Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
5ª Turma

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0009763-96.2014.4.03.6181

RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

APELANTE: PAULO EDUARDO MORAES FRAZAO, JOEL SCOLARI

Advogados do(a) APELANTE: BIANCA FIORAMONTE LANA - SP296379-A, CICERO MARCOS LIMA LANA - SP182890-A
Advogados do(a) APELANTE: GEORGE RAYMOND ZOUEIN - SP137130-A, MARCELA PRISCILA MALTA SOLDERA - SP243030-A

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0009763-96.2014.4.03.6181

RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

APELANTE: PAULO EDUARDO MORAES FRAZAO, JOEL SCOLARI

Advogados do(a) APELANTE: BIANCA FIORAMONTE LANA - SP296379-A, CICERO MARCOS LIMA LANA - SP182890-A
Advogados do(a) APELANTE: GEORGE RAYMOND ZOUEIN - SP137130-A, MARCELA PRISCILA MALTA SOLDERA - SP243030-A

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

 

 

 R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de apelações criminais interpostas por Paulo Eduardo Moraes Frazão e Joel Scolari contra a sentença (Id n. 273642761), proferida pelo Juízo da 4ª Vara Criminal Federal de São Paulo (SP), que condenou os apelantes à pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 11 (onze) dias-multa, no valor unitário de décimo do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, restando as penas privativas de liberdade substituídas por penas restritivas de direitos.

A defesa de Paulo Eduardo Moraes Frazão sustenta, em síntese:

a) em sede preliminar, a anulação da sentença condenatória, sob a alegação de cerceamento de defesa, que restou obstada pela confusão, ao longo da investigação e da instrução criminal, quanto à empresa contribuinte, ora se referindo à Alcamp Comercial Ltda., ora à Alcamp Alimentos Ltda.;

b) a nulidade de todos os atos decisórios por incompetência do Juízo a quo, considerando que a empresa autuada pela Receita Federal, Alcamp Comercial Ltda., estava sediada, ao tempo dos fatos (2006, “quando as informações tributárias não foram (...) devidamente prestadas”), no município de Campinas (SP);

c) no mérito, a absolvição por ausência de provas da participação do apelante nos fatos imputados pela acusação, uma vez que não era responsável pelas omissões nas declarações tributárias, não podendo ser condenado com base apenas no fato de constar no contrato social da empresa, sob pena de conformar hipótese de responsabilidade penal objetiva; e

d) subsidiariamente, a existência de dúvida razoável sobre a autoria delitiva ou ainda sobre a materialidade, em razão da mencionada confusão entre as empresas e a incompreensão do Fisco “em relação à atividade desenvolvida, notadamente em relação ao faturamento e recebimento dos valores oriundos das vendas de cestas de Natal” (Id n. 274206543).

Por sua vez, em seu apelo, a defesa de Joel Scolari alega, em resumo:

a) preliminarmente, a nulidade da condenação em razão de vício no procedimento, uma vez que houve confusão na apuração entre as empresas Alcamp Alimentos Ltda. e Alcamp Comercial Ltda.;

b) a “nulidade da denúncia” por ilegitimidade de parte, dado que “o recorrente não estava à frente da empresa no que tange ao pagamento de tributos e a parte administrativa em geral”, sendo responsável apenas pela “administração comercial” da empresa;

c) a ausência de justa causa, tendo em vista a alteração de dados enviados à Receita Federal por terceiro não identificado, sem a ciência ou anuência dos proprietários da empresa, acarretando a diminuição da receita declarada e a consequente redução de tributos, gerando o crime fiscal ora imputado;

d) a ausência de comprovação da constituição definitiva do crédito tributário em relação à empresa Alcamp Alimentos Ltda., ocasionando a nulidade do feito pelo descumprimento da Súmula Vinculante n. 24 do STF; e

e) no mérito, sustenta ser hipótese de absolvição por não ter sido comprovado o dolo ou em razão do reconhecimento da inexigibilidade de conduta diversa em razão de dificuldades financeiras da pessoa jurídica (Id n. 273642849).

Foram apresentadas contrarrazões pelo Ministério Público Federal (Id n. 273642851).

O Ilustre Procurador Regional da República, Dr. Ronaldo Pinheiro de Queiroz, manifestou-se pelo não provimento dos recursos defensivos (Id n. 275317037).

É o relatório.

À revisão, nos termos regimentais.

 

 


APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0009763-96.2014.4.03.6181

RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

APELANTE: PAULO EDUARDO MORAES FRAZAO, JOEL SCOLARI

Advogados do(a) APELANTE: BIANCA FIORAMONTE LANA - SP296379-A, CICERO MARCOS LIMA LANA - SP182890-A
Advogados do(a) APELANTE: GEORGE RAYMOND ZOUEIN - SP137130-A, MARCELA PRISCILA MALTA SOLDERA - SP243030-A

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

 

 

 V O T O

 

Imputação. Paulo Eduardo Moraes Frazão e Joel Scolari foram denunciados pela prática do delito tipificado no art. 1º, I e II, da Lei n. 8.137/90:

 

1. Descrição da conduta criminosa

De janeiro a dezembro de 2006, na condição de administradores da pessoa jurídica ALCAMP ALIMENTOS LTDA, inscrita no CNPJ n. 03.310.865/0001-42, localizada, na época dos fatos, na Av. Comendador Aladino Selmi, 4.840, Jardim Santa Mônica, Campinas, SP, PAULO EDUARDO MORAES FRAZÃO e JOEL SCOLARI, com consciência livre e vontade dirigida, e em unidade de desígnios, reduziram tributos (IRRJ, CSLL, PIS E COFINS) ao omitirem receitas que a sociedade empresária efetivamente auferiu (devidamente descritas nas tabelas constantes nas p. 5-9, 11, 13-4, 16-7, 22-7, 31-2, 36 e 42-3 do ID 118212943) – omitindo-as não apenas na escrituração contábil, mas também na DIPJ e, conseqüentemente, nas Declarações de Débitos e Créditos Tributários Federais – DCTF. Como os DENUNCIADOS, com consciência e vontade de pagar menos tributos, declararam apenas 63% das receitas que eram bases de cálculo deles, acabou havendo, ficticiamente, apuração de prejuízos nos três primeiros trimestres de 2006. Por meio desse artifício, o contribuinte pessoa jurídica ficou isento do pagamento do IRPJ neste período.

A sociedade empresária Alcamp Alimentos Ltda. tinha como principal atividade econômica o comércio atacadista de produtos alimentícios em geral. No primeiro trimestre de 2006, por exemplo, os DENUNCIADOS declararam que a pessoa jurídica teve uma receita de vendas de R$5.480.601,46. Porém, no mesmo período, através da mesma pessoa jurídica, os DENUNCIADOS emitiram duplicatas a receber no total de R$ 13.043.761,84.

Conforme registrou o auditor fiscal da Receita Federal que analisou o caso:

Não pode ser considerado um erro escusável registrar uma venda de mercadorias lançando-se diretamente a débito na conta “Caixa Geral” ou “Duplicatas a Receber” contra uma conta de estoque, simplesmente omitindo a receita da venda. Trata-se de um princípio básico o registro em contas de resultado dos fatos que representem variações no patrimônio da entidade.

Observe o lançamento abaixo:

(...)

Este lançamento, assim como outros observados na contabilidade, registra o recebimento de clientes em contrapartida à baixa no estoque. Há o registro da saída de mercadorias do estoque no valor de R$ 4.324.941,36, contra o recebimento de clientes no mesmo valor, sendo R$ 69.412,20 em dinheiro e o restante a prazo, na forma de duplicatas a receber. O histórico informa de forma inequívoca que a baixa no estoque foi referente a mercadorias vendidas em 01/2006. Não há a menor dúvida que se trata de venda de mercadorias.

Entretanto, esta venda, como as demais que originaram o auto de infração lavrado contra o contribuinte, não foi lançada como receita de vendas. No primeiro trimestre de 2006, o contribuinte declarou na DIPJ (Ficha 06A – Linha 03) uma Receita da Revenda de Mercadorias de R$ 5.480.601,46, sendo R$ 1.577.863,89, R$ 1.633.321,33 e R$ 2.269.416,24 para as competências de janeiro a março de 2006, respectivamente, conforme Demonstrativo de Apuração das Contribuições Sociais – DACON (Ficha 07A – Linha 01).

Portanto, somente no exemplo supracitado, o contribuinte omitiu uma receita de R$ 4.324.941,36, para uma receita declarada no mês de janeiro de 01/2006 de R$ 1.577.863,89.

O artifício de não registrar em contas de resultado a totalidade das vendas, maculando suas demonstrações contábeis e declarações à Receita Federal, resultando na omissão de receitas apurada no Auto de Infração, constitui evidente intuito de fraude, pois o contribuinte agiu de forma a modificar as características do fato gerador da obrigação tributária com a finalidade de obter A conduta de declarar ao Fisco valores menores do que aqueles que de fato seriam os verdadeiros, sem que nenhuma justificativa plausível tenha sido apresentada para tanto, corroborada pela recusa em apresentar os documentos comprobatórios dos lançamentos contábeis, demonstra a intenção de retardar o conhecimento do fato gerador por parte da autoridade administrativa (sonegação).

Ao final o auto de infração constatou que os DENUNCIADOS, por meio do artifício acima descrito, e mediante omissão de informações à Receita Federal do Brasil, de janeiro a setembro de 2006, sonegaram valores que, acrescidos de juros de mora e multa proporcional, chegaram a R$15.342.421,711, sendo que, deste valor, R$8.822.264,81 é relativo ao Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ), R$3.142.046,88, relativo à Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL), R$2.779.514,00 relativo à Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (COFINS) e R$598.596,02 relativo à Contribuição para Programas de Integração Social (PIS) – cf. p. 1-4 do ID 118213277.

A Representação Fiscal para Fins Penais n. 10830.726036/2011-69, encaminhada ao Ministério Público Federal, foi emitida no bojo do Processo Administrativo Fiscal n. 10830. 725999/2011-45, cujo recurso do contribuinte foi julgado procedente em parte (para reduzir a multa de ofício proporcional de 225% para 150%), dando origem ao Processo Administrativo n. 16151.720447/2013-38. O julgamento do recurso ocorreu em 23.10.2012 (p. 1 do ID 118213273); o contribuinte foi cientificado por correspondência em 15.01.2013 (p. 1 do ID 118213278) e por edital em 08.02.2013, com prazo de trinta dias para recurso, contados do 16º dia da data da afixação do edital.

Portanto, não tendo havido impugnação (cf. p. 1 do ID 118213280), os créditos se tornaram definitivos na via administrativa no dia 25.03.2013. Por fim, os autos foram encaminhados à Procuradoria da Fazenda Nacional, para inscrição em dívida ativa da União (p. 123 do ID 118224033) – o que efetivamente ocorreu em 22.08.2013 (p. 199 do ID 118224033).

A materialidade está comprovada pelo Termo de Verificação Fiscal - MPF n. 08.1.04.00-2010-00119-1 às p. 1-43 do ID 118212943 e pelos demonstrativos detalhados de apuração e autos de infração que o acompanham.

A autoria delitiva está assentada não apenas nas fichas cadastrais da JUCESP, juntadas nas p. 59-67 do ID 118224032, que indicam que os dois denunciados eram os únicos administradores da sociedade empresária no ano de 2006, portanto os responsáveis pelas informações omitidas, mas também nos depoimentos do denunciado PAULO EDUARDO MORAES FRAZÃO (p. 67 do ID 118224033), de Luciano Limoli Júnior (p. 101 do ID 118224033) e de Fernanda Dimarzio Scolari Oliveira (p. 33 do ID 118224037).

2. Classificação dos crimes objeto desta denúncia

Em razão dos fatos aqui descritos, os denunciados PAULO EDUARDO MORAES FRAZÃO e JOEL SCOLARI praticaram o delito do art. 1º, incisos I e II, da Lei Federal n. 8.137/90, na forma dos art. 29 e 71 do Código Penal (Id n. 273641466).

 

Do processo. A denúncia ministerial foi oferecida em 14.03.22, bem como recebida pelo Juízo a quo em 15.03.22 (Id n. 273641468). Devidamente processado o feito, foi proferida sentença, em 22.02.23, julgando procedente o pedido acusatório (Id n. 273642761).

Foram opostos embargos de declaração pelas defesas de Paulo (Id n. 273642778) e de Joel (Id n. 273642816), acolhidos apenas para correção de erro material, sem alteração do julgamento (Id n. 273642838).

 

Crime material contra a ordem tributária. Consumação. Constituição definitiva do crédito tributário. Domicílio fiscal do contribuinte. Esta Corte tem decidido que o foro competente para o processamento e o julgamento de crime material contra a ordem tributária é o do domicílio fiscal do contribuinte, na data da constituição definitiva do crédito na esfera administrativa, de acordo com a Súmula n. 24 do Supremo Tribunal Federal:

 

PROCESSUAL PENAL. CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO. CRIME DE SONEGAÇÃO FISCAL. NATUREZA. COMPETÊNCIA. LOCAL DA CONSUMAÇÃO. IMPROCEDÊNCIA. 1. O crime previsto no artigo 1º da Lei nº 8.137/90 é material e somente se consuma quando, em decorrência das condutas previstas no tipo, resultar a supressão ou a redução do tributo devido. 2. É competente para processar e julgar crime material contra a ordem tributária o juízo do domicílio fiscal do contribuinte na data da constituição definitiva do crédito tributário. 3. Conflito julgado improcedente.

(TRF 3ª Região, 4ª Seção, CJ n. 00019933420154030000, Rel. Des. Fed. Mauricio Kato, j. 20.08.15)

 

CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. SUPRESSÃO OU REDUÇÃO DE TRIBUTO. CRIME MATERIAL. CONSUMAÇÃO. LOCAL ONDE VERIFICADO O EFETIVO PREJUÍZO DECORRENTE DA CONDUTA. 1. Por tratar-se de crime material, o ilícito de supressão ou redução de tributo, previsto no art. 1º da Lei n.º 8.137/90, consuma-se no local onde verificado o prejuízo decorrente da conduta típica. 2. Ademais, de acordo com entendimento do Supremo Tribunal Federal, cristalizado na Súmula Vinculante nº 24, a consumação dos crimes contra a ordem tributária previstos no art. 1º da Lei nº 8.137/90 (crimes materiais) somente ocorre no momento da constituição definitiva do crédito tributário. Desse modo, tratando-se de crime material contra a ordem tributaria, o foro competente para processá-lo e julgá-lo é o do domicílio fiscal do contribuinte (matriz ou filial), na data da constituição definitiva do crédito na esfera administrativa. 3. Dessa forma, ainda que a decisão de inserir, mediante fraude, o nome de Marco Antônio Barreto da Silva no quadro societário da pessoa jurídica, possa ter partido da matriz, em São Paulo, o fato é que a consumação do crime fiscal, com a redução ou supressão de tributo, ocorreu no lugar onde situada a empresa filial, em São Bernardo do Campo (contrato social à fl. 75), o mesmo em que causado prejuízo ao Fisco, porquanto aí restou definitivamente constituído o crédito tributário, pressuposto imprescindível à consumação do crime fiscal, à luz da Súmula Vinculante 24 do STF. 4. Conflito procedente, para declarar a competência do MMº Juízo Federal da 1ª Vara de São Bernardo do Campo/SP, ora suscitado. (TRF 3ª Região, 1ª Seção, CJ n. 00310908420124030000, Des. Fed. Rel. Luiz Stefanini, j. 07.02.13)

 

PROCESSUAL PENAL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA (...). CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ARTIGO 1º, INCISO I, DA LEI N.º 8.139/1990. CONSUMAÇÃO QUE SE DÁ QUANDO DA CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. DOMICÍLIO FISCAL DO CONTRIBUINTE. (...) 4. Na conformidade do entendimento consolidado na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal desde o julgamento do HC n.º 81.611 - e hoje objeto da Súmula Vinculante n.º 24 - não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo. 5. Tratando-se de crime material contra a ordem tributária, o foro competente para processá-lo e julgá-lo é o do domicílio fiscal do contribuinte na data da constituição definitiva do crédito na esfera administrativa.

(TRF 3ª Região, 1ª Seção, CJ n. 00017823720114030000, Des. Fed. Rel. Nelton dos Santos, j. 17.03.11)

 

CRIMINAL.CONFLITO DE COMPETÊNCIA. INVESTIGAÇÃO DE CRIME DE SONEGAÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA. PEDIDO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL DE QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO DE CONTA CORRENTE EM AGÊNCIA BANCÁRIA SEDIADA EM MUNICÍPIO DIVERSO DO DOMICÍLIO FISCAL DO CONTRIBUINTE. COMPETÊNCIA DO JUÍZO FEDERAL COM JURISDIÇÃO SOBRE O LUGAR DO DOMICÍLIO FISCAL DO CONTRIBUINTE. 1.Se o crime investigado é o de sonegação de imposto de renda pessoa física (IRPF) o lugar da infração é o domicílio fiscal do contribuinte que se confunde, em regra, com o local de sua residência habitual (artigo 127, inciso I, do CTN), pois é aí que ocorre o não pagamento do tributo devido. 2.No caso, o domicílio fiscal é localizado em Santo André (SP), nada importando que a conta cujo sigilo o Ministério Público Federal deseja quebrar esteja em agência bancária sediada noutro município que se localiza em outra Subseção Judiciária desta 3ª Região. 3.Conflito julgado procedente para declarar a competência do Juízo da 2ª Vara Federal de Santo André (SP).

(TRF 3ª Região, 1ª Seção, CC n. 00332191420024030000, Des. Fed. Rel. Johonsom Di Salvo, j. 07.05.03)

 

Do caso dos autos. Em sede preliminar, o apelo de Paulo alega a nulidade de todos os atos decisórios por incompetência do Juízo a quo, considerando que a empresa autuada pela Receita Federal, Alcamp Comercial Ltda., estava sediada, ao tempo dos fatos (2006, “quando as informações tributárias não foram (...) devidamente prestadas”), no município de Campinas (SP).

O pleito não comporta acolhida.

Em que pesem os argumentos apresentados em sede recursal, verifica-se a competência do Juízo da 4ª Vara Criminal Federal de São Paulo (SP) para o julgamento do feito, uma vez que a constituição definitiva do crédito tributário, em 25.03.13 (cf. Ids n. 273641330 e 273641336), ocorreu quando a empresa Alcamp Comercial Ltda. estava sediada na cidade de São Paulo (SP), conforme se verifica da ficha cadastral perante a JUCESP (Id n. 273641368, p. 59/67; e Id n. 273641663).

Nesse sentido, a fundamentação do Juízo de origem:

 

I.II- DA COMPETÊNCIA DO JUÍZO

Igualmente, rejeito a preliminar de incompetência da Justiça Federal de São Paulo para o julgamento do feito.

Isso porque a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça posicionou-se no sentido de que a competência para processar e para julgar os crimes materiais contra a ordem tributária é a do juízo do local onde tiver ocorrido a consumação do delito, vale dizer, do local da constituição definitiva do crédito tributário.

Em que pese à data dos fatos (ano de 2006) a empresa estar sediada na cidade de Campinas/SP, aos 25/03/2013 – data em que o crédito foi constituído (p.1 do ID 118213280) – esta havia transferido sua sede a este Município de São Paulo/SP, justificando a competência desde juízo a teor do seguinte precedente: STJ, AgRg no CC 146.343/RJ, 3ª Seção, Rel. Min. Antônio Saldanha Palheiro, 13/09/2021 (Id n. 273642761).

 

Logo, resta mantida a competência do Juízo a quo para o processamento e julgamento do feito, afastando-se a nulidade alegada.

 

Decretação de nulidade. Exigibilidade de prova do prejuízo sofrido. A nulidade somente será decretada quando resultar prejuízo para a parte, em conformidade com o disposto no art. 563 do Código de Processo Penal:

 

Art. 563. Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa.

 

Do caso dos autos. Ainda no âmbito liminar, as defesas de Joel e Paulo sustentam a nulidade da sentença condenatória em razão do prejuízo causado ao exercício do direito de defesa pela confusão, durante todo o inquérito e processo, entre as empresas Alcamp Alimentos Ltda. e Alcamp Comercial Ltda., que possuem objeto e quadro sociais distintos.

Sem razão.

A defesa de Joel arguiu a nulidade da seguinte forma:

 

DO VÍCIO INSANÁVEL

Os documentos encartados aos autos não se prestam a embasar decreto condenatório.

O recorrente foi sócio de duas empresas: Alcamp Comercial Ltda. e Alcamp Alimentos Ltda.

A denúncia do presente processo fora oferecida em face dos sócios da empresa Alcamp Alimentos Ltda., a requisição do DD. Procurador Geral da República para instauração de IPL, bem como a portaria do I. Delegado da Polícia Federal foram todas em face da empresa Alcamp Alimentos Ltda.

A farta documentação que instrui a denúncia diz respeito a empesa Alcamp Alimentos (duplicatas a receber, caixa geral etc.), no entanto, a r. sentença fora proferida contra os sócios da empresa Alcamp Comercial LTDA.

Isso porque, conforme exaustivamente alegado em sede defensiva, houve uma mescla de documentos e autuações fiscais, confusão de pessoas jurídicas e de documentos fiscalizados pelo Sr. Auditor fiscal entre as empresas Alcamp Comercial e Alcamp Alimentos.

Assim, o inquérito policial tramitou, “de capa a capa”, em face da empresa ALCAMP ALIMENTOS LTDA., tendo todos os seus atos praticados (intimações, ofícios etc.) em face dessa empresa (“ALCAMP ALIMENTOS LTDA.”).

Toda a movimentação financeira, documentação, entrada de valores, recebimento e emissão de duplicatas e faturamento dizem respeito a Alcamp Alimentos. Os livros contábeis analisados e confrontados com o faturamento para se chegar à conclusão de sonegação fiscal também são da Alcamp Alimentos. No entanto, invocando-se todas as vênias necessárias, a r. sentença estendeu o crime fiscal para outra empresa (Alcamp Comercial).

Em síntese, os documentos que embasaram a fiscalização e a fase inquisitória não comprovam a materialidade delitiva.

Não se pode analisar o caixa da empresa “A”, confrontar as declarações de imposto da empresa “A” e chegar-se à conclusão de sonegação fiscal da empresa “B”.

Nesse sentido, fazendo uma analogia inversa com a jurisprudência abaixo transcrita, com base nos Procedimentos Administrativos Fiscais não se pode extrair que o recorrente omitiu crédito tributário:

(...)

Diante do exposto, requer a declaração de nulidade levada a efeito no presente caso, visto que não há como se provar, de maneira segura, cabal e induvidosa, a materialidade delitiva do crime de sonegação fiscal (sic - Id n. 273642849).

 

Por sua vez, a defesa de Paulo sustentou:

 

- Da nulidade por cerceamento de defesa

O Apelante prestou depoimento em sede policial e demonstrou, naquela oportunidade, que não conhecia os fatos por ter se desligado da empresa Alcamp Alimentos Ltda em 2009, antes da ocorrência da fiscalização.

Ocorre que, ao analisar, posteriormente, a atuação, foi verificado a existência de inconsistência no apontamento da empresa autuada.

O Fisco informa que a autuação se deu na empresa Alcamp Alimentos Ltda, e aponta o CNPJ 03.310.865/0001-42.

No entanto, com este número de CNPJ existe outra empresa, denominada Alcamp Comercial Ltda (ID 247132465).

E, Alcamp Comercial não se confunde, de forma alguma, com a Alcamp Alimentos.

Embora tenham o mesmo nome inicial, Alcamp, são duas empresas distintas, com objeto social diferente, e que tiveram destinos diferentes.

A Alcamp Alimentos, CNPJ 53.242.145/0001-65, hoje se denomina MF COMERCIAL DE PRODUTOS ALIMENTICIOS EIRELI (ID 247132477).

E, continua tendo como sócio o Apelante (ID 247132489).

Aliás, esta empresa teve suas atividades iniciadas em 1984, e continua ativa até os dias atuais, tendo o réu à frente do negócio.

Já a Alcamp Comercial, teve início em 1999; e formalmente, o Apelante se desligou da empresa em 2009, embora já não exercesse funções gerenciais nela muito antes dessa data.

E, esta empresa, hoje, teve sua falência decretada e não mais exerce atividades comerciais.

Outro ponto merece destaque: a empresa MF (ex – Alcamp Alimentos) nunca sofreu autuação da Receita Federal!!

Logo, mais este fato corrobora o que o Apelante disse na esfera policial e no seu interrogatório: desconhece por completo o que levou à autuação da Receita Federal, na empresa Alcamp Comercial Ltda!

Mais ainda: seja qual for o motivo dessa autuação, não participou de nenhuma irregularidade.

O Ministério Público, em seus memoriais, expressamente aduz que:

“(...) PAULO EDUARDO MORAES FRAZÃO e JOEL SCOLARI foram denunciados pela prática dos crimes tipificados no art. 1º, I e II da Lei Federal n. 8.137/90, na forma dos art. 29 e 71 do Código Penal, uma vez que durante o ano de 2006, enquanto representantes legais da empresa ALCAMP ALIMENTOS S.A. (CNPJ n. 03.310.865/0001- 42) sonegaram diversos tributos federais, consistentes em Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), Contribuições para o Programa de Integração Social (PIS) e Financiamento da Seguridade Social (COFINS). O crédito tributário foi definitivamente constituído em 22.08.2013 (cf. a f. 197 e 212 do ID 118224033). (...)”

Como dito alhures, o CNPJ 03.310.865/0001- 42 pertence a outra empresa!!!

Ora, como iria o Apelante se defender de uma acusação que menciona uma autuação em nome de uma empresa, e cita o CNPJ de outra??

O Inquérito Policial, por sua vez, em mais de uma oportunidade, trata de Alcamp Alimentos; assim também o faz a denúncia.

Mas, o despacho da MM. Juíza de Piso, que recebeu a denúncia (ID 245713164), trata expressamente de Alcamp Comercial Ltda!!

Ora Excelências, qual a empresa objeto do processo, de onde se originou a suposta sonegação fiscal: Alcamp Alimentos, ou Alcamp Comercial???

Esta confusão perpetrada ao longo da investigação e da instrução criminal, acaba por prejudicar, de forma irreparável, o exercício da ampla defesa e do contraditório, previsto no artigo 5, LV da Constituição Federal.

As empresas são diferentes, tiveram destinos diferentes, composição societárias diferentes.

Logo, confundir as duas, como feito no caso dos autos, não permite que o Apelante tenha plena ciência do que deve ser trazido à tona, em sua defesa.

A diferença entre as empresas traz como consequência lógica a existência de fatos diversos, de situações díspares, que devem ser tratadas como tal.

Logo, misturar as empresas, dentro de um contexto de persecução penal, traz evidente e insuperável prejuízo à defesa.

Este prejuízo, que viola direito garantido pela Constituição Federal, constitui nulidade insanável, que deve ser reconhecida por este D. Tribunal (sic - Id n. 274206543).

 

A matéria já foi objeto de detida apreciação pelo Juízo a quo, nos seguintes termos:

 

I.I– Da nulidade do feito por cerceamento de defesa

Os réus alegam ter havido prejuízo às suas corretas defesas em razão de uma suposta confusão nos autos entre as empresas Alcamp Comercial e Alcamp Alimentos. Afirmam que a representação fiscal para fins penais, a requisição do MPF para instauração de IPL, a Portaria do Delegado de Polícia Federal e a denúncia se referem à empresa ALCAMP ALIMENTOS LTDA, cujo CNPJ seria o de n. 03.310.865/0001-42. Não obstante, tal número de CNPJ se referiria à empresa ALCAMP COMERCIAL LTDA., em face da qual a denúncia teria sido recebida.

Afirmam que se tratam de empresas diferentes, com composição societárias diferentes e destinos diferentes, fato que impossibilitou a defesa, pois as testemunhas de acusação nada sabiam acerca da empresa Alcamp Alimentos.

Ocorre que a preliminar arguida não se sustenta. Conforme é cediço, a Constituição da República estabelece diversas garantias individuais com o fim de proporcionar à defesa, no processo penal, todos os meios possíveis para demonstrar sua versão dos fatos, sobretudo o contraditório, a ampla defesa e a presunção de inocência nos termos do artigo 5º, incisos LV e LVII.

Na espécie, verifica-se clara tentativa das defesas em criar um vício inexistente com o fim de comprometer a idoneidade da ação penal.

Isso porque desde o início das investigações, seja no âmbito da Receita Federal quanto perante a Polícia Federal, se tratou da empresa correta, ou seja, a ALCAMP COMERCIAL LTDA, cujo CNPJ é 03.310.865/0001-42. A exemplo, cito o Auto de Infração de pp. 03/62 do ID 118212941, datado de 27/12/2011; o contrato social juntado ao processo administrativo fiscal nas pp. 01/09 do ID 118212944; os documentos contábeis constantes do referido PAF como os Demonstrativos de Apurações das Contribuições Sociais nas pp. 01/347 do ID 118213204, relativos ao ano de 2006 TODOS da empresa Alcamp COMERCIAL; o Termo de Ciência do Contribuinte sobre a Fiscalização assinado em dezembro de 2009 por Fernanda Scolari (ID 118213209).

Em que pese ter havido alguma menção à empresa Alcamp Alimentos Ltda. em poucas páginas do Inquérito Policial, como a Portaria de instauração de p. 09 do ID 118224032 e até na denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal, SEMPRE, em TODAS as vezes em que se mencionou Alcamp Alimentos, o CNPJ da pessoa jurídica estava correto- n. 03.310.865/0001-42 e havia referência ao processo administrativo fiscal, de n. 10830.726036/2011-69, referente à Alcamp Comercial.

Em nenhum momento da investigação ou do processo se tratou de outra empresa, de outro objeto social ou de outro quadro societário, restando claro ter havido confusão apenas entre os nomes, mas não entre as duas empresas e em nada que tenha envolvido OS FATOS ORA TRATADOS, isto é, a omissão de receitas por parte da empresa Alcamp Comercial nos três primeiros trimestres do ano de 2006.

As mais de mil páginas de documentos fiscais, às quais as defesas tiveram amplo e irrestrito acesso, jamais se referiram à empresa Alcamp Alimentos, mas unicamente à Alcamp Comercial Ltda.

Tal fato é incontroverso e foi em face deste que ambos os réus se defenderam durante esta ação penal.

Assim, não há falar-se em cerceamento em defesa, muito menos em nulidade.

Frise-se que o sistema de nulidades no processo penal brasileiro é regido pelo princípio “pas de nullitè sans grief”, segundo o qual nenhum ato será declarado nulo se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa (STJ, AgRg no AREsp 606.731/SP, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 13/06/2017, DJe 28/06/2017). Em que pese as defesas terem falado inúmeras vezes em prejuízos, não se demonstrou em nenhuma oportunidade qual teria sido o prejuízo causado. Ora, esta magistrada não consegue compreender qual o prejuízo sofrido pela defesa se as testemunhas de acusação nada sabiam acerca da empresa Alcamp, como afirmou a defesa de Joel em seus memoriais.

Por último, insta rememorar que as instâncias administrativas e penal são independentes e autônomas, sendo que o fato de o réu PAULO EDUARDO MORAES FRAZÃO não ter acompanhado a auditoria tributária à época e nem ter sido intimado nos autos do PAD não causam qualquer impacto à ação penal.

Isso porque os documentos acostados aos autos permitem constatar a plena legalidade do procedimento adotado na esfera administrativa, uma vez que a pessoa com poderes para representar a empresa à época foi regularmente intimada, acompanhou a fiscalização e inclusive apresentou defesa, a exemplo do (ID 118213209).

O contraditório, ampla defesa e demais previsões legais foram respeitadas no processo administrativo fiscal, sendo que as defesas sequer o impugnaram judicialmente perante o Juízo cível, nada havendo a macular a desconstituir o crédito tributário, restando incontroversa a omissão de informações à Receita, a qual causou supressão de tributos ao Fisco Federal.

Destarte, rejeitadas as alegações das defesas (Id n. 273642761).

 

A temática foi suficientemente esclarecida pelo Juízo de origem, não subsistindo qualquer vício a justificar a anulação da sentença condenatória.

De fato, a simples menção, por lapso, à empresa Alcamp Alimentos Ltda. não se mostra capaz de impedir o regular exercício da defesa técnica frente aos fatos imputados pela acusação, especificamente atribuídos aos acusados, sócios da Alcamp Comercial Ltda.

Se houve confusão entre os nomes semelhantes das empresas, que integravam, ao menos em alguma medida, um mesmo grupo empresarial, tal constatação não interferiu na correta autuação fiscal – sempre constando como sujeito passivo a empresa Alcamp Comercial Ltda. (cf. Id n. 273640894, p. 3) –, na indicação da empresa de responsabilidade dos acusados ao tempo dos fatos imputados – como se verifica da Representação Fiscal Para Fins Penais e do Termo de Verificação Fiscal, em que consta como contribuinte (Id n. 273640891 e 273640912, respectivamente) –, e mesmo na oitiva das testemunhas, as quais puderam ser inquiridas de forma ampla pelos defensores, que tiveram ciência prévia de todo o processo e poderiam formular as questões que entendessem adequadas, tendo plena consciência, como se depreende das próprias peças defensivas (como, por exemplo, Id n. 274206543, p. 6), de que a sonegação fiscal imputada referia-se tão somente à empresa Alcamp Comercial Ltda.

Não há, ademais, qualquer prejuízo a justificar a anulação da sentença penal condenatória, razão pela qual rejeito a preliminar suscitada pelas defesas técnicas.

 

Por fim, alguns dos pedidos defensivos, formulados a título liminar, implicam o revolvimento do mérito recursal, razão pela qual serão analisados no momento adequado. 

 

Materialidade. A materialidade delitiva encontra-se satisfatoriamente comprovada pelos seguintes elementos:

a) Representação Fiscal para Fins Penais (RFFP) n. 10830.726036/2011-69, indicando como contribuinte autuada a empresa Alcamp Comercial Ltda. (CNPJ n. 03.310.865/0001-42), e noticiando que “a fiscalização constatou que o contribuinte omitiu as receitas auferidas não apenas na escrituração contábil, mas também na DIPJ e, consequentemente, nas Declarações de Débitos e Créditos Tributários Federais – DCTF, pois a declaração de apenas 63% das bases de cálculo levou à apuração de prejuízos nos três primeiros trimestres de 2006, isentando o contribuinte do pagamento do IRPJ neste período” (Id n. 273640891);

b) Auto de Infração indicando o valor do crédito tributário de R$ 3.122.398,70 (três milhões cento e vinte e dois mil trezentos e noventa e oito reais e setenta centavos) referente ao Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica (Id n. 273640894, p. 3/18); Auto de Infração indicando o valor do crédito tributário de R$ 977.920,10 (novecentos e setenta e sete mil novecentos e vinte reais e dez centavos) referente à Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Id n. 273640894, p. 19/34); Auto de Infração indicando o valor do crédito tributário de R$  1.112.180,74 (um milhão cento e doze mil cento e oitenta reais e setenta e quatro centavos) referente à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (Id n. 273640894, p. 35/47); Auto de Infração indicando o valor do crédito tributário de R$ 210.601,17 (duzentos e dez mil seiscentos e um reais e dezessete centavos) referente à Contribuição para o PIS/PASEP (Id n. 273640894, p. 48/63); totalizando R$ 5.423.100,71 (cinco milhões quatrocentos e vinte e três mil e cem reais e setenta e um centavos), não considerados juros e multa (Id n. 273641307, p. 57);

c) Termo de Verificação Fiscal (Id. 273640912);

d) Declaração de Informações Econômico-Fiscais da Pessoa Jurídica (DIPJ), referente à empresa Alcamp Comercial Ltda., do ano-calendário de 2006 (Id n. 273640930);

e) Declarações de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTFs), referentes à empresa Alcamp Comercial Ltda., no ano-calendário de 2006 (Id n. 273640934);

f) Escrituração contábil da empresa Alcamp Comercial Ltda., referente ao ano de 2006 (Id n. 273640967 e ss.); e

g) Informação indicando a constituição definitiva dos aludidos créditos tributários em 25.03.13 (Ids n. 273641330 e 273641336).

 

Sonegação. Lançamento. Consoante estabelecido pela Súmula Vinculante n. 24, é necessário o lançamento definitivo para a configuração do crime contra a ordem tributária:

Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei n. 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo.

 

Lançamento. Validade. Instâncias tributária e penal. Independência. O processo criminal não é a via adequada para a impugnação de eventuais nulidades ocorridas no procedimento administrativo-fiscal:

 

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PENAL. SONEGAÇÃO FISCAL E DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ART. 1º, I, DA LEI 8.137/1990 E ART. 337-A DO CP. MATERIALIDADE. CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA DO CRÉDITO FISCAL. JUSTA CAUSA. ALEGAÇÃO DE VÍCIO NO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO. VIA INADEQUADA. SÚMULA 7/STJ (...).

2. É descabida a discussão sobre a nulidade ou não do procedimento administrativo fiscal em processo criminal. A alegação da existência de vícios no referido procedimento deve ser manejada na esfera adequada para o exercício da pretensão anulatória do crédito tributário, e não no âmbito da Justiça Criminal. Precedentes. Ademais, a aferição da suposta irregularidade do ato de notificação inicial do contribuinte para responder ao procedimento administrativo no qual se constituiu o crédito tributário sonegado dependeria do reexame de matéria fático-probatória, medida que, em recurso especial, enfrenta o óbice da Súmula n. 7/STJ (...).

(STJ, AgRg no AREsp n. 469.137, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 05.12.17)

 

PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ART. 1º, II, DA LEI N. 8.137/1990. ACÓRDÃO RECORRIDO. OMISSÃO. AUSÊNCIA. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO FISCAL (PAF). ILEGALIDADE. VIA INADEQUADA PARA DISCUSSÃO. PRECEDENTE. DENÚNCIA. DESCRIÇÃO SUFICIENTE DO VÍNCULO ENTRE A POSIÇÃO DO AGENTE NA SOCIEDADE EMPRESÁRIA E O CRIME IMPUTADO. ADOÇÃO DOS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA PELO ACÓRDÃO RECORRIDO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTE (...).

2. A jurisdição criminal não é a via adequada para a verificação de nulidades ocorridas no Procedimento Administrativo Fiscal. Precedente (...).

(STJ, AgRg no AREsp n. 1.058.190, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, j. 21.11.17)

 

Além disso, eventuais vícios no procedimento administrativo-fiscal, enquanto não reconhecidos na esfera cível, são irrelevantes para o processo penal em que se apura a ocorrência de crime contra a ordem tributária:

 

CRIMINAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RHC. NULIDADE. PROCEDIMENTO FISCAL. IRRELEVÂNCIA PARA A AÇÃO PENAL (...).

I. Persistem as razões do acórdão embargado, que decidiu com acerto a questão sub judice, levando em conta os fundamentos entendidos como suficientes ao embasamento da decisão, no sentido de que eventuais vícios no procedimento administrativo fiscal são irrelevantes para o processo penal em que se apura a possível ocorrência de crime contra a ordem tributária (...).

(STJ, RHC n. 14.459, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 16.09.04)

 

Do caso dos autos. A defesa de Joel sustenta não haver comprovação da constituição definitiva do crédito tributário em relação à empresa Alcamp Alimentos Ltda., ocasionando a nulidade do feito pelo descumprimento da Súmula Vinculante n. 24 do STF.

O pleito não comporta acolhida.

A apuração tributária, bem como a imputação delitiva objeto destes autos, refere-se à empresa Alcamp Comercial Ltda., não sendo relevante, portanto, eventual ausência de consolidação de débito fiscal em detrimento da empresa Alcamp Alimentos Ltda., alheia à sentença ora recorrida.

Por outro lado, como anteriormente registrado, constata-se que o crédito tributário foi devidamente constituído em relação à empresa Alcamp Comercial Ltda. em 25.03.13, conforme informações prestadas pela Receita Federal do Brasil, atendendo à exigência quanto à materialidade delitiva nos crimes materiais contra a ordem tributária, nos termos da Súmula Vinculante n. 24 do Supremo Tribunal Federal.

Assim, deixa-se de acolher a alegação defensiva.

 

A defesa de Paulo sustenta, por sua vez, a incompreensão do Fisco quanto à atividade desenvolvida pela empresa autuada, especialmente em relação ao faturamento e recebimento dos valores oriundos das vendas de cestas de Natal. Assevera que havia faturamento apenas nos meses de setembro a dezembro, em razão da venda das referidas cestas, com a devida declaração dos valores tributáveis, mas “na imensa maioria das vezes, o pagamento somente ocorria em janeiro e fevereiro do ano seguinte”, o que ocasionava “um verdadeiro descompasso ente o faturamento e o recebimento das mercadorias”, que “parecia, num olhar inicial, que havia ingresso de valores nas contas bancárias da empresa, em janeiro e fevereiro, sem a respectiva venda de mercadorias, ou melhor, sem a respectiva emissão de documentos fiscais que embasassem esse recebimento de valores”. Aduz, por fim, que a autoridade fiscal não compreendeu a dinâmica de funcionamento da empresa, não sendo propiciada a realização de defesa no âmbito administrativo. Dessa forma, não haveria prova suficiente da materialidade delitiva, impondo-se a absolvição nos termos do art. 386, VII, do Código de Processo Penal.

Sem razão.

A ação penal não é o âmbito adequado para a rediscussão da autuação fiscal promovida pela Receita Federal. O apelante teve a oportunidade de apresentar defesa administrativa, após a notificação da autuação (cf. Id n. 273640900, p. 1), podendo, outrossim, apresentar pleito específico no Juízo Cível.

Não se constatando qualquer ilegalidade de plano – apenas a alegação de uma incorreta compreensão do Fisco sobre a atividade econômica da empresa Alcamp Comercial Ltda. e as receitas dela decorrentes –, não se justifica o questionamento apresentado, mantendo-se hígido o crédito constituído em detrimento da referida empresa e, por consequência, a materialidade do delito de sonegação fiscal, tal como imputado pela acusação.

Os demais aspectos da materialidade não foram objeto de insurgência recursal, estando devidamente comprovados, razão pela qual se passa à análise da autoria delitiva.

 

Autoria. Por sua vez, a autoria delitiva está escorada nos seguintes elementos de convicção.

De acordo com as informações constantes de ficha cadastral da empresa Alcamp Comercial Ltda. na Junta Comercial do estado de São Paulo (JUCESP) (Id n. 273641368, p. 59/67; e Id n. 273641663), os réus Paulo Eduardo Moraes Frazão (que se retirou apenas em 2009) e Joel Scolari eram sócios administradores e responsáveis pela sociedade na época dos fatos.

Ouvido em sede policial, Luciano Limoli Júnior afirmou:

 

QUE foi contador da empresa ALCAMP ALIMENTOS LTDA durante o ano de 1988 até dezembro de 2002, retornando a prestar serviço para referida empresa no segundo semestre de 2006 até dezembro do ano de 2009; QUE prestava serviço à referida empresa de forma autônoma, por meio do seu escritório de contabilidade PRODACON CONTÁVIL SS LTDA, sediada na Av. Marechal Rondon, Nº 1268, Jardim Chapadão, nesta cidade; QUE no primeiro trimestre de 2006, período de apuração da Receita Federal, não prestava serviço para a empresa ALCAMP ALIMENTOS LTDA.; QUE neste período, quem prestava serviço para a referida empresa era o escritório de contabilidade VARALLO, sediado na cidade de São Paulo/SP; QUE no primeiro trimestre de 2006, os sócios da empresa eram JOEL SCOLARI e PAULO FRAZÃO, sendo que estes sempre foram os sócios gerentes da empresa ALCAMP ALIMENTOS LTDA; QUE JOEL SCOLARI e PAULO FRAZÃO sempre administraram a mencionada empresa; QUE indagado se prestou informações falsas à Receita Federal, omitindo receita da empresa na escrituração contábil e da DIPJ, no primeiro trimestre de 2006, o declarante assevera que não, uma vez que não era o contador da empresa e portanto não foi responsável por prestar tais informações à RFB; QUE em ressalta que em certa ocasião, uma Auditora Fiscal da Receita Federal de São Paulo/SP lhe telefonou querendo saber o motivo da interposição de várias declarações retificadoras propostas no ano de 2006 pela empresa no seu nome (a empresa teria usado o seu CPF), retificando DIPJ dos anos calendários de 2000 e 2001; QUE naquela oportunidade, informou que não tinha feito nenhuma declaração retificadora; QUE depois descobriu que o escritório de contabilidade VARALLO tinha retificado as DIPJ feitas pelo declarante dos anos de 2000 e 2001, reduzindo drasticamente a receita auferida pela empresa, no intuito de reduzir o valor do tributo, conforme demonstra a cópia da tabela que apresenta neste ato; QUE não teve nenhuma participação nisso, bem como não prestou nenhuma informação falsa à RFB referente a receita da empresa no primeiro trimestre de 2006; QUE possivelmente, foi adotada a mesma conduta anteriormente relatada aqui (redução de receita), com a ciência dos administradores; QUE nunca foi preso ou processado (sic – Id n. 273641375, p. 101)

 

Igualmente ouvida em âmbito policial, Fernanda Dimarzio Scolari Oliveira informou:

 

QUE indagada se era responsável pela administração da empresa ALCAMP COMERCIAL LIMITADA, a declarante assevera que figurou apenas como sócia de direito da referida sociedade no período de 2009 até a presente data, não possuindo qualquer poder de ingerência sobre a mesma; QUE seu pai (JOEL SCOLARI) pediu a declarante para figurar no quadro societário da empresa apenas para compor a sociedade limitada; QUE trabalhou apenas como assistente administrativa no escritório da empresa fazendo “cobranças, contas a receber, contas a pagar” no período de 2006 a 2012, quando a empresa foi fechada; QUE a empresa está inativa, ressaltando que foi declarada a sua falência no ano de 2017 pela Justiça Estadual; QUE os responsáveis pela administração da empresa ALCAMP COMERCIAL LIMITADA eram PAULO EDUARDO MORAES FRAZÃO (que cuidava da parte administrativa) e JOEL SCOLARI (que cuidava da parte comercial), salientando que PAULO saiu da empresa em setembro de 2009 e seu pai passou a “assumir tudo”; QUE indagada se a empresa omitiu receitas auferidas em sua escrituração contábil, na DIPJ e nas DCTFs, referente a competência do 1º trimestre de 2006, eis que teria informado uma receita de venda no valor de R$ 5.480.604,46 quando no mesmo período foram emitidas duplicatas a receber no valor de R$ 13.043.761,84, a declarante assevera que a empresa não omitiu receitas; QUE esclarece que a contabilidade da empresa estava “muito ruim” e tal discrepância pode ter ocorrido em virtude da época natalina (setembro, outubro e novembro), pois a empresa faturava muito com vendas de cestas de natal mas somente recebia os valores em janeiro ou fevereiro; QUE nesta época, a empresa enfrentou sérios problemas financeiros, pois seu pai perdeu muito dinheiro ao tentar abrir uma filial da empresa na África do Sul no ano de 2005; QUE acha que não foi cometido nenhum crime fiscal; QUE  a responsabilidade por informar  tais valores recebidos pela empresa à Receita Federal era do escritório de contabilidade contratado (PRODACON), uma vez que passavam todos os documentos da empresa a eles (notas fiscais, faturas); QUE no final do ano de 2009, contrataram um contador (JOSE EDCLER) para trabalhar internamente na empresa e tentar arrumar a contabilidade da empresa; QUE nunca o escritório de contabilidade VARALLO, sediado na cidade de São Paulo/SP prestou serviços à empresa (sic – Id n. 273641418, p. 33/35)

 

O réu Paulo Eduardo de Moraes Frazão foi interrogado pela Autoridade Policial, oportunidade em que afirmou:

 

QUE foi sócio proprietário da empresa ALCAMP COMERCIAL LTDA (CNPJ 0.310.865/0001-42), junto com o seu sócio JOEL SCOLARI, desde a fundação ocorrida em 1999 até o ano de 2009; QUE saiu da sociedade no ano de 2009, conforme se vê na ficha cadastral da empresa de fls. 29; QUE nesta época, quem administrava a empresa era o declarante e seu outro sócio chamado JOEL SCOLARI; QUE o nome da empresa é ALCAMP COMERCIAL LTDA e não ALCAMP ALIMENTOS LTDA; QUE indagado se lembra da autuação da Receita Federal, o declarante assevera que somente tomou conhecimento da autuação quando foi intimado a comparecer nesta delegacia para prestar esclarecimentos, ocasião em que seu advogado teve vista dos autos anteriormente; QUE não foi intimado pela Receita Federal para se defender do lançamento do auto de infração; QUE o declarante assevera que o auto de infração lavrado pela Receita Federal ocorreu em 2011, quando o mesmo já não figurava no quadro societário da da empresa, embora os fatos apurados sejam do ano de 2006; QUE não acompanhou a fiscalização da Receita Federal, pois já não estava na empresa; QUE afirma que não sonegou tributos federais mediante omissão de receitas auferidas em sua escrituração contábil, da DIPJ e na DCTF, durante o ano de 2006; QUE quem fazia a escrituração contábil e preenchia as DIPJ e DCTF da empresa era um contador terceirizado (empresa de contabilidade PRODACON, pertencente a LUCIANO LIMOLI JUNIOR) QUE a funcionária FERNANDA da empresa PRODACON era responsável pela parte contábil de sua empresa; QUE indagado se tinha conhecimento da escrituração contábil da sua empresa e das DIPJ e DCTF preenchidas pelo contador, o declarante assevera que assinava os balancetes da empresa entregues pelo contador, mas não tinha muito conhecimento sobre contabilidade; QUE indagado como explica a exorbitante diferença de receita auferida pela sua empresa (receita declarada ao fisco e a receita efetivamente recebida), o declarante explica que o faturamento maior de sua empresa era concentrado no final do ano, entre outubro a dezembro, em razão da venda de cesta de natal, e a receita só entrava no primeiro trimestre no ano subsequente; QUE talvez, por isso, tenha dado a diferença observada pela Receita Federal; QUE não sabe dizer onde JOEL SCOLAR, pois perdeu contato com ele; QUE não pagou o débito fiscal, até mesmo porque o desconhecia; QUE acha que somente possui a última alteração contratual, não possuindo o contrato social vigente de 2006; QUE ULISSES PALOMO PIERONI era funcionário da empresa e como trabalhava no setor financeiro tinha procuração para atuar na parte financeira (p. ex. fazer pagamentos), sendo que ele não tinha nenhuma atuação contábil; QUE não possui nenhuma procuração outorgando poderes a ULISSES PALOMO PIERONI; QUE nuca foi preso ou processado (sic – Id n. 273641375, p. 67/69).

 

Em audiência, foram ouvidas as testemunhas Luciano Limoli Junior, Paulo Roberto da Conceição, José Edcler da Silva Brito e Adenilson Honório Soares, bem como a informante Fernanda Dimarzio Scolari Oliveira.

Luciano Limoli Júnior informou ao Juízo a quo ser empresário e contador e que conhece os acusados, sendo que prestou serviço militar com o réu Paulo, quando tinham 18 ou 19 anos, onde começaram uma amizade e depois foi contratado por ele, quando se tornou empresário, enquanto Joel conheceu apenas na audiência. Afirmou que não teve mais contato com o réu Paulo desde que a empresa Alcamp faliu. Questionado pelo MPF, disse que foi contador da empresa Alcamp Alimentos Ltda., mas não se recorda exatamente quando, acredita que até o ano de 2006 ou 2007; que prestava serviços de forma autônoma ou terceirizada, em seu escritório, PRODACAMP; acredita que no primeiro trimestre de 2006 prestava serviços à empresa, porém precisaria confirmar. Indagado, afirmou que os sócios ainda eram os réus Joel e Paulo, que sempre foram os sócios gerentes; que nunca prestou informações falsas ou omitiu receitas à Receita Federal; que quando eles contrataram um escritório com contador e advogados em São Paulo (SP) – que desconhece os nomes –, eles tentaram retificar os últimos 5 (cinco) anos da DIPJ que a testemunha tinha feito, derrubando o faturamento; que uma Auditora Fiscal da RFB o procurou perguntando se a testemunha tinha feito a retificadora, ao que respondeu negativamente, muito menos com aquela significativa discrepância que tinha sido colocada na DIPJ. Perguntado, respondeu que não se recorda exatamente do nome do escritório, mas “parece” que é o Varallo, nome mencionado pelo Procurador da República; que eles fizeram no nome da testemunha (outro Id, mas no seu nome e CPF), mas a Auditora Fiscal, ao que se recorda, não aceitou; que o réu Paulo nunca lhe pediu para sonegar tributos, que sempre lhe orientou que tudo que era comercializado tinha que ser tributado, mas que havia muitas falhas de comunicação e documentação à época. Esclareceu que era uma empresa de médio porte e que os documentos chegavam por meio de malote, existindo muitos problemas de falta e extravio de documentação, pois o pessoal que trabalhava lá era pouco qualificado. Questionado, disse que foi contratado pela Alcamp Alimentos e que a Alcamp Comercial surgiu posteriormente, possuindo CNPJs diferentes; que acredita que essa autuação envolveu a Alcamp Alimentos; que a documentação fiscal e contábil das empresas também é diversa; que foi apenas uma vez ao escritório Varallo com o réu Paulo para saber das retificadoras, mas não se recorda dos nomes das pessoas com quem conversou, não tendo registrado Boletim de Ocorrência, em razão da Auditora Fiscal não ter acatado a retificadora. Por fim, questionado especificamente sobre os problemas de documentação, esclareceu que havia extravio, não entrega, entrega fora de data, obrigando-os a retificar ou refazer o balanço, sem a certeza de que “estavam espalhando a realidade ou não”; que “a Alcamp sofria de um mal muito grande, ela nunca teve uma plataforma de gestão, nunca teve assessoria externa de gestão de negócio, então todo mundo era sobrecarregado e não tinha controle de todas as atividades, sendo carente de capital próprio, sempre buscava capital de terceiros, o que comprometia a sua margem de lucros”; que “a venda era feita, já era tributada na venda, e o recebimento era um controle à parte de clientes a receber, mas se tributava exatamente no mês da emissão, da competência” (Ids n. 273642264 e 273642273)

Fernanda Dimarzio Scolari Oliveira afirmou ser filha do réu Joel e por isso foi ouvida como informante. Questionada, informou que os acusados Paulo e Joel eram os únicos sócios; que ingressou no contrato social da empresa Alcamp, em 2009, quando o réu Paulo saiu, para compor a sociedade limitada; que tinha dezenove anos na época, não tendo poder de decisão e administração na empresa; que, no entanto, trabalhava na sociedade desde 2006, tendo entrado com 16 anos no departamento financeiro, para ajudar na parte de cobrança e contas a pagar, como assistente; que ficou até a empresa fechar em 2012, quando faliu. Perguntada, disse que a empresa não omitiu receitas; que passou por uma situação de dificuldades financeiras, que começou com o sequestro da depoente em 2001, quando recursos foram retirados da empresa para pagar o resgate; que, em 2005, houve a questão da tentativa de abertura de uma filial na África do Sul e a empresa não conseguia mais pagar fornecedores; que seu pai entrou em depressão e chegou um momento em que “não tinha mais o que fazer”, a empresa, por conta dessas dificuldades financeiras, não conseguia pagar fornecedores ou contadores; que a contabilidade era feita inicialmente pela Prodacon, depois por um contador interno, o Edcler; que sabe que não houve nenhuma omissão de receita, que “era uma questão de dificuldade mesmo, que a empresa estava passando por um momento muito difícil”. Reiterou que seu pai teve depressão profunda e não conseguia mais sair da cama para ir trabalhar, então decidiram fechar empresa. Esclareceu que a empresa faturava muito em épocas natalinas (outubro, novembro e dezembro), era o maior faturamento do ano; que ocorria uma questão de ter que explicar para o Fisco que os clientes pagariam em janeiro (pois eram grandes clientes, grandes redes); havia um “desencaixe contábil, porque tinha muito faturamento, aí no começo do ano, não tinha tanto faturamento, mas tinha todos os recebimentos de outubro, novembro e dezembro, o que acabava entrando muito recurso na conta, mas não tinha uma quantidade de notas ficais condizente, mas por conta de que essas notas tinham sido emitidas em outubro, novembro ou dezembro”. Perguntada, respondeu que entrou na sociedade com a saída do réu Paulo, em 2009, não tendo trabalhado mais na empresa; não se recorda se a fiscalização se deu após a saída do aludido acusado; que quem fazia a contabilidade era a Prodacon, externa à empresa, depois contrataram o Edcler, contador interno da empresa, para tentar organizar a parte contábil, mas que não conseguiu, pois já havia uma situação se “arrastando” desde antes; a Alcamp Alimentos e a Alcamp Comercial eram empresas distintas, com contabilidades distintas; que a Alcamp Comercial teve duas filiais e se encerrou com a falência; a Alcamp Alimentos ficou com o réu Paulo quando ele saiu da Alcamp Comercial; que o acusado Joel saiu e cada um ficou com um CNPJ; que foram contratados muitos empréstimos para tentar sanar as dificuldades; que perderam todos os bens que possuíam, porque a empresa manteve os bens em seu próprio nome; que nunca foi a intenção que a empresa fechasse; que pegavam o pedido de cliente para pagar um fornecedor, sempre tentando salvar a empresa; que, em 2011 ou 2012, a empresa tinha 4 (quatro) milhões de endividamento bancário; que a depoente já respondeu processos trabalhistas e cíveis, tendo sido despejados; que a situação da empresa estava ruim desde 2006. Afirmou, por derradeiro, que não possui informações sobre a contratação de um outro escritório em 2006 (Ids n. 273642276 e 273642308).

Paulo Roberto da Conceição, comerciante, questionado perante o Juízo a quo, afirmou conhecer os réus Paulo e Joel porque trabalhou por doze anos na empresa Alcamp, em que era gerente de operações da unidade de beneficiamento de grãos; cuidava da compra e venda de produtos; que não existia orientação para não emissão de notas, sonegação de documentos; que o procedimento se dava da seguinte forma: o caminhão vinha do Sul, passava na balança da empresa e entrava “100% com nota”, depois havia o descarregamento e beneficiamento e, por fim, o produto saía da empresa com nota. Informou que em sua unidade, de Elias Fausto, havia 35 funcionários; que existiam departamentos separados; que na sua unidade recebiam as notas ou outros documentos que eram enviados diariamente, por malote, para a central em Campinas (SP), sendo esse o procedimento da empresa; que era um procedimento automático e que os documentos eram recebidos pelo contador. Indagado, respondeu que era gerente da filial na cidade de Elias Fausto, não sabendo informar sobre outras filiais, mas a sede era em Campinas, não se recordando de filial em São Paulo (SP); que as empresas Alcamp Alimentos e Alcamp Comercial possuíam diferentes CNPJs, com documentação contábil própria; que atuava em uma unidade da Alcamp Comercial; que não tinha muita autuação fiscal na empresa, não se recordando da realizada em 2006; que, na sua opinião, o que levou a Alcamp Comercial à falência foi a má-gestão; que os sócios tentaram salvar a empresa. Por fim, questionado, disse que não acompanhou a fiscalização da Receita objeto destes autos; que toda semana conversava com os réus sobre o que estava acontecendo na empresa; que o faturamento da empresa, ao menos na unidade dele da Alcamp Comercial, em que as mercadorias eram arroz e feijão, era basicamente igual nos doze meses do ano, com faturamento semelhante todo mês (Id n. 273642334).

A testemunha José Edcler da Silva Brito disse conhecer os réus Paulo e Joel em razão de ter trabalho na empresa Alcamp Comercial do início de 2010 a maio de 2012. Esclareceu que foi contratado para tentar ajudar nos controles internos da empresa, desde os pequenos registros até a escrituração digital; que evidentemente havia pontos que poderiam ter sido melhorados na escrituração como um todo, isso se referindo ao contador terceirizado que o antecedeu; que teve grandes dificuldades com a contabilidade, sobretudo com “questões de sistema, questão de documentação, questão de ajuste de processos internos”; que a Alcamp Comercial, na sua época, tinha duas atividades, o faturamento de cestas básicas e a de cestas de Natal; que as cestas básicas ocorriam o ano inteiro e as de Natal, no final de ano, só que o recebimento não ocorria no próprio mês; que cada empresa tinha um prazo de pagamento negociado com a área comercial; que o faturamento e o recebimento efetivo eram descasados; que atendeu à fiscalização da Receita Federal. Afirmou que, “olhando o número friamente” a Receita Federal tinha dificuldade em entender o funcionamento da empresa; que conhece a Alcamp Alimentos, mas ela “não tem a ver” com a Alcamp Comercial, sendo que elas possuíam documentações fiscais distintas; que nunca ouviu falar de um escritório de contabilidade chamado Varallo. Indagado, disse que, pelo que sabe, os sócios passaram por um momento extremamente difícil, pois a empresa tinha um endividamento financeiro muito elevado, o que impactou nas suas operações, mas eles tentaram manter a empresa Alcamp Comercial funcionando; que a empresa ficou devendo para ele, mas não ajuizou processo trabalhista (Id n. 273642345).

Adenilson Honório Soares asseverou que era contador da Alcamp entre os anos de 2010 e 2012, quando ela se encerrou, e declarou ter sido contratado para apoiar o contador, porque a empresa era de lucro real, em razão do volume de faturamento; que foi contratado para fazer uma avaliação contábil externa, ajudando nas declarações a serem realizadas perante a Receita Federal, bem como para consultoria financeira; que a empresa vinha passando por muitas dificuldades e a “descontinuidade” era previsível, porque a empresa tinha indicadores financeiros ruins, com endividamento alto e perspectiva de insolvência; que, na sua opinião, a contabilidade que existia até sua contratação era “imprestável”, tendo que refazer a contabilidade por meio da apuração de saldo (balanço de abertura, um novo balanço para dar continuidade com números reais). Segundo o depoente, até hoje o Fisco tem dificuldade em entender o faturamento das cestas de Natal, pois a Receita Federal não possui um CNAE específico para essas cestas; de modo que essas empresas tem um faturamento muito alto entre setembro e dezembro, só que os pagamentos só ocorrem no ano seguinte, existindo o faturamento em um ano e o recebimento no outro, de modo que o Fisco entende que o recebimento realizado no ano posterior é sonegação, porque o fluxo financeiro é muito alto;  que o correto seria fazer venda por consignação, mas os clientes grandes (do atacado e do varejo) não aceitam isso; que, em suma, a venda é feita em setembro e o recebimento só ocorre em janeiro/fevereiro do ano seguinte; que a ausência desse CNAE gera inclusive bastante fiscalização neste setor; que uma outra empresa, denominada Consulcamp, foi quem atendeu à fiscalização, mas não conseguiram localizar o relatório, por fazer muito tempo; que desconhece o escritório Varallo. Indagado, disse que pode dizer que os sócios empreenderam todos os esforços para tentar salvar a empresa, mas o endividamento era muito alto; que a empresa sofreu diversas autuações ficais e reclamações trabalhistas; que todo o patrimônio dos sócios pertencia à empresa e eles perderam tudo, inclusive os bens pessoais, não se cogitando de nenhuma forma de blindagem patrimonial; que conheceu apenas a Alcamp Comercial, não sabendo informar com precisão sobre a existência de filiais; que não acompanhou a fiscalização referente a este processo criminal; que a empresa escriturava e pagava os tributos no momento da venda, mas os grandes varejistas não aceitavam o faturamento antes deles venderem o produto, de forma que, na verdade, era uma venda em consignação; que a empresa fazia a escrituração normal, sendo que o depoente nunca verificou qualquer indício de sonegação de tributos pela empresa; que se, por exemplo, de setembro a dezembro, a empresa emitir dez milhões de notas, os valores são recebidos entre janeiro e março do ano seguinte, mas não haverá emissão de nota fiscal, ou seja, haverá recebimento de valores sem emissão de nota fiscal; que o correto seria ter uma classificação específica para empresas de venda de cestas de Natal, como o que existe para advocacia, por exemplo  (Ids n. 273642355 e 273642365).

Interrogado em Juízo, o réu Paulo Eduardo Moraes Frazão afirmou que possui ensino superior incompleto e, atualmente, é aposentado e síndico de seu prédio, auferindo rendimentos mensais de cerca de três mil e setecentos reais. Sobre os fatos, disse que a acusação não é verdadeira; que sempre houve uma confusão entre as empresas Alcamp Comercial e a Alcamp Alimentos; que na época da fiscalização já não estava na empresa, embora estivesse no período de 2006; que foi um dos fundadores da empresa e no ano de 2006 ainda estava nela. Esclareceu que a empresa tinha um passivo tributário muito alto de impostos declarados e não pagos, porque em 2005 perderam muito dinheiro em um investimento mal calculado na África do Sul, e a empresa foi se endividando, tomando dinheiro nos bancos; que havia um bom potencial de vendas, pois mesmo com a saída do interrogando, a empresa continuou até 2012; que não houve a iniciativa de fazer sonegação, pois já havia um passivo tributário alto; que em conversa com outros advogados, foi instruído que deveria declarar e se não puder pagar é um outro problema; que tinha que escolher o que pagar, sob o risco de paralisar as atividades da empresa, que tinha um porte grande; que, como gestor da empresa, escolheu o que deveria ou não ser pago, mas em nenhum momento da história da empresa houve qualquer sinalização ou orientação no sentido de sonegar, esconder um faturamento, sendo que todos os faturamentos estavam declarados e constavam da contabilidade.  Indagado, respondeu que não estava na empresa na época da fiscalização, não sabendo informar sobre a documentação levantada na oportunidade; que reitera que todo faturamento era acompanhado de nota fiscal; que desconhece esse fato de que só 63% das vendas de 2006 foram pagas; que, em 2006, a empresa tinha mais ou menos 300 funcionários, contando os trabalhadores sazonais, com um faturamento menor no início do ano e no final aumentava. Explicou que a confusão entre as duas empresas foi feita pela Receita Federal, pois o Auditor Fiscal pegou a razão social de uma empresa e o CNPJ da outra; que a Alcamp Alimentos foi fundada em 1984 e a Alcamp Comercial em 1999/2000, com objetos sociais distintos; que, em 2006, as operações eram realizadas pela Comercial, a Alimentos nunca foi encerrada e tinha uma atividade comercial, atuando como um atacadista, a Comercial que produzia e montava as cesta de Natal; que saiu da empresa por vários motivos, houve um desgaste natural após o investimento na África do Sul; que o corréu Joel queria seguir com a empresa, o interrogando “não estava mais aguentando” e saiu, inclusive por questões familiares; que a Alcamp Alimentos continua no nome dele e que tentou algumas atividades até se aposentar.  Sobre o que ocorreu na África do Sul, disse que criaram uma nova empresa lá, com sócios sul-africanos, em 2005, “a coisa tomou uma dimensão que fugiu do controle” e “tudo deu errado”; que perderam 100% do investimento, que era de quase três milhões de dólares, prejuízo sentido em 2006, 2007 etc.; que foram vendendo bens, tentaram “não quebrar a empresa”; que deixar de declarar os tributos nunca foi uma opção; que a fiscalização ocorreu em 2011, mas só ficou sabendo quando foi na Polícia Federal, pois já tinha saído da empresa. Sobre as declarações das testemunhas de que a contabilidade da empresa era falha ou malfeita, não sabe o que responder; que a contabilidade não era tratada diretamente com o Luciano, mas entre funcionários; que o que vinha para o réu eram as DARFs ou documentos já contabilizados; que tentou se cercar de profissionais que dessem suporte para a empresa. Perguntado, respondeu que não houve retificação de contabilidade em 2006; que tiveram em uma filial em São Paulo (SP), então pode ter ido com o Luciano na cidade, mas não se recorda; que desconhece o escritório Varallo; que nunca contratou escritório para tentar diminuir a carga tributária; que os outros processos que responde são da Alcamp Comercial e dizem respeito ao faturamento e sua divergência com o recebimento. Questionado, confirmou que ele e sua defesa tiveram acesso a todo o processo administrativo referente à fiscalização; que concorda em parte que tenha havido má gestão da empresa, pois a empresa cresceu muito e escapou um pouco ao controle, mas em nenhum momento teve intenção de sonegar (Ids n. 273642427, 273642449 e 273642471).

O acusado Joel Scolari, também ouvido em sede judicial, afirmou que atua como consultor, tendo como renda mensal o valor aproximado de cinco ou seis mil reais e que não entende de contabilidade, cuidando da área comercial. Aduziu serem falsas as acusações formuladas pelo Ministério Público Federal; que a empresa começou em 1984 e até 2000 nunca tiveram nenhum problema; que, em 2001, houve um sequestro na sua família e isso trouxe um prejuízo imenso à empresa, porque precisou retirar recursos dela para pagar o resgate, bem como teve de montar outro escritório, separado do depósito, e a partir daí “as coisas começaram a não dar mais certo”; que, em 2004, foram procurados pelo governo da África do Sul e convidados a montar uma empresa naquele país; que o problema era que não tinham condições de serem os investidores, apenas poderia levar o seu know-how; que se adiantaram e mandaram 100 contêineres para a África do Sul e a mercadoria ficou parada 11 meses no porto e, quando foi liberada, a dívida portuária era equivalente à mercadoria que estava no local, entre 18 e 20 milhões de reais em valores atuais; que perderam esse dinheiro, ficando devendo para todos os fornecedores no Brasil, que restaram posteriormente pagos. Esclareceu que o montante da alegada sonegação seria “impossível”, porque os seus clientes eram grandes empresas, como Assai, Atacadão, Bosh e Ambev, que não comprariam sem nota fiscal, assim como os fornecedores não venderiam sem nota; que o grande problema foi a confusão do fiscal entre as empresas, indicada pelo Adenilson, juntando duas empresas, com o nome de uma e o CNPJ de outra; que não houve sonegação alguma; que eles compravam consignado, de modo que se o Natal não fosse bom, a mercadoria retornava para a empresa; que eles fariam a nota fiscal e a mercadoria retornaria para a empresa, inclusive com o risco de perder produtos pela expiração da data de validade, por exemplo; que algumas mercadorias não retornavam, pois o frete sairia mais caro que o produto, então a compradora emitia nota fiscal e a empresa do interrogando passava a constar com um estoque aparentemente imenso, mas não tinham a mercadoria. Perguntado, respondeu que a empresa vendia em setembro a dezembro os produtos de Natal e o pagamento era apenas em janeiro e fevereiro; que vendia toda essa mercadoria e não recebia nada até o mês seguinte; que como cuidou da Alcamp na área comercial, por todos esses anos, pode responder sobre tudo que acontecia; que tinha vinte representantes no Brasil inteiro; que a empresa era gigante e eles se “perderam na contabilidade”; que o investimento na África do Sul gerou uma dívida enorme, que eles foram conseguindo quitar com o lucro das cestas de Natal, mas não foi suficiente. Relatou que a Alcamp Comercial foi criada porque em um dado momento a Alcamp Alimentos não podia mais tirar a CND, atendendo a Prefeituras que exigissem o documento; que a operação era feita nas duas empresas, mas foram transferindo tudo para a Comercial, que era posterior; que “a dívida era da empresa geral, as duas empresas ficaram misturadas”; que não houve sonegação porque trabalharam sempre dentro das regras; que “não é bom na área contábil”, mas sempre procurou “fazer um bom comercial” e foram crescendo, o que não foi acompanhado pelo suporte fiscal; que não se beneficiou de nada, tendo de liquidar bens próprios para pagar as dívidas da empresa. Indagado, respondeu que a empresa declarava tudo; que solicitou ao seu advogado na época que falasse com a Receita Federal, que explicasse a situação, mas o Fisco não aceitou; que não fez nada intencionalmente, apenas houve um erro estratégico na África do Sul que resultou na dependência de valores emprestados de instituições financeiras; que não houve essa declaração de apenas 63% das vendas no ano de 2006, mas apenas uma confusão fiscal; que não acompanhou a fiscalização em 2011, pois estava sozinho na empresa e Edcler tinha sido contratado para cuidar da contabilidade; que em 2011 já estava entrando em depressão, momento em que “abandonou a empresa”; que acabou trazendo problemas econômicos inclusive para sua família. Reiterou que houve uma “confusão fiscal”, embora não saiba dizer exatamente o que aconteceu. Questionado sobre o motivo pelo qual não provou a “confusão” para a fiscalização, informou que ficou devendo para o advogado João Figueiredo, cerca de 45 mil reais, e ele se recusou a continuar defendendo o réu, abandonando o caso; que não possuía condições financeiras ou psicológicas de se defender em 2011; que ficou um pouco “perdido” após a saída do corréu Paulo, que cuidava mais dessa parte, não sabendo responder o motivo para isso ter acontecido; que contratou uma empresa de Campinas para tentar salvar a empresa, mas quando apresentaram o relatório não era mais possível; que toda a documentação da empresa, hoje, estava na carroceria de um caminhão-baú, estacionado no terreno emprestado do irmão de um amigo em Sumaré e saquearam as peças de todos os caminhões, deixando espalhada a documentação referida, que foi recolhida pelo interrogando e está em um “quartinho emprestado”; que não encontrou sequer as guias que recolheu para sua aposentadoria; que não sabe em que condições estão os documentos ainda existentes. Afirmou desconhecer a existência de declarações retificadoras em 2006 e que nunca ouviu falar da Varallo contabilidade, acreditando que pode ter sido prejudicado pela ação de empresas concorrentes (Id n. 273642569, 273642666, 273642684 e 273642709).

 

Sonegação fiscal. Dolo genérico. Para a consumação do crime de sonegação fiscal, é suficiente a constatação do dolo genérico (STJ, AgRg nos EDcl no AREsp n. 1827173/DF, Rel. Min. Antônio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, j. 05.10.21).

 

Dificuldades financeiras. Improcedência. A mera existência de dificuldades financeiras, as quais, por vezes, perpassam todo o corpo social, não configura ipso facto causa supralegal de exclusão de culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa quanto ao delito de não-repasse de contribuições previdenciárias. O acusado tem o ônus de provar que, concretamente, não havia alternativa ao não-repasse das contribuições:

 

“PENAL. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA DESCONTADA DOS SALÁRIOS DOS EMPREGADOS. OMISSÃO DOS RECOLHIMENTOS. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. (...). IMPOSSIBILIDADE FINANCEIRA NÃO COMPROVADA. APELAÇÃO PROVIDA.

(...)

4. A ocorrência de meras dificuldades financeiras não escusa a apropriação indébita de contribuições previdenciárias; para configurar-se o estado de necessidade ou a inexigibilidade de conduta diversa, é mister a efetiva comprovação, pela defesa, da absoluta impossibilidade de efetuarem-se os recolhimentos nas épocas próprias.

5. Apelação provida.”

(TRF da 3ª Região, ACr n. 98030965085, Rel. Des. Fed. Nelton dos Santos, j. 14.09.04)

 

“APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA – (...) - INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA RECHAÇADA (...).

(...)

3. Alegações genéricas de dificuldades financeiras não são capazes de acoimar o tipo penal contido na denúncia.

(...)

5. Negado provimento à apelação.

(TRF da 3ª Região, ACr n. 200203990354034, Rel. Des. Fed. Luiz Stefanini, j. 26.06.07)

 

“PENAL. APROPRIAÇÃO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS.(...) DIFICULDADES FINANCEIRAS DO AGENTE.(...).

(...)

3. A mera existência de dificuldades financeiras, as quais, por vezes, perpassam todo o corpo social, não configura ipso facto causa supralegal de exclusão de culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa quanto ao delito de não-repasse de contribuições previdenciárias. O acusado tem o ônus de provar que, concretamente, não havia alternativa ao não-repasse das contribuições.

(...)

6. Recurso da defesa parcialmente provido.”

(TRF da 3ª Região, ACr n. 20056118007918, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 15.09.08)

 

Anote-se que a concordata favorece a empresa devedora quanto ao pagamento de seus credores, os quais, porém, não fazem jus a receber seus créditos mediante o desvio de recursos destinados à Previdência Social. Nesse sentido, a isolada circunstância de a empresa ter-se beneficiado com a concordata não oblitera a caracterização do delito:

 

“APELAÇÃO CRIMINAL. ART.95, ALÍNEA ‘D’, DA LEI Nº 8.212/91, C.C. O ART. 71 DO CP. (...) NÃO DEMONSTRADA A EXCLUDENTE DE CULPABILIDADE POR DIFICULDADES FINANCEIRAS.(...) APELAÇÃO DESPROVIDA.

(...)

- Não restou provada relação entre a crise econômica que ensejou a falência da empresa e o cometimento do crime. O período delitivo iniciou-se em janeiro de 1993 e estendeu-se mesmo após a alegada decretação de concordata em novembro de 1996, até julho de 1998. Não foi demonstrado nos autos o pedido de concordata. Ainda que admitida, o réu não poderia ter dela se beneficiado, uma vez que não podem ocorrer os impedimentos do art. 140 da Lei de Falências e devem estar presentes as condições do seu art. 158 e os requisitos do art. 191 do CTN. Não conseguiu a defesa esgrimir nos autos a comprovação de que a situação comercial da empresa estaria a impedir o adimplemento da obrigação tributária.

(...)

- Preliminares de anistia e cerceamento do direito de defesa rejeitadas. Apelação desprovida. Reconhecida, de ofício, a prescrição em concreto de parte das condutas praticadas.”

(TRF da 3ª Região, ACr n. 199961810073570, Rel. Des. Fed. André Nabarrete, j. 25.07.05)

 

Por sua vez, a falência nada mais é do que uma execução coletiva que se instaura em razão de uma crise de liquidez ou desequilíbrio patrimonial. Embora ela usualmente ocorra num quadro de dificuldades financeiras, não exclui a culpabilidade do agente que se apropria das contribuições previdenciárias dos empregados, em especial no período anterior à quebra:

 

“PROCESSUAL PENAL E PENAL: APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. ART. 168-A DO CP. (...). DIFICULDADES FINANCEIRAS. NÃO-COMPROVAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE OUTRAS PROVAS. ESTADO DE NECESSIDADE. ART. 24, DO CP. PERIGO ATUAL.(...) RECURSO EXCLUSIVO DA DEFESA. NÃO PROVIMENTO.

(...)

VIII - Mesmo no que diz respeito a eventual decreto de falência da empresa no período final da reiterada prática dos atos delituosos, considerando que o apelante deixou de recolher as contribuições descontadas dos salários de seus empregados desde a constituição da empresa trata-se de conduta pelo mesmo sempre adotada, que não é afastada pela quebra, ao contrário, a sua forma de administração poderá até mesmo ter contribuído sobremaneira para tal desfecho. Precedentes do STJ.

(...)

XXII - Recurso do réu improvido. De ofício, reconhecida a prescrição da pretensão punitiva retroativa dos fatos referentes aos períodos de julho/1988 a setembro de 1988; novembro de 1988 a janeiro de 1989 e março de 1989.”

(TRF da 3ª Região, ACr n. 200203990386734, Rel. Des. Fed. Cecília Mello, j. 06.11.07)

 

Do caso dos autos. As defesas dos acusados sustentam, em seus recursos, que a sentença condenatória merece reforma em razão de não existir prova quanto à autoria delitiva, ou ainda ante a consideração da inexigibilidade de conduta diversa, tendo em vista as dificuldades econômicas pelas quais a empresa Alcamp Comercial Ltda. passava ao tempo dos fatos imputados pela acusação.

A pretensão defensiva não merece prosperar.

A autoria foi apreciada pelo Juízo a quo nos seguintes termos:

 

Quanto à autoria, esta também restou demonstrada.

Inicialmente é de ressaltar que conforme a ficha cadastral da empresa depositada perante a junta comercial de São Paulo, ambos os réus figuravam como sócios administradores da empresa à época dos fatos, pp. 01/09 do ID 118212944.

Interrogados, os réus negaram as acusações.

(...)

Em que pese as declarações fornecidas nos interrogatórios, as versões fornecidas pelos acusados são insatisfatórias.

Primeiramente, causa estranheza o fato de os réus afirmarem que declaravam tudo corretamente, que emitiam notas, que os clientes eram “grandes” e que o Fisco simplesmente “não conseguiu entender” o faturamento das cestas de Natal. Ora, não é preciso ser expert em contabilidade para entender o funcionamento de vendas por consignação, sendo de difícil crença que a auditoria fiscal tenha confundido tal fato com omissão de 63% das receitas. Ademais, conforme já dito nesta sentença, a empresa acompanhou a fiscalização à época, apresentou documentos e teve oportunidade para esclarecer à Receita qualquer fato que pudesse levar a um entendimento errado sobre a escrituração fiscal, o que não ocorreu.

As testemunhas arroladas em Juízo, assim como os réus, não souberam esclarecer as omissões, tendo tentado imputar a responsabilidade a um suposto escritório de contabilidade cuja existência sequer restou provada e os próprios acusados afirmam desconhecerem.

(...)

Além de não ter restado provada a existência do referido escritório de contabilidade que teria apresentado declarações retificadoras, deve-se ressaltar que a mera existência de contadores, ou sócios responsáveis por áreas específicas não exclui, por si só, a autoria delitiva, especialmente quando os réus participavam ativamente da gestão da empresa, tendo inclusive poderes para tomada de decisões, conforme precedente:

“PROCESSUAL PENAL. PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. ART. 168-A DO CP. SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ART. 337-A, I, DO CP. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. DIRETOR DE COLÉGIO. (...) 04. O réu, na qualidade de diretor geral de Colégio, era o responsável pela administração da instituição e, em consequência, pela averiguação do regular recolhimento dos impostos devidos. Não pode se eximir da responsabilidade, ao argumento de que o contador e o diretor administrativo eram responsáveis para fazer a escrita contábil, pois, mesmo que a declaração tenha sido efetuada por estes, a responsabilidade pelos dados lançados na declaração ainda é do administrador, diretor ou gerente da empresa. (TRF1, Apelação Criminal n. 46626220084014300, Relator Desembargador Federal Tourinho Neto, Órgão julgador Terceira Turma, Fonte: e-DJF1, Data: 22/06/2012, página 552. Grifo nosso.

Sobre as alegações dos réus acerca de dificuldades financeiras enfrentadas pela empresa à época, vale ressaltar não ter sido produzida sequer uma prova acerca dessa situação. Conforme é cediço, a prova da alegação incumbe a quem a fizer e o enfrentamento de dificuldades financeiras pela empresa, salvo casos excepcionais, não constituem motivo suficiente para caracterizar a inevitabilidade da conduta - causa supralegal de exclusão de culpabilidade - visto que é próprio do cotidiano empresarial o enfrentamento dos riscos normais ou comuns decorrentes de oscilações econômicas.

Assim, o enfrentamento de dificuldades financeiras, salvo casos excepcionais, não constituem motivo suficiente para caracterizar a inevitabilidade da conduta - causa supralegal de exclusão de culpabilidade - visto que é próprio do cotidiano empresarial o enfrentamento dos riscos normais ou comuns decorrentes de oscilações econômicas, consoante tem ponderado a jurisprudência (nossos destaques):

“PENAL E PROCESSUAL PENAL. OMISSÃO NO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA (ART. 168-A DO CÓDIGO PENAL). AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. DOLO GENÉRICO. CULPABILIDADE. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. INADMISSIBILIDADE. DIFICULDADES ECONÔMICAS. NÃO-PROVADAS. 1. O crime de apropriação previdenciária é omissivo próprio e perfaz-se com o dolo genérico, consistente na vontade livre e consciente de não-recolher à Previdência Social, no prazo previsto em lei, a contribuição arrecadada dos empregados. Não importa, para a configuração do delito, a ré ter ou não se apropriado dos valores descontados dos empregados. (...) 3. Apesar de o Código Penal não adotar a inexigibilidade de conduta diversa como causa geral de exclusão de culpabilidade, os tribunais pátrios têm-na aceito como causa supralegal de exclusão de culpabilidade e, ainda, como circunstância de mitigação da pena, pela livre apreciação da prova constante dos autos pelo magistrado (art. 157 do CPP). Ademais, não se há de reconhecer a tese exculpante de dificuldades financeiras da empresa, se desacompanhada de prova documental ou pericial contábil. A apelante colacionou, somente, relação de reclamações trabalhistas ajuizadas dois anos após o fim do não recolhimento das contribuições descontadas dos empregados. Por conseguinte, não são aptos para eximir a responsabilidade da dirigente da empresa pelo cumprimento do dever legal de recolher a contribuição previdenciária, porque não foram ajuizadas na época do não recolhimento das contribuições previdenciárias. 5. O ônus da prova, nessa hipótese, compete à defesa, e não à acusação, por força do art. 156 do Código de Processo Penal. Precedente do Superior Tribunal de Justiça (REsp no 888.947/PB) (...)”. (TRF 5ª Região, 1ª Turma, Des. Fed. EDVALDO BATISTA DA SILVA JR., APR 200983000168649, j. 19/01/2012).

“PENAL E PROCESSUAL PENAL. OMISSÃO NO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA (ART. 168-A DO CÓDIGO PENAL). AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. DOLO GENÉRICO. CULPABILIDADE. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. INADMISSIBILIDADE. DIFICULDADES ECONÔMICAS. NÃO-PROVADAS. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. RAZOABILIDADE. CRIME CONTINUADO. CRITÉRIO DE AUMENTO. QUANTIDADE DE INFRAÇÕES. PENA PECUNIÁRIA. QUANTIDADE DE DIAS-MULTA. VALOR DO DIA-MULTA. SITUAÇÃO ECONÔMICA DO RÉU. (...) 4. Os documentos colacionados (cópia de ações de execuções fiscais ajuizadas contra a empresa) não são aptos para eximir a responsabilidade dos dirigentes da empresa pelo cumprimento do dever legal de recolher a contribuição previdenciária, porque apenas quatro delas foram ajuizadas na época do não recolhimento das contribuições previdenciárias. (...) 6. Deve-se também considerar que o não-recolhimento perdurou por quase 2 anos. É difícil aceitar a tese de inexigibilidade de conduta diversa por prazo tão dilatado. Não é admissível que empresas sigam em sua atividade econômica sem adotar medidas administrativas rigorosas para cumprir suas obrigações com a Seguridade Social, que é patrimônio de toda a sociedade brasileira (...)”. (TRF 5ª Região, 1ª Turma, Des. Fed. FRANCISCO CAVALCANTI., ACR 6725 PE 0004979-48.2006.4.05.8300, j. 14/01/2010).

No caso em concreto, há apenas provas testemunhais, quando a prova documental acerca das narradas dificuldades seria farta e específica, como os investimentos na África do Sul, a existência de dívidas, venda de patrimônio pessoal. Os documentos juntados aos autos na oportunidade da resposta à acusação, os quais foram devidamente analisados por este juízo, NÃO são contemporâneos à data dos fatos, mas sim posteriores. O documento de ID 261035490 não atesta ter sido pago valor a título de resgate capaz de comprometer a idoneidade financeira da empresa, sequer citando quantias.

As testemunhas de defesa apenas afirmaram que os sócios tentaram salvar a empresa, o que é insuficiente ao reconhecimento da excludente de culpabilidade.

(...)

Os depoimentos das testemunhas indicam, destarte, a existência de erros na gestão da empresa, o que não justifica a dificuldade financeira para isentar a responsabilidade penal.

Assim, reputo plenamente demonstrada a ocorrência do crime, estando presente o dolo nas próprias declarações dos réus, ressaltando que nos casos em que não há confissão da parte, a comprovação do dolo é predominantemente indiciária, pois é impossível adentrar-se o íntimo do agente para a sua aferição.

Na arguta expressão do Desembargador Federal Peixoto Júnior, do E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, “pressuposta a impenetrabilidade de consciência, se o réu não confessa, a prova do elemento subjetivo do delito só pode ser fornecida por meios indiretos, por indícios, vale dizer” (ACR 17877, Processo 2003.60.02.001394-2-MS – Segunda Turma – DJU 05/08/2005, p. 383).

Destaco que a admissibilidade da prova indiciária tem arrimo no art. 239 do CPP e conta com o beneplácito de forte corrente jurisprudencial:

“Possibilidade de condenação por prova indiciária – TJSP: ‘Prova. Condenação com base em indícios. Admissibilidade se somada a outras provas apresentam elementos positivos de credibilidade. De acordo com o princípio da livre convicção do Juiz, a prova indiciária ou circunstancial tem o mesmo valor das provas diretas, pois mesmo que a prova estritamente extrajudicial não possa embasar condenação, se somada a outras, apresentar elementos positivos de credibilidade, é o suficiente para dar base a uma decisão condenatória’ (RT 748/599)”.(Júlio Fabbrini Mirabete, Código de Processo Penal Interpretado, 11ª ed., Atlas, p. 618. GRIFEI).

Assim, a configuração do delito é clara e de fácil compreensão.

Apesar das alegações da defesa, nenhuma prova robusta foi trazida aos autos ao menos para pôr em dúvida o julgamento condenatório em relação a sua autoria (Id n. 273642761).

 

A apreciação realizada pela magistrada de origem não merece reparos.

Os apelantes alegam, em resumo, que não possuem conhecimentos específicos de contabilidade e que não eram responsáveis pela matéria na empresa.

Contudo, o conjunto probatório demonstra a participação dos acusados, não apenas por serem os proprietários da empresa. As assinaturas do réu Paulo foram apostas nos diversos livros da escrituração contábil do ano de 2006 (Id n. 273640967, p. 2/9). Ambos os acusados atuavam diretamente na gestão da sociedade empresarial, conforme a prova oral colhida ao longo da instrução criminal.

Em que pese se sustente a ausência do elemento subjetivo do tipo, considerando a expressiva diferença entre os valores recebidos e declarados à Receita Federal, a experiência dos acusados como empresários, bem como o não pagamento dos tributos devidos, não há como se extrair dos autos a compreensão de que os réus ignoravam a repercussão fiscal da declaração de valores tão díspares.

Com efeito, não é possível sustentar que os réus desconhecessem o dever de informar e discriminar os valores recebidos. Note-se, por outro lado, que o tipo penal descrito no art. 1º, I, da Lei n. 8.137/90, prescinde de dolo específico, sendo suficiente, para sua caracterização, a presença do dolo genérico, consistente na omissão voluntária do recolhimento, no prazo legal, do valor devido aos cofres públicos. É sancionada penalmente a conduta daquele que não se queda meramente inadimplente, mas omite um dever que lhe é exigível, consistente na declaração de fatos geradores de tributo à repartição fazendária, na periodicidade prevista em lei.

A alegada alteração de dados enviados à Receita Federal por terceiro não identificado, por sua vez, não encontra amparo nos autos, sendo que nem os acusados conseguem fornecer uma justificativa plausível para essa conduta em benefício dos réus, com a redução dos valores apresentados para tributação.

Por fim, a alegação de inexigibilidade de conduta diversa, argumentando que, à época dos fatos, a empresa Alcamp Comercial foi severamente afetada por crise financeira, sendo impossibilitada de cumprir com suas obrigações tributárias, não merece acolhida.

Com efeito, as dificuldades financeiras são, de certa forma, sempre presentes na vida econômica das empresas e o administrador precisa lidar com situações variáveis de caixa.

Tais oscilações, que fazem parte da realidade econômica da atividade empresarial, não podem sacrificar o recolhimento dos tributos devidos, sendo certo que a legislação impõe prioridade na ordem de pagamentos que o administrador deve zelar.

Os empresários em situação financeira adversa não podem se sentir legitimados a cometer delitos para, de alguma forma, alcançar seus objetivos.

Por outro lado, não se desincumbiu a defesa do ônus de comprovar que não havia alternativa ao não recolhimento dos tributos, extraindo-se a condição de solvência da empresa pelo seu faturamento milionário há época, sendo insuficiente a alegação de dificuldade financeira para a exclusão de sua culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa.

Dessa forma, comprovada a materialidade, a autoria e o dolo, a condenação dos acusados Paulo Eduardo Moraes Frazão e Joel Scolari deve ser mantida.

Passo, assim, à análise da dosimetria da pena.

 

Dosimetria. A dosimetria da sanção penal foi realizada pelo Juízo a quo nos seguintes termos:

 

RÉU PAULO EDUARDO MORAES FRAZÃO

1ª fase – Circunstâncias Judiciais

Na análise do artigo 59 do CP, merecem registro as seguintes circunstâncias judiciais:

A) culpabilidade: o réu é culpável, já que tinha conhecimento do caráter ilícito do fato e condições de autodeterminação. Apresentava e apresenta sanidade mental que lhe permitia não realizar a conduta ilícita, sendo exigível que agisse de modo diverso. Não há nos autos qualquer prova da existência de causa excludente da culpabilidade. Nesse tópico, tenho que a mencionada culpabilidade deve ser considerada em seu grau normal, não havendo motivos que determinem necessidade de acentuação;

B) antecedentes: Trata-se de requisito objetivo, que impede qualquer análise subjetiva do julgador, nada havendo que o desabone, nos termos da súmula nº 444 do STJ (ID 246155973);

C) conduta social e da personalidade: nada digno de nota foi constatado, além do desvio que o levou à prática delitiva;

D) motivo: não desborda da própria tipicidade e previsão do delito;

E) circunstâncias e conseqüências: as circunstâncias do crime não prejudicam a ré;

F) comportamento da vítima: o comportamento da vítima em nada influenciou no cometimento do delito.

Assim, considerando as penas abstratamente cominadas no preceito secundário do artigo 1º, inciso I lei n. 8.137/90 entre os patamares de 02 a 05 anos de reclusão e multa, fixo a pena-base em (02) dois anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

2ª fase – Circunstâncias atenuantes e agravantes

Não há circunstâncias agravantes a serem consideradas.

Em observância ao princípio da proporcionalidade, verifico incidir, outrossim, a atenuante da confissão, prevista no art. 65, III, "d", do Código Penal.

Isso porque, não obstante o réu tenha NEGADO o elemento subjetivo do tipo, ou seja, afirmado desconhecer as omissões constatadas pela Receita Federal – o que consiste em confissão qualificada, este Juízo reforçou o aspecto objetivo da autoria com base nas declarações deste de que de fato administrava a empresa.

Logo, sendo a confissão um fato processual que gera um ônus para a ré (utilizado contra esta como elemento de prova), não seria justo que esta magistrada deixasse de conferir a esse o bônus trazido pela confissão, qual seja, o reconhecimento como circunstância atenuante.

Nesse sentido é o posicionamento pacífico dos Tribunais Superiores brasileiros, sacramentados com recentíssimo Enunciado de Súmula do STJ, número 545, de outubro de 2015, segundo o qual “quando a confissão for utilizada para a formação do convencimento do julgador, o réu fará jus à atenuante prevista no artigo 65, III, d, do Código Penal” (3ª Seção. Aprovada em 14/10/2015, DJe 19/10/2015).

No entanto, deixo de reduzir a pena abaixo do piso legal, à luz da Súmula 231 do STJ, ficando a pena, nesta fase, estabelecida no mesmo quantum da pena-base em (02) dois anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

3ª fase – Causas de diminuição e causas de aumento

Igualmente, não há causas de diminuição ou de aumento de pena a serem valoradas.

Logo, fixo a pena definitiva em (02) dois anos e de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Quanto ao concurso de crimes, entende este Juízo que a sonegação de mais de um tributo em decorrência da mesma conduta rende ensejo à incidência do concurso formal de crimes (CP, art. 70, caput, 1ª parte), enquanto a reiteração da conduta por anos fiscais consecutivos, da continuidade delitiva (CP, art. 71, caput). Nesse sentido: TRF 3ª Região, ACR n. 00056738319994036112, Juiz Fed. Conv. Hélio Nogueira, j. 20.05.14, ACR n. 00119604920004036105, Des. Fed. Nelton dos Santos, j. 05.06.12; TRF 2ª Região, ACR n. 199851010485273, Des. Fed. Abel Gomes, j. 19.07.06.

Considerando que no caso em tela houve supressão de CINCO tributos (IRPJ, PIS, COFINS e CSLL) em um único ano calendário, deve-se considerar a primeira regra.

Assim, em se tratando de crimes idênticos, aplica-se-lhes somente uma das penas, aumentada de um sexto até metade. Na espécie, aplico o aumento mínimo de 1/6 previsto pelo artigo 70 do Código Penal, fixando a pena definitiva em 02 (dois) anos, 04 (três) meses de reclusão, além de 11 (onze) dias-multa.

Havendo nos autos referência acerca da situação econômica-pessoal do condenado (ID 270636651), fixo o valor unitário do dia-multa acima do mínimo legal, a saber, em um décimo (1/10) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, atualizados monetariamente, na forma do § 2º do art. 49 do CP, sendo que a liquidação da pena de multa deve se fazer em fase de execução.

Ante o acima exposto, presentes os requisitos do art. 44 e seguintes do CP (com a redação dada pela Lei 9.714/98), substituo a pena privativa de liberdade anteriormente imposta ao réu por duas penas restritivas de direitos, nas modalidades de prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas (art. 43, IV, do CP) e de prestação pecuniária (art. 43, I, do CP), esta fixada em 20 (vinte) salários-mínimos vigentes no mês do pagamento, a serem pagas em favor da UNIÃO, tendo em vista o cometimento de crime contra a ordem tributária, na forma do artigo 45, § 1º, do Código Penal.

Na eventualidade de revogação dessa substituição, o réu deve iniciar o cumprimento da pena privativa de liberdade no regime aberto, sob as condições gerais obrigatórias e outras a critério do Juízo das Execuções.

RÉU JOEL SCOLARI

1ª fase – Circunstâncias Judiciais

Na análise do artigo 59 do CP, merecem registro as seguintes circunstâncias judiciais:

A) culpabilidade: o réu é culpável, já que tinha conhecimento do caráter ilícito do fato e condições de autodeterminação. Apresentava e apresenta sanidade mental que lhe permitia não realizar a conduta ilícita, sendo exigível que agisse de modo diverso. Não há nos autos qualquer prova da existência de causa excludente da culpabilidade. Nesse tópico, tenho que a mencionada culpabilidade deve ser considerada em seu grau normal, não havendo motivos que determinem necessidade de acentuação;

B) antecedentes: Trata-se de requisito objetivo, que impede qualquer análise subjetiva do julgador, nada havendo que o desabone, nos termos da súmula nº 444 do STJ (ID 246155978);

C) conduta social e da personalidade: nada digno de nota foi constatado, além do desvio que o levou à prática delitiva;

D) motivo: não desborda da própria tipicidade e previsão do delito;

E) circunstâncias e conseqüências: as circunstâncias do crime não prejudicam a ré;

F) comportamento da vítima: o comportamento da vítima em nada influenciou no cometimento do delito.

Assim, considerando as penas abstratamente cominadas no preceito secundário do artigo 1º, inciso I lei n. 8.137/90 entre os patamares de 02 a 05 anos de reclusão e multa, fixo a pena-base em (02) dois anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

2ª fase – Circunstâncias atenuantes e agravantes

Não há circunstâncias agravantes a serem consideradas.

Em observância ao princípio da proporcionalidade, verifico incidir, outrossim, a atenuante da confissão, prevista no art. 65, III, "d", do Código Penal.

Isso porque, não obstante o réu tenha NEGADO o elemento subjetivo do tipo, ou seja, afirmado desconhecer as omissões constatadas pela Receita Federal - o que consiste em confissão qualificada, este Juízo reforçou o aspecto objetivo da autoria com base nas declarações deste de que de fato administrava a empresa.

Logo, sendo a confissão um fato processual que gera um ônus para a ré (utilizado contra esta como elemento de prova), não seria justo que esta magistrada deixasse de conferir a esse o bônus trazido pela confissão, qual seja, o reconhecimento como circunstância atenuante.

Nesse sentido é o posicionamento pacífico dos Tribunais Superiores brasileiros, sacramentados com recentíssimo Enunciado de Súmula do STJ, número 545, de outubro de 2015, segundo o qual “quando a confissão for utilizada para a formação do convencimento do julgador, o réu fará jus à atenuante prevista no artigo 65, III, d, do Código Penal” (3ª Seção. Aprovada em 14/10/2015, DJe 19/10/2015).

No entanto, deixo de reduzir a pena abaixo do piso legal, à luz da Súmula 231 do STJ, ficando a pena, nesta fase, estabelecida no mesmo quantum da pena-base em (02) dois anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

3ª fase – Causas de diminuição e causas de aumento

Igualmente, não há causas de diminuição ou de aumento de pena a serem valoradas.

Logo, fixo a pena definitiva em (02) dois anos e de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Quanto ao concurso de crimes, entende este Juízo que a sonegação de mais de um tributo em decorrência da mesma conduta rende ensejo à incidência do concurso formal de crimes (CP, art. 70, caput, 1ª parte), enquanto a reiteração da conduta por anos fiscais consecutivos, da continuidade delitiva (CP, art. 71, caput). Nesse sentido: TRF 3ª Região, ACR n. 00056738319994036112, Juiz Fed. Conv. Hélio Nogueira, j. 20.05.14, ACR n. 00119604920004036105, Des. Fed. Nelton dos Santos, j. 05.06.12; TRF 2ª Região, ACR n. 199851010485273, Des. Fed. Abel Gomes, j. 19.07.06.

Considerando que no caso em tela houve supressão de CINCO tributos (IRPJ, PIS, COFINS e CSLL) em um único ano calendário, deve-se considerar a primeira regra.

Assim, em se tratando de crimes idênticos, aplica-se-lhes somente uma das penas, aumentada de um sexto até metade. Na espécie, aplico o aumento mínimo de 1/6 previsto pelo artigo 70 do Código Penal, fixando a pena definitiva em 02 (dois) anos, 04 (três) meses de reclusão, além de 11 (onze) dias-multa.

Havendo nos autos referência acerca da situação econômica-pessoal do condenado (ID 270636656), fixo o valor unitário do dia-multa acima do mínimo legal, a saber, em um décimo (1/10) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, atualizados monetariamente, na forma do § 2º do art. 49 do CP, sendo que a liquidação da pena de multa deve se fazer em fase de execução.

Ante o acima exposto, presentes os requisitos do art. 44 e seguintes do CP (com a redação dada pela Lei 9.714/98), substituo a pena privativa de liberdade anteriormente imposta ao réu por duas penas restritivas de direitos, nas modalidades de prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas (art. 43, IV, do CP) e de prestação pecuniária (art. 43, I, do CP), esta fixada em 20 (vinte) salários-mínimos vigentes no mês do pagamento, a serem pagas em favor da UNIÃO, tendo em vista o cometimento de crime contra a ordem tributária, na forma do artigo 45, § 1º, do Código Penal.

Na eventualidade de revogação dessa substituição, o réu deve iniciar o cumprimento da pena privativa de liberdade no regime aberto, sob as condições gerais obrigatórias e outras a critério do Juízo das Execuções.

DISPOSIÇÕES COMUNS

Inexistente fato a ensejar a custódia preventiva, nos termos do art. 312 do CPP, os réus têm o direito de apelar em liberdade.

Condeno-os, ainda, ao pagamento das custas processuais, nos termos do artigo 804 do Código de Processo Penal c.c. a Lei nº 9.289/96. (Id n. 273642761).

 

Não obstante a dosimetria não tenha sido objeto de recurso defensivo, comporta revisão de ofício e de forma conjunta, uma vez que não há discrepância entre as situações dos acusados.

Reapreciando a dosimetria da pena, adequada a fixação da pena-base no mínimo legal de 2 (dois) anos de reclusão, tendo em vista que as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal devem ser consideradas neutras, uma vez que não comprovada a existência de elementos desabonadores.

Não há agravantes a serem consideradas e muito embora incida a atenuante da confissão, resta obstada a redução da pena aquém do mínimo legal (Súmula n. 231 do STJ).

Ainda que suprimidos diversos tributos (IRPJ, CSLL, PIS e COFINS), considero praticada, na esteira da jurisprudência (STJ, REsp n. 1294687, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 15.10.13; TRF da 1ª Região, ACr n. 00158703020044013800, Rel. Des. Fed. Hilton Queiroz, j. 01.10.13; TRF da 3ª Região, ACr n. 00082555720114036105, Rel. p/ acórdão Des. Fed. Paulo Fontes, j. 04.09.17; ACr n. 00083665620024036105, Rel. Juiz Conv. Márcio Mesquita, j. 05.08.08; TRF da 5ª Região, ACr n. 200783000155622, Rel. Des. Fed. Rogério Fialho Moreira, j. 26.05.15), uma única conduta fraudulenta mediante a omissão de receita tributável e reconheço a prática de crime único, qual seja, o delito do art. 1º, I, da Lei n. 8.137/90, pela redução das contribuições e imposto indicados.

Dessa forma, afasto a exasperação correspondente à previsão do art. 70 do Código Penal, mantendo a pena aplicada em 2 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, a qual torno definitiva.

Arbitro o valor unitário do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo, corrigido monetariamente quando da execução, tendo em vista a insuficiência dos elementos existentes sobre a capacidade econômica do agente.

Mantenho o regime inicial aberto para o cumprimento das penas privativas de liberdade (art. 33, caput e §2º, “c”, do Código Penal).

Presentes os requisitos do art. 44 do Código Penal, substituo as penas privativas de liberdade por 2 (duas) penas restritivas de direitos, consistentes em prestação pecuniária no valor de 1 (um) salário mínimo em favor de entidade beneficente  (CP, art. 43, I, c. c. o art. 45, §§ 1º e 2º) e prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas (CP, art. 43, IV, c. c. o art. 46), pelo mesmo tempo da pena privativa de liberdade, cabendo ao Juízo das Execuções Penais definir a entidade beneficiária, o local de prestação de serviços e observar as aptidões dos réus.

 

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO aos recursos interpostos pelas defesas de Paulo Eduardo Moraes Frazão e Joel Scolari e, DE OFÍCIO, reduzo as penas aplicadas para 2 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo, substituídas as penas privativas de liberdade por 2 (duas) penas restritivas de direitos, consistentes em prestação pecuniária no valor de 1 (um) salário mínimo em favor de entidade beneficente e prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas.

É o voto.



E M E N T A

 

PENAL. PROCESSO PENAL. SONEGAÇÃO FISCAL. DELITO DO ART. 1º, I e II, DA LEI N. 8.137/90. SUPRESSÃO DE IRPJ, CSLL, PIS e COFINS. SONEGAÇÃO. LANÇAMENTO. CRIME MATERIAL CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. CONSUMAÇÃO. CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. DOMICÍLIO FISCAL DO CONTRIBUINTE. NULIDADE. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. LANÇAMENTO. VALIDADE. INSTÂNCIAS TRIBUTÁRIA E PENAL. INDEPENDÊNCIA. MATERIALIDADE. AUTORIA. DOLO. COMPROVAÇÃO. DIFICULDADES FINANCEIRAS. IMPROCEDÊNCIA. DOSIMETRIA REVISTA, DE OFÍCIO. APELOS DESPROVIDOS.

1. Consoante estabelecido pela Súmula Vinculante n. 24, é necessário o lançamento definitivo para a configuração do crime contra a ordem tributária.

2. Esta Corte tem decidido que o foro competente para o processamento e o julgamento de crime material contra a ordem tributária é o do domicílio fiscal do contribuinte, na data da constituição definitiva do crédito na esfera administrativa, de acordo com a Súmula n. 24 do Supremo Tribunal Federal (TRF 3ª Região, 4ª Seção, CJ n. 00019933420154030000, Rel. Des. Fed. Mauricio Kato, j. 20.08.15; 1ª Seção, CJ n. 00310908420124030000, Des. Fed. Rel. Luiz Stefanini, j. 07.02.13; CJ n. 00017823720114030000, Des. Fed. Rel. Nelton dos Santos, j. 17.03.11; CC n. 00332191420024030000, Des. Fed. Rel. Johonsom Di Salvo, j. 07.05.03).

3. A nulidade somente será declarada quando resultar em prejuízo para a parte.

4. O processo criminal não é a via adequada para a impugnação de eventuais nulidades ocorridas no procedimento administrativo-fiscal (STJ, AgRg no AREsp n. 469.137, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 05.12.17 e STJ, AgRg no AREsp n. 1.058.190, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, j. 21.11.17). Além disso, eventuais vícios no procedimento administrativo-fiscal, enquanto não reconhecidos na esfera cível, são irrelevantes para o processo penal em que se apura a ocorrência de crime contra a ordem tributária (STJ, RHC n. 14.459, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 16.09.04).

5. Materialidade e autoria comprovadas nos autos.

6. O tipo penal descrito no art. 1º, I e II, da Lei n. 8.137/90 prescinde de dolo específico, sendo suficiente, para sua caracterização, o dolo genérico que restou comprovado nos autos, consistente na omissão voluntária de informações às autoridades fazendárias.

7. A mera existência de dificuldades financeiras, as quais, por vezes, perpassam todo o corpo social, não configura ipso facto causa supralegal de exclusão de culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa quanto ao delito de não-repasse de contribuições previdenciárias. O acusado tem o ônus de provar que, concretamente, não havia alternativa ao não-repasse das contribuições (TRF da 3ª Região, ACr n. 98030965085, Rel. Des. Fed. Nelton dos Santos, j. 14.09.04; ACr n. 200203990354034, Rel. Des. Fed. Luiz Stefanini, j. 26.06.07; ACr n. 20056118007918, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 15.09.08; ACr n. 199961810073570, Rel. Des. Fed. André Nabarrete, j. 25.07.05; ACr n. 200203990386734, Rel. Des. Fed. Cecília Mello, j. 06.11.07).

8. Revisão da dosimetria.

9. Apelações de Paulo Eduardo Moraes Frazão e Joel Scolari desprovidas. Redução, de ofício, das penas aplicadas aos apelantes para 2 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo, substituídas as penas privativas de liberdade por 2 (duas) penas restritivas de direitos, consistentes em prestação pecuniária no valor de 1 (um) salário mínimo em favor de entidade beneficente e prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quinta Turma, por unanimidade, decidiu NEGAR PROVIMENTO aos recursos interpostos pelas defesas de Paulo Eduardo Moraes Frazão e Joel Scolari e, DE OFÍCIO, reduzir as penas aplicadas para 2 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo, substituídas as penas privativas de liberdade por 2 (duas) penas restritivas de direitos, consistentes em prestação pecuniária no valor de 1 (um) salário mínimo em favor de entidade beneficente e prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.