial de vigência do convênio, ou mesmo que a ausência de qualquer outra prestação de contas constitui mera coincidência. É evidente, portanto, que ao menos parte considerável dos recursos transferidos à FAAPOP pelo INCRA foram, mediante fraude, desviados, em benefício próprio por JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES e GLEUBER SIDNEI CASTELÃO.

Quanto ao primeiro, integrou a Presidência da FAAFOP desde sua fundação e era o responsável pela movimentação de valores da entidade, como ele próprio declarou – “QUE a conta da FAAFOP era movimentada pelo Declarante e por Pedro Trava”. Embora tenha sustentado, em Delegacia de Polícia, que “os pagamentos efetuados pela FAAFOP às pessoas relacionadas às fls. 185/187 dos autos condizem com a verdade, aduzindo que todas as pessoas teriam sido beneficiadas pelos serviços prestados”, confrontado com situações nas quais aqueles que teriam recebido valores negaram o auferimento de qualquer quantia ou em que apontaram discrepância entre o montante registrado na prestação de contas e aquele realmente recebido, limitou-se a dizer laconicamente que tais pessoas tinham o direito de fazer tais afirmações – “QUE questionado a respeito do fato de JOSÉ PAULO FERREIRA ter declarado à fl. 890  “que jamais recebeu R$ 6.000,00 por serviços prestados â FAAFOP”, respondeu que é um direito dele afirmar isso (...) respondeu que é um direito de GIVALDO alegar que recebeu menos”. Também carece de credibilidade sua assertiva genérica, em juízo, de que, em determinadas ocasiões, “chegou um aditivo” e não sabia como, bem como que lhe garantiram que a prestação de contas seria feita posteriormente, uma vez que não apenas estava no comando administrativo da entidade como também participava das reuniões realizadas com o Superintendente Regional do INCRA, pelo que certamente estava inteirado do real contexto do convênio e seus aditivos. Na mesma direção, não há como acolher as alegações de que, no que diz respeito à emissão de cheques em nome da própria FAAFOP, saques na boca do caixa, e notas fiscais expedidas muito depois da data do suposto pagamento, recebeu orientações de que isso poderia ser feito.

Com efeito, não é crível que o desvio de valores fosse praticado à margem do conhecimento de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, que presidia a FAAFOP, e era responsável pela movimentação de valores da entidade e comparecia às reuniões realizadas com o Superintendente Regional do INCRA. Aliás, HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO contou, em Delegacia de Polícia, que “era notório que a prestação de contas da FAAFOP era feita por JOSÉ EDUARDO, CASTELINHO E CASCATA” e, sob o crivo do contraditório, que EDUARDO GOMES DE MORAES permaneceu no comando da federação mesmo quando esteve formalmente afastado. Na mesma direção foram as palavras de GLEUBER SIDNEI CASTELÃO – “QUE apesar de afastado, era JOSÉ EDUARDO quem efetivamente ‘corria atrás’ dos negócios da FAAFOP” –, JOSÉ CLÁUDIO VIEIRA – “QUE o declarante afirma que os pagamentos eram realizados pelo EDU e por Castelinho, contador do escritório da FAAFOPo qual, em juízo, pormenorizou que os cheques eram assinados na residência de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, onde inclusive, em determinada ocasião, um talão inteiro foi assinado em branco, e que ele “era o cabeça da Federação”, decidia a destinação do dinheiro e permaneceu no comando da FAAFOP mesmo durante seu afastamento formal, e, por fim, IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO, segundo quem era JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES que pedia que os cheques fossem assinados.

Quanto a GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, a versão por tal réu apresentada em juízo, segundo a qual, em síntese, assinou a prestação de contas parcial sem saber de fato se o conteúdo do documento correspondia à realidade, bem como que não participou dos pagamentos realizados pela FAAFOP, não encontra respaldo no restante do conjunto probatório e revela tão somente o vão intento de subtrair-se às consequências penais de seus atos.

Com efeito, JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES expôs, em Delegacia de Polícia, que “as pessoas responsáveis por realizar os pagamentos em nome da FAAFOP eram WAGMAR NUNES, JOSÉ RAINHA JUNIOR e GLEUBER CASTELÃO, além do próprio interrogado”, assim como que “a pessoa de GLEUBER CASTELÃO era o responsável por emitir recibos em nome da FAAFOP” e, ainda, que “GLEUBER SIDNEI CASTELÃO prestava serviços administrativos para a FAAFOP, inclusive tendo realizado pagamentos às pessoas relacionadas às fls. 185/187”.

Na mesma direção, HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO aduziu, na fase inquisitiva da persecução penal, que “era notório que a prestação de contas da FAAFOP era feita por JOSÉ EDUARDO, CASTELINHO E CASCATA”. JOSÉ CLÁUDIO VIEIRA, por sua vez, aduziu que “os pagamentos eram realizados pelo EDU e por Castelinho, contador do escritório da FAAFOP”, e PEDRO APARECIDO TRAVA MUNHOZ por sua vez, que “os pagamentos foram realizados no escritório de contabilidade de GLEUBER SIDNEI CASTELÃO”.

O próprio GLEUBER SIDNEI CASTELÃO aduziu, na etapa administrativa, que participou da reunião em Brasília na qual o convênio da FAAFOP com o INCRA foi assinado, bem como esclareceu que figurou como 1º Tesoureiro da Associação Amigos de Teodoro Sampaio, conjuntura que, aliada aos conhecimentos que possuía em decorrência de sua formação como técnico contábil, torna, por si só, implausível qualquer assertiva de desconhecimento do que de fato se passava. Aliás, embora já em Delegacia de Polícia tenha sustentado que “foi informado por JOSÉ EDUARDO que o INCRA havia lhe comunicado que seria necessária a assinatura do contador, motivo pelo qual acabou assinando”, relatou, por outro lado, que “auxiliava na emissão de recibos em nome da FAAFOP”, assim como que “dos documentos apresentados para a organização da sobredita relação de pagamento, pode afirmar que condizem com a verdade”, repisando “que, de fato, esteve presente nos pagamentos realizados”, assertivas que vão ao encontro das declarações de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO e JOSÉ CLÁUDIO VIEIRA. Não prospera, por conseguinte, a justificativa apresentada em juízo de que foi convocado a prestar esclarecimentos na Delegacia de Polícia Federal sem aviso prévio e que estava transtornado, de modo que não se recordava com precisão do que disse naquele momento, e que, na verdade, não teria participado de pagamentos nem feito contratação de serviços.

Merecem relevo, ainda, as palavras de José Paulo Ferreira, que, ao negar a prestação de qualquer serviço para a FAAFOP, disse que “acredita que as pessoas de Castelinho, José Rainha, Vaguimar, além de outros, tenham utilizado seu nome para justificar desvio de recursos” e, ouvido novamente em Delegacia de Polícia, negou ter emitido nota fiscal atinente a prestação de serviços por sua empresa, aduzindo que “a referida nota foi preenchida pela pessoa de GLAUBER CASTELINHO, haja vista que seu bloco de notas fiscais encontrava-se em poder desta pessoa” e que GLAUBER CASTELINHO era o contador de sua empresa, CONTATO TELECOM, e ficava de posse dos blocos de notas fiscais”.

Por conseguinte, a manutenção da condenação de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES e GLEUBER SIDNEI CASTELÃO pela prática do crime previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal, é medida que se impõe.

Conclusão distinta, todavia, deve ser adotada no tocante a HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO e JOSÉ CLAUDIO VIEIRA.

De fato, quanto a tais réus, os elementos de convicção coligidos ao processo não fornecem lastro firme à manutenção da condenação penal e indicam, pelo contrário, que, embora formalmente integrassem o corpo administrativo da FAAFOP, não possuíam poderes gerenciais ou conhecimento dos termos do convênio com o INCRA ou como os valores eram aplicados.

Com efeito, HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO declarou, na fase inquisitiva da persecução penal, que foi anunciada como Vice-Presidente da FAAFOP durante uma reunião dos assentados em Mirante do Paranapanema, o que, como complementou em juízo, lhe causou surpresa. Embora tenha admitido que assinou cheques em branco, assim como a prestação de contas parcial, afirmou que os cheques e documentos eram trazidos até ela em seu sítio e aduziu que “não sabe informar quais são os projetos encabeçados pela FAAFOP”, tampouco “o montante de verba liberado para os projetos” e, ainda, que “não participa da administração da federação”, além de que “não sabe informar onde é a sede da FAAFOP neste município”. Na mesma direção, em juízo, aduziu que nunca participou da administração da federação e que se limitava a assinar documentos e cheques conforme lhe solicitavam, complementando que jamais foi a São Paulo/SP tratar de qualquer assunto sobre o tema. A propósito, JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES pontuou, sob o crivo do contraditório, que ela, IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO (2ª Secretária de Administração e Finanças) e JOSÉ CLAUDIO VIEIRA (Conselheiro Fiscal) nunca participaram das reuniões que eram realizadas em São Paulo/SP. É bem verdade que este, em seu interrogatório judicial, ao confessar que assinou cheques em branco, disse que o fez a pedido de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES e HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, que, segundo declarou, eram os responsáveis por tudo o que acontecia. Trata-se, entretanto, de afirmação passageira, realizada, ao que parece, mais no intuito de distanciar-se o declarante de qualquer imputação do que como descrição precisa das circunstâncias, e que não encontra respaldo no restante do conjunto probatório, tanto é que o próprio JOSÉ CLAUDIO VIEIRA, mais adiante, particularizou que quem lhe pedia que assinasse cheques em branco era JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES.

Realmente, ao contrário de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES e GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO não figura na prova oral produzida como pessoa de fato responsável pela administração da entidade, motivo pelo qual tal atividade (e a imputação criminal daí decorrente) não lhe pode ser atribuída com base somente no fato de que participava formalmente do corpo administrativo da FAAFOP, ainda mais quando, pelo contrário, os elementos de convicção indicam que a federação e o convênio com o INCRA foram concebidos e geridos por outras pessoas, entre as quais JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES e GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, assim como terceiros que não integram esta relação processual.

De qualquer maneira, importa reconhecer, quanto a HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, que a pretensão punitiva estatal se encontra prescrita.

Com efeito, a ré nasceu em 04.10.1948 (Id 163020283 – f. 15), de maneira que, quando da publicação da sentença condenatória, em 26.11.2019, já tinha mais de setenta anos de idade, o que, nos termos do art. 115 do Código Penal, impõe a redução pela metade do prazo prescricional.

Posto isso, uma vez que o órgão de acusação requereu em suas razões recursais a exasperação da pena-base, o cálculo do prazo prescricional deve ser realizado a partir da pena máxima em abstrato cominada ao delito, que, no caso do art. 171 do Código Penal, é de cinco anos de reclusão, montante que, acrescido do aumento fixo de um terço previsto no § 3º do mesmo dispositivo, resulta em 06 (seis) anos e 08 (oito) meses de reclusão, sanção para a qual a prescrição ocorre em 12 (doze) anos, nos termos do art. 109, III, do Código Penal. Reduzido pela metade, tem-se o prazo de 06 (seis) anos para o fenecimento da pretensão punitiva estatal, efetivamente transcorrido entre a data do recebimento da denúncia (01.07.2013) e a da publicação da sentença condenatória (26.11.2019).

Por conseguinte, DECLARA-SE EXTINTA A PUNIBILIDADE DE HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, com fundamento no art. 107, IV, combinado com os arts. 109, III, e 115, todos do Código Penal. Quanto a JOSÉ CLÁUDIO VIEIRA e IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO, também não são mencionados como responsáveis pela administração dos recursos da FAAFOP e sequer assinaram a prestação de contas parcial. Subscreveram, é verdade, cheques em branco, mas tal circunstância, por si só, não é suficiente para caracterizar a prática do crime de estelionato, que exige, entre outros elementos, o emprego deliberado de fraude. Em sentido oposto, aliás, HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, JOSÉ CLÁUDIO VIEIRA e IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO foram uníssonos em afirmar que os cheques eram assinados a pedido de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, que, quando interrogado, fornecia justificativas genéricas, como pagamento de despesas com pessoal.

Por conseguinte, a absolvição de JOSÉ CLÁUDIO VIEIRA e IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO é medida impositiva, com fundamento no art. 386, V, do Código de Processo Penal.

Posto isso, deve ser rejeitado o pedido subsidiário de reconhecimento da participação de menor importância formulado pela defesa de GLEUBER SIDNEI CASTELÃO.

Com efeito, como o próprio réu (embora no intuito de esquivar-se da imputação delitiva) salientou tanto em Delegacia de Polícia quanto em juízo, sua assinatura era imprescindível na prestação de contas parcial apresentada pela FAAFOP ao INCRA, e, como já analisado exaustivamente acima, na condição de técnico contábil que inclusive participou de reunião com o INCRA, integrava o corpo administrativo de associação análoga (Associação dos Amigos de Teodoro Sampaio) e participava de pagamentos e emissão de recibos, é evidente que seu papel na empreitada delitiva foi fundamental para o êxito da fraude perpetrada.

Passa-se, por conseguinte, à análise das penas fixadas.

 

DOSIMETRIA DA PENA

O cálculo da pena deve atentar aos critérios dispostos no artigo 68 do Código Penal, de modo que, na primeira etapa da dosimetria, observando as diretrizes do artigo 59 do Código Penal, o magistrado deve atentar à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, e estabelecer a quantidade de pena aplicável, dentro de uma discricionariedade juridicamente vinculada, a partir de uma análise individualizada e simultânea de todas as circunstâncias judiciais.

Na segunda fase de fixação da pena, o juiz deve considerar as agravantes e atenuantes, previstas nos artigos 61 a 66, todos do Código Penal.

Finalmente, na terceira etapa, incidem as causas de diminuição e de aumento da pena.

No presente caso, o r. juízo singular fixou a sanção de todos os réus nos seguintes termos:

Atentando para as circunstâncias judiciais do artigo 59, do Código Penal, como bem ressaltou o Ministério Público Federal, embora sejam os acusados primários e de bons antecedentes, a pena base deve ser fixada acima do mínimo legal. Isso em razão da elevada quantia obtida mediante fraude, reduzindo recursos públicos preciosos, destinados ao desenvolvimento de política pública relevante ligada à área da reforma agrária, o que contribui para o agravamento dos conflitos no campo, principalmente na região do Pontal do Paranapanema.

Nesse passo, considerando as circunstâncias judiciais desfavoráveis aos réus, fixo a pena base prevista no artigo 171, em 2 anos e 6 meses de reclusão para cada réu.

Tendo em vista a causa de aumento de pena prevista no § 3º, do artigo 171, do Código penal, a pena -base deve ser amentada de 1/3, perfazendo 3 anos e 4 meses de reclusão, que torno definitiva, na ausência de circunstâncias agravantes e atenuantes ou outras causas de aumento e diminuição, a ser cumprida no regime aberto, desde o início.

Substituo a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos para cada réu, sendo a primeira consistente na entrega mensal de cestas básicas à instituição de caridade, pelo tempo de duração da pena privativa de liberdade e a segunda, na prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo tempo, a ser definida pelo Juízo das Execuções Penais.

Condeno os réus no pagamento de 33 dias multa, fixado o valor do dia-multa em 1/30 do salário mínimo vigente na data do fato (Id 163020299 – fls. 62/63).

 

Pena-Base

Na etapa inicial do dimensionamento, a pena dos réus foi estipulada em 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão, em razão da valoração desfavorável das circunstâncias do crime.

Postula o órgão de acusação a exasperação da pena-base, para que seja fixada em pelo menos 03 (três) anos de reclusão, dada “a gravidade do ato praticado, que prejudica importante programa social de reforma agrária, destinado aos trabalhadores rurais assentados, o que compromete toda a política pública prevista” e considerando o montante de R$ 1.373.598,28 (um milhão, trezentos e setenta e três mil e quinhentos e noventa e oito reais e vinte e oito centavos) que teria sido desviado.

O pedido não merece guarida.

Isso porque, embora as circunstâncias do crime de fato mereçam avaliação negativa, já que, como bem pontuou o magistrado singular, a fraude foi perpetrada em larga escala, com desvio de recursos destinados a políticas públicas a serem implementadas em área de reforma agrária, em prejuízo dos assentados que residiam na região, a pena inicial já foi estabelecida em 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão acima do mínimo legal, montante que se afigura adequado à gravidade concreta do caso, ainda mais quando considerado que parte dos recursos transferidos pelo INCRA à FAAPOP realmente foram empregados nos assentamentos a que se destinavam, conforme a prova oral produzida em Delegacia de Polícia e sob o crivo do contraditório, de maneira que o valor total do dano causado é inferior ao total do convênio e seus aditivos – R$ 1.373.598,28 (um milhão, trezentos e setenta e três mil e quinhentos e noventa e oito reais e vinte e oito centavos).

Devem ser rejeitados, por outro lado, os pedidos de redução da pena-base formulados pelas defesas de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES e GLEUBER SIDNEI CASTELÃO. Com efeito, o primeiro presidia a federação utilizada para o desvio da verba pública e continuou no comando da entidade mesmo quando formalmente afastado, assim como solicitava aos demais que assinassem cheques em branco e era o responsável pela movimentação de valores da entidade. Quanto ao segundo, valeu-se de sua formação como técnico contábil para dar aparência de legitimidade à prestação de contas parcial apresentada ao INCRA e, mais do que isso, certamente possuía pleno conhecimento de todo o esquema criminoso, tanto é que chegou a participar da reunião em que o convênio foi assinado. Tudo, repise-se, no âmbito de fraude de larga escala perpetrada em detrimento direto de assentados e do desenvolvimento da região.

Mantém-se, portanto, a pena inicial em 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão. A pena de multa, por sua vez, fica proporcionalmente estabelecida em 25 (vinte e cinco) dias-multa.

 

Agravantes e Atenuantes

Na segunda fase da dosimetria, não foram reconhecidas agravantes ou atenuantes, motivo pelo qual a pena permanece no mesmo patamar.

 

Causas de Diminuição e de Aumento

Na fase final do cálculo, foi reconhecida a causa de aumento de pena prevista no art. 171, § 3º, do Código Penal, que determina o aumento na fração fixa de 1/3 (um terço), o que resulta na pena final de 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão. A pena de multa, por seu turno, fica mantida em 33 (trinta e três) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos.

 

Da Substituição da Pena Privativa de Liberdade

A pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas e entrega mensal de cestas básicas a instituições de caridade, cujos destinatários serão indicados pelo r. Juízo das Execuções Penais.

Argumenta o Ministério Público Federal que a pena substitutiva de entrega mensal de cestas básicas a instituições de caridade constitui, em verdade, a de prestação pecuniária, cujo valor requer seja fixado em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais).

A defesa do réu JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, por outro lado, pretende que tal pena seja substituída por outra, ou que que o valor seja estipulado em “20% (vinte por cento) calculada sobre o salário mínimo da época dos fatos, na quantidade de 01 (um) pagamento a cada três meses, durante o período de substituição da pena”.

Como bem apontado pelo órgão de acusação, a entrega mensal de cestas básicas a instituições de caridade configura, na realidade, a sanção de prestação pecuniária prevista no art. 43 do Código Penal. E como estabelece o art. 45, § 1º, do mesmo diploma normativo, “a prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima, a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social, de importância fixada pelo juiz, não inferior a 1 (um) salário mínimo nem superior a 360 (trezentos e sessenta) salários mínimos”.

Dentro desse contexto, considerando sua finalidade de antecipar a reparação dos danos causados pelo crime, sua fixação deve estar atrelada ao valor do prejuízo causado, de modo que observe não somente a capacidade econômica do réu, mas também a gravidade do delito, atendendo, assim, às finalidades de prevenção e reprovação da conduta.

Posto isso, considerando-se, por um lado, a extensão dos danos causados, e, por outro, a ausência de informações acerca da situação financeira dos réus, deve ser fixado o valor da prestação pecuniária em 05 (cinco) salários mínimos. De resto, não demonstrou a defesa de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES a impossibilidade do réu de arcar com tal valor.

Dá-se, portanto, parcial provimento ao pedido formulado pelo Ministério Público Federal, e rejeita-se aquele veiculado pela defesa de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES.

 

Regime de Cumprimento da Pena Privativa de Liberdade

Mantém-se o regime aberto para início do cumprimento da pena privativa de liberdade, nos termos do art. 33, § 2º, “c”, do Código Penal.

 

Da Pena Definitiva

Ficam as penas privativas de liberdade de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES e GLEUBER SIDNEI CASTELÃO mantidas em 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, a serem cumpridas inicialmente em regime ABERTO, porém substituídas por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas e prestação pecuniária, no valor de 05 (cinco) salários mínimos, cujos destinatários serão indicados pelo r. Juízo das Execuções Penais, e pagamento de 33 (trinta e três) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos.

Posto isso, a pena de multa encontra previsão no preceito secundário do art. 171 do Código Penal e, nos termos do art. 49 do diploma repressivo, deve ser fixada entre 10 (dez) e 360 (trezentos e sessenta) dias-multa. No caso em apreço, ademais, foi observada a proporcionalidade com a pena privativa de liberdade.

Rejeita-se, assim, os pedidos de afastamento da pena de multa ou que seja fixada em apenas 01 (um) dia-multa, formulados pela defesa de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, uma vez que não possuem respaldo legal.

 

GRATUIDADE DA JUSTIÇA

Em suas razões de Apelação, a defesa de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES requer a concessão dos benefícios da Assistência Judiciária Gratuita.

Consigno que a condenação ao pagamento das custas processuais decorre do comando normativo inserto no artigo 804 do CPP, sendo devida mesmo ao acusado que seja beneficiário da Assistência Judiciária Gratuita.

No caso concreto, ao que tudo indica, o réu faz jus ao benefício da gratuidade de justiça, já que existem nos autos indícios de que não possuiria, de fato, rendimentos bastantes para arcar com o pagamento dos consectários da sucumbência, já que não foram coletadas informações sobre sua situação financeira.

Posto isso, deve ser adotado o entendimento jurisprudencial no sentido de que a eventual impossibilidade de adimplemento das custas processuais deve ser requerida no Juízo da Execução Criminal (Ap. 0000051-59.2013.8.18.0040, 2ª C. Esp. Crim, Rel. Joaquim Dias de Santana Filho, Julg. 27.04.2015, v.u.), de modo que nada impede que, oportunamente, o Juízo das Execuções Criminais, observando a insuficiência de recursos do apenado, proceda à suspensão da exigibilidade das custas processuais, pelo período máximo de cinco anos ou enquanto sua situação financeira não lhe permitir arcar com este pagamento. Nesse sentido, há precedente do Superior Tribunal de Justiça: (AgInt no REsp 1637275/RJ, Min. Maria Thereza de Assis Moura, Julgado em 06 de dezembro de 2016).

 

DO PEDIDO DE FIXAÇÃO DE VALOR MÍNIMO PARA REPARAÇÃO DOS DANOS CAUSADOS PELA INFRAÇÃO (ART. 387, IV, CPP)

Pleiteia o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL a fixação de indenização para reparação do dano suportado, sob o pálio do disposto no art. 387, IV, do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei nº 11.719, de 20 de junho de 2008 (O juiz, ao proferir sentença condenatória: (...) IV - fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido).

Com efeito, não se desconhece a existência de posicionamento jurisprudencial e doutrinário no sentido de que a aplicação do artigo mencionado exige (a) o cometimento de um crime após a entrada em vigor da Lei nº 11.719, de 20 de junho de 2008; (b) a existência de pedido expresso do Ministério Público na denúncia ou nas alegações para fixação do valor mínimo do dano causado pela infração; e (c) a indicação dos valores e a existência de provas suficientes a fundamentar o pedido de condenação na reparação dos danos.

Todavia, cumpre consignar que a exigência de indenização do dano causado pelo crime não constitui inovação da Lei nº 11.719/2008, o que poderia respaldar o posicionamento acima referido. Trata-se, na verdade, de efeito da condenação previsto no art. 91, I, do Código Penal, com a redação dada pela Lei nº 7.209, de 11 de julho de 1984, segundo o qual são efeitos da condenação: I - tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime, efeito este automático da sentença penal condenatória, cuja eficácia prescinde, inclusive, de pronunciamento judicial expresso do magistrado nesse sentido.

Ressalte-se, também, a desnecessidade de haver pedido expresso do Órgão Acusatório para a fixação do valor mínimo da reparação do dano causado pelo crime. Conforme já dito acima, a disposição prevista no art. 91, I, do Código Penal, constitui efeito automático da sentença condenatória. Ademais, não há que se falar em violação às garantias do contraditório e da ampla defesa, pois o valor a ser imposto é extraído da exordial acusatória, bem como da instrução processual, cabendo destacar que, diante da existência de norma expressa no Código Penal, o réu não pode alegar desconhecimento de que, em caso de condenação, restará assentada a certeza da obrigação de indenização pelo dano do crime.

Desse modo, a fixação do valor mínimo a título de reparação na sentença condenatória, ainda que não haja pedido expresso da acusação, não implica em desrespeito às garantias do devido processo legal.

Por seu turno, a atual redação do art. 387, IV, do Código de Processo Penal, conforme consignado pela Lei nº 11.719/2008, apenas visa operacionalizar a regra de direito penal no âmbito processual. Além disso, tratando-se de norma de cunho processual, tem aplicação imediata aos processos em tramitação, a teor do disposto no art. 2º do Código de Processo Penal. Nesse sentido:

PENAL. APELAÇÕES CRIMINAIS DA ACUSAÇÃO E DA DEFESA. DESCAMINHO/CONTRABANDO DE CIGARROS (...) PEDIDO DE CONDENAÇÃO DOS RÉUS AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO AO ERÁRIO. (...) 27. Pedido de condenação dos réus ao pagamento de indenização ao erário: nosso ordenamento, antes mesmo da alteração que adveio com a Lei nº 11.719/08, previa que a sentença penal condenatória tornava certa, além da responsabilização criminal, também a responsabilização civil, conforme dispõe o art. 91, inc. I do CP, sendo certo que a novel lei apenas veio a trazer comando no sentido de que a sentença condenatória seja minimamente líquida. Não há necessidade de que o pedido seja expresso na denúncia ou reiterado em memoriais, já que a pretensão acusatória abrange igualmente a condenação de quantia líquida, em seu grau mínimo, em função do ato ilícito praticado. (...) (TRF3, ACR 00014361320114036006; 1ª Turma; Rel. Des. Fed. Hélio Nogueira; e-DJF3 Judicial 1 DATA:12/07/2016).

 

No contexto apresentado, reconhece-se a possibilidade de fixação de obrigação de ressarcimento indenizatório, passando-se à análise sobre a existência de parâmetros que permitam aferir tal valor na presente ação penal.

Quanto a este ponto, assim argumentou o Ministério Público Federal em suas razões recursais:

Do mesmo modo, conquanto este órgão de Acusação não a tenha requerido na denúncia o ressarcimento do dano ocasionado, a Jurisprudência entende que se trata de pedido implícito, decorrente da própria lei, devendo o Magistrado fixa-lo, desde que presente a liquidez do montante devido a título de reparação do dano.

É o que dispõe o artigo 387, inciso IV, com redação dada pela Lei no 11.719/08, abaixo reproduzido:

(...)

Neste aspecto, consta expressamente da inicial acusatória que a vantagem ilícita obtida foi de R$ 1.373.598,28 (um milhão e trezentos e setenta e três mil e quinhentos e noventa e oito reais e vinte e oito centavos), devendo ser estipulado este valor, devidamente corrigido, como valor mínimo de reparação ao Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT, fundo este destinado ao custeio do programa do seguro-desemprego, corrigindo-se a omissão (Id 163020300 – fls. 08/10)

 

Entretanto, ao contrário do sustentado pelo órgão de acusação, o dano causado pela fraude perpetrada pelos réus JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES e GLEUBER SIDNEI CASTELÃO não alcança o montante de R$ 1.373.598,28 (um milhão, trezentos e setenta e três mil e quinhentos e noventa e oito reais e vinte e oito centavos), uma vez que tal valor representa o total transferido pelo INCRA à FAAFOP por meio do convênio n° 19000/2007 e seus aditivos, sem considerar que, como demonstrado por ocasião da análise da materialidade delitiva, parte dessa quantia realmente foi empregada de acordo com as finalidades previstas naquele instrumento, como demonstrou a prova oral produzida em ambas as etapas da persecução penal.

Além disso, tanto o Relatório elaborado pela Controladoria-Geral da União quanto a Informação Técnica produzida pela Procuradoria da República em Presidente Prudente/SP limitaram-se a apontar valores cuja destinação, conforme a prestação de contas parcial apresentada pela FAAFOP, não teria sido demonstrada, o que não equivale, por si só, à comprovação de malversação de valores específicos. Ambas as análises, aliás, foram somente documentais, e embora tenham subsidiado de maneira valiosa a aferição da materialidade delitiva, não permitem, justamente pela ausência de outros elementos, tais como constatações in loco ou o confronto com as declarações dos beneficiários listados na prestação de contas parcial, a determinação precisa das quantias desviadas.

Ademais, a fixação do valor mínimo equivale a obrigação civil de natureza solidária, mas não foi possível delimitar o lucro ilícito auferido por cada réu na ação criminosa.

De tal modo, não tendo sido produzidas provas nos autos que pudessem aferir o prejuízo causado ao erário, entende-se ser temerária a estipulação de valor mínimo, tendo em vista que é possível que os recursos desviados tenham sido distribuídos entre os réus de forma desigual, de acordo com a participação de cada um no esquema criminoso, o que poderia resultar na atribuição de obrigação civil sem o correspondente nexo de causalidade.

Por essa razão, a reparação de danos no presente caso deverá ser buscada por meio de ação própria, ajuizada perante o Juízo competente, na qual poderá ser realizada a liquidação do dano causado à autarquia federal.

Diante de todo o exposto, indefere-se o pedido formulado pelo Ministério Público Federal.

 

CONCLUSÃO

Ante o exposto, voto por DECLARAR, DE OFÍCIO, EXTINTA A PUNIBILIDADE DE HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, com fundamento no art. 107, IV, combinado com os arts. 109, III, e 115, todos do Código Penal, de modo a considerar prejudicada a Apelação por ela veiculada, DAR PROVIMENTO aos recursos interpostos por IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO e JOSÉ CLAUDIO VIEIRA, para absolvê-los da prática do crime previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal, com fundamento no art. 386, V, do Código de Processo Penal, DAR PARCIAL PROVIMENTO aos recursos interpostos pelo Ministério Público Federal e por JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES e por NEGAR PROVIMENTO àquele manejado  por GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, para manter a condenação dos dois últimos pela prática do crime previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal, cada qual à pena privativa de liberdade de 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, a serem cumpridas inicialmente em regime ABERTO, porém substituídas por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas e prestação pecuniária, no valor de 05 (cinco) salários mínimos, cujos destinatários serão indicados pelo r. Juízo das Execuções Penais, e pagamento de 33 (trinta e três) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, bem como, enfim, conceder a JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES os benefícios da Justiça Gratuita

Comunique-se o r. Juízo das Execuções Penais.

É o voto.



E M E N T A

 

PENAL. PROCESSUAL PENAL. CRIME DE ESTELIONATO MAJORADO. ART. 171, § 3º, DO CÓDIGO PENAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA. INSURGIMENTOS DO ÓRGÃO DE ACUSAÇÃO E DOS RÉUS. PLEITOS ABSOLUTÓRIOS. MATERIALIDADE DELITIVA COMPROVADA. AUTORIA, ENTRETANTO, DEMONSTRADA SOMENTE EM RELAÇÃO A DOIS DOS CINCO RÉUS. PLEITO SUBSIDIÁRIO DE RECONHECIMENTO DA PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA REJEITADO. DOSIMETRIA DA PENA. PRIMEIRA FASE. VALORAÇÃO DESFAVORÁVEL DAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME E CORRESPONDENTE MONTANTE DA EXASPERAÇÃO DA SANÇÃO MANTIDOS. PENA SUBSTITUTIVA DE FORNECIMENTO DE CESTAS BÁSICAS IMPOSTA PELO JUÍZO SINGULAR QUE CONSTITUI, EM VERDADE, A DE PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. VALOR FIXADO EM CINCO SALÁRIOS MÍNIMOS. PENA DE MULTA MANTIDA. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE INDIQUEM A POSSIBILIDADE DE ARCAR COM AS CUSTAS PROCESSUAIS. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE PERMITAM A FIXAÇÃO DE VALOR MÍNIMO PARA A REPARAÇÃO DOS DANOS CAUSADOS. RECONHECIMENTO, DE OFÍCIO, DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL QUANTO A UMA DAS RÉS. PREJUDICADA A ANÁLISE DO RESPECTIVO INCONFORMISMO. APELAÇÕES INTERPOSTAS POR DOIS DOS CINCO RÉUS PROVIDAS, PROVIDAS EM PARTE A MANEJADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL E A INTERPOSTA POR UM DOS RÉUS E DESPROVIDA A VEICULADA PELO RÉU REMANESCENTE.

- O Ministério Público Federal ofereceu denúncia em face de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, JOSÉ CLAUDIO VIEIRA, IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO e PEDRO APARECIDO TRAVA MUNHOZ (réu este com relação a quem o processo foi desmembrado) pela prática do crime previsto no  art. 171, § 3º, do Código Penal, uma vez que teriam obtido vantagem ilícita consistente no recebimento de R$ 1.373.598,28 (um milhão, trezentos e setenta e três mil e quinhentos e noventa e oito reais e vinte e oito centavos) em prejuízo do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA, para o que, mediante meio fraudulento, induziram a erro os responsáveis pela liberação do valor à Federação das Associações de Assentados e Agricultores Familiares do Oeste Paulista – FAAFOP (que os réus integravam em posições essenciais), situada no Município de Mirante do Paranapanema/SP, valor este obtido através do convênio INCRA/CRT/SP n° 19000/2007 – cujo objetivo declarado era fomentar a produção de oleaginosas nos assentamentos do Estado de São Paulo no âmbito do Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel do Governo Federal, diversificar a produção, contribuir para o aumento da biodiversidade e aumentar a renda das famílias – e seus aditivos.

- A materialidade do crime de estelionato majorado encontra-se demonstrada principalmente por cópias do convênio firmado entre a FAAFOP e o INCRA, seus aditivos e documentos correlatos, Informação Técnica elaborada pela Procuradoria da República no Município de Presidente Prudente/SP, Relatório de Demandas Especiais elaborado pela Controladoria-Geral da União e pela prova oral coligida ao processo, que demonstra, também, a autoria delitiva de dois dos cinco réus que figuraram nesta relação processual.

- Com efeito, entre as irregularidades encontradas, podem ser destacadas justificativas para a formalização do convênio e seus aditivos  “elaboradas em termos vagos, sem a indicação de fatos e ou situações concretas e mensuráveis, fundamentais e imprescindíveis para as análises, decisões, acompanhamento e controle do Órgão concedente”; situações em que não foram fornecidas quaisquer cópias de comprovantes dos gastos relacionados na prestação de contas apresentada pela FAAFOP ao INCRA (aproximadamente metade do total), prestação de contas esta que abarcou pouco mais de quatro meses do período de um ano de vigência inicial do convênio, sem que qualquer outra demonstração de gastos tenha sido fornecida posteriormente; diversas ocorrências em que foram apresentadas cópias de recibos sem número, assim como casos de pagamento antecipado pelos serviços e contratações sem licitação; notas fiscais com datas de emissão posteriores às dos supostos pagamentos em até 248 dias; desproporção entre o valor supostamente aplicado no período da prestação de contas parcial e aquele remanescente (em 74 dias, o que representa pouco mais de 20% do período inicial de vigência de um ano, teriam sido gastos R$ 434.465,52 do total de R$ 622.400,00 inicialmente alocados, ou seja, 70%); 77% dos cheques foram liquidados no caixa, de modo a permitir saques em dinheiro e movimentações sem identificação do favorecido ou preposto; e discrepâncias entre as pessoas apontadas em cheques como favorecidas e aquelas informadas nas relações de credores.

- Embora parte das pessoas relacionadas na prestação de contas parcial apresentada pela FAAFOP ao INCRA tenha confirmado o recebimento de recursos da federação, outras testemunhas, tanto na fase inquisitiva da persecução penal quanto em juízo, negaram o recebimento de qualquer valor, elemento que, aliado à extensão e gravidade das irregularidades constatadas, demonstra a materialidade do crime de estelionato majorado.

- Quanto à autoria delitiva, JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES integrou a Presidência da FAAFOP desde sua fundação e era o responsável pela movimentação de valores da entidade, assinou cheques em branco e pediu que outros membros do corpo administrativo também o fizessem e inclusive participava de reuniões realizadas com o então Superintendente Regional do INCRA, motivo pelo qual é inconcebível que, como sustentou, tenha agido sem conhecimento das irregularidades. Além disso, as provas produzidas no curso da persecução penal demonstram que permaneceu no comando da entidade mesmo quando esteve formalmente afastado em razão do exercício de atividade política.

- GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, por sua vez, na condição de técnico contábil, assinou a prestação de contas parcial apresentada pela FAAFOP e participou dos pagamentos realizados, bem como também esteve presente em reunião realizada em Brasília na qual o convênio foi discutido, razões pelas quais não prospera sua versão dos fatos de que assinou o mencionado documento sem ter ciência de que não correspondia integralmente à verdade.

- Deve ser reconhecida, de ofício, a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal com relação a HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, uma vez que, mesmo considerada a pena máxima em abstrato cominada ao delito (em razão do inconformismo quanto ao montante da pena veiculado pelo órgão de acusação), entre o recebimento da denúncia e a publicação da sentença condenatória (ocasião na qual a ré já tinha mais de setenta anos de idade), transcorreu lapso suficiente para tanto.

- Quanto a JOSÉ CLAUDIO VIEIRA e IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO, embora tenham participado do corpo administrativo da FAAFOP e confessado que assinaram cheques em branco, a prova oral indica que pouco participavam da efetiva gestão da entidade e seguiam as orientações fornecidas por JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES, que lhes solicitava que assinassem os cheques e assegurava que os valores estavam sendo corretamente empregados, motivo pelo qual devem ser absolvidos, com fundamento no art. 386, V, do Código de Processo Penal.

- Afigura-se adequado o incremento da pena em 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão realizado pelo magistrado singular em razão da valoração desfavorável das circunstâncias do crime, já que a fraude foi perpetrada em larga escala, com desvio de recursos destinados a políticas públicas a serem implementadas em área de reforma agrária, em prejuízo dos assentados que residiam na região.

- Como bem apontado pelo órgão de acusação em suas razões recursais, a entrega mensal de cestas básicas a instituições de caridade estabelecida em substituição à pena privativa de liberdade configura, na realidade, a sanção de prestação pecuniária prevista no art. 43 do Código Penal. Posto isso, considerando-se, por um lado, a extensão dos danos causados, e, por outro, a ausência de informações acerca da situação financeira dos réus, deve ser fixado o valor da prestação pecuniária em 05 (cinco) salários mínimos.

- A pena de multa encontra previsão no preceito secundário do art. 171 do Código Penal e, nos termos do art. 49 do diploma repressivo, deve ser fixada entre 10 (dez) e 360 (trezentos e sessenta) dias-multa. No caso em apreço, ademais, foi observada a proporcionalidade com a pena privativa de liberdade, razão pela qual não há como acolher os pleitos de afastamento da pena de multa ou que seja fixada em apenas 01 (um) dia-multa, formulados pela defesa de JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES.

- A condenação ao pagamento das custas processuais decorre do comando normativo inserto no artigo 804 do CPP, sendo devida mesmo ao acusado que seja beneficiário da Assistência Judiciária Gratuita. No caso concreto, ao que tudo indica, JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES faz jus ao benefício da gratuidade de justiça, já que existem nos autos indícios de que não possuiria, de fato, rendimentos bastantes para arcar com o pagamento dos consectários da sucumbência, já que não foram coletadas informações sobre sua situação financeira. Posto isso, deve ser adotado o entendimento jurisprudencial no sentido de que a eventual impossibilidade de adimplemento das custas processuais deve ser requerida no Juízo da Execução Criminal (Ap. 0000051-59.2013.8.18.0040, 2ª C. Esp. Crim, Rel. Joaquim Dias de Santana Filho, Julg. 27.04.2015, v.u.), de modo que nada impede que, oportunamente, o Juízo das Execuções Criminais, observando a insuficiência de recursos do apenado, proceda à suspensão da exigibilidade das custas processuais, pelo período máximo de cinco anos ou enquanto sua situação financeira não lhe permitir arcar com este pagamento. Nesse sentido, há precedente do Superior Tribunal de Justiça: (AgInt no REsp 1637275/RJ, Min. Maria Thereza de Assis Moura, Julgado em 06 de dezembro de 2016).

- Ao contrário do sustentado pelo órgão de acusação, o dano causado pela fraude perpetrada pelos réus JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES e GLEUBER SIDNEI CASTELÃO não alcança o montante de R$ 1.373.598,28 (um milhão, trezentos e setenta e três mil e quinhentos e noventa e oito reais e vinte e oito centavos), uma vez que tal valor representa o total transferido pelo INCRA à FAAFOP por meio do convênio n° 19000/2007 e seus aditivos, sem considerar que, como demonstrado por ocasião da análise da materialidade delitiva, parte dessa quantia realmente foi empregada de acordo com as finalidades previstas naquele instrumento, como demonstrou a prova oral produzida em ambas as etapas da persecução penal. Além disso, tanto o Relatório elaborado pela Controladoria-Geral da União quanto a Informação Técnica produzida pela Procuradoria da República em Presidente Prudente/SP limitaram-se a apontar valores cuja destinação, conforme a prestação de contas parcial apresentada pela FAAFOP, não teria sido demonstrada, o que não equivale, por si só, à comprovação de malversação de valores específicos. Ambas as análises, aliás, foram somente documentais, e embora tenham subsidiado de maneira valiosa a aferição da materialidade delitiva, não permitem, justamente pela ausência de outros elementos, tais como constatações in loco ou o confronto com as declarações dos beneficiários listados na prestação de contas parcial, a determinação precisa das quantias desviadas. Por essa razão, a reparação de danos no presente caso deverá ser buscada por meio de ação própria, ajuizada perante o Juízo competente, na qual poderá ser realizada a liquidação do dano causado à autarquia federal.

- Reconhecida, de ofício, a extinção da punibilidade de HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, com fundamento no art. 107, IV, combinado com os arts. 109, III, e 115, todos do Código Penal, de modo a considerar prejudicada a Apelação por ela veiculada; Apelações interpostas por IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO e JOSÉ CLAUDIO VIEIRA providas, para absolvê-los da prática do crime previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal, com fundamento no art. 386, V, do Código de Processo Penal; parcialmente provida a interposta pelo Ministério Público Federal e a veiculada por JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES e desprovida a interposta por GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, para manter a condenação dos dois últimos pela prática do crime previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal, cada qual à pena privativa de liberdade de 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, a serem cumpridas inicialmente em regime ABERTO, porém substituídas por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas e prestação pecuniária, no valor de 05 (cinco) salários mínimos, cujos destinatários serão indicados pelo r. Juízo das Execuções Penais, e pagamento de 33 (trinta e três) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, bem como, enfim, conceder a JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES os benefícios da Justiça Gratuita.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, REVISÃO RATIFICADA PELO DES. FED. HÉLIO NOGUEIRA. A Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu, DECLARAR, DE OFÍCIO, EXTINTA A PUNIBILIDADE DE HILDA PEREIRA DOS SANTOS AUGUSTO, com fundamento no art. 107, IV, combinado com os arts. 109, III, e 115, todos do Código Penal, de modo a considerar prejudicada a Apelação por ela veiculada, DAR PROVIMENTO aos recursos interpostos por IZABEL CRISTINA DAS NEVES RIBEIRO e JOSÉ CLAUDIO VIEIRA, para absolvê-los da prática do crime previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal, com fundamento no art. 386, V, do Código de Processo Penal, DAR PARCIAL PROVIMENTO aos recursos interpostos pelo Ministério Público Federal e por JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES e por NEGAR PROVIMENTO àquele manejado por GLEUBER SIDNEI CASTELÃO, para manter a condenação dos dois últimos pela prática do crime previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal, cada qual à pena privativa de liberdade de 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, a serem cumpridas inicialmente em regime ABERTO, porém substituídas por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas e prestação pecuniária, no valor de 05 (cinco) salários mínimos, cujos destinatários serão indicados pelo r. Juízo das Execuções Penais, e pagamento de 33 (trinta e três) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, bem como, enfim, conceder a JOSÉ EDUARDO GOMES DE MORAES os benefícios da Justiça Gratuita, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.