Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5010127-81.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 20 - DES. FED. MAIRAN MAIA

AGRAVANTE: JACSON SILVA RODRIGUES

Advogado do(a) AGRAVANTE: PAULO BRUNO LETTIERI VARJAO - SP327749-A

AGRAVADO: CONSELHO REGIONAL DE CORRETORES DE IMOVEIS DA 2 REGIAO

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5010127-81.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 20 - DES. FED. MAIRAN MAIA

AGRAVANTE: JACSON SILVA RODRIGUES

Advogado do(a) AGRAVANTE: PAULO BRUNO LETTIERI VARJAO - SP327749-A

AGRAVADO: CONSELHO REGIONAL DE CORRETORES DE IMOVEIS DA 2 REGIAO

OUTROS PARTICIPANTES:

 

R E L A T Ó R I O

Insurge-se a agravante contra decisão que, em ação ordinária, indeferiu o pedido liminar para autorizar sua inscrição no conselho profissional.

Alega, em suma, preencher todos os requisitos legais para realização da inscrição definitiva nos quadros do conselho profissional, não constituindo suas condenações criminais em obstáculo para deferimento da medida.

Processado o feito com a concessão da tutela recursal. A parte agravada apresentou resposta.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5010127-81.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 20 - DES. FED. MAIRAN MAIA

AGRAVANTE: JACSON SILVA RODRIGUES

Advogado do(a) AGRAVANTE: PAULO BRUNO LETTIERI VARJAO - SP327749-A

AGRAVADO: CONSELHO REGIONAL DE CORRETORES DE IMOVEIS DA 2 REGIAO

OUTROS PARTICIPANTES:

 

V O T O

No presente caso, ao apreciar o pedido de tutela recursal formulado pela agravante, assim decidi: 

Nos termos do artigo 995, parágrafo único, do Código de Processo Civil, a suspensão da eficácia de decisão agravada encontra-se condicionada à presença de dois fatores: a relevância da fundamentação e a configuração de situação capaz de resultar risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, que, neste aspecto, deve ser certa e determinada, capaz de comprometer a eficácia da tutela jurisdicional.

Por sua vez, o recurso interposto contra decisão que defere ou indefere pedido de tutela provisória devolve ao órgão julgador apenas o exame da presença ou ausência destes pressupostos legais ensejadores da concessão.

A despeito dos argumentos defendidos pela agravante, a análise dos elementos constantes do processo, em sede de cognição sumária, revela a presença dos pressupostos para a concessão do provimento postulado.

In casu, o Juízo a quo indeferiu o pedido de tutela provisória de urgência, com base no artigo 8º, § 1°, alínea "e", da Resolução n.º 327/1992 do COFECI: 

Art. 8° - A inscrição principal de Corretor de Imóveis se fará mediante requerimento dirigido ao Presidente do CRECI, com menção: 

I - do nome do requerente por extenso e, se for o caso, do nome abreviado que pretenda usar; (NR dada pela Resolução COFECI nº 1065 de 2007) 

II - da nacionalidade, estado civil e filiação; 

III - da data e local de nascimento; 

IV - da residência profissional; 

V - do número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF); 

§ 1° - O requerimento que se refere este artigo será instruído com os seguintes documentos: 

a) - cópia da carteira de identidade; 

b) - cópia do certificado que comprove a quitação com o serviço militar; 

c) - cópia do título de Técnico em Transações Imobiliárias fornecido por estabelecimento de ensino reconhecido pelos órgãos educacionais competentes; 

d) - cópia do título de eleitor; 

e) - declaração do requerente, sob as penas da lei, de que não responde nem respondeu a inquérito criminal ou administrativo, execução civil, processo falimentar e que não tenha títulos protestados no último qüinqüênio, bem como os locais de residências no mesmo período. 

 

No entanto, a Lei n.º 6.530/1978, que regula a profissão de corretor de imóveis, só exige como requisito para deferimento de inscrição no conselho o título de técnico em transação imobiliária,  conforme seus artigos 1º, 2º e 4º, in verbis

Art. 1º O exercício da profissão de Corretor de Imóveis, no território nacional, é regido pelo disposto na presente lei. 

Art 2º O exercício da profissão de Corretor de Imóveis será permitido ao possuidor de título de Técnico em Transações Imobiliárias. 

[…] 

Art 4º A inscrição do Corretor de Imóveis e da pessoa jurídica será objeto de Resolução do Conselho Federal de Corretores de Imóveis.” 

 

Com efeito, a Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso II, preceitua que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Ainda, especificamente acerca da liberdade profissional, dispõe a CF, em seu artigo 5º, inciso XIII que “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelece.” 

As resoluções, como atos infralegais que são, não se prestam a impor comportamentos não disciplinados por lei, haja vista que a função do ato administrativo se restringe a complementá-la, de modo a permitir sua concreção, sem criar cerceamentos de direitos não autorizados por lei. 

Portanto, como não há previsão legal expressa que impeça a inscrição como corretor de imóveis pela existência de ação penal em trâmite ou de condenação criminal anterior, referida restrição imposta com fundamento em Resolução do COFECI revela-se ilegal.

Nesse sentido, é o entendimento deste E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região:

DIREITO ADMINISTRATIVO. REGISTRO PERANTE O CONSELHO PROFISSIONAL. CRECI. EXIGÊNCIA DE DECLARAÇÃO DE NÃO POSSUIR "ANTECEDENTES CRIMINAIS". RESOLUÇÃO COFECI 327/1992. ARTIGOS 5º, XIII, CF; E 2º E 4º DA LEI 6.530/1978. 

1. O indeferimento do registro profissional no CRECI resultou, na espécie, da aplicação do artigo 8º, § 1º, e, da Resolução COFECI 327/1992, que apenas prevê que o pedido deve ser instruído com declaração de que o requerente não responde nem respondeu a inquérito criminal, a indicar, portanto, que "antecedentes criminais" foram elencados como impedimento ao registro profissional. 

2. Sucede, contudo, que a imposição de restrição ao exercício da profissão, que depende de registro em conselho regional, é matéria de lei, ao menos quanto a aspectos gerais da respectiva disciplina, não podendo ser a lacuna preenchida por resoluções sem força normativa exigida na norma constitucional, e não apenas porque a atividade administrativa rege-se pelo princípio da vinculação baseada no princípio da legalidade, como regra geral, como também porque sem o suporte legal específico não se pode sequer avaliar a hipótese de exercício regular de eventual discricionariedade administrativa.  

3. A lei, quando se refere a conceitos indeterminados, como "idoneidade moral" - o que tampouco é o caso dos autos, já que a previsão legal não contempla sequer tal previsão abstrata e genérica - exige o exame, no caso concreto, de cada situação fática específica e, no controle de legalidade, pode ser avistada particularidade que se encerra em juízo de discricionariedade, infenso ao controle judicial.  

4. Todavia, quando restrição ao exercício da profissão não decorre da lei, mas de mero ato normativo, o Tribunal tem decidido pela ilegalidade da decisão administrativa sem sequer adentrar no exame dos fatos em si ("antecedentes criminais"), pois o próprio juízo de gravidade depende do conceito que foi adotado na lei para a qualificação respectiva. Se não existe lei com tal definição, não se implementa a eficácia restritiva que a Constituição Federal permite nos termos do artigo 5º, XIII, que concerne às qualificações profissionais, abrangendo mais do que apenas a formação técnica por grau curricular, como ainda outras que devem, porém, estar expressas na norma legal para que se cogite de legalidade ou discricionariedade 

5. No caso, houve formação em curso técnico em transações imobiliárias, sem que conste da previsão legal a restrição adotada pelo órgão para impedir o registro profissional, o que, sem adentrar no exame do mérito em si dos "antecedentes criminais", é razão suficiente para concessão da ordem.  

6. Apelação e remessa oficial, tida por submetida, desprovidas.  

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5019945-32.2019.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal LUIS CARLOS HIROKI MUTA, julgado em 06/08/2021, Intimação via sistema DATA: 12/08/2021) 

 

“MANDADO DE SEGURANÇA. INSCRIÇÃO EM CONSELHO PROFISSIONAL. EXIGÊNCIA DE DECLARAÇÃO DE ANTECEDENTES CRIMINAIS. EXIGÊNCIA PREVISTA EM NORMA INFRALEGAL. RESOLUÇÃO COFECI Nº 327/92. ILEGALIDADE. 

1. Considerando que a apelante interpôs o competente recurso de apelação na forma e no prazo corretos e que, por conta de pedido de sigilo, as partes no processo não tiveram acesso ao conteúdo do apelo, resta afastada a preliminar para não conhecimento do apelo. 

2. O artigo 5º, inciso XIII, da Constituição da República assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país, dentre outros direitos, o livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão. 

3. A imposição de declaração de antecedentes criminais pelo Conselho Regional de Corretores de Imóveis, por meio de regulamento infralegal, extrapolou os limites legais, bem como impôs restrição ao livre exercício profissional, direito assegurado pela Constituição Federal, de modo que a decisão de indeferimento de pedido de inscrição profissional não poderia ser fundamentada em uma Resolução que contraria a lei. 

4. Com fundamento exclusivo na existência de processo criminal em curso e/u inquéritos policiais não poderia ter sido obstado o livre exercício da profissão de corretor de imóveis, em face do princípio da presunção de inocência, que se consubstancia no direito da pessoa de não ser declarada culpada senão após o trânsito em julgado da decisão condenatória. 

5. Como bem apontou o MM. Juiz Federal quando a concessão da medida liminar, "há que se considerar que o princípio constitucional da presunção de inocência já foi objeto de análise por parte do Supremo Tribunal Federal – STF, em diversas pautas de temas de repercussão geral, entendendo referido princípio deve prevalecer quando da análise de antecedentes criminais, de modo que inquéritos e processos criminais em curso não devem ser considerados para tal fim.” 

6. O fato de a recorrente ter contra si processos criminais em andamento não pode ser impeditivo para a sua inscrição nos quadros do sobredito Conselho Profissional. 

7.  Preliminar rejeitada. Apelação provida.” 

(TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5014009-26.2019.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal MARCELO MESQUITA SARAIVA, julgado em 21/03/2022, Intimação via sistema DATA: 28/03/2022) 

 

Diante do exposto, presentes os requisitos, defiro o pedido.

 

Observa-se que, entre a análise do pedido de tutela recursal e o julgamento do recurso neste momento pela 6ª Turma deste E. TRF, não houve nos autos alteração substancial capaz de influir na decisão proferida "ab initio", adotando-se, pois, os seus fundamentos como razão de decidir. 

Nesse sentido, reveste-se "de plena legitimidade jurídico-constitucional a utilização, pelo Poder Judiciário, da técnica da motivação 'per relationem' que se mostra compatível com o que dispõe o art. 93, IX, da Constituição da República", sendo certo que a "remissão feita pelo magistrado – referindo-se, expressamente, aos fundamentos (de fato e/ou de direito) que deram suporte a anterior decisão (ou, então, a pareceres do Ministério Público ou, ainda, a informações prestadas por órgão apontado como coator) – constitui meio apto a promover a formal incorporação, ao ato decisório, da motivação a que o juiz se reportou como razão de decidir" (AI 825.520 AgR-ED, Rel. Min. Celso de Mello, Segunda Turma). 

Na mesma esteira: AgInt no AREsp nº 919.356, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, DJe: 27/02/2018; AgInt no REsp 1.624.685/MG, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 16/12/2016; AgInt no AREsp 1178297/ES, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, 07/08/2018, DJe 13/08/2018. 

Diante do exposto, voto por dar provimento ao agravo de instrumento.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO ORDINÁRIA – INDEFERIMENTO DE REGISTRO PROFISSIONAL – ANTECEDENTES CRIMINAIS – RESOLUÇÃO COFECI N° 327/1992 – NORMA INFRALEGAL – ILEGALIDADE – OFENSA AO LIVRE EXERCÍCIO PROFISSIONAL - ARTigo 5º, INCiso XIII, E artigo 170, parágrafo ÚNICO, DA CF - RECURSO PROVIDO. 

1. A Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso II, preceitua que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Ainda, especificamente acerca da liberdade profissional, em seu artigo 5º, inciso XIII, estabelece que “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelece".

2. As resoluções, como atos infralegais que são, não se prestam a impor comportamentos não disciplinados por lei, haja vista que a função do ato administrativo se restringe a complementá-la, de modo a permitir sua concreção, sem criar cerceamentos de direitos não autorizados por lei.

3. Portanto, como não há previsão legal expressa que impeça a inscrição como corretor de imóveis pela existência de ação penal em trâmite ou de condenação criminal anterior, referida restrição imposta com fundamento em Resolução do COFECI revela-se ilegal.

4. Agravo de instrumento provido.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma, por unanimidade, deu provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.