
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5023013-49.2022.4.03.0000
RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO
AGRAVANTE: NELSON RUBENS MUSCARI NETO
Advogado do(a) AGRAVANTE: CARLOS CARMELO NUNES - SP31956-A
AGRAVADO: COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS - CVM
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5023013-49.2022.4.03.0000 RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO AGRAVANTE: NELSON RUBENS MUSCARI NETO Advogado do(a) AGRAVANTE: CARLOS CARMELO NUNES - SP31956-A AGRAVADO: COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS - CVM OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (Relator): Trata-se de agravo de instrumento interposto por NELSON RUBENS MUSCARI NETO contra decisão que indeferiu sua exceção de pré-executividade, mantendo-o no polo passivo da Execução Fiscal n. 5001120-93.2018.4.03.6126, cujo redirecionamento foi determinado pelo Juízo da 3ª Vara Federal de Santo André, em razão da sociedade executada ter sido dissolvida irregularmente. Sustenta o agravante, em síntese, que já havia se retirado da sociedade na época da ocorrência do fato gerador do tributo e de sua posterior dissolução irregular, de forma que não seria possível o redirecionamento da execução contra si. Foi proferida decisão indeferindo a tutela requerida. A agravada apresentou contraminuta. Em 11/09/2023, os autos foram redistribuídos para minha relatoria em razão da criação desta unidade judiciária. É o relatório.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5023013-49.2022.4.03.0000 RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO AGRAVANTE: NELSON RUBENS MUSCARI NETO Advogado do(a) AGRAVANTE: CARLOS CARMELO NUNES - SP31956-A AGRAVADO: COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS - CVM OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (Relator): Cinge-se a controvérsia em saber se é possível, em sede de exceção de pré-executividade, excluir o sócio do polo passivo de execução fiscal a ele redirecionada, sob o fundamento de não mais pertencer aos quadros da sociedade no momento dos fatos geradores dos tributos e de sua posterior dissolução irregular, tendo como base instrumento de alteração contratual não averbado na junta comercial. Isso porque o apelante juntou aos autos da execução Instrumento de Alteração de Contrato Social no qual consta sua retirada da sociedade executada em 25/08/2013 (ID 186941939) - não registrado na junta comercial, sendo que o redirecionamento da referida execução fiscal se deu em 16/10/2018. O redirecionamento da execução fiscal em desfavor do agravante se deu de acordo com os requisitos legais. Em 27 de junho de 2018, o oficial de justiça certificou que deixou de cumprir o mandado de citação e intimação da executada por ter sido informado pela moradora local, proprietária do imóvel, que desconhece a empresa (id 9055494). Tal diligência foi realizada no endereço inicial de cadastro da executada, na Rua Dom João V, 408, apto. 144 – Lapa, São Paulo/SP, conforme ficha cadastral da sociedade na JUCESP, juntada pela exequente (id 8662364). Posteriormente, em 05 de outubro de 2018, comparecendo ao novo endereço da executada informado na sua ficha cadastral registrada na Junta Comercial (Rua Monte Pascoal, 87, Lapa, São Paulo/SP), conforme ficha cadastral juntada pela exequente (id 10603936), o auxiliar do juízo certificou que também deixou de proceder à citação e intimação da executada, por ter verificado que o imóvel se encontra fechado, aparentemente vazio, com placas de “aluga-se” de corretoras imobiliárias (Certidão, id. 11405936). Assim, pode-se concluir que a executada deixou de funcionar em seu domicílio fiscal sem comunicar os órgãos competentes, presumindo-se sua dissolução irregular, apta a permitir o redirecionamento da execução fiscal, nos termos da citada súmula 435-STJ: “presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente”. Isso porque "é obrigação dos gestores das empresas manter atualizados os respectivos cadastros, incluindo os atos relativos à mudança de endereço dos estabelecimentos e, especialmente, referentes à dissolução da sociedade. A regularidade desses registros é exigida para que se demonstre que a sociedade dissolveu-se de forma regular, em obediência aos ritos e formalidades previstas nos arts. 1.033 a 1.038 e arts. 1.102 a 1.112, todos do Código Civil de 2002 – onde é prevista a liquidação da sociedade com o pagamento dos credores em sua ordem de preferência – ou na forma da Lei 11.101/2005, no caso de falência. A desobediência a tais ritos caracteriza infração à lei" (cf. REsp 1.371.128/RS, tema repetitivo 630, Rel. Min. Mauro Campbell, DJe de 17/09/2014, grifos meus). Por sua vez, verifica-se que o agravante era sócio da executada desde 14/06/2013, mantendo-se nessa condição no momento em que ocorreu a sua dissolução irregular. Assim, o redirecionamento operado se deu nos termos do entendimento adotado pelo STJ no julgamento do tema repetitivo 981: “O redirecionamento da execução fiscal, quando fundado na dissolução irregular da pessoa jurídica executada ou na presunção de sua ocorrência, pode ser autorizado contra o sócio ou o terceiro não sócio, com poderes de administração na data em que configurada ou presumida a dissolução irregular, ainda que não tenha exercido poderes de gerência quando ocorrido o fato gerador do tributo não adimplido, conforme art. 135, III, do CTN.” (STJ, tema representativo de controvérsia 981, julgado em 25/05/2022, grifos meus). No caso, não prospera o argumento do agravante de que teria se retirado da sociedade executada desde 25/08/2013, não pertencendo mais aos quadros de tal sociedade no momento de sua dissolução irregular. Isso porque o instrumento de alteração contratual de sua retirada não foi averbado na Junta Comercial, tendo eficácia apenas entre as partes, nos termos dos art. 1.151 e 1.154 do Código Civil (CC/02): “Art. 1.150. O empresário e a sociedade empresária vinculam-se ao Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais, e a sociedade simples ao Registro Civil das Pessoas Jurídicas, o qual deverá obedecer às normas fixadas para aquele registro, se a sociedade simples adotar um dos tipos de sociedade empresária. Art. 1.151. O registro dos atos sujeitos à formalidade exigida no artigo antecedente será requerido pela pessoa obrigada em lei, e, no caso de omissão ou demora, pelo sócio ou qualquer interessado. § 1 o Os documentos necessários ao registro deverão ser apresentados no prazo de trinta dias, contado da lavratura dos atos respectivos. § 2 o Requerido além do prazo previsto neste artigo, o registro somente produzirá efeito a partir da data de sua concessão. § 3 o As pessoas obrigadas a requerer o registro responderão por perdas e danos, em caso de omissão ou demora. Art. 1.154. O ato sujeito a registro, ressalvadas disposições especiais da lei, não pode, antes do cumprimento das respectivas formalidades, ser oposto a terceiro, salvo prova de que este o conhecia. Parágrafo único. O terceiro não pode alegar ignorância, desde que cumpridas as referidas formalidades.” (grifos meus) Como se vê, os atos societários da pessoa jurídica, para que sejam oponíveis a terceiros, precisam ser registrados na Junta Comercial, haurindo da esperada publicidade os seus efeitos legais. Por outro lado, o agravante cedeu a integralidade de suas cotas a outro sócio, de modo que se aplica também a regra do art. 1.057 do CC/02 “Art. 1.057. Na omissão do contrato, o sócio pode ceder sua quota, total ou parcialmente, a quem seja sócio, independentemente de audiência dos outros, ou a estranho, se não houver oposição de titulares de mais de um quarto do capital social. Parágrafo único. A cessão terá eficácia quanto à sociedade e terceiros, inclusive para os fins do parágrafo único do art. 1.003, a partir da averbação do respectivo instrumento, subscrito pelos sócios anuentes.” (grifos meus) Assim, tendo em vista que o documento apresentado pelo agravante não foi averbado na Junta Comercial, não é oponível contra terceiros, tornando possível o redirecionamento da execução fiscal contra si. Nesse sentido: “EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. CESSÃO. COTAS. PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 1.057 DO CC. CONTRATO. AVERBAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. DEVOLUÇÃO. VALOR ADIMPLIDO. 1. Não viola o art. 535 do CPC o acórdão que, integrado pelo julgado proferido nos embargos de declaração, dirime, de forma expressa, congruente e motivada, as questões suscitadas nas razões recursais. 2. A cessão de cotas só tem eficácia quanto à sociedade depois de averbado o respectivo instrumento contratual (parágrafo único do art. 1.057 do Código Civil). 3. Enquanto não averbado, o contrato pode este ser resolvido, ainda que paga a quantia acordada; todavia, cabe à parte responsável pela não perfectibilização da avença a devolução do valor adimplido monetariamente corrigido. 4. Recurso especial conhecido e parcialmente provido.” (REsp n. 1.011.262 – RN, rel. Min. João Otávio de Noronha, j. em 01/08/2011, grifos meus) Não se desconhece que o STJ possui entendimento consolidado no sentido de que no redirecionamento de execução fiscal o ex-sócio pode se desobrigar pelas dívidas da sociedade caso demonstre não ter agido com excesso de poderes ou infração a lei: “O redirecionamento da execução fiscal, quando fundado na dissolução irregular da pessoa jurídica executada ou na presunção de sua ocorrência, não pode ser autorizado contra o sócio ou o terceiro não sócio que, embora exercesse poderes de gerência ao tempo do fato gerador, sem incorrer em prática de atos com excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato social ou aos estatutos, dela regularmente se retirou e não deu causa à sua posterior dissolução irregular, conforme art. 135, III, do CTN.” (STJ, tema repetitivo 962, grifos meus) No entanto, como se vê, é necessário que seja demonstrada sua retirada regular da sociedade, o que no caso não ocorreu. Além disso, a comprovação de que o agravante efetivamente não atuou com excesso de poderes ou infração a lei da sociedade executada no momento de sua dissolução irregular demandaria dilação probatória, o que não é possível em sede de exceção à pré-executividade, como bem observou o magistrado em sua decisão. Nesse sentido é, inclusive, a Súmula 393 do STJ: “A exceção de pré-executividade é admissível na execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de ofício que não demandem dilação probatória”. Ante o exposto, nego provimento ao agravo de instrumento. É o voto.
O Excelentíssimo Desembargador Federal Nery Junior: Vênias todas à E. Relatora, divirjo de Sua Excelência para dar parcial provimento ao recurso, de modo a determinar a instauração do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica – IDPJ (arts. 133 e seguintes do CPC) para análise da responsabilidade tributária do agravante.
Em sessão realizada no dia 10 de fevereiro de 2021, o C. Órgão Especial desta Corte Regional concluiu o julgamento do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas n. 0017610-97.2016.4.03.0000, fixando a seguinte tese:
“Não cabe instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica nas hipóteses de redirecionamento da execução fiscal desde que fundada, exclusivamente, em responsabilidade tributária nas hipóteses dos artigos 132, 133, I e II e 134 do CTN, sendo o IDPJ indispensável para a comprovação de responsabilidade em decorrência de confusão patrimonial, dissolução irregular, formação de grupo econômico, abuso de direito, excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato ou ao estatuto social (CTN, art. 135, incisos I, II e III), e para a inclusão das pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal, desde que não incluídos na CDA, tudo sem prejuízo do regular andamento da Execução Fiscal em face dos demais coobrigados".
(IRDR n. 0017610-97.2016.4.03.0000. TRF3. Órgão Especial. Julgado em 10.2.2021. Acórdão disponibilizado no DJE em 19.5.2021)
O v. Acórdão foi assim ementado:
DIREITO CIVIL, PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (IRDR) (CPC, ART. 976). DEMANDAS PARADIGMAS: CABIMENTO DO INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA (IDPJ) (CPC, ART. 133) EM EXECUÇÃO FISCAL. TESE FIRMADA PELA COMPATIBILIDADE E INDISPENSABILIDADE DO IDPJ PARA COMPROVAÇÃO DE RESPONSABILIDADE EM DECORRÊNCIA DE CONFUSÃO PATRIMONIAL, DISSOLUÇÃO IRREGULAR, FORMAÇÃO DE GRUPO ECONÔMICO, ABUSO DE DIREITO, EXCESSO DE PODERES OU INFRAÇÃO À LEI, AO CONTRATO OU AO ESTATUTO SOCIAL (CTN, ART. 135, INCISOS I, II E III) E PARA INCLUSÃO DAS PESSOAS QUE TENHAM INTERESSE COMUM NA SITUAÇÃO QUE CONSTITUA O FATO GERADOR DA OBRIGAÇÃO PRINCIPAL, DESDE QUE NÃO INCLUÍDOS NA CDA. PROSSEGUIMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL EM FACE DOS DEMAIS COOBRIGADOS. DESNECESSIDADE DE SUSPENSÃO DOS ATOS EXECUTÓRIOS. LEI DA LIBERDADE ECONÔMICA: LEI 13.874/19.CÓD. CIV. ARTS. 49-A, 50, 264 E 265; CPC-15, ARTS. 7º, 9º , 10, 133 A 137 E 795 E PARÁGRAFO. CTN. ARTS. 124, I E II, 133, INCISOS I E II, 134 E INCISOS, E 135, INCISOS I, II E III. LEI DE EXECUÇÃO FISCAL (6.830/80), ART. 4º, § 2º. LEI 8.212/91, ART. 30, INCISO IX. PORTARIA RFB 2.284/2.010.
1. Preenchidos os requisitos para a admissibilidade do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) diante da repetição de processos contendo controvérsia sobre o cabimento do Incidente de Desconstituição da Personalidade Jurídica (IDPJ) em sede de Execução Fiscal, para a atração de possível responsável tributário.
2. A Lei da Liberdade Econômica (Lei nº 13.874/2.019) reintroduziu no ordenamento jurídico a autonomia patrimonial das pessoas jurídicas, que não podem ser confundidas com os seus sócios, associados, instituidores ou administradores (Cód. Civ. art. 49-A), e também disciplinou as hipóteses de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial (Cód. Civ. art. 50 e seus parágrafos), além de estabelecer paradigma interpretativo de seus postulados "na aplicação e na interpretação do direito civil, empresarial, econômico, urbanístico e do trabalho" (art. 1º, § 1º).
3. A Lei de Execuções Fiscais (Lei nº 6.830/1.980) em seu artigo 4º, § 2º, prevê que "à dívida da Fazenda Pública, de qualquer natureza, aplicam-se as normas relativas à responsabilidade prevista na legislação tributária, civil e comercial", o que remete à aplicação do artigo 50 do Código Civil para a pretensão de redirecionamento da responsabilidade tributária em Execução Fiscal já em curso, dado que as normas civis de assunção de responsabilidade devem ser observadas, e aplicadas, na constituição e exigência da dívida ativa da Fazenda Pública, por expressa determinação legal.
4. Consideradas as garantias processuais e procedimentais tendentes a garantir o contraditório (CPC-15, arts. 7º, 9º e 10), aplicáveis também no seio do Processo de Execução Fiscal, para a determinação, in concreto, das condicionantes postas pelo artigo 50 e seus parágrafos, do Código Civil, não se mostra possível que tal se dê sem que se instaure um incidente em que se confira à parte o amplo direito de defesa, até que se prove, ao fim e ao cabo a presença dos pressupostos da confusão patrimonial e do desvio de finalidade agora legalmente disciplinados, abrangentes das hipóteses de excesso de poderes e infração à lei (vide sobre obrigatoriedade do IDPJ: CPC-15, art. 795, § 4º).
5. Não fossem bastantes as garantias processuais e procedimentais tendentes a garantir o contraditório (CPC-15, arts. 7º, 9º e 10),aplicáveis também no seio do processo de Execução Fiscal, o certo é que não pode, por via judicial, afastar-se o postulado da autonomia patrimonial das pessoas jurídicas sem resguardar o especial direito de ser ouvida a respeito da pretensão, previamente, a exemplo do que já ocorre no âmbito administrativo.
6. O redirecionamento de execução fiscal a pessoa jurídica que integra o mesmo grupo econômico da sociedade empresária originalmente executada, mas que não foi identificada no ato de lançamento, ou cuja responsabilidade não foi apurada em procedimento administrativo tributário prévio à emissão da CDA, depende mesmo da comprovação do abuso de personalidade, caracterizado pelo desvio de finalidade ou confusão patrimonial, tal como consta do art. 50 do Código Civil, daí porque, nessa hipótese, é obrigatória a instauração do incidente de desconsideração da personalidade da pessoa jurídica devedora (CPC-15, art. 133, c.c. art. 795, § 4º).
7. O artigo 124, ao prever que são "solidariamente obrigadas as pessoas que I - tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal: e II - as pessoas expressamente designadas por lei", não autoriza o redirecionamento da responsabilidade tributária de modo automático, dado que o interesse comum, previsto no inciso I, diz respeito ao interesse jurídico das pessoas na relação tributária, que se dá quando os sujeitos, conjuntamente, fazem parte da situação que permite a ocorrência do fato gerador: por isso, só o interesse econômico decorrente da situação não legitima a atribuição da responsabilidade; o inciso II, ao se referir às pessoas expressamente designadas por lei, remete à norma que atribui a responsabilidade tributária; de toda sorte, não se pode conjugar essa norma com outras espécies de responsabilidade, como, p. ex., a civil ou a trabalhista, para o fim de se concluir pela sujeição passiva de pessoa jurídica tão só por compor um grupo econômico que engloba a devedora original, diante da autonomia das pessoas jurídicas (Cód. Civ., art. 49-A).
8. As hipóteses postas no artigo 133, inciso II e artigo 134 do CTN cuidam, em verdade, de responsabilidade subsidiária e não solidária, devendo se observar a técnica do benefício de ordem na exigência do tributo, situação que não demanda a instauração de IDPJ, bastante para tanto a demonstração de execução frustrada em face do devedor originário (contribuinte), trazendo-se à lide executória a pessoa expressamente indicada em lei (responsável).
9. Para as hipóteses contempladas no artigo 135 e incisos do CTN, em que se têm responsabilidades concorrentes, não excludentes, mas não solidárias, exige-se a demonstração da prática de atos específicos definidos na lei que não podem ser inferidos ou deduzidos sem que se estabeleça prévio e indispensável contraditório, impondo-se a instauração do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica, também para a atribuição de responsabilidade inversa (CPC-15, art. 795 e parágrafos).
10. Quanto à suspensão do processo de Execução Fiscal, em razão da instauração do IDPJ, tem-se que a melhor interpretação a ser conferida ao instituto é a de que a Execução Fiscal, em relação aos demais coobrigados já integrados à lide executória não se suspenderá, devendo se instaurar o incidente de modo paralelo, sem prejuízo do regular prosseguimento da pretensão executória, até que advenha a solução sobre a ampliação (ou não) do rol de coobrigados, observando-se a autonomia dos atos executórios em face do devedor originário contra quem se constituiu, validamente, a CDA.
11. Fixa-se, com tais fundamentos, a seguinte tese jurídica: "Não cabe instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica nas hipóteses de redirecionamento da execução fiscal desde que fundada, exclusivamente, em responsabilidade tributária nas hipóteses dos artigos 132, 133, I e II e 134 do CTN, sendo o IDPJ indispensável para a comprovação de responsabilidade em decorrência de confusão patrimonial, dissolução irregular, formação de grupo econômico, abuso de direito, excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato ou ao estatuto social (CTN, art. 135, incisos I, II e III), e para a inclusão das pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal, desde que não incluídos na CDA, tudo sem prejuízo do regular andamento da Execução Fiscal em face dos demais coobrigados".
12. Pedido parcialmente acolhido.
(TRF 3ª Região, ORGÃO ESPECIAL, IncResDemR - INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS - 6 - 0017610-97.2016.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL BAPTISTA PEREIRA, julgado em 10/02/2021, e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/05/2021)
A Tese fixada é expressa em exigir a instauração do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica para comprovação de responsabilidade de terceiro em decorrência de dissolução irregular, formação de grupo econômico e outras hipóteses que delimita.
O Recurso Especial nº 1985935 – SP, interposto pela Fazenda Nacional contra o acórdão proferido pelo Órgão Especial desta E. Corte no IRDR nº 0017610-97.2016.4.03.0000 não foi conhecido pelo E. Ministro Relator. Senão vejamos:
“Os recursos interpostos contra o acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região no julgamento do IRDR 0017610-97.2016.4.03.0000 não são cognoscíveis. A Corte Especial, na apreciação do REsp 1.798.374/DF, adotou o entendimento de que não cabe recurso especial contra acórdão proferido pelo Tribunal de origem que fixa tese jurídica em abstrato em julgamento do IRDR, por ausência do requisito constitucional de cabimento de "causa decidida", mas apenas naquele que aplica a tese fixada, que resolve a lide, desde que observados os demais requisitos constitucionais do art. 105, III, da Constituição Federal e dos dispositivos do Código de Processo Civil que regem o tema. O acórdão foi assim ementado:
(...)
Ante o exposto, com fundamento no art. 253, parágrafo único, I, a, e no art. 255, §4º, I, do RISTJ, conheço do agravo da Associação Brasileira de Direito Processual para não conhecer do seu recurso especial, bem como não conheço do recurso especial da Fazenda Nacional.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília, 13 de setembro de 2023.
Ministro FRANCISCO FALCÃO
Relator”
Por seu turno, o Recurso Extraordinário sequer foi admitido pela Vice-Presidência desta E. Corte Regional.
Uma vez não conhecido o Recurso Especial e não admitido o Recurso Extraordinário, esvaziou-se o argumento de que o Acórdão do Órgão Especial deste Tribunal estaria automaticamente suspenso (art. 987, § 1º, do CPC). Impõe, portanto, a imediata observação da Tese fixada no precedente qualificado desta Corte Regional, por força do art. 927 do CPC, verbis:
Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:
I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;
II - os enunciados de súmula vinculante;
III - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;
IV - os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional;
V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso, de modo a determinar a instauração do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica – IDPJ (arts. 133 e seguintes do CPC) para análise da responsabilidade tributária do agravante.
E M E N T A
AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA SOCIEDADE. REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO PARA O SÓCIO. POSSIBILIDADE. ANTERIOR CESSÃO DAS COTAS NÃO AVERBADA NA JUNTA COMERCIAL. INOPONIBILIDADE PERANTE TERCEIROS. IMPOSSIBILIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA EM SEDE DE EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. RECURSO NÃO PROVIDO.
- Cinge-se a controvérsia em saber se é possível, em sede de exceção de pré-executividade, excluir o sócio do polo passivo de execução fiscal a ele redirecionada, sob o fundamento de não mais pertencer aos quadros da sociedade no momento dos fatos geradores dos tributos e de sua posterior dissolução irregular, tendo como base instrumento de alteração contratual não averbado na junta comercial.
- Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente (Súmula 435-STJ).
- O redirecionamento da execução fiscal, quando fundado na dissolução irregular da pessoa jurídica executada ou na presunção de sua ocorrência, pode ser autorizado contra o sócio ou o terceiro não sócio, com poderes de administração na data em que configurada ou presumida a dissolução irregular, ainda que não tenha exercido poderes de gerência quando ocorrido o fato gerador do tributo não adimplido, conforme art. 135, III, do CTN (STJ, tema repetitivo 981).
- O instrumento de alteração contratual em que se operou a retirada do sócio da sociedade executada, para que seja oponível perante terceiros, deve ser averbado na Junta Comercial (CC/02, arts. 1057, 1151 e 1154).
- Para se eximir de sua responsabilidade, o sócio deve demonstrar que não agiu com excesso de poderes ou infração a lei, se retirando se sociedade de forma regular - o que também exige a averbação do instrumento contratual na Junta Comercial (STJ, tema repetitivo 962).
- Além disso, a exceção de pré-executividade somente é admissível na execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de ofício que não demandem dilação probatória (STJ, Súmula 393).
- Agravo de instrumento não provido.