APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5015446-97.2022.4.03.6100
RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR
APELANTE: PATRICK PIERRE
Advogado do(a) APELANTE: TIAGO DE SOUZA MUHARRAM - SP389379-A
APELADO: UNIÃO FEDERAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA UNIÃO DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5015446-97.2022.4.03.6100 RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR APELANTE: PATRICK PIERRE Advogados do(a) APELANTE: TIAGO DE SOUZA MUHARRAM - SP389379-A, WANDERSON FARIAS MORAIS - SP463647-A APELADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação em que PATRICK PIERRE se insurge em face da sentença que denegou a segurança por entender não existir abusividade ou ilegalidade na conduta da autoridade impetrada, resolvendo o mérito do mandamus, com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil. Na peça inicial (ID 263741778 e documentos anexos), com pedido de tutela de urgência, a impetrante, de nacionalidade haitiana, relata ter direito à dispensa de apresentação de certidão de inscrição consular e certidão de nascimento para o processamento de seu pedido de naturalização, pois impossível a obtenção dos documentos sem que isso lhe gere ônus excessivo. Fundamenta o seu direito nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, aduzindo que a Administração Pública não pode exigir documentos impossíveis de serem obtidos para a conclusão da análise de seu requerimento de naturalização, sob pena de abuso de poder. Aduz que a finalidade para a exigência de tais documentos, qual seja, a aferição da correta grafia do nome da impetrante e de seus genitores, é passível de ser atingida com o seu passaporte e o RNM (Registro Nacional Migratório). Aponta, assim, lesão a direito líquido e certo por autoridade pública em vista da ilegalidade da exigência em comento. Como tutela de urgência em caráter liminar, pleiteia o afastamento da obrigatoriedade de apresentação das certidões de inscrição consular e de nascimento haitianas e, ao final, que seja confirmada a tutela, concedendo-se em definitivo a segurança. Valor da causa fixado em R$ 1.000,00 (mil reais). O pedido liminar foi indeferido (ID 263741937). A UNIÃO pleiteou o seu ingresso no feito (ID 263741954), o que foi deferido (ID 263741963). A autoridade impetrada prestou informações em ID 263741955. Em suma, informou que consta pedido de naturalização sob o protocolo nº 235881.0158434/2022, em nome do autor da ação, o qual encontra-se com o andamento: "Fase do processo: complementar informações que compete ao cidadão, anexar os documentos solicitados pela unidade policial”. Informou também que os pedidos de naturalização devem ser instruídos com os documentos previstos nos Anexos I, II, III e IV da Portaria nº 623, de 13 de novembro de 2020. A parte autora juntou comprovante de interposição de agravo de instrumento (ID 263741960) - e cópia do referido recurso - em face da decisão de indeferimento da medida liminar. O Ministério Público Federal requereu o regular processamento do feito (ID 263741964). A decisão agravada foi mantida (ID 263741966). Sobreveio sentença (ID 264542649) que denegou a segurança pleiteada, com fulcro no artigo 487, I, do Código de Processo Civil. Assentou o magistrado de piso não vislumbrar abuso ou ilegalidade na exigência imposta pela autoridade impetrada, entendendo que esta agiu amparada expressamente na lei. Aduziu que impor à autoridade de migração descumprir a lei vigente, sob a alegação de dificuldades financeiras ou burocráticas de repartição consular, implica em conferir tratamento desigual entre os estrangeiros e indiretamente atenta contra a soberania nacional, pois o Brasil deixaria de cumprir dispositivo legal por ação indireta de procedimento burocrático de outro país. Sem condenação em honorários advocatícios e custas pelo impetrante. A UNIÃO manifestou ciência da sentença (ID 263741981). O autor insurgiu-se em recurso de apelação (ID 263741983). Aduz que a sentença prolatada mantém a violação ao seu direito líquido e certo de ter processado o seu pedido de naturalização a despeito da ausência de apresentação das certidões consular e de nascimento haitianas. Reitera a desnecessidade de tais documentos, aduzindo que a finalidade a qual se propõem, qual seja, conferir a correta grafia de seu nome e de seus genitores, é passível de ser feita mediante outros documentos oficiais - e emitidos pelas autoridades brasileiras - de que dispõe. Argumenta que com a publicação da nova Lei de Migração (Lei nº 13.446/2017), em substituição ao Estatuto do Estrangeiro (Lei nº 6.815/1980), não mais subsiste a discricionariedade do Estado na concessão de naturalização ordinária àqueles que preenchem os requisitos previstos na lei, traduzindo-se, assim, em direito público subjetivo. Sustenta também que a fundamentação legal utilizada na sentença não guarda relação com o pedido do Apelante, eis que o art. 45 da Lei de Migração trata das hipóteses de impedimento de ingresso no território nacional, ato este que é discricionário, mas que distingue-se da situação em cotejo, dado que o apelante já reside no território nacional há quase 10 (dez) anos, estando devidamente registrado e documentado perante a autoridade competente para registro de imigrantes no Brasil. Destaca também que o apelante é detentor de autorização de residência com base em acolhida humanitária (Portaria Interministerial nº 10/2018), tendo em vista o reconhecimento pelo Governo brasileiro do grave quadro de violações de direitos humanos que o Haiti experiencia. Reitera que o apelante possui documentos oficiais aptos a comprovar a correta grafia de seu nome e do nome de seus genitores, em conformidade, pois, com o inciso I do art. 6º da Portaria Interministerial nº 10/2018. Aduz ainda que o Decreto nº 9.199/2017, que regulamenta a Lei de Migração, apenas exige do imigrante a apresentação da CRNM, conforme disposto em seu art. 234, I, e que a Portaria Interministerial nº 623/2020, ao tratar no “Anexo I” dos documentos a serem apresentados pelo interessado para o procedimento de naturalização ordinária, não contém previsão para apresentação dos documentos solicitados pelas autoridades impetradas. Conclui, assim, que a exigência de apresentação das certidões de nascimento e inscrição consular fere os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, além de não estar respaldada na lei. Aponta também julgados desta Corte em consonância com o pleito do autor. Pugna, assim, pelo provimento do recurso e reforma da sentença para conceder-se a dispensa das certidões de nascimento e inscrição consular para o devido processamento do pedido de naturalização do apelante. Contrarrazões de apelação em ID 263741990. O Ministério Público Federal, pela Procuradoria Regional da 3ª Região, opinou em Parecer (ID 264143123) pelo provimento da apelação. É o relatório.
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA UNIÃO DA 3ª REGIÃO
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5015446-97.2022.4.03.6100 RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR APELANTE: PATRICK PIERRE Advogados do(a) APELANTE: TIAGO DE SOUZA MUHARRAM - SP389379-A, WANDERSON FARIAS MORAIS - SP463647-A APELADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Trata-se de apelação do autor em face da sentença que denegou a segurança por entender que a autoridade impetrada agiu respaldada na lei quando exigiu do impetrante a apresentação da Certidão Consular e Certidão de Nascimento do país de origem para o processamento do pedido de naturalização ordinária protocolizado sob o nº 235881.0158434/2022. O mandado de segurança é ação constitucional, prevista no art. 5º, LXIX, da Constituição Federal, destinada a proteger direito líquido e certo, lesado ou sob ameaça de lesão, não amparado por habeas corpus ou habeas data, em casos de ilegalidade ou abuso de poder. O caso em apreço denota potencial violação ao direito de processamento do pedido de naturalização, de sorte que adequada a via eleita. Discute-se a legalidade da exigência de apresentação de certidões de inscrição consular e de nascimento haitianas - cuja obtenção o impetrante alega não lhe ser possível - para o processamento de pedido de naturalização ordinária. Conforme informações e documentos acostados, o impetrante é haitiano, adentrou o território nacional em 8/10/2018; obteve a expedição, em 10/08/2018, da Cédula de Identidade de Estrangeiro (ID 263741932), com validade até 23/07/2027, e em 6/01/2022 protocolou pedido de naturalização ordinária, cujo regular trâmite foi obstado ante a ausência de apresentação das Certidões Consular e de Nascimento de seu país de origem. O apelo comporta provimento. A Lei nº 13.445/2017 (Lei de Migração) regulamenta a situação dos migrantes no Brasil. Relativamente ao diploma normativo anterior (Lei nº 6.815/80 - Estatuto do Estrangeiro), inaugurou uma expressiva mudança de paradigma calcada no reforço da condição de sujeito de direitos dos migrantes, estabelecendo, inclusive, diretriz expressa no sentido de facilitar a regularização documental como pressuposto para o exercício de direitos. No que pertine à matéria em discussão, importante destacar os seguintes dispositivos da Lei de Migração (Lei nº 13.445/2017) e seu decreto regulamentador (Decreto nº 9.199/2017): Lei nº 13.445/2017: “Seção II Art. 64. A naturalização pode ser: I - ordinária; II - extraordinária; III - especial; ou IV - provisória. Art. 65. Será concedida a naturalização ordinária àquele que preencher as seguintes condições: I - ter capacidade civil, segundo a lei brasileira; II - ter residência em território nacional, pelo prazo mínimo de 4 (quatro) anos; III - comunicar-se em língua portuguesa, consideradas as condições do naturalizando; e IV - não possuir condenação penal ou estiver reabilitado, nos termos da lei. Decreto nº 9.199/2017 “Art. 2º Ao imigrante são garantidos os direitos previstos em lei, vedada a exigência de prova documental impossível ou descabida que dificulte ou impeça o exercício de seus direitos. (...) Art. 218. A naturalização, cuja concessão e de competência exclusiva do Ministério da Justiça e Segurança Pública, poderá ser: I - ordinária; II - extraordinária; III - especial; ou IV - provisória. (...) Art. 223. O naturalizando poderá requerer a tradução ou a adaptação de seu nome à língua portuguesa. Art. 224. O interessado que desejar ingressar com pedido de naturalização ordinária, extraordinária, provisória ou de transformação da naturalização provisória em definitiva deverá apresentar requerimento em unidade da Polícia Federal, dirigido ao Ministério da Justiça e Segurança Pública. (...) Art. 227. A Polícia Federal, ao processar o pedido de naturalização: I - coletará os dados biométricos do naturalizando; II - juntará as informações sobre os antecedentes criminais do naturalizando; III - relatará o requerimento de naturalização; IV - poderá apresentar outras informações que instruam a decisão quanto ao pedido de naturalização. Parágrafo único. Na hipótese de naturalização especial, a coleta dos dados biométricos prevista no inciso I do caput será realizada pelo Ministério das Relações Exteriores. Da naturalização ordinária Art. 233. No procedimento para a concessão de naturalização ordinária, deverão ser comprovados: I - capacidade civil, segundo a lei brasileira; II - residência no território nacional, pelo prazo mínimo de quatro anos; III - capacidade de se comunicar em língua portuguesa, consideradas as condições do naturalizando; e IV - inexistência de condenação penal ou comprovação de reabilitação, nos termos da legislação vigente. § 1º O prazo de residência no território nacional a que se refere o inciso II do caput deverá ser imediatamente anterior à apresentação do pedido. § 2º Na contagem do prazo previsto no inciso II do caput, as viagens esporádicas do naturalizando ao exterior cuja soma dos períodos de duração não ultrapassem o período de doze meses não impedirão o deferimento da naturalização ordinária. § 3º A posse ou a propriedade de bens no País não será prova suficiente do requisito estabelecido no inciso II do caput , hipótese em que deverá ser comprovada a residência efetiva no País. § 4º O Ministério da Justiça e Segurança Pública consultará bancos de dados oficiais para comprovar o prazo de residência de que trata o inciso II do caput . Art. 234. O pedido de naturalização ordinária se efetivará por meio da: I - apresentação da Carteira de Registro Nacional Migratório do naturalizando; II - comprovação de residência no territorio nacional pelo prazo mínimo requerido; III - demonstração do naturalizando de que se comunica em língua portuguesa, consideradas as suas condições; IV - apresentação de certidões de antecedentes criminais expedidas pelos Estados onde tenha residido nos últimos quatro anos e, se for o caso, de certidão de reabilitação; e V - apresentação de atestado de antecedentes criminais expedido pelo país de origem.” - grifei Há que se referir também ao que dispõe a Portaria Interministerial de n° 11 - Ministério da Justiça/Ministério Extraordinário da Segurança Pública, que disciplina, dentre outros temas, os procedimentos para a solicitação de naturalização, de igualdade de direitos, de perda, de reaquisição de nacionalidade brasileira e de revogação da decisão de perda da nacionalidade brasileira. No que concerne à regulamentação dos pedidos de naturalização ordinária, o Anexo I da Portaria aludida estabelece: ANEXO I O requerimento de naturalização ordinária deverá ser instruído com a seguinte documentação: Cotejando, portanto, a norma de regência do tema, impende concluir não haver determinação legal no sentido da exigência feita de apresentação de Certidões Consular e de Nascimento do país de origem do impetrante para a instrução do pedido de naturalização ordinária. Outrossim, afigura-se desarrazoada a exigência de tais documentos como únicos possíveis para o fim mencionado, qual seja, de conferência da correta grafia do nome do impetrante e da comprovação de sua filiação. No que concerne à conferência da correta grafia do nome, cumpre mencionar existir previsão expressa na Lei de Migração possibilitando ao naturalizando requerer a tradução ou a adaptação de seu nome à língua portuguesa, nos termos do art. 223 do Decreto nº 9.199/2017, dispositivo transcrito anteriormente, previsão esta que torna questionável a prescindibilidade da exigência em apreço. Ademais, o impetrante possui cédula de identidade de estrangeiro (RNE), documento nacional oficial este em que consta sua filiação. Portanto, além de não constar na norma como requisitos para a instrução do processo de naturalização ordinária a comprovação da filiação e da grafia do nome do solicitante, há que se aceitar que a finalidade referida é passível de ser atingida mediante outros documentos oficiais emitidos pelas autoridades nacionais. Nesta senda, menciono que a Cédula de Identidade de Estrangeiro, emitida pela República Federativa do Brasil em nome do apelante e trazida aos autos em ID 263741932 contém os dados em questão, a dizer, o nome do apelante e sua filiação. Tais dados constam também da certidão de nascimento de sua filha, também emitida pelo Estado brasileiro (ID 263741985). Ademais, a conferência da grafia do nome é possibilitada a partir do cotejo de seu passaporte haitiano, acostado em ID 263741781. Impende concluir, pois, que a exigência específica de apresentação das certidões Consular e de Nascimento carece de embasamento na norma, além de que a finalidade a que se propõem pode ser alcançada por outros meios igualmente idôneos. Dessarte, o ato que obstou o prosseguimento do pedido de naturalização brasileira em função da ausência de apresentação dos documentos aludidos revelou-se desproporcional e não amparado pela norma de regência da matéria. Impõe-se a reforma da sentença, concedendo-se a segurança a fim de se determinar à autoridade impetrada que afaste a exigência de apresentação da Certidão Consular e de Nascimento haitiana do impetrante para o fim de comprovar a grafia correta de seu nome e filiação, prosseguindo com o regular processamento do pedido de naturalização protocolizado sob o nº 235881.0158434/2022. Sem condenação em honorários advocatícios e custas ex lege. Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação interposta. É como voto.
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA UNIÃO DA 3ª REGIÃO
Das Condições da Naturalização
DOCUMENTOS A SEREM APRESENTADOS PELO INTERESSADO PARA O PROCEDIMENTO DE NATURALIZAÇÃO ORDINÁRIA
1. Formulário devidamente preenchido e assinado pelo requerente;
2. Declaração de interesse em traduzir ou adaptar o nome à língua portuguesa;
3. Cópia da Carteira de Registro Nacional Migratório e via original para conferência;
4. Comprovante de situação cadastral do CPF- Cadastro de Pessoas Físicas;
5. Certidão de antecedentes criminais emitida pela Justiça Federal e Estadual dos locais onde residiu nos últimos cinco anos;
6. Certidão de antecedentes criminais ou documento equivalente emitido pelos países onde residiu nos últimos quatro anos, legalizada e traduzida, no Brasil, por tradutor público juramentado, observada a Convenção sobre a eliminação da exigência de legalização de documentos públicos estrangeiros, promulgada pelo Decreto nº 8.660, de 29 de janeiro de 2016;
7. Comprovante de reabilitação, nos termos da legislação vigente, se for o caso;
8. Comprovante de residência, nos termos do art. 54 desta Portaria;
9. Cópia do passaporte, observadas as normas do Mercosul;
10. Certidão de casamento atualizada;
11. Documentos que comprovem união estável;
12. Certidão de nascimento do filho brasileiro; e
13. Certificado de Proficiência em Língua Portuguesa para Estrangeiros expedido pelo Ministério da Educação."
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. ESTRANGEIRO. NATURALIZAÇÃO ORDINÁRIA. EXIGÊNCIA DE DOCUMENTOS. IMPOSSIBILIDADE DE APRESENTAÇÃO. DESNECESSIDADE. RECURSO PROVIDO.
1. Trata-se de apelação do autor em face da sentença que denegou a segurança pleiteada para determinar à autoridade impetrada que afaste a exigência de apresentação da Certidão Consular e Certidão de Nascimento do impetrante, documentos exigidos para o fim de comprovar a correta grafia de seu nome e filiação no requerimento de naturalização ordinária.
2. Conforme informações e documentos acostados, o impetrante é haitiano, adentrou o território nacional em 8/10/2018; obteve a expedição, em 10/08/2018, da Cédula de Identidade de Estrangeiro com validade até 23/07/2027 e, em 6/01/2022, protocolou pedido de naturalização ordinária, cujo regular trâmite foi obstado ante a ausência de apresentação das certidões Consular e de Nascimento do país de origem do impetrante.
3. O caso em apreço denota potencial violação ao direito de regularização migratória, de sorte que adequada a via eleita.
4. A Lei nº 13.445/2017 (Lei de Migração) regulamenta a situação dos migrantes no Brasil. Relativamente ao diploma normativo anterior (Lei nº 6.815/80 - Estatuto do Estrangeiro), vislumbra-se uma mudança de paradigma calcada no reforço da condição de sujeito de direito dos migrantes, estabelecendo, inclusive, diretriz expressa no sentido de facilitar a regularização documental como pressuposto para o exercício de direitos.
5. Cotejando, portanto, a norma de regência do tema, impende concluir não haver determinação legal no sentido da exigência feita de apresentação de Certidões Consular e de Nascimento do país de origem do impetrante para a instrução do pedido de naturalização ordinária.
6. Outrossim, afigura-se desarrazoada a exigência de tais documentos como exclusivos para o fim mencionado de conferência da correta grafia do nome do impetrante e da comprovação de sua filiação.
7. No que concerne à conferência da correta grafia de seu nome, cumpre mencionar existir previsão expressa na Lei de Migração possibilitando ao naturalizando requerer a tradução ou a adaptação de seu nome à língua portuguesa, nos termos do art. 223 do Decreto nº 9.199/2017.
8. Portanto, além de não constar na norma como requisitos para a instrução do processo de naturalização ordinária a comprovação da filiação e da grafia do nome do solicitante, há que se aceitar que a finalidade referida é passível de ser atingida mediante outros documentos oficiais. Nesta senda, menciono que a Cédula de Identidade de Estrangeiro, emitida pela República Federativa do Brasil em nome do apelante e trazida aos autos contém os dados em questão, a dizer, o nome do apelante e sua filiação. Tais dados constam também da certidão de nascimento de sua filha, também emitida pelo Estado brasileiro. Ademais, a conferência da grafia do nome é possibilitada a partir do cotejo de seu passaporte haitiano, também juntado aos autos.
9. Impõe-se a reforma da sentença, concedendo-se a segurança a fim de se determinar à autoridade impetrada que afaste a exigência de apresentação da Certidão Consular e de Nascimento haitiana do impetrante para o fim de comprovar a grafia correta de seu nome e filiação, no requerimento de naturalização protocolizado sob o nº 235881.0158434/2022
10. Recurso de apelação a que se dá provimento.