APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5005367-02.2022.4.03.6119
RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM GUARULHOS//SP
APELADO: FOOD ITALIA AEROPORTO LTDA
Advogados do(a) APELADO: ANDRE FELIPE DE COIMBRA PINTO FILHO - PE47825-A, BARBARA TENORIO DE ANDRADE OLIVEIRA - PE34462-A, MARIA EDUARDA ALENCAR CAMARA SIMOES - PE24079-A, PAMMELA CHRISTINE LOPES DE OLIVEIRA GALVAO - PE31257-A, TACIANA STANISLAU AFONSO BRADLEY ALVES - PE19130-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5005367-02.2022.4.03.6119 RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM GUARULHOS//SP APELADO: FOOD ITALIA AEROPORTO LTDA Advogados do(a) APELADO: ANDRE FELIPE DE COIMBRA PINTO FILHO - PE47825-A, BARBARA TENORIO DE ANDRADE OLIVEIRA - PE34462-A, MARIA EDUARDA ALENCAR CAMARA SIMOES - PE24079-A, PAMMELA CHRISTINE LOPES DE OLIVEIRA GALVAO - PE31257-A, TACIANA STANISLAU AFONSO BRADLEY ALVES - PE19130-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de remessa necessária e de apelação interposta pela UNIÃO (Fazenda Nacional) contra sentença que, na forma do art. 487, I, concedeu a segurança “para determinar à autoridade impetrada que conceda a adesão ao PERSE para a impetrante para fruição dos benefícios constantes do art. 4º da Lei n. 14.148/2021, afastando o impeditivo de registro no Cadastur desde a data de publicação da lei instituidora, a partir de 18.03.2022, caso este seja o único impeditivo”. O writ foi impetrado por FOOD ITALIA AEROPORTO LTDA, em 27.06.2022, contra ato do DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM GUARULHOS/SP. Pedido de liminar indeferido, consoante decisão ID 266565070. Informações prestadas pela autoridade apontada como coatora (ID 266565079). Pela sentença ID 266565383, o Magistrado sentenciante afastou, preliminarmente, a alegação de ilegitimidade passiva da autoridade coatora, porquanto “a RFB é responsável pela administração dos tributos e contribuições federais objeto dos autos”. Quanto ao mérito, entendeu que “ao Ministério da Economia foi delegada pela Lei n. 14.148/2021 somente a designação dos códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), sendo que a exigência de situação regular no Cadastur, quando da publicação da lei, ou seja, requisito retroativo, estipulado tão somente por ato infralegal, extrapola do poder regulamentar”. Fundamentou, ainda, que “ o cadastro para as empresas do ramo da impetrante era facultativo, mostrando-se, portanto, irrazoável exigir que estivesse tal requisito cumprido quando da instituição da Lei n. 14.148/2021. A parte impetrante comprovou possuir cadastro no Cadastur válido entre 24.05.2022 a 25.05.2024 (ID 255022122) e que seu CNAE está previsto na Portaria, de modo que deve fazer jus à adesão ao PERSE para fins do disposto no art. 4º da Lei n. 14.148/2021”. Desse modo, reconheceu “o direito à adesão ao PERSE para os fins do art. 4º da Lei n. 14.148/2021 a partir de 18.03.2022, ou seja, data a partir da qual passou a vigorar a redação do referido artigo com rejeição do veto pelo Congresso Nacional”. Em suas razões de recorrer (ID 266565387), alega a parte apelante que “a Portaria ME 7.163/2021, ao cumprir a determinação do art. 2º, §2º da lei4 , não criou requisito algum, apenas declarou quais códigos CNAE se enquadram na definição de setor de eventos e exigiu o registro regular no CADASTUR para as pessoas jurídicas que prestam serviços turísticos (e que fazem parte do setor de eventos). A exigência da Portaria, ressalte-se, é válida tanto para as transações realizadas com base no art. 3º, como para obtenção do benefício de alíquota zero previsto no art. 4º”. Ademais, “e o registro prévio no CADASTUR é exigência legal que decorre não apenas da aludida Portaria, mas também da legislação que rege o Setor de Turismo, qual seja, a Lei 11.771/2008, que dispõe sobre a Política Nacional de Turismo e estabelece, em seu art. 22, a necessidade do CADASTUR”. Sustenta, ainda, que “por meio do CADASTUR – repita-se – que se comprova que o negócio mantido é regularizado e autorizado pelo órgão público competente; a mera apresentação do CNAE, código de sete números que simplesmente define a atividade principal da empresa, não supre tal exigência. Por isso que a Portaria ME 7.163/2021 fez essa exigência”. Sendo assim, “permitir a dado contribuinte, que não exercia atividade ligada ao setor de eventos no momento da edição da Lei 14.148/2021 e, portanto, durante as restrições impostas pela pandemia, usufruir do programa, equivale a desconsiderar toda a finalidade e regramento do instituto em tela, o que não se pode admitir, mormente quando se tem vista que se está diante de benefício fiscal, e não de direito subjetivo dos contribuintes”. Aduz que não a exigência em testilha não ofende ao princípio da isonomia, pois “o simples fato de pertencerem ao mesmo setor não é suficiente para equiparar aqueles que estão regulares dos que não estão. Estar na mesma situação não é, apenas, pertencer ao mesmo setor, como visto”. Ademais, em atenção aos princípios da legalidade e separação dos poderes, não é dado ao Judiciário estender a benesse em questão para além do previsto, tampouco substituir a regulamentação da Portaria. Sendo assim, “para obtenção desse benefício específico é preciso que a empresa esteja registrada no CADASTUR na mesma data (18/03/2022), pois não faz sentido exigir que estivesse cadastrada desde a primeira publicação da lei – o que somente se exige para o gozo dos benefícios que já estavam em vigor desde a publicação original da lei”. Por fim, pretende o prequestionamento expresso dos seguintes dispositivos: “arts. 2º; 5º, caput, I; 60, §4º, III e 150, II, §6º da CF; os arts. 97, inciso VI e 155-A do CTN; os arts. 2º, §2º e 3º, §2º, I da Lei 14.148/2021; os arts. 21, 22, 33, I, 34 e 36 da Lei 11.771/2008; art. 1º, caput e §4º da LINDB e o art. 1º, §2º da Portaria ME 7.163/2021”. Contrarrazões recursais apresentadas pela apelada (ID 266565390). Manifestação do Parquet Federal (ID 267175906) no sentido da desnecessidade de sua intervenção no feito. É o relatório.
EXMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA: Com a devida vênia, divirjo do Sr. Relator para dar provimento à apelação e à remessa oficial. Instituído pela Lei 14.148/2021, o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos - PERSE estabelece ações emergenciais e temporárias destinadas ao setor de eventos para compensar os efeitos decorrentes das medidas de combate à pandemia da COVID/19. Dentre os benefícios fiscais, está a redução para zero, pelo prazo de 60 meses, das alíquotas de PIS, COFINS, CSLL e IRPJ devidos pelas pessoas jurídicas que exercem as atividades econômicas elencadas. Confira-se: Assim disciplina a Lei nº 11.771/2008, que dispõe sobre a Política Nacional de Turismo: Art. 21. Consideram-se prestadores de serviços turísticos, para os fins desta Lei, as sociedades empresárias, sociedades simples, os empresários individuais e os serviços sociais autônomos que prestem serviços turísticos remunerados e que exerçam as seguintes atividades econômicas relacionadas à cadeia produtiva do turismo: Art. 33. São direitos dos prestadores de serviços turísticos cadastrados no Ministério do Turismo, resguardadas as diretrizes da Política Nacional de Turismo, na forma desta Lei: O legislador expressamente definiu quais são atividades típicas da "cadeia produtiva do turismo" (caput do art. 21), cujo cadastro no Ministério do Turismo é obrigatório, e quais são as atividades equiparadas (parágrafo único do art. 21), que podem se registrar no CADASTUR, cujo cadastro é obrigatório para fins de acesso a programas de apoio e outros benefícios legais (art. 33, I). Por exigência do § 2º, do art. 2º da Lei 14.148/2021, o Ministério da Economia editou a Portaria ME nº 7.163/2021, trazendo os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE considerados do setor de eventos, definindo no Anexo I as atividades econômicas que estão enquadradas no PERSE, e no Anexo II as atividades cujo enquadramento é permitido, desde que na data da publicação da Lei nº 14.148/2021, estivessem registradas no Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos - CADASTUR. Portanto, verifica-se que a exigência de inscrição prévia no CADASTUR para usufruir dos benefícios do PERSE não se mostra desarrazoada, na medida em que as atividades descritas nos incisos do parágrafo único do art. 21 da Lei 11.771/2008 (como restaurantes e bares, por exemplo) não são, necessariamente, qualificadas como pertencentes ao setor turístico. Tanto é que a apelante não está registrada no CADASTUR, embora o cadastro já fosse obrigatório aos prestadores de serviços tipicamente turísticos e efetivamente atuantes (art. 22). Assim, a Portaria ME 7.163/2021 não extrapola as disposições das Leis 14.148/2021 e 11.771/2008, apenas possibilita a adesão ao PERSE de pessoas jurídicas que exercem atividades que não são típicas do setor de eventos, mas podem nele atuar, para o que se exige o registro no CADASTUR. Não se identifica, portanto, que a norma regulamentar apresente ilegalidade ou abuso a atrair a interferência do Poder Judiciário. É como tem julgado esta Corte em casos semelhantes: Em face do exposto, pedindo vênia ao Sr. Relator, dou provimento à apelação e à remessa oficial. É o voto.
Art. 2º Fica instituído o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), com o objetivo de criar condições para que o setor de eventos possa mitigar as perdas oriundas do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020.
§ 1º Para os efeitos desta Lei, consideram-se pertencentes ao setor de eventos as pessoas jurídicas, inclusive entidades sem fins lucrativos, que exercem as seguintes atividades econômicas, direta ou indiretamente:
I - realização ou comercialização de congressos, feiras, eventos esportivos, sociais, promocionais ou culturais, feiras de negócios, shows, festas, festivais, simpósios ou espetáculos em geral, casas de eventos, buffets sociais e infantis, casas noturnas e casas de espetáculos;
II - hotelaria em geral;
III - administração de salas de exibição cinematográfica; e
IV - prestação de serviços turísticos, conforme o art. 21 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.
§ 2º Ato do Ministério da Economia publicará os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que se enquadram na definição de setor de eventos referida no § 1º deste artigo.
I - meios de hospedagem;
II - agências de turismo;
III - transportadoras turísticas;
IV - organizadoras de eventos;
V - parques temáticos; e
VI - acampamentos turísticos.
Parágrafo único. Poderão ser cadastradas no Ministério do Turismo, atendidas as condições próprias, as sociedades empresárias que prestem os seguintes serviços:
I - restaurantes, cafeterias, bares e similares;
II - centros ou locais destinados a convenções e/ou a feiras e a exposições e similares;
III - parques temáticos aquáticos e empreendimentos dotados de equipamentos de entretenimento e lazer;
IV - marinas e empreendimentos de apoio ao turismo náutico ou à pesca desportiva;
V - casas de espetáculos e equipamentos de animação turística;
VI - organizadores, promotores e prestadores de serviços de infra-estrutura, locação de equipamentos e montadoras de feiras de negócios, exposições e eventos;
VII - locadoras de veículos para turistas; e
VIII - prestadores de serviços especializados na realização e promoção das diversas modalidades dos segmentos turísticos, inclusive atrações turísticas e empresas de planejamento, bem como a prática de suas atividades.
Art. 22. Os prestadores de serviços turísticos estão obrigados ao cadastro no Ministério do Turismo, na forma e nas condições fixadas nesta Lei e na sua regulamentação.
§ 1º As filiais são igualmente sujeitas ao cadastro no Ministério do Turismo, exceto no caso de estande de serviço de agências de turismo instalado em local destinado a abrigar evento de caráter temporário e cujo funcionamento se restrinja ao período de sua realização.
§ 2º O Ministério do Turismo expedirá certificado para cada cadastro deferido, inclusive de filiais, correspondente ao objeto das atividades turísticas a serem exercidas.
§ 3º Somente poderão prestar serviços de turismo a terceiros, ou intermediá-los, os prestadores de serviços turísticos referidos neste artigo quando devidamente cadastrados no Ministério do Turismo.
§ 4o O cadastro terá validade de 2 (dois) anos, contados da data de emissão do certificado.
§ 5o O disposto neste artigo não se aplica aos serviços de transporte aéreo.
(...)
I - o acesso a programas de apoio, financiamentos ou outros benefícios constantes da legislação de fomento ao turismo;
AGRAVO INTERNO. MANDADO DE SEGURANÇA. ADESÃO AO PERSE. PROGRAMA EMERGENCIAL DE RETOMADA DO SETOR DE EVENTOS. PORTARIA ME Nº 7.163/2021. INSCRIÇÃO PRÉVIA NO CADASTUR. REQUISITO NÃO ATENDIDO. LIMINAR SATISFATIVA. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.
1. Na via estreita do mandado de segurança é exigida a demonstração, de plano, do direito líquido e certo tido como violado, não se comportando fase instrutória. No caso em tela, não se pode imputar à autoridade impetrada qualquer ilegalidade, porquanto observada a normatização própria do caso.
2. É incontroverso que não foi observado o cumprimento de todos os requisitos para adesão ao Programa em comento. O contribuinte não observou os requisitos da Portaria ME nº 7.163/2021 ao formalizar o pedido de benefício do PERSE. Alega, contudo, que a regulamentação contida na referida Portaria é ilegal, porquanto na lei regulamentadora – Lei nº 14.148/21 não há previsão de inscrição no CADASTUR até a respectiva data de entrada em vigor.
3. Se o contribuinte adere a um programa emergencial de apoio, deve submeter-se a suas regras. E ao Judiciário não cabe incursionar nos meandros do programa para alterar as regras que vigem, desequilibrando a relação em favor do constituinte, a uma porque o Juiz não é legislador positivo (STF: ARE 1307729 AgR, Relator(a): Roberto Barroso, Primeira Turma, julgado em 03/05/2021, DJe-087, publicado em 07-05-2021), a duas porque não pode de qualquer modo invadir o espaço de competência dos órgãos do Poder Executivo.
4. O referido programa – PERSE, sujeita-se em primeiro lugar ao princípio da estrita legalidade e se caracteriza por sua natureza de adesão; ao contribuinte só resta anuir com os termos instituídos, descabendo qualquer ingerência dele – ou do Judiciário, sob pena de afronta à separação de poderes – nas cláusulas do favor concedido. Trata-se, portanto, de uma opção do contribuinte, que, ao aderir ao benefício, fica sujeito às suas determinações.
5. Como confessado pela própria agravante, a inscrição no CADASATUR somente foi efetivada no dia 01.04.2022, fora do período aceito pela portaria regulamentadora. Embora não haja expressa previsão do período na Lei 14.148/2021, em seu art. 3º, §2º, I, a lei deixa claro que a transação “poderá ser realizada por adesão, na forma e nas condições constantes da regulamentação específica...”.
6. A lei não regulamentou todos os requisitos e pormenores necessários à adesão, ao programa, deixando isso a cargo de regulamentação específica, o que foi feito na Portaria ME nº 7.163/2021. Assim, diante da existência de norma infralegal que expressamente disciplina em pormenores os critérios de adesão ao PERSE, sem qualquer ilegalidade ou inconstitucionalidade aparente, descabe a invocação de princípios para se safar do cumprimento de determinações da Portaria.
7. Agravo interno desprovido.
(TRF 3ª Região, 6ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5015579-09.2022.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 29/08/2022, Intimação via sistema DATA: 01/09/2022)
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5005367-02.2022.4.03.6119
RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM GUARULHOS//SP
APELADO: FOOD ITALIA AEROPORTO LTDA
Advogados do(a) APELADO: ANDRE FELIPE DE COIMBRA PINTO FILHO - PE47825-A, BARBARA TENORIO DE ANDRADE OLIVEIRA - PE34462-A, MARIA EDUARDA ALENCAR CAMARA SIMOES - PE24079-A, PAMMELA CHRISTINE LOPES DE OLIVEIRA GALVAO - PE31257-A, TACIANA STANISLAU AFONSO BRADLEY ALVES - PE19130-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, devem ser conhecidas a remessa necessária e a apelação.
A sentença não comporta retoques.
Dispõe a Lei n. 14.148/2021 ("Lei Perse" - Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos):
Art. 2º Fica instituído o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), com o objetivo de criar condições para que o setor de eventos possa mitigar as perdas oriundas do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020.
§ 1º Para os efeitos desta Lei, consideram-se pertencentes ao setor de eventos as pessoas jurídicas, inclusive entidades sem fins lucrativos, que exercem as seguintes atividades econômicas, direta ou indiretamente:
I - realização ou comercialização de congressos, feiras, eventos esportivos, sociais, promocionais ou culturais, feiras de negócios, shows, festas, festivais, simpósios ou espetáculos em geral, casas de eventos, buffets sociais e infantis, casas noturnas e casas de espetáculos;
II - hotelaria em geral;
III - administração de salas de exibição cinematográfica; e
IV - prestação de serviços turísticos, conforme o art. 21 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.
§ 2º Ato do Ministério da Economia publicará os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que se enquadram na definição de setor de eventos referida no § 1º deste artigo.
(...)
Art. 4º Ficam reduzidas a 0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta Lei, as alíquotas dos seguintes tributos incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas de que trata o art. 2º desta Lei:
I - Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Contribuição PIS/Pasep);
II - Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins);
III - Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); e
IV - Imposto sobre a Renda das Pessoas Juridicas (IRPJ).”
Com efeito, a Lei n. 14.148, de 3.5.2021 trouxe importantes benefícios fiscais ao setor de eventos como forma de mitigar os danos causados pela pandemia da COVID19, trazendo ações emergenciais e temporárias destinadas a essa área empresarial.
O aludido diploma legal autorizou, por prazo limitado, a redução da alíquota dos tributos que elenca para zero. Registre-se que a hipótese não é de isenção ou não incidência, mas de incidência de alíquota zero, pelo prazo que fixa.
A lei, ainda, delegou ao Ministério da Economia a publicação dos códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que se enquadram na definição de setor de eventos.
Em razão dessa delegação, foi editada a Portaria n. 7163/2021 que incluiu as atividades exercidas pela autora quando considerada prestadora de serviços turísticos, conforme art. 21 da Lei 11.771, de 17/09/2008.
A referida portaria previu: “As pessoas jurídicas que exercem as atividades econômicas relacionadas no Anexo II a esta Portaria poderão se enquadrar no Perse desde que, na data de publicação da Lei nº 14.148, de 2021, sua inscrição já estivesse em situação regular no Cadastur, nos termos do art. 21 e do art. 22 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.” (art. 1º, § 2º). (grifos)
A Lei n. 11.771/2008, que depôs sobre a Política Nacional de Turismo, definiu as atribuições do Governo Federal no planejamento, desenvolvimento e estímulo ao setor turístico:
Art. 21. Consideram-se prestadores de serviços turísticos, para os fins desta Lei, as sociedades empresárias, sociedades simples, os empresários individuais e os serviços sociais autônomos que prestem serviços turísticos remunerados e que exerçam as seguintes atividades econômicas relacionadas à cadeia produtiva do turismo:
I - meios de hospedagem;
II - agências de turismo;
III - transportadoras turísticas;
IV - organizadoras de eventos;
V - parques temáticos; e
VI - acampamentos turísticos.
Parágrafo único. Poderão ser cadastradas no Ministério do Turismo, atendidas as condições próprias, as sociedades empresárias que prestem os seguintes serviços:
I - restaurantes, cafeterias, bares e similares;
II - centros ou locais destinados a convenções e/ou a feiras e a exposições e similares;
III - parques temáticos aquáticos e empreendimentos dotados de equipamentos de entretenimento e lazer;
IV - marinas e empreendimentos de apoio ao turismo náutico ou à pesca desportiva;
V - casas de espetáculos e equipamentos de animação turística;
VI - organizadores, promotores e prestadores de serviços de infra-estrutura, locação de equipamentos e montadoras de feiras de negócios, exposições e eventos;
VII - locadoras de veículos para turistas; e
VIII - prestadores de serviços especializados na realização e promoção das diversas modalidades dos segmentos turísticos, inclusive atrações turísticas e empresas de planejamento, bem como a prática de suas atividades.
Art. 22. Os prestadores de serviços turísticos estão obrigados ao cadastro no Ministério do Turismo, na forma e nas condições fixadas nesta Lei e na sua regulamentação.
§ 1o As filiais são igualmente sujeitas ao cadastro no Ministério do Turismo, exceto no caso de estande de serviço de agências de turismo instalado em local destinado a abrigar evento de caráter temporário e cujo funcionamento se restrinja ao período de sua realização.
§ 2o O Ministério do Turismo expedirá certificado para cada cadastro deferido, inclusive de filiais, correspondente ao objeto das atividades turísticas a serem exercidas.
§ 3o Somente poderão prestar serviços de turismo a terceiros, ou intermediá-los, os prestadores de serviços turísticos referidos neste artigo quando devidamente cadastrados no Ministério do Turismo.
§ 4o O cadastro terá validade de 2 (dois) anos, contados da data de emissão do certificado.
§ 5o O disposto neste artigo não se aplica aos serviços de transporte aéreo.
Logo, em que pese não desconhecer a existência de julgados desta Corte em sentido contrário, tenho que a imposição do cadastro (na hipótese, no Cadastur), para gozo da incidência da alíquota zero, decorreu de ato infralegal e não da lei estipuladora do benefício fiscal.
Ademais, tornou faculdade em condição obrigatória para a concessão da benesse a partir da edição da portaria.
Vale lembrar que o Ministério da Economia não possuía capacidade normativa para instituir a obrigação cadastral, excedendo a delegação concedida pela lei. Se a lei instituidora do benefício não o restringiu às empresas inscritas no Cadastur, não cabe ao ato infralegal limitar seu alcance, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade.
Frise-se, admitir que uma portaria possa inovar, criando uma obrigação para o contribuinte que não foi prevista em lei, importa violação ao disposto no art. 100, do CTN, pois desborda dos estreitos limites do poder regulamentar conferidos à Administração Fiscal.
Convém ressaltar, noutro giro, que a Medida Provisória nº 1.147/2022, de 22.12.22, alterou o art. 4º da Lei nº 14.148/2021, restringindo o benefício da alíquota zero, de modo que apenas os resultados das atividades relacionadas no novo texto (a serem detalhadas em portaria editada pelo Ministério da Economia) poderiam ser alvo do benefício fiscal, não mais sendo atingido todo o resultado auferido pela pessoa jurídica.
Posteriormente, com a edição da Lei n. 14.592, de 30 de maio de 2023, lei de conversão da Medida Provisória nº 1.147/2022, passou-se a estabelecer a necessidade de prévio registro no CADASTUR como requisito prévio para inscrição no PERSE. Confira-se:
“Art. 1º O art. 4º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021, passa a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 4º Ficam reduzidas a 0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta Lei, as alíquotas dos seguintes tributos, incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas pertencentes ao setor de eventos abrangendo as seguintes atividades econômicas, com os respectivos códigos da CNAE: hotéis (5510-8/01); apart-hotéis (5510-8/02); albergues, exceto assistenciais (5590-6/01); campings (5590-6/02), pensões (alojamento) (5590-6/03); outros alojamentos não especificados anteriormente (5590-6/99); serviços de alimentação para eventos e recepções - bufê (5620-1/02); produtora de filmes para publicidade (5911-1/02); atividades de exibição cinematográfica (5914-6/00); criação de estandes para feiras e exposições (7319-0/01); atividades de produção de fotografias, exceto aérea e submarina (7420-0/01); filmagem de festas e eventos (7420-0/04); agenciamento de profissionais para atividades esportivas, culturais e artísticas (7490-1/05); aluguel de equipamentos recreativos e esportivos (7721-7/00); aluguel de palcos, coberturas e outras estruturas de uso temporário, exceto andaimes (7739-0/03); serviços de reservas e outros serviços de turismo não especificados anteriormente (7990-2/00); serviços de organização de feiras, congressos, exposições e festas (8230-0/01); casas de festas e eventos (8230-0/02); produção teatral (9001-9/01); produção musical (9001-9/02); produção de espetáculos de dança (9001-9/03); produção de espetáculos circenses, de marionetes e similares (9001-9/04); atividades de sonorização e de iluminação (9001-9/06); artes cênicas, espetáculos e atividades complementares não especificadas anteriormente (9001-9/99); gestão de espaços para artes cênicas, espetáculos e outras atividades artísticas (9003-5/00); produção e promoção de eventos esportivos (9319-1/01); discotecas, danceterias, salões de dança e similares (9329-8/01); serviço de transporte de passageiros - locação de automóveis com motorista (4923-0/02); transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, municipal (4929-9/01); transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, intermunicipal, interestadual e internacional (4929-9/02); organização de excursões em veículos rodoviários próprios, municipal (4929-9/03); organização de excursões em veículos rodoviários próprios, intermunicipal, interestadual e internacional (4929-9/04); transporte marítimo de cabotagem - passageiros (5011-4/02); transporte marítimo de longo curso - passageiros (5012-2/02); transporte aquaviário para passeios turísticos (5099-8/01); restaurantes e similares (5611-2/01); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, sem entretenimento (5611-2/04); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, com entretenimento (5611-2/05); agências de viagem (7911-2/00); operadores turísticos (7912-1/00); atividades de museus e de exploração de lugares e prédios históricos e atrações similares (9102-3/01); atividades de jardins botânicos, zoológicos, parques nacionais, reservas ecológicas e áreas de proteção ambiental (9103-1/00); parques de diversão e parques temáticos (9321-2/00); atividades de organizações associativas ligadas à cultura e à arte (9493-6/00):
(...)
§ 4º Somente as pessoas jurídicas, inclusive as entidades sem fins lucrativos, que já exerciam, em 18 de março de 2022, as atividades econômicas de que trata este artigo poderão usufruir do benefício.
§ 5º Terão direito à fruição de que trata este artigo, condicionada à regularidade, em 18 de março de 2022, de sua situação perante o Cadastro dos Prestadores de Serviços Turísticos (Cadastur), nos termos dos arts. 21 e 22 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008 (Política Nacional de Turismo), as pessoas jurídicas que exercem as seguintes atividades econômicas: serviço de transporte de passageiros - locação de automóveis com motorista (4923-0/02); transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, municipal (4929-9/01); transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, intermunicipal, interestadual e internacional (4929-9/02); organização de excursões em veículos rodoviários próprios, municipal (4929-9/03); organização de excursões em veículos rodoviários próprios, intermunicipal, interestadual e internacional (4929-9/04); transporte marítimo de cabotagem - passageiros (5011-4/02); transporte marítimo de longo curso - passageiros (5012-2/02); transporte aquaviário para passeios turísticos (5099-8/01); restaurantes e similares (5611-2/01); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, sem entretenimento (5611-2/04); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, com entretenimento (5611-2/05); agências de viagem (7911-2/00); operadores turísticos (7912-1/00); atividades de museus e de exploração de lugares e prédios históricos e atrações similares (9102-3/01); atividades de jardins botânicos, zoológicos, parques nacionais, reservas ecológicas e áreas de proteção ambiental (9103-1/00); parques de diversão e parques temáticos (9321-2/00); atividades de organizações associativas ligadas à cultura e à arte (9493-6/00).”
Sendo assim, o requisito da inscrição prévia no CADASTUR somente pode ser exigido para os pedidos de inscrição no PERSE ocorridos após a edição da supracitada lei.
Sobre o tema, válido trazer à baila os seguintes precedentes jurisprudenciais:
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ART. 1.022 DO CPC. PRESSUPOSTOS. INEXISTÊNCIA. REDISCUSSÃO DA MATÉRIA. NÃO CABIMENTO. ADVENTO DE NORMA LEGAL A PREVER A EXIGÊNCIA.
1. Embargos de declaração opostos pela União (Fazenda Nacional) contra acórdão desta Quinta Turma que deu provimento ao agravo de instrumento.
2. O acórdão embargado tratou da questão ora reiterada no recurso, qual seja, o disposto na Portaria ME 7.163/2021 e a obrigatoriedade do registro no CADASTUR. Esta Quinta Turma se manifestou expressamente sobre o cerne da questão trazida à baila por ocasião da apreciação do recurso de agravo de instrumento, fundamentando que, a referida portaria estabelece uma limitação que afronta o princípio da legalidade estrita, já que restringe a concessão do benefício da desoneração fiscal prevista no art. 4º, da Lei nº 14.148, de 2021. Além disso, a Quinta Turma evidenciou a prevalência do entendimento segundo o qual o prévio registro no Cadastur não deve ser exigido para que a pessoa jurídica possa participar do PERSE.
3. Esta eg. 5ª Turma do TRF5 compreende que a Portaria ME nº 7.163/2021 violou o princípio da legalidade ao exigir a prévia inscrição no CADASTUR das empresas interessadas nas benesses do programa, pois, no momento da edição do referido normativo, não constava tal requisito na Lei nº 14.148/21.
4. Ocorre, todavia, que, com o advento da Medida Provisória nº 1.147, de 20/12/2022, e, mais especificamente, com o advento da respectiva lei de conversão (Lei nº 14.592, de 30/5/2023), o artigo 4º da Lei nº 14.148/2021 passou a estabelecer a necessidade de prévio registro no CADASTUR como requisito para a fruição da benesse (a necessidade de prévio registro no aludido cadastro não constava na redação da MP, mas passou a constar na redação da referida lei de conversão; o que já constava, na aludida medida provisória, era a previsão de que a benesse não poderia se aplicar a todas as atividades da pessoa jurídica, mas apenas àquelas expressamente previstas como relacionadas ao setor de eventos e turismo, devendo ser realizada a devida distinção e separação na contabilidade fiscal respectiva).
5. A respeito do novo panorama normativo, depreende-se que as referidas Medida Provisória nº 1.147, de 20/12/2022, e Lei nº 14.592, de 30/5/2023, não poderiam se aplicar de forma retroativa, alcançando períodos e fatos anteriores à sua vigência.
6. Em atenção ao princípio da anterioridade (seja o seja a anterioridade nonagesimal, para as contribuições sociais; seja a anual, para os demais tributos, 'ex vi' dos artigos 195, § 6º, e 150, III, b, todos da CF/88), não podem as novas normas ser aplicadas de imediato, mas mediante observância dos marcos temporais alusivos ao referido princípio (intervalo de 90 dias para as contribuições sociais e a data de 1º de janeiro do ano subsequente para os demais tributos).
7. Do exposto se infere que a impetrante somente poderia usufruir do benefício de redução a 0% (zero por cento) das alíquotas do Imposto de Renda sobre a Pessoa Jurídica - IRPJ, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL, Contribuição para os Programas de Integração Social - PIS e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - COFINS, nos termos do art. 4º da Lei nº 14.148/2021, sobre todo seu resultado (englobando todas as atividades), até a finalização do princípio constitucional da anterioridade nonagesimal (para as contribuições sociais) e até o advento da data de 1º de janeiro de 2023 (para o IRPJ), tomando sempre por parâmetro a publicação da Medida Provisória nº 1.147, de 20 de dezembro de 2022, a partir de quando incidirão as regras desta, já transformada na Lei 14.592, de 30.05.2023. Tal se deve, como já dito, ao fato de a Medida Provisória haver limitado a fruição do PERSE apenas às atividades da pessoa jurídica relacionadas ao setor turístico e de eventos. Assim, se ela desenvolver atividades outras, serão estas excluídas a partir dos marcos temporais mencionados.
8. De seu turno, a despeito da inclusão da exigência de prévio registro no CADASTUR a partir da Lei nº 14.592, de 30 de maio de 2023, depreende-se sua inaplicabilidade às pessoas jurídicas que (como a demandante) haviam buscado sua inscrição no PERSE anteriormente ao seu advento. Suficiente que se observe que formulou exigência (de inscrição no CADASTUR em 18 de março de 2022) que não poderia ser validamente exigida. A exigência, para ser considerada legítima, somente poderia impor que a inscrição no referido Cadastro fosse anterior ao advento da própria lei (que ocorreu em 30 de maio de 2023), não podendo indicar uma data muito anterior à sua promulgação.
9. Embargos de declaração desprovidos. Diante do direito superveniente (Medida Provisória nº 1.147, de 20.12.2022, já convertida na Lei 14.592, de 30.05.2023), haverão de ser obrigatoriamente atendidos, pela pessoa jurídica contribuinte, os parâmetros mencionados no item 7.
(PROCESSO: 08017900420234050000, AGRAVO DE INSTRUMENTO, DESEMBARGADORA FEDERAL JOANA CAROLINA LINS PEREIRA, 5ª TURMA, JULGAMENTO: 18/09/2023)
TRIBUTÁRIO. PROGRAMA EMERGENCIAL DE RECUPERAÇÃO DO SETOR DE EVENTOS - PERSE. LEI Nº 14.148/2021. EXIGÊNCIA DE INSCRIÇÃO PRÉVIA NO CADASTUR. PORTARIA ME Nº 7.163/2021. EXTRAPOLAÇÃO DO PODER REGULAMENTAR. ILEGALIDADE. MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.147/2022. ALTERAÇÃO DO ART. 4°, CAPUT DA LEI Nº 14.148/2021. RESTRIÇÃO A ATIVIDADES ESPECIFICADAS. ELEVAÇÃO DA CARGA TRIBUTÁRIA. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE. LEI Nº 14.592/2023. ALTERAÇÃO DO ART. 4°, § 5º, DA LEI Nº 14.148/2021. INTRODUÇÃO DA EXIGÊNCIA DE PRÉVIO CADASTRO NO CADASTUR. POSSIBILIDADE. APLICAÇÃO RESTRITA ÀS EMPRESAS QUE PLEITEAREM O INGRESSO APÓS A LEI. PROVIMENTO PARCIAL DA APELAÇÃO E DA REMESSA NECESSÁRIA.
1. Apelação interposta pela Fazenda Nacional e remessa necessária contra sentença do Juízo da 2ª Vara Federal de Pernambuco (Magistrado Rafael Tavares da Silva), que concedeu a segurança pleiteada no sentido de garantir o ingresso do particular no Programa de Retomada do Setor de Eventos - PERSE.
2. O PERSE foi criado pelo Governo Federal para combater os efeitos na economia da adoção das medidas de isolamento ou de quarentena realizadas para enfrentamento da pandemia da Covid-19.
3. Os requisitos para ingressar no PERSE encontram-se disciplinados na Lei n° 14.148/2021.
4. A Portaria ME n° 7.163/2021 incluiu exigência indevida de que a pessoa jurídica interessada já possuísse inscrição regular no Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos - CADASTUR quando da data de publicação da Lei n. 14.148/2021, para que pudesse ter acesso ao PERSE.
5. Em razão disso, a Portaria ME nº 7.163/2021 violou o princípio da legalidade, devendo tal exigência ser afastada in concreto.
6. Posteriormente, a redação do art. 4º, da Lei nº 14.148/2021, foi alterada pela Medida Provisória nº 1.147/2022, instituindo-se restrição ao benefício de alíquota zero trazido pelo PERSE.
7. Nos termos da nova redação do art. 4º, apenas aos resultados das atividades ali relacionadas (a serem detalhadas em portaria editada pelo Ministério da Economia) podem ser alvo do benefício fiscal e não mais todo o resultado auferido pela pessoa jurídica.
8. A Solução de Consulta n° 52 - COSIT, de 2023, definiu que, para apuração dos tributos sujeitos ao benefício fiscal do PERSE, é necessário segregar as receitas e resultados auferidos pela pessoa jurídica em duas categorias distintas, conforme tais valores sejam abrangidos ou não pelo referido benefício.
9. A alteração em tela deverá observar o princípio da anterioridade, seja o nonagesimal, seja o anual, delineados no art. 150, § 1º, da Constituição, uma vez que se trata de uma alteração legislativa que envolve matéria tributária e implica em majoração da carga tributária final do contribuinte.
10. Mais recentemente, a Medida Provisória nº 1.147/2022 foi convertida na Lei nº 14.592/2023, que acrescentou mais uma modificação na Lei nº 14.148/2021.
11. De acordo com a nova redação do § 5º, do art. 4º, da Lei nº 14.148/2021, passou-se a exigir do contribuinte o prévio registro no CADASTUR para fruição dos benefícios do PERSE.
12. A alteração legislativa incorporou o requisito antes veiculado somente pela Portaria ME n° 7.163/2021, corrigindo o vício de legalidade anteriormente existente.
13. Entretanto, tal exigência só poderá ser imposta às empresas que requereram administrativamente o gozo do benefício ou que ingressaram em juízo após a aludida alteração (20/05/2023), uma vez que ela não poderá ser aplicada retroativamente, de modo a atingir períodos e fatos anteriores à sua vigência, em razão do postulado da irretroatividade da lei.
14. Na hipótese dos autos, se está diante de empresa que desempenha atividade contemplada pela lei como as que podem ter acesso ao PERSE (56.11-2-01 - Restaurante e Similares).
15. Tendo a demanda sido ajuizada em 03/06/2022, a empresa faz jus ao ingresso no PERSE sem observância da exigência de prévia inscrição no CADASTUR, mas com as restrições relativas às atividades contempladas no programa, respeitadas as regras da anterioridade pertinentes especificamente aos impostos e contribuições contemplados no programa.
16. A possibilidade da declaração do direito à compensação encontra fundamento no artigo 170 do Código Tributário Nacional (CTN), assim como nas Leis n° 8.383/91 (art. 66) e 9.430/96 (art. 74).
17. Segundo o art. 170-A do CTN, acrescido pela Lei Complementar nº. 104/2001, deve ser condicionada a compensação à verificação do trânsito em julgado da sentença.
18. Os valores a serem compensados devem ser corrigidos exclusivamente pela taxa SELIC, que já engloba juros e correção monetária, na forma prevista no artigo 39, § 4º, da Lei 9.250/95 e deverá ser observada a norma do art. 166, do CTN, com relação ao PIS e à COFINS, por se tratarem de tributos indiretos.
19. No que tange à repetição de indébito dos valores recolhidos durante a tramitação do mandado de segurança, o valor deverá ser restituído ao contribuinte por meio de requisitório de pagamento, por força do art. 100, da Constituição.
20. Apelação e remessa oficial parcialmente providas.
(PROCESSO: 08089314020224058300, APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA, DESEMBARGADORA FEDERAL CIBELE BENEVIDES GUEDES DA FONSECA, 5ª TURMA, JULGAMENTO: 18/09/2023)
No caso concreto, observa-se que a impetrante atua no ramo de “restaurantes, cafeteria, bar e similares” (ID 266565060), estabelecimentos estes abrangidos pelo PERSE, sendo que este writ foi impetrado em 27.06.2022, de modo que faz jus ao ingresso no PERSE sem observância da exigência de prévia inscrição no CADASTUR, desde que observadas as restrições relativas às atividades contempladas no programa.
Logo, deve ser mantida a sentença concessiva da segurança.
Ante o exposto, nego provimento à remessa necessária e ao recurso de apelação.
É como voto.
E M E N T A
MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUTÁRIO. PROGRAMA EMERGENCIAL DE RETOMADA DO SETOR DE EVENTOS – PERSE. LEI 14.148/2021. ATIVIDADES TIPICAMENTE ALHEIAS AO SETOR DE TURISMO. OBRIGATORIEDADE DE PRÉVIA INSCRIÇÃO NO CADASTUR. PORTARIA ME Nº 7.163/2021. LEI nº 11.771/2008. AUSÊNCIA DE OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E DA ISONOMIA. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO PROVIDAS.
1. Instituído pela Lei 14.148/2021, o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos - PERSE estabelece ações emergenciais e temporárias destinadas ao setor de eventos para compensar os efeitos decorrentes das medidas de combate à pandemia da COVID/19. Dentre os benefícios fiscais, está a redução para zero, pelo prazo de 60 meses, das alíquotas de PIS, COFINS, CSLL e IRPJ devidos pelas pessoas jurídicas que exercem as atividades econômicas elencadas.
2. A Lei 11.771/2008, que dispõe sobre a Política Nacional de Turismo, definiu quais são atividades típicas da "cadeia produtiva do turismo" (caputdo art. 21), cujo cadastro no Ministério do Turismo é obrigatório, e quais são as atividades equiparadas (parágrafo único do art. 21), que podem se registrar no CADASTUR, cujo cadastro é obrigatório para fins de acesso a programas de apoio e outros benefícios legais (art. 33, I).
3. Por exigência do § 2º, do art. 2º da Lei 14.148/2021, o Ministério da Economia editou a Portaria ME nº 7.163/2021, trazendo os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE considerados do setor de eventos, definindo no Anexo I as atividades econômicas que estão enquadradas no PERSE,e no Anexo II as atividades cujo enquadramento é permitido, desde que na data da publicação da Lei nº 14.148/2021, estivessem registradas no Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos - CADASTUR.
4. A exigência de inscrição prévia no CADASTUR para usufruir dos benefícios do PERSE não se mostra desarrazoada, na medida em que as atividades descritas nos incisos do parágrafo único do art. 21 da Lei 11.771/2008 (como restaurantes e bares, por exemplo) não são, necessariamente, qualificadas como pertencentes ao setor turístico. Tanto é que a apelante não está registrada no CADASTUR, embora o cadastro já fosse obrigatório aos prestadores de serviços tipicamente turísticos e efetivamente atuantes (art. 22).
5. Assim, a Portaria ME 7.163/2021 não extrapola as disposições das Leis 14.148/2021 e 11.771/2008, apenas possibilita a adesão ao PERSE de pessoas jurídicas que exercem atividades que não são típicas do setor de eventos, mas podem nele atuar, para o que se exige o registro no CADASTUR.
6. Não se identifica, portanto, que a norma regulamentar apresente ilegalidade ou abuso a atrair a interferência do Poder Judiciário. Precedente (TRF 3ª Região, 6ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5015579-09.2022.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 29/08/2022, Intimação via sistema DATA: 01/09/2022).
7. Remessa necessária e apelação providas.