APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002725-22.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. CARLOS MUTA
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
APELADO: CELMIRO DE CICCA, ROMUALDO MARTINS COSTA
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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002725-22.2023.4.03.9999 RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. CARLOS MUTA APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: CELMIRO DE CICCA, ROMUALDO MARTINS COSTA R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação à sentença que, reconhecendo prescrição intercorrente, extinguiu execução fiscal. Alegou, em suma, que não houve prescrição intercorrente porque houve determinação legal de suspensão do prazo prescricional, conforme Lei 13.340/2016 e Lei 13.606/2018. Não houve contrarrazões. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002725-22.2023.4.03.9999 RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. CARLOS MUTA APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: CELMIRO DE CICCA, ROMUALDO MARTINS COSTA V O T O Senhores Desembargadores, a respeito da prescrição intercorrente, o Superior Tribunal de Justiça assentou no teor da Súmula 314 que: "Em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual se inicia o prazo da prescrição quinquenal intercorrente". A compreensão da forma com que o prazo é caracterizado e computado foi explicitada no julgamento do RESP 1.340.553, sob o rito de recurso repetitivo: RESP 1.340.553, Rel. Min. CAMPBELL MARQUES, DJe 16/10/2018: “RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ARTS. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015 (ART. 543-C, DO CPC/1973). PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. SISTEMÁTICA PARA A CONTAGEM DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE (PRESCRIÇÃO APÓS A PROPOSITURA DA AÇÃO) PREVISTA NO ART. 40 E PARÁGRAFOS DA LEI DE EXECUÇÃO FISCAL (LEI N. 6.830/80). 1. O espírito do art. 40, da Lei n. 6.830/80 é o de que nenhuma execução fiscal já ajuizada poderá permanecer eternamente nos escaninhos do Poder Judiciário ou da Procuradoria Fazendária encarregada da execução das respectivas dívidas fiscais. 2. Não havendo a citação de qualquer devedor por qualquer meio válido e/ou não sendo encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora (o que permitiria o fim da inércia processual), inicia-se automaticamente o procedimento previsto no art. 40 da Lei n. 6.830/80, e respectivo prazo, ao fim do qual restará prescrito o crédito fiscal. Esse o teor da Súmula n. 314/STJ: "Em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual se inicia o prazo da prescrição qüinqüenal intercorrente". 3. Nem o Juiz e nem a Procuradoria da Fazenda Pública são os senhores do termo inicial do prazo de 1 (um) ano de suspensão previsto no caput, do art. 40, da LEF, somente a lei o é (ordena o art. 40: "[...] o juiz suspenderá [...]"). Não cabe ao Juiz ou à Procuradoria a escolha do melhor momento para o seu início. No primeiro momento em que constatada a não localização do devedor e/ou ausência de bens pelo oficial de justiça e intimada a Fazenda Pública, inicia-se automaticamente o prazo de suspensão, na forma do art. 40, caput, da LEF. Indiferente aqui, portanto, o fato de existir petição da Fazenda Pública requerendo a suspensão do feito por 30, 60, 90 ou 120 dias a fim de realizar diligências, sem pedir a suspensão do feito pelo art. 40, da LEF. Esses pedidos não encontram amparo fora do art. 40 da LEF que limita a suspensão a 1 (um) ano. Também indiferente o fato de que o Juiz, ao intimar a Fazenda Pública, não tenha expressamente feito menção à suspensão do art. 40, da LEF. O que importa para a aplicação da lei é que a Fazenda Pública tenha tomado ciência da inexistência de bens penhoráveis no endereço fornecido e/ou da não localização do devedor. Isso é o suficiente para inaugurar o prazo, ex lege. 4. Teses julgadas para efeito dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015 (art. 543-C, do CPC/1973): 4.1.) O prazo de 1 (um) ano de suspensão do processo e do respectivo prazo prescricional previsto no art. 40, §§ 1º e 2º da Lei n. 6.830/80 - LEF tem início automaticamente na data da ciência da Fazenda Pública a respeito da não localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis no endereço fornecido, havendo, sem prejuízo dessa contagem automática, o dever de o magistrado declarar ter ocorrido a suspensão da execução; 4.1.1.) Sem prejuízo do disposto no item 4.1., nos casos de execução fiscal para cobrança de dívida ativa de natureza tributária (cujo despacho ordenador da citação tenha sido proferido antes da vigência da Lei Complementar n. 118/2005), depois da citação válida, ainda que editalícia, logo após a primeira tentativa infrutífera de localização de bens penhoráveis, o Juiz declarará suspensa a execução. 4.1.2.) Sem prejuízo do disposto no item 4.1., em se tratando de execução fiscal para cobrança de dívida ativa de natureza tributária (cujo despacho ordenador da citação tenha sido proferido na vigência da Lei Complementar n. 118/2005) e de qualquer dívida ativa de natureza não tributária, logo após a primeira tentativa frustrada de citação do devedor ou de localização de bens penhoráveis, o Juiz declarará suspensa a execução. 4.2.) Havendo ou não petição da Fazenda Pública e havendo ou não pronunciamento judicial nesse sentido, findo o prazo de 1 (um) ano de suspensão inicia-se automaticamente o prazo prescricional aplicável (de acordo com a natureza do crédito exequendo) durante o qual o processo deveria estar arquivado sem baixa na distribuição, na forma do art. 40, §§ 2º, 3º e 4º da Lei n. 6.830/80 - LEF, findo o qual o o Juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato; 4.3.) A efetiva constrição patrimonial e a efetiva citação (ainda que por edital) são aptas a interromper o curso da prescrição intercorrente, não bastando para tal o mero peticionamento em juízo, requerendo, v.g., a feitura da penhora sobre ativos financeiros ou sobre outros bens. Os requerimentos feitos pelo exequente, dentro da soma do prazo máximo de 1 (um) ano de suspensão mais o prazo de prescrição aplicável (de acordo com a natureza do crédito exequendo) deverão ser processados, ainda que para além da soma desses dois prazos, pois, citados (ainda que por edital) os devedores e penhorados os bens, a qualquer tempo - mesmo depois de escoados os referidos prazos -, considera-se interrompida a prescrição intercorrente, retroativamente, na data do protocolo da petição que requereu a providência frutífera. 4.4.) A Fazenda Pública, em sua primeira oportunidade de falar nos autos (art. 245 do CPC/73, correspondente ao art. 278 do CPC/2015), ao alegar nulidade pela falta de qualquer intimação dentro do procedimento do art. 40 da LEF, deverá demonstrar o prejuízo que sofreu (exceto a falta da intimação que constitui o termo inicial - 4.1., onde o prejuízo é presumido), por exemplo, deverá demonstrar a ocorrência de qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição. 4.5.) O magistrado, ao reconhecer a prescrição intercorrente, deverá fundamentar o ato judicial por meio da delimitação dos marcos legais que foram aplicados na contagem do respectivo prazo, inclusive quanto ao período em que a execução ficou suspensa. 5. Recurso especial não provido. Acórdão submetido ao regime dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015 (art. 543-C, do CPC/1973).” Percebe-se, portanto, que foram fixadas as seguintes teses repetitivas: (1) Tese 566: "O prazo de 1 (um) ano de suspensão do processo e do respectivo prazo prescricional previsto no art. 40, §§ 1º e 2º da Lei n. 6.830/80 - LEF tem início automaticamente na data da ciência da Fazenda Pública a respeito da não localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis no endereço fornecido, havendo, sem prejuízo dessa contagem automática, o dever de o magistrado declarar ter ocorrido a suspensão da execução"; (2) Teses 567 e 569: "Havendo ou não petição da Fazenda Pública e havendo ou não pronunciamento judicial nesse sentido, findo o prazo de 1 (um) ano de suspensão inicia-se automaticamente o prazo prescricional aplicável"; (3) Tese 568: "A efetiva constrição patrimonial e a efetiva citação (ainda que por edital) são aptas a interromper o curso da prescrição intercorrente, não bastando para tal o mero peticionamento em juízo, requerendo, v.g., a feitura da penhora sobre ativos financeiros ou sobre outros bens"; e (4) Teses 570 e 571: "A Fazenda Pública, em sua primeira oportunidade de falar nos autos (art. 245 do CPC/73, correspondente ao art. 278 do CPC/2015), ao alegar nulidade pela falta de qualquer intimação dentro do procedimento do art. 40 da LEF, deverá demonstrar o prejuízo que sofreu (exceto a falta da intimação que constitui o termo inicial - 4.1., onde o prejuízo é presumido), por exemplo, deverá demonstrar a ocorrência de qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição". Como se observa, desde outubro de 2018, passou a Súmula 314 do Superior Tribunal de Justiça a ser interpretada com outros parâmetros de análise. A prescrição intercorrente não mais depende de pedido ou decisão judicial no sentido de suspender e arquivar provisoriamente a execução fiscal por um ano com a automática e subsequente contagem do quinquênio prescricional. Não depende, tampouco, de caracterização de inércia, pois nenhum ato ou diligência de localização do devedor ou pesquisa de bens é capaz de obstar a contagem da prescrição, que somente se interrompe com a efetiva citação ou constrição patrimonial. Portanto, ainda que esteja em tramitação, sem suspensão ou arquivamento declarado nos autos, com realização de diligências, a prescrição intercorrente encontra-se em curso desde a ciência, pela exequente, da não localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis e somente é interrompida com a efetiva citação ou constrição patrimonial. A interrupção da prescrição intercorrente em caso de êxito na penhora retroage à data do pedido ("considera-se interrompida a prescrição intercorrente, retroativamente, na data do protocolo da petição que requereu a providência frutífera") – Tema 566. Em caso de diligência sem êxito, mero pedido não tem o mesmo efeito interruptivo, conforme enunciado na Tese 568: “A efetiva constrição patrimonial e a efetiva citação (ainda que por edital) são aptas a interromper o curso da prescrição intercorrente, não bastando para tal o mero peticionamento em juízo, requerendo, v.g., a feitura da penhora sobre ativos financeiros ou sobre outros bens”. Sendo este o quadro de caracterização da prescrição intercorrente, segundo a exegese da Corte Superior, importa apenas verificar se não houve citação ou penhora e, neste caso, quando a exequente teve ciência da falta de localização ou inexistência de bens penhoráveis para que seja contado, automaticamente, o prazo de um ano acrescido de mais cinco anos para a consumação do prazo extintivo. Na espécie, a exequente teve ciência de que não haviam bens penhoráveis em 20/11/2007 (ID 274556897, f. 16/20) e, considerando que não foram adotadas providências de suspensão ou interrupção, foi reconhecida por sentença, ora apelada, a prescrição intercorrente. Sucede que a falta de ato interruptivo não decorreu de inércia da exequente, mas de previsão legal de suspensão da prescrição do crédito objeto da execução, em conformidade com sucessiva legislação editada, a saber: MP 432/2008 e Leis 11.775/2008, 12.884/2013, 13.340/2016 e 13.606/2018. A última disposição legal em referência (artigo 20 da Lei 13.606/2018) suspendeu a prescrição do crédito, objeto da execução, até 30/11/2019, a demonstrar que inexistente inércia a justificar reconhecimento da prescrição intercorrente na data em que proferida a sentença e desde a edição da primeira norma suspensiva em 27/05/2008. Assim, não há como atribuir inércia à exequente se, por força legal, a cobrança da dívida estava suspensa. Ante o exposto, dou provimento à apelação para determinar o prosseguimento da execução fiscal. É como voto.
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RESP 1.340.553 (TEMAS 566 A 571). SÚMULA 314. EXECUÇÃO E PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL. SUSPENSÃO DA PRESCRIÇÃO POR LEIS ESPECÍFICAS.
1. Não se reconhece prescrição intercorrente, com fundamento na Súmula 314/STJ e temas repetitivos julgados no REsp 1.340.553, se não caracterizada inércia da exequente na prática de ato suspensivo ou interruptivo a partir da intimação da não localização de bens penhoráveis, como ocorrido na espécie.
2. Conforme demonstrado nos autos, logo após a intimação da exequente da não localização de bens penhoráveis, sucessivas normas foram editadas, suspendendo a prescrição da dívida em execução (MP 432/2008 e Leis 11.775/2008, 12.884/2013, 13.340/2016 e 13.606/2018), afastando a caracterização legal de inércia da exequente em promover cobrança, dada a previsão legal de suspensão da prescrição do crédito, a obstar, pois, seja reconhecida prescrição intercorrente.
3. Apelação provida.