Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5014016-14.2021.4.03.0000

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

AGRAVANTE: ADRIANA DE OLIVEIRA ROCHA

Advogados do(a) AGRAVANTE: JOSE RIZKALLAH JUNIOR - MS6125-B, MARINA BOIGUES IDALGO - MS15549-A

AGRAVADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL NO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5014016-14.2021.4.03.0000

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

AGRAVANTE: ADRIANA DE OLIVEIRA ROCHA

Advogados do(a) AGRAVANTE: JOSE RIZKALLAH JUNIOR - MS6125-B, MARINA BOIGUES IDALGO - MS15549

AGRAVADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL NO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de antecipação da tutela, interposto por ADRIANA DE OLIVEIRA ROCHA, contra a decisão proferida pelo r. Juízo da 4ª Vara Federal de Campo Grande, que, nos autos da Ação Civil Pública de Improbidade Administrativa nº 0014897-02.2013.4.03.6000, recebeu a petição inicial em seu desfavor e determinou a indisponibilidade de seus bens no montante de R$ 742.762,44 (setecentos e quarenta e dois mil setecentos e sessenta e dois reais e quarenta e quatro centavos).

Cuida-se, na origem, de Ação de Improbidade Administrativa ajuizada pelo Ministério Público Federal em face de MARIA CRISTINA DE BARROS MIGUÉIS, JOSE RIBEIRO DA SILVA, WANDERLEY CORREA DOS SANTOS FILHO, EDSON LACERDA, JOAQUIM CANDIDO TEODORO DE CARVALHO, NELSON DA COSTA ARAUJO FILHO, ADRIANA DE OLIVEIRA ROCHA, WANDERLEY CORREA DOS SANTOS, EDUARDO JOSE MONTEIRO SERRANO, RICARDO JORGE CARNEIRO DA CUNHA, ALMIR MORRO CANTERO, ENERTEL ENGENHARIA LTDA – ME e CONSTRUTORA BRASILEIRA DE ESTRADAS COBEL LTDA – ME, pretendendo a imposição das sanções previstas no art. 12, II, da Lei nº 8.429/92 (LIA).

Alega o Parquet que, em razão dos elementos probatórios colhidos na residência de JOSÉ RIBEIRO DA SILVA, quando do cumprimento do mandado de busca e apreensão exarado na Ação Penal nº 2004.60.00.000328-5, restou descortinado envolvimento de servidores públicos e empresários na prática de fraudes em detrimento do Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS).

Narra que foi instaurado o Inquérito Policial n° 244/04 (Ação Penal 0007205-64.2004.403.6000), o qual logrou êxito em descortinar as condutas criminosas/ímprobas perpetradas pelos corréus, os quais integravam grupo que dentro do INSS favorecia ilicitamente contribuintes em troca do recebimento de propinas.

Aponta que, no período de 14 a 28 de fevereiro de 2002, o Auditor Fiscal Luiz Carlos Nagata, ao fiscalizar a contribuinte ENERTEL ENGENHARIA LTDA., apurou débitos de R$ 1.760.588,40 e RS 4.060.155,38, sendo assinados por EDUARDO SERRANO, representante legal da empresa, os Lançamentos de Débitos Confessados - LDC's n° 35.199.151-4 e 35.199.150-6.

Visando a coibir a atuação fiscal, EDUARDO SERRANO entabulou acordo com a gerente-executiva do INSS, MARIA CRISTINA, sendo estabelecido que deveria ser formulado pedido de anulação dos LDC's alegando a ocorrência de vício de vontade, o qual, ao final, seria acatado.

Contudo, segundo o autor, MARIA CRISTINA e EDUARDO SERRANO não contavam com a negativa do Auditor-Fiscal responsável pela autuação - Luiz Carlos Nagata - em converter os LDC's em Notificações, Fiscais de Lançamento de Débitos Previdenciários - NFLD's, procedimento que, uma vez efetivado, permitiria que pedidos de restituição formulados pela ENERTEL continuassem a tramitar e, posteriormente, serem providos.

Posteriormente, MARIA CRISTINA, contando com a participação da procuradora federal ADRIANA DE OLIVEIRA ROCHA, a qual foi responsável por confeccionar parecer favorável ao pedido formulado pela ENERTEL ENGENHARIA, conseguiu anular os lançamentos fiscais.

Completando o trâmite exigido para possibilitar a restituição indevida, os auditores fiscais EDSON LACERDA e JOSÉ RIBEIRO ingressaram no sistema e fizeram as alterações respectivas, transformando as LCD's em NFLD's. Após a alteração dessas informações nos sistemas de informática da Receita Federal, os pedidos de restituição feitos por EDUARDO SERRANO em prol da ENERTEL foram propositalmente encaminhados, a pedido da gerente-executiva MARIA CRISTINA, a JOSÉ RIBEIRO DA SILVA, restando descumprindo os procedimentos de praxe da Receita Federal, consistentes em encaminhar pedido de restituição ao auditor fiscal responsável pela fiscalização, no caso, Luiz Carlos Nagata.

Após descrever as demais condutas praticadas pelos envolvidos, o MPF formulou o seguinte pedido (ID Num. 24424788 - Pág. 17, dos autos da ação original):

e) ao final, a condenação do demandado às sanções descritas pelo artigo 12, inciso II, da Lei de Regência, quais sejam: perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos; ou, caso esse Juízo Federal entenda de forma diversa (no que se refere à adequação das condutas ímprobas ao disposto no artigo 10 ou 11 da Lei de Improbidades), que sejam aplicadas as sanções correspondentes.

Na decisão ora agravada, o r. Juízo Singular recebeu a petição inicial em face dos corréus, com exceção de WANDERLEY CORREA DOS SANTOS, e deferiu parcialmente a medida de indisponibilidade dos bens até o montante de R$ 742.762,44 (ID Num. 162925011).

Inconformada, a agravante interpõe o presente recurso, com pedido de tutela antecipada, alegando, em síntese, que: a) não existem indícios suficientes para o recebimento da inicial em seu desfavor, que atuando como Procuradora Federal, emitiu parecer jurídico em exercício de suas funções institucionais, sem qualquer ligação com o suposto “grupo” apontado na inicial que teriam perpetrado fraudes à autarquia federal; b) nos depoimentos prestados em sede de Inquérito utilizados pelo MPF como causa de pedir para a Ação Civil Pública, tem-se que o parecer jurídico emitido pela agravante, além de não autorizar qualquer restituição ou anulação de lançamento, uma vez que emitido com expressa natureza opinativa, foi posteriormente utilizado em processo administrativo distinto e assinado pela ré MARIA CRISTINA; c) o ato anulado pela Controladoria-Geral da União (CGU) foi apenas o despacho decisório da servidora MARIA CRISTINA, proferido em processo administrativo distinto daquele em que a agravante emitiu seu parecer jurídico; d) a sua conduta se limitou à emissão de parecer jurídico, no exercício de suas atribuições funcionais, o qual foi submetido ao crivo técnico e de discricionariedade, da autoridade hierarquicamente superior, e avaliada em sede de Processo Administrativo Disciplinar (PAD), cuja conclusão foi de ausência de erro ou dolo da procuradora na emissão do parecer, inclusive diferenciando sua conduta dos demais servidores envolvidos, ao afirmar que o parecer em que pese “não ter sido o melhor para o momento, também não se mostra teratológico”; g) a decisão agravada determinou o bloqueio de verbas de natureza alimentar, como proventos de aposentadoria e pensão, inviabilizando a própria subsistência da recorrente, em evidente excesso.

Formulou os pedidos de antecipação dos efeitos da tutela recursal nos seguintes termos (ID Num. 162925007 - Págs. 24-25):

a. com a concessão de efeito suspensivo da decisão de primeiro grau que recebeu a inicial da Ação Civil Pública de Improbidade Administrativa, até o julgamento final do recurso, para imediato desbloqueio da integralidade dos bens da Agravante, considerando a inexistência de atos que se enquadrem nos tipos descritos nos artigos 9º, 10º e 11 da Lei 8.429/92, conforme dispõe o art. 1.019, I do CPC;

b. sucessivamente, caso assim não se entenda, requer-se como medida de tutela de urgência, o imediato desbloqueio das VERBAS ALIMENTARES depositadas em conta corrente de titularidade da agravante, e aplicações financeiras inferiores a 40 (quarenta) salários mínimos, vez que destinados à subsistência da agravante e sua família, na esteira da jurisprudência pacífica sobre o tema;

No mérito, requer a reforma da decisão agravada para:

d. ao final, seja dado INTEGRAL PROVIMENTO ao Recurso, para reformar a decisão agravada, reconhecendo a inexistência de elementos mínimos de justa causa para recebimento da inicial, determinando-se seu não recebimento em relação à Agravante, com o desbloqueio definitivo de todos os seus bens e valores;

e. sucessivamente, caso assim não se entenda, requer-se seja dado provimento ao Recurso, para limitar o bloqueio de bens ao montante atribuído exclusivamente à conduta da agravante, considerando a inviabilidade de constrição genérica, indiscriminada e que compromete recebimentos futuros da agravante indispensáveis à sua subsistência.

Em decisão ID Num. 163640737, foi deferido o pedido de efeito suspensivo para revogar o decreto de indisponibilidade de bens da agravante.

Intimada, a parte agravada apresentou contraminuta, pugnando pela anulação da indisponibilidade de bens decretada e extinção do processo sem pronunciamento de mérito com relação à agravante em decorrência da inépcia da petição inicial (ID Num. 255307135).

Em parecer, o Ministério Público Federal, por meio da Procuradoria da República, ratificou as contrarrazões (ID Num. 258476147).

Em despacho ID Num. 258548045, determinei a manifestação das partes em razão das alterações substanciais da Lei nº 8.429/92, promovidas pela Lei nº 14.230/21.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5014016-14.2021.4.03.0000

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

AGRAVANTE: ADRIANA DE OLIVEIRA ROCHA

Advogados do(a) AGRAVANTE: JOSE RIZKALLAH JUNIOR - MS6125-B, MARINA BOIGUES IDALGO - MS15549

AGRAVADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL NO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

Do ARE nº 843.989

No dia 25/10/2021, foi promulgada a Lei nº 14.230/21 promovendo alterações na Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92).

Dentre as modificações trazidas pelo novo Diploma, algumas possuem natureza extremamente benéfica para os acusados da prática de atos ímprobos (por exemplo, a extinção da improbidade culposa; a revogação dos incisos I, II, IX e X do art. 11; a exigência de dolo específico; a prescrição intercorrente, etc.), o que, invariavelmente, acarreta a discussão acerca de sua possível incidência retroativa.

O E. Supremo Tribunal Federal, em sessão de julgamento do dia 24/02/22, reconheceu a repercussão geral quanto à incidência das modificações trazidas pela Lei nº 14.230/2021 nas ações de improbidade administrativa, especialmente quanto ao dolo e a prescrição (Tema nº 1.119). Na ocasião, a ementa ficou assim redigida:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. LEI 14.230/2021. APLICAÇÃO RETROATIVA DAS DISPOSIÇÕES SOBRE O DOLO E A PRESCRIÇÃO NA AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA.

1. Revela especial relevância, na forma do art. 102, § 3º, da Constituição, a definição de eventual (IR)RETROATIVIDADE das disposições da Lei 14.230/2021, em especial, em relação: (I) A necessidade da presença do elemento subjetivo dolo para a configuração do ato de improbidade administrativa, inclusive no artigo 10 da LIA; e (II) A aplicação dos novos prazos de prescrição geral e intercorrente.

2. Repercussão geral da matéria reconhecida, nos termos do art. 1.035 do CPC.

(ARE 843989 RG, Relator Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, julgado em 24/02/2022, Processo Eletrônico DJe-041 DIVULG 03-03-2022 PUBLIC 04-03-2022)

Posteriormente, em sessão de julgamento realizada no dia 18/08/2022, a E. Corte Suprema, ao finalizar a análise do ARE 843.989 RG, fixou as seguintes teses de repercussão geral:

1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA a presença do elemento subjetivo dolo;

2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa, é irretroativa, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes;

3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do tipo culposo, devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente.

4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é irretroativo, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.

Analisando detidamente as teses fixadas, verifica-se que não há menção expressa acerca da retroatividade da Lei nº 14.230/2021 como um todo, salvo nos atos ímprobos culposos sem condenação transitada em julgado (há retroatividade – item 3) e no regime prescricional (não há retroatividade - item 4).

É certo que, em seu voto, o Ministro Relator Alexandre de Moraes defendeu que “o princípio da retroatividade da lei penal, consagrado no inciso XL do artigo 5º da Constituição Federal (...) não tem aplicação automática para a responsabilidade por atos ilícitos civis de improbidade administrativa, por ausência de expressa previsão legal e sob pena de desrespeito à constitucionalização das regras rígidas de regência da Administração Pública e responsabilização dos agentes públicos corruptos com flagrante desrespeito e enfraquecimento do Direito Administrativo Sancionador” (grifei).

Contudo, o que chama a atenção é que o entendimento do eminente Ministro Relator não consta dentre as teses fixadas no Tema nº 1.119.

Como se sabe, o regime da repercussão geral foi introduzido no § 3º, do art. 102, da CF/88, pela Emenda Constitucional nº 45/04, tendo por objetivo delimitar as matérias que seriam apreciadas pela E. Corte Suprema. O dispositivo apresenta a seguinte redação:

§ 3º No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros.

No CPC, a repercussão geral está prevista no art. 1.035, admitindo-se o recurso extraordinário quando a matéria nele discutida apresentar “questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos do processo” (§ 1º).

Paralelamente a este instituto, o Diploma Processual Civil, nos arts. 1.036 até 1.041, regulamentou o julgamento dos recursos extraordinário e especial repetitivos, sempre que houver a multiplicidade de recursos “com fundamento em idêntica questão de direito”.

No sítio eletrônico do E. Supremo Tribunal Federal, não consta do andamento processual eletrônico que o ARE 843.989 foi submetido à sistemática dos recursos repetitivos.

A meu ver, trata-se de questão meramente formal, uma vez que, ao redigir as teses resultantes do julgamento do ARE 843.989, a E. Corte Suprema adotou na prática o rito do recurso extraordinário repetitivo.

Ao dispor sobre o rito dos recursos repetitivos, o § 3º, do art. 1.038, do CPC, prevê que o “conteúdo do acórdão abrangerá a análise dos fundamentos relevantes da tese jurídica discutida”.

E, com a conclusão dos julgamentos dos recursos afetados, incidem as disposições dos arts. 1.039 e 1.040 do CPC:

Art. 1.039. Decididos os recursos afetados, os órgãos colegiados declararão prejudicados os demais recursos versando sobre idêntica controvérsia ou os decidirão aplicando a tese firmada.

Parágrafo único. Negada a existência de repercussão geral no recurso extraordinário afetado, serão considerados automaticamente inadmitidos os recursos extraordinários cujo processamento tenha sido sobrestado.

Art. 1.040. Publicado o acórdão paradigma:

I - o presidente ou o vice-presidente do tribunal de origem negará seguimento aos recursos especiais ou extraordinários sobrestados na origem, se o acórdão recorrido coincidir com a orientação do tribunal superior;

II - o órgão que proferiu o acórdão recorrido, na origem, reexaminará o processo de competência originária, a remessa necessária ou o recurso anteriormente julgado, se o acórdão recorrido contrariar a orientação do tribunal superior;

III - os processos suspensos em primeiro e segundo graus de jurisdição retomarão o curso para julgamento e aplicação da tese firmada pelo tribunal superior;

IV - se os recursos versarem sobre questão relativa a prestação de serviço público objeto de concessão, permissão ou autorização, o resultado do julgamento será comunicado ao órgão, ao ente ou à agência reguladora competente para fiscalização da efetiva aplicação, por parte dos entes sujeitos a regulação, da tese adotada.

Segundo os artigos acima descritos, os tribunais de origem devem seguir as teses firmadas nos recursos repetitivos.

Deste modo, entendo que a vinculação dos efeitos do Tema de Repercussão Geral nº 1.119 estão limitadas às quatro teses descritas, e não aos votos proferidos pelos eminentes Ministros da E. Corte Suprema.

Cuida-se, em verdade, de aplicação analógica da vedação à teoria da transcendência do s motivos determinantes.

Em sede de controle abstrato de constitucionalidade, o § 2º, do art. 102, da CF/88, estabelece os efeitos jurídicos da decisão proferida pelo E. Supremo Tribunal Federal:

Art. 102, § 2º As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal.

Em termos doutrinários, discute-se qual(is) capítulo(s) da decisão de mérito que ostenta(m) o efeito vinculante e a abrangência erga omnes.

Uma primeira corrente defende uma interpretação mais restrita, de modo que somente o dispositivo da decisão seria vinculante.

Outra corrente, contudo, postula uma maior extensão dos efeitos jurídicos, de modo que o efeito vinculante alcança não apenas o dispositivo, mas a própria fundamentação utilizada. Os defensores desta corrente interpretativa a denominaram “teoria da transcendência dos motivos determinantes”.

Instado a se manifestar, há tempos a E. Corte Suprema rejeita a aplicação da teoria da transcendência dos motivos determinantes:

EMENTA: I. Reclamação. Ausência de pertinência temática entre o caso e o objeto da decisão paradigma. Seguimento negado. II. Agravo regimental. Desprovimento. Em recente julgamento, o Plenário do Supremo Tribunal Federal rejeitou a tese da eficácia vinculante dos motivos determinantes das decisões de ações de controle abstrato de constitucionalidade (RCL 2475-AgR, j. 2.8.07).

(Rcl 2990 AgR, Relator Ministro Sepúlveda Pertence, Tribunal Pleno, julgado em 16/08/2007, DJe-101  DIVULG 13-09-2007  PUBLIC 14-09-2007 DJ 14-09-2007 PP-00030 EMENT VOL-02289-01 PP-00087)

Trata-se de posicionamento presente até os dias atuais:

AGRAVO REGIMENTAL NA RECLAMAÇÃO. ADI 2.689/RN. ADI 1.350/RO. ADI 3.609/AC. AUSÊNCIA DE ADERÊNCIA ESTRITA. TEORIA DOS MOTIVOS DETERMINANTES. INAPLICABILIDADE. RECLAMAÇÃO COMO SUCEDÂNEO RECURSAL. INVIABILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. I –É imprescindível a demonstração da estrita aderência entre a decisão reclamada e os acórdãos apontados como paradigma. II – Esta Corte tem entendimento contrário à chamada transcendência ou efeitos irradiantes dos motivos determinantes das decisões proferidas em controle abstrato de normas. III - A reclamação não pode ser utilizada como sucedâneo recursal. IV - Agravo regimental a que se nega provimento.

(Rcl 48910 AgR, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, julgado em 04/10/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-210  DIVULG 21-10-2021  PUBLIC 22-10-2021)

É certo que o ARE 843.989 não versa sobre decisão proferida em controle abstrato de constitucionalidade.

Contudo, ao prever quais são as decisões que possuem efeitos vinculantes, o CPC adotou idêntico regime jurídico para aquelas proferidas em sede de controle concentrado de constitucionalidade com aquelas proferidas em julgamento de recursos repetitivos:

Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:

I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;

(...)

III - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;

Assim, dada a semelhança entre os efeitos vinculantes da decisão prolatada em sede de controle abstrato de constitucionalidade com as decisões proferidas em recurso extraordinário repetitivo, tenho como possível, para esta última, invocar a impossibilidade da adoção da teoria da transcendência dos motivos determinantes.

Trazendo tais premissas ao caso em tela, como a vedação da retroatividade da Lei nº 14.230/2021 foi apenas reconhecida pelo eminente Ministro Relator Alexandre de Moraes de modo obiter dictum (“coisa dita de passagem”), tenho que, à exceção dos itens 2, 3 e 4 do Tema nº 1.119, todas as demais modificações trazidas pelo novo regramento podem ser aplicadas nas ações civis públicas por ato de improbidade administrativa.

Do recebimento da petição inicial

Na redação anterior, a Lei nº 8.429/92 estabelecia que a ação de improbidade administrativa somente poderia ser rejeitada de plano se juiz se convencesse da “inexistência do ato de improbidade, da improcedência da ação ou da inadequação da via eleita” (§ 8º do art. 17).

Interpretando o mencionado dispositivo, o E. Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que, havendo indícios de cometimento de atos qualificados como improbidade administrativa, a petição inicial deve ser recebida pelo juiz, pois, na fase inaugural prevista no art. 17, §§ 7º, 8º e 9º, da Lei nº 8.429/92, vigora o princípio do in dubio pro societate:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. INEXISTÊNCIA. RECEBIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. PRESENÇA DE INDÍCIOS. REVISÃO. ÓBICE DA SÚMULA N. 7 STJ. DEMAIS ALEGAÇÕES. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.

(...)

3. Relativamente ao recebimento da inicial, o Superior Tribunal de Justiça possui firme entendimento de que é suficiente a demonstração de indícios razoáveis de prática de atos de improbidade e autoria para que se determine o processamento da ação, nos termos do art. 17, §§ 6º e 8º, da Lei n. 8.429/1992, a fim de possibilitar mais resguardo do interesse público.

4. Existindo indícios de atos de improbidade nos termos dos dispositivos da Lei n. 8.429/1992, sendo adequada a via eleita, cabe ao juiz receber a inicial e dar prosseguimento ao feito.

5. É pacífico nesta Corte que, no momento do recebimento da ação de improbidade administrativa, o magistrado apenas verifica se há a presença de indícios suficientes da prática de atos ímprobos, deixando para analisar o mérito, se ocorreu ou não improbidade, dano ao erário, enriquecimento ilícito ou violação de princípios, condenando ou absolvendo os denunciados, após regular instrução probatória.

(...)

(AgInt no AREsp n. 1.823.133/MG, relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 9/11/2021, DJe de 10/12/2021.)

Sob a égide da Lei nº 14.230/2021, as hipóteses de rejeição da petição inicial agora estão previstas no art. 17, § 6º-B:

Art. 17. A ação para a aplicação das sanções de que trata esta Lei será proposta pelo Ministério Público e seguirá o procedimento comum previsto na Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), salvo o disposto nesta Lei.

§ 6º-B A petição inicial será rejeitada nos casos do art. 330 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), bem como quando não preenchidos os requisitos a que se referem os incisos I e II do § 6º deste artigo, ou ainda quando manifestamente inexistente o ato de improbidade imputado.

O art. 330 do CPC trata do indeferimento da petição inicial:

Art. 330. A petição inicial será indeferida quando:

I - for inepta;

II - a parte for manifestamente ilegítima;

III - o autor carecer de interesse processual;

IV - não atendidas as prescrições dos arts. 106 e 321 .

Já os incisos I e II, do § 6º, do art. 17, da LIA, acrescenta outros requisitos da petição inicial nas ações de improbidade administrativa:

§ 6º A petição inicial observará o seguinte:

I - deverá individualizar a conduta do réu e apontar os elementos probatórios mínimos que demonstrem a ocorrência das hipóteses dos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei e de sua autoria, salvo impossibilidade devidamente fundamentada;

II - será instruída com documentos ou justificação que contenham indícios suficientes da veracidade dos fatos e do dolo imputado ou com razões fundamentadas da impossibilidade de apresentação de qualquer dessas provas, observada a legislação vigente, inclusive as disposições constantes dos arts. 77 e 80 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil)

Percebe-se, deste modo, que, além da individualização da conduta de cada réu para a consumação do ato ímprobo, corroborada por “elementos probatórios mínimos” de autoria, a nova Lei consigna a necessidade de demonstrar “indícios suficientes da veracidade dos fatos e do dolo imputado”.

Sob tal enfoque, não vislumbro alteração do entendimento pacificado pelo E. Superior Tribunal de Justiça, uma vez que para aferir a presença de indícios de autoria e materialidade dos fatos, invariavelmente se analisam as provas trazidas nos autos.

No caso em tela, verifico que o parecer jurídico utilizado pelo Parquet para fundamentar a suposta conduta ímproba da agravante fora proferido nos Processo nº 35.199.150-6 (ID Num. 162925017), tendo como interessada a corré ENERTEL ENGENHARIA LTDA.. Na oportunidade, a agravante, atuando como Procuradora Federal, assim opinou (destaques do original):

8. Na manifestação de fls. 62/65, a sra. Chefe da Seção de Análise de Defesas e Recursos, do Serviço de Arrecadação da Gerência Executiva de Campo Grande - MS, embora não tendo submetido o pedido do interessado a julgamento, por faltar-lhe a natureza de "defesa" em sentido estrito, posto que esta é incabível quanto à modalidade de lançamento tributário iniciada por "confissão de dívida", conclui que os argumentos do peticionário não lhe aproveitam.

9. Discordamos, pelos seguintes motivos:

9.1. O vício de vontade consistente em erro ou ignorância quanto ao conteúdo do ato jurídico perpetrado através de declaração pode ser comprovado pela própria alegação de quem produziu o referido ato, mormente quanto o mesmo pertencer à modalidade unilateral.

9.2. Isso porque, em conformidade com os arts. 85 a 89 do Código Civil Brasileiro, diploma autorizado a tratar do tema ato jurídico e seus respectivos defeitos, nas declarações de vontade cabe mais prestar atenção ao seu conteúdo que em sua literalidade.

Mais ainda, que os atos jurídicos quando realizados em erro são anuláveis. Acrescentando: que o erro deve ser tal que pertina à natureza do ato, ou ao objeto principal da declaração (como é o caso, data venia), ou alguma das qualidades a ele essenciais.

E, por derradeiro, a transmissão errônea de vontade pode-se argüir de nulidade, tudo nos termos dos dispositivos abaixo transcritos:

(...)

10. E o que se observa do arrazoado de fls. 54, é, cabalmente, a arguição de nulidade formulada pelo declarante dos Lançamentos de Débito Confessado – LDC ns. 35.199.151-4 e 35.199.150-6, POSTO QUE A VONTADE ALI DECLARADA NÃO CORRESPONDE À REALIDADE, OU SEJA, NÃO PRETENDIA O MESMO FIRMAR QUALQUER CONFISSÃO OU DECLARAR-SE DEVEDOR DOS CRÉDITOS ALI APURADOS.

11. “Errei", disse o interessado, em outras palavras, e não se pode levar adiante, para instâncias outras com vistas à liquidação, aquilo que na origem se encontra viciado por um defeito insanável, consistente na própria vontade do interessado em ver declarados os fatos imponíveis, valores líquidos e créditos tributários ali registrados (LDCs ns. 35.199.151-4 e 35.199.150-6).

12. E porque não se levar adiante? Ora, porque ao Fisco é dado outros instrumentos destinados a ver realizados os créditos que considera dignos de constituir, qual seja, o lançamento de ofício, sucedâneo eficiente do verdadeiro lançamento por declaração, sujeito à homologação, que se operou em erro, segundo o contribuinte, porquanto sua vontade não está ali expressa, apesar de seu representante legal ter firmado documento com esta finalidade.

13. Não haverá prejuízo, como já informado pelo sr. Chefe do Serviço de Arrecadação, às fls. 68, ainda porque não cumprido o prazo decadencial de 10 (dez) anos, para constituição do crédito previdenciário.

14. Vistos, ainda que com simplicidade, mas objetivamente esses aspectos, somos de opinião que o pleito do contribuinte deva merecer acolhida, a fim de ANULAR o lançamento feito com base em declaração proferida com erro quanto à sua substância, a fim de que se proceda nova apuração, mediante fiscalização, do crédito tributário não honrado pelo contribuinte, de modo a produzir novo e hígido ato jurídico dessa natureza, na forma como o Fisco entender por realizar.

Ao receber a petição inicial e decretar a indisponibilidade de bens da agravante, o r. Julgador a quo entendeu que haveria indícios da prática de atos ímprobos (ID Num. 162925011 - Págs. 19-20, grifos do original):

2.4.7 ADRIANA DE OLIVEIRA ROCHA.

A requerida era Procuradora Federal e foi seu o parecer que concluiu pela possibilidade de anulação dos DEBCAD’s da empresa ENERTEL.

De fato, a requerida apresentou parecer concluindo pela anulação dos DEBCAD’s aludidos (24426367 - Pág. 1-15) e, valendo-se de um juízo perfunctório, considerou possíveis as anulações aludidas, em virtude de erro (já descrito – primeira requerida), por compreender que o Lançamento de Crédito Confessado tratava-se de ato unilateral, o qual poderia ser desfeito por vontade do próprio declarante.

Todavia, ao que parece, não está correta a conclusão da parecerista, mormente porque no memorando de fls. 24426367 - Pág. 25- 24426089 - Pág. 9, há informação de que o auditor responsável por lavrar o Lançamento de Débito Confessado afirmou ter esclarecido/sanado todas as dúvidas do declarante, de sorte que, ao que parece, foi açodada a conclusão do parecer reconhecendo o erro, até porque o servidor responsável pela lavratura do ato afiançou justamente o contrário, ou seja, que antes de receber a confissão extirpou quaisquer dúvidas do contribuinte, sendo descabida a tese do erro.

Ademais, não se deve olvidar que o processo em apreço trata de contribuições previdenciárias não recolhidas de forma adequada e, tratando-se de tributo, existem três espécies de lançamento, quais sejam: de ofício, declaração e homologação.

Assim, apesar da contribuição previdenciária ser, em regra, lançada por homologação, neste caso, por tratar-se de lançamento confessado pelo próprio contribuinte, que ensejou a atividade administrativa capaz de constituir o crédito, estamos diante de um lançamento por declaração.

Com isso, ainda que a manifestação unilateral do contribuinte tenha permitido o início do procedimento de constituição do crédito tributário, ela per si não é capaz de produzir qualquer efeito jurídico, sendo o ato ulterior da administração imprescindível para o surgimento do crédito, na sua forma perfeita.

Destarte, ao que parece, pelo menos nesse momento incipiente do processo, nada obstando que em cognição exauriente a posição possa ser revista, equivocada a conclusão de que o contribuinte poderia, de forma unilateral, desfazer o ato sob alegação de erro, porque à sua vontade inicial aderiu-se a vontade da própria Administração Pública por meio de Auditor Fiscal com competência para lavratura do ato.

Note-se que o parecer (fls. 24426367 - Pág. 13-15) não está balizado em entendimento doutrinário ou jurisprudencial, resumindo-se a ilustre Procuradora Federal a tecer as suas considerações acerca dos dispositivos legais, pelo que, deste modo vislumbra-se a existência de culpa grave na sua confecção.

Nessa senda, aponto o seguinte trecho de voto do relator, ministro José Antônio Barreto de Macedo, na decisão n. 289/1996, do Plenário do TCU:

(...)

Com isso, o parecer, ainda que não seja vinculante, pois, no caso em tela, ele é peça meramente opinativa, não está devidamente fundamentado.

Não se pode aniquilar um ato administrativo por mera vontade do contribuinte, isso porque no caso em apreço não estamos diante de uma relação horizontal, regida pelo Direito Civil, onde os atores (particular e Administração Pública) estariam no mesmo nível.

Não se deve olvidar que os atos administrativos devem sempre ser pautados pela supremacia do Interesse Público e pela indisponibilidade do Interesse Público, que seriam as pedras de toque do Direito Administrativo.

Então, reconhecer a tese do contribuinte (erro) desmantelaria as presunções de legalidade, legitimidade e veracidade, inerentes ao ato administrativo já formado, pelo que é indevida a sua admissão.

Ainda, equivocada também é a conclusão de que caberia à Gerente-Executiva a anulação dos lançamentos, pois a Procuradora Federal deveria saber que a anulação extrapolava os limites das atribuições do cargo de Gerente-Executiva.

Sendo assim, no meu sentir, ainda que não se possa sustentar, nesta atual fase, que a requerida agiu com dolo, nem que tenha recebido qualquer tipo de vantagem para exarar o parecer, é possível que se vislumbre tenha ela agido com culpa grave e sua conduta contribuiu para o resultado final, ou seja, a anulação do lançamento fiscal.

Analisando os autos principais (nº 0014897-02.2013.4.03.6000), verifico que foi instaurado o Processo Administrativo Disciplinar nº 00407.006188/2009-73 tendo por escopo “apurar irregularidades a partir de comunicação da Procuradora Federal ADRIANA DE OLIVEIRA ROCHA sobre sua incompatibilidade em assumir a chefia da PF/FUNAI, haja vista que a mesma fora indiciada em inquérito policial, na época, em curso na Superintendência de Polícia Federal do Estado do Mato Grosso do Sul, o qual tinha como objeto a investigação de fatos envolvendo a atuação da Procuradora quando em exercício na Procuradoria do Instituto Nacional de Seguro Social” (ID Num. 24425736 - Pág. 6).

Consta do seu Relatório Final os seguintes fatos (grifei):

4. Em apertada síntese, a pessoa jurídica ENERTEL ENGENHARIA LTDA endereçou requerimento a Gerente Executiva do INSS em Campo Grande/MS, postulando a anulação de lançamento de débito confessado. Na ocasião a Seção de Análise de Defesas e Recursos não acolheu os argumentos do contribuinte. Nesse instante, após o ouvir o chefe de serviço de arrecadação, que opinou favoravelmente pela conversão de débito confessado em lançamento de oficio, a então Gerente (também membro da carreira de Procurador Federal) encaminhou a questão a Procuradoria Federal para fins de parecer sobre sua competência para anular lançamento tributário e sobre o mérito, ocasião em que a Procuradora Federal Adriana de Oliveira Rocha acolheu as nulidades assentadas pelo contribuinte e constatou que a Gerente Executiva tinha atribuição para declarar a nulidade do referido crédito tributário.

5. Mediante a nota técnica Nr. 28Q/PGF/MHAS/2009 (Fl. 409/411, Vol. ll), devidamente aprovada pelo Procurador Geral Federal, foi sugerida a instauração de processo administrativo disciplinar com vistas a apuração dos fatos retromencionados e outros conexos, o que se deu pela Portaria 305 de 28 de abril de 2010 e prorrogações posteriores conforme item 2 supra.

Ao final dos trabalhos, a Comissão entendeu que a recorrente não teria praticado transgressão disciplinar, pois o parecer emitido é juridicamente aceitável e não trouxe prejuízo ao erário” (ID Num. 24425736 - Pág. 28).

Para alcançar tal conclusão, foram adotados os seguintes fundamentos:

31. De outro modo, percebe-se que o parecer aclara situação de dúvida jurídica presente no Serviço de Arrecadação, pois a Chefia de Seção de Recursos e Análises entendia que não era possível a anulação do crédito tributário, e por outro lado o Chefe de Serviço de Arrecadação, superior hierárquico da Chefia de Seção de Recursos, entendia ser possível a conversão do Lançamento de débito confessado - LDC em Notificação Fiscal de Lançamento de Débito - NFLD.

32. Portanto a opção adotada pela consulente em SUGERIR a realização de uma nova fiscalização, pode até não ser compartilhada pela Comissão, contudo, se mostra juridicamente aceitável. E contrariamente a qualquer entendimento, o Lançamento de Débito Confessado pode até não ser passível de discussão na instância administrativa, mas pode sim ser objeto de discussão judicial, ainda que haja agilização da inscrição em dívida ativa.

(...)

33. Com a refiscalização, realizada pelo mesmo auditor fiscal, a Administração encontrou valor superior ao anteriormente apurado, o que demonstra que a sugestão promovida pelo parecer e acolhida pela Gerente Executiva não trouxe prejuízo aos cofres públicos.

(...)

35. Outro ponto que a Comissão entende está esclarecido é a questão das restituições em favor do contribuinte ENERTEL, logo após a anulação dos Lançamento de Débitos Confessados. Não há irregularidade que possa ser atribuída a Procuradora Federal ADRIANA DE OLIVEIRA ROCHA.

(...)

38. Restou a Comissão Processante compulsar as declarações de imposto de renda (2002 a 2010) e analisar minuciosamente a evolução patrimonial da Procuradora Federal ADRIANA DE OLIVEIRA ROCHA e não foi constatada nenhuma irregularidade, o que nos permite inferir que não houve obtenção de nenhuma vantagem indevida.

39. Em arremate, o parecer emitido pela procuradora federal ADRIANA ROCHA, não vinculava a decisão do gestor, pois se apresentava meramente opinativo.

Corroboram as conclusões administrativas no sentido de inexistir condutas irregulares da recorrente a sua absolvição na Ação Penal nº 0007205-64.2004.403.6000, perante a 5ª Vara Federal de Campo Grande, nos seguintes termos (ID Num. 24427255 - Págs. 18 e 22, dos autos originais, grifei):

EXCLUSÃO DE DADOS DO SISTEMA INFORMATIZADO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Materialidade

Assiste razão às parles.

Com efeito, embora existentes indícios da prática delitiva, razão pela qual foi recebida a denúncia, no curso da instrução criminal, realizadas as oitivas das testemunhas arroladas pelas parles, verifica-se que não há prova de vantagem indevida para a prática de exclusão de dados do sistema informatizado da Administração Pública. Além disso, como bem ressaltou o Parquet, o procedimento administrativo (fls. 1871/1902) revelou que o cancelamento e a exclusão de dados do sistema informatizado obedeceram às normas pertinentes, não foram realizados indevidamente, de forma que o fato é atípico.

(...)

ABSOLVO os réus MARIA CRISTINA DE BARROS MIGUEÍS, EDSON LACERDA, WANDERLEI CORREA DOS SANTOS FILHO, NELSON ARAUJO DA COSTA FILHO, JOAQUIM CANDIDO TEODORO DE CARVALHO, ADRIANA DE OLIVEIRA ROCHA, qualificados, da acusação de prática do crime previsto no art. 313-A, § 1°, do CP, com fundamento o no art. 386, inciso III, do CPP.

Em regra, vigora no ordenamento jurídico a independência das instâncias punitivas, ou seja, uma conduta pode ser considerada ao mesmo tempo um ilícito civil, penal e administrativo, devendo seu autor responder em todas estas esferas.

Na redação original da Lei de Improbidade Administrativa, constava dispositivo que reforçava a mencionada independência:

Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato: (...)

No entanto, a independência das instâncias punitivas, não é absoluta, existindo situações em que a decisão proferida no âmbito penal pode refletir nas demais. Tanto que o CC/2002 preceitua no seu art. 935 que:

Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.

O art. 386 do CPP enumera as hipóteses de absolvição do agente na seara criminal:

Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça:

I - estar provada a inexistência do fato;

II - não haver prova da existência do fato;

III - não constituir o fato infração penal;

IV - estar provado que o réu não concorreu para a infração penal;

V - não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal;

VI - existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena (arts. 20, 21, 22, 23, 26 e § 1o do art. 28, todos do Código Penal), ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência;

VII - não existir prova suficiente para a condenação.

Analisando o mencionado dispositivo, o E. Superior Tribunal de Justiça já pacificou o entendimento de que, em razão da relativa independência entre as instâncias, a absolvição no juízo penal somente vincula o cível nas situações previstas nos incisos I ("estar provada a inexistência do fato") e IV ("estar provado que o réu não concorreu para a infração penal"):

 PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PREFEITO MUNICIPAL. CONTRATAÇÃO DE EMPRESA DA QUAL É SÓCIO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. ACÓRDÃO EMBASADO EM NORMA DE DIREITO LOCAL. LEI ORGÂNICA DO MUNICÍPIO DE ORATÓRIOS/MG. INCIDÊNCIA, POR ANALOGIA, DA SÚMULA N. 280/STF. ACÓRDÃO QUE CONSIGNA A PRESENÇA DE DOLO E DE ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE NO CASO DOS AUTOS. SÚMULA N. 7/STJ. APLICAÇÃO. ABSOLVIÇÃO CRIMINAL POR MOTIVOS OUTROS QUE NÃO A INEXISTÊNCIA DE FATO OU NEGATIVA DE AUTORIA. INDEPENDÊNCIA ENTRE AS INSTÂNCIAS PENAL, CIVIL E ADMINISTRATIVA. DOSIMETRIA DAS SANÇÕES. PROPORCIONALIDADE. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DESCABIMENTO.

(...)

IV - O Superior Tribunal de Justiça tem reiteradamente afirmado a independência entre as instâncias administrativa, civil e penal, salvo se verificada absolvição criminal por inexistência do fato ou negativa de autoria. Dessa forma, a absolvição criminal em decorrência de outros motivos não afasta a condenação por ato de improbidade administrativa.

(...)

(AgInt no REsp 1678327/MG, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 26/02/2019, DJe 01/03/2019) (grifei)

 

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PREFEITO MUNICIPAL. CONTRATAÇÃO DE EMPRESA DA QUAL É SÓCIO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. ACÓRDÃO EMBASADO EM NORMA DE DIREITO LOCAL. LEI ORGÂNICA DO MUNICÍPIO DE ORATÓRIOS/MG. INCIDÊNCIA, POR ANALOGIA, DA SÚMULA N. 280/STF. ACÓRDÃO QUE CONSIGNA A PRESENÇA DE DOLO E DE ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE NO CASO DOS AUTOS. SÚMULA N. 7/STJ. APLICAÇÃO. ABSOLVIÇÃO CRIMINAL POR MOTIVOS OUTROS QUE NÃO A INEXISTÊNCIA DE FATO OU NEGATIVA DE AUTORIA. INDEPENDÊNCIA ENTRE AS INSTÂNCIAS PENAL, CIVIL E ADMINISTRATIVA. DOSIMETRIA DAS SANÇÕES. PROPORCIONALIDADE. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DESCABIMENTO.

(...)

IV - O Superior Tribunal de Justiça tem reiteradamente afirmado a independência entre as instâncias administrativa, civil e penal, salvo se verificada absolvição criminal por inexistência do fato ou negativa de autoria. Dessa forma, a absolvição criminal em decorrência de outros motivos não afasta a condenação por ato de improbidade administrativa.

(...)

(AgInt no REsp 1678327/MG, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 26/02/2019, DJe 01/03/2019) (grifei)

Com a edição da Lei nº 14.230/2021, o posicionamento da E. Corte Superior, em princípio, encontra-se superado, na medida em que o § 4º, do art. 21, assim prevê (grifei):

§ 4º A absolvição criminal em ação que discuta os mesmos fatos, confirmada por decisão colegiada, impede o trâmite da ação da qual trata esta Lei, havendo comunicação com todos os fundamentos de absolvição previstos no art. 386 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal).

Deve-se pontuar, no entanto, que o preceito normativo parte da premissa de que os fatos discutidos na ação penal e na ação de improbidade sejam os mesmos.

Na decisão agravada, não houve análise acerca da similitude dos fatos.

De todo modo, dos documentos juntados nos autos, não se vislumbram indícios da prática de atos de improbidade administrativa pela recorrente.

Segundo José Afonso da Silva:

A probidade administrativa é uma forma de moralidade administrativa que mereceu consideração especial da Constituição, que pune o ímprobo com a suspensão de direitos políticos (art. 37, § 4º). A probidade administrativa consiste no dever de o “funcionário servir a Administração com honestidade, procedendo no exercício das suas funções, sem aproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem queira favorecer”. O desrespeito a esse dever é que caracteriza a improbidade administrativa. Cuida-se de uma imoralidade administrativa qualificada. A improbidade administrativa é uma imoralidade qualificada pelo dano ao erário e correspondente vantagem ao ímprobo ou a outrem(...).

(in Curso de Direito Constitucional Positivo, 37ª ed., São Paulo, Malheiros Editores, 2014, pg. 678)

Pondere-se, no entanto, que não é qualquer conduta irregular que automaticamente se qualifica como ímprobo, sendo imprescindível analisar o elemento subjetivo do agente público no momento de sua prática. Ensina Maria Sylvia Zanella Di Pietro que:

A própria severidade das sanções previstas na Constituição está a demonstrar que o objetivo foi o de punir infrações que tenham um mínimo de gravidade, por apresentarem consequências danosas para o patrimônio público (em sentido amplo), ou propiciarem benefícios indevidos para o agente ou para terceiros. A aplicação das medidas previstas na lei exige observância do princípio da razoabilidade, sob o seu aspecto de proporcionalidade entre meios e fins.

(in Direito administrativo, 30ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2017, pg. 840)

In casu, que a Comissão do PAD nº 00407.006188/2009-73 foi categórica ao absolver a recorrente por não ter havido “transgressão disciplinar, pois o parecer emitido é juridicamente aceitável e não trouxe prejuízo ao erário”.

Segundo a mencionada Comissão, o posicionamento adotado pela agravante de sugerir a realização de uma nova fiscalização “se mostra juridicamente aceitável”.

Além disso, com a refiscalização, o mesmo auditor fiscal encontrou valor superior ao anteriormente apurado, “o que demonstra que a sugestão promovida pelo parecer e acolhida pela Gerente Executiva não trouxe prejuízo aos cofres públicos”.

Por fim, em análise das declarações de imposto de renda dos anos 2002 até 2010, a mesma Comissão não verificou indícios de recebimento de vantagens indevidas.

Assim, dados os elementos probatórios trazidos no PAD nº 00407.006188/2009-73 e na Ação Penal nº 0007205-64.2004.403.6000, não se constata a existência de provas de que a agravante, ao emitir o parecer jurídico, tenha atuado de forma viciada a ponto de considerar a sua conduta como justificadora de punição nos termos da Lei nº 8.429/92.

Cabível, na espécie, a previsão do § 3º, do art. 1º (grifei):

§ 3º O mero exercício da função ou desempenho de competências públicas, sem comprovação de ato doloso com fim ilícito, afasta a responsabilidade por ato de improbidade administrativa.

Reconhecida a ilegitimidade passiva da agravante, cumpre analisar a fixação de honorários sucumbenciais.

Acerca do tema, o art. 23-B, § 2º, da LIA, incluído pela Lei nº 14.230/2021, assim dispõe:

Art. 23-B. Nas ações e nos acordos regidos por esta Lei, não haverá adiantamento de custas, de preparo, de emolumentos, de honorários periciais e de quaisquer outras despesas.

(...)

§ 2º Haverá condenação em honorários sucumbenciais em caso de improcedência da ação de improbidade se comprovada má-fé.

Cuida-se de previsão normativa que positiva o entendimento já adotado pela C. Corte Especial do E. Superior Tribunal de Justiça, nos autos do EAREsp 962.250/SP, no sentido de que, em Ação Civil Pública, por força do princípio da simetria, não há condenação em honorários advocatícios da parte requerida quando inexistente a má-fé, tal como ocorre com a parte autora, conforme o disposto no art. 18 da Lei nº 7.347/85:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DISSENSO CONFIGURADO ENTRE O ARESTO EMBARGADO E ARESTO PARADIGMA ORIUNDO DA QUARTA TURMA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA INTENTADA PELA UNIÃO. CONDENAÇÃO DA PARTE REQUERIDA EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ. DESCABIMENTO. ART. 18 DA LEI N. 7.347/1985. PRINCÍPIO DA SIMETRIA. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. Trata-se de recurso interposto em ação civil pública, de que é autora a União, no qual pleiteia a condenação da parte requerida em honorários advocatícios, sob o fundamento de que a regra do art. 18 da Lei n. 7.347/1985 apenas beneficia o autor, salvo quando comprovada má-fé.

2. O acórdão embargado aplicou o princípio da simetria, para reconhecer que o benefício do art. 18 da Lei n. 7.347/1985 se aplica, igualmente, à parte requerida, visto que não ocorreu má-fé. Assim, o dissenso para conhecimento dos embargos de divergência ocorre pelo confronto entre o aresto embargado e um julgado recente da eg. Quarta Turma, proferido nos EDcl no REsp 748.242/RJ, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 12/4/2016, DJe 25/4/2016.

3. Com efeito, o entendimento exposto pelas Turmas, que compõem a Primeira Seção desta Corte, é no sentido de que, "em favor da simetria, a previsão do art. 18 da Lei 7.347/1985 deve ser interpretada também em favor do requerido em ação civil pública. Assim, a impossibilidade de condenação do Ministério Público ou da União em honorários advocatícios - salvo comprovada má-fé - impede serem beneficiados quando vencedores na ação civil pública" (STJ, AgInt no AREsp 996.192/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 30/8/2017). No mesmo sentido: AgInt no REsp 1.531.504/CE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 21/9/2016; AgInt no REsp 1.127.319/SC, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 18/8/2017; AgInt no REsp 1.435.350/RJ, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 31/8/2016; REsp 1.374.541/RJ, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 16/8/2017.

4. De igual forma, mesmo no âmbito da Terceira e Quarta Turmas do Superior Tribunal de Justiça, ainda que o tema não tenha sido analisado sob a óptica de a parte autora ser ente de direito público - até porque falece, em tese, competência àqueles órgãos fracionários quando num dos polos da demanda esteja alguma pessoa jurídica de direito público -, o princípio da simetria foi aplicado em diversas oportunidades: AgInt no REsp 1.600.165/SP, Rel. Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 20/6/2017, DJe 30/6/2017; REsp 1.438.815/RN, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 22/11/2016, DJe 1º/12/2016; REsp 1.362.084/RJ, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 16/5/2017, DJe 1º/8/2017.

5. Dessa forma, deve-se privilegiar, no âmbito desta Corte Especial, o entendimento dos órgãos fracionários deste Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que, em razão da simetria, descabe a condenação em honorários advocatícios da parte requerida em ação civil pública, quando inexistente má-fé, de igual sorte como ocorre com a parte autora, por força da aplicação do art. 18 da Lei n. 7.347/1985.

6. Embargos de divergência a que se nega provimento.

(EAREsp 962.250/SP, Rel. Ministro Og Fernandes, Corte Especial, julgado em 15/08/2018, DJe 21/08/2018)

No caso, não verifico a existência de má-fé do Parquet ao incluir a agravante no polo passivo da lide, uma vez que o órgão acusador entendeu que a emissão do parecer pela anulação de lançamento fiscal em nome de ENERTEL ENGENHARIA LTDA. teria sido elaborado de forma irregular, tese, inclusive, encampada na decisão agravada (ID Num. 162925011 - Págs. 19-21).

Ante o exposto, dou provimento ao agravo de instrumento para excluir a agravante do polo passivo da ação civil de improbidade administrativa originária.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI Nº 14.230/2021. INCIDÊNCIA RETROATIVA. TEMA Nº 1.119. RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. VINCULAÇÃO ÀS TESES FIRMADAS. RECEBIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. INEXISTÊNCIA DE JUSTA CAUSA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. HONORÁRIOS. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ. RECURSO PROVIDO.

1. No dia 25/10/2021, foi promulgada a Lei nº 14.230/21 promovendo alterações na Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92).

2. A discussão jurídica que agora se coloca é saber se as modificações trazidas pelo novo Diploma, algumas possuem natureza extremamente benéfica para os acusados da prática de atos ímprobos (por exemplo, a extinção da improbidade culposa; a revogação dos incisos I, II, IX e X do art. 11; a exigência de dolo específico; a prescrição intercorrente, etc.), possuem incidência retroativa.

3. O E. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema nº 1.119, fixou quatro teses de repercussão geral.

4. Analisando detidamente as teses fixadas, verifica-se que não há menção expressa acerca da retroatividade da Lei nº 14.230/2021 como um todo, salvo nos atos ímprobos culposos sem condenação transitada em julgado (há retroatividade – item 3) e no regime prescricional (não há retroatividade - item 4).

5. Ao redigir as teses resultantes do julgamento do ARE 843.989, a E. Corte Suprema adotou na prática o rito do recurso extraordinário repetitivo.

6. Ao dispor sobre o rito dos recursos repetitivos, o § 3º, do art. 1.038, do CPC, prevê que o “conteúdo do acórdão abrangerá a análise dos fundamentos relevantes da tese jurídica discutida”. E, com a conclusão dos julgamentos dos recursos afetados, incidem as disposições dos arts. 1.039 e 1.040 do CPC.

7. Segundo os artigos, os tribunais de origem devem seguir as teses firmadas nos recursos repetitivos. Deste modo, a vinculação dos efeitos do Tema de Repercussão Geral nº 1.119 estão limitadas às quatro teses descritas, e não aos votos proferidos pelos eminentes Ministros da E. Corte Suprema.

8. Cuida-se, em verdade, de aplicação analógica da vedação à teoria da transcendência do s motivos determinantes.

9. É certo que o ARE 843.989 não versa sobre decisão proferida em controle abstrato de constitucionalidade. Contudo, ao prever quais são as decisões que possuem efeitos vinculantes, o CPC adotou idêntico regime jurídico para aquelas proferidas em sede de controle concentrado de constitucionalidade com aquelas proferidas em julgamento de recursos repetitivos.

10. Na redação anterior, a Lei nº 8.429/92 estabelecia que a ação de improbidade administrativa somente poderia ser rejeitada de plano se juiz se convencesse da “inexistência do ato de improbidade, da improcedência da ação ou da inadequação da via eleita” (§ 8º do art. 17). Interpretando o mencionado dispositivo, o E. Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que, havendo indícios de cometimento de atos qualificados como improbidade administrativa, a petição inicial deve ser recebida pelo juiz, pois, na fase inaugural prevista no art. 17, §§ 7º, 8º e 9º, da Lei nº 8.429/92, vigora o princípio do in dubio pro societate.

11. Sob a égide da Lei nº 14.230/2021, as hipóteses de rejeição da petição inicial agora estão previstas no art. 17, § 6º-B. Deste modo, que, além da individualização da conduta de cada réu para a consumação do ato ímprobo, corroborada por “elementos probatórios mínimos” de autoria, a nova Lei consigna a necessidade de demonstrar “indícios suficientes da veracidade dos fatos e do dolo imputado”.

12. Não se vislumbra alteração do entendimento pacificado pelo E. Superior Tribunal de Justiça, uma vez que para aferir a presença de indícios de autoria e materialidade dos fatos, invariavelmente se analisam as provas trazidas nos autos.

13. Dado os elementos probatórios trazidos no PAD nº 00407.006188/2009-73 e na Ação Penal nº 0007205-64.2004.403.6000, não se constata a existência de provas de que a agravante, ao emitir o parecer jurídico, tenha atuado de forma viciada a ponto de considerar a sua conduta como justificadora de punição nos termos da Lei nº 8.429/92.

14. Não se verifica a existência de má-fé do Parquet ao incluir a agravante no polo passivo da lide, uma vez que o órgão acusador entendeu que a emissão do parecer pela anulação de lançamento fiscal em nome de ENERTEL ENGENHARIA LTDA. teria sido elaborado de forma irregular, tese, inclusive, encampada na decisão agravada.

15. Agravo de instrumento provido.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu dar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do voto do Des. Fed. MARCELO SARAIVA (Relator), com quem votaram o Des. Fed. WILSON ZAUHY e a Juíza Fed. Conv. NOEMI MARTINS. Ausente, justificadamente, a Des. Fed. MARLI FERREIRA (em férias), substituída pela Juíza Fed. Conv. NOEMI MARTINS , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.