CONFLITO DE COMPETÊNCIA CÍVEL (221) Nº 5015018-48.2023.4.03.0000
RELATOR: Gab. DES. FED. CARLOS DELGADO - OE
SUSCITANTE: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 5ª VARA FEDERAL DAS EXECUÇÕES FISCAIS
SUSCITADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 9ª VARA FEDERAL DAS EXECUÇÕES FISCAIS
OUTROS PARTICIPANTES:
PARTE RE: NESTLE BRASIL LTDA.
ADVOGADO do(a) PARTE RE: CELSO DE FARIA MONTEIRO - SP138436-A
CONFLITO DE COMPETÊNCIA CÍVEL (221) Nº 5015018-48.2023.4.03.0000 RELATOR: Gab. DES. FED. CARLOS DELGADO - OE SUSCITANTE: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 5ª VARA FEDERAL DAS EXECUÇÕES FISCAIS SUSCITADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 9ª VARA FEDERAL DAS EXECUÇÕES FISCAIS OUTROS PARTICIPANTES: PARTE RE: NESTLE BRASIL LTDA. ADVOGADO do(a) PARTE RE: CELSO DE FARIA MONTEIRO - SP138436-A R E L A T Ó R I O O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR): Trata-se de conflito negativo de competência suscitado pelo Juízo Federal da 5ª Vara de Execuções Fiscais de São Paulo/SP, em face do Juízo Federal da 9ª Vara de Execuções Fiscais de São Paulo/SP, no bojo da execução fiscal ajuizada pelo INSTITUTO NACIONAL DE METROLOGIA, QUALIDADE E TECNOLOGIA – INMETRO, tendo como executada NESTLÉ BRASIL LTDA. Sustenta o Juízo suscitante a competência do Juízo a quem fora, inicialmente, distribuída a execução fiscal, com base em precedentes desta Corte. O presente conflito fora, inicialmente, distribuído no âmbito da 2ª Seção, e redistribuído a este Órgão Especial. Designado o Juízo suscitado para resolver, em caráter provisório, eventuais medidas urgentes (art. 955 do CPC). O Ministério Público Federal ofertou manifestação no sentido do regular prosseguimento do feito, sem a necessidade de sua intervenção. É o relatório.
CONFLITO DE COMPETÊNCIA CÍVEL (221) Nº 5015018-48.2023.4.03.0000 RELATOR: Gab. DES. FED. CARLOS DELGADO - OE SUSCITANTE: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 5ª VARA FEDERAL DAS EXECUÇÕES FISCAIS SUSCITADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 9ª VARA FEDERAL DAS EXECUÇÕES FISCAIS OUTROS PARTICIPANTES: PARTE RE: NESTLE BRASIL LTDA. ADVOGADO do(a) PARTE RE: CELSO DE FARIA MONTEIRO - SP138436-A V O T O O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR): Discute-se a existência de prevenção, para fins de processar e julgar execução fiscal, do juízo especializado em execuções fiscais, em que processada ação visando à antecipação de garantia do respectivo débito, dentre múltiplos outros. Não se olvida que o artigo 1º, I e III, §1º, do Provimento CJF3R nº 25/2017 estabelece a prevenção do Juízo Especializado para a execução fiscal correspondente ao crédito acautelado ou garantido em medidas cautelares fiscais ou ações e tutelas tendentes à antecipação da garantia da execução fiscal, verbis: “Art. 1º Atribuir às Varas Especializadas em Execuções Fiscais, no âmbito da Justiça Federal da 3ª Região, competência para processar e julgar: I - as ações de execução fiscal, bem como os respectivos embargos; II - as medidas cautelares fiscais, previstas na Lei nº 8.397, de 6 de janeiro de 1992; III - as ações e tutelas tendentes, exclusivamente, à antecipação de garantia da execução fiscal não ajuizada, mesmo quando já aforada, no Juízo cível, ação voltada à discussão do crédito fiscal. §1º - Intentadas as medidas previstas nos incisos II ou III, fica o Juízo Especializado prevento para a execução fiscal correspondente ao crédito acautelado ou garantido”. Contudo, não se pode perder de vista que o Código de Processo Civil (artigos 54 e 55) autoriza a modificação da competência relativa pela conexão visando à segurança jurídica, a fim de evitar a prolação de decisões conflitantes ou contraditórias. Ademais, o e. Supremo Tribunal Federal, no julgamento das ADIs nºs 5.492 e 5.737, restringiu a aplicação do artigo 46, §5º, do CPC aos limites do território de cada ente subnacional ou ao local de ocorrência do fato gerador, de sorte que o foro de domicílio do devedor não será, necessariamente, observado para fins de ajuizamento da execução fiscal. Assim, a questão que, a princípio, poderia ser entendida como uma simples reunião de processos conexos, revela-se bastante tormentosa quando as ações que visam à prestação de garantia prévia ao ajuizamento de execução fiscal reúnem, num mesmo processo, uma diversidade de débitos cuja execução fiscal não necessariamente será objeto de processo único. Este o caso concreto, em que a ação primeva objetivou garantir múltiplos débitos, cujas execuções fiscais são ajuizadas em diversos processos, perante diversos juízos, de acordo com as regras de competências próprias ao rito executivo fiscal. Nesta Corte, em razão da competência prevista para as 1ª e 2ª Seções, as quais englobam execuções fiscais relacionadas a empresas que, usualmente, procedem ao ajuizamento de demandas para fins de antecipação de garantias prévias, observou-se a necessidade de uniformização, pelo Órgão Especial, do entendimento a ser adotado no âmbito do Tribunal (artigo 17, II e III, do RITRF3). Por seu turno, em recente julgamento, ocorrido em 26.04.2023 e transitado em julgado em 21.06.2023, o e. Órgão Especial, majoritariamente –votação com a qual assenti –, entendeu que “diante da reconhecida e consabida especificidade de que as partes litigam em centenas de processos idênticos, não se afigura oportuno impor a reunião de pedido de antecipação de dívida e cobrança de dívidas sob um mesmo Juízo, sob o risco de multiplicação de feitos em processamento e geração de custos consideráveis às partes e à administração judiciária – sem prejuízo de que eventualmente alinhem formalmente entre si a correspondência de método de agrupamento de garantias e débitos a executar. Assim, provê-se solução homogênea a todos os casos envolvendo tais litigantes, de modo a pacificar o entendimento sobre a questão e evitar a adoção de procedimentos contraditórios sobre o cabimento do desmembramento de garantias e títulos executivos”. Segue a ementa do acórdão: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. ÓRGÃO ESPECIAL. ANTECIPAÇÃO DE GARANTIA E EXECUÇÃO FISCAL. REUNIÃO DE FEITOS. DEMANDA DE MASSA. MULTIPLICIDADE DE PROCESSOS E IMPACTO SOBRE A ESTRUTURA JUDICIÁRIA. EFICIÊNCIA, RACIONALIDADE, SEGURANÇA E PRESTEZA DA FUNÇÃO JURISDICIONAL. ESPECIFICIDADE DO CASO CONCRETO. 1. Embora bem assentadas orientações sobre fixação e modificação da competência, é primordial considerar que o norte hermenêutico é o de que as regras legais, regulamentares e jurisprudenciais de conexão e prevenção produzem eficácia dentro de sistemas normativos complexos e em cenários específicos que, por vezes, ensejam conflitos de valores prestigiados pelo ordenamento, inclusive em grau constitucional. De fato, a organização judiciária é orientada à eficiência quantitativa e qualitativa no processamento de demandas (segundo postulados de universalidade de jurisdição, acesso à justiça, celeridade, pacificação social), e planejada administrativamente a partir de macrovisão das limitações da estrutura judiciária existente – do que naturalmente resultam, episodicamente, restrições formais ao espectro de possibilidades de decisão a respeito de como conduzir, com previsibilidade e segurança jurídica, lides individualizadas que, por vezes, escapam à generalidade focada pelo legislador. Daí a construção casuística de soluções aplicáveis a cada gênero de casos, conforme os exemplos acima. 2. Configura cenário comumente problemático, neste contexto, o de litigantes de massa, como é o caso de origem deste conflito de competência. Como é fato notório, as partes do processo de base litigam em centenas de processos virtualmente idênticos (cobranças de valores relativos a autos de infração administrativos e ações correlatas), de modo que por vezes observa-se pleitos de oferta de garantia distribuídos em Subseções várias (ou, como destacou o Juízo suscitante, até mesmo em Regiões Federais distintas), cuja caução abrange débitos variados que, nos mais das vezes, não correspondem àqueles que a exequente reúne para cobrar em cada processo. Assim, para respeitar o entendimento de que o Juízo que processou o pedido de caução está prevento para o eventual litígio futuro sobre o mérito das dívidas previamente garantidas, para além de medidas processuais simples de redistribuição e compensação de acervo, tem-se grande ônus de desmembrar apólices de seguro-garantia ou títulos executivos (demandando alocação de trabalho, tempo, diligências e custos financeiros às partes) e, de maneira tumultuária, multiplicar processos em curso na Justiça Federal (precisamente na área de especialização que detém o acervo total de maior volume nas Subseções de São Paulo e Mato Grosso do Sul, a saber, a de execuções fiscais). 3. Sucede que, na ordem de ideias exposta, os institutos jurídicos de conexão e prevenção, conquanto tenham o objetivo imediato claro de preservar a segurança jurídica e coesão da apreciação dos direitos das partes, como expressão do acesso à Justiça, não detém prevalência absoluta e axiomática em situações de conflito de valores principiológicos do ordenamento, tais como este. Neste ponto, é de se observar que, em verdade, as próprias normas de conexão e prevenção também se destinam, de maneira mediata, a dar racionalidade e eficiência ao sistema processual, como um todo orgânico e coerente. 4. É preciso, portanto, em casos que tais, perscrutar a solução que melhor acomode a contraposição primária de comandos normativos, a partir das balizas que orientam a própria existência e eficácia destas regras processuais. Assim, há que se ter presente que, em última análise, o direito processual é instrumental. Nos dizeres de Cândido Rangel Dinamarco, “instrumento cheio de dignidade e autonomia científica, mas nada mais do que instrumento” (in: "A instrumentalidade do processo", 15ª Edição. São Paulo: Malheiros, 2013, f. 318). O funcionamento dos sistemas processuais é amparado, teleologicamente, na premissa de que as regras promulgadas preservam valores instrumentais (celeridade, contraditório, acesso à justiça) e conduzem a objetivos finalísticos divisados pelo sistema (pacificação social, preservação de direitos, justiça material, etc.). O direito processual não é um fim em si mesmo, e não se sobrepõe, como desígnio jurídico, à solução do direito material em litígio. 5. Desta maneira, ao limite, nada obsta que, mesmo sob entendimento, com respaldo legal expresso que seja, da efetiva conexão ou acessoriedade entre duas demandas (atraindo, primariamente, a percepção de que devem ser reunidas, em nome da segurança jurídica e coerência da apreciação dos direitos das partes), conclua-se pela prevalência de disposições e orientações outras que priorizem princípios e direitos outros igualmente tutelados pelo sistema processual e, de maneira ampla, pelo ordenamento jurídico. Trata-se de conclusão a ser alcançada a partir da análise de hipóteses concretas. 6. Perceba-se que este prisma é capaz de solucionar o conflito quer se entenda que o pleito antecipatório de garantia para fins exclusivos de regularidade fiscal deve ser considerado demanda autônoma ou pedido acessório da ação de cobrança, divergência frutífera que, todavia, ocupa segundo plano, pelo enfoque ora adotado. Qualquer seja a posição adotada, o ponto nodal a ser identificado é, singelamente, qual saída melhor compõe o conflito de valores prestigiados pelo sistema processual, considerada sua instrumentalidade e fim último de prover deslinde adequado (célere, eficiente, justo e serviente à legítima fruição das garantias e direitos reconhecidos às partes) à lide subjacente. 7. Esta premissa esteve implícita em julgado da 2ª Seção consideravelmente recente, envolvendo as mesmas partes do presente feito (CCiv 019860-42.2021.4.03.0000, Rel. Des. Fed. MÔNICA NOBRE, DJEN 14/03/2022). Frise-se que na oportunidade havia divergência no colegiado, sob o entendimento de que a relação entre os feitos não seria de conexão, mas de acessoriedade, como acima mencionado (o que, prima facie, recomendaria a reunião dos processos). Contudo, mesmo sob tal ótica, prevaleceu a percepção de que, de toda a sorte, como se tratava de conflito de competência entre foros distintos, forçar o trâmite da execução fiscal perante o Juízo que processou a antecipação de garantia equivaleria a anular a prerrogativa legal do credor de escolher o foro de ajuizamento da cobrança, dentre as opções elencadas em lei (artigo 46, § 5º, CPC) - excepcionando-se a regra de agrupamento dos feitos. Assim, a 2ª Seção convergiu para a decisão, unânime, de não reunir os feitos. 8. Em que pese o caso presente trate de conflito de competência entre Juízos de um mesmo foro, crê-se que há, igualmente, fundamentos sensíveis e relevantes a recomendar que seja dispensada a reunião dos processos. Afigura-se substancialmente mais custoso às partes, e ao próprio sistema judiciário, forçar a multiplicação de processos e reunião de demandas em casos como o presente, na linha do quanto alinhavado anteriormente. Conquanto não se desconheça a posição de que seria possível, em teoria, a existência de decisões conflitantes (divergência entre o entendimento dos Juízos a respeito da aceitabilidade da garantia ofertada), trata-se de hipótese com a qual esta Região já lida cotidianamente em função da incompetência do Juízo Cível para processar execuções fiscais conexas a ações anulatórias (comumente com oferta de caução para regularidade fiscal) previamente distribuídas, equacionada pelos magistrados de primeiro e segundo grau e nos termos de jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça. É possível cogitar de situação análoga, por igual, no caso de remoção de magistrados, nada assegurando às partes que o juiz que passar a ocupar a vaga deixada em aberto terá as mesmas convicções doutrinárias e jurisprudenciais que o anterior. 9. No mais, até porque a oferta de caução antecipada para obtenção de CPD-EN não impede a propositura da execução fiscal, quer parecer que os cenários de decisões conflitantes elucubrados dissipam-se a partir da segregação da eficácia da caução, cabendo ao Juízo que processar a antecipação de garantia decidir sobre a possibilidade de emissão de certidão de regularidade fiscal a partir da caução especificamente aceita (com possibilidade de trânsito em julgado desta decisão, tal como ocorre atualmente e já há anos) e ao Juízo da execução fiscal decidir sobre aptidão da garantia para suspensão da exigibilidade da dívida, ou da tramitação da execução e demais questões correlatas. Naturalmente, em situação normal, é interessante às partes e ao sistema judiciário que antecipação de garantia e execução de dívida sejam processadas pelo mesmo Juízo, sempre que possível. Não ressoa como melhor solução, contudo, que esta pretensão figure aprioristicamente acima da análise individualizada de cada lide, sempre sob o prisma finalístico do direito processual. 10. Na espécie, diante da reconhecida e consabida especificidade de que as partes litigam em centenas de processos idênticos, não se afigura oportuno impor a reunião de pedido de antecipação de dívida e cobrança de dívidas sob um mesmo Juízo, sob o risco de multiplicação de feitos em processamento e geração de custos consideráveis às partes e à administração judiciária – sem prejuízo de que eventualmente alinhem formalmente entre si a correspondência de método de agrupamento de garantias e débitos a executar. Assim, provê-se solução homogênea a todos os casos envolvendo tais litigantes, de modo a pacificar o entendimento sobre a questão e evitar a adoção de procedimentos contraditórios sobre o cabimento do desmembramento de garantias e títulos executivos. 11. Conflito de competência julgado procedente”. (TRF3, OE, CC nº 5028464-55.2022.4.03.0000, Relator Des. Federal Carlos Muta, j. 28.04.2023). Ante o exposto, julgo procedente o conflito negativo de competência, para declarar o juízo suscitado competente para processar e julgar a execução fiscal ajuizada. É como voto.
V O T O
Trata-se de hipótese em que o contribuinte, com vistas à expedição de certidão de regularidade fiscal bem como para evitar a sua inclusão em cadastro de inadimplentes, antecipou-se à execução fiscal para oferecer garantia em sede de tutela cautelar antecedente.
Cuida-se de uma ação cautelar atípica eis que proposta não por futuro demandante, mas sim por aquele que antevê contra si o ajuizamento de execução fiscal no interregno entre o vencimento da obrigação tributária e o ajuizamento da execução, período em que o contribuinte encontrava-se em situação vulnerável de pré-demanda que lhe era mais desfavorável do que aquele que já havia sido demandado tendo em vista a limitação de seu direito de defesa com vistas à garantia do juízo para expedição de certidão de regulariade fiscal bem como evitar a sua inclusão em cadastro de inadimplesntes.
Nessa esteira, o E. STJ fixou a seguinte tese no Tema 237:
"É possível ao contribuinte, após o vencimento da sua obrigação e antes da execução, garantir o juízo de forma antecipada, para o fim de obter certidão positiva com efeito de negativa."
A discussão objeto do presente conflito encontra-se justamente sobre a ocorrência ou não de prevenção para o julgamento da execução fiscal.
Não se desconhecem os precedentes deste Órgão Especial no sentido da desnecessidade de reunião dos múltiplos feitos de execução fiscal no juízo em que fora julgada ação cautelar, destaco o CC 5028464-55.2022.4.03.0000, de relatoria do e. Desembargador Federal Carlos Muta, julgado em 26.04.2023.
Contudo, observo que o entendimento prevalente está assentado na inconveniência da reunião de múltiplos feitos no que tange à racionalização do julgamento em contrapartida à assunção do risco de decisões conflitantes.
Já naquela ocasião, com a devida vênia ao e. Relator, apresentei voto divergente por não vislumbrar razão para excepionar a regra da reunião de processos conexos prevista no Art. 55, § 3º do CPC e regulamentada pelo Art. 1º, § 1º do Provimento CJF nº 25/2017, tendo em vista que a questão da multiplicidade de feitos distribuídos por prevenção a uma mesma vara encontra solução no próprio algorítmo do sistema eletrônico de distribuição por meio da compensação e equalização do número de processos entre as varas, bem como que não resta dúvida quanto à possibilidade de decisões conflitantes a respeito da aceitabilidade da garantia ofertada.
Entretanto, verifico que o melhor enfoque para o deslinde da questão não é o da conexão entre os feitos, mas sim da assessoriedade entre a ação cautelar e a execução fiscal, nos termos dos artigos 61 e 299 do CPC, in verbis:
"Art. 61. A ação acessória será proposta no juízo competente para a ação principal."
"Art. 299. A tutela provisória será requerida ao juízo da causa e, quando antecedente, ao juízo competente para conhecer do pedido principal."
Sobre a natureza jurídica de ação cautelar da caução prévia não resta dúvida no âmbito do E. STJ de que se trata de mera "antecipação da fase de penhora na execução".
É que vê nos julgados a seguir colacionados de ambas as turmas da 1ª Seção do STJ, a exemplo:
PROCESSUAL CIVIL. CAUTELAR DE CAUÇÃO PRÉVIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PARTES. RESPONSABILIDADE. INEXISTÊNCIA. 1. A cautelar prévia de caução configura-se como mera antecipação de fase de penhora na execução fiscal e, via de regra, é promovida no exclusivo interesse do devedor. 2. Atribuir ao ente federado a causalidade pela cautelar de caução prévia à execução fiscal representa imputar ao credor a obrigatoriedade da propositura imediata da ação executiva, retirando-se dele a discricionariedade da escolha do momento oportuno para a sua proposição e influindo diretamente na liberdade de exercício de seu direito de ação. 3. Ao devedor é assegurado o direito de inicialmente ofertar bens à penhora na execução fiscal, de modo que também não é possível assentar que ele deu causa indevida à medida cautelar tão somente por provocar a antecipação dessa fase processual. 4. Hipótese em que a questão decidida nesta ação cautelar tem natureza jurídica de incidente processual inerente à execução fiscal, não guardando autonomia a ensejar condenação em honorários advocatícios em desfavor de qualquer da partes. 5. Agravo conhecido para dar parcial provimento ao recurso especial. (AREsp 1.521.312/MS, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 09/06/2020, DJe 1º/07/2020); e
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. ALEGAÇÃO GENÉRICA DO DISPOSITIVO LEGAL VIOLADO. DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INCIDÊNCIA, POR ANALOGIA, DA SÚMULA 284/STF. CAUTELAR DE CAUÇÃO PRÉVIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AUSÊNCIA DE RECURSO DA PARTE CONTRÁRIA. REFORMATIO IN PEJUS. SÚMULA 83/STJ. ANÁLISE PREJUDICADA. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CPC/2015. INADEQUAÇÃO AO CASO CONCRETO.
1. Trata-se de Agravo Interno contra decisão que deu provimento ao Recurso Especial para afastar a condenação em honorários.
2. A cautelar prévia com o objetivo de garantir o crédito a fim de obter a certidão positiva de débitos com efeitos de negativa, como é o caso da presente demanda, configura-se como mera antecipação de fase de penhora na execução fiscal. Considerando que ao devedor é assegurado o direito de inicialmente ofertar bens à penhora na execução fiscal, também não é possível assentar que ele deu causa indevida à medida cautelar tão somente por provocar a antecipação dessa fase processual.
3. Agravo Interno não provido.
(AgInt no AREsp n. 2.109.762/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 9/11/2022, DJe de 24/11/2022.)
Note-se que não há sequer condenação em honorários advocatícios justamente porque não se reconhece a autonomia desta ação cautelar.
Expandindo esse conceito de "mera antecipação da fase de penhora" observo que os efeitos da garantia do juízo em ação cautelar perduram para além do ajuizamento da execução fiscal. É o que vê nos precedentes a seguir colacionados:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AÇÃO CAUTELAR. CAUÇÃO OFERECIDA PARA GARANTIA DO DÉBITO E OBTENÇÃO DE CERTIDÃO POSITIVA DE DÉBITOS COM EFEITO DE NEGATIVA. ENTENDIMENTO FIRMADO NO JULGAMENTO DO RESP 1.123.669/RS, SUBMETIDO À SISTEMÁTICA DOS RECURSOS REPETITIVOS.
1. Cuida-se de inconformismo com acórdão do Tribunal de origem que entendeu que a recorrente deveria, após o acolhimento do pedido em primeira instância, ter aditado a petição inicial, com a complementação de sua argumentação e demais pedidos, e dessa forma extinguiu o feito sem resolução do mérito, afastando a aplicação do entendimento dos Recursos Especiais repetitivos 1.156.668 e 1.123.669 ao caso presente, dizendo que são incompatíveis com a atual redação do CPC de 2015.
2. A questão central em exame cinge-se à possibilidade de oferecimento de garantia, em Ação Cautelar, cujo respectivo executivo fiscal ainda não foi ajuizado, visando à obtenção de certidão positiva com efeitos de negativa.
3. A Corte a quo entendeu que "a invocação do precedente do STJ de n° REsp 1.156.668 e também do REsp n° 1.123.669 não pode ser aceito.
Isto porque tais precedentes são antigos, muito anteriores ao atual CPC, tendo sido proferidos sob a égide do CPC de 1973. Deste modo, tratam-se de precedentes em desacordo com a atual regulamentação do CPC de 2015 e anteriores a edição do atual art. 927, não tendo caráter vinculante".
4. Entretanto, o STJ já se manifestou a respeito após a edição do CPC/2015. Consoante o STJ, quando do julgamento do REsp 1.123.669/RS (Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 1/2/2010), submetido à sistemática dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC/1973), reconheceu-se a possibilidade de o contribuinte oferecer caução, mediante Ação Cautelar, antes da propositura da execução fiscal, sendo tal garantia equiparável à penhora antecipada e viabilizadora da certidão pretendida, desde que prestada em valor suficiente à garantia do juízo (Aglnt no AREsp 1.365.883/MS, Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 19/2/2019).
5. Entender que a antecipada garantia do débito, por meio de caução oferecida em Ação Cautelar, e que os efeitos da autorização da expedição de certidão positiva com efeito de negativa perduraram somente até o ajuizamento do processo executivo, implica minimizar o alcance da orientação firmada pelo STJ. 6. Acrescente-se que a sentença julgou procedente o pedido formulado na Inicial, confirmando a liminar concedida e apontando que a requerente ofereceu seguro-garantia a fim de que fosse expedida a certidão positiva com efeitos de negativa, e que portanto, deve ser considerado que a requerente garantiu judicialmente o pagamento do débito para o fim de obter a almejada certidão.
7. Recurso Especial provido.
(REsp n. 1.824.839/SP, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 27/8/2019, DJe de 11/10/2019.)
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 03/STJ. TRIBUTÁRIO. AÇÃO CAUTELAR. CAUÇÃO OFERECIDA PARA GARANTIA DO DÉBITO E OBTENÇÃO DE CERTIDÃO POSITIVA DE DÉBITOS COM EFEITO DE NEGATIVA. POSTERIOR AJUIZAMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO CAUTELAR, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, POR PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO. IMPOSSIBILIDADE, SOB PENA DE MINIMIZAR O ALCANCE DO ENTENDIMENTO FIRMADO NO JULGAMENTO DO RESP 1.123.669/RS, SUBMETIDO À SISTEMÁTICA DOS RECURSOS REPETITIVOS. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.
1. Quando do julgamento do REsp 1.123.669/RS (Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 1/2/2010), submetido à sistemática dos recursos repetitivos (art.
543-C do CPC/1973), reconheceu-se a possibilidade de o contribuinte oferecer caução, mediante ação cautelar, antes da propositura da execução fiscal, sendo tal garantia equiparável à penhora antecipada e viabilizadora da certidão pretendida, desde que prestada em valor suficiente à garantia do juízo.
2. Entender que a antecipada garantia do débito, por meio de caução oferecida em ação cautelar, e que os efeitos da autorização da expedição de certidão positiva com efeito de negativa perduraram somente até o ajuizamento do processo executivo, implica, forçosamente, minimizar o alcance da orientação firmada por esta Corte Superior.
3. Agravo interno não provido.
(AgInt no AREsp n. 1.365.883/MS, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 12/2/2019, DJe de 19/2/2019.); e
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AÇÃO CAUTELAR PARA ASSEGURAR A EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO POSITIVA COM EFEITOS DE NEGATIVA. CAUÇÃO. POSSIBILIDADE.
1. O contribuinte pode, após o vencimento da sua obrigação e antes da execução, garantir o juízo de forma antecipada, para o fim de obter certidão positiva com efeito de negativa (Precedentes do STJ:
EREsp 574.107/PR, DJ 07.05.2007; REsp 940.447/PR, DJ 06.09.2007; e EREsp 779.121/SC, DJ 07.05.2007).
2. O artigo 206, do CTN, dispõe que: "tem os mesmos efeitos previstos no artigo anterior a certidão de que conste a existência de créditos não vencidos, em curso de cobrança executiva em que tenha sido efetivada a penhora, ou cuja exigibilidade esteja suspensa". A caução oferecida pelo contribuinte, antes da propositura da execução fiscal, é equiparável à penhora antecipada e viabiliza a certidão pretendida.
3. É viável a antecipação dos efeitos que seriam obtidos com a penhora no executivo fiscal, através de caução de eficácia semelhante. A percorrer-se entendimento diverso, o contribuinte que contra si tenha ajuizada ação de execução fiscal ostenta condição mais favorável do que aquele contra o qual o Fisco não se voltou judicialmente ainda.
4. Deveras, não pode ser imputado ao contribuinte solvente, isto é, aquele em condições de oferecer bens suficientes à garantia da dívida, prejuízo pela demora do Fisco em ajuizar a execução fiscal para a cobrança do débito tributário. Raciocínio inverso implicaria em que o contribuinte que contra si tenha ajuizada ação de execução fiscal ostenta condição mais favorável do que aquele contra o qual o Fisco ainda não se voltou judicialmente.
5. Mutatis mutandis, o mecanismo assemelha-se ao previsto no art. 570 do CPC, por força do qual o próprio devedor pode iniciar a execução. Isso porque, as obrigações, como vínculos pessoais, nasceram para serem extintas pelo cumprimento, diferentemente dos direitos reais que visam à perpetuação da situação jurídica nele edificadas.
6. Outrossim, instigada a Fazenda pela caução oferecida, pode ela iniciar a execução, convertendo-se a garantia prestada por iniciativa do contribuinte na famigerada penhora que autoriza a expedição da certidão.
7. Embargos de divergência desprovidos.
(EREsp n. 568.209/PR, relator Ministro Luiz Fux, Primeira Seção, julgado em 14/5/2008, DJe de 23/6/2008.)
Nessa linha, não se perca de vista que o pedido formulado na Tutela Antecipada Antecedente pretendia que os efeitos da aceitação de garantia fossem extendidos à "futura Execução fiscal e, consequentemente, a discussão de nulidades em Embargos à Execução".
Acresço que uma vez aceita a garantida da execução ofertada, os efeitos deste julgado alcançam todas as execuções em curso conforme entendimento firmado pelo E. STJ supra citado.
Nestes termos, não sendo reconhecida prevenção no primeiro grau e, consequentemente, em sede de apelação nos embargos à execução distribuídos neste Tribunal, sujeitaríamos esta Corte a situação inusitada de que um mesmo crédito tributário poderia ser objeto de julgamento por certo órgão fracionário, todavia, vinculado à aceitação de garantia por julgado de outra turma.
Ante o exposto, julgo improcedente o presente conflito de competência em razão da ocorrência de prevenção.
É o voto.
Autos n. 5015018-48.2023.4.03.0000
D E C L A R A Ç Ã O D E V O T O
Egrégio Órgão Especial
Cuida-se de conflito negativo de competência em que se discute acerca da competência para o processamento de execuções fiscais precedidas de pedidos de antecipação de garantia.
Colhe-se dos autos que, múltiplas vezes autuada pelo INMETRO, a empresa Nestlé Brasil Ltda. antecipou-se ao ajuizamento das execuções fiscais e ofereceu garantia com vistas a obter certidão positiva com efeitos de negativa.
A possibilidade de obtenção dessa certidão resulta da previsão do artigo 206 do Código Tributário Nacional, verbis:
“ Art. 206. Tem os mesmos efeitos previstos no artigo anterior a certidão de que conste a existência de créditos não vencidos, em curso de cobrança executiva em que tenha sido efetivada a penhora, ou cuja exigibilidade esteja suspensa.”
Visando a alcançar também a situação do contribuinte ou administrado que precisa da certidão de regularidade antes do ajuizamento da execução fiscal, o Superior Tribunal de Justiça firmou jurisprudência no sentido de permitir o oferecimento prévio de garantia pelo interessado mediante a propositura de demanda cautelar. Veja-se:
TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. CAUÇÃO E EXPEDIÇÃO DA CPD-EN. POSSIBILIDADE. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. ART. 151 DO CTN. INEXISTÊNCIA DE EQUIPARAÇÃO DA FIANÇA BANCÁRIA AO DEPÓSITO DO MONTANTE INTEGRAL DO TRIBUTO DEVIDO PARA FINS DE SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE. SÚMULA 112/STJ. VIOLAÇÃO AO ART. 535, II, DO CPC, NÃO CONFIGURADA. MULTA. ART. 538 DO CPC. EXCLUSÃO.
(....)
5. O contribuinte pode, após o vencimento da sua obrigação e antes da execução, garantir o juízo de forma antecipada, para o fim de obter certidão positiva com efeito de negativa.
6. É que a Primeira Seção firmou o entendimento de que: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. AÇÃO CAUTELAR PARA ASSEGURAR A EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO POSITIVA COM EFEITOS DE NEGATIVA. POSSIBILIDADE. INSUFICIÊNCIA DA CAUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.
1. O contribuinte pode, após o vencimento da sua obrigação e antes da execução, garantir o juízo de forma antecipada, para o fim de obter certidão positiva com efeito de negativa. (Precedentes: EDcl no AgRg no REsp 1057365/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04/08/2009, DJe 02/09/2009; EDcl nos EREsp 710.153/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 23/09/2009, DJe 01/10/2009; REsp 1075360/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/06/2009, DJe 23/06/2009; AgRg no REsp 898.412/RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/12/2008, DJe 13/02/2009; REsp 870.566/RS, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/12/2008, DJe 11/02/2009; REsp 746.789/BA, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/11/2008, DJe 24/11/2008; EREsp 574107/PR, Relator Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA DJ 07.05.2007)
2. Dispõe o artigo 206 do CTN que: "tem os mesmos efeitos previstos no artigo anterior a certidão de que conste a existência de créditos não vencidos, em curso de cobrança executiva em que tenha sido efetivada a penhora, ou cuja exigibilidade esteja suspensa."
A caução oferecida pelo contribuinte, antes da propositura da execução fiscal é equiparável à penhora antecipada e viabiliza a certidão pretendida, desde que prestada em valor suficiente à garantia do juízo.
3. É viável a antecipação dos efeitos que seriam obtidos com a penhora no executivo fiscal, através de caução de eficácia semelhante. A percorrer-se entendimento diverso, o contribuinte que contra si tenha ajuizada ação de execução fiscal ostenta condição mais favorável do que aquele contra o qual o Fisco não se voltou judicialmente ainda.
4. Deveras, não pode ser imputado ao contribuinte solvente, isto é, aquele em condições de oferecer bens suficientes à garantia da dívida, prejuízo pela demora do Fisco em ajuizar a execução fiscal para a cobrança do débito tributário. Raciocínio inverso implicaria em que o contribuinte que contra si tenha ajuizada ação de execução fiscal ostenta condição mais favorável do que aquele contra o qual o Fisco ainda não se voltou judicialmente.
5. Mutatis mutandis o mecanismo assemelha-se ao previsto no revogado art. 570 do CPC, por força do qual era lícito ao devedor iniciar a execução. Isso porque as obrigações, como vínculos pessoais, nasceram para serem extintas pelo cumprimento, diferentemente dos direitos reais que visam à perpetuação da situação jurídica nele edificadas.
6. Outrossim, instigada a Fazenda pela caução oferecida, pode ela iniciar a execução, convertendo-se a garantia prestada por iniciativa do contribuinte na famigerada penhora que autoriza a expedição da certidão.
(...)
10. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nesta parte, desprovido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008.
(REsp 1123669/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/12/2009, DJe 01/02/2010)
(....)
12. Recurso especial parcialmente provido, apenas para afastar a multa imposta com base no art. 538, § único do CPC. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008.
(STJ, 1ª Seção, REsp n. 1.156.668/DF, relator Ministro Luiz Fux, julgado em 24/11/2010, DJe de 10/12/2010)
Na linha de pensamento esposada pelo precedente supra, a obtenção da certidão de regularidade não está condicionada à existência de execução fiscal e penhora, podendo o contribuinte garantir o juízo antecipadamente por meio de procedimento judicial de sua iniciativa. Assim, uma vez formalizada a garantia, o contribuinte obterá a certidão desejada; e, uma vez instaurada a execução fiscal, a garantia poderá ser convolada em penhora.
É importante observar que, em 2010, quando se firmou essa jurisprudência, vigia o Código de Processo Civil de 1973, que, dentre os procedimentos cautelares específicos, previa o rito destinado ao oferecimento ou ao pedido de caução (v. arts. 826 e seguintes).
Àquela época, a única via procedimental antecedente ao processo principal era a do processo cautelar, que servia para a postulação e a prestação das tutelas de urgência em geral, ainda que despidas de natureza propriamente cautelar. Em outras palavras, em momento anterior à instauração de processo principal, o rito cautelar era utilizado sempre que se necessitasse de uma medida urgente, mesmo que não se destinasse a assegurar o resultado útil de um provimento jurisdicional definitivo.
Lembre-se, também, que, sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, o processo cautelar era sempre dependente de um processo principal, nos termos do artigo 796; mas, sob certos aspectos e na conformidade de toda a doutrina, ele gozava de autonomia formal, na medida em que abarcava um direito próprio de ação, uma relação processual também própria e uma tutela jurisdicional igualmente específica.
Amadurecido pelas diversas reformas realizadas sobre o Código de Processo Civil de 1973, em especial as alusivas à tutela antecipada, o legislador pátrio deu novo tratamento à matéria quando da edição do Código de Processo Civil de 2015.
Assim, hoje, o Código de Processo Civil não mais prevê procedimentos cautelares específicos e, no Livro V de sua Parte Geral, disciplina a chamada “tutela provisória”, abrangendo a “tutela de evidência” e a “tutela de urgência”, esta última subdividida em “cautelar” e “antecipada”.
Além disso, o Código atual contempla expressamente a possibilidade de buscar-se e obter-se, em caráter antecedente ao processo principal, qualquer tutela de urgência: entre os artigos 303 e 304, tem-se o procedimento da tutela antecipada requerida em caráter antecedente; e entre os artigos 305 e 310, o procedimento da tutela cautelar requerida em caráter antecedente.
Todas essas observações iniciais são importantes para que se identifique, no atual ordenamento legal, a natureza do oferecimento de garantia, em caráter prévio à execução fiscal, para obtenção da certidão de regularidade.
Nesse sentido, parece claro que a medida em questão não possui natureza cautelar, uma vez que não se destina a assegurar o resultado útil de qualquer pronunciamento judicial definitivo, mas, sim, a propiciar o gozo antecipado do direito à certidão. Dito de outro modo: aquele direito que, em princípio e nos termos do artigo 206 do Código Tributário Nacional, só adviria no curso da execução fiscal e mediante a formalização de penhora, pode ser reconhecido e usufruído antes mesmo da propositura do processo de cobrança, desde que oferecida garantia suficiente e idônea.
Assim, avulta que o prévio oferecimento de garantia, na hipótese tratada nos autos que deram origem ao presente conflito, possui natureza de tutela antecipada antecedente.
À primeira vista, pode causar certa estranheza a circunstância de o futuro demandado (executado) requerer tutela antecipada antecedente. Isso porque, comumente, quem a postula é o futuro demandante da tutela jurisdicional principal; mas nada na lei obsta que a tutela de urgência seja requerida por qualquer das partes, não sendo privilégio apenas de uma delas.
Ademais, dúvida não há de que o artigo 206 do Código Tributário Nacional estabelece um direito ao executado, precisamente o de obter a referida certidão; direito que se confere a alguém no bojo de processo instaurado a pedido de outrem.
Assim, não há impedimento a que o futuro executado postule, em caráter antecedente, a antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional a que faria jus se já pendesse a execução e se já houvesse penhora. Essa é a essência do raciocínio que deu origem ao entendimento jurisprudencial supramencionado, que por sinal invoca o artigo 570 do Código de Processo Civil de 1973, dispositivo legal que conferia ao devedor a iniciativa de promover até mesmo a execução.
Sendo, pois, o oferecimento de garantia uma modalidade de tutela antecipada antecedente, a conclusão a que se chega é a de que a competência para processar e julgar tal pedido conforma-se à regra do artigo 299, caput, do Código de Processo Civil:
“ Art. 299. A tutela provisória será requerida ao juízo da causa e, quando antecedente, ao juízo competente para conhecer do pedido principal.”
Essa regra de competência é de perfil funcional, pois conecta as funções jurisdicionais exercidas tanto no procedimento antecedente quanto no procedimento principal, daí resultando que a garantia prévia há de ser oferecida perante o juízo competente para a execução fiscal.
Sendo de caráter funcional, a competência é absoluta, revelando-se nítido o interesse público em que o mesmo juízo decida sobre a garantia prévia, destinada a convolar-se em penhora na execução fiscal, exatamente como preconizado no precedente de início citado. Não por outra razão, as questões que se colocam no procedimento prévio de oferecimento de garantia são as mesmas que se põem na execução fiscal: suficiência, idoneidade e liquidez da garantia, além da observância da ordem legal.
Ora, não há dúvida de que interessa à efetividade da tutela jurisdicional a análise, por um único juízo, de questões que dizem respeito ao mesmo direito.
Na verdade, não há diferença essencial entre obter-se a certidão antes do ajuizamento da execução fiscal ou já na pendência desta. Os requisitos e critérios legais e judiciais são os mesmos, tanto para a caução prévia quanto para a formalização da penhora.
Essa constatação evidencia, ademais, o verdadeiro caráter acessório do rito de oferecimento antecipado da garantia. Não se cuida, portanto, de demanda autônoma, porquanto sempre indissociavelmente ligada à execução fiscal, ainda que futura.
De qualquer sorte, mesmo para aqueles que eventualmente vejam natureza de ação em tal pedido, é certo que ela não gozaria de independência, ou seja, não poderia existir isoladamente ou de todo desprendida de uma outra ação, de caráter principal. Seu caráter acessório é claro e, destarte, o presente conflito poderia ser resolvido à luz do artigo 61 do Código de Processo Civil atual:
“ Art. 61. A ação acessória será proposta no juízo competente para a ação principal.”
E, para quem veja, apesar das considerações já feitas neste voto, natureza cautelar no oferecimento prévio de garantia, ainda assim a competência seria funcional e absoluta, seja por força do artigo 299 do Código de Processo Civil atual, acima reproduzido, seja em razão do artigo 800 do Código de Processo Civil revogado, que também previa regra de competência de tal natureza.
Sintetizando o que até aqui foi deduzido, tem-se que:
a) na vigência do Código de Processo Civil de 1973, quando se firmou a jurisprudência viabilizadora do oferecimento prévio de garantia, a via procedimental adequada era a do processo cautelar, formalmente autônomo, mas essencialmente dependente de um processo principal;
b) à época, tinha-se um vínculo funcional e, portanto, absoluto, entre as competências para processar o feito cautelar e o feito principal, nos termos do art. 800 daquele Código;
c) hoje, o oferecimento prévio de garantia consiste em pedido de tutela antecipada antecedente, relativamente ao qual incide a regra do artigo 299 do Código de Processo Civil, também de caráter funcional e absoluto;
d) para quem, eventualmente, identifique em tal pedido a natureza cautelar ou de demanda acessória, ainda assim a competência será funcional e absoluta, nos termos dos artigos 299 e 61 do Código de Processo Civil, respectivamente.
Portanto, por qualquer ângulo que se analise a questão, a solução alcançada é sempre a mesma: trata-se de competência funcional e absoluta, insuscetível de modificação.
Não é possível, porém, encerrar este voto sem analisar as razões que norteiam o entendimento contrário, sustentado pelo e. relator.
Segundo Sua Excelência, conquanto certo que, como regra, competiria ao mesmo juízo processar tanto o oferecimento prévio de garantia quanto a execução fiscal, o caso presente envolveria uma “excepcionalidade”, justificadora da desvinculação entre os feitos.
Essa singularidade consistiria no fato de que a empresa autuada valeu-se de uma única garantia para alcançar dezenas de débitos, de sorte que “impor que cada execução fiscal proposta seja atribuída ao Juízo da plúrima antecipação de garantia vai de encontro à efetividade e celeridade da prestação jurisdicional”.
Com a devida vênia, em tema de competência absoluta descabem considerações em torno de maior ou menor celeridade. A celeridade é princípio inerente ao procedimento, que não se sobrepõe às normas de processo, propriamente ditas. Não por outra razão é que não há falar em celeridade em detrimento do direito de defesa ou do contraditório, tampouco em desfavor de regra de competência absoluta. A celeridade e a razoável duração do processo hão de ser buscadas sem prejuízo do respeito às garantias fundamentais do processo e às normas de ordem pública, como o são as regras de competência absoluta.
De outra parte, não se vê prejuízo à efetividade do processo na distribuição das execuções fiscais ao mesmo juízo do oferecimento da garantia. A uma, porque não há necessidade de apensamento ou agrupamento das execuções fiscais, para que tenham andamento em conjunto. Elas podem tramitar separadamente, perante o mesmo juízo, bastando que em cada uma delas se atente para a existência e a formalização da garantia. A duas, porque o próprio sistema de distribuição promove a compensação entre os juízos, equilibrando quantitativamente os feitos entre eles.
Na verdade, a distribuição das execuções fiscais a juízos diversos é que pode comprometer a efetividade da jurisdição. Se cada juízo executivo for rever a suficiência e a idoneidade da garantia, bem assim a observância ou não da ordem legal, demandar-se-á maior tempo e maior energia, sem falar na adoção de critérios diversos para situações análogas envolvendo as mesmas partes.
Sob outro aspecto e analisando-se argumento expendido pelo juízo suscitante, nada importa que o procedimento de garantia antecipada tenha sido julgado, uma vez que exceção à reunião de feitos em razão de julgamento de um deles é própria e específica das hipóteses de competência relativa.
Ora, o artigo 55, § 1º, do Código de Processo Civil, na linha do enunciado n. 235 da Súmula da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, trata especificamente de demandas conexas, o que não é a hipótese presente.
Com efeito, a exemplo da continência, a conexão modifica a competência relativa, nos termos do artigo 54 do Código de Processo Civil. Já a competência absoluta – determinada em razão da matéria, da pessoa ou da função – é inderrogável por convenção das partes ou, mesmo, por decisão fundada em juízo de conveniência ou oportunidade.
Ademais, a conexão é fenômeno que se verifica entre demandas autônomas, não entre feitos principal e acessório, tampouco entre pedido de tutela antecipada antecedente e pedido definitivo.
Do mesmo modo, nada importa que o oferecimento de garantia tenha sido julgado improcedente, pois não existe, no nosso ordenamento jurídico, regra de competência determinada pelo resultado do julgamento.
Quanto ao argumento de que a C. 2ª Seção excepcionou a regra da vinculação entre os feitos quando ajuizados em foros diversos, são necessários alguns esclarecimentos.
No precedente indicado pelo e. relator, efetivamente se entendeu que a escolha de foro, realizada pelo devedor quando do pedido de apresentação de garantia, não determinava a redistribuição da posterior execução fiscal ajuizada em foro diverso, porque, se tal se desse, restaria prejudicado o direito do credor de escolher, dentre as opções legais, o local de sua preferência para a tramitação da execução.
Ocorre que, naquele conflito, o que se discutia era se a execução fiscal haveria de ser redistribuída para o foro de tramitação do pedido de garantia. Naturalmente, decidiu-se negativamente. Se a discussão recaísse, contudo, sobre a competência para o processo acessório, a solução poderia e haveria de ser outra, cabendo sua redistribuição ao foro e juízo do processo principal.
Deveras, havendo opções de foro, a competência para o feito acessório, quando promovido pelo futuro réu, possui caráter provisório, ou seja, prevalece até que se firme a competência para o feito principal. Isso é perfeitamente possível, especialmente em sede de tutela de urgência, há muito se aplicando o entendimento de que, havendo perigo da demora, até mesmo o juízo incompetente pode adotar as medidas necessárias, incumbindo-lhe, todavia, o subsequente envio do feito ao juízo competente.
Já a prevenção, critério para a fixação da competência, pressupõe competências de igual condição e grau, como é o caso do presente conflito, diversamente daquele referido no precedente invocado pelo e. relator.
Por fim, cabe perquirir qual seria, no entendimento do qual ora se diverge, o critério objetivo para aferir-se a suposta excepcionalidade. A partir de quantos autos de infração abarcados pela mesma garantia haveria espaço para a quebra da regra geral de competência? São necessários centenas, dezenas, uma dúzia ou um par? Não parece que possa o Poder Judiciário, sem força legiferante e com base em juízo subjetivo de conveniência e oportunidade, fixar a competência para cada caso que lhe venha à apreciação.
Ante o exposto, forte na convicção de que se trata de competência absoluta, insuscetível de modificação por juízo de conveniência, oportunidade ou mesmo celeridade, peço vênia ao e. relator para dissentir de seu d. voto e, assim, julgar improcedente o conflito.
É como voto.
Nelton dos Santos
Desembargador Federal
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. EXECUÇÃO FISCAL. PRÉVIA AÇÃO PARA ANTECIPAÇÃO DE GARANTIA DE MÚLTIPLOS DÉBITOS. PREVENÇÃO. INOCORRÊNCIA. INCIDENTE PROCEDENTE.
1. Discute-se a existência de prevenção, para fins de processar e julgar execução fiscal, do juízo especializado em execuções fiscais, em que processada ação visando à antecipação de garantia do respectivo débito, dentre múltiplos outros.
2. Não se olvida que o artigo 1º, I e III, §1º, do Provimento CJF3R nº 25/2017 estabelece a prevenção do Juízo Especializado para a execução fiscal correspondente ao crédito acautelado ou garantido em medidas cautelares fiscais ou ações e tutelas tendentes à antecipação da garantia da execução fiscal. Contudo, não se pode perder de vista que o Código de Processo Civil (artigos 54 e 55) autoriza a modificação da competência relativa pela conexão visando à segurança jurídica, a fim de evitar a prolação de decisões conflitantes ou contraditórias.
3. O e. Supremo Tribunal Federal, no julgamento das ADIs nºs 5.492 e 5.737, restringiu a aplicação do artigo 46, §5º, do CPC aos limites do território de cada ente subnacional ou ao local de ocorrência do fato gerador, de sorte que o foro de domicílio do devedor não será, necessariamente, observado para fins de ajuizamento da execução fiscal.
4. A questão que, a princípio, poderia ser entendida como uma simples reunião de processos conexos, revela-se bastante tormentosa quando as ações que visam à prestação de garantia prévia ao ajuizamento de execução fiscal reúnem, num mesmo processo, uma diversidade de débitos cuja execução fiscal não necessariamente será objeto de processo único. Este o caso concreto, em que a ação primeva objetivou garantir múltiplos débitos, cujas execuções fiscais são ajuizadas em diversos processos, perante diversos juízos, de acordo com as regras de competências próprias ao rito executivo fiscal.
5. Nesta Corte, em razão da competência prevista para as 1ª e 2ª Seções, as quais englobam execuções fiscais relacionadas a empresas que, usualmente, procedem ao ajuizamento de demandas para fins de antecipação de garantias prévias, observou-se a necessidade de uniformização, pelo Órgão Especial, do entendimento a ser adotado no âmbito do Tribunal (artigo 17, II e III, do RITRF3). Este e. Órgão Especial, majoritariamente, entendeu que “diante da reconhecida e consabida especificidade de que as partes litigam em centenas de processos idênticos, não se afigura oportuno impor a reunião de pedido de antecipação de dívida e cobrança de dívidas sob um mesmo Juízo, sob o risco de multiplicação de feitos em processamento e geração de custos consideráveis às partes e à administração judiciária – sem prejuízo de que eventualmente alinhem formalmente entre si a correspondência de método de agrupamento de garantias e débitos a executar. Assim, provê-se solução homogênea a todos os casos envolvendo tais litigantes, de modo a pacificar o entendimento sobre a questão e evitar a adoção de procedimentos contraditórios sobre o cabimento do desmembramento de garantias e títulos executivos”. Precedente.
6. Conflito negativo de competência julgado procedente.