APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006930-84.2019.4.03.6103
RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE
APELANTE: JULIANO DIAS PIRES
Advogado do(a) APELANTE: FELIPE ENRICO DEL CORTO - SP291407-A
APELADO: CONSELHO REGIONAL DE CORRETORES DE IMOVEIS DA 2 REGIAO
Advogado do(a) APELADO: ANDRE LUIS DE CAMARGO ARANTES - SP222450-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006930-84.2019.4.03.6103 RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE APELANTE: JULIANO DIAS PIRES Advogado do(a) APELANTE: FELIPE ENRICO DEL CORTO - SP291407-A APELADO: CONSELHO REGIONAL DE CORRETORES DE IMOVEIS DA 2 REGIAO Advogado do(a) APELADO: ANDRE LUIS DE CAMARGO ARANTES - SP222450-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação interposto por JULIANO DIAS PIRES, em face da sentença que julgou improcedente o pedido. Em suas razões, aduz o apelante, em síntese, que o Processo Administrativo Disciplinar deveria ter sido instaurado a partir da constatação da suposta conduta, em 29/04/2012, tendo ocorrido a decadência; que no auto de infração consta apenas de forma genérica que o apelante teria facilitado o exercício irregular da profissão, presumindo que, simplesmente por estar no mesmo local, teria colaborado com a Sr. Hélbia, sem sequer descrever especificamente como ou qual seria a conduta dolosa que teria praticado; que jamais foi responsável pela contratação da Sra. Hélbia e tão pouco foi seu supervisor; que não há assinatura no auto de infração. Pugna pela reparação civil pelos danos morais sofridos no patamar de R$20.000,00. Com contrarrazões. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006930-84.2019.4.03.6103 RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE APELANTE: JULIANO DIAS PIRES Advogado do(a) APELANTE: FELIPE ENRICO DEL CORTO - SP291407-A APELADO: CONSELHO REGIONAL DE CORRETORES DE IMOVEIS DA 2 REGIAO Advogado do(a) APELADO: ANDRE LUIS DE CAMARGO ARANTES - SP222450-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O art. 5º, caput, da Constituição Federal, dispõe sobre os direitos e garantias fundamentais da República Federativa do Brasil, e em seu inciso XIII, disciplina a liberdade para exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais estabelecidas na lei. Tratando-se de preceito constitucional de eficácia contida, o art. 5º, XIII, da Constituição de 1988, permite que a legislação ordinária federal fixe critérios razoáveis para o exercício da atividade profissional. Quanto à profissão de corretor de imóveis, a regulamentação legal foi feita pela Lei n.º 6.530/78, a qual dispõe: "Art. 5º. O Conselho Federal e os Conselhos Regionais são órgãos de disciplina e fiscalização do exercício da profissão de Corretor de Imóveis, constituídos em autarquia, dotada de personalidade jurídica de direito público, vinculada ao Ministério do Trabalho, com autonomia administrativa, operacional e financeira. (...) Art. 21. Compete ao Conselho Regional aplicar aos Corretores de Imóveis e pessoas jurídicas as seguintes sanções disciplinares; (...) III - multa; (...)" O poder de polícia conferido ao conselho profissional, de fiscalizar e autuar irregularidades, não possibilita ao órgão impor multas em face de terceiros que não sejam corretores de imóveis, como no caso concreto em que o autor foi autuado e condenado a pagar multa no valor de duas anuidades, por facilitar o exercício ilegal da profissão. A jurisprudência desta Corte: "CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONSELHO REGIONAL DE CORRETORES DE IMÓVEIS (CRECI). EXERCÍCIO PROFISSIONAL POR TERCEIRO NÃO INSCRITO NOS QUADROS. CONTRAVENÇÃO PENAL. IMPOSIÇÃO DE MULTA. IMPOSSIBILIDADE. 1. O livre exercício profissional é um direito fundamental assegurado pela Constituição da República em seu art. 5º, XIII, desde que atendidas às qualificações profissionais que a lei estabelecer. 2. Trata-se de norma de eficácia contida, ou seja, possui aplicabilidade imediata, podendo, contudo, ter seu âmbito de atuação restringido por meio de lei que estabeleça quais os critérios que habilitam o profissional ao desempenho de determinada atividade, sendo competência privativa da União legislar sobre organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões (art. 22, XVI). 3. Em relação aos Corretores de Imóveis, a regulamentação e a definição de direitos e deveres da categoria deram-se por meio da Lei n.º 6.530/78, que, muito embora atribua ao conselho em comento a fiscalização do exercício da profissão, não estabelece a possibilidade de imposição de multas em face de terceiros que não sejam Corretores de Imóveis ou pessoas jurídicas regularmente inscritas nos quadros da autarquia profissional. 4. Restaria ao conselho denunciar a apelada às autoridades, em razão do exercício irregular da profissão, nos termos do art. 47, da Lei das Contravenções Penais (Decreto-Lei n.º 3.688/41), sendo incabível a imposição de multa. 5. Apelação Improvida." (ApCiv 0007668-44.2011.4.03.6102, DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA, TRF3 - SEXTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/11/2013.) "ADMINISTRATIVO. CONSELHO REGIONAL DE IMÓVEIS. MULTA IMPOSTA A PESSOA NÃO INSCRITA EM SEUS QUADROS. ILEGALIDADE. 1. Consolidou-se a jurisprudência, firme no sentido de que não cabe ao Conselho Regional de Corretores de Imóveis aplicar quaisquer sanções a pessoas físicas e jurídicas não inscritas em seus quadros. 2. Não se vê na Lei nº 6.530/78 nenhuma autorização para imposição de qualquer sanção a terceiros, ao contrário, seu art. 21 faz referência à possibilidade de imposição de sanções disciplinares "aos Corretores de imóveis e pessoas jurídicas". 3. Muito embora o art. 5º da mesma Lei atribua aos Conselhos a competência para fiscalizar o exercício da profissão de corretor de imóveis, disso não decorre a competência para impor quaisquer multas. A competência para "fixar" tais multas, isto é, para estabelecer o valor das multas, prevista no art. 16, VII, da Lei nº 6.530/78, tampouco autoriza sua aplicação aos não inscritos. 4. Apelação e remessa oficial, tida por ocorrida, a que se nega provimento." (TRF3, AMS n.º 0000101-70.2008.4.03.6100, Rel. Juiz Convocado Renato Barth, Terceira Turma, j. 05/07/2012, e-DJF3 27/07/2012) "EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL - CONSELHO PROFISSIONAL - CORRETOR DE IMÓVEIS - EXERCÍCIO IRREGULAR DA PROFISSÃO - CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CARACTERIZADO - PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. 1. Sentença não sujeita ao reexame necessário, nos termos do artigo 475, parágrafo 2º do Código de Processo Civil. 2. A dilação probatória está condicionada ao exame de necessidade e da conveniência à instrução do feito. Convencendo-se o Juiz de que a lide comporta julgamento antecipado, com as provas já existentes nos autos, não há falar em cerceamento de defesa. 3. No presente caso, a sentença partiu de ponto incontroverso - o fato de que o apelado não estava inscrito no Conselho Regional de Corretores de Imóveis- para firmar a resolução da lide. 4. A autarquia federal deve-se pautar pelo princípio da legalidade. A Lei 6.530/78, que regulamentou a profissão de Corretor de Imóveis, disciplina o funcionamento de seus órgãos de fiscalização, mas não lhes confere competência para, expressamente, aplicar multa ou outras sanções a pessoa física não inscrita nesse Conselho Profissional. Neste passo, nem se poderia argumentar que a Resolução 316/1991 poderia dar espeque à autuação, em face de malferir o princípio da legalidade, por ultrapassar os limites do poder regulamentar. 5. Também não se poderia cogitar da inscrição, manu militari , de pessoas nesse órgão de classe, porque devem os interessados "possuir título de técnico em transações imobiliárias", nos termos do artigo 2º da lei 6.530/78.. 6. Ainda que o artigo 5º , inciso XIII da Constituição Federal exija o atendimento de qualificações profissionais que a lei estabelecer para o exercício de profissões regulamentadas, não se pode extrair desse comando a imposição das sanções cominadas, por afronta ao princípio da legalidade, como acima anotado. Bem caminha a sentença, ao firmar que o exercício irregular de profissão pode gerar outras conseqüências, como a tipificação de contravenção penal, mas não admitir o exercício de poder de polícia administrativo sem espeque em lei. 7. Apelação a que se nega provimento." (ApCiv 0003432-79.2002.4.03.6000, JUIZ CONVOCADO SANTORO FACCHINI, TRF3 - SEXTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/08/2010 PÁGINA: 493.) Assim, se o conselho-réu, efetivamente, apurou conduta ilegal, de exercício irregular de profissão, teria a prerrogativa de comunicar as autoridades competentes para a apuração de eventual prática da contravenção penal, prevista no art. 47, do Decreto-Lei n.º 3.688/41. Por outro lado, o pleito do apelante quanto a indenização por danos morais não merece prosperar. Embora o autor tenha sofrido penalidade ilegítima na via administrativa, não há comprovação nos autos de constrangimento que ultrapasse a linha do mero aborrecimento. Nas próprias razões recursais o autor alega, de maneira genérica, que "o apelante vem despendendo de tempo produtivo de vida para ver solucionada a injustiça praticada contra ele, razão pela qual merece ser indenizado, inclusive pela angustia e pelo tempo de vida gasto e que não volta mais. Nada obstante, e em especial deve-se considerar o efeito pedagógico da condenação, para inibir que se repita a práticas abusivas e arbitrárias decorrentes de excesso de discricionariedade (...)". Ademais, não há prova, nem menção, de que o autor tenha tido seu nome inserido no cadastro de inadimplentes, ou sofrido execução da multa, circunstâncias que demonstrariam a ocorrência de dano moral in re ipsa. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o dano moral passível de indenização caracteriza-se pela conduta causadora de violação à integridade psíquica ou moral da pessoa humana de forma mais extensa do que o mero aborrecimento ou dissabor. (RESP 1329189/RN, Terceira Turma, relatora Ministra Nancy Andrighi, j. 13/11/2012; DJ 21/11/2012; RESP 959330/ES, Terceira Turma, relator Ministro Sidnei Beneti, j. 9/3/2010, DJ 16/11/2010). A r. sentença deve ser reformada. Por estes fundamentos, dou parcial provimento à apelação, nos termos da fundamentação. É o meu voto.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006930-84.2019.4.03.6103
RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE
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jgb
V O T O - V I S T A
Apelação interposta por Juliano Dias Pires contra sentença que julgou improcedente ação ordinária proposta para obter a declaração de nulidade da decisão administrativa proferida no PAD nº 2016/007821 – CRECI/SP e do auto de infração que ensejou a sua instauração, bem como de danos morais fixados em R$ 20.000,00 e da devolução do valor da multa paga pelo autor ao CRECI, corrigido monetariamente.
A eminente relatoria deu parcial provimento à apelação para considerar a penalidade imposta ilegítima ao fundamento de que: “O poder de polícia conferido ao conselho profissional, de fiscalizar e autuar irregularidades, não possibilita ao órgão impor multas em face de terceiros que não sejam corretores de imóveis, como no caso concreto em que o autor foi autuado e condenado a pagar multa no valor de duas anuidades, por facilitar o exercício ilegal da profissão”.
Pedi vista dos autos para aprofundar o exame do caso concreto.
A ação anulatória, cumulada com pedido de repetição de indébito e de reparação civil, foi proposta no Juizado Especial Federal, que declinou da competência para uma das varas federais (Id. 253320650). Narra o autor na petição inicial que foi lavrado auto de infração sob a alegação de que teria facilitado a terceira pessoa o exercício ilegal da profissão de corretor de imóveis e, em consequência, instaurado o Processo Administrativo Disciplinar nº 2016/007821 perante o Conselho Regional dos Corretores de Imóveis. Alega, em apertada síntese, que não era sua a responsabilidade de coibir a atuação de Helbia Caroline Esteves de Lima, cuja inscrição no respectivo conselho estava vencida, de modo que não lhe pode ser imputada culpa ou dolo pela conduta cuja fiscalização cabia à imobiliária contratante e ao gerente presente no local dos fatos. Assevera, ainda, a ausência de motivação do ato administrativo e a inobservância do devido processo legal, razões pelas quais busca a declaração de nulidade do auto de infração e do PAD, bem como a retificação dos registros históricos do órgão de classe para exclusão de qualquer apontamento disciplinar negativo a ele relacionado e a condenação ao pagamento de R$ 20.000,00, a título de danos morais, bem como à devolução do valor da multa paga (R$1.322,52), atualizado a contar da data do depósito (15/08/2018) até a data do efetivo pagamento.
A sentença julgou improcedentes os pedidos (Id. 253320784) e o autor apresentou a apelação que ora se examina.
Inicialmente, constata-se dos autos que o apelante, Juliano Dias Pires, é corretor de imóveis e não terceiro, conforme indica sua qualificação na inicial, de forma que o CRECI detém a competência para eventual aplicação de sanção disciplinar. É o que se depreende da Lei nº 6.530/1978, que consigna em seu artigo 5º que: “o Conselho Federal e os Conselhos Regionais são órgãos de disciplina e fiscalização do exercício da profissão de Corretor de Imóveis constituídos em autarquia, dotada de personalidade jurídica de direito público, vinculada ao Ministério do Trabalho, com autonomia administrativa, operacional e financeira” e que compete ao conselho regional impor as sanções previstas na lei (artigo 17, inciso VIII).
A mesma lei enumera as vedações impostas a corretores de imóveis e pessoas jurídicas inscritas nos quadros do respectivo conselho, conforme artigo 20. Entre as condutas proibidas está a de: “auxiliar, ou por qualquer meio facilitar, o exercício da profissão aos não inscritos" (inciso II). No artigo 21, por sua vez, são previstas as sanções disciplinares passíveis de aplicação, tais como advertência verbal (inciso I), censura (inciso II), multa (inciso III), suspensão (inciso IV) e até cancelamento da inscrição (Inciso V).
A disciplina legal da profissão de corretor de imóveis é regulamentada pelo Decreto nº 81.871/1978, que dispõe:
Art 38. Constitui infração disciplinar da parte do Corretor de Imóveis:
I - transgredir normas de ética profissional;
II - prejudicar, por dolo ou culpa, os interesses que lhe forem confiados;
III - exercer a profissão quando impedido de fazê-lo ou facilitar, por qualquer meio, o seu exercício aos não inscritos ou impedidos; (grifo nosso).
De acordo com o Auto de Constatação nº 2012/020438 (Id. 253320670, p.02), referente ao Processo Administrativo nº 2012/001646, o fato que foi imputado ao apelante e que originou o processo administrativo disciplinar em questão foi o de que, na condição de corretor supervisor plantonista em local de corretagem de imóveis, facilitou a atuação como corretora de pessoa com inscrição profissional vencida. De todo o exposto, denota-se a legitimidade do réu para impor as sanções disciplinares em questão.
Passa-se, assim, ao exame dos argumentos do apelante no que se refere à higidez do auto de infração e do processo administrativo.
Da alegação de "decadência"
O apelante afirma que a conduta que ensejou a instauração do PAD, em 24.06.2016, ocorreu em 29.04.2012, de forma que deveria ter sido arquivado em razão da decadência, nos termos do artigo 70 da Resolução COFECI n º 146/82.
A alegação foi afastada no âmbito do PAD, conforme parecer do Departamento de Ética e Disciplina, uma vez que: “só após o trânsito em julgado do Processo Administrativo instaurado em face do(a) colaborador(a) se inicia a contagem do prazo para a instauração do Processo Disciplinar, salientando que a facilitação do exercício ilegal da profissão é uma infração que depende da existência da comprovação anterior do exercício irregular, razão pela qual, somos pela procedência do Auto de Infração.”
Sobre o tema o Título IV do Código de Processo Disciplinar (aprovado pela Resolução COFECI nº 146/82) dispõe:
Art. 68 - A punibilidade decorrente de ilícito apurado em processo disciplinar prescreve em 05 (cinco) anos contados da data de verificação de sua ocorrência.
Art. 69 - A lavratura do auto de infração ou do termo de representação interrompe o prazo prescricional de que trata o artigo anterior.
Parágrafo Único - A partir da data da entrega da defesa ou do transcurso do prazo para sua apresentação recomeçará a fluir novo prazo prescricional.
Art. 70 - Será arquivado, “ex officio” ou a requerimento do autuado ou do representado, todo processo disciplinar paralisado há mais de 03 (três) anos, pendente de despacho ou julgamento.
Sem razão o apelante. Considerada a data do fato, qual seja, 29.04.2012 (Auto de Constatação nº 2012/020438 - Id. 253320670, p.02) e a da lavratura do Auto de Infração nº 2016/011211, em 24.06.2016 (Id. 253320645, p. 29), constata-se que não havia decorrido o lustro prescricional. O processo administrativo disciplinar do autor, por sua vez, também foi autuado antes do decurso quinquenal, em 21.07.2016 (Id. 253320645, p. 27). Note-se, ainda, que não se constata a paralisação aludida no artigo 70 da Resolução COFECI nº 146/82, porquanto após a instauração tempestiva do PAD nº 2016/007821, o julgamento foi realizado em menos de dois anos, em 23.05.2018 (Id. 253320645, p. 56).
Da ausência de motivação e nexo de causalidade
O Conselho Federal de Corretores de Imóveis (COFECI) editou a Resolução 146/82, por meio da qual foi aprovado o Código de Processo Disciplinar, que em seu artigo 6º dispõe:
Art. 6º - Verificada a ocorrência da infração, o agente de fiscalização lavrará o respectivo auto, mediante o preenchimento de modelo próprio, numerado, em 03 (três) vias, a máquina ou a tinta, de forma clara e legível, sem entrelinhas ou rasuras, contendo:
a) qualificação e endereço completos do autuado, inclusive suas inscrições no CGC ou CPF e no CRECI;
b) data, hora e local da lavratura;
c) local da ocorrência da infração;
d) dispositivo legal infringido;
e) órgão autuante e seu endereço para apresentação da defesa;
f) nome e assinatura do autuante e do autuado;
g) descrição circunstanciada dos fatos e elementos caracterizadores da infração. (grifo nosso)
Assevera o apelante que a alegação genérica de que teria facilitado o exercício irregular da profissão, sem qualquer descrição de conduta dolosa, não atende às disposições da resolução, de forma que o auto de infração padece de nulidade. Todavia, a leitura dos respectivos autos de constatação e infração demonstra a observância da regra mencionada, com a descrição suficiente à caracterização da infração e da presença do requerente na condição de supervisor plantonista (Id. 253320670, p. 03/04).
Instaurado o Processo Administrativo nº 2012/001646 contra Helbia Caroline Esteves de Lima para apurar o exercício de atividade privativa de corretora estagiária sem o devido credenciamento, o apelante foi notificado e requereu vista dos autos, em 18.06.2012 (Id. 253320670, p. 18), obtida em 22.06.2012 (p. 20). Apresentou manifestação, na qual informou que, na data de 29.04.2012, exercia no plantão de vendas Paesaggio, da Construtora Helbor, a função de COORDENADOR DE PRODUTO PELA IMOBILIÁRIA FOCO IMÓVEIS LTDA, incumbido de: “fornecer apoio operacional do produto para a realização de negócios imobiliários para a imobiliária em que presta serviços como profissional liberal autônomo” e que: “apenas consta no auto de constatação "Supervisor de Plantonista" onde entende-se "Coordenador de Produto", esta sim a forma correta denominar a função exercida pelo Requerente. Na data de 16/06/2012, para a surpresa do Requerente, chegou à sua residência uma carta de ciência referente ao PROCESSO ADMINISTRATIVO N° 2012/001646- AVISO 2278 /12, sob a alegação de ato disciplinar, "por facilitação do exercício profissional de não inscritos" (artigo 38, inciso 111 do Decreto 81.871/78)”. Afirmou, ainda, a sua ausência de responsabilidade, porquanto não detinha autoridade nem competência para fiscalizar as atividades dos demais corretores presentes no empreendimento. (Id. 253320670, p. 34/44)
O parecer do Departamento de Ética e Disciplina entendeu ter havido a infração de dispositivo legal e regimental pela querelada Helbia Caroline Esteves de Lima (Id. 253320670, p. 66). A Comissão responsável concluiu no sentido da aplicação de pena de multa equivalente a 03 anuidades de pessoa física, em 19.11.2013 (Id. 253320670, p. 70/71). Com o trânsito em julgado do feito em que se demonstrou a facilitação de exercício irregular da profissão, determinou-se o encaminhamento dos autos à fiscalização para a lavratura dos autos de infração contra os facilitadores Foco Imóveis LTDA, Flavio Milena Franceschini e Juliano Dias Pires, com notificação via postal (AR), nos termos da Resolução COFECI 146/82 (Id. 253320670, p. 85). Por essa razão, os autos que instruíram o processo administrativo do autor não contêm a sua assinatura, apenas o AR referente ao recebimento das vias anexas ao Ofício DEDIS nº 2627/2016 – sbs (Id. 253320645, p. 33). Destaque-se que referido procedimento tem previsão na Resolução COFECI nº 146/82, que em seu artigo 11, §1º, inciso II, permite: “a remessa da segunda via do auto de infração ao autuado, por via postal, com aviso de recebimento (AR)”.
Instaurado contra o autor o Processo Administrativo Disciplinar nº 2016/007821 (Id. 253320645, p. 27/62), o Auto de Constatação nº 2016/105658, datado de 24.06.2016, descreveu:
“EM RAZÃO DE RESTAR CONFIGURADA A MATERIALIDADE EM FACE DOS DOCUMENTOS JUNTADOS AOS AUTOS E A COMPROVAÇÃO DA FACILITAÇÃO DO EXERCÍCIO ILEGAL DA PROFISSÃO À COLABORADORA, SR (A). HÉLBIA CAROLINE ESTEVES DE UMA, AUTUADO (A) POR ESTE CONSELHO, EM DATA DE 29/04/2012, SOB O AUTO DE INFRAÇÃO No 2012/003522, POR PARTE DO CONSTATADO; ESTÁ SENDO LAVRADO NESTE ATO, CONTRA SI, O COMPETENTE AUTO DE INFRAÇÃO, NOS TERMOS DO ARTIGO 38, INCISO III, DO DECRETO 81.871/78.” (Id. 253320645, p. 28).
O Auto de Infração nº 2016/011211, por sua vez, indica como dispositivo legal infringido o inciso III do artigo 38 do Decreto Federal nº 81.871/78, com a seguinte descrição circunstanciada dos fatos e elementos caracterizadores da infração: “pela facilitação do exercício ilegal da profissão ao colaborador Hélbia Caroline Esteves de Lima” (Id. 253320645, p. 29).
Em 01.08.2016, foi expedido o Ofício DEDIS nº 2627/2016 – sbs, a fim de dar ao autor ciência sobre a instauração do Processo Disciplinar nº 2016/007821 e conceder-lhe o prazo de 15 dias para eventual apresentação de defesa. O aviso de recebimento (AR) da respectiva comunicação foi recebido em 12.08.2016 (Id. 253320645, p. 33) e a defesa, datada de 03.11.2016 foi apresentada junto com documentos (Id. 253320645, p. 35/62). Parecer do Departamento de Ética e Disciplina, no sentido de que constatada a regular instrução do processo e finalizada a instrução (Id. 253320645, p. 53). O julgamento, realizado pela Comissão de Ética e Fiscalização Profissional em 23.05.2018, julgou procedente a autuação e aplicou a pena de censura cumulada com multa de duas anuidades (Id. 253320645, p. 56). Em 25.06.2018, foi expedido o Ofício Pres. nº 12151/18-ipf para intimação do julgamento (Id. 253320645, p. 60), aperfeiçoada em 18.07.2018, consoante termo de requerimento de vistas e ciência dos autos assinado pelo autor (Id. 253320645, p. 61). Não consta a interposição de recurso.
O exame dos autos revela, pois, que os procedimentos administrativos garantiram o exercício da ampla defesa e do contraditório e que não houve vícios na respectiva condução. Destaque-se que não se trata aqui de averiguar a força probante das provas produzidas e a respectiva avaliação pela administração, na medida em que a atuação do Poder Judiciário não alcança o mérito do processo administrativo disciplinar, conforme entendimento pacificado das cortes superiores, mas recai apenas sobre a regularidade do procedimento. Confira-se precedente desta corte:
APELAÇÃO. ADMINISTRATIVO. CONSELHO REGIONAL DE CORRETORES DE IMÓVEIS (CRECI – 2ª Região). PROCESSO ÉTICO-PROFISSIONAL. INOCORRÊNCIA DE IRREGULARIDADES. IMPROCEDÊNCIA. DESPROPORCIONALIDADE DA PENA APLICADA. NÃO CONFIGURAÇÃO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
1. A ausência da notificação válida no processo administrativo torna o lançamento nulo por ofensa aos princípios da ampla defesa e devido processo legal.
2. Contudo, diversamente do alegado pelo apelante de que o órgão fiscalizador teria enviado carta registrada em endereço estranho ao constante da denúncia, motivo que não pôde exercer o direito de se defender. Constata-se que os endereços em que foram encaminhadas as correspondências constam do cadastro do CRECI/SP, de modo que caberia ao apelante manter os dados atualizados junto ao respectivo Conselho.
3. No mais, observa-se que o apelante atestou o recebimento de notificações em ambos os endereços, bem como instaurado Processo Administrativo Disciplinar nº 2012/002660, em 13/06/2012, o apelante teve vista dos autos em 26/07/2012 e deixou transcorrer in albis, o prazo para manifestação, razão pela qual não merece acolhimento as teses relacionadas à inobservância das garantias constitucionais da ampla defesa e contraditório.
4. Quanto ao pedido subsidiário consistente no cancelamento da cassação do registro profissional do Apelante, por ser sanção desproporcional; a referida pretensão depende de juízo de oportunidade e a conveniência da autoridade administrativa, não sendo permitido ao Judiciário apreciar o referido mérito, uma vez que houve a ponderação das circunstâncias específicas atinentes à ação ilícita analisada, com a consideração da gravidade da conduta infracional pelo órgão fiscalizador.
5. No mesmo sentido, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que “a atuação do Poder Judiciário no controle jurisdicional do Processo Administrativo limita-se ao exame da regularidade do procedimento e a legalidade do ato, à luz dos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, sendo-lhe vedada qualquer incursão no mérito administrativo a impedir a análise e valoração das provas constantes no processo disciplinar.” (Precedentes: STJ, RMS 48.636/CE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/08/2016, DJe 12/08/2016).
6. Apelação não provida.
(TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5020967-91.2020.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal MARLI MARQUES FERREIRA, julgado em 25/09/2023, DJEN DATA: 29/09/2023)
Constatada a higidez do processo administrativo disciplinar questionado, resta prejudicada a análise dos pedidos de retificação dos registros históricos do órgão de classe para exclusão de qualquer apontamento disciplinar negativo e de condenação ao pagamento de R$ 20.000,00, a título de danos morais, bem como à devolução do valor da multa paga (R$1.322,52), atualizado a contar da data do depósito (15/08/2018) até a data do efetivo pagamento.
Ante o exposto, divirjo da eminente relatoria para negar provimento à apelação.
É como voto.
ANDRÉ NABARRETE - DESEMBARGADOR FEDERAL
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. CONSELHO REGIONAL DE CORRETORES DE IMÓVEIS. AUTUAÇÃO. MULTA. EXERCÍCIO PROFISSIONAL POR TERCEIRO NÃO INSCRITO NOS QUADROS. CONTRAVENÇÃO PENAL. IMPOSSIBILIDADE DE AUTUAÇÃO. DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
- O art. 5º, caput, da Constituição Federal, dispõe sobre os direitos e garantias fundamentais da República Federativa do Brasil, e em seu inciso XIII, disciplina a liberdade para exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais estabelecidas na lei. Tratando-se de preceito constitucional de eficácia contida, o art. 5º, XIII, da Constituição de 1988, permite que a legislação ordinária federal fixe critérios razoáveis para o exercício da atividade profissional.
- Quanto à profissão de corretor de imóveis, a regulamentação legal foi feita pela Lei n.º 6.530/78.
- O poder de polícia conferido ao conselho profissional, de fiscalizar e autuar irregularidades, não possibilita ao órgão impor multas em face de terceiros que não sejam corretores de imóveis, como no caso concreto em que o autor, zelador de prédio, foi autuado e condenado a pagar multa no valor de três anuidades, por exercício ilegal da profissão. Precedentes jurisprudenciais.
- Se o conselho-réu efetivamente apurou conduta ilegal, de exercício irregular de profissão, teria a prerrogativa de comunicar as autoridades competentes para a apuração de eventual prática da contravenção penal, prevista no art. 47, do Decreto-Lei n.º 3.688/41.
- Por outro lado, embora o autor tenha sofrido penalidade ilegítima na via administrativa, não há comprovação nos autos de constrangimento que ultrapasse a linha do mero aborrecimento. Assim, são indevidos os danos morais.
- Apelação improvida.