APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0020027-61.2013.4.03.6100
RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. CARLOS MUTA
APELANTE: ANA RITA MACHADO DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: CAIO MARQUES BERTO - SP192240-A
APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, EMPRESA GESTORA DE ATIVOS - EMGEA
Advogado do(a) APELADO: FABRICIO DOS REIS BRANDAO - PA11471-A
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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0020027-61.2013.4.03.6100 RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. CARLOS MUTA APELANTE: ANA RITA MACHADO DA SILVA Advogado do(a) APELANTE: CAIO MARQUES BERTO - SP192240-A Advogado do(a) APELADO: FABRICIO DOS REIS BRANDAO - PA11471-A R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação à sentença que, em ação de imissão na posse, julgou procedente o feito para determinar a imediata desocupação, com reintegração da autora na posse do imóvel, condenando a ré ao pagamento de taxa mensal de R$ 500,00 por cada mês de ocupação do imóvel, contados da transcrição do título no cartório, em 13/12/1999, a serem cobrados em ação própria, fixada verba honorária de R$ 500,00. Alegou-se que: (1) a autora é parte ilegítima para ajuizar o feito, pois a CEF é a proprietária do imóvel, devendo o feito ser extinto sem resolução do mérito (artigo 485, § 3º, CPC); (2) é possuidora do imóvel desde 2002, tendo recebido notificação somente em 2013, e citação em 2014, ocorrendo prescrição aquisitiva; e (3) deve ser afastada a condenação de taxa mensal, pois não foi objeto do pedido da inicial, gerando julgamento extra petita. Indeferido pedido de justiça gratuita, foram recolhidas custas referentes ao preparo recursal. Houve contrarrazões. É o relatório.
APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, EMPRESA GESTORA DE ATIVOS - EMGEA
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0020027-61.2013.4.03.6100 RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. CARLOS MUTA APELANTE: ANA RITA MACHADO DA SILVA Advogado do(a) APELANTE: CAIO MARQUES BERTO - SP192240-A Advogado do(a) APELADO: FABRICIO DOS REIS BRANDAO - PA11471-A V O T O Senhores Desembargadores, rejeita-se o pedido de extinção do feito, sem resolução do mérito, por ilegitimidade ativa, pois, apesar da inicial indicar no polo ativo a "Empresa Gestora de Ativos (EMGEA)", igualmente consta que a mesma é representada no presente feito pela própria CEF, proprietária do imóvel. Ademais, confirmado em réplica a titularidade da CEF para prosseguimento do feito, é certo que a mera correção do polo ativo da ação, sem alteração da causa de pedir e do pedido, não tem o condão de promover sua extinção, devendo prevalecer em tal situação, os princípios da instrumentalidade das formas, celeridade e economia processual. Neste sentido: AgInt no AREsp 1.948.327, Rel. Min. MARCO BUZZI, DJe 11/3/2022: "AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO EXECUTIVA - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA DO EXECUTADO. 1. Segundo o entendimento jurisprudencial adotado por esta Colenda Corte, é admissível a emenda à inicial, mesmo após a citação do réu e a apresentação de contestação, quando se tratar de falta de documento indispensável à propositura da demanda e quando a definição do polo ativo for de convalidação possível, em prestígio ao princípio do aproveitamento dos atos processuais. Precedentes. 1.1. A jurisprudência do STJ, "em observância aos princípios da instrumentalidade das formas, da celeridade, da economia e da efetividade processuais admite, excepcionalmente, a emenda da inicial após o oferecimento da contestação quando tal diligência não ensejar a modificação do pedido ou da causa de pedir" (REsp 1.477.851/PR, 3ª Turma, DJe 04/08/2015 e AgInt no REsp 1.644.772/SC, 3ª Turma, DJe 27/10/2017). 1.2 Na hipótese, a ação executiva foi ajuizada por Aba Participações Eireli com base em cheque emitido pelo executado, que fora devolvido pelo banco sacado. O Tribunal a quo, reformando a sentença que acolheu a exceção de pré-executividade apresentada pelo executado, considerou que a cártula teria sido preenchida em benefício do sócio unipessoal da empresa exequente e concluiu pela impossibilidade de extinção do feito sem antes determinar a emenda à inicial, a fim de que fosse corrigido o vício de ilegitimidade ativa. 1.3 A referida emenda à inicial não teve o condão de promover, propriamente, uma alteração no pedido ou na causa de pedir, mas, ao revés, somente resultou em uma determinação para a correção no polo ativo da ação de execução, sob pena de extinção do feito sem julgamento de mérito. 1.4 O entendimento da Corte local está em harmonia com jurisprudência consolidada no STJ, o que atrai a incidência da Súmula 83 do STJ. Precedentes. 2. Agravo interno desprovido." REsp 1.826.537, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, DJe 14/5/2021: "DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. SEQUESTRO DE BENS DECRETADO PELO JUÍZO CRIMINAL. DEPÓSITO EM MÃOS DA VÍTIMA, PESSOA JURÍDICA, QUE PERDUROU POR QUASE 17 ANOS. EXTINÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA PELA PRESCRIÇÃO. RESTITUIÇÃO DOS BENS EM ESTADO PRECÁRIO. RECURSO ESPECIAL RETIDO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC/73. NÃO OCORRÊNCIA. AÇÃO AJUIZADA POR SOCIEDADE EMPRESÁRIA EXTINTA. ILEGITIMIDADE. MODIFICAÇÃO DO POLO ATIVO APÓS A CITAÇÃO. POSSIBILIDADE. INCLUSÃO DO EX-SÓCIO. LIMITAÇÃO DA INDENIZAÇÃO NA PROPORÇÃO DE SUA PARTICIPAÇÃO NO CAPITAL SOCIAL. RECURSO ESPECIAL CONTRA A SENTENÇA DE MÉRITO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 211/STJ. 1. Ação ajuizada em 03/05/2011. Recursos especiais interpostos em 09/05/2014 (com retenção nos autos) e em 14/03/2019. Conclusão ao Gabinete em 22/07/2019. 2. Os propósitos recursais consistem em dizer: a) preliminarmente, se é possível a modificação do polo ativo da demanda após a citação, para a substituição da sociedade empresária extinta por um de seus sócios e, b) no mérito, se a apuração da indenização, em relação aos veículos, deve considerar seu valor de mercado à época do sequestro judicial, ou, de outro turno, à época da restituição dos bens. 3. Ausentes os vícios do art. 535 do CPC/73, é imperativa a rejeição dos embargos de declaração. 4. A extinção representa para a sociedade empresária o que a morte representa para a pessoa natural: o fim da sua existência no plano jurídico, sem a qual não há mais personalidade civil, nem capacidade de ir a juízo e reivindicar qualquer direito. 5. Eventuais direitos patrimoniais que integraram a esfera jurídica da sociedade são transmitidos, com a sua extinção, aos ex-sócios, aos quais, assim, pertence a legitimidade para postular em juízo acerca de tais direitos. 6. Segundo a jurisprudência desta Corte, em homenagem aos princípios da efetividade do processo, da economia processual e da instrumentalidade das formas, é admissível a emenda à petição inicial para a modificação das partes, sem alteração do pedido ou da causa de pedir, mesmo após a contestação do réu. Precedentes. 7. Hipótese dos autos em que, desde o protocolo da petição inicial, estava patente a ilegitimidade ativa da sociedade empresária, porquanto já extinta anos antes, como atestado pelos documentos anexados à peça. 8. Contexto em que cabia ao juiz, à primeira leitura da exordial, ter determinado a retificação do polo ativo, com vistas a possibilitar o regular processamento da demanda. Como não o fez, abriu-se para a parte ré a possibilidade de suscitar o vício em sua contestação, circunstância que, todavia, não é capaz de justificar a prematura extinção do processo quanto ao direito material vindicado. 9. A isso se acrescenta a ausência de prejuízo à ré, haja vista que, em não se tratando de hipótese de alteração do pedido ou da causa de pedir, suas razões de defesa, tanto fáticas como jurídicas, permanecem hígidas e absolutamente pertinentes, quer conste no polo ativo a sociedade ou o seu ex-sócio. 10. Vindo aos autos apenas um dos ex-sócios, impõe-se o pagamento da indenização não por inteiro, mas na proporção da sua participação no capital social da empresa extinta. 11. Em que pese a oposição de embargos de declaração, a ausência de prequestionamento da tese sustentada pela recorrente, bem como dos dispositivos legais correlatos, impede o conhecimento do recurso especial interposto contra a sentença de mérito. Aplicação da Súmula 211/STJ. 12. Recurso especial interposto contra decisão interlocutória conhecido e parcialmente provido. 13. Recurso especial interposto contra a sentença de mérito não conhecido." No mérito, consta da matrícula 83.422, do 11º CRI de São Paulo (ID 276113990, f. 16/18), que o imóvel situado à Avenida Interlagos, 871, ap. 125, bloco 5, São Paulo/SP, foi vendido, por instrumento particular, em 28/01/1979, pela Cooperativa Habitacional Interlagos a Roberto Paulo Godoy, Roberto Leandro Dodoy, e Therezinha Corazzini Godoy, tendo o imóvel sido dado em hipoteca a Sul Brasileiro SP - Crédito Imobiliário S/A e que, posteriormente, conforme averbado à "4/83.422", este cedeu e transferiu à CEF, "todos os seus direitos creditórios decorrentes da hipoteca", por instrumento particular datado de 03/06/1996. Verifica-se ainda na averbação de 10/03/2000, que pela "carta de arrematação passada em 13 de dezembro de 1999", o imóvel foi arrematado pela CEF em "execução extrajudicial promovida nos temos do Decreto Lei nº 70/66", e que, assim, houve cancelamento da hipoteca. Neste ponto, cumpre registrar ainda que, conforme documentos acostados, a CEF enviou duas notificações extrajudiciais ao endereço do imóvel. A primeira, datada de 14/03/2013 e dirigida a "Ana Rita Machado da Silva", restou negativa, pelo fato da destinatária não ter sido encontrada "nas diligências de 15/03/2013 às 16h00; 26/03/2013 às 11h25; 05/04/2013 às 15h00 e 10/04/2013 às 14h10", apesar de "deixados avisos de comparecimento a este serviço registral, com o Sr. Jose Gonzaga, porteiro" (idem, f. 28/29). A segunda, datada de 24/04/2013, e dirigida a "Roberto Paulo Godoy", também restou negativa, tendo o "Sr. Cicero Jose (porteiro)" informado que "o destinatário é desconhecido no local" (idem, f. 25/27). Determinada a citação dos réus no presente feito, qualificados na inicial apenas como "invasores", certificou o oficial de Justiça, na diligência realizada em 14/12/2013 que (idem, f. 46/47): "(...) estive na Av. Interlagos, 871, nesta Capital, sendo atendida pelo Sr. Ubirajara, porteiro, que informou, após consultar a lista de moradores, que constam como moradores no ap. 125 do Bloco 05: Sra. Ana Rita Machado da Silva; Sr. Alziro Machado da Silva Filho e o Sr. José Roberto Corregiari. Assim, subi ao apartamento 125 do Ed. Fênix, sendo atendida pela Sra. Cíntia, trabalhadora na residência, que assim se apresentou e informou que a Sra. Ana Rita não se encontrava naquele momento. Desta maneira, voltei ao mencionado em 14 do presente e, no térro do Ed. Fênix, CITEI e INTIMEI a Sra. Ana Rita Machado da Silva (...) que de tudo ficou ciente, aceitando a contrafé e lançando sua assinatura no anverso. Por mais a Sra. Ana Rita Machado da Silva afirmou que atualmente só ela reside em referido apartamento, pois o Sr. Alziro, seu pai, não se encontra residindo ali atualmente e nem o Sr. José Roberto." Por sua vez, sustentou a apelante que "tem a posse do imóvel desde 2002, mais precisamente janeiro de 2002", ao assumir "o apartamento dos Sra. Roberto Paulo Godoy, Roberto Leandro Godoy e Therezinha Corazzini Godoy, com a finalidade de pagar condomínios e taxas, bem como promover reforma e acertar eventual pendência com o financiamento, todavia foi informada à época que isto não seria possível em face do cancelamento da hipoteca, arrematação" (idem, f. 50), aduzindo ter havido prescrição aquisitiva. Neste contexto, resta provado que a CEF é efetiva proprietária do imóvel, ao menos desde 13/12/1999, ante o registro da carta de arrematação na respectiva matrícula, e que a apelante tinha plena ciência da arrematação havida antes de "assumir o apartamento" de Roberto Paulo Godoy, Roberto Leandro Godoy e Therezinha Corazzini Godoy, os que sequer eram mais proprietários, em janeiro de 2002. Sobre tal questão dispõe o Código Civil que: "Art. 1.200. É justa a posse que não for violenta, clandestina ou precária. (...) Art. 1.202. A posse de boa-fé só perde este caráter no caso e desde o momento em que as circunstâncias façam presumir que o possuidor não ignora que possui indevidamente. Art. 1.203. Salvo prova em contrário, entende-se manter a posse o mesmo caráter com que foi adquirida. (...) Art. 1.208. Não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância assim como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a clandestinidade." Logo, nota-se que a posse da apelante não é justa, diante do próprio reconhecimento da mesma de que à época já tinha ciência de que "isto não seria possível em face do cancelamento da hipoteca, arrematação", e consequentemente a impossibilidade de que tal imóvel pudesse ter sido objeto de transferência por terceiros, não mais proprietários ou titulares de poderes para tanto, caracterizando-se, em verdade, no caso, ocupação clandestina, sem justo título, com prática de esbulho possessório. Assim, ainda que se considere que tal imóvel, pertencente à CEF, não configure bem público por não estar relacionado ao Sistema Financeiro de Habitação, estando, pois, sujeito a usucapião, é certo que estando a posse viciada pela clandestinidade, que se manteve com o mesmo caráter desde que adquirida, não se autoriza o reconhecimento da prescrição aquisitiva, que tampouco resulta da situação de eventual mera tolerância, consoante previsão do artigo 1.208 do CC. Neste sentido podem ser colacionados precedentes do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte: REsp 1.403.493, Rel. Min. FELIPE SALOMÃO, DJe 2/8/2019: "RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REIVINDICATÓRIA DE BENS PÚBLICOS OBJETO DE CONTRATO DE CONCESSÃO DE DIREITO REAL DE USO CELEBRADO COM TERCEIRO. OFERTA EM PROCESSO DE EXECUÇÃO DOS DIREITOS ALUSIVOS AO CONTRATO PELA CONCESSIONÁRIA. PLEITO DE INDENIZAÇÃO PELAS BENFEITORIAS PELO ATUAL OCUPANTE DOS IMÓVEIS (O ARREMATANTE). 1. O ajuizamento da ação reivindicatória - de natureza real e fundada no direito de sequela -, reclama a existência concomitante de três requisitos específicos: a prova da titularidade do domínio pelo autor, a individualização da coisa e a demonstração da posse (ou detenção) injusta do réu (REsp 1.060.259/MG, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 04.04.2017, DJe 04.05.2017; REsp 1.152.148/SE, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 13.08.2013, DJe 02.09.2013; e REsp 1.003.305/DF, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 18.11.2010, DJe 24.11.2010). 2. Na hipótese dos autos, não há controvérsia sobre a titularidade do domínio do autor, tendo sido os bens - objeto da reivindicatória - devidamente individualizados. O recorrente, contudo, afirma que sua "posse" era justa, por não ser violenta, clandestina ou precária, ex vi do disposto no artigo 1.200 do Código Civil, o que ensejaria a inadmissibilidade da ação reivindicatória. 3. Nada obstante, como bem assinalado pela doutrina, "a noção ampla de posse injusta a que alude o caput do art. 1.228 do Código Civil não corresponde ao conceito estrito de posse injusta espelhado no art. 1.200 do mesmo estatuto (posse violenta, clandestina ou precária), posto que mais extensa", referindo-se àquela que, "mesmo obtida pacificamente - despida dos realçados vícios -, sobeja desamparada de causa jurídica eficiente capaz de respaldar a atividade do possuidor" (FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil, vol. 5: reais. Salvador: Juspodivm, 2013, p. 297). 4. Desse modo, excetuada a hipótese em que for configurada posse ad usucapionem, o cabimento da ação reivindicatória reclama apenas a constatação de que a posse - ou a detenção - do réu se contrapõe ao exercício do direito de propriedade do autor, inexistindo causa jurídica adequada que legitime a atuação do possuidor/detentor. Nessa perspectiva, até mesmo a posse ad interdicta, defensável por interditos possessórios, não constitui obstáculo à procedência do pedido reivindicatório, prevalecendo o direito do titular do domínio de exercer suas faculdades de uso, gozo e disposição da coisa (artigos 524 do Código Civil de 1916 e 1.228 do Código Civil de 2002). 5. Consoante incontroverso na origem: (a) a TERRACAP é a proprietária dos imóveis objeto da ação reivindicatória; (b) celebrou com a sociedade Paineira Construção e Urbanismo Ltda. contrato de concessão de direitos reais de uso com opção de compra, devidamente formalizado por escritura pública; (c) a referida sociedade tornou-se inadimplente no cumprimento de suas obrigações (pagamento de taxa mensal de concessão), o que motivou a rescisão do negócio; (iv) sem a participação (ou anuência) da TERRACAP, os aludidos imóveis foram nomeados à penhora no âmbito de execução ajuizada em face de filho do sócio gerente da concessionária; (d) os direitos reais de uso do bens foram, então, arrematados em hasta pública pelo exequente (réu da ação reivindicatória), tendo sido as respectivas cartas registradas em 2003; e (e) no contrato de concessão firmado com a sociedade, havia cláusula expressa proibindo a sublocação, doação, empréstimo, cessão a qualquer título, bem como a venda da opção de compra. 6. Desse modo, revela-se o caráter injusto da "posse" do réu da ação petitória, ante a ausência de causa jurídica que o legitimasse a se contrapor ao direito subjetivo do proprietário de recuperar seus poderes dominiais sobre os bens, motivo pelo qual não merece reforma o acórdão estadual que estabeleceu o cabimento da reivindicatória. 7. Nos termos da jurisprudência da Corte Especial, os imóveis administrados pela TERRACAP são bens públicos, sendo, inclusive, insuscetíveis de usucapião (EREsp 695.928/DF, Rel. Ministro José Delgado, Corte Especial, julgado em 18.10.2006, DJ 18.12.2006). 8. Nesse quadro, também sobressai a exegese firmada no STJ no sentido de que, no tocante aos bens públicos, não se pode falar em posse, mas em mera detenção de natureza precária, o que afasta a pretensão a qualquer direito típico de possuidor em detrimento do Poder Público - a exemplo da indenização por benfeitorias ou por acessões previsto no artigo 1.219 do Código Civil de 2002 -, ainda que à luz de alegada boa-fé. Precedentes. 9. Outrossim, não é possível conferir relevância jurídica à demora da TERRACAP em adotar providências voltadas à retomada dos bens (a inadimplência e a consequente rescisão do contrato de concessão ocorreram em 1996, mas o ajuizamento da ação petitória se deu apenas em 2005), pois, nos termos do artigo 1.208 do Código Civil de 2002 (correspondente ao artigo 497 do Código Civil de 1916), "não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância assim como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a clandestinidade". 10. Ademais, merece destaque a assertiva do Tribunal de origem no sentido de inexistir comprovação, nos autos, de que quaisquer melhoramentos ou atos voltados à conservação dos bens foram, efetivamente, custeados pelo demandado. 11. Recurso especial não provido." ApCiv 0011343-93.2008.4.03.6110, Rel. Des. Fed. WILSON ZAUHY, e-DJF3 11/06/2019: "DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA. POSSE CLANDESTINA. ATOS DE OPOSIÇÃO. AUSENTE MANSIDÃO DA POSSE. IMPROCEDÊNCIA. PROVAS DESNECESSÁRIAS. INDEFERIMENTO. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO VERIFICADO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.1.No caso dos autos, pretende a parte autora a aquisição de propriedade de imóvel urbano por meio de usucapião, sustentando ter sobre ele a posse mansa, pacífica e ininterrupta, com animus domini, desde 28/10/2002.2.A análise dos autos revela que os autores obtiveram a posse do imóvel em comento clandestinamente, eis que sem dar notícia ao proprietário, e que não demonstraram a cessação da clandestinidade, ônus que lhes incumbia, por se tratar de fato constitutivo do direito por eles alegado e porque "salvo prova em contrário, entende-se manter a posse o mesmo caráter com que foi adquirida" (art. 1.203 do Código Civil).3.O ajuizamento da presente demanda não teve o condão de afastar a clandestinidade da posse por eles exercida, já que nos presentes autos só houve citação da CEF e da EMGEA, sendo esta credora hipotecária do bem, não se tendo demonstrado que os proprietários do imóvel tenham, de alguma forma, tomado ciência da posse exercida pelos requerentes.4.Não é possível admitir a mansidão de sua posse, já que consta dos autos que o terreno em questão está sob litígio desde, pelo menos, o final de 1992, quando foi ajuizada ação de execução fiscal com a finalidade de se cobrar valores referentes a um contrato de mútuo entabulado anteriormente entre a CEF e a construtora PG S/A, como consignado em sentença e não impugnado pela parte interessada. Só por meio de escritura pública lavrada em 10/08/2009 é que se operou a venda do empreendimento Parque São Bento, aparentemente onde está inserido o imóvel usucapiendo, da devedora PG S/A para a Parque São Bento Empreendimentos Imobiliários Ltda. - tudo sem que se tenha verificado a ciência do antigo e do novo proprietário do imóvel acerca da posse exercida pelos autores.5.Não se há de falar em cerceamento de defesa em razão do indeferimento das provas genericamente pleiteadas pela parte autora em sua peça inicial, uma vez que o Juízo Sentenciante fundamentou devidamente a sua decisão com base nos elementos trazidos aos autos, sendo certo que a parte interessada não demonstra, sequer minimamente, de que forma tais provas - a saber: depoimento pessoal, prova pericial, requisição de informações e prova testemunhal - poderiam modificar o convencimento do Juízo, que se pautou precipuamente nas provas documentais trazidas aos autos.6.Apelação não provida." Ainda que assim não fosse, inviável cogitar do cumprimento dos requisitos necessários à configuração da prescrição pretendida, por ausência de: efetivo animus domini; comprovação inequívoca de não ser a apelante proprietária de outro imóvel urbano ou rural, não lhe tendo sido deferida a usucapião especial urbana em outra ocasião; justo título e boa-fé para usucapião ordinário; e decurso do prazo de usucapião extraordinário, pois não restaram consumados vinte ou quinze anos (artigos 550 do CC/1916 e 1.238 do CC/2002) no período de janeiro/2002 e março e abril/2013, quando ocorridas as quatro tentativas de notificação extrajudicial com aviso de comparecimento no endereço do imóvel, ou de outubro/2013, quando ajuizado o presente feito, com citação pessoal em 14/12/2013. Some-se ainda que documentos acostados pela apelante (idem, f. 54/108), incluindo recibos apócrifos de serviços prestados, contratos e faturas diversas em nome de terceiros, não são aptos a comprovar o animus possidendi da apelante, e nem o exercício da posse ad usucapionem de forma ininterrupta pelo prazo previsto em lei, pelo que resta afastada a possibilidade de acolhimento do pleito formulado. Ademais, note-se que as notificações enviadas pelo condomínio em agosto/2003 e junho/2012 foram direcionados à CEF, constando esta como condômino nos boletos de agosto a dezembro/2013. No tocante à alegação de julgamento extra petita referente à fixação de taxa mensal de R$ 500,00 por cada mês de ocupação do imóvel, consta no inicial que o pedido foi formulado nos seguintes termos (idem, f. 9/10): "(a) a antecipação de tutela pretendida na inicial para liminarmente e "inaudita altera pars", na forma do artigo 273 do Código de Processo Civil, diante do inequívoco domínio sobre o imóvel, e fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, a imissão na posse em favor desta empresa pública e todos os poderes inerentes a seu direito de propriedade; (b) seja providenciada a qualificação do(s) réu(s) e, ato sequente, sua citação para que, uma vez querendo, apresentem a defesa que tiverem nbo prazo legal, sob pena de revelia e confissão. (c) a confirmação em sentença da tuitela antecipada concedida, julgando-se a ação integralmente procedente, entregando-se a efetiva posse do imóvel à autora, sua legítima proprietária; (d) a condenação dos requeridos em multa diária a ser arbitrada judicialmente até a efetiva desocupação do imóvel; (e) a condenação dos requeridos em custas e honorários advocatícios que pede sejam arbitrados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa" Verifica-se, assim, que assiste razão à apelante, pois o requerimento do item "d" do pedido da inicial acerca do arbitramento de multa diária como sanção pecuniária pelo descumprimento de ordem judicial de desocupação do imóvel, não se confunde com pedido de fixação de taxa mensal, de caráter indenizatório, e arbitrada, no caso, pelo Juízo a quo de modo retroativo desde 13/12/1999, com fundamento no artigo 38 do Decreto-lei 70/1966. Neste ponto, convém destacar, porém, que a solução adotada não obsta que, descumprida a ordem de imissão da posse, caso seja formulado pedido específico pela CEF, possa o Juízo, oportunamente, fixar pagamento de multa diária até desocupação, bem como autorizar, se necessário, o uso dos meios legais para cumprimento da decisão judicial. Por fim, não se fixa verba honorária a favor da apelante, ante o decaimento da autora em parte mínima do pedido, nos termos do parágrafo único, do artigo 86, CPC. Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação, nos termos supracitados. É como voto.
APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, EMPRESA GESTORA DE ATIVOS - EMGEA
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE IMISSÃO NA POSSE. MODIFICAÇÃO DO POLO ATIVO. POSSIBILIDADE. ARREMATAÇÃO REGISTRADA NA MATRÍCULA DO IMÓVEL. AUSÊNCIA DE JUSTO TÍTULO. POSSE CLANDESTINA. USUCAPIÃO. NÃO COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS. JULGAMENTO EXTRA PETITA CONFIGURADO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. Confirmado em réplica a titularidade da CEF para prosseguir no feito, é certo que mera correção do polo ativo da ação, sem alteração da causa de pedir e do pedido, não tem o condão de promover extinção do feito, devendo prevalecer em tal situação, os princípios da instrumentalidade das formas, celeridade e economia processual.
2. Infundada a pretensão de reforma da sentença, no tocante à ordem de desocupação, pois comprovado nos autos que a CEF é proprietária do imóvel, ao menos desde 13/12/1999, ante o registro da carta de arrematação na respectiva matrícula, e que a posse da apelante não é justa pelo próprio reconhecimento da mesma de que à época já tinha ciência da arrematação havida antes de "assumir o apartamento" dos antigos proprietários, em janeiro de 2002, caracterizando, em verdade, ocupação clandestina, sem justo título e com prática de esbulho possessório.
3. Ainda que se considere que tal imóvel pertencente à CEF não configure bem público por não estar inserido no Sistema Financeiro de Habitação, estando, pois, sujeito a usucapião, é certo que estando a posse viciada pela clandestinidade, que se manteve com o mesmo caráter desde que adquirida, não se autoriza a aquisição pretendida, inclusive porque não gera tal efeito mera tolerância nos termos do artigo 1.208 do CC.
4. Não verificados requisitos necessários à configuração da prescrição punitiva, por ausente: efetivo animus domini; prova inequívoca de não ser a apelante proprietária de outro imóvel urbano ou rural, não lhe tendo sido deferida a usucapião especial urbana em outra ocasião; justo título e boa-fé para fins de usucapião ordinário; e de transcurso temporal de usucapião extraordinário. Ademais, documentos acostados pela apelante não são aptos a comprovar animus possidendi, e nem exercício da posse ad usucapionem de forma ininterrupta pelo prazo previsto em lei, para autorizar acolhida da pretensão recursal deduzida.
5. O mero pedido na inicial de arbitramento de multa diária, como sanção pecuniária por descumprimento de ordem judicial para desocupação do imóvel, não se confunde com pedido de fixação de taxa mensal, de caráter indenizatório, e arbitrada, no caso, pelo Juízo a quo de modo retroativo desde 13/12/1999, com fundamento no artigo 38 do Decreto-lei 70/1966, pelo que deve ser reformada a sentença, por julgamento extra petita.
6. Dada a sucumbência mínima da autora, não se altera o arbitramento da verba honorária fixada na origem.
7. Apelação parcialmente provida.