Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5015390-07.2017.4.03.0000

RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS

AGRAVANTE: A & C TRANSPORTES, COMERCIO E REPRESENTACAO DE BOVINOS LTDA - EPP

Advogado do(a) AGRAVANTE: DIEGO GIULIANO DIAS DE BRITO - MS14400-A

AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5015390-07.2017.4.03.0000

RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS

AGRAVANTE: A & C TRANSPORTES, COMERCIO E REPRESENTACAO DE BOVINOS LTDA - EPP

Advogado do(a) AGRAVANTE: DIEGO GIULIANO DIAS DE BRITO - MS14400-A

AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de embargos de declaração opostos por A & C Transportes, Comércio e Representação de Bovinos Ltda. – Epp., em face do r. acórdão de ID 269878173, que, após prosseguir no julgamento, nos termos do artigo 942, do Código de Processo Civil, por maioria, acolheu os embargos de declaração, com efeitos infringentes, para dar provimento ao agravo interno da União Federal, assim ementado:

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CAUTELAR FISCAL. FORMAÇÃO DE GRUPO ECONÔMICO DE FATO, CONFUSÃO PATRIMONIAL E DESVIO DE FINALIDADE. OMISSÃO. EMBARGOS ACOLHIDOS COM EFEITOS INFRINGENTES. 

1- Assiste razão à parte embargante, porquanto o v. Acórdão embargado deixou de se manifestar quanto à formação de grupo econômico de fato e a constatação de confusão patrimonial e desvio de finalidade, matéria esta devidamente apreciada e fundamentada na decisão proferida pelo Juízo a quo.  

2- Neste contexto, entendo que há fortes indícios da participação da agravante no grupo econômico e o compartilhamento de sua sede social e frota de caminhões pelas demais empresas do grupo econômico, evidenciando a ocorrência de confusão patrimonial e desvio de finalidade, a ensejar o reconhecimento, em sede cautelar, da responsabilidade solidária do crédito tributário devido pelo grupo econômico FRIGOLOP. Ademais, o substantivo valor devido pelo grupo econômico justifica a concessão da liminar, ante o risco de esvaziamento patrimonial a obstar a satisfação da dívida tributária. 

3- Embargos de declaração acolhidos, com efeitos infringentes, para dar provimento ao agravo interno da União Federal.” (grifo no original)

 

A embargante aponta omissões e contradições no v. acórdão e requer seja: (i) “processado e submetido a aplicação e julgamento com ampliação do quórum da Colenda Turma, conferindo aplicação ao prosseguimento do julgamento não unânime, com a colheita de mais dois votos de Desembargadores convocados para compor o julgamento com ampliação da colegialidade assegurando o prosseguimento do julgamento não unânime”, (ii) “submetida a julgamento a questão inerente à responsabilidade tributária e redirecionamento da obrigação à terceiros antes não analisada, acerca do precedente vinculativo do IRDR Nº 0017610-97.2016.4.03.0000 do Órgão Especial do E. TRF3”, e (iii)  “submetida a julgamento a questão processual preliminar de nulidade do julgamento dos embargos de declaração opostos pela União Embargada no tocante à supressão de instância diante da incursão da matéria de fato e de valoração de prova de competência primeva do primeiro grau de jurisdição”. Requer, ainda que a Turma se manifeste sobre (iv) a súmula 392 do STJ e precedentes deste e do E. TRF3 no tocante a responsabilidade tributária solidária; e (v) a impossibilidade de se aferir responsabilidade de terceiro em sede de juízo sumário de cognição. Prequestiona os dispositivos que menciona (ID 271815215).

A embargada apresentou contrarrazões (ID 274330765).

É o relatório.

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5015390-07.2017.4.03.0000

RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS

AGRAVANTE: A & C TRANSPORTES, COMERCIO E REPRESENTACAO DE BOVINOS LTDA - EPP

Advogado do(a) AGRAVANTE: DIEGO GIULIANO DIAS DE BRITO - MS14400-A

AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

V O T O

 

 

O Senhor Desembargador Federal Nelton dos Santos (Relator):

É sabido que os embargos de declaração têm finalidade integrativa do julgamento proferido pelo Juízo, e não podem servir ao intento de manifestar inconformidade com a decisão proferida. Por isso, devem ser rejeitados sempre que opostos contra acórdão livre de omissão, contradição, obscuridade ou erro material.

No que tange aos pontos suscitados preliminarmente, esclareça-se que não se trata de hipótese de aplicação da técnica de julgamento do artigo 942, § 3º, II, do Código de Processo Civil, in verbis:

 

“Art. 942. Quando o resultado da apelação for não unânime, o julgamento terá prosseguimento em sessão a ser designada com a presença de outros julgadores, que serão convocados nos termos previamente definidos no regimento interno, em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial, assegurado às partes e a eventuais terceiros o direito de sustentar oralmente suas razões perante os novos julgadores.

§ 1º Sendo possível, o prosseguimento do julgamento dar-se-á na mesma sessão, colhendo-se os votos de outros julgadores que porventura componham o órgão colegiado.

§ 2º Os julgadores que já tiverem votado poderão rever seus votos por ocasião do prosseguimento do julgamento.

§ 3º A técnica de julgamento prevista neste artigo aplica-se, igualmente, ao julgamento não unânime proferido em:

I - ação rescisória, quando o resultado for a rescisão da sentença, devendo, nesse caso, seu prosseguimento ocorrer em órgão de maior composição previsto no regimento interno;

II - agravo de instrumento, quando houver reforma da decisão que julgar parcialmente o mérito.” (grifo nosso)

 

No presente caso, o agravo de instrumento interposto pela ora embargante reformou decisão que concedeu liminar em sede de medida cautelar fiscal. Não houve julgamento parcial de mérito a atrair a sistemática estabelecida no Código de Processo Civil e no Regimento Interno desta E. Corte, portanto.

Quanto à não manifestação pelo v. acórdão acerca da suposta necessidade de instauração de incidente de desconsideração de personalidade jurídica (IDPJ) para responsabilizar solidariamente o embargante, impõe-se observar que não transitou em julgado o feito paradigma 017610-97.2016.4.03.0000, o qual ensejou a tese firmada no IRDR, uma vez que houve interposição de Recursos Especial e Extraordinário, e que tais recursos têm efeito suspensivo, conforme dispõe o artigo 987, § 1º, do Código de Processo Civil.

Consequentemente, e segundo entendimento do C. STJ, “não há que se suspender a tramitação dos executivos fiscais em razão da pendência de confirmação da tese fixada pela 3ª Região em sede de IRDR, podendo os magistrados decidirem acerca da necessidade ou não da instauração do IDPJ conforme suas convicções, até que esta Corte Superior aprecie o Recurso Especial interposto contra o acórdão em comento” (TP n. 3.628, Ministro Manoel Erhardt, Desembargador Convocado do Trf5, DJe de 30/11/2021).

Assim também já se pronunciou esta E. Primeira Turma:

 

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO DO FEITO EXECUTIVO EM FACE DOS SÓCIOS. PEDIDO DE EXCLUSÃO DOS SÓCIOS. AUSÊNCIA DE LEGITIMIDADE DA PESSOA JURÍDICA. ARTIGO 18 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. DESNECESSIDADE DE INSTAURAÇÃO DO INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. RECURSO DESPROVIDO.

I. Dispõe o artigo 18 do Código de Processo Civil que "Ninguém poderá pleitear direito alheio em nome próprio, salvo quando autorizado pelo ordenamento jurídico". Neste contexto, o ora agravante não tem legitimidade para, em nome próprio, requerer a exclusão de sócio do polo passivo da execução fiscal.

II. Com relação à prescrição intercorrente, tal matéria não foi objeto de apreciação pelo Juízo a quo, não cabendo a esta Corte a sua análise, sob pena de supressão de instância.

III. Saliente-se, no mais, que, em sede de execução fiscal, é prescindível a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica prevista no Código de Processo Civil. Isto porque, o procedimento previsto no artigo 133 e seguintes do Código de Processo Civil é incompatível com o regime jurídico da execução fiscal, no qual não há previsão para a apresentação de defesa sem prévia garantia do juízo, nem de automática suspensão do processo. Outrossim, a aplicação da Lei n.º 6.830/80 prevalece sobre o Código de Processo Civil, ante a sua natureza especial, sendo a incidência do CPC apenas subsidiária. No mais, registro que o Código Tributário Nacional traz em seu artigo 135 hipóteses de legitimação imediata de terceiros para a execução fiscal sem a necessidade de confecção de novo título executivo, salientando-se que a Lei n.º 6.830/80 prevê mecanismos próprios de defesa do executado, em consonância com os princípios do contraditório e da ampla defesa. Outrossim, é certo que o Código de Processo Civil dispõe em seu artigo 779, inciso VI, o redirecionamento da execução em face do responsável tributário.

IV. Registre-se que não se desconhece o teor do julgamento do IRDR 0017610-97.2016.4.03.0000 pelo Órgão Especial desta Corte, em 10/02/2021. Contudo, tendo em vista a interposição de Recurso Especial e Recurso Extraordinário em face do referido julgamento, bem como a teor do artigo 987, § 1º, do Código de Processo Civil, que prevê o efeito suspensivo destes recursos, a tese firmada no IRDR em questão, por ora, não vincula o pronunciamento dos demais órgãos judiciais no âmbito da competência desta Corte.

V. Agravo de instrumento desprovido. Embargos de declaração prejudicados." (TRF 3ª Região, 1ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5018123-67.2022.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal VALDECI DOS SANTOS, julgado em 14/10/2022, Intimação via sistema DATA: 17/10/2022) (grifo nosso)

 

Também não se verifica ter ocorrido supressão de instância, pois o d. Colegiado, em análise perfunctória, na mesma esteira da realizada pelo r. Juízo a quo, entendeu por estarem presentes a probabilidade do direito e o risco ao resultado útil do processo, no caso de esvaziamento do patrimônio pela ora embargante.

 Confira-se do trecho do voto condutor abaixo reproduzido:

 

“(...) Assiste razão à parte embargante, porquanto o v. Acórdão embargado deixou de se manifestar quanto à formação de grupo econômico de fato e a constatação de confusão patrimonial e desvio de finalidade, matéria esta devidamente apreciada e fundamentada na decisão proferida pelo Juízo a quo

Com efeito, sobre a questão suscitada, assim decidira a decisão agravadain verbis:

 ‘Assevero, ainda, que a configuração da formação de grupo econômico de fato é notória.

Isto porque, como se infere dos documentos juntados pela requerente, notadamente a Informação de Pesquisa e Investigação IPEI n. CG2014004, existe confusão patrimonial entre as pessoas físicas e jurídicas.

Os fundamentos, para tanto, invocados são, em análise perfunctória, aptos a justificá-la.

(...) 

Tais pontos, detalhados no relatório de f. 100-246, servem de subsídio à concessão desta medida cautelar’.

(...)

Neste contexto, entendo que há fortes indícios da participação da agravante no grupo econômico e o compartilhamento de sua sede social e frota de caminhões pelas demais empresas do grupo econômico, evidenciando a ocorrência de confusão patrimonial e desvio de finalidade, a ensejar o reconhecimento, em sede cautelar, da responsabilidade solidária do crédito tributário devido pelo grupo econômico FRIGOLOP.

Ademais, o substantivo valor devido pelo grupo econômico justifica a concessão da liminar, ante o risco de esvaziamento patrimonial a obstar a satisfação da dívida tributária. (...).” (ID 269878173 - Págs. 3-5) (grifo nosso)

 

Como se vê, não formou a Turma juízo de valor exauriente sobre a responsabilidade da ora agravante, mas, superficial, com o propósito de resguardar o crédito tributário de um esvaziamento patrimonial por quem tem probabilidade de vir a responder por ele, sobretudo em face da notoriedade da existência de grupo econômico.

Portanto, a Súmula 392 do C. Superior Tribunal de Justiça e os precedentes invocados pela embargante, que tratam da vedação à modificação do sujeito passivo da execução e da participação no fato gerador como condição para apuração de responsabilidade, questões de fundo, não interferem na presente análise.

É perceptível que a embargante deseja, na verdade, que prevaleça a tese por ela defendida, na intenção de revolver questão de direito já dirimida, com evidente pretensão de inversão do resultado, o que não é possível na via estreita dos embargos de declaração.

Frise-se que a exigência contida nos artigos 93, IX, da CRFB e 489, § 1º, do CPC não impõe ao julgador que se manifeste, explicitamente, acerca de todos os argumentos e artigos, constitucionais e infraconstitucionais, arguidos pelas partes. Tendo o julgado enfrentado, de forma fundamentada, todos os argumentos relevantes para a convicção firmada, não há como rotulá-lo de omisso ou contraditório, tal qual pretendido pela embargante.

Aliás, está pacificado o entendimento de que o julgador, tendo encontrado motivação suficiente para decidir desta ou daquela maneira, não está obrigado a rebater, um a um, todos os argumentos apresentados pela parte para decidir a demanda.

Por fim, registre-se que para efeito de prequestionamento é desnecessária a referência expressa aos princípios e aos dispositivos legais e constitucionais tidos por violados, uma vez que o exame da controvérsia, à luz dos temas invocados, é mais que suficiente para viabilizar o acesso às instâncias superiores, como expresso no artigo 1.025 do Código de Processo Civil.

Ante o exposto, REJEITO os embargos de declaração.

É como voto.  


O DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY

 

Acompanho com ressalva o eminente Relator. 

 

Ao examinar e rejeitar os embargos de declaração, entendeu Sua Excelência que:

 

“(...)

Quanto à não manifestação pelo v. acórdão acerca da suposta necessidade de instauração de incidente de desconsideração de personalidade jurídica (IDPJ) para responsabilizar solidariamente o embargante, impõe-se observar que não transitou em julgado o feito paradigma 017610-97.2016.4.03.0000, o qual ensejou a tese firmada no IRDR, uma vez que houve interposição de Recursos Especial e Extraordinário, e que tais recursos têm efeito suspensivo, conforme dispõe o artigo 987, § 1º, do Código de Processo Civil.

Consequentemente, e segundo entendimento do C. STJ, ‘não há que se suspender a tramitação dos executivos fiscais em razão da pendência de confirmação da tese fixada pela 3ª Região em sede de IRDR, podendo os magistrados decidirem acerca da necessidade ou não da instauração do IDPJ conforme suas convicções, até que esta Corte Superior aprecie o Recurso Especial interposto contra o acórdão em comento’ (TP n. 3.628, Ministro Manoel Erhardt, Desembargador Convocado do Trf5, DJe de 30/11/2021).

(...)”

 

Todavia, no que tange à determinação de suspensão da execução, comungo do posicionamento de que não é necessário aguardar o trânsito em julgado de matéria firmada em sede de IRDR para sua aplicação.

Acerca do tema, merecem destaque as percucientes conclusões do E. Desembargador Federal Antônio Cedenho em recente decisão proferida nos autos do AI n. 5008021-20.2021.4.03.0000, verbis:

 

“De acordo com o artigo 985, I, do CPC, o julgamento proferido em incidente de resolução de demandas repetitivas possui eficácia vinculante na esfera de jurisdição do órgão julgador, garantindo uma jurisprudência uniforme dos Tribunais e a realização dos valores da segurança jurídica, isonomia e proteção da confiança.

Segundo os autos da execução fiscal, a União fundamentou o pedido de redirecionamento na ocorrência de confusão patrimonial e de desvio de finalidade, alegando que a personalidade jurídica de Amaro de Araújo Pereira Filho fora manipulada para a sonegação de tributos federais, mediante transferência de imóveis garantidores a Interbens Administração de Bens Ltda., da qual é sócio administrador. 

Trata-se de questão que se ajusta perfeitamente à orientação fixada no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº 0017610-97.2016.4.03.0000, no sentido de que deve ser instaurado o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, como garantia da ampla defesa e do contraditório de quem não figurou no processo administrativo fiscal e vem a responder por débitos de outro sujeito de direito (artigo 133 do CPC).

A alegação de que o acórdão do Órgão Especial não teria aplicação imediata, em função da ausência de publicação, da suspensão dos processos individuais e coletivos até o trânsito em julgado e do efeito suspensivo dos recursos especial e extraordinário, não procede.

Em primeiro lugar, o resultado do julgamento já se encontra disponível no sítio oficial do Tribunal na internet, como se extrai do extrato de movimentação processual do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº 0017610-97.2016.4.03.0000. A tese jurídica está devidamente delimitada, discriminando as situações em que o incidente de desconsideração da personalidade jurídica é aplicável à execução fiscal.

Para a eficácia do acórdão, basta a publicação na sessão de julgamento, com a posterior disponibilização da conclusão no sítio oficial do Tribunal na internet. A publicação de que trata o artigo 943, §2º, do CPC é prevista para a intimação das partes interessadas e não para a eficácia da decisão colegiada, que já decorre da sessão de julgamento e da informação do resultado no site, principalmente diante da natureza objetiva e impessoal do incidente, acima da lide eminentemente intersubjetiva.

Em segundo lugar, a suspensão dos processos individuais e coletivos até o trânsito em julgado somente se aplica ao incidente de resolução de demandas repetitivas que venha sucedido de requerimento dirigido ao STF e STJ para o sobrestamento da controvérsia em nível nacional (artigo 982, §3º e §5º, do CPC). Ela não alcança o incidente restrito à área de jurisdição do órgão julgador, em que a interposição de recurso especial ou extraordinário é totalmente incerta.

O CPC confere ao incidente de resolução de demandas repetitivas a posição de precedente obrigatório, voltado a garantir os princípios da segurança jurídica, isonomia, proteção da confiança e razoável tramitação dos processos (artigo 985, I e II). Os Juízos de primeiro grau e os órgãos fracionários do Tribunal estão vinculados à tese jurídica firmada, sendo que o CPC alastra a vinculação por todo o procedimento, como na concessão de tutela de evidência (artigo 311, II), na improcedência liminar do pedido (artigo 332, III), na dispensa de remessa oficial (artigo 496, §4º, III) e nos poderes do relator de recursos (artigo 932, IV, c, e V, c).

Não condizem com a relevância do instituto a postergação da eficácia da decisão, o condicionamento dos efeitos a um evento futuro e incerto, como a ausência de interposição de recurso especial ou extraordinário. O CPC dá ao incidente poder de vinculação autônomo e direto, conforme se extrai da influência em várias fases do procedimento, de modo que o diferimento dos efeitos contraria uma visão sistêmica e unitária do julgamento de casos repetitivos. 

Se o legislador quisesse impor a confirmação por Tribunal Superior, deveria ter previsto a remessa oficial e não o recurso especial ou extraordinário, enquanto evento futuro e incerto, dependente da iniciativa da parte. 

Ademais, o recurso especial ou extraordinário a ser interposto segue praticamente o regime conferido ao julgamento de casos repetitivos no Tribunal Superior. Não se trata de recurso adaptado ao incidente de resolução de demandas repetitivas, mas daquele previsto para a própria sistemática de recurso especial ou extraordinário repetitivo (artigo 987 do CPC e artigo 256-H do Regimento Interno do STJ), de maneira que não há sentido em inutilizar o incidente de resolução de demandas repetitivas, enquanto mecanismo com a mesma função dos recursos repetitivos e destinado a assegurar os princípios da segurança jurídica, isonomia, proteção da confiança e razoável tramitação dos processos. 

Se o procedimento comporta mais de uma ferramenta de julgamento de casos repetitivos, guiada pela mesma principiologia, não se mostra coerente neutralizar uma delas, mediante inteira subordinação à outra. Ainda mais diante da constatação de que o envolvimento da jurisdição superior demanda um evento futuro e incerto, como a interposição de recurso especial ou extraordinário (artigo 987, caput, do CPC). 

Portanto, em função de interpretação sistemática e teleológica do CPC, pode-se concluir que a suspensão dos processos individuais e coletivos até o trânsito em julgado, com o diferimento da eficácia de julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas, somente se aplica na hipótese de sobrestamento da controvérsia em âmbito nacional, após determinação de Tribunal Superior (artigo 982, §3º e §5º). Não alcança o incidente de abrangência regional, quando não se pode cogitar ainda de intervenção da jurisdição superior, em decorrência da total incerteza de recurso especial e extraordinário. 

Deve prevalecer, nas circunstâncias, o poder de vinculação autônomo e direto do acórdão proferido no incidente de resolução de demandas repetitivas, sem que a mera possibilidade de interposição de recurso especial ou extraordinário justifique a neutralização da eficácia de mecanismo concebido igualmente para a garantia dos princípios da segurança jurídica, isonomia, proteção da confiança e razoável duração do processo (artigo 928, I, do CPC). 

O Superior Tribunal de Justiça tem proferido decisões no sentido da desnecessidade de trânsito em julgado: 

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OMISSÃO NÃO CONFIGURADA. LITISCONSÓRCIO ATIVO FACULTATIVO. VALOR DA CAUSA INFERIOR A SESSENTA SALÁRIOS MÍNIMOS. VALOR INDIVIDUAL DE CADA LITISCONSORTE. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL. SÚMULA 83/STJ. MATÉRIA FIRMADA EM IRDR. DESNECESSIDADE DO TRÂNSITO EM JULGADO PARA SUA APLICAÇÃO. REVISÃO DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.

1. Não se configurou a ofensa ao art. 1.022 do Código de Processo Civil de 2015, uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia.

2. Em relação ao mérito, o Tribunal de origem julgou em consonância com a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça segundo a qual, ‘em se tratando de litisconsórcio ativo facultativo, a fixação da competência dos Juizados Especiais deve observar o valor de cada autor, individualmente, e não o valor global da demanda’ (AgRg no AREsp 472.074/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 3/2/2015).

3. Ressalta-se que a jurisprudência do STJ considera que não é necessário aguardar o trânsito em julgado de matéria firmada em IRDR para sua aplicação (REsp 1879554/SC, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 31/08/2020).

4. Ademais, é evidente que alterar as conclusões adotadas pela Corte de origem a respeito do valor da causa e da iliquidez da obrigação, como defendido nas razões recursais, demanda novo exame do acervo fático-probatório constante dos autos, providência vedada em Recurso Especial, conforme o óbice previsto na Súmula 7/STJ.

5. Agravo conhecido para conhecer em parte do Recurso Especial, e, nessa extensão, negar-lhe provimento.

(STJ, AResp 1786933, Relator Herman Benjamin, Segunda Turma, DJ 23/03/2021). 

O Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº 0017610-97.2016.4.03.0000 tramitou sem a extensão do sobrestamento da controvérsia para todo o território nacional por determinação do STJ e ou STF, o que garante eficácia imediata ao acórdão proferido. 

De qualquer forma, ainda que se negue efeito imediato, a dispensa do incidente de desconsideração da personalidade jurídica na execução fiscal não pode ser imposta pela própria tramitação do incidente, como pretende a União. 

Isso porque o relator, no início do IRDR nº 0017610-97.2016.4.03.0000, não se limitou a decretar a suspensão dos processos individuais e coletivos que tratavam da controvérsia (artigo 982, I, do CPC); concedeu, na verdade, tutela provisória, a fim de que o redirecionamento das execuções fiscais prosseguisse mediante simples petição nos autos, sem a instauração do incidente de despersonalização. 

Ora, a tutela provisória perdeu naturalmente os efeitos diante do julgamento final do incidente no Tribunal, pela própria superveniência de cognição exauriente e pela noção de procedimento. Não existe mais a possibilidade de prosseguimento da execução com o descarte por completo do incidente de desconsideração, de modo que só resta uma opção: a suspensão de todos os pedidos de redirecionamento até o trânsito em julgado, sem prejuízo do requerimento de tutela de urgência no período (artigo 982, I e §2º, do CPC). 

Nesse caso, a União teria de apresentar perigo da demora acima do convencional na execução fiscal e os Juízos de primeiro grau possuiriam, no exame da tutela provisória, liberdade para aplicar ou não o incidente de desconsideração, podendo, inclusive, invocar a fundamentação do acórdão proferido no incidente de resolução de demandas repetitivas, a título de convicção, embasamento fático e não de imposição, precedente obrigatório. 

Desse modo, não se encontra vedada a exigência de instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, como pretende a União na reforma da decisão do Juízo de Origem. Pode decorrer da própria eficácia do acórdão proferido no incidente de resolução de demandas repetitivas ou da revogação da tutela provisória concedida no início dele. (...)”

(TRF3. AI 5008021-20.2021.04.03.0000. Rel. Desembargador Federal Antônio Cedenho. Data da Decisão: 11.5.2021)

 

Destaca-se, nesse ponto, o quanto decidido no REsp 1.879.554 (FRANCISCO FALCÃO):

 

"RECURSO ESPECIAL. PENSÃO POR MORTE. PRETENSÃO DE PARIDADE COM OS AGENTES EM ATIVIDADE. TEMÁTICA FIRMADA EM INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. DESNECESSIDADE DO TRÂNSITO EM JULGADO PARA APLICAÇÃO DO PRECEDENTE PARADIGMA. DESNECESSIDADE DE NOTIFICAR AS PARTES ACERCA DA APLICAÇÃO DA TESE EM IRDR. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO.

I - A jurisprudência desta Corte Superior considera que não é necessário aguardar o trânsito em julgado de matéria firmada em IRDR para sua aplicação. Precedente: AgInt nos EDcl no RMS 47.944/RO, Rel. Min. Francisco Falcao, DJe de 17.8.2018.

...."

 

Por fim, ressalto que em recente decisão o eminente Ministro FRANCISCO FALCÃO não conheceu dos Recursos Especiais atravessados no IRDR 0017610-97.2016.4.03.0000.

Entendeu o Ministro relator FRANCISCO FALCÃO que “não cabe recurso especial contra acórdão proferido pelo Tribunal de origem que fixa tese jurídica em abstrato em julgamento do IRDR, por ausência do requisito constitucional de cabimento de ‘causa decidida’, mas apenas naquele que aplica a tese fixada, que resolve a lide, desde que observados os demais requisitos constitucionais do art. 105, III, da Constituição Federal e dos dispositivos do Código de Processo Civil que regem o tema”.

Conquanto se trate de decisão monocrática, ainda não transitada em julgada, seguramente aponta o norte de entendimento da Corte Superior quanto ao destino de recursos especiais interpostos em IRDR.

Assim, uma vez proferida decisão pelo não-conhecimento do REsp, tenho que tal cenário autoriza a aplicação, de pronto, do posicionamento firmado no IRDR 0017610-97.2016.4.03.0000.

No mais, com a ressalva supra, acompanho o e. Relator no sentido de rejeitar os embargos de declaração.

Ante o exposto, em homenagem à uniformidade da Jurisprudência da Corte, e à necessidade de mantê-la estável, íntegra e coerente (art. 926 CPC-15), com todas as vênias quanto aos motivos determinantes para dispensa de instauração do IDPJ, acompanho com a ressalva supra o eminente Relator para rejeitar os embargos de declaração.

É como voto.

 


E M E N T A

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO E CONTRADIÇÃO. INOCORRÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO. EMBARGOS REJEITADOS.  

1. Os embargos de declaração têm finalidade integrativa do julgamento proferido pelo Juízo, e não podem servir ao intento de manifestar inconformidade com a decisão proferida. Por isso, devem ser rejeitados sempre que opostos contra acórdão livre de omissão, contradição, obscuridade ou erro material.

2. Intenção da embargante de revolver questão de direito já dirimida, com evidente pretensão de inversão do resultado, o que não é possível na via estreita dos embargos de declaração.

3. A exigência contida nos artigos 93, IX, da CRFB e 489, § 1º, do CPC não impõe ao julgador que se manifeste, explicitamente, acerca de todos os argumentos e artigos, constitucionais e infraconstitucionais, arguidos pela parte. Tendo o julgado enfrentado, de forma fundamentada, todos os argumentos relevantes para a convicção firmada, não há como rotulá-lo de omisso ou contraditório.

4. Para efeito de prequestionamento é desnecessária a referência expressa aos princípios e aos dispositivos legais e constitucionais tidos por violados, uma vez que o exame da controvérsia, à luz dos temas invocados, é mais que suficiente para viabilizar o acesso às instâncias superiores, como expresso no artigo 1.025 do Código de Processo Civil.

5. Embargos de declaração rejeitados.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, por unanimidade, rejeitou os embargos de declaração, com ressalva do senhor Desembargador Federal Wilson Zauhy, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.