Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5022446-81.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

AGRAVANTE: WALDNEY BATISTA DE SOUZA

Advogado do(a) AGRAVANTE: JORCASTA CAETANO BRAGA - SP297262-A

AGRAVADO: UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5022446-81.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

AGRAVANTE: WALDNEY BATISTA DE SOUZA

Advogado do(a) AGRAVANTE: JORCASTA CAETANO BRAGA - SP297262-A

AGRAVADO: UNIÃO FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO: Trata-se de agravo de instrumento interposto por WALDNEY BATISTA DE SOUZA contra decisão proferida nos autos de mandado de segurança impetrado contra UNIÃO FEDERAL e OUTROS.

Alega o agravante, em breve síntese, ser a ordem de suspensão de seus vencimentos ilegal e arbitrária. Afirma ter sido reformado por incapacidade definitiva e irreversível das fileiras do Exército, após o devido processo legal que transitou em julgado em 27/09/2018. Aduz que a nova convocação para inspeção de saúde para revisão de sua reforma viola a segurança jurídica, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Alega que as alterações trazidas pela Lei nº 13.954/2019 não se aplicam ao presente caso. Pugna pela concessão de tutela antecipada com a decretação de nulidade da ordem de comparecimento em inspeção de saúde.

Foi proferida decisão indeferindo a tutela antecipada requerida.

A agravada apresentou contrarrazões.

O Ministério Público Federal ofertou parecer pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5022446-81.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

AGRAVANTE: WALDNEY BATISTA DE SOUZA

Advogado do(a) AGRAVANTE: JORCASTA CAETANO BRAGA - SP297262-A

AGRAVADO: UNIÃO FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO: No presente caso, nenhuma das partes trouxe qualquer argumento apto a infirmar o entendimento já manifestado na decisão que apreciou o pedido antecipação de tutela.

Passo a transcrever os fundamentos da decisão por mim lavrada:

O art. 142, da Constituição de 1988, prevê que as Forças Armadas (constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica) são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, destinando-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem. Nos moldes desse art. 142 § 3º, X, da ordem de 1988 (na redação dada pela Emenda nº 18/1998), os membros das Forças Armadas são denominados militares, sendo que “a lei disporá sobre o ingresso nas Forças Armadas, os limites de idade, a estabilidade e outras condições de transferência do militar para a inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as prerrogativas e outras situações especiais dos militares, consideradas as peculiaridades de suas atividades, inclusive aquelas cumpridas por força de compromissos internacionais e de guerra.”.

O art. 142, §3º, X, da Constituição, delimitou o âmbito da reserva absoluta de lei (ou estrita legalidade) e recepcionou vários diplomas normativos, dentre eles a Lei nº 4.375/1964 (Lei do Serviço Militar), a Lei nº 6.880/1980 (Estatuto dos Militares), e a Lei nº 6.391/1976 (Lei do Pessoal do Exército), com os correspondentes regulamentos. A solução jurídica do problema posto nos autos deve se dar pelos atos normativos vigentes à época da ocorrência do objeto litigioso, razão pela qual são aplicáveis as disposições da Lei nº 13.954/2019 (DOU de 17/12/2019).

Em vista do art. 3º da Lei nº 6.880/1980, os membros das Forças Armadas compreendem servidores na ativa ou na inatividade. Os militares da ativa são: a) de carreira; b) temporários, incorporados ou matriculados para prestação de serviço militar (obrigatório ou voluntário) durante os prazos previstos na legislação e suas eventuais prorrogações; c) componentes da reserva, quando convocados, reincluídos, designados ou mobilizados; d) alunos de órgão de formação de militares da ativa e da reserva; e) em tempo de guerra, todo cidadão brasileiro mobilizado para o serviço ativo nas Forças Armadas. Por sua vez, os militares em inatividade abrangem: a) os da reserva remunerada, quando pertençam à reserva das Forças Armadas e percebam remuneração da União, porém sujeitos, ainda, à prestação de serviço na ativa, mediante convocação ou mobilização; b) os reformados, quando, tendo passado por uma das situações anteriores e estejam dispensados, definitivamente, da prestação de serviço na ativa, mas continuem a perceber remuneração da União; c) os da reserva remunerada e, excepcionalmente, os reformados, que estejam executando tarefa por tempo certo, segundo regulamentação para cada Força Armada.  

O art. 3º da Lei nº 6.391/1976 (Lei do Pessoal do Exército) complementa as disposições do art. 3º da Lei 6.880/1980 no que tange ao pessoal da ativa, mencionando que o militar de carreira é aquele cujo vínculo com o serviço público (sempre voluntário) é permanente, ao passo em que o militar temporário tem vínculo (voluntário ou obrigatório) por prazo determinado para complementação de pessoal em várias áreas militares:

Art. 3º O Pessoal Militar da Ativa pode ser de Carreira ou Temporário.

I - O Militar de Carreira é aquele que, no desempenho voluntário e permanente do serviço militar, tem vitaliciedade assegurada ou presumida.

II - O Militar Temporário é aquele que presta o serviço militar por prazo determinado e destina-se a completar as Armas e os Quadros de Oficiais e as diversas Qualificações Militares de praças, conforme for regulamentado pelo Poder Executivo.

Quanto à duração, o serviço do militar de carreira é permanente, de modo que cessará nas hipóteses descritas na Lei nº 6.880/1980 (dentre elas a reforma). No que concerne ao serviço militar temporário obrigatório inicial, a Lei nº 4.375/1964 estabeleceu o prazo de 12 meses como regra geral em tempo de paz (contados do momento da incorporação), podendo ser reduzido ou ampliado por atos normativos regulamentares da administração militar competente (vale dizer, não se trata de matéria subordinada à reserva absoluta mas sim à reserva relativa de lei):

Art. 5º A obrigação para com o Serviço Militar, em tempo de paz, começa no 1º dia de janeiro do ano em que o cidadão completar 18 (dezoito) anos de idade e subsistirá até 31 de dezembro do ano em que completar 45 (quarenta e cinco) anos.

§ 1º Em tempo de guerra, êsse período poderá ser ampliado, de acôrdo com os interêsses da defesa nacional.

§ 2º Será permitida a prestação do Serviço Militar como voluntário, a partir dos 17 (dezessete) anos de idade.

Art. 6º O Serviço Militar inicial dos incorporados terá a duração normal de 12 (doze) meses.

§ 1º Os Ministros da Guerra, da Marinha e da Aeronáutica poderão reduzir até 2 (dois) meses ou dilatar até 6 (seis) meses a duração do tempo do Serviço Militar inicial dos cidadãos incorporados às respectivas Fôrças Armadas.

§ 2º Mediante autorização do Presidente da República, a duração do tempo do Serviço Militar inicial poderá:

a) ser dilatada por prazo superior a 18 (dezoito) meses, em caso de interêsse nacional;

b) ser reduzida de período superior a 2 (dois) meses desde que solicitada, justificadamente, pelo Ministério Militar interessado.

§ 3º Durante o período de dilação do tempo de Serviço Militar, prevista nos parágrafos anteriores, as praças por ela abrangidas serão consideradas engajadas.

Art. 7º O Serviço Militar dos matriculados em Órgãos de Formação de Reserva terá a duração prevista nos respectivos regulamentos.

Art. 8º A contagem de tempo de Serviço Militar terá início no dia da incorporarão (sic – incorporação).

Parágrafo único. Não será computado como tempo de serviço o período que o incorporado levar no cumprimento de sentença passada em julgado.

(...)

Já a duração do serviço militar temporário voluntário depende dos fundamentos normativos e administrativos da correspondente autorização de ingresso (note-se que o art. 27, §3º, da Lei 4.375/1964, incluído pela Lei nº 13.964/2019, explicitou prazo mínimo e máximo). O período de duração do serviço militar temporário obrigatório e do voluntário pode ser prorrogado, conforme previsto no art. 33 dessa Lei nº 4.375/1964: 

Art. 33. Aos incorporados que concluírem o tempo de serviço a que estiverem obrigados poderá, desde que o requeiram, ser concedida prorrogação desse tempo, uma ou mais vezes, de acordo com a conveniência da Força Armada interessada.

§ 1º As condições de prorrogação serão estabelecidas em ato dos Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica.     

§ 2º Não há direito subjetivo à prorrogação ao final de cada período. 

Assim, o militar temporário integra o efetivo das Forças Armadas em caráter transitório e se submete aos ditames da Lei nº 4.375/1964, da Lei nº 6.880/1980 e demais aplicáveis, sem estabilidade na carreira; após concluir o tempo a que estiver obrigado, poderá pedir prorrogação (uma ou mais vezes), daí permanecendo como engajados ou reengajados. A concessão da prorrogação do tempo de serviço além do previsto está submetida à discricionariedade da autoridade militar competente, cujos limites estão na Constituição, na legislação ordinária e também em atos normativos hierárquicos da administração militar (especialmente do Comando de cada uma das Forças Armadas), respeitados os âmbitos próprios da reserva absoluta (estrita legalidade) ou da reserva relativa de lei (legalidade).

A exclusão do serviço ativo das Forças Armadas (com consequente desligamento e inatividade) pode se dar por vários motivos, elencados no art. 94 da Lei 6.880/1980: transferência para a reserva remunerada (art. 96 e seguintes, podendo ser suspensa na vigência do estado de guerra, estado de sítio, estado de emergência ou em caso de mobilização); reforma (art. 104 e seguintes, marcando o desligamento definitivo); demissão de oficiais (art. 115 e seguintes, com ou sem indenização das despesas efetuadas pela União com a sua preparação, formação ou adaptação); perda de posto e patente (art. 118 e seguintes, em casos de o oficial ser declarado indigno ou incompatível ao oficialato); licenciamento (art. 121 e seguintes, para militares de carreira, da reserva ou temporários, após concluído o tempo de serviço, por conveniência do serviço, ou também a bem da disciplina e outras hipóteses legais); anulação de incorporação ou desincorporação da praça (art. 124, em casos de interrupção do serviço militar ativo previstas na legislação); exclusão da praça a bem da disciplina (art. 125 e seguintes, mesmo que o militar tenha estabilidade assegurada, em caso de infrações descritas na legislação); deserção (art. 128, atrelada à tipificação criminal correspondente); falecimento (art. 129); e extravio (art. 130, em casos de desaparecimento do militar). O marco temporal do desligamento é a publicação do ato oficial correspondente em Diário Oficial, em Boletim ou em Ordem de Serviço de sua organização militar, e não poderá exceder 45 dias da data da primeira publicação oficial; ultrapassado o prazo, o militar será considerado desligado da organização a que estiver vinculado, deixando de contar tempo de serviço, para fins de transferência para a inatividade.

Cuidando da reforma em caso de incapacidade definitiva para o serviço ativo das Forças Armadas, a Lei nº 6.880/1980 prescreve um conjunto de requisitos que variam em razão: de o militar ser de carreira ou temporário (com ou sem estabilidade); da origem do problema incapacitante (decorrente de campanha, de manutenção da ordem pública, de acidente em serviço, ou se os males têm nexo de causalidade com o serviço militar, ou, mesmo não havendo tal nexo, se consta de lista legal de doenças); e de a incapacidade ser para a vida castrense ou também para a vida civil. Na compreensão sistemática dos preceitos da Lei nº 6.880/1980, é necessário observar preceitos nos quais a expressão “incapacidade definitiva” fica restrita apenas ao serviço ativo castrense (porque remanesce capacidade para atividades laborais civis) ou se também alcança a vida civil (quando aparece o termo “inválido”, p. ex., art. 110, §1º, e art. 111, II).

A conjugação desses requisitos para a reforma repercute também no valor a ser pago ao militar. E, descumpridas as exigências para a reforma, o militar será transferido para a reserva, será licenciado, desincorporado (observado o art. 31, §2º da Lei nº 4.375/1964 e demais aplicáveis) ou receberá outra medida prevista na legislação de regência.

Já o art. 112-A, incluído no Estatuto dos Militares pela Lei nº 13.954/2019, estabelece a possibilidade de convocação do militar reformado por incapacidade definitiva ou por invalidez para revisão das condições que ensejaram a reforma, sob pena de suspensão de sua remuneração em caso de recusa a submeter-se à inspeção de saúde a cargo da administração militar.

Nessa esteira, o Decreto nº 10.750/2021 regulamenta o procedimento de revisão de reforma de militares inativos, de carreira ou temporários, definindo que a administração militar poderá convocar para revisão quando houver indícios de que o militar desempenhe atividades incompatíveis com as condições de saúde que ensejaram a sua reforma ou por processo de amostragem.  

 

A decisão agravada foi proferida nos seguintes termos: 

Vistos.

Trata-se de mandado de segurança impetrado por WALDNEY BATISTA DE SOUZA em face do COMANDANTE DA 2ª REGIÃO MILITAR, objetivando obter decisão liminar para que a autoridade impetrada se abstenha de realizar inspeções de saúde e/ou qualquer ato que de revisão da reforma do impetrante obtida através de decisão judicial.

Alega ser CB reformado do Exército Brasileiro a partir do dia 31 de maio de 2004, conforme Portaria 057.SS.1.2./SSIP/2RM, de 11/04/2019.

Relata ter sido reformado das fileiras do exército por incapacidade definitiva e irreversível, em processo judicial transitado em julgado em 27/09/2018, após exaustivo debate jurídico.

A decisão judicial de reforma foi proferida no Processo nº 0000345-81.2004.403.6118, nos termos das normas legais vigentes à época.

Sustenta que, a despeito do trânsito em julgado da demanda, foi notificado pela autoridade impetrada para se submeter a inspeção de saúde para revisão das condições que ensejaram sua reforma.

Defende a ilegalidade do ato, na medida em que o ato jurídico que determinou sua reforma é ato perfeito e válido segundo as normas vigentes à época.

A apreciação do pedido liminar foi postergada para após a vinda das informações.

A autoridade impetrada prestou informações (ID 295705563) defendendo a ausência de demonstração de violação do alegado direito líquido e certo. Sustenta que as pretensões do impetrante não merecem prosperar, na medida em que pretende, mediante decisão judicial, tratamento diverso do previsto em lei, haja vista que todos os atos praticados pela Administração Militar são pautados em observância ao princípio da estrita legalidade. Aponta que, nos termos do §1º, do artigo 112-A, da Lei nº 6.880/1980, “o militar reformado por incapacidade definitiva para o serviço ativo das Forças Armadas ou reformado por invalidez é obrigado, sob pena de suspensão da remuneração, a submeter-se à inspeção de saúde a cargo da Administração Militar”.  Relata que a mera convocação para a realização da inspeção médica não é incompatível com a concessão judicial de reforma, uma vez que, tornando-se militar reformado, deve cumprir as obrigações relativas a esta hipótese de exclusão do serviço ativo das Forças Armadas.

 

É O RELATÓRIO. DECIDO.

 

Examinado o feito, ao menos nesta primeira aproximação, tenho que não assiste razão ao impetrante.

Pretende o impetrante obter provimento jurisdicional para compelir a autoridade impetrada a se abster de realizar inspeções de saúde e/ou qualquer ato de revisão da reforma do impetrante, sob o fundamento de que sua reforma foi obtida através de decisão judicial transitada em julgado.

A sentença juntada no ID 294298182 revela que a União foi condenada a reincorporar o impetrante nas fileiras do Exército e a proceder sua reforma sob o fundamento de que que ele possui incapacidade total e definitiva para o serviço militar.

No mesmo sentido, o acórdão apontou que:

“Restou comprovado que o autor apresenta lesão física definitiva decorrente de acidente sofrido durante a prestação do serviço militar.

Por conseguinte, o servidor militar considerado inválido, definitivamente, para o serviço do Exército em decorrência de acidente ocorrido em serviço fará jus à reforma, nos termos dos artigos 106, II; 108, III e 109 do Estatuto dos Militares.

(...)

Reconhecida a ilegalidade do ato de licenciamento do autor, deve ser reintegrado às Forças Armadas, para então ser reformado com soldo correspondente ao que ocupava, tal como determinado na sentença.”

Ocorre que, nos casos em que se concede reforma de militar, independentemente se concedida administrativamente, ou por intermédio de provimento judicial, por haver total incapacidade para o exercício de qualquer profissão, o beneficiário deve ser submetido à inspeção de saúde para se verificar a permanência das condições que originaram sua reforma.

Assim estabelece a Lei nº 6.880/80:

“Art. 112-A. O Militar reformado por incapacidade definitiva para o serviço ativo das Forças Armadas ou reformado por invalidez poderá ser convocado, por iniciativa da Administração Militar, a qualquer momento, para revisão das condições que ensejaram a reforma.

§1º O militar reformado por incapacidade definitiva para o serviço ativo das Forças Armadas ou reformado por invalidez é obrigado, sob pena de suspensão da remuneração, a submeter-se à inspeção de saúde a cargo da Administração Militar.

§2º Na hipótese da convocação referida no caput deste artigo, os prazos previstos no art. 112 desta Lei serão interrompidos”.

 

No mesmo sentido, o Decreto 10.750/21 que regulamenta os procedimentos para se revisar a manutenção das condições em que se deram a reforma, prevê que:

“Art. 5º O militar, de carreira ou temporário, que não atender à convocação para revisão das condições que ensejaram a sua reforma ou, caso atenda à convocação, que se recusar a se submeter à inspeção de saúde a cargo da administração militar terá os seus proventos de inatividade suspensos até que seja realizada nova inspeção”.

Saliento que o efeito da sentença judicial transitada em julgado não escusa o impetrante do estrito cumprimento das normas legais, até porque a eficácia da sentença mantém-se até quando satisfeitos os requisitos que a fundamentaram.

Posto isto, considerando tudo o mais que dos autos consta, INDEFIRO A TUTELA DE URGÊNCIA requerida.

Oficie-se a autoridade impetrada para ciência da presente decisão.

Ao Ministério Público Federal e, em seguia, conclusos para sentença.

Intimem-se.

No caso dos autos, o agravante, cabo reformado do Exército Brasileiro narra ter sido reformado por incapacidade definitiva a contar de 31/05/2004, em razão de decisão judicial transitada em julgado em 27/09/2018. Afirma que passados cinco anos do término da demanda recebeu notificação da administração militar para que se submeta a nova inspeção de saúde para revisão das condições que ensejaram a sua reforma. Aduz que a nova convocação para inspeção de saúde viola a segurança jurídica, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Alega que as alterações trazidas pela Lei nº 13.954/2019 não se aplicam ao presente caso. Pugna pela concessão de tutela antecipada com a decretação de nulidade da ordem de comparecimento em inspeção de saúde.

Em que pesem as alegações do agravante, tem-se que, nessa primeira análise, não se verifica qualquer ilegalidade do ato exarado pela administração militar. Com efeito, a mera convocação para realização de nova inspeção de saúde não viola a coisa julgada estabelecida no processo que determinou a reforma do agravante (id. 294298182 dos autos subjacentes), notadamente em se tratando de relação jurídica de trato continuado a qual se sujeita a cláusula rebus sic stantibus, de modo que alterado o contexto fático ou jurídico, não há óbice para a revisão do julgado (art. 505, I do CPC).

Nessa mesma toada, são plenamente aplicáveis as alterações trazidas pela Lei nº 13.954/2019, tendo em vista a relação jurídica objeto da presente ação mandamental ser de trato sucessivo, veja-se, nesse sentido, o entendimento do C. STJ e deste C. TRF.

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. MILITAR. ALEGAÇÃO GENÉRICA DE OFENSA AO ART. 535, II, DO CPC/1973. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL SUPOSTAMENTE CONTRARIADO. DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. OFENSA À COISA JULGADA. NÃO OCORRÊNCIA. ART. 471, I, DO CPC/1973. REEXAME DE PROVA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. INCAPACIDADE PARA O SERVIÇO CASTRENSE. REVISÃO. POSSIBILIDADE. CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS ESTABELECIDAS NO ART. 112, §§ 1º E 2º, DA LEI 6.880/1980. AFERIÇÃO. NECESSIDADE DE RETORNO DOS AUTOS AO TRIBUNAL DE ORIGEM.

1. Trata-se, na origem, de ação ordinária ajuizada pela União, cujo objetivo é a revisão do ato administrativo que, em cumprimento à decisão judicial transitada em julgado, concedeu ao réu, ora recorrente, reforma militar por incapacidade para o serviço castrense.

2. "A alegação genérica de violação do artigo 535 do CPC/1973, sem demonstrar qual questão de direito não foi abordada no acórdão recorrido e a sua efetiva relevância para fins de novo julgamento pelo Tribunal de origem, atrai a aplicação do disposto na Súmula 284/STF" (AgInt no REsp 1.774.161/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, DJe 30/4/2019).

3. A ausência de indicação do dispositivo de lei federal supostamente violado importa em deficiência de fundamentação, nos termos da Súmula 284/STF, aplicada por analogia.

4. É firme nesta Corte o entendimento no sentido de que, "nas relações jurídicas continuativas, 'é possível a revisão da decisão transitada em julgado, desde que tenha ocorrido a modificação no estado de fato e de direito à vista do que preceitua o artigo 471, inciso I, do Código de Processo Civil' (AgInt nos EDcl no AREsp 874.169/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/09/2016, DJe 29/09/2016)" (AgInt no AREsp 992.412/RJ, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, DJe 21/8/2018).

5. Diante da recusa do recorrente em submeter-se à perícia médica determinada pelo Juízo a quo - necessária para aferir se a incapacidade para o serviço militar subsistia -, e à luz do princípio da livre apreciação das provas, concluiu o Tribunal de origem que ele não mais estaria incapacitado. A revisão desse entendimento esbarra no óbice da Súmula 7/STJ.

6. O superveniente restabelecimento do militar que havia sido considerado definitivamente incapacitado para o serviço castrense não implica apenas no cancelamento do referido ato administrativo, mas lhe assegura também o direito de "retornar ao serviço ativo ou ser transferido para a reserva remunerada, conforme dispuser regulamentação específica" (art. 112, caput, parte final, da Lei 6.880/1980).

7. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido em parte, para determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem, a fim de que se pronuncie acerca das consequências jurídicas do cancelamento definitivo do ato de reforma militar do ora recorrente, à luz do art. 112, caput, parte final, e §§ 1º e 2º, da Lei 6.880/1980, dando à controvérsia a solução que entender de direito.

(REsp n. 1.513.402/RS, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 24/11/2020, DJe de 30/11/2020.)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. COISA JULGADA MATERIAL. DOENÇA PREEXISTENTE. CAUSA DE PEDIR INCAPAZ DE ALTERAR O QUADRO FÁTICO EXAMINADO NA PRIMEIRA AÇÃO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RECURSO PROVIDO.

I - Nos termos do art. 505, inc. I, do CPC, a coisa julgada material torna imutável a decisão de mérito que transitou em julgado, impossibilitando a modificação do conteúdo do julgamento ainda que em processo diverso, salvo se, “tratando-se de relação jurídica de trato continuado, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito”. Assim, nas ações relativas a relações continuativas, a decisão de mérito é proferida em conformidade com a regra rebus sic stantibus, mantendo-se prevalente enquanto mantidas as mesmas condições de fato e de direito que foram examinadas pelo magistrado ao julgar a lide. (...)

VI- Agravo de instrumento provido, extinguindo-se o processo de origem sem exame do mérito, nos termos do art. 485, inc. V, do CPC.

(TRF 3ª Região, 8ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5028553-20.2018.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal HERBERT CORNELIO PIETER DE BRUYN JUNIOR, julgado em 07/06/2023, DJEN DATA: 15/06/2023)

PREVIDENCIÁRIO. ASSISTENCIAL. PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LOAS. DEFICIÊNCIA NÃO COMPROVADA. AUSÊNCIA DO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS.  INDEVIDA A CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL. APELAÇÃO DESPROVIDA.

(....)

- Nada impede que novo pleito seja formulado caso haja alteração da situação fática, e, por consequência, venha acarretar a deficiência da parte requerente.

 - Isso porque, a ação de concessão de benefício assistencial caracteriza-se por ter como objeto relações de trato sucessivo, que contém implícita a cláusula rebus sic stantibus, de forma que, modificadas as condições fáticas ou jurídicas sobre as quais se formou a coisa julgada material, tem-se nova causa de pedir próxima ou remota.

-  Apelação da parte autora não provida.

(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5002952-12.2023.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal LEILA PAIVA MORRISON, julgado em 23/08/2023, Intimação via sistema DATA: 24/08/2023)                          

Assim, ao menos nessa primeira análise, extrai-se que o agravante não trouxe aos autos elementos suficientes para afastar a presunção de legalidade do ato administrativo, o qual está em consonância com o disposto na legislação militar.

Por conseguinte, ausente qualquer motivo para alteração, entendo que a decisão deve ser mantida.

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento interposto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. MILITAR. REFORMA. REVISÃO. POSSIBILIDADE. CLÁUSULA REBUS SIC STANTIBUS. RELAÇÃO DE TRATO SUCESSIVO.

- O art. 112-A, incluído no Estatuto dos Militares pela Lei nº 13.954/2019, estabelece a possibilidade de convocação do militar reformado por incapacidade definitiva ou por invalidez para revisão das condições que ensejaram a reforma, sob pena de suspensão de sua remuneração em caso de recusa a submeter-se à inspeção de saúde a cargo da administração militar. Nessa esteira, o Decreto nº 10.750/2021 regulamenta o procedimento de revisão de reforma de militares inativos, de carreira ou temporários, definindo que a administração militar poderá convocar para revisão quando houver indícios de que o militar desempenhe atividades incompatíveis com as condições de saúde que ensejaram a sua reforma ou por processo de amostragem.  

- No caso dos autos, o agravante, cabo reformado do Exército Brasileiro narra ter sido reformado por incapacidade definitiva a contar de 31/05/2004, em razão de decisão judicial transitada em julgado em 27/09/2018. Afirma que passados cinco anos do término da demanda recebeu notificação da administração militar para que se submeta a nova inspeção de saúde para revisão das condições que ensejaram a sua reforma. Aduz que a nova convocação para inspeção de saúde viola a segurança jurídica, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Alega que as alterações trazidas pela Lei nº 13.954/2019 não se aplicam ao presente caso. Pugna pela concessão de tutela antecipada com a decretação de nulidade da ordem de comparecimento em inspeção de saúde.

- Não se verifica qualquer ilegalidade do ato exarado pela administração militar. Com efeito, a mera convocação para realização de nova inspeção de saúde não viola a coisa julgada estabelecida no processo que determinou a reforma do agravante, notadamente em se tratando de relação jurídica de trato continuado a qual se sujeita a cláusula rebus sic stantibus, de modo que alterado o contexto fático ou jurídico, não há óbice para a revisão do julgado (art. 505, I do CPC).

- Agravo de instrumento desprovido.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.