AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5017450-40.2023.4.03.0000
RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS
AGRAVANTE: DOMINGOS ANTONIO DE CAETANO, LOURDES LAURIANO DE SOUZA CAETANO
Advogados do(a) AGRAVANTE: MARCELO BUENO FARIA - SP185304-A, PEDRO IVO FREITAS DE SOUZA - SP318109-A, RODRIGO DE FREITAS - SP184482-A
AGRAVADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5017450-40.2023.4.03.0000 RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS AGRAVANTE: DOMINGOS ANTONIO DE CAETANO, LOURDES LAURIANO DE SOUZA CAETANO Advogados do(a) AGRAVANTE: MARCELO BUENO FARIA - SP185304-A, PEDRO IVO FREITAS DE SOUZA - SP318109-A, RODRIGO DE FREITAS - SP184482-A AGRAVADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de agravo de instrumento interposto por Domingos Antônio de Caetano e Lourdes Lauriano de Souza Caetano em face de decisão proferida nos autos da execução extrajudicial nº 0002089-85.2016.4.03.6120, em trâmite perante o Juízo da 1ª Vara Federal de Araraquara/SP, que, ao apreciar os Embargos à Penhora apresentados pelos agravantes, rejeitou a defesa e manteve a constrição da área equivalente a 98,2% do imóvel registrado com a Matrícula nº 26.606 do Cartório de Registro de Imóveis de Matão/SP, declarando a impenhorabilidade do Bem de Família apenas sobre a fração ideal de 1,8% do imóvel (360m²). Informam os agravantes que a decisão agravada desconsiderou que o imóvel consiste em uma pequena propriedade rural indivisível, bem como que os agravantes tiram dela o seu sustento. Pela decisão de ID 276240686, indeferiu-se o pedido de efeito suspensivo. Em face dessa decisão, a agravante opôs embargos de declaração. A CEF ofertou contraminuta aduzindo, em suma, que a impenhorabilidade não atinge a área total do imóvel, e sim apenas a área necessária para a moradia, nos termos do artigo 4º, § 2º, da Lei 8.009/90. É o relatório.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5017450-40.2023.4.03.0000 RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS AGRAVANTE: DOMINGOS ANTONIO DE CAETANO, LOURDES LAURIANO DE SOUZA CAETANO Advogados do(a) AGRAVANTE: MARCELO BUENO FARIA - SP185304-A, PEDRO IVO FREITAS DE SOUZA - SP318109-A, RODRIGO DE FREITAS - SP184482-A AGRAVADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Senhor Desembargador Federal Nelton dos Santos (Relator): Pretendem os agravantes, em suma, obter a reforma da decisão agravada que manteve a constrição da área equivalente a 98,2% do imóvel registrado com a Matrícula nº 26.606 do Cartório de Registro de Imóveis de Matão/SP, declarando a impenhorabilidade do Bem de Família apenas sobre a fração ideal de 1,8% do imóvel (360m²). De início, cumpre ressaltar que a impenhorabilidade do bem de família (artigo 4º, § 2º, da Lei 8.009/90) não se confunde com a proteção dada à pequena propriedade rural (artigo 5º, XXVI, da Constituição Federal). Nesse sentido, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: “RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. CPC/2015. IMPENHORABILIDADE DA PEQUENA PROPRIEDADE RURAL COMO BEM DE FAMÍLIA. REQUISITOS. ÔNUS DA PROVA. QUESTÃO NÃO ENFRENTADA. NECESSIDADE DE RETORNO DOS AUTOS AO TRIBUNAL DE ORIGEM. 1. Controvérsia acerca da impenhorabilidade da pequena propriedade rural como bem de família. 2. Nos termos do art. 4º, § 2º, da Lei 8.009/1990: "Quando a residência familiar constituir-se em imóvel rural, a impenhorabilidade restringir-se-á à sede de moradia, com os respectivos bens móveis, e, nos casos do art. 5º, inciso XXVI, da Constituição, à área limitada como pequena propriedade rural". (sem grifos no original) 3. No caso dos autos, tendo sido afastada a impenhorabilidade da área definida como pequena propriedade, cumpria ao Tribunal de origem apreciar a questão da impenhorabilidade da sede de moradia como bem de família. 4. Necessidade de retorno dos autos ao Tribunal de origem a fim de que seja apreciada a controvérsia acerca da impenhorabilidade da sede de moradia do imóvel rural em questão, nos termos do voto da Min.ª NANCY ANDRIGHI. 5. RECURSO ESPECIAL PROVIDO EM PARTE.” (REsp n. 1.716.425/RS, relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 8/10/2019, DJe de 19/11/2019.) (grifei) No caso em tela, o juízo de origem manteve a impenhorabilidade de parte do imóvel – correspondente a 360 m² --, resguardando, assim, o direito à moradia dos agravantes. De outro giro, a decisão agravada admitiu a penhora do montante remanescente do imóvel, equivalente a 19.620 m². Urge ressaltar, nesse ponto, que para a caracterização de um imóvel como pequena propriedade rural, faz-se necessária a comprovação de que o proprietário desenvolve atividade agrícola, retirando dali o seu sustento e o de sua família. Nesse sentido, vejam-se os seguintes precedentes do Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal: “RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE DE PEQUENA PROPRIEDADE RURAL, DEFINIDA EM LEI E TRABALHADA PELA ENTIDADE FAMILIAR, COM ESCOPO DE GARANTIR A SUA SUBSISTÊNCIA. REJEIÇÃO, PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS, SOB O FUNDAMENTO DE QUE O EXECUTADO NÃO RESIDE NO IMÓVEL E DE QUE O DÉBITO NÃO SE RELACIONA À ATIVIDADE PRODUTIVA. IRRELEVÂNCIA. RECONHECIMENTO. NECESSIDADE DE SE AFERIR, TÃO SOMENTE, SE O BEM INDICADO À CONSTRIÇÃO JUDICIAL CONSTITUI PEQUENA PROPRIEDADE RURAL, NOS TERMOS DA LEI DE REGÊNCIA, E SE A ENTIDADE FAMILIAR ALI DESENVOLVE ATIVIDADE AGRÍCOLA PARA O SEU SUSTENTO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Tomando-se por base o fundamento que orienta a impenhorabilidade da pequena propriedade rural (assegurar o acesso aos meios geradores de renda mínima à subsistência do agricultor e de sua família), não se afigura exigível, segundo o regramento pertinente, que o débito exequendo seja oriundo do atividade produtiva, tampouco que o imóvel sirva de moradia ao executado e de sua família. 2. Considerada a relevância da pequena propriedade rural trabalhada pela entidade familiar, a propiciar a sua subsistência, bem como promover o almejado atendimento à função sócioeconômica, afigurou-se indispensável conferir-lhe ampla proteção. 2.1 O art. 649, VIII, do CPC/1973 (com redação similar, o art. 833, CPC/2015), ao simplesmente reconhecer a impenhorabilidade da pequena propriedade rural, sem especificar a natureza da dívida, acabou por explicitar a exata extensão do comando constitucional em comento, interpretado segundo o princípio hermenêutico da máxima efetividade. 2.2 Se o dispositivo constitucional não admite que se efetive a penhora da pequena propriedade rural para assegurar o pagamento de dívida oriunda da atividade agrícola, ainda que dada em garantia hipotecária (ut REsp 1.368.404/SP, Relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 13/10/2015, DJe 23/11/2015), com mais razão há que reconhecer a impossibilidade de débitos de outra natureza viabilizar a constrição judicial de bem do qual é extraída a subsistência do agricultor e de sua família. 3. O fundamento que orienta a impenhorabilidade do bem de família (rural) não se confunde com aquele que norteia a da pequena propriedade rural, ainda que ambos sejam corolários do princípio maior da dignidade da pessoa humana, sob a vertente da garantia do patrimônio mínimo. O primeiro, destina-se a garantir o direito fundamental à moradia; o segundo, visa assegurar o direito, também fundamental, de acesso aos meios geradores de renda, no caso, o imóvel rural, de onde a família do trabalhador rural, por meio do labor agrícola, obtém seu sustento. 3.1 As normas constitucional e infralegal já citadas estabelecem como requisitos únicos para obstar a constrição judicial sobre a pequena propriedade rural: i) que a dimensão da área seja qualificada como pequena, nos termos da lei de regência; e ii) que a propriedade seja trabalhada pelo agricultor e sua família. Assim, para o reconhecimento da impenhorabilidade da pequena propriedade rural, não se exige que o imóvel seja a moradia do executado, impõe-se, sim, que o bem seja o meio de sustento do executado e de sua família, que ali desenvolverá a atividade agrícola. 3.2 O tratamento legal dispensado à impenhorabilidade da pequena propriedade rural, objeto da presente controvérsia, afigura-se totalmente harmônico com aquele conferido à impenhorabilidade do bem de família (rural). O art. 4º, § 2º, da Lei n. 9.008/1990, que disciplina a impenhorabilidade do bem de família, põe a salvo de eventual contrição judicial a sede da moradia, e, em se tratando de pequena propriedade rural, a área a ela referente. 4. Recurso especial provido.” (REsp n. 1.591.298/RJ, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 14/11/2017, DJe de 21/11/2017.) (grifei) “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA RECURSAL DA PARTE AGRAVANTE. 1. Não há falar em ofensa ao art. 1022 do CPC/15, porquanto todas as questões fundamentais ao deslinde da controvérsia foram apreciadas pelo Tribunal a quo, sendo que não caracteriza omissão ou falta de fundamentação a mera decisão contrária ao interesse da parte, tal como na hipótese dos autos. 2. O STJ firmou orientação no sentido de que a pequena propriedade rural trabalhada pela entidade familiar é impenhorável, mesmo quando oferecida em garantia hipotecária pelos respectivos proprietários. Incidência da Súmula 83/STJ. 3. Agravo interno desprovido.” (AgInt no AREsp n. 1.968.844/SC, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 21/3/2022, DJe de 24/3/2022.) (grifei) “RECURSO ESPECIAL. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. GARANTIA HIPOTECÁRIA. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL. FINANCIAMENTO DA ATIVIDADE PRODUTIVA. IMPENHORABILIDADE. ARTS. 649, VIII, DO CPC, E 5º, XXVI, DA CF/88. PROVIMENTO. 1. A pequena propriedade rural, trabalhada pela família, é impenhorável, ainda que dada pelos proprietários em garantia hipotecária para financiamento da atividade produtiva. Artigos 649, VIII, do Código de Processo Civil, e 5º, XXVI, da Constituição Federal. 2. Recurso provido para afastar a penhora.” (REsp n. 1.368.404/SP, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 13/10/2015, DJe de 23/11/2015.) (grifei) “PROCESSO CIVIL – AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO FISCAL – PEQUENA PROPRIEDADE RURAL – TRABALHADA PELA FAMILIA – ÚNICA FONTE DE SUBSISTÊNCIA - NÃO COMPROVADO I – Não resta cabalmente comprovado nos autos que a pequena propriedade rural de matrícula nº 4.038 no CRI de Ipaussu/SP é trabalhada unicamente pela entidade familiar de Artur Prandin e de que é a única fonte de subsistência da mesma, de forma a estar ungida pela impenhorabilidade previsto no art. 833, VIII do Código de Processo Civil. II – Agravo de instrumento não provido.” (TRF 3ª Região, 2ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5025594-08.2020.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, julgado em 01/06/2023, Intimação via sistema DATA: 04/06/2023) (grifei) No caso em comento, em que pesem as alegações dos agravantes, não restou comprovado o exercício das atividades de locação de cavalos e de plantação de quiabos, de modo que não está constatado que a propriedade seja trabalhada pelo agricultor e sua família. Assim, numa análise perfunctória, cabível neste momento processual, não se vislumbram elementos para reformar a decisão agravada. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento, julgando prejudicados os embargos de declaração. É como voto.
E M E N T A
AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMÓVEL RURAL. IMPENHORABILIDADE. BEM DE FAMÍLIA. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. AGRAVO NÃO PROVIDO. EMBARGOS PREJUDICADOS.
1. A impenhorabilidade do bem de família (artigo 4º, § 2º, da Lei 8.009/90) não se confunde com a proteção dada à pequena propriedade rural (artigo 5º, XXVI, da CF/88). Precedentes do STJ.
2. No caso em tela, o juízo de origem manteve a impenhorabilidade de parte do imóvel, resguardando, assim, o direito à moradia dos agravantes, no entanto admitiu a penhora do montante remanescente do imóvel.
3. Para a caracterização de um imóvel como pequena propriedade rural, faz-se necessária a comprovação de que o proprietário desenvolve atividade agrícola, retirando dali o seu sustento e o de sua família. Precedentes.
4. No caso em comento, em que pesem as alegações dos agravantes, não restou comprovado o exercício das atividades de locação de cavalos e de plantação de quiabos, de modo que não está constatado que a propriedade seja trabalhada pelo agricultor e sua família.
5. Agravo não provido. Embargos de declaração prejudicados.