APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000652-65.2018.4.03.6115
RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, ABENGOA BIOENERGIA AGROINDUSTRIA LTDA
Advogado do(a) APELANTE: WILSON CARLOS GUIMARAES - SP88310-N
APELADO: ABENGOA BIOENERGIA AGROINDUSTRIA LTDA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
Advogados do(a) APELADO: FABIO IZIQUE CHEBABI - SP184668-A, WILSON CARLOS GUIMARAES - SP88310-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000652-65.2018.4.03.6115 RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, ABENGOA BIOENERGIA AGROINDUSTRIA LTDA Advogado do(a) APELANTE: WILSON CARLOS GUIMARAES - SP88310-N APELADO: ABENGOA BIOENERGIA AGROINDUSTRIA LTDA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL Advogados do(a) APELADO: FABIO IZIQUE CHEBABI - SP184668-A, WILSON CARLOS GUIMARAES - SP88310-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de ação ajuizada pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em face da Abengoa Bioenergia Agroindustria Ltda, objetivando indenização correspondente ao valor despendido para pagamento de benefício previdenciário decorrente de acidente de trabalho concedido a trabalhador da ré. O juízo a quo reconheceu a prescrição da pretensão ressarcitória e extinguiu o feito (ID 7211082). O INSS apelou e o então relator, monocraticamente, deu provimento ao recurso para afastar a prescrição e determinar o retorno dos autos à vara de origem para o regular prosseguimento do feito (ID 34874234). O agravo interno interposto pela empresa ré foi julgado provido pela Turma, para anular a decisão monocrática e determinar o retorno dos autos ao relator para julgamento da apelação por meio de decisão colegiada (ID 146865708). A Turma, por unanimidade, deu provimento à apelação do INSS, para afastar a prescrição e determinar o retorno dos autos à origem para regular prosseguimento do feito (ID 158414382). Uma nova sentença foi proferida, julgando procedente o pedido para condenar a parte ré a pagar à parte autora indenização correspondente ao valor pago à vítima Everton Luís Cassiano de Oliveira, a título de benefícios previdenciários acidentário de números 91/602.381.657-0 e 94/605.131.837-6, até a data da liquidação e até a data de cessação de aludidos benefícios. Esses valores serão pagos pela parte ré até o dia 20 de cada mês, por meio de guia da previdência social (GPS) preenchida com o código 9636 (CNPJ). O valor devido será corrigido monetariamente e acrescido de juros moratórios contados da data do evento danoso, que no caso é o pagamento de cada prestação do benefício concedido pelo INSS, nos termos da Resolução CJF nº 134/2010, com a redação dada pela Resolução CJF nº 267/2013. Condenou a ré, ainda, a pagar honorários advocatícios calculados sobre o valor atualizado da condenação, observados os percentuais mínimos previstos no artigo 85, § 3º, do Código de Processo Civil (ID 272853484). Os embargos de declaração da parte autora foram acolhidos em parte tão somente para corrigir erro material e os embargos de declaração da parte ré também foram acolhidos em parte para afastar a contradição e assegurar que a apresentação das alegações finais se deu no prazo legal, sendo, portanto, tempestivas (ID 272853503). O INSS apelou, sustentando, em síntese, que, impõe-se a aplicação da taxa SELIC quanto à correção e juros de mora do ressarcimento das parcelas em atraso, desde o desembolso de cada prestação previdenciária paga pelo INSS, por ser o índice obrigatório na atualização dos créditos, de qualquer natureza, das autarquias e fundações públicas federais, em razão da norma expressa do art. 37-A da Lei n° 10.522/2002 (incluída pela Medida Provisória n° 449/2008, convertida na Lei n° 11.941/2009), combinado com o art. 61, § 3°, da Lei n° 9.430/1996. A empresa ré também apelou, alegando, em suma, que: a) se o empregador é obrigado a recolher aos cofres da Previdência o SAT (Seguro de Acidentes de Trabalho), mediante as alíquotas variáveis de acordo com o FAT (Fator multiplicador, que varia de 1% a 3%, instituído pela Lei nº 10.666, de 8 de maio de 2003), não pode ser demandado em ação regressiva, advindo daí a inconstitucionalidade dos artigos 120 e 121 da Lei nº 8.213/91; b) não há comprovação de qualquer ofensa às normas gerais de padrão de segurança e higiene do trabalho que tenha, de forma objetiva, sido a causadora do acidente e dos respectivos danos, sendo certo que, para que nasça o dever de indenização, é necessário que tal “desconformidade” gere a possibilidade real de acidente de trabalho; c) a testemunha Everton Mazzoneto confirmou que trabalhou com o funcionário que se acidentou e que ele e todos os demais funcionários que operavam com o desfibrador recebiam treinamentos ministrados por um analista mais experiente, e que os funcionários não podiam, de forma alguma, utilizar as mãos para empurrar a cana-de-açúcar; d) a culpa pelo acidente se deu exclusivamente pela vítima e, ainda que assim não fosse, deverá ser reconhecida a parcela de culpa, mesmo que proporcional, do empregado, que agiu de forma imprudente e negligente, devendo ser limitada eventual condenação, no mínimo, pela metade da indenização devida; e) tratando-se de ação indenizatória de perdas e danos, aplica-se ao caso o disposto no artigo 405 do Código Civil, ou seja, devem os juros de mora fluir a partir da citação e não do evento danoso. Com contrarrazões apenas do INSS, em que se requer a majoração dos honorários advocatícios, vieram os autos a este Tribunal. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000652-65.2018.4.03.6115 RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, ABENGOA BIOENERGIA AGROINDUSTRIA LTDA Advogado do(a) APELANTE: WILSON CARLOS GUIMARAES - SP88310-N APELADO: ABENGOA BIOENERGIA AGROINDUSTRIA LTDA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL Advogados do(a) APELADO: FABIO IZIQUE CHEBABI - SP184668-A, WILSON CARLOS GUIMARAES - SP88310-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Senhor Desembargador Federal Nelton dos Santos (Relator): De início, com relação à alegação de inconstitucionalidade dos artigos 120 e 121 da Lei nº 8.213/91, cabe destacar que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 677725, em 11.11.2021, pelo rito da repercussão geral, consignou expressamente que “o sistema de financiamento do Seguro de Acidente de Trabalho (SAT) e da Aposentadoria Especial visa suportar os benefícios previdenciários acidentários decorrentes das doenças ocupacionais”, sendo que a “Contribuição Social para o Seguro de Acidente de Trabalho (SAT) tem fundamentado nos artigos 7º, XXVIII, 194, parágrafo único, V, e 195, I, todos da CRFB/88”. Na oportunidade, destacou, ainda, que o “sistema impregnado, principalmente, pelos Princípios da Solidariedade Social e da Equivalência (custo-benefício ou prêmio versus sinistro), impõe maior ônus às empresas com maior sinistralidade por atividade econômica”. Nesse sentido, a Corte Suprema já definiu que os referidos artigos têm suporte constitucional no artigo 7º, inciso XXVIII, parte final, da Constituição Federal, o qual confere ao trabalhador direito a seguro contra acidentes de trabalho, mas sem prejuízo da indenização a que estiver obrigado o responsável pelo acidente, quando concorrer com dolo ou culpa. Com efeito, a contribuição ao SAT é norma que vem ao encontro dos direitos dos trabalhadores, enquanto a ação regressiva busca a reparação pecuniária do INSS pelo pagamento de benefício, em razão de negligência do empregador. Prosseguindo, é dever da empresa fiscalizar o cumprimento das determinações e procedimentos de segurança, não lhe sendo dado eximir-se da responsabilidade pelas consequências quando tais normas não são cumpridas, ou o são de forma inadequada, afirmando de modo simplista que cumpriu com seu dever. Consta dos autos que, no dia 13.06.2013, o segurado Everton Luis Cassiano de Oliveira, empregado da ré, ao executar a tarefa de operar um desfibrador, inserindo nele partes de cana-de-açúcar, sofreu amputação dos dedos da mão direita pelas partes móveis (lâminas) da máquina. No caso em apreço, a análise de acidente de trabalho, realizada pelo Ministério do Trabalho, apontou a existência de diversas irregularidades na condução do trabalho, quais sejam: i) falta de proteção no desfibrador; ii) intervenção em condições ergonomicamente inadequadas (atividade realizada em pé e em posição de difícil alcance do desfibrador); iii) o modo de operação da máquina necessita que o operador utilize suas mãos ou outro pedaço de cana para funcionamento do equipamento; iv) falta de proteções fixas e/ou dispositivos mecânicos e/ou proteções móveis e/ou dispositivos do tipo sensores de segurança (ID 7210820 - Pág. 12). Essas mesmas questões foram analisadas pela Vara do Trabalho de Pirassununga, no bojo dos autos de nº 00257-75.2014.5.15.0136, que concluiu no sentido de que a falta de dispositivos de segurança e o projeto irregular da máquina tornavam vulnerável a operação do equipamento (ID 7210820 - Pág. 94-104). Além disso, o testemunho de Everton Mazzonetto, colega de trabalho da vítima, confirma que as medidas de segurança recomendadas não foram adotadas pelo empregador, pois, embora não fosse autorizado ao funcionário utilizar as mãos para empurrar a cana para dentro do desfibrador, depois do acidente, a empresa instalou na máquina uma extensão de grade, além da proteção de 20 cm que já existia. Ou seja, o empregador se preocupou em colocar uma proteção extra no equipamento somente após o evento danoso. À vista disso, cumpre asseverar que, ainda que a vítima tenha sido submetida a treinamento, o desfibrador é um equipamento perigoso e desprovido de sistema de proteção adequado, tanto que no documento de ID 7210820 - Pág. 10, expedido pelo Ministério do Trabalho e Emprego, constatou-se que o “empregado teve acesso a zona de perigo da máquina ocasionando o acidente de trabalho, apesar de existir uma proteção fixa e móvel no acesso mais próximo da lâmina do desfibrador”. Ora, se a máquina é mal concebida, opera com condições ergonômicas inadequadas e com falta de dispositivo de proteção, a responsabilidade pelo acidente é exclusiva do empregador, que não proporciona um ambiente de trabalho seguro. Registre-se que nas ações regressivas ajuizadas pelo INSS, por se tratar de responsabilidade extracontratual por ato ilícito, os juros de mora deverão fluir a partir do evento danoso, nos termos da Súmula nº 54 do STJ. Veja-se: “PREVIDENCIÁRIO. ACIDENTE DO TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA DO INSS. ART. 120 DA LEI N. 8.213/1991. RECURSO ESPECIAL DA EMPRESA. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 489 E 1.022 DO CPC/2015. INEXISTÊNCIA. NEGLIGÊNCIA DA EMPREGADORA. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. REEXAME FÁTICO - PROBATÓRIO. SÚMULA N. 7/STJ. RECURSO ESPECIAL DO INSS. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. DATA DO EVENTO DANOSO. SÚMULA N. 54/STJ. I - Na origem, cuida-se de ação regressiva ajuizada pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em desfavor da empresa Masisa do Brasil Ltda. objetivando o ressarcimento das despesas causadas à Previdência Social com o pagamento de benefícios acidentários. II - Impõe-se o afastamento de alegada violação dos arts. 489 e 1.022 do CPC/2015 quando a questão apontada como omitida pelo recorrente foi examinada de modo fundamentado no acórdão recorrido, caracterizando o intuito revisional dos embargos de declaração. III - A jurisprudência do STJ é no sentido de que a contribuição ao SAT não exime o empregador da sua responsabilização por culpa em acidente de trabalho, conforme art. 120 da Lei n. 8.213/1991. Precedentes: AgInt no REsp n. 1.677.388/RS, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 7/6/2018, DJe 20/6/2018; e REsp n. 1.666.241/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 27/6/2017, DJe 30/6/2017. IV - Havendo o Tribunal de origem, em vasta decisão e com fundamento nos fatos e provas dos autos, concluído que o acidente que vitimou os segurados decorreu de negligência da empresa quanto ao cumprimento das normas de segurança do trabalho em relação a risco específico da atividade industrial, de explosão e incêndio, a inversão do julgado demandaria o reexame de fatos e provas dos autos, o que é vedado na instância especial ante o óbice do enunciado n. 7 da Súmula do STJ. V - De acordo com a jurisprudência do STJ, entende-se que, por se tratar de responsabilidade extracontratual por ato ilícito, nas ações regressivas ajuizadas pelo INSS, os juros de mora deverão fluir a partir do evento danoso, nos termos do enunciado n. 54 da Súmula do STJ: "Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual". Precedentes: REsp n. 1.673.513/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 28/11/2017, DJe 1º/12/2017; AgInt no REsp n. 1.373.984/DF, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 9.8.2017; e AgInt no AREsp n. 410.097/PR, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 10.2.2017. VI - Recurso especial da empresa parcialmente conhecido e improvido; Recurso especial do INSS provido para fixar o evento danoso como termo inicial dos juros de mora”. (REsp n. 1.745.544/RS, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 13/12/2018, DJe de 18/12/2018.) (grifei) “PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO Nº 3/STJ. AÇÃO REGRESSIVA. ARTIGO 120 DA LEI 8.213/1991. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. TAXA SELIC. ARTIGOS 37-A DA LEI 10.522/2002 E 61 DA LEI 9.430/1996. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. DATA DO EVENTO DANOSO. SÚMULA 54 DO STJ. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA PARTE, PROVIDO. 1. O Tribunal de origem não se manifestou sobre os artigos 37-A da Lei 10.522/2002 e 61 da Lei 9.430/1996, bem como sobre a respectiva tese de que após dezembro de 2008 a aplicação da taxa Selic é obrigatória para a atualização dos créditos das autarquias e fundações públicas. Portanto, desatendido, no ponto, o requisito do prequestionamento, nos termos da Súmula 211/STJ. 2. A ação regressiva intentada pelo INSS visa ressarcir os cofres públicos dos gastos com o pagamento de benefícios previdenciários oriundos de acidente de trabalho, causado pela negligência do empregador quanto à observância das normas de segurança e higiene do trabalho. Trata-se, em verdade, de responsabilidade extracontratual por ato ilícito, porquanto, o empregador, por culpa ou dolo, deixa de observar as normas de segurança do trabalho, conduta determinante para a ocorrência do acidente. 3. Tratando-se de responsabilidade extracontratual por ato ilícito, os juros de mora deverão fluir a partir do evento danoso, nos termos da Súmula 54 do STJ, in verbis: "Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual". Precedente: REsp 1393428/SC, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 21/11/2013, DJe 06/12/2013. 4. Portanto, com relação às parcelas vencidas, os juros de mora deverão incidir a partir do evento danoso, nos termos da Súmula 54/STJ. 5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido. (REsp n. 1.673.513/RS, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 28/11/2017, DJe de 1/12/2017.) (grifei) E mais, considerando que a condenação judicial em tela envolve a Fazenda Pública, a incidência de juros de mora e de correção monetária deve observar os seguintes parâmetros: (a) até julho/2001: juros de mora: 1% ao mês (capitalização simples); correção monetária: índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b) agosto/2001 a junho/2009: juros de mora: 0,5% ao mês; correção monetária: IPCA-E; (c) a partir de julho/2009: juros de mora: remuneração oficial da caderneta de poupança; correção monetária: IPCA-E (Tema Repetitivo 905 do STJ, Tese 3.1.1, e Tema 810 de Repercussão Geral do STF). A partir de 09.12.2021, conforme o art. 3º da EC 113/2021, sobre o capital “haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente”. A respeito do tema, colhe-se o seguinte precedente deste Tribunal: “EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AÇÃO REGRESSIVA. INSS. ACIDENTE DE TRABALHO. RESSARCIMENTO. ART. 120 DA LEI Nº 8.212/1991. NORMAS PADRÃO DE SEGURANÇA E DE HIGIENE. DOLO OU CULPA. REQUISITOS CUMULATIVOS. - O art. 7º, XXII e XXVIII e o art. 210, §10, ambos da Constituição, dão amparo à redação originária do art. 120 da Lei nº 8.213/1991, agora ampliada pela Lei nº 13.846/2019. As responsabilidades do empregador ou do contratante do trabalhador decorrem de primados do sistema jurídico, mas o art. 19 dessa mesma Lei nº 8.213/1991 reforçou essas exigências ao definir acidente de trabalho. (...) - O termo a quo do cálculo da atualização monetária e dos juros moratórios é a Data do Início do Pagamento – DIP, que expressa o momento do efetivo prejuízo, devendo ser calculadas em fase de liquidação de sentença (art. 509, § 2º, do CPC). - Tratando-se de consectários decorrentes de ação regressiva ajuizada pelo INSS para reaver valores já dispendidos a título de benefício previdenciário em decorrência de acidente de trabalho (art. 120 da Lei nº 8.213/1991), aplica-se a SELIC (que engloba juros e correção monetária) desde cada evento danoso (Súmula 54 do E.STJ, para esse fim, o dia de cada dispêndio mensal da autarquia a título da benesse paga), por força do art. 406 do Código Civil, do art. 30 da Lei 10.522/2002 e de demais aplicáveis, inclusive pelo contido no Manual de Cálculos da Justiça Federal (item 4.2, em vista da caracterização da responsabilidade extracontratual). - Embargos de declaração acolhidos com efeitos modificativos”. (TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0003193-91.2016.4.03.6127, Rel. Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, julgado em 20/03/2023, Intimação via sistema DATA: 27/03/2023) (grifei) Por fim, majoro em 2% (dois por cento) os honorários advocatícios sucumbenciais, nos termos do art. 85, § 11 do CPC. Diante do exposto, DOU PROVIMENTO PARCIAL à apelação do INSS para determinar a incidência da taxa Selic sobre a condenação a partir de 09.12.2021 e NEGO PROVIMENTO à apelação da ré. É como voto.
E M E N T A
PROCESSO CIVIL. CONSTITUCIONALIDADE DOS ARTIGOS 20 E 21 DA LEI 8.213/91. AÇÃO REGRESSIVA. ACIDENTE DE TRABALHO. RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR. EQUIPAMENTO PERIGOSO E SEM DISPOSITIVOS DE SEGURANÇA. VIOLAÇÃO ÀS NORMAS DE SAÚDE, HIGIENE E SEGURANÇA DO TRABALHO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. APELAÇÃO DA RÉ DESPROVIDA.
1. Com relação à alegação de inconstitucionalidade dos artigos 120 e 121 da Lei nº 8.213/91, cabe destacar que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 677725, em 11.11.2021, pelo rito da repercussão geral, consignou expressamente que “o sistema de financiamento do Seguro de Acidente de Trabalho (SAT) e da Aposentadoria Especial visa suportar os benefícios previdenciários acidentários decorrentes das doenças ocupacionais”, sendo que a “Contribuição Social para o Seguro de Acidente de Trabalho (SAT) tem fundamentado nos artigos 7º, XXVIII, 194, parágrafo único, V, e 195, I, todos da CRFB/88”. Na oportunidade, destacou, ainda, que o “sistema impregnado, principalmente, pelos Princípios da Solidariedade Social e da Equivalência (custo-benefício ou prêmio versus sinistro), impõe maior ônus às empresas com maior sinistralidade por atividade econômica”.
2. Nesse sentido, a Corte Suprema já definiu que os referidos artigos têm suporte constitucional no artigo 7º, inciso XXVIII, parte final, da Constituição Federal, o qual confere ao trabalhador direito a seguro contra acidentes de trabalho, mas sem prejuízo da indenização a que estiver obrigado o responsável pelo acidente, quando concorrer com dolo ou culpa.
3. Com efeito, a contribuição ao SAT é norma que vem ao encontro dos direitos dos trabalhadores, enquanto a ação regressiva busca a reparação pecuniária do INSS pelo pagamento de benefício, em razão de negligência do empregador.
4. É dever da empresa fiscalizar o cumprimento das determinações e procedimentos de segurança, não lhe sendo dado eximir-se da responsabilidade pelas consequências quando tais normas não são cumpridas, ou o são de forma inadequada, afirmando de modo simplista que cumpriu com seu dever.
5. No caso em apreço, a análise de acidente de trabalho, realizada pelo Ministério do Trabalho, apontou a existência de diversas irregularidades na condução do trabalho, quais sejam: i) falta de proteção no desfibrador; ii) intervenção em condições ergonomicamente inadequadas (atividade realizada em pé e em posição de difícil alcance do desfibrador); iii) o modo de operação da máquina necessita que o operador utilize suas mãos ou outro pedaço de cana para funcionamento do equipamento; iv) falta de proteções fixas e/ou dispositivos mecânicos e/ou proteções móveis e/ou dispositivos do tipo sensores de segurança.
6. Essas mesmas questões foram analisadas pela Vara do Trabalho de Pirassununga, no bojo de ação trabalhista movida pela vítima contra o empregador, que concluiu no sentido de que a falta de dispositivos de segurança e o projeto irregular da máquina tornavam vulnerável a operação do equipamento.
7. Além disso, o testemunho de um colega de trabalho da vítima confirma que as medidas de segurança recomendadas não foram adotadas pelo empregador, pois, embora não fosse autorizado ao funcionário utilizar as mãos para empurrar a cana para dentro do desfibrador, depois do acidente, a empresa instalou na máquina uma extensão de grade, além da proteção de 20 cm que já existia. Ou seja, o empregador se preocupou em colocar uma proteção extra no equipamento somente após o evento danoso.
8. Ainda que a vítima tenha sido submetida a treinamento, o desfibrador é um equipamento perigoso e desprovido de sistema de proteção adequado, tanto que o Ministério do Trabalho ressaltou que o “empregado teve acesso a zona de perigo da máquina ocasionando o acidente de trabalho, apesar de existir uma proteção fixa e móvel no acesso mais próximo da lâmina do desfibrador”.
9. Ora, se a máquina é mal concebida, opera com condições ergonômicas inadequadas e com falta de dispositivo de proteção, a responsabilidade pelo acidente é exclusiva do empregador, que não proporciona um ambiente de trabalho seguro.
10. Nas ações regressivas ajuizadas pelo INSS, por se tratar de responsabilidade extracontratual por ato ilícito, os juros de mora deverão fluir a partir do evento danoso, nos termos da Súmula nº 54 do STJ.
11. Considerando que a condenação judicial em tela envolve a Fazenda Pública, a incidência de juros de mora e de correção monetária, a partir de 09.12.2021, se dará pela taxa Selic, conforme disposto no art. 3º da EC 113/2021.
12. Apelação do INSS parcialmente provida. Apelação da ré desprovida.