Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0001426-22.2018.4.03.6103

RELATOR: Gab. 44 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, FABIO FERNANDO FRANCISCATE, J. J. EXTRACAO E COMERCIO DE AREIA LTDA - EPP

Advogados do(a) APELANTE: FAUSTO LATUF SILVEIRA - SP199379-A, LEONARDO HENRIQUE ALEIKSCIVIEZ MICHELOTTI BARBOZA - SP178038-A, NEWTON DE SOUZA PAVAN - SP206363-A

APELADO: J. J. EXTRACAO E COMERCIO DE AREIA LTDA - EPP, FABIO FERNANDO FRANCISCATE, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

Advogados do(a) APELADO: FAUSTO LATUF SILVEIRA - SP199379-A, LEONARDO HENRIQUE ALEIKSCIVIEZ MICHELOTTI BARBOZA - SP178038-A, NEWTON DE SOUZA PAVAN - SP206363-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma
 

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0001426-22.2018.4.03.6103

RELATOR: Gab. 44 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, FABIO FERNANDO FRANCISCATE, J. J. EXTRACAO E COMERCIO DE AREIA LTDA - EPP

Advogados do(a) APELANTE: FAUSTO LATUF SILVEIRA - SP199379-A, LEONARDO HENRIQUE ALEIKSCIVIEZ MICHELOTTI BARBOZA - SP178038-A, NEWTON DE SOUZA PAVAN - SP206363-A

APELADO: J. J. EXTRACAO E COMERCIO DE AREIA LTDA - EPP, FABIO FERNANDO FRANCISCATE, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

Advogados do(a) APELADO: FAUSTO LATUF SILVEIRA - SP199379-A, LEONARDO HENRIQUE ALEIKSCIVIEZ MICHELOTTI BARBOZA - SP178038-A, NEWTON DE SOUZA PAVAN - SP206363-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA (Relator):

O Ministério Público Federal denunciou J.J. EXTRACÃO E COMERCIO DE AREIA LTDA, ADILSON FERNANDO FRANCISCATE e FABIO FERNANDO FRANCISCATE, qualificados nos autos, estes nascidos aos 04/12/1961 e 15/09/1988, respectivamente, como incursos nas penas do art. 2º, caput, da Lei n. 8.176/90, e dos artigos 38-A e 55, ambos da Lei n. 9.605/98. Consta da denúncia (fls. 158/165 dos autos físicos, p. 3/10 do id 163209620):

Em período não definido, mas que perdurou, pelo menos, entre Outubro/2011 e 18 de junho de 2014, na Fazenda Marajoara, na cidade de Caçapava/SP, ADILSON FERNANDO FRANCISCATE e FABIO FERNANDO FRANCISCATE, na qualidade de administradores de fato da empresa J.J. EXTRACÃO E COMERCIO DE AREIA LTDA, com pleno conhecimento dos elementos do tipo penal e vontade livre e consciente de realizar a conduta proibida. exploraram recursos minerais pertencentes à União (areia), em desacordo com o título autorizativo expedido pelo órgão federal responsável (DNPM, atual ANM), bem como executaram extração e lavra de recursos minerais, sem o competente título autorizativo ambiental emitido pela CETESB, condutas essas que se subsumem aos tipos penais descritos no art. 21, caput, da Lei 8.176/91 e art. 55 da Lei n. 9.605/98. No mesmo lugar, entre Janeiro/2014 e Maio/2014, ADILSON FERNANDO FRANCISCATE e FABIO FERNANDOFRANCISCATE, na qualidade de administradores de fato da empresa J.J. EXTRACÃO ECOMERCIO DE AREIA LTDA. danificaram vegetação primária e secundária do Bioma Mata Atlântica, em estágio médio de regeneração (art. 38-A da Lei n. 9.605/98), bem como impediram a regeneração natural de floresta do Bioma Mata Atlântica (art. 48, Lei n. 9.605/98).

- BREVE EXPLANAÇÃO FACTUAL –

Para correta e melhor compreensão dos fatos imputados aos denunciados, é preciso, antes, destacar que as atividades extrativistas irregulares foram detectadas em duas cavas separadas, embora contíguas, denominadas Cavas "A” e "B" no Laudo Pericial n. 1762/2016 - NUCRIM/SETECISRIPFIRJ (fls. 79/103). O critério para identificação e distinção dessas cavas foi puramente físico (as cavas não estavam interligadas entre si).

A CETESB, por sua vez, identificou e autuou as atividades extrativistas irregulares a partir de critério diverso, qual seja, a inserção das áreas dentro das poligonais correspondentes aos processos administrativos, que por sua vez refletem as poligonais dos processos administrativos do DNPM.

Em razão disso, as áreas identificadas pela CETESB (uma de 1,6ha e outra de 2,095 ha) não coincidem inteiramente com as Cavas “A" e "B" identificadas pela Polícia Federal, embora se refiram exatamente ao mesmo local.

A mera comparação visual entre as imagens de fls. 07 e 08 (Figuras 2 e 3) e de fls. 87 (referente a janeiro/2014) permite concluir que a Cava "B" está quase inteiramente localizada dentro da poligonal do Processo DNPM n. 821.108/1995, de modo que está abrangida pela área de 2,095 ha referida pela CETESB. Já a Cava "A" engloba toda a área de 1,6 ha e mais uma porção oeste da área de 2.095 ha.

Para fins penais, importa a situação de fato encontrada no local, de modo que a presente denúncia irá se basear na distinção entre Cavas "A" e “B”, nos termos do laudo da Policia Federal.

Em razão do exposto, os fatos são separados da seguinte forma:

Fato 1 - exploração de recursos minerais sem licença ambiental na Cava "A" (art. 2º, caput, Lei 8176/91)

Fato 2 - exploração de recursos minerais sem licença ambiental na Cava "B" (art. 2º, caput, Lei 8176/91)

Fato 3 - exploração de recursos minerais sem licença mineraria do DNPM na Cava "A" (art. 55, Lei 9605/98)

Fato 4 - exploração de recursos minerais sem licença mineraria do DNPM na Cava “B” (art. 55, Lei 9605/98)

Fato 5 - dano e destruição de vegetação primária e secundária do Bioma Mata Atlântica, em estágio médio de regeneração, em toda a área abrangida pelas Cavas "A" e “B” (art. 38-A, Lei n. 9605/98)

Fato 6 - impedimento da regeneração natural de floresta do Bioma Mata Atlântica, em toda a área abrangida pelas Cavas “A" e “B” (art. 48. Lei n 9605/98)

 - DOS FATOS –

No dia 18 de junho de 2014, técnicos da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB) estiveram no empreendimento localizado na Fazenda Marajoara e constataram extração de areia sem as devidas licenças ambientais da CETESB, na faixa de reserva ecológica entre duas cavas do empreendimento fiscalizado, perfazendo uma área poligonal de 1,6 ha, delimitada pelas coordenadas UTM referidas à fl. 05 da Informação Técnica n. 185/14/CJS (fls. 05/11).

A irregularidade deu ensejo à lavratura dos Autos de Infração para imposição de multa AIIPM 57000363 (fl. 13/14) e para embargo da área AIIPM 57000032(fl. 17), em nome da empresa Universo Extração e Comercia De Minérios Ltda, que era formalmente titular da área, embora não fosse, de fato, responsável pela extração irregular, pois a responsabilidade recai sobre os denunciados, conforme se demonstrará adiante.

Na mesma diligência, os técnicos da CETESB também constataram extração de areia, igualmente sem licença ambiental, em uma área poligonal n. 2,095 ha, delimitada pelas coordenadas UTM referidas à fl. 05 da Informação Técnica n. 185/14/CJS, o que deu ensejo à lavratura dos Autos de Infração para imposição de multa AlIPM 57000364 (fl. 15/16) e para embargo da área AlIPM 57000036 (fl. 12), em nome, de novo, da empresa Universo Extração e Comercio De Minérios Ltda. O Laudo Pericial n.1762/2016 - NUCRIM/SETEC/SR/PF/RJ (fls. 79/103) identificou a exploração minerária, sem as devidas licenças ambientais e do DNPM, se deu em duas cavas distintas, que denominou de Cavas "A" e "B" (respectivamente FATOS 1 E 2 desta denúncia).

Além de os denunciados não possuírem licença ambiental, o mesmo Laudo Pericial n. 1762/2016 indicou que as extrações, em ambos os locais (áreas A e B), se deram dentro da "Zona de Recuperação" definida pela Resolução SMA n. 28 de22/09/1999, assim compreendidas “as áreas definidas como prioritárias à recuperação ambiental, objetivando compatibilizá-las com os usos urbanos, agropecuário ou de preservação, segundo sua localização específica" (art. 5º). Nos termos do §2º do art. 5º da mesma resolução, "na zona de recuperação não será expedida licença de ampliação de área para os empreendimentos em funcionamento já licenciados ambientalmente". Dessa forma, resta comprovado que as licenças ambientais não existiam e não poderiam ser expedidas, sendo que a degradação ambiental atingiu zona de recuperação ambiental, em extensa área, tornando muito mais gravosa a conduta dos denunciados, o que deve ser considerado na dosimetria da pena, em caso de eventual condenação.

Esse Laudo Pericial n. 1762/2016 informou ainda que as atividades extrativistas, em ambas as áreas (Cavas “A” e “B”), se deram majoritariamente nas poligonais dos processos DNPM: 821.100/1995 (fase de requerimento de lavra – Universo Extração e Comércio de Minérios Ltda. Epp) e 821.108/1995 (fase de requerimento de lavra -Franciscate Extratora, Comércio e Transporte de Minérios Ltda), sem autorização minerária do DNPM (FATOS 3 e 4), haja vista que esses dois processos DNPM consistem em Requerimentos de Lavra, que não permitem a extração de areia. A área de extração ainda abrangeu, porém em porção mínima, as áreas das poligonais englobadas pelos processos DNPM 821.049/1995; 821.047/1995 (ambos em fase de concessão de lavra) e 821.090/2011(em fase de requerimento de pesquisa), tudo, de qualquer forma, sem as devidas licenças ambiental e minerária.

O mesmo Laudo Pericial n. 1762/2016 também demonstrou que a abertura de cavas para extração de areia (...) começou com a remoção da vegetação que ocorreu entre outubro de 2011 e janeiro de 2014", sendo que, "posteriormente, especificamente no período entre janeiro de 2014 e maio de 2014, houve uma intensa remoção da vegetação e de extração de areia que resultou a ampliação de uma cava inundada já existente formando a cava 8". Por fim, ainda segundo o mesmo laudo, "em junho de 2014 houve a construção de um aterro na cava A aliado ao término de abertura dessa cava" (ver fl. 86).

O laudo, por fim, demonstra que o volume de areia retirada das cavas foi de, pelo menos (o cálculo usou critérios conservadores, de modo que o valor real é seguramente maior do que esse), 55.199m3 e 29.786m3 (fls. 94) nas cavas "A" e "B", totalizando 84.985m3, o equivalente a R$ 6.687.469,65.

Para concretizar o intuito de extraírem irregularmente a areia naquela região, englobando as duas cavas, os denunciados causaram severos danos ambientais, consistentes na supressão de vegetação em estágios inicial e secundário do Bioma Mata Atlântica, em urna extensão de área correspondente a 74.883 m3.

Com efeito, no referido polígono de 1,6 ha, os técnicos da CETESEB constataram a supressão de vegetação nativa em estágio médio de regeneração do Bioma Mata Atlântica (ver Informação Técnica n. 185/14/CJS - fls. 05/11), fato este que foi confirmado pelo Laudo Pericial n. 1762/2016 - ver fl. 101), o que configura o tipo penal especifico previsto no art. 38-A da Lei n. 9605/98 (FATO 5). É relevante anotar que a sequência de fotos de fls. 87/89 demonstra visualmente que a robusta vegetação do Bioma Mata Atlântica que existia no local foi danificada e inteiramente suprimida entre Janeiro/2014 e Maio/2014.

Além disso, os denunciados, desde os danos ambientais, até apresente data, ainda vem impedindo a regeneração natural do Bioma Mata Atlântica no local, eis que não providenciaram a recuperação ambiental da área degradada, mediante a aprovação e implementação de Plano de Recuperação de Área Degradada-PRAD (FATO 6).

A autoria restou comprovada e recai sobre os denunciados, eis que há provas de que a responsável pela extração era a empresa J.J. EXTRAÇÃO ECOMERCIO DE AREIA LTDA, gerida pelos réus ADILSON e FÁBIO.

Nesse sentido, Marcelo Gutierrez (fls. 33/34), técnico da CETESB que vistoriou o local na data dos fatos, afirmou que ADILSON e FÁBIO estavam no local na primeira vistoria, em junho, e se apresentaram como responsáveis pelas atividades; e, na segunda vistoria, a "confirmativa", realizada em novembro/2014, era FABIO quem estava presente. Disse que a proprietária da empresa “J.J.”, Sra. Adriana Fernanda Franciscate, nunca apareceu para responder pela empresa, que sempre é FABIO e ADILSON que respondem pela empresa. Esclareceu que o material extraído era retirado do local pelo acesso criado pela empresa Franciscate, cujos administradores de fato são também ADILSON e FÁBIO. Enfatizou que quem se apresentou como responsável pela intervenção no local, perante a CETESB, foi a J.J. EXTRAÇÃO E COMERCIO DE AREIA LTDA., conforme carta datada de 29 de agosto de 2014, juntada ao processo administrativo do referido órgão. Disse, ainda, que os proprietários da empresa Universo, em defesa apresentada por escrito à CETESB, argumentaram que a área de suas poligonais havia sido transferida para a empresa "J.J." e que a extração deu-se sem seu consentimento (fls. 34 - dos 7min20seg aos 14min do arquivo de vídeo em mídia digital). Por fim, esclareceu que, possivelmente, o material extraído da poligonal da empresa Universo era processado na área pertencente à empresa Franciscate, visto que era o único local onde constavam os classificadores.

FABIO FRANCISCATE ainda é apontado como responsável pelas atividades irregulares por Luis Carlos Siqueira Salomão (fl. 150), para quem, segundo ele, FABIO assumiu pessoalmente a responsabilidade pelas atividades, vindo a firmar com a CETESB plano de recuperação ambiental dos danos ocasionados no local.

Além disso, a empresa Universo Extração e Comércio De Minérios Ltda, formalmente responsável pelos processos administrativos nessa área, e contra quem foram lavrados os autos de infração pela CETESB, informou que a área pertence de fato a empresa J.J. EXTRAÇÃO E COMERCIO DE AREIA LTDA., conforme relato do Sr. Marcelo Gutierrez, técnico da CETESB, responsável pela vistoria (fls. 34).

Diante do exposto, o MINISTÉRIO PUBLICO FEDERAL denuncia a Vossa Excelência:

a) JJ. EXTRAÇÃO E COMERCIO DE AREIA LTDA., pelas condutas típicas descritas no Fato1; Fato 2; Fato 5; e Fato 6, todos em concurso material (art. 69);

b) ADILSON FERNANDO FRANCISCATE, pelas condutas típicas descritas em todos os fatos narrados (Fato 1; Fato 2; Fato 3; Fato 4; Fato 5; e Fato 6), todos em concurso material (art. 69);

c) FABIO FERNANDO FRANCISCATE, pelas condutas típicas descritas em todos os fatos narrados (Fato 1; Fato 2; Fato 31 Fato 4: Fato 5; e Fato 6), todos em concurso material (art.69).

A denúncia foi recebida aos 28/05/2018 (fls. 167/169 dos autos físicos, p. 12/14 do id 163209620).

Após instrução, sobreveio sentença, da lavra do MM. Juiz Federal Renato Barth Pires e publicada em 24/01/2020 (fls. 572/581 dos autos físicos, p. 58/75 do id 163209624), que julgou parcialmente procedente a denúncia para absolver ADILSON FERNANDO FRANCISCATE das imputações que lhe foram feitas, e para condenar FÁBIO FERNANDO FRANCISCATE pela prática do crime previsto no artigo 2º da Lei nº 8.176/91, combinado com o artigo 55 da Lei nº 9.605/98 e com o artigo 70 do Código Penal, e pelo crime previsto no artigo 38-A, caput, da Lei nº 9.605/98, à pena total de 05 (cinco) anos e 06 (seis) meses de detenção, em regime inicial semiaberto, além de 55 (cinquenta e cinco) dias multa, cada um fixado em 01 (um) salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigido monetariamente; bem como para condenar a empresa JJ. EXTRAÇÃO E COMÉRCIO DE AREIA LTDA., pelo crime previsto no artigo 38-A, caput, da Lei nº 9.605/98, à pena de multa, fixada em R$ 50.000,00, a serem corrigidos até o efetivo pagamento, e às penas de suspensão total das atividades de extração mineral, pelo prazo de cinco anos, de interdição total das atividades de extração mineral constatadas, e de proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações, também pelo prazo de cinco anos.

Apela o Ministério Público Federal, postulando a reforma parcial da sentença, com a majoração das penalidades aplicadas aos apelados (fls. 582 e 588/591 dos autos físicos, p. 77 e 85/91 do id 163209624), nos seguintes termos:

a) majoração da pena-base do apelado FABIO por conta do grau de culpabilidade, conduta social e maus antecedentes;

b) exasperação com maior rigor da pena de FABIO por conta das agravantes, não sendo razoável a majoração de cada agravante em apenas 3 meses;

c) majoração da pena de multa de FABIO, considerada a vantagem econômica auferida, nos termos do art. 18 da Lei n. 9.605/98;

c) majoração da pena de multa da empresa JJ Extração, porque a apelada sequer se interessou em reparar os danos ambientais por meio de Plano de Recuperação Ambiental, por haver registro de inquérito policial (fls. 193) por fatos semelhantes, e por ter auferido, pelo menos, R$ 6.687.469,65 de renda bruta com a prática criminosa, em detrimento do meio ambiente (arts. 18 e 19 da Lei n. 9.605/98).

 

Apela o corréu FABIO e a empresa JJ EXTRAÇÃO E COMÉRCIO DE AREIA LTDA (fls. 584/585 dos autos físicos, p. 80/81 do id 163209624 e id 220033366), requerendo:

a) a nulidade dos atos processuais praticados a partir da fase do art. 402 do Código de Processo Penal, por cerceamento de defesa, dada a ausência de realização de laudo pericial complementar, em afronta aos princípios da verdade real, da ampla defesa e do devido processo legal;

b) absolvição por atipicidade, por ausência de objeto material, em relação aos delitos previstos nos arts. 38-A e 55, ambos da Lei nº 9.605/98, e no art. 2º da Lei nº 8.176/91, pois inexistem elementos nos autos a demonstrar que houve supressão de vegetação do Bioma Mata Atlântica ou extração de areia por parte de Fabio Fernando Franciscate e da empresa J.J. Extração e Comércio de Areia Ltda. na área objeto de autuação pela CETESB - Companhia Ambiental do Estado de São Paulo, pois apenas houve remoção de terra de um trecho do solo que já estava exposto, sem a vegetação nativa; porque o laudo não traz elementos concretos a concluir que houve extração de areia, e não de terra, e nem indicou a espécie de vegetação típica de Mata Atlântica que tenha sido suprimida; e porque o laudo foi elaborado 2 anos após a autuação; e porque a extração de areia ocorreu há mais de 20 anos pela empresa Universo Extração e Comércio de Minérios Ltda, estando com o estoque de areia esgotado quando da chegada da empresa JJ Extração; e porque as provas apontam que não existia areia no local ou equipamentos para beneficiamento do minério;

c) subsidiariamente, requer a aplicação do princípio da especialidade, com a exclusão do delito previsto no art. 2º da Lei nº 8.176/91 e a aplicação exclusiva do art. 55 da Lei nº 9.605/98, pois “matéria-prima” é o gênero do qual os “recursos minerais” são espécie

d) pede a redução da pena-base do crime do artigo 2º, “caput”, da Lei 8.176/91 para o mínimo legal por conta de fundamentação inadequada ao caso;

e) a exclusão das quatro agravantes aplicadas ao delito previsto no art. 38-A da Lei nº 9.605/98, por absoluta ausência de motivação;

f) a substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos, nos termos do art. 44 do CP;

g) aplicação da circunstância atenuante do art. 66 do Código Penal, em razão da apresentação e aprovação de Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD) junto à CETESB logo depois dos fatos, o qual se encontra em processo de licenciamento, mais especificamente na fase de licenciamento de instalação (doc. 01);

h) a redução para o mínimo legal da quantidade de dias-multa e do valor de cada dia-multa aplicada a FABIO pelos crimes do artigo 2º, “caput”, da Lei 8.176/91, e artigo 38-A, da Lei de Crimes Ambientais, por ausência ou deficiência de motivação;

i) em relação às penas aplicadas à pessoa jurídica, houve nulidade na fixação da pena de multa por não ter seguido a regra do artigo 18 da Lei n. 9.605/98; bem como a inconstitucionalidade das penas restritivas de direitos dos incisos I e II, do artigo 22, da Lei 9.605/98, por ausência de previsão legal dos limites máximo e mínimo de pena (limites temporais das penas, em violação ao artigo 5º, XXXIX, da CF), ou, ainda, a nulidade da pena aplicada em relação aos três incisos do artigo 22, por absoluta ausência de fundamentação.

 

Com as contrarrazões das partes (id 163209626 e 227727873), subiram os autos a esta Corte Regional.

A Procuradoria Regional da República, em parecer da lavra do Dr. JOSÉ ROBERTO PIMENTA OLIVEIRA, opinou pelo provimento do recurso ministerial e pelo desprovimento do apelo defensivo (id 253149980).

É o relatório.

Dispensada a revisão, nos termos regimentais.

 

 


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APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0001426-22.2018.4.03.6103

RELATOR: Gab. 44 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, FABIO FERNANDO FRANCISCATE, J. J. EXTRACAO E COMERCIO DE AREIA LTDA - EPP

Advogados do(a) APELANTE: FAUSTO LATUF SILVEIRA - SP199379-A, LEONARDO HENRIQUE ALEIKSCIVIEZ MICHELOTTI BARBOZA - SP178038-A, NEWTON DE SOUZA PAVAN - SP206363-A

APELADO: J. J. EXTRACAO E COMERCIO DE AREIA LTDA - EPP, FABIO FERNANDO FRANCISCATE, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

Advogados do(a) APELADO: FAUSTO LATUF SILVEIRA - SP199379-A, LEONARDO HENRIQUE ALEIKSCIVIEZ MICHELOTTI BARBOZA - SP178038-A, NEWTON DE SOUZA PAVAN - SP206363-A

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V O T O

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA (Relator):

FABIO FERNANDO FRANCISCATE foi condenado como incurso nas penas do artigo 2º da Lei nº 8.176/91, e artigos 55 e 38-A, caput, da Lei nº 9.605/98, por ter, entre outubro de 2011 e 18 de junho de 2014, na Fazenda Marajoara, situada na cidade de Caçapava/SP, explorado recursos minerais pertencentes à União (areia), em desacordo com o título autorizativo expedido pelo órgão federal responsável (DNPM atual ANM), bem como executado extração e lavra de recursos minerais, sem o competente título autorizativo ambiental emitido pela CETESB, e por ter entre janeiro e maio de 2014, danificado vegetação primária e secundária do Bioma Mata Atlântica, em estágio médio de regeneração natural de floresta do Bioma Mata Atlântica.

A empresa J.J. EXTRACÃO E COMERCIO DE AREIA LTDA foi condenada nas penas do artigo 38-A da Lei n. 9.605/98, por ter, entre janeiro e maio de 2014, danificado vegetação primária e secundária do Bioma Mata Atlântica, em estágio médio de regeneração natural de floresta do Bioma Mata Atlântica.

 

Pugna a Acusação, a majoração da pena-base, majoração do quantum para cada uma das agravantes e majoração da pena de multa em relação a Fabio. Quanto à empresa JJ Extração, pede a majoração da pena de multa.

Por sua vez, a defesa suscita a preliminar de nulidade por cerceamento de defesa, absolvição por ausência de materialidade delitiva, o afastamento da imputação do art. 2º da Lei nº 8.176/91 em razão da especialidade do art. 55 da lei 9.605/98, a redução da pena privativa de liberdade e afastamento ou redução da pena de multa.

 

Passo a análise dos recursos.

 

Do cerceamento defesa em razão do indeferimento de laudo complementar

 

Suscita a defesa a preliminar de nulidade dos atos processuais praticados a partir da fase do art. 402 do Código de Processo Penal por cerceamento de defesa, em afronta aos princípios da verdade real, da ampla defesa e do devido processo legal.

Alega que, em petição datada de 25/10/2019, apresentou quesitos complementares aos Peritos Criminais Federais que lavraram o Laudo Pericial nº 1762/2016, em busca da verdade real, e que o juízo a quo indeferiu o pedido de elaboração de laudo complementar e determinou a abertura do prazo para apresentação do Memorial, sob o argumento de que “a pretensão da defesa é de realização de nova prova pericial, o que não se pode admitir, já que perfeitamente caracterizada a preclusão”.

A defesa narra ter renovado o pedido no memorial como preliminar, mas a sentença afastou o pleito sem qualquer fundamentação.

Aduz que o juiz desconsiderou que a fase do artigo 402 do CPP possui justamente a finalidade de realização de diligências cuja necessidade surgiu na fase de instrução e que, no caso, os depoimentos de testemunhas arroladas pela defesa, bem como o interrogatório do Apelante, não puderam ser confrontados com a perícia por conta de lacunas ou contradições no que toca a elementares dos crimes imputados.

Argumenta que os depoimentos colhidos na audiência de instrução, inclusive dos representantes da CETESB, revelaram que na área autuada não existia areia, nem equipamentos concernentes à extração do minério; que comprovou que houve apenas retirada de terra, e não de areia, a pedido de FABIO, em área cuja vegetação era composta de eucaliptos, espinheiros e mato comum, além de vários espaços descampados.

Sustenta que não há que se falar em preclusão, pois existindo pertinência e relevância para tanto, a colheita de prova complementar, no caso laudo pericial complementar, deveria ter sido deferida independentemente de se tratar da fase do artigo 402, do Código de Processo Penal.

A preliminar é de ser rejeitada.

Consta dos autos que, após a oitiva das testemunhas e interrogatório dos acusados, em 10/10/2019, na fase do art. 402 do CPP, a defesa de Fabio e da empresa JJ requereu a concessão de um prazo para juntada de novos documentos relativos à recuperação ambiental da área em discussão, o que foi deferido pelo juízo a quo, pelo prazo de 15 dias (fl. 384 dos autos físicos, p. 45 do id 163209622).

Em 25/10/2019, a defesa apresentou petição requerendo, na fase do artigo 402 do CPP, a expedição de oficio à CETESB (Agência Ambiental de São José dos Campos), solicitando informações sobre a situação do pedido de licença de instalação registrado sob número 91431945 e a elaboração de laudo complementar, ao argumento que, na audiência de instrução realizada no dia 10/10/2019, os depoimentos das testemunhas e o interrogatório do Peticionário, relataram fatos que demandariam esclarecimentos complementares dos peritos, por apresentarem importantes divergências com as conclusões do laudo; que as testemunhas Odair José Minari e Marco Aurélio Gomes da Silva alegaram ter retirado terra e não areia da área em debate nos autos, a pedido de Fábio Franciscate, que, por sua vez, confirmou os fatos e disse que visava utilizar a terra para elevar o pátio no porto de areia em que trabalhava na época, na própria Fazenda Marajoara; no que toca à vegetação, o Peticionário disse que encontrou a área em janeiro de 2014 já com alguns clarões na vegetação e que a vegetação então existente apresentava “pés de eucalipto", “espinheiros”, "como um terreno abandonado, cheio de espinhos". Assim, a defesa requereu seja determinado aos peritos que subscreveram o Laudo Pericial n. 1762/2016 (fls. 79/103) a apresentação de laudo complementar respondendo aos seguintes quesitos (fls. 507/512 dos autos físicos, p. 112/117 do id 163209623):

 

“1) Quais foram os critérios que levaram à conclusão de que houve efetivamente extração de areia, e não de terra, entre janeiro e junho de 2014 no local periciado, mesmo tendo em conta que o levantamento de dados em campo foi realizado em maio de 2016, quase dois anos depois dos fatos?

2) Houve, diante da existência de escavações no local com trechos apresentando água no fundo, uma presunção de que se tratava de exploração de areia, reforçada pelo fato da área se localizar na Fazenda Marajoara, onde existem inúmeros portos de extração do citado minério?

3) Na resposta ao quesito de letra 'i.' do Laudo n° 1762/2016 (fl. 101), afirmou-se que "O local está inserido no Bioma Mata Atlântica e trata-se de vegetação em estágio inicial de processo de sucessão ecológica secundária, ocorrendo, em alguns casos, estágio intermediário", sem qualquer justificativa subsequente.

Assim, diante das declarações colhidas na audiência de instrução sobre a existência de "eucaliptos", "espinheiros", "espinhos" e "mato normal", além de alguns clarões sem vegetação, na área onde houve intervenção do acusado, indaga-se:

a) Quais foram os motivos concretos pelos quais se concluiu que a vegetação suprimida na área periciada era pertencente ao Bioma Mata Atlântica, que possui características próprias e específicas previstas na Lei n° 11.428/2006 e no Decreto n° 6.660/2008, que regulamenta seus dispositivos?

b) Mais precisamente, seria pelo simples fato da região de Caçapava, assim como vários estados brasileiros, fazer parte do referido biossistema? Ou seria decorrente da pesquisa "in loco" na área objeto de autuação pela CETESB? Caso a segunda resposta seja positiva, como foi possível, dois anos depois dos fatos, fazer uma análise com o grau de certeza exigido no processo penal?

c) Na hipótese de que a conclusão tenha se baseado em imagens de satélite, seriam estas adequadas para análise das características da vegetação?”

 

O juízo a quo indeferiu os pedidos, ao fundamento que a defesa havia requerido, na fase do artigo 402 do CPP, a concessão de um prazo para "juntada de novos documentos relativos à recuperação ambiental da área em discussão", mas acabou por formular pedido de realização de “laudo complementar”, pretendendo em verdade a realização de nova perícia judicial, o que já estava precluso, bem como porque não demonstrou que não conseguiu obter, por seus próprios meios, informações a respeito do pedido de licença de instalação junto à CETESB  (fl. 520 dos autos físicos, p. 5 do id 163209624):

 

“Vistos etc.

Fls. 507-515 e 518-519: na audiência de instrução realizada em 10.10.2019, a defesa dos acusados FÁBIO FERNANDO FRANCISCATI e J. J. EXTRAÇÃO E COMÉRCIO DE AREIA LTDA. requereu, na fase do artigo 402 do Código de Processo Penal, a concessão de um prazo para "juntada de novos documentos relativos à recuperação ambiental da área em discussão" (fls. 384). Este pedido foi deferido, nos termos em que formulado.

Agora, comparecem os acusados requerendo a "apresentação de um laudo complementar", verdadeiro eufemismo para indicar que sua pretensão é de realização de uma nova prova pericial, o que não se pode admitir, já que perfeitamente caracterizada a preclusão. Ainda que se admita, para efeito de argumentar, que fossem necessários outros esclarecimentos a partir do que apurado no curso da instrução, a defesa deveria tê-los requerido a tempo e modo. Não o fazendo, não é caso de acolhê-los nesta fase.

A defesa destes acusados tampouco comprovou que não conseguiu obter, por seus próprios meios, informações a respeito do pedido de licença de instalação da CETESB. Não comprovou sequer ter requerido tais informações à CETESB. Portanto, não é caso de deferir a expedição do ofício requerido.

Concedo um prazo adicional de cinco dias para que estes acusados, caso queiram, juntem tais documentos, mesmo prazo em que deverão apresentar memoriais escritos.

Em seguida, venham os autos conclusos para sentença.

Intimem-se.”

 

Em alegações finais, a defesa alegou a ocorrência de cerceamento de defesa com o indeferimento do pedido, requerendo a conversão do julgamento em diligência par que seja determinada a realização de laudo complementar pelos Peritos Federais Criminais que lavraram o Laudo Pericial e 1762/2016, a fim de que respondam os quesitos apresentados pela defesa na fase do artigo 402 CPP (fls. 521/531, p. 7/16 do id 163209624).

Por ocasião da prolação da sentença, o juiz afastou a preliminar, nos seguintes termos (fl. 573v., p. 61 do id 163209624):

 

“Quanto ao alegado cerceamento de defesa, reporto-me ao que decidido ás fis. 520. Estando a questão alcançada pela preclusão, não é cabível deferir quaisquer dos pleitos.”

 

Com efeito, não se tratava de diligência cuja necessidade decorreu da instrução, pois o Laudo Pericial n. 1762/2016 já contava dos autos desde o inquérito policial, tendo sido utilizado para fundamentar a denúncia.

O artigo 402 do Código de Processo Penal, na redação da Lei nº 11.719/2008, se presta para que as partes requeiram "as diligências, cuja necessidade ou conveniência se origine de circunstâncias ou de fatos apurados na instrução". Ou seja, não é a fase adequada para o requerimento de diligências cuja necessidade ou conveniência já era clara no momento oferecimento da defesa prévia. Nesse sentido anota Guilherme de Souza Nucci, in "Código de Processo Penal Comentado", Ed. RT, 5a ed., pg. 833:

 

Não se deve deixar para a fase final uma diligência que poderia ter sido pleiteada durante a instrução, pois o art. 499 é claro, ao referir-se à complementação da prova resultante de "circunstâncias ou de fatos apurados na instrução". Logo, requerimentos extemporâneos de prova podem ser indeferidos pelo magistrado, inclusive se for percebida a intenção de procrastinar o término do processo.

 

Ademais, registro ainda que o indeferimento de prova não implica ilegalidade, na medida em que a aferição da necessidade da produção da prova cabe ao juiz da causa, que tem ampla visão sobre o desenrolar da ação penal. O juiz é o destinatário das provas e tem o dever de indeferir as inúteis e meramente protelatórias (art. 400, § 1º do CPP). Nesse sentido situa-se o entendimento dos Tribunais Regionais Federais, v.g.:

 

PENAL. HABEAS CORPUS. AÇÃO PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. INDEFERIMENTO DE PROVA PERICIAL. PROVA DOCUMENTAL EM PODER DO RÉU. INEXISTÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA. ORDEM DENEGADA. 1. O indeferimento de prova, por si só, não constitui cerceamento de defesa. Precedentes. 2. As dificuldades econômicas da empresa podem ser aferidas por outros meios de prova que não a pericial, como ações de execução, penhoras, protestos etc. em nome da empresa. O juiz é o destinatário da prova. 3. Ordem denegada.

TRF-1a Região - 4a Turma - HC 200501000615151 - Rel. Des.Fed. Carlos Olavo - DJ 12.12.2005 p.32

HABEAS CORPUS" - PENAL E PROCESSUAL PENAL - ARTIGO 168-A DO CÓDIGO PENAL - DIFICULDADES FINANCEIRAS - PROVA PERICIAL - JUÍZO DE PERTINÊNCIA E RELEVÂNCIA DO MAGISTRADO - INEXISTÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL - ORDEM DENEGADA. 1. O magistrado é o destinatário último da prova, cabendo-lhe, por isso mesmo, a tarefa de fiscalizar a atividade probatória das partes, zelando, continuamente, pela celeridade e racionalidade da marcha processual. E é justamente porque é o destinatário último da prova, que faz todo o sentido que o Juiz possa, uma vez já convencido do fato pelos demais elementos de convencimento, desconsiderar a prova pericial. É evidente que se o Juiz pode desconsiderar a prova pericial realizada, pode também entender desnecessária a sua produção. 2. A não realização da perícia contábil durante a instrução processual não acarreta o cerceamento de defesa, haja vista que esta Egrégia Corte Regional vem firmando entendimento de que a realização de perícia, para o fim de comprovar as dificuldades financeiras, nos crimes de apropriação indébita previdenciária, é dispensável, bastando, para tanto, que sejam juntados aos autos balanços patrimoniais relativos aos exercícios financeiros aludidos na inicial acusatória, ou seja, da época em que ocorreu a conduta criminosa. 3. Precedentes desta Corte e do Superior Tribunal de Justiça. 4. Ordem denegada

TRF-3a Região - 5a Turma - HC 200703000295569 - Rel. Des.Fed. Ramza Tartuce - DJ 09.10.2007 p.305

 

Cumpre registrar que a materialidade dos crimes já se encontrava demonstrada não apenas pelo laudo pericial n. 1762/2016, mas também pelo procedimento administrativo instaurado pela Cetesb, em especial pelos autos de infração lavrados em 2014, que gozam da presunção de veracidade e legalidade.

Nesse diapasão, caberia à defesa a demonstração da imprescindibilidade da diligência, nos termos do artigo 156 do Código de Processo Penal.

Além disso, o magistrado não está obrigado a deferir toda e qualquer prova solicitada pelas partes, sendo perfeitamente lícito o indeferimento fundamentado, nos termos do art. 400, § 1º c.c. o art. 402, ambos do Código de Processo Penal.

Cumpre ressaltar que a defesa não demonstrou efetivo prejuízo, a ensejar a anulação do ato, nos termos do artigo 563 do Código de Processo Penal.

Desta forma, não há falar em cerceamento de defesa.

 

Do princípio da especialidade

 

No tocante à alegação de concurso aparente de normas entre o artigo 2º, caput, da Lei nº 8.176/1991 e artigo 55, caput, da Lei nº 9.605/1998, observo que o réu foi denunciado como incurso nos artigos 55, caput, da Lei nº 9.605/1998 e 2º, caput, da Lei nº 8.176/1991, na medida em que praticava atos de extração de areia sem obtenção das competentes licenças, bem como explorava matéria-prima pertencente à União.

Alega a defesa que deve ser aplicado o princípio da especialidade, com a exclusão do delito previsto no art. 2º da Lei nº 8.176/91 e a aplicação exclusiva do art. 55 da Lei nº 9.605/98, pois “matéria-prima” é o gênero do qual os “recursos minerais” são espécie.

Não assiste razão à defesa. No caso em tela, observo que deve prevalecer o posicionamento quanto à tipificação das condutas nos termos do artigo 2º da Lei nº 8.176/91 e artigo 55 da Lei nº 9.605/98, pois ocorreu a violação de bens jurídicos distintos, respectivamente, o patrimônio público e o meio ambiente, caracterizando o concurso formal de crimes (Art. 70 do CP).

Cada uma das ações, ao atingir bens jurídicos distintos, penalmente tutelados, resultou na ocorrência concomitante de mais de um delito.

O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento consolidado no sentido da ocorrência de concurso formal de crimes, em vista da lesividade a bens jurídicos distintos. Nesse sentido:

 

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. EXTRAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS MINERAIS. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. NÃO APLICAÇÃO. LESÃO EXPRESSIVA. ART. 55 DA LEI N. 9.605/1998. ART. 2º DA LEI N. 8.176/1991. PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. NÃO INCIDÊNCIA. CRIMES AUTÔNOMOS. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.

1. É inaplicável o princípio da especialidade entre os delitos dos arts. 2º da Lei n. 8.176/1991 (usurpação de patrimônio da União) e 55 da Lei n. 9.605/1998 (extração irregular de recursos minerais), porquanto tutelam bens jurídicos diversos: o primeiro protege a ordem econômica e o último, o meio ambiente. Aplica-se, ao caso, o concurso formal de crimes. Precedentes.

2. Não é cabível a aplicação do princípio da insignificância à espécie, haja vista a expressividade da lesão ao meio ambiente - 1.996 metros quadrados afetados pela atividade extrativista -, inclusive com a utilização de maquinário pesado - retroescavadeira e caminhão.

3. A discussão acerca da quantidade de material efetivamente extraído não pode ser enfrentada por esta Corte Superior, por demandar o revolvimento das provas dos autos, providência obstada pela Súmula n. 7 do STJ.

4. Agravo regimental não provido.

(AgRg no REsp n. 1.840.893/PB, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 26/5/2020, DJe de 4/6/2020.)”

 

PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. EXTRAÇÃO E EXPLORAÇÃO MINERAL CLANDESTINA, A PROCURA DE OURO, SEM AUTORIZAÇÃO LEGAL. INCIDÊNCIA DOS ARTIGOS 2º, DA LEI Nº 8.176/91, E 55 DA LEI Nº 9.605/98. DIVERSIDADE DE BENS JURÍDICOS TUTELADOS. INEXISTÊNCIA DE CONFLITO APARENTE DE NORMAS. RECURSO ORDINÁRIO DESPROVIDO.

Na linha da pacificada jurisprudência desta eg. Corte, não existe conflito aparente de normas entre o art. 2º da Lei nº 8.176/1991 e o art. 55 da Lei nº 9.605/1998, porquanto o primeiro incrimina o agente que usurpa o patrimônio da União sem autorização legal ou em desacordo com as obrigações impostas por título autorizativo, enquanto que o segundo visa à proteção do meio ambiente, punindo quem executa pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem a devida autorização, permissão, concessão ou licença. (Precedentes).

Recurso ordinário desprovido.

(RHC n. 48.646/PE, relator Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 24/2/2015, DJe de 4/3/2015.)

 

PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIMES AMBIENTAL E CONTRA A ORDEM ECONÔMICA. APARENTE CONFLITO DE NORMAS. INOCORRÊNCIA. BENS JURÍDICOS DISTINTOS. LEIS 8.176/91 E 9.605/98. ENTENDIMENTO DESTE STJ. SÚMULA 83/STJ. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULAS 282 E 356 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. APLICAÇÃO. AGRAVO NÃO PROVIDO.

1. As Turmas componentes da 3ª Seção têm entendimento firme no sentido de que os arts. 55 da Lei 9.605/98 e 2º, caput, da Lei 8.176/91 protegem bens jurídicos distintos: o meio ambiente e a ordem econômica, de forma que não há falar em derrogação da segunda pela primeira, restando ausente o conflito aparente de normas.

2. "O artigo 2º da Lei 8.176/91 tipifica o crime de usurpação, como modalidade de delito contra o patrimônio público, consistente em produzir bens ou explorar matéria-prima pertencente à União, sem autorização legal ou em desacordo com as obrigações impostas pelo título autorizativo, enquanto que o artigo 55 da Lei 9.605/98 tipifica o delito contra o meio-ambiente, consubstanciado na extração de recursos minerais sem a competente autorização, permissão, concessão ou licença, ou em desacordo com a obtida, sendo induvidosamente distintas as situações jurídico-penais" (HC 35.559/SP, Rel. Min. HAMILTON CARVALHIDO, DJ 05/02/2007) 3. Por outro vértice, a ausência de pronunciamento em torno da questão contida nos dispositivos da legislação federal invocada impede o conhecimento do recurso especial, pela falta de prequestionamento. Incidência das Súmulas 282 e 356 do STF.

Ademais, a aceitação, pela jurisprudência deste STJ, do chamado "prequestionamento implícito" não socorre aos recorrentes.

4. Agravo regimental não provido.

(AgRg no AREsp n. 137.498/SP, relator Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 19/11/2013, DJe de 27/11/2013.)

 

Logo, deve prevalecer o entendimento no tocante à ocorrência do concurso formal de crimes, de modo a ser mantida a imputação dos delitos tipificados no artigo 2º da Lei nº 8.176/91 e artigo 55 da Lei nº 9.605/98 c.c. o artigo 70 do Código Penal.

 

Da materialidade delitiva

 

A defesa postula a absolvição por atipicidade da conduta, por ausência de objeto material, em relação aos delitos previstos nos art. 55 da Lei nº 9.605/98 e art. 2º da Lei nº 8.176/91, ao argumento que inexistem elementos nos autos a demonstrar que houve extração de areia por parte de Fabio Fernando Franciscate e da empresa J.J. Extração e Comércio de Areia Ltda. na área objeto de autuação pela CETESB - Companhia Ambiental do Estado de São Paulo.

Alega que houve apenas remoção de terra de um trecho do solo que já estava exposto, sem a vegetação nativa, para elevação do pátio de um porto de areia; que o laudo não traz elementos concretos a concluir que houve extração de areia, e não de terra; que o laudo pericial foi elaborado 2 anos após a autuação; que a extração de areia ocorreu há mais de 20 anos pela empresa Universo Extração e Comércio de Minérios Ltda, estando com o estoque de areia esgotado quando da chegada da empresa JJ Extração; que o laudo pericial reconheceu que a área explorada está classificada como “zona de recuperação”, ou seja, tratava-se de área que já teve sua reserva de areia praticamente esgotada pelo administrador anterior, e que as provas apontam que não existia areia no local ou equipamentos para beneficiamento do minério.

 

A materialidade dos delitos está comprovada nos autos, pelos seguintes elementos:

a) Informação Técnica n. 185/14/CJS, elaborada por técnico da Cetesb, acompanhada do relatório fotográfico, que informa que vistoria realizada em 18/06/2014 na Fazenda Marajoara foi constada: (i) a extração de areia sem as devidas licenças ambientais da CETESB, na faixa de reserva ecológica entre duas cavas do empreendimento em questão, perfazendo 1,6 ha; (ii) a supressão de vegetação nativa em estágio médio de regeneração do Bioma Mata Atlântica na mesma área; (iii) o decapeamento de área contígua a cava sul do empreendimento, próxima a área extraída irregularmente, com supressão de vegetação nativa do Bioma Mata Atlântica em estágio inicial de regeneração em área de 2,095 há. Informa ainda a aplicação de 3 penalidades de multa e embargo das áreas onde houve supressão de vegetação (fls. 05/11, p. 11/17 do id 163209617);

b) Auto de Infração para imposição de penalidade de multa AIIPM 57000363 expedida pela Cetesb, pela infração constatada em 18/06/2014 consistente em extração de areia, sem as devidas licenças ambientais da CETESB em área de aproximadamente 1,6 hectares (faixa ecológica   entre cavas do empreendimento) e inserida em Zona de Recuperação (ZR) conforme o Zoneamento, Ambiental Minerário Resolução SMA 28/99 (fls. 13/14, p. 19/20 do id 163209617);

c) Laudo Pericial n. 1762/2016 - NUCRIM/SETEC/SR/PF/RJ (fls. 79/103, p. 24/48 do id 163209618) elaborado a partir do levantamento de dados em campo, e imagens de satélite de outubro/2011, janeiro/2014, junho/2014 e novembro/2014, que identificou a exploração minerária, sem as devidas licenças ambientais da CETESB e do DNPM, em duas cavas distintas, que denominou de Cavas "A" e "B". Conforme laudo pericial, “os peritos constataram a presença de duas cavas inundadas fruto da extração de areia fora da Área de Preservação Permanente (APP) do Rio Paraíba do Sul. Na área das cavas ocorreu a remoção da vegetação para viabilizar a extração de areia”; “a abertura de cavas para extração de areia, ao atingir o nível do lençol freático, resultou na formação de lagoas na margem direita do Rio Paraíba do Sul e iniciou a remoção da vegetação entre outubro de 2011 e janeiro de 2014, conforme pode ser observado na Figura 9”; “no período entre janeiro de 2014 e maio de 2014, houve intensa remoção da vegetação e extração de areia que resultou na ampliação de uma cava inundada já existente formando a cava B, num corte no terreno próximo à cava B e na abertura de boa parte da cava A (Figura 10)”. Os peritos constataram o local examinado não tem licença da CETESB para extração de areia. O laudo também atesta que o volume de areia retirada das cavas foi de, pelo menos (o cálculo usou critérios conservadores, de modo que o valor real é seguramente maior do que esse), 55.199m3 e 29.786m3 (fls. 94) nas cavas A e B, totalizando 84.985m3, o equivalente a R$ 6.687.469,65.

A efetiva extração e exploração de areia na área de 1,6 hectares efetuada na faixa de reserva ecológica entre duas cavas do empreendimento, e inserida em Zona de Recuperação (ZR) conforme o Zoneamento Ambiental Minerário - Resolução SMA 28/99, fora dos limites da autorização ambiental, restou demonstrada não apenas pelas imagens de satélite constantes do laudo pericial, mas também pela Informação Técnica nº 0185/14/CJS da Cetesb, que ensejou a lavratura dos autos de infração, e fotografias constantes do relatório fotográfico (figuras 4 a 7), do qual se verifica tratar de extração de areia, e não de terra.

Ademais, verifica-se das imagens de satélite referente aos meses de maio/2014 e junho/2014, a turbidez aumentada da água em função das partículas em suspensão, o que aponta a operação na área, resultante do processo de dragagem e de lavagem da areia (v. fl. 88, p. 33 do id 163209618).

Como fundamentado na r. sentença apelada, “a formação da cava é uma decorrência lógica da extração de areia, atividade econômica efetivamente desempenhada pela JJ e pelos seus administradores”.

Conforme mencionado pelo MPF em suas contrarrazões, “As meras ilações apresentadas pelo Apelante não justificam ter sido extraído terra, ao invés de areia das cavas previamente existentes, inclusive com requerimento de concessão de lavra de areia. As cavas se encontravam inundadas em decorrência de extração de areia, sendo certo que essa era a atividade econômica desenvolvida pelos Apelantes.  Portanto, trata-se de tentativa de confundir o julgador com o intuito de afastar o objeto material (“recurso mineral”) dos delitos a que foram condenados (art. 55 da Lei 9605/98 e art. 2º da Lei 8176/91) e assim tornar os fatos atípicos”.

 

A defesa pede a absolvição quanto ao crime do no art. 38-A da Lei nº 9.605/98, alegando que inexistem elementos nos autos a demonstrar que houve supressão de vegetação do Bioma Mata Atlântica, apta a configurar a elementar do tipo.

Sustenta que o laudo, ou qualquer documento dos autos, não indicou a espécie de vegetação prevista legalmente como típica do Bioma Mata Atlântica que tenha sido suprimida, não bastando afirmar que, em tese, o “local está inserido no Bioma Mata Atlântica”.

Aduz ainda que o art. 38-A somente prevê punição para quem destrói vegetação em estágio médio ou avançado de regeneração, mas não em estágio inicial.

Não assiste razão à defesa.

Dispõe o art. 38-A da Lei n. 9.605/1998 que constitui crime “destruir ou danificar vegetação primária ou secundária, em estágio avançado ou médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção”.

Consoante jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, para a tipificação dos delitos previstos nos arts. 38 e 38-A da Lei ambiental é necessário que a conduta tenha sido praticada contra vegetação de floresta de preservação permanente (art. 38) e vegetação primária ou secundária, situada no Bioma Mata Atlântica (art. 38-A), sendo imprescindível a realização de perícia na medida em que não é qualquer supressão/destruição que caracteriza o ilícito do art. 38 da Lei n. 9.605/98, sendo dispensável a prova pericial apenas quando houver nos autos outros elementos idôneos, aptos a comprovar a materialidade do delito:

 

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. ART. 38-A DA LEI N. 9.605/1998. PROVA DA MATERIALIDADE. DELITO QUE DEIXA VESTÍGIOS. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE EXAME PERICIAL. REALIZAÇÃO POR OUTROS MEIOS. NÃO JUSTIFICADA. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 158, 159 E 167 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL E DO ART. 19 DA LEI DE CRIMES AMBIENTAIS. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. "O exame de corpo de delito é imprescindível para comprovar a materialidade das infrações que deixam vestígios, sendo que a sua realização de forma indireta somente é possível quando esses tiverem desaparecido ou o lugar tenha se tornado inapropriado para a sua realização, situações que não se apresentam no caso ora examinado" (AgRg no REsp n. 2.030.432/RJ, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 13/12/2022, DJe de 19/12/2022).

2. Para o oferecimento da peça acusatória é necessária a existência de indícios de autoria e a prova sobre a materialidade delitiva, sendo assente na jurisprudência desta Corte a necessidade de elaboração de laudo pericial para fins de comprovação da materialidade do crime ambiental previsto no art. 38-A da Lei n. 9.605/1998, somente podendo ser substituído por outros meios probatórios quando houver o desaparecimento dos vestígios ou registrada a impossibilidade de fazê-lo, o que não ocorreu na espécie. (Inteligência dos arts. 158, 159 e 167 do CPP).

3. Vale acrescentar que a própria Lei dos Crimes Ambientais determina, em seu art. 19, a utilização de perícia para a constatação do dano ambiental e, sempre que possível, a quantificação dos prejuízos inclusive para fins de prestação de fiança e cálculo de multa a ser imposta ao infrator.

4. Na espécie, o laudo pericial é imprescindível para aferição de que se tratava de árvores nativas e em estágio médio de regeneração do Bioma Mata Atlântica, porquanto não é qualquer supressão ou destruição que tipifica os delitos dos arts. 38 e 38-A da Lei n. 9.605/1998, sendo exigível que seja a conduta praticada contra vegetação de preservação permanente primária ou secundária, localizada no Bioma Mata Atlântica. A propósito: AREsp n. 1.810.747, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 5/3/2021.

5. Agravo regimental desprovido.

(AgRg no AgRg no RHC n. 165.610/SC, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Sexta Turma, julgado em 14/8/2023, DJe de 17/8/2023.)

 

PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIME AMBIENTAL. ARTIGO 38-A DA LEI 9.605/98. ABSOLVIÇÃO. MATERIALIDADE COMPROVADA. LAUDO PERICIAL. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.

1. É assente na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que, para a tipificação dos delitos previstos nos arts. 38 e 38-A da Lei ambiental é necessário que a conduta tenha sido praticada contra vegetação de floresta de preservação permanente (art. 38) e vegetação primária ou secundária, situada no Bioma Mata Atlântica (art. 38-A) [...] O tema é complexo, não facilmente identificável por leigos, sendo imprescindível a realização de perícia na medida em que não é qualquer supressão/destruição que caracteriza o ilícito do art. 38 da Lei Ambiental (AgRg no AREsp n. 1.571.857/PR, Quinta Turma, de minha relatoria, DJe de 22/10/2019).

2. In casu, as instâncias de origem condenaram o recorrente pela existência de provas concretas acerca da destruição de vegetação nativa da Mata Atlântica, em estágio médio de regeneração, sem autorização do órgão ambiental competente, inclusive por meio de laudo pericial, tudo nos termos do art 38-A da Lei n. 9.605/1998.

Assim, rever os fundamentos utilizados pela Corte de origem, para decidir pela absolvição do acusado, tendo em vista a ausência de prova acerca da ocorrência do crime, como requer a parte agravante, importa revolvimento de matéria fático-probatória, vedado em recurso especial, segundo óbice da Súmula 7/STJ.

3. Agravo regimental não provido.

(AgRg no AREsp n. 2.026.669/ES, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 19/4/2022, DJe de 25/4/2022.)

 

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO. CRIME AMBIENTAL. CONDENAÇÃO PELO ART. 38-A, CAPUT, C/C O ART. 53, II, "c", DA LEI N. 9.605/98. AUSÊNCIA DE LAUDO PERICIAL. CRIME QUE DEIXA VESTÍGIOS. PRECLUSÃO AFASTADA IN CASU. FUNDAMENTAÇÃO A QUO NÃO IDÔNEA. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA, DE OFÍCIO.

I - A Terceira Seção desta Corte, seguindo entendimento firmado pela Primeira Turma do col. Pretório Excelso, firmou orientação no sentido de não admitir a impetração de habeas corpus em substituição ao recurso adequado, o que implica o não conhecimento da impetração, ressalvados casos excepcionais em que, configurada flagrante ilegalidade, apta a gerar constrangimento ilegal, seja recomendável a concessão da ordem de ofício.

II - Sobre os crimes ambientais em comento, assim se pronunciou esta eg. Quinta Turma, acerca da imprescindibilidade da perícia: "Para a tipificação dos delitos previstos nos arts. 38 e 38-A da Lei ambiental é necessário que a conduta tenha sido praticada contra vegetação de floresta de preservação permanente (art. 38) e vegetação primária ou secundária, situada no Bioma Mata Atlântica (art. 38-A) [...] O tema é complexo, não facilmente identificável por leigos, sendo imprescindível a realização de perícia na medida em que não é qualquer supressão/destruição que caracteriza o ilícito do art. 38 da Lei Ambiental" (AgRg no AREsp n. 1.571.857/PR, Quinta Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 22/10/2019).

III - No mesmo sentido, entende a eg. Sexta Turma desta Corte Superior: "A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça está fixada no sentido de que é necessária a realização de exame pericial em delitos não transeuntes, sendo possível a sua substituição por outros meios probatórios somente quando a infração não deixar vestígio ou se o corpo de delito houver desaparecido, a teor do disposto nos arts. 158 e 167 do Código de Processo Penal (AgRg no AgRg no REsp 1.419.093/DF, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, QUINTA TURMA, julgado em 10/03/2015, DJe de 26/03/2015; sem grifos no original) [...] O exame de corpo de delito direto somente pode ser suprido por outros meios probatórios, na forma indireta, para fins de comprovação da materialidade dos crimes ambientais de natureza material e não transeunte - no caso, o art. 38 da Lei n.º 9.605/98 -, na hipótese em que houver o desaparecimento dos vestígios ou quando o lugar dos fatos tenha se tornado impróprio à análise pelos experts, circunstâncias excepcionais que não se enquadram ao caso em análise" (AgRg no REsp n. 1.782.765/PR, Sexta Turma, Relª. Minª. Laurita Vaz, DJe de 02/08/2019).

IV- No caso concreto, a perícia in loco foi dispensada com fundamentação que não se coaduna às exigências do Código de Processo Penal.

V - Soma-se a isso o afastamento, in casu, de eventual preclusão, tendo em vista o requerimento do laudo em resposta à acusação e o efetivo debate do tema em alegações finais.

Habeas corpus não conhecido. Ordem parcialmente concedida, de ofício.

(HC n. 570.680/PR, relator Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 26/5/2020, DJe de 3/6/2020.)

 

No caso, a materialidade delitiva do crime do art. 38-A da Lei n. 9.605/98 restou comprovada pelo conjunto probatório acostado aos autos, apto a demonstrar a efetiva supressão de vegetação nativa em estágio médio de regeneração do Bioma Mata Atlântica:

a) Informação Técnica n. 185/14/CJS, elaborada por técnico da Cetesb, acompanhada do relatório fotográfico, que informa que em 18/06/2014 foi realizada vistoria na Fazenda Marajoara, tendo sido constada: (i) a extração de areia sem as devidas licenças ambientais da CETESB, na faixa de reserva ecológica entre duas cavas do empreendimento em questão, perfazendo 1,6 ha; (ii) a supressão de vegetação nativa em estágio médio de regeneração do Bioma Mata Atlântica na mesma área; (iii) o decapeamento de área contígua a cava sul do empreendimento, próxima a área extraída irregularmente, com supressão de vegetação nativa do Bioma Mata Atlântica em estágio inicial de regeneração em área de 2,095 há. Informa ainda a aplicação de 3 penalidades de multa e embargo das áreas onde houve supressão de vegetação (fls. 05/11, p. 11/17 do id 163209617).

b) Auto de Infração para imposição de penalidade de embargo da área AIIPEMBARGO 57000032, referente a embargo de área de 1,6 há onde ocorreu supressão de vegetação nativa secundária do Bioma Mata Atlântica, em estágio médio de regeneração, não passível de autorização, em Zona de Recuperação (ZR) conforme o Zoneamento, Ambiental Minerário Resolução SMA 28/99 (fl. 17, p. 23 do id 163209617)

c) Auto de Infração para imposição de penalidade de multa AIIPM 57000362, por destruir, mediante supressão, 1,6 ha de vegetação nativa secundária do Bioma Mata Atlântica, em estágio médio de regeneração, não passível de autorização, em Zona de Recuperação (ZR) conforme o Zoneamento, Ambiental Minerário Resolução SMA 28/99 (fls. 18/19, p. 24/25 do id 163209617);

d) Laudo Pericial n. 1762/2016 - NUCRIM/SETEC/SR/PF/RJ (fls. 79/103, p. 24/48 do id 163209618) elaborado a partir do levantamento de dados em campo, e imagens de satélite de outubro/2011, janeiro/2014, junho/2014 e novembro/2014, tendo os peritos constataram a presença de duas cavas inundadas fruto da extração de areia fora da Área de Preservação Permanente (APP) do Rio Paraíba do Sul, onde ocorreu a remoção da vegetação para viabilizar a extração de areia; “a abertura de cavas para extração de areia, ao atingir o nível do lençol freático, resultou na formação de lagoas na margem direita do Rio Paraíba do Sul e iniciou a remoção da vegetação entre outubro de 2011 e janeiro de 2014, conforme pode ser observado na Figura 9”; “no período entre janeiro de 2014 e maio de 2014, houve intensa remoção da vegetação e extração de areia que resultou na ampliação de uma cava inundada já existente formando a cava B, num corte no terreno próximo à cava B e na abertura de boa parte da cava A (Figura 10)”.

Consta do laudo que no local foi realizada a retirada da cobertura vegetal e a retirada de material de uma área de aproximadamente 74.883 M2 (incluindo as áreas utilizadas parra beneficiamento do material extraído).

Os peritos constaram que o local dos exames não se encontra dentro de Área de Preservação Permanente, nem dentro de Unidade de Conservação, porém, encontra-se dentro de Zona de Recuperação.

Os peritos ainda responderam que “o local está inserido no Bioma Mata Atlântica e trata-se de vegetação em estágio inicial de processo de sucessão ecológica secundária, ocorrendo, em alguns casos, estágio intermediário”.

 

Não desconheço que o tipo penal do art. 38-A da Lei n. 9.605/98 somente prevê punição em caso de destruição ou dano de vegetação em estágio avançado ou médio de regeneração do Bioma Mata Atlântica, mas não em estágio inicial.

No caso, conforme Informação Técnica n. 185/14/CJS, elaborada por técnico da Cetesb, acompanhada do relatório fotográfico, foi constatado na vistoria realizada em 18/06/2014 a efetiva supressão de vegetação nativa em estágio médio de regeneração do Bioma Mata Atlântica, na área de 1,6 hectares na Fazenda Marajoara, tendo sido lavrado os Autos de Infração para imposição de penalidade de multa e de embargo da área (AIIPM 57000362 e AIIPEMBARGO 57000032), conduta essa que se amolda ao tipo penal do art. 38-A da Lei n. 9.605/98.

Apesar de a defesa sustentar que foram extraídos apenas espinheiros da região, não é o que se observa das fotografias constantes do relatório fotográfico (p. 13/11 do id 163209617) e das Figuras 9 a 11 do laudo pericial (p. 32/34 do id 163209618). No relatório fotográfico restou demonstrado a supressão de vegetação nativa em estágio médio de regeneração, inclusive um espécime arbóreo de grande porte remanescente da vegetação suprimida. E a sequência das imagens do laudo pericial demonstra que entre outubro/2011 a janeiro/2014 havia robusta vegetação do Bioma Mata Atlântica no local, que foi inteiramente suprimida entre janeiro/2014 e maio/2014.

Ademais, desnecessária a indicação das espécies de vegetação suprimida, para a condenação pela prática do crime do art. 38-A, bastando apenas que o laudo pericial ateste a supressão de vegetação nativa de Mata Atlântica em estágio médio de regeneração do Bioma da Mata Atlântica.

Como mencionado acima, a materialidade restou comprovada no Auto de Infração, Informação Tecnica e Laudo pericial, que evidenciam o desmatamento de vegetação nativa da Mata Atlântica em estágio médio de regeneração.

 

Não houve insurgência das partes em relação à autoria delitiva.

Não obstante, verifico que, a despeito de os autos de infração terem sido lavrados em nome de “Universo Extração e Comércio de Minérios Ltda.”, o próprio acusado FABIO compareceu à CETESB, comunicando ter sido somente ele o responsável pelas escavações, sendo ele o administrador da empresa JJ Extração, que efetivamente explorava a área.

 

Passo à análise da dosimetria da pena.

 

Da dosimetria da pena de FABIO pelos crimes do art. 2º da Lei n. 8.176/91 e art. 55 da Lei n. 9.605/98

 

Como visto acima, há concurso formal entre os crimes dos art. 2º da Lei n. 8.176/91 e art. 55 da Lei n. 9.605/98, nos termos do art. 70 do Código Penal.

O juízo sentenciante fixou a pena do crime mais grave (art. 2º da Lei n. 8.176/91) em 03 anos de detenção, considerada as circunstâncias e consequências do crime, ausentes agravantes e atenuantes, sendo a pena acrescida em 1/6 por conta do concurso formal com o crime do art. 55 da Lei n. 9.605/98, resultando na pena de 03 anos e 06 meses de detenção, nos seguintes termos:

 

“Considerando-se os elementos constantes do artigo 59 do Código Penal, verifica-se que o grau de culpabilidade não excedeu à habitual para este tipo de delito. Apesar dos apontamentos em sua folha de antecedentes, não vieram aos autos certidões que pudessem autorizar um juízo a respeito de possíveis maus antecedentes. Não há elementos nos autos para aferir a personalidade do acusado. Os motivos do crime são, efetivamente, aqueles próprios dos delitos análogos ao presente. As circunstâncias e consequências do crime, por seu turno, são daquelas que justificam o aumento da pena, já que a conduta foi causadora de significativo abalo ao bem jurídico tutelado (o patrimônio da União), particularmente o elevadíssimo valor subtraído indevidamente pela conduta, conforme avaliação realizada no âmbito da perícia.

Fixa-se a pena base, portanto, para este crime, em 03 (três) anos de detenção, como necessária e suficiente à reprovação da conduta do réu FÁBIO.

Não há atenuantes ou agravantes a considerar.

Em razão do concurso formal de infrações em relação ao crime do artigo 55 da Lei nº 9.605/98, a pena do crime mais grave (do artigo 2º, "caput", da Lei nº 8.176/91) deve ser acrescida de 1/6 (um sexto), nos termos do artigo 70 do Código Penal, totalizando 03 anos e 06 meses de detenção.

Condeno o réu, ainda, à pena de multa.

Diante das razões já expressas, da capacidade econômica do réu (art. 60 do Código Penal) e do critério de gradação estabelecido no art. 2º, §2º, da Lei nº 8.176/91, fixo a pena de multa em 35 (trinta e cinco) dias-multa, cada um fixado em 01 (um) salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigido monetariamente.

 

 

A defesa requer a redução da pena-base do crime do artigo 2º, “caput”, da Lei 8.176/91 para o mínimo legal por conta de fundamentação inadequada ao caso.

Não procede a alegação.

O juiz sentenciante fixou a pena-base acima do mínimo legal, em 03 anos de detenção, fundamentando a majoração nas circunstâncias e consequências do crime, considerado que “a conduta foi causadora de significativo abalo ao bem jurídico tutelado (o patrimônio da União), particularmente o elevadíssimo valor subtraído indevidamente pela conduta, conforme avaliação realizada no âmbito da perícia”.

Destarte, as circunstâncias do crime justificam a elevação da pena-base, considerado que o laudo pericial n. 1762/2016 concluiu que o volume de areia extraída das cavas foi de pelo menos 55.199m3 e 29.786m3 nas cavas “A” e “B”, totalizando 84.985m3 (p. 39 do id 163209618).

Ademais, as consequências do crime também se mostram exacerbadas, uma vez que, segundo o cálculo efetuado no laudo pericial, o valor do material explorado sem autorização seria de aproximadamente R$ 6.687.469,65 (seis milhões, seiscentos e oitenta e sete mil, quatrocentos e sessenta e nove reais e noventa e cinco centavos) (p. 42 do id 163209618), em um nítido relevante prejuízo a bens da União.

Assim, de rigor a manutenção da pena-base em 03 anos de detenção.

 

Ausentes agravantes e atenuantes e causas de aumento e de diminuição da pena, considerado o concurso formal de crimes, a pena é aumentada em 1/6, resultando na pena definitiva de 03 anos e 06 meses de detenção.

 

 

Da dosimetria da pena de FABIO pelos crimes do art. 38-A Lei n. 9.605/98

 

Quanto ao crime do art. 38-A da lei n. 9.605/98, o juiz fixou a pena-base no mínimo legal, ponderando que a gravidade dos danos perpetrados seria considerada na segunda fase da dosimetria da pena:

 

“Para o crime previsto no artigo 38-A da Lei nº 9.605/95, a pena prevista é de detenção, de 01 (um) a 03 (três) anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.

Observo, desde logo, que a gravidade dos danos perpetrados justifica a imposição cumulativa das sanções penais.

Na primeira fase, a pena deve ser mantida no mínimo. Embora as circunstâncias e consequências do delito autorizassem, em tese, uma elevação da pena, verifico que parte delas também se configurariam agravantes específicas do artigo 15 da Lei nº 9.605/98. Portanto, devem ser consideradas na fase seguinte da dosimetria da pena.”

 

Apela o Ministério Público Federal, requerendo a majoração da pena de FABIO pelo art. 38-A da lei n. 9.605/98, ao argumento que o magistrado deixou de valorar negativamente o grau de culpabilidade, conduta social, maus antecedentes do acusado FABIO.

O Ministério Público Federal alega que a culpabilidade acentuada do acusado se dá considerada a vasta experiência e conhecimento técnico no ramo de mineração, sendo proprietário, juntamente com sua família, de diversas empresas de mineração, o que torna mais repudiante o desrespeito do apelado às normas que regulam a atividade minerária.

O Ministério Público Federal sustenta que a pena deve ser majorada, pois mesmo após a instauração do processo administrativo da CETESB, os apelados sequer se interessaram em reparar os danos ambientais por meio de Plano de Recuperação Ambiental, além de que há registro de inquéritos policiais contra o acusado por crimes semelhantes aos fatos denunciados (fls. 191/192), o que expõe sua conduta social e maus antecedentes, além de ser causa para gradação da penalidade, nos termos do art. 6º da Lei n. 9.605/98.

Assiste razão em parte à acusação

Embora haja demonstração do réu no enredamento frequente em crimes da mesma natureza, os inquéritos policiais e ações em andamento não podem ser usados, conforme dispõe a Súmula nº 444 do E. STJ, para majorar a pena-base, não servindo, na dosagem da reprimenda penal, para que macule a conduta social e a personalidade do agente, nem como maus antecedentes.

Quanto à reparação do dano, verifico que a defesa apresentou junto a resposta à acusação documentação que demonstra ter submetido à Cetesb o Projeto de Recuperação de Área Degradad – PRAD em 12/09/2014 (p. 24 do id 163209616), que foi aprovado mediante condições, quais sejam, a obtenção de licença prévia, licença de instalação e licença de operação (p. 25 do id 163209616); que solicitou a pedido de licença prévia em 12/01/2016, a qual foi emitida em 14/06/2017 (p. 102/110 do id 163209620 e p. 1/29 do id 163209621). Na fase do art. 402 do CPP, a defesa demonstrou ter apresentado em 19/06/2019 pedido de licença de instalação junto à Cetesb (p. 119/122 do id 163209623). E nas razões de apelação, a defesa demonstrou que a licença de instalação foi emitida em 29/11/2019 (id 220033368), e o pedido de licença de operação foi protocolado em 21/01/2020 (id 220033369).

Por outro lado, o grau de culpabilidade do réu é mais acentuado, considerado que é empresário na área de mineração desde 2007 e proprietário das empresas J.J., Mineradora São Francisco, Mineração F. F. (p. 59 do id 163209622), tendo elevado conhecimento acerca da ilicitude do fato, já que no exercício da atividade há muitos anos.

Assim, considerada a culpabilidade do acusado, fixo a pena-base em 01 ano e 06 meses de detenção.

 

 

Na segunda fase, o juiz sentenciante considerou a caracterização de quatro circunstâncias agravantes, aumentando a pena em 03 meses para cada circunstância:

 

“Na segunda fase, entendo caracterizadas as circunstâncias agravantes previstas no artigo 15, II, "ter o agente cometido a infração", "para obter vantagem pecuniária" (alínea "a"), "afetando ou expondo a perigo, de maneira grave, a saúde pública ou o meio ambiente" (alínea "b"), "atingindo áreas de unidades de conservação ou áreas sujeitas, por ato do Poder Público, a regime especial de uso" (alínea "e"), "no interior do espaço territorial especialmente protegido" (alínea "l").

Sendo quatro as circunstâncias agravantes, entendo razoável que a exasperação da pena se dê em três meses para cada circunstância, totalizando doze, de tal forma que a pena fica totalizada, nesta fase em 02 (dois) anos de detenção.

Não há outras circunstâncias agravantes ou atenuantes, nem causas de aumento ou diminuição de pena, de tal forma que a pena fica assim totalizada em 02 (dois) anos de detenção.”

 

O MPF pede a majoração do quantum de aumento para cada uma das quatro agravantes aplicadas. Alega que a exasperação da pena em apenas três meses para cada circunstância é irrazoável, considerada a extensão da área do Bioma Mata Atlântica suprimida e o volume de areia extraído.

Não procede o pleito da acusação.

A especificação, pela lei, de uma fração determinada (por exemplo, 1/6), ou de um intervalo de frações (por exemplo, de 1/6 a 2/3), ocorre nas causas de aumento ou diminuição, mas não nas circunstâncias atenuantes ou agravantes.

Assim, e não obstante as respeitosas opiniões em sentido contrário, não está o juiz obrigado a majorar a pena em no mínimo de um sexto ao aplicar uma circunstância agravante, podendo estabelecer outro critério, por exemplo, determinado período de tempo (v.g. seis meses, um ano).

Dessa forma, a fixação do quantum de diminuição da pena em razão da circunstância atenuante ou do quantum de incremento da pena em razão da circunstância agravante insere-se no âmbito da discricionariedade do juiz, consideradas as circunstâncias do caso concreto, de acordo com critérios de razoabilidade e proporcionalidade, tudo visando a melhor individualização da pena.

Nesse sentido anota Julio Fabrini Mirabete, in "Código Penal Interpretado", Ed. Atlas, 2ª edição, p. 439:

 

Na segunda etapa da aplicação da pena deve o julgador considerar as circunstâncias agravantes e atenuantes previstas nos arts. 61 a 66. Embora exista a praxe de que cada circunstância tenha um valor de um sexto sobre a pena-base, a quantidade dos acréscimos ou diminuições fica ao prudente critério do juiz, que deve dar ênfase às circunstâncias preponderantes.


 

Assim, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que, em se tratando de atenuantes e agravantes, compete ao julgador, dentro do seu livre convencimento e de acordo com as peculiaridades do caso, escolher a fração de aumento ou redução de pena, em observância aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, mas que a aplicação de fração diversa de 1/6 (um sexto) exige motivação concreta e idônea:

 

PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. ROUBO MAJORADO. DOSIMETRIA. REINCIDÊNCIA. PATAMAR DE AUMENTO. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 68 DO CP. PRESENÇA DE TRÊS CAUSAS DE AUMENTO. APLICAÇÃO CUMULATIVA. POSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. A individualização da pena é uma atividade em que o julgador está vinculado a parâmetros abstratamente cominados pela lei, sendo-lhe permitido, entretanto, atuar discricionariamente na escolha da sanção penal aplicável ao caso concreto, após o exame percuciente dos elementos do delito, e em decisão motivada. Assim, é admissível a revisão da dosimetria pelas Corte Superiores apenas nas hipóteses de manifesta ilegalidade ou arbitrariedade, exatamente o que ocorreu na hipótese.

2. Em relação à majoração da pena realizada na segunda fase do procedimento dosimétrico, o Código Penal olvidou-se de estabelecer limites mínimo e máximo de aumento ou redução de pena a serem aplicados em razão das agravantes e das atenuantes genéricas. Assim, a jurisprudência reconhece que compete ao julgador, dentro do seu livre convencimento e de acordo com as peculiaridades do caso, escolher a fração de aumento ou redução de pena, em observância aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Entretanto, a aplicação de fração diversa de 1/6 exige motivação concreta e idônea.

3. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e desta Corte é no sentido de que o art. 68, parágrafo único, do CP, não exige que o juiz aplique uma única causa de aumento referente à parte especial do Código Penal, quando estiver diante de concurso de majorantes, mas que sempre justifique a escolha da fração imposta.

4. Na hipótese em apreciação, devidamente justificada a cumulação das causas de aumento do concurso de pessoas, restrição à liberdade da vítima e do uso de arma de fogo (art. 157, § 2°, I e V, e § 2°-A, I, do CP), considerando que o crime foi praticado por cinco agentes, bem como porque eles, mediante emprego de armas de fogo, restringiram as liberdades das vítimas por aproximadamente três horas.

5. Agravo regimental desprovido.

(AgRg no REsp n. 2.059.295/MG, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 26/6/2023, DJe de 29/6/2023.)

PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ROUBO MAJORADO. FUNDAMENTO DA CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL NEGATIVADA. CIRCUNTÂNCIAS DO CRIME. INOVAÇÃO RECURSAL. MATÉRIA NÃO SUSCITADA NO RECURSO ESPECIAL. AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA. MULTIRREINCIDÊNCIA. INCREMENTO EM PATAMAR SUPERIOR A 1/6 (UM SEXTO). POSSIBILIDADE. MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA.

I - A defesa apontou que "o vetor das circunstâncias do crime foi valorado negativamente, "uma vez que praticou o roubo em plena luz do dia e no horário comercial"" (fl. 761), tese não aventada nas razões do recurso especial, configurando-se hipótese de inovação recursal.

II - No tocante à segunda fase da dosimetria, consoante entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, a aplicação de fração superior à 1/6 (um sexto), pelo reconhecimento das agravantes e das atenuantes genéricas, exige motivação concreta e idônea.

III - Na hipótese, em razão da multirreincidência, o agravamento da pena na fração de 3/11 (três onze avos) foi corretamente fundamentado pelo Tribunal a quo, não merece qualquer reparo.

Agravo regimental parcialmente conhecido e, na extensão, desprovido.

(AgRg no REsp n. 1.950.370/RN, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 30/5/2023, DJe de 2/6/2023.)

 

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PENAL. FURTO SIMPLES E FALSA IDENTIDADE. VIOLAÇÃO DOS ARTS 61, I, E 65, III, D, AMBOS DO CP. SEGUNDA FASE DA DOSIMETRIA. PEDIDO DE REAJUSTE DE FRAÇÕES ATINENTES À CONFISSÃO ESPONTÂNEA E À REINCIDÊNCIA. QUANTUM. DISCRICIONARIEDADE DO JUÍZO SENTENCIANTE. PROPORCIONALIDADE. VERIFICAÇÃO. OCORRÊNCIA. COMPENSAÇÃO INTEGRAL. INVIABILIDADE. MULTIRREINCIDÊNCIA DO AGRAVANTE ATESTADA PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS.

1. O Código Penal não estabelece limites mínimo e máximo de aumento de pena a serem aplicados em razão de circunstâncias agravantes, motivo pelo qual cabe ao Juízo sentenciante sopesar as circunstâncias existentes no caso concreto, fixando o patamar necessário dentro de parâmetros razoáveis e proporcionais (AgRg nos EDcl no REsp n. 1.533.597/RS, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 1º/8/2018).

2. O entendimento manifestado pelas instâncias ordinárias, notadamente quanto à impossibilidade de compensação integral entre a atenuante da confissão espontânea e a constatada multirreincidência do agravante, está em conformidade com a jurisprudência desta Corte Superior.

3. Em se tratando de atenuantes e agravantes, a lei não estabelece os percentuais de fração de diminuição e de aumento que devem ser utilizados. Em decorrência, a jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que a fração de 1/6, mínima prevista para as majorantes e minorantes, deve guiar o julgador no momento da dosimetria da pena, de modo que, em situações específicas, é permitido o aumento superior a 1/6, desde que haja fundamentação concreta. [...] Hipótese em que a fração de 1/4, utilizada para agravar a pena na segunda fase da dosimetria, lastreou-se no fato de pesarem contra o paciente três outras condenações definitivas, fundamentação idônea e de acordo com o postulado da proporcionalidade (HC n. 392.299/SP, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 12/12/2017).

4. Agravo regimental improvido.

(AgRg no REsp n. 1.822.454/GO, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 10/9/2019, DJe de 19/9/2019.)

 

No caso em tela, o juízo sentenciante exasperou a pena em 3 meses para cada circunstância agravante, patamar equivalente à 1/4 (um quarto) da pena-base então fixada na sentença.

Entendo razoável e proporcional a fixação do patamar de majoração da pena por conta de cada circunstância agravante no patamar de 1/4 (um quarto) sobre a pena-base, considerada a extensão da área do Bioma Mata Atlântica suprimida. Com efeito, o laudo pericial n. 1762/2016 atestou que “foi realizada a retirada da cobertura vegetal e a retirada de material de uma área de aproximadamente 74.883 m2 (incluindo as áreas utilizadas parra beneficiamento do material extraído)” (p. 41 do id 163209618).

 

Por outro lado, o volume de areia extraído não pode ser considerado para majorar a pena do art. 38-A da Lei n. 9.605/98, por se referir aos crimes dos art. 2º da Lei n. 8.176/91 e 55 da Lei n. 9.605/98.

Assim, mantenho a fração para 1/4 (um quarto) sobre a pena-base para aumento da pena pela incidência de cada circunstância agravante.

 

Na segunda fase de dosimetria, apela a defesa, postulando a exclusão das quatro agravantes aplicadas ao delito previsto no art. 38-A da Lei nº 9.605/98, por absoluta ausência de motivação.

A defesa requer ainda a aplicação da circunstância atenuante do art. 66 do Código Penal, em razão da apresentação e aprovação de Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD) junto à CETESB logo depois dos fatos, o qual se encontra na fase de licenciamento de instalação.

Assiste em parte razão à defesa.

Afasto a agravante do artigo 15, inciso II, alínea “a”, da Lei n. 9.605/98, ter o agente cometido a infração "para obter vantagem pecuniária". Referida agravante teria aplicação apenas no crime do art. 55 da Lei n. 9.605/98, pois o agente obteve vantagem pecuniária com a extração de areia sem as competentes autorizações, e não com o crime de supressão de vegetação secundaria, em estágio médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica.

Mantenho a agravante do artigo 15, inciso II, alínea “c”, da Lei n. 9.605/98, de ter o agente cometido a infração "afetando ou expondo a perigo, de maneira grave, a saúde pública ou o meio ambiente". Consoante Laudo pericial, “a supressão de vegetação, quer seja arbórea, arbustiva ou rasteira, expõe o solo, antes protegido pelo dossel vegetal, à ação dos raios solares, que provoca o ressecamento da área, e das chuvas, o que pode gerar erosão causada pela precipitação pluviométrica e pelo escorrimento das águas superficiais. A presença da vegetação aumenta a absorção da água pelo solo reduzindo a quantidade de chuva que escorre superficialmente para os corpos d'água. A vegetação tem, ainda, importância fundamental na manutenção da estabilidade do solo das margens dos rios e córregos, prevenindo o seu assoreamento e a ocorrência de enchentes danosas” (p. 41 do id 163209618).

Afasto a agravante do artigo 15, inciso II, alínea “e”, da Lei n. 9.605/98, de ter o agente cometido a infração "atingindo áreas de unidades de conservação ou áreas sujeitas, por ato do Poder Público, a regime especial de uso". O laudo pericial n. 1726/2016 reconheceu que a área afetada não se encontra dentro de Área de Preservação Permanente (APP) nem em Unidade de Conservação (UC) (p. 35 do id 163209618). Os peritos responderam que a área autuada se encontra dentro da denominada “zona de recuperação”, classificação criada da Resolução SMA (Secretaria do Meio Ambiente de São Paulo) nº 28/1999. Segundo a acusação, a infração teria sido cometida em área sujeita, por ato do Poder Público, a regime especial de uso, porque a supressão da vegetação ocorreu dentro da Zona de Recuperação da Mata Atlântica, definida pela Resolução SMA nº 28, de 22/09/1999. A defesa alega que “zona de recuperação” não se confunde com “zona de proteção”, conforme definições contidas na Resolução SMA 28/1999. Referida agravante não se aplica ao caso em tela, considerado que a circunstância de a infração ter sido praticada em zona de recuperação já constitui elementar do tipo penal imputado, de supressão de vegetação secundária em estágio médio de recuperação.

Afasto a agravante do artigo 15, inciso II, alínea “l”, da Lei n. 9.605/98, de ter o agente cometido a infração “no interior do espaço territorial especialmente protegido”. Alega a acusação que o espaço territorial especialmente protegido seria o Bioma Mata Atlântica, patrimônio nacional e especialmente protegido pela Lei Federal nº 11.428/2006, regulamentada pelo Decreto nº 6660/2008. A circunstância de o crime ter sido praticado no Bioma Mata Atlântica constitui elementar do tipo do art. 38-A da Lei n. 9.605/98.

 

Inaplicável a atenuante genérica prevista no artigo 66 do CP, dada a ausência de comprovação da efetiva reparação do dano. Não obstante o acusado tenha apresentado documentação que demonstre ter apresentado administrativamente um Plano de Recuperação de Área Degradada perante a Cetesb, que está em fase de licenciamento de operação, não há comprovação da efetiva reparação do dano. A própria defesa afirma que “a partir da emissão desta última licença, os Apelantes já ficaram autorizados a iniciar a recuperação da área, que atualmente está em curso” (id 281293065). Como mencionado pela acusação, para ser considerada atenuante, a medida deve ser eficiente, o que não é o caso.

 

Note-se que a licença de operação (cópia trazida pela Defesa após a inclusão do presente recurso em pauta de julgamento – Id 281293068) data de 27/03/2022, portanto, há mais de um ano e seis meses, tendo a Defesa se limitado a pleitear a conversão do julgamento em diligência (Id 281293065) para verificar a implantação do projeto, sem apresentar qualquer indício probatório da efetiva recuperação.

 

Assim, na segunda fase da dosimetria da pena, verifico a ausência de atenuantes e a presença da circunstância agravante do art. 15 inciso II, alínea “c”, da Lei n. 9.605/98. Reconhecida uma circunstância agravante, majoro a pena em 1/4 (um quarto) sobre a pena-base fixada acima, resultando na pena intermediária de 01 (um) ano, 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de detenção.

 

Na terceira fase, ausentes causas de aumento e de diminuição da pena, torno a pena definitiva em 01 (um) ano, 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de detenção.

 

 

Da pena de multa de Fabio

 

O juiz sentenciante fixou a pena de multa de Fabio pelo crime do crime do art. 2º, “caput”, da Lei 8.176/91, c.c. o art. 55 da Lei 9.605/98 em 35 dias-multa, cada um no valor de um salário mínimo:

 

“Diante das razões já expressas, da capacidade econômica do réu (art. 60 do Código Penal) e do critério de gradação estabelecido no art. 2º, §2º, da Lei nº 8.176/91, fixo a pena de multa em 35 (trinta e cinco) dias-multa, cada um fixado em 01 (um) salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigido monetariamente.”

 

Com relação ao crime do art. 38-A da Lei n. 9.605/98, o juiz sentenciante fixou a pena de multa de Fabio em 20 dias-multa, cada dia-multa fixado em um salário mínimo:

 

“Com os mesmos critérios, a pena de multa é arbitrada em 20 (vinte) dias multa, cada um fixado em 01 (um) salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigido monetariamente.”

 

O MPF alega que a pena de multa aplicada ao acusado Fabio deveria ser majorada, uma vez que o magistrado desconsiderou a vantagem econômica auferida (R$ 6.687.469,65, conforme laudo pericial n. 1762/2016), ignorando o aumento proporcionado pelo art. 18 da Lei n. 9.605/98.

A defesa pede a redução para o mínimo legal da quantidade de dias-multa e do valor de cada dia-multa aplicada a FABIO pelos crimes do artigo 2º, “caput”, da Lei 8.176/91, e 38-A, da Lei de Crimes Ambientais, por ausência ou deficiência de motivação.

 

Dispõe o artigo 49 e parágrafos do Código Penal:

 

"Art. 49 - A pena de multa consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada em dias-multa. será, no mínimo, de 10 (dez) e, no máximo, de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa.

§ 1º - O valor do dia-multa será fixado pelo juiz não podendo ser inferior a um trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato, nem superior a 5 (cinco) vezes esse salário.

§ 2º - O valor da multa será atualizado, quando da execução, pelos índices de correção monetária."

 

A fixação do valor do dia-multa deve levar em consideração a condição econômica do réu. Nesse sentido é a orientação legal do artigo 60 do Código Penal:

 

"Art. 60. Na fixação da pena de multa o juiz deve atender, principalmente, à situação econômica do réu.

§1º. A multa pode ser aumentada até o triplo, se o juiz considerar que, em virtude da situação econômica do réu, é ineficaz, embora aplicada no máximo."

 

A Lei n. 8.176/91 prevê em seu art. 2º:

 

“Art. 2° Constitui crime contra o patrimônio, na modalidade de usurpacão, produzir bens ou explorar matéria-prima pertencentes à União, sem autorização legal ou em desacordo com as obrigações impostas pelo título autorizativo.

Pena: detenção, de um a cinco anos e multa.

§ 1° Incorre na mesma pena aquele que, sem autorização legal, adquirir, transportar, industrializar, tiver consigo, consumir ou comercializar produtos ou matéria-prima, obtidos na forma prevista no caput deste artigo.

§ 2° No crime definido neste artigo, a pena de multa será fixada entre dez e trezentos e sessenta dias-multa, conforme seja necessário e suficiente para a reprovação e a prevenção do crime.”

 

E a Lei n. 9.605/98 dispõe em seus artigos 18 e 19:

 

“Art. 18. A multa será calculada segundo os critérios do Código Penal; se revelar-se ineficaz, ainda que aplicada no valor máximo, poderá ser aumentada até três vezes, tendo em vista o valor da vantagem econômica auferida.

Art. 19. A perícia de constatação do dano ambiental, sempre que possível, fixará o montante do prejuízo causado para efeitos de prestação de fiança e cálculo de multa.”

 

Como se observa, a aplicação da pena de multa deve seguir os mesmos parâmetros de fixação da pena privativa.

A elevação do valor do dia-multa é possível, desde que haja fundamentação adequada, pautada na condição econômica do réu e, em caso de crime ambiental, no valor da vantagem econômica auferida.

 

Assim, quanto ao crime do art. 2º da Lei n. 8.176/91, seguindo os parâmetros de fixação da pena privativa de liberdade, correta a fixação da pena-base em 30 dias-multa. Na segunda fase, a pena resta mantida, considerada a ausência de atenuantes e agravantes. Na terceira fase, ausentes causas de aumento e de diminuição da pena. Considerado o concurso formal com o crime do art. 55 da Lei n. 9.605/98, a pena é aumentada de 1/6 (um sexto), nos termos do art. 70 do CP, resultando na pena definitiva em 35 (trinta e cinco) dias-multas.

O Juiz "a quo" fixou cada dia-multa em 01 (um) salário mínimo vigente ao tempo do fato, considerada a capacidade econômica do réu.

A aplicação da pena de multa enseja a imposição de um valor pecuniário de caráter penal bastante para a censura do comportamento praticado, sendo que, para a estipulação do valor da pena de multa, deve ser observada a situação do réu, conforme o artigo 60 Código Penal.

Assim, em atenção ao disposto nos artigos 49, §1º, e 60, caput e §1º, do Código Penal, e art. 2º, §2º, da Lei n. 8.176/91, considerada a renda mensal do acusado, que em outubro/2019, correspondia a vinte mil reais (p. 59 do id 163209622), e que o réu reside em localidade distinta na cidade de Taubaté, a denotar sua boa condição financeira, reputo razoável e proporcional a fixação do valor de cada dia-multa em 01 (um) salário mínimo vigente à época dos fatos, tal como lançado na r. sentença apelada.

 

Quanto ao crime do art. 38-A da Lei n. 9.605/98, seguindo os parâmetros de fixação da pena privativa de liberdade, fixo a pena-base em 15 dias-multa, ausentes circunstâncias atenuantes. Considerado o reconhecimento de apenas uma circunstância agravante (art. 15, II, “c”, da lei n. 9.605/98), majoro a pena em 1/4, resultando na pena de multa de 18 dias-multa, que torno definitiva, à mingua de causas de aumento e de diminuição da pena.

No tocante ao valor do dia-multa, o juízo sentenciante fixou em 01 (um) salário mínimo vigente ao tempo do fato.

Inaplicável o disposto no art. 18 da Lei n. 9.605/98 ao caso em tela, uma vez que o laudo pericial atestou o valor estimado da substância mineral extraída, de modo que a vantagem econômica auferida refere-se ao lucro apurado com a extração de areia, e não ao crime de supressão de vegetação secundária, em estágio médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica (art. 38-A da Lei n. 9.605/98).

Assim, em atenção ao disposto nos artigos 49, §1º, e 60, caput e §1º, do Código Penal, considerada a renda mensal do acusado, que em outubro/2019, correspondia a vinte mil reais (p. 59 do id 163209622), e que é residente em localidade distinta na cidade de Taubaté, a denotar sua boa condição financeira, reputo razoável e proporcional a fixação do valor de cada dia-multa em 01 (um) salário mínimo vigente à época dos fatos, tal como lançado na r. sentença apelada.


Dessa forma, o total da pena de multa resulta em 52 (cinquenta e dois) dias-multa, cada um no valor de 01 (um) salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, devidamente corrigido.

 

Da substituição da pena privativa de liberdade

 

A defesa postula a substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos, nos termos do art. 44 do CP.

Tendo em vista que a pena privativa de liberdade de Fabio foi fixada em 03 anos e 06 meses de detenção para o crime do art. 2º da Lei 8.176/91, em concurso formal com o art. 55 da lei n. 9.605/98, e em 01 ano, 10 meses e 15 dias de detenção, pela prática do crime do art. 38-A da Lei n. 9.605/98, o somatório da pena de Fabio resulta em 05 anos, 04 meses e 15 dias de detenção.

Assim, incabível, na hipótese em tela, a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, uma vez que não preenchido o requisito objetivo do inciso I do artigo 44 do Código Penal.

 

Mantenho o regime semiaberto para o início do cumprimento de pena, a teor do disposto no artigo 33, § 2º, "b", do Código Penal.

 

 

 

Da penalidade aplicada à empresa JJ EXTRAÇÃO

 

O juízo sentenciante condenou a empresa JJ Extração pelo crime previsto no artigo 38-A, caput, da Lei nº 9.605/98, à pena de multa, fixada em R$ 50.000,00, devidamente corrigido, bem como às penas restritivas de direitos, consistentes em suspensão total das atividades de extração mineral, pelo prazo de cinco anos, de interdição total das atividades de extração mineral constatadas, e proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações, também pelo prazo de cinco anos, nos seguintes termos:

 

“Quanto à pessoa jurídica, entendo cabível a imposição das penas previstas no artigo 21, I e II, da Lei nº 9.605/98, dada a gravidade da lesão causada.

Arbitro a multa em R$ 50.000,00, valor que reputo adequado, na esfera penal, para obstar novas condutas, sendo também razoavelmente proporcional ao agravo. A multa em questão será paga sem prejuízo daquela aplicada no âmbito administrativo (ou que vier a ser), e sem prejuízo de eventual ação de ressarcimento que venha a ser proposta pela União.

É também cabível a imposição da suspensão total das atividades de extração mineral, pelo prazo de cinco anos, com interdição total da atividade constatada, bem como a proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações, também pelo prazo de cinco anos.”

 

O Ministério Público Federal pede a majoração da pena de multa da JJ EXTRAÇÃO, porque a apelada sequer se interessou em reparar os danos ambientais por meio de Plano de Recuperação Ambiental, e ainda há registro de inquérito policial (fls. 193) por fatos semelhantes ao ora apurados e ainda considerada a vantagem econômica auferida com a prática criminosa, em detrimento do meio ambiente (R$ 6.687.469,65 de renda bruta), nos termos dos arts. 18 e 19 da Lei n. 9.605/98.

A defesa alega que, em relação às penas aplicadas à pessoa jurídica, houve nulidade na fixação da pena de multa por não ter seguido a regra do artigo 18, da Lei n. 9.605/98; bem como a inconstitucionalidade das penas restritivas de direitos dos incisos I e II, do artigo 22, da Lei 9.605/98, por ausência de previsão legal dos limites máximo e mínimo de pena (limites temporais das penas, em violação ao artigo 5º, XXXIX, da CF), ou, ainda, a nulidade da pena aplicada em relação aos três incisos do artigo 22, por absoluta ausência de fundamentação.

 

Quanto à penalidade aplicável à pessoa jurídica pela prática de crimes ambientais, dispõem os artigos 21 e 22 da Lei n. 9.605/98:

 

Art. 21. As penas aplicáveis isolada, cumulativa ou alternativamente às pessoas jurídicas, de acordo com o disposto no art. 3º, são:

I - multa;

II - restritivas de direitos;

III - prestação de serviços à comunidade.

Art. 22. As penas restritivas de direitos da pessoa jurídica são:

I - suspensão parcial ou total de atividades;

II - interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade;

III - proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações.

§ 1º A suspensão de atividades será aplicada quando estas não estiverem obedecendo às disposições legais ou regulamentares, relativas à proteção do meio ambiente.

§ 2º A interdição será aplicada quando o estabelecimento, obra ou atividade estiver funcionando sem a devida autorização, ou em desacordo com a concedida, ou com violação de disposição legal ou regulamentar.

§ 3º A proibição de contratar com o Poder Público e dele obter subsídios, subvenções ou doações não poderá exceder o prazo de dez anos.

 

No tocante à pena de multa, dispõem os artigos 6º, 18 e 19 da Lei n. 9.605/98:

 

Art. 6º Para imposição e gradação da penalidade, a autoridade competente observará:

I - a gravidade do fato, tendo em vista os motivos da infração e suas conseqüências para a saúde pública e para o meio ambiente;

II - os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental;

III - a situação econômica do infrator, no caso de multa.

(...)

Art. 18. A multa será calculada segundo os critérios do Código Penal; se revelar-se ineficaz, ainda que aplicada no valor máximo, poderá ser aumentada até três vezes, tendo em vista o valor da vantagem econômica auferida.

Art. 19. A perícia de constatação do dano ambiental, sempre que possível, fixará o montante do prejuízo causado para efeitos de prestação de fiança e cálculo de multa.

Parágrafo único. A perícia produzida no inquérito civil ou no juízo cível poderá ser aproveitada no processo penal, instaurando-se o contraditório.

 

O juiz sentenciante arbitrou a multa à pessoa jurídica, pela prática do crime do art. 38-A da Lei n. 9.605/98 em “R$ 50.000,00, valor que reputo adequado, na esfera penal, para obstar novas condutas, sendo também razoavelmente proporcional ao agravo”.

Não procede a alegação do Ministério Público Federal de que a pena deve ser majorada porque a empresa sequer se interessou em reparar os danos ambientais por meio de Plano de Recuperação Ambiental. A empresa JJ Extração apresentou o PRAD em 12/09/2014 (p. 24 do id 163209616), solicitou a licença prévia em 12/01/2016 (p. 17/20 do id 163209621), solicitou a licença de instalação em 19/06/2019 (p. 119/122 do id 163209623) e solicitou a licença de operação em 21/01/2020 (id 220033369). Não consta dos autos informação acerca da efetiva reparação do dano, mas o Plano de Recuperação Ambiental foi apresentado, tendo a empresa solicitado as licenças necessárias, após o atendimento das condições impostas pela Cetesb.

Eventual registro de inquérito policial (p. 54 do id 163209620) por fatos semelhantes ao ora apurados não podem valorados negativamente, dada a ausência de certidão que demonstre condenação definitiva por esses delitos, conforme entendimento firmado na Súmula 444 do STJ.

Inaplicável a consideração vantagem econômica auferida com a prática criminosa na fixação da pena de multa, nos termos dos arts. 18 e 19 da Lei n. 9.605/98, uma vez que, conforme já exposto acima, a vantagem econômica auferida refere-se ao lucro apurado com a extração de areia, e não ao crime de supressão de vegetação secundária, em estágio médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica (art. 38-A da Lei n. 9.605/98).


Assiste razão à defesa ao alegar que a pena de multa aplicada à pessoa jurídica deveria ser calculada segundo os critérios do Código Penal, com a estipulação do número de dias-multa e valor de cada dia-multa, nos termos do art. 49 do CP, considerada a previsão expressa nos artigos 18 e 79 da Lei n. 9.605/98.

Dessa forma, considerada a gravidade da conduta, tendo em vista os motivos da infração e suas consequências para o meio ambiente (art. 6º, I, da Lei n. 9.605/98), uma vez que o laudo pericial n. 17/26/2016 atestou que foram suprimidos aproximadamente 74.883m2 de cobertura vegetal, e que “a supressão de vegetação, quer seja arbórea, arbustiva ou rasteira, expõe o solo, antes protegido pelo dossel vegetal, à ação dos raios solares, que provoca o ressecamento da área, e das chuvas, o que pode gerar erosão causada pela precipitação pluviométrica e pelo escorrimento das águas superficiais. A presença da vegetação aumenta a absorção da água pelo solo reduzindo a quantidade de chuva que escorre superficialmente para os corpos d'água. A vegetação tem, ainda, importância fundamental na manutenção da estabilidade do solo das margens dos rios e córregos, prevenindo o seu assoreamento e a ocorrência de enchentes danosas” (p. 41 do id 163209618), fixo a pena de multa em 20 dias-multa.

E nos termos do art. 60 do Código Penal e artigos 6º, III, e 18 da Lei n. 9.605/98, considerada a situação financeira da empresa, estipulo o valor de cada dia-multa em 03 (três) salários mínimos.

 

Quanto à penas restritivas de direitos, a defesa sustenta a inconstitucionalidade das penas previstas nos incisos I e II do art. 22 da Lei n. 9.605/98, porque as penas restritivas de direitos relativas à pessoa jurídica não têm origem na substituição de uma pena privativa de liberdade previamente aplicada, a qual indica os parâmetros a serem adotados na sua aplicação. Alega que o mencionado artigo 22 deveria ter expressa disposição sobre os limites mínimo e máximo de tempo para cumprimento das penas nele relacionadas, o que não se observa nas penas restritivas previstas nos incisos I e II, mas apenas na proibição de contratação com o Poder Público, que estabelece em seu §3º o prazo máximo de dez anos.

Aduz ainda que o juízo sentenciante não fundamentou o motivo de as penas restritivas de direitos terem sido fixadas pelo prazo de 5 anos, alegando que o prazo fixado é exacerbado, postulando sua redução para 01 ano.

 

A Lei n. 9.605/98 não foi declarada inconstitucional e permanece em vigor desde a data de sua publicação. Quanto aos limites mínimo e máximo de tempo para cumprimento, registro que, consoante jurisprudência do STJ, “na hipótese de aplicação de pena de multa e restritiva de direitos à pessoa jurídica, em virtude da omissão da Lei 9.605/1998, adotam-se, subsidiariamente, as disposições do Código Penal, nos termos do seu art. 109 e do art. 79 da Lei 9.605/1998” (AgRg no AREsp n. 1.616.383/RJ, relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 19/5/2020, DJe de 26/5/2020.).

 

Assim, em virtude da omissão na Lei n. 9.605/98 quanto à duração da pena restritiva de direito aplicável à pessoa jurídica, deve ser observada a cominação abstrata de pena privativa de liberdade no preceito secundário do tipo penal incriminador.

Nesse sentido, a observação de Guilherme de Souza Nucci, "in" Leis Penais e Processuais Penais Comentadas, Ed. RT, 14ª ed., pg. 612:

 

“Assim sendo, as penas previstas para a pessoa jurídica, porque não podem ser privativas de liberdade, mas são calculadas com base nestas, obedecem aos mesmos critérios.”

 

Dessa forma, tendo em vista que o crime do art. 38-A da Lei n. 9.605/98 prevê pena de 01 a 03 anos de detenção, e considerado os critérios de gradação da pena previstos no art. 6º da Lei n. 9.605/98, em especial, as consequências para o meio ambiente, uma vez que, o laudo pericial n. 1726/2016 atestou que foram suprimidos aproximadamente 74.883m2 de cobertura vegetal e que “a supressão de vegetação, quer seja arbórea, arbustiva ou rasteira, expõe o solo, antes protegido pelo dossel vegetal, à ação dos raios solares, que provoca o ressecamento da área, e das chuvas, o que pode gerar erosão causada pela precipitação pluviométrica e pelo escorrimento das águas superficiais. A presença da vegetação aumenta a absorção da água pelo solo reduzindo a quantidade de chuva que escorre superficialmente para os corpos d'água. A vegetação tem, ainda, importância fundamental na manutenção da estabilidade do solo das margens dos rios e córregos, prevenindo o seu assoreamento e a ocorrência de enchentes danosas” (p. 41 do id 163209618), entendo por bem redimensionar a duração das penas restritivas de direitos impostas na sentença para 02 (dois) anos.

 

Dispositivo

 

Por estas razões, dou parcial provimento à apelação do Ministério Público Federal, para majorar a pena-base do apelado FABIO pela prática do crime do art. 38-A da lei n. 9.605/98, dou parcial provimento à apelação de FABIO FERNANDO FRANCISCATE para afastar as agravantes do art. 15, II, “a”, “e”, e “l” da Lei n. 9.605/98, de modo que a pena pelo crime previsto no artigo 38-A, caput, da Lei nº 9.605/98, resulta em 01 ano, 10 meses e 15 dias de detenção e o pagamento de 18 dias-multa, ficando sua pena totalizada em 05 anos, 04 meses e 15 dias de detenção, a ser cumprida em regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 52 dias-multa, cada um no valor de 01 salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, devidamente corrigido, e dou parcial provimento à apelação da JJ EXTRAÇÃO para fixar pena de multa em 20 dias-multa, cada um no valor de 3 salários mínimos, e reduzir a duração das penas restritivas de direitos aplicadas à pessoa jurídica para 02 anos.

É o voto.

 

 

 

 

 



E M E N T A

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ARTIGO 2º DA LEI Nº 8.176/91 E ARTIGO 55 DA LEI Nº 9.605/98, C.C. ARTIGO 70 DO CÓDIGO PENAL. ART. 38-A DA LEI Nº 9.605/98. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. ART. 402, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL: FASE INADEQUADA PARA O REQUERIMENTO DE DILIGÊNCIAS CUJA NECESSIDADE OU CONVENIÊNCIA JÁ ERA CLARA NO MOMENTO DO OFERECIMENTO DA DEFESA PRÉVIA. USURPAÇÃO DE BEM DA UNIÃO E EXTRAÇÃO DE RECURSO MINERAL. VIOLAÇÃO DE BENS JURÍDICOS DISTINTOS. CONCURSO FORMAL CONFIGURADO. AGRAVANTES. FRAÇÃO DE AUMENTO. PENA DE MULTA. PENALIDADE DA PESSOA JURIDICA. DURAÇÃO DA PENA RESTRITIVA. APELAÇÕES PROVIDAS EM PARTE.

1. Apelações interpostas pela acusação e defesa contra sentença que condenou o réu FÁBIO pela prática do crime previsto no artigo 2º da Lei nº 8.176/91, combinado com o artigo 55 da Lei nº 9.605/98 e com o artigo 70 do Código Penal, e pelo crime previsto no artigo 38-A, caput, da Lei nº 9.605/98, à pena total de 05 (cinco) anos e 06 (seis) meses de detenção, em regime inicial semiaberto, além de 55 (cinquenta e cinco) dias multa, cada um fixado em 01 (um) salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigido monetariamente, e condenou a empresa JJ. EXTRAÇÃO E COMÉRCIO DE AREIA LTDA., pelo crime previsto no artigo 38-A, caput, da Lei nº 9.605/98, à pena de multa, fixada em R$ 50.000,00, a serem corrigidos até o efetivo pagamento, e às penas de suspensão total das atividades de extração mineral, pelo prazo de cinco anos, de interdição total das atividades de extração mineral constatadas, e de proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações, também pelo prazo de cinco anos.

2. O artigo 402 do Código de Processo Penal, na redação da Lei nº 11.719/2008, se presta para que as partes requeiram "as diligências, cuja necessidade ou conveniência se origine de circunstâncias ou de fatos apurados na instrução". Não é a fase adequada para o requerimento de diligências cuja necessidade ou conveniência já era clara no momento oferecimento da defesa prévia.

3. O indeferimento de prova não implica ilegalidade, na medida em que a aferição da necessidade da produção da prova é mister do juiz da causa, que tem ampla visão sobre o desenrolar da ação penal. O juiz é o destinatário das provas e tem o dever de indeferir as inúteis e meramente protelatórias.

4. A defesa não demonstrou efetivo prejuízo, a ensejar a anulação do ato (artigo 563 do CPP).

5. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça encontra-se consolidada no sentido da existência do concurso formal entre os crimes do artigo 2º da Lei nº 8.176/91 e do artigo 55 da Lei nº 9.605/98, em decorrência da violação de bens jurídicos distintos, o patrimônio público e o meio ambiente. Precedentes.

6. Materialidade delitiva e autoria comprovada nos autos.

7. Pena-base do artigo 2º, “caput”, da Lei 8.176/91 acima do mínimo legal. As circunstâncias do crime justificam a elevação da pena-base, considerado que o laudo pericial concluiu que o volume de areia extraída das cavas foi de pelo menos 55.199m3 e 29.786m3 nas cavas “A” e “B”, totalizando 84.985m3. As consequências do crime também se mostram exacerbadas, uma vez que, segundo o cálculo efetuado no laudo pericial, o valor do material explorado sem autorização seria de aproximadamente R$ 6.687.469,65 (seis milhões, seiscentos e oitenta e sete mil, quatrocentos e sessenta e nove reais e noventa e cinco centavos), em um nítido relevante prejuízo a bens da União.

8. Pena-base do art. 38 da Lei n. 9.605/98 majorada. O grau de culpabilidade do réu é mais acentuado, considerado que é empresário na área de mineração desde 2007 e proprietário das diversas empresas mineradoras, tendo elevado conhecimento acerca da ilicitude do fato, já que no exercício da atividade há muitos anos.

9. A fixação do quantum de diminuição da pena em razão da circunstância atenuante ou do quantum de incremento da pena em razão da circunstância agravante insere-se no âmbito da discricionariedade do juiz, consideradas as circunstâncias do caso concreto, de acordo com critérios de razoabilidade e proporcionalidade, tudo visando a melhor individualização da pena.

10. O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que, em se tratando de atenuantes e agravantes, compete ao julgador, dentro do seu livre convencimento e de acordo com as peculiaridades do caso, escolher a fração de aumento ou redução de pena, em observância aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, mas que a aplicação de fração diversa de 1/6 (um sexto) exige motivação concreta e idônea.

11. No caso, é razoável e proporcional a fixação do patamar de majoração da pena por conta de cada circunstância agravante no patamar de 1/4 (um quarto) sobre a pena-base, considerada a extensão da área do Bioma Mata Atlântica suprimida, tendo o laudo pericial atestado que “foi realizada a retirada da cobertura vegetal e a retirada de material de uma área de aproximadamente 74.883 m2 (incluindo as áreas utilizadas parra beneficiamento do material extraído)”.

12. Afastada a agravante do artigo 15, inciso II, alínea “a”, da Lei n. 9.605/98. Referida agravante teria aplicação apenas no crime do art. 55 da Lei n. 9.605/98, pois o agente obteve vantagem pecuniária com a extração de areia sem as competentes autorizações, e não com o crime de supressão de vegetação secundaria, em estágio médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica.

13. Mantida a agravante do artigo 15, inciso II, alínea “c”, da Lei n. 9.605/98. Consoante Laudo pericial, “a supressão de vegetação, quer seja arbórea, arbustiva ou rasteira, expõe o solo, antes protegido pelo dossel vegetal, à ação dos raios solares, que provoca o ressecamento da área, e das chuvas, o que pode gerar erosão causada pela precipitação pluviométrica e pelo escorrimento das águas superficiais. A presença da vegetação aumenta a absorção da água pelo solo reduzindo a quantidade de chuva que escorre superficialmente para os corpos d'água. A vegetação tem, ainda, importância fundamental na manutenção da estabilidade do solo das margens dos rios e córregos, prevenindo o seu assoreamento e a ocorrência de enchentes danosas”.

14. Afastada a agravante do artigo 15, inciso II, alínea “e”, da Lei n. 9.605/98. O laudo pericial reconheceu que a área afetada não se encontra dentro de Área de Preservação Permanente (APP) nem em Unidade de Conservação (UC). Os peritos responderam que a área autuada se encontra dentro da denominada “zona de recuperação”, classificação criada da Resolução SMA (Secretaria do Meio Ambiente de São Paulo) nº 28/1999. Referida agravante não se aplica ao caso em tela, considerado que a circunstância de a infração ter sido praticada em zona de recuperação já constitui elementar do tipo penal imputado, de supressão de vegetação secundária em estágio médio de recuperação.

15. Afasto a agravante do artigo 15, inciso II, alínea “l”, da Lei n. 9.605/98. A circunstância de o crime ter sido praticado no Bioma Mata Atlântica constitui elementar do tipo do art. 38-A da Lei n. 9.605/98.

16. Inaplicável a atenuante genérica prevista no artigo 66 do CP, dada a ausência de comprovação da efetiva reparação do dano.

17. A aplicação da pena de multa deve seguir os mesmos parâmetros de fixação da pena privativa. A elevação do valor do dia-multa é possível, desde que haja fundamentação adequada, pautada na condição econômica do réu e, em caso de crime ambiental, no valor da vantagem econômica auferida.

18. Incabível, na hipótese em tela, a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, uma vez que não preenchido o requisito objetivo do inciso I do artigo 44 do Código Penal.

19. Mantido o regime semiaberto para o início do cumprimento de pena, a teor do disposto no artigo 33, § 2º, "b", do Código Penal.

20. Inaplicável a consideração vantagem econômica auferida com a prática criminosa na fixação da pena de multa, nos termos dos arts. 18 e 19 da Lei n. 9.605/98, uma vez que, conforme já exposto acima, a vantagem econômica auferida refere-se ao lucro apurado com a extração de areia, e não ao crime de supressão de vegetação secundária, em estágio médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica (art. 38-A da Lei n. 9.605/98).

21. A pena de multa aplicada à pessoa jurídica deve ser calculada segundo os critérios do Código Penal, com a estipulação do número de dias-multa e valor de cada dia-multa, nos termos do art. 49 do CP, considerada a previsão expressa nos artigos 18 e 79 da Lei n. 9.605/98.

22. A Lei n. 9.605/98 não foi declarada inconstitucional e permanece em vigor desde a data de sua publicação. Quanto aos limites mínimo e máximo de tempo para cumprimento, registro que, consoante jurisprudência do STJ, “na hipótese de aplicação de pena de multa e restritiva de direitos à pessoa jurídica, em virtude da omissão da Lei 9.605/1998, adotam-se, subsidiariamente, as disposições do Código Penal, nos termos do seu art. 109 e do art. 79 da Lei 9.605/1998” (AgRg no AREsp n. 1.616.383/RJ, relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 19/5/2020, DJe de 26/5/2020.).

23. Em virtude da omissão na Lei n. 9.605/98 quanto à duração da pena restritiva de direito aplicável à pessoa jurídica, deve ser observada a cominação abstrata de pena privativa de liberdade no preceito secundário do tipo penal incriminador.

24. Apelações parcialmente providas.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do Ministério Público Federal, para majorar a pena-base do apelado FABIO pela prática do crime do art. 38-A da lei n. 9.605/98, dar parcial provimento à apelação de FABIO FERNANDO FRANCISCATE para afastar as agravantes do art. 15, II, a, e, e l da Lei n. 9.605/98, de modo que a pena pelo crime previsto no artigo 38-A, caput, da Lei nº 9.605/98, resulta em 01 ano, 10 meses e 15 dias de detenção e o pagamento de 18 dias-multa, ficando sua pena totalizada em 05 anos, 04 meses e 15 dias de detenção, a ser cumprida em regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 52 dias-multa, cada um no valor de 01 salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, devidamente corrigido, e dar parcial provimento à apelação da JJ EXTRAÇÃO para fixar pena de multa em 20 dias-multa, cada um no valor de 3 salários mínimos, e reduzir a duração das penas restritivas de direitos aplicadas à pessoa jurídica para 02 anos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.