AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5027679-93.2022.4.03.0000
RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
AUTOR: ANDRE LUIZ PIRES, MARCELO FERNANDES ARAUJO, ANTONIO MOREIRA DA COSTA, CLAUDEMAR MOULIN ROCHA, CLOVIS MIGUEL DE LIMA JUNIOR, FATIMA LOPES DE CARVALHO COSTA, EDSON GARCIA DE ANDRADE FILHO
Advogados do(a) AUTOR: MARCELLY CAROLINE CREPALDE ALARCON - SP476034, SONETE NEVES DE OLIVEIRA - SP178402-A
REU: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5027679-93.2022.4.03.0000 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO AUTOR: ANDRE LUIZ PIRES, MARCELO FERNANDES ARAUJO, ANTONIO MOREIRA DA COSTA, CLAUDEMAR MOULIN ROCHA, CLOVIS MIGUEL DE LIMA JUNIOR, FATIMA LOPES DE CARVALHO COSTA Advogados do(a) AUTOR: MARCELLY CAROLINE CREPALDE ALARCON - SP476034, SONETE NEVES DE OLIVEIRA - SP178402-A REU: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O Exmo. Desembargador Federal Carlos Francisco (Relator): Trata-se de ação rescisória ajuizada por MARCELO FERNANDES ARAUJO e outros com fulcro no art. 966, V, do CPC, objetivando a desconstituição de julgado proferido nos autos da ação n. 5005249-16.2018.4.03.6103, para que o feito seja suspenso e aguarde deliberação da Corte Suprema sobre a matéria discutida nos autos da ADI 5090. Sustenta a parte autora, em síntese, que a ação tinha por objeto a correção dos saldos do FGTS, mas teve o pedido julgado improcedente em 23/01/2019. Foi interposto recurso de apelação pelos requerentes, tendo esta Corte negado provimento ao recurso, em 05/11/2019. Ocorre que em 06/09/2019, nos autos do julgamento da ADI nº 5090, fora deferida cautelar para suspender todos os feitos que versassem sobre a matéria. A decisão, portanto, deve ser anulada, bem como todos os atos subsequentes, uma vez que o prosseguimento do feito descumpriu a ordem de suspensão prolatada pelo e.STF. Afirma que houve afronta a norma expressa, tanto da Constituição Federal quanto da Lei Federal nº 9.868/1999. Afinal, a ordem emanada pelo Supremo Tribunal Federal em sede de julgamento de Ação Direta de Inconstitucionalidade consiste em decisão provida de eficácia erga omnes e efeito vinculante (art. 102, §3º, CF/88; art. 11, §2º da Lei nº 9.868/99). A parte ré apresentou contestação (Id. 266456207). Preliminarmente, sustenta a inépcia da inicial (o objetivo da parte autora, suspender os efeitos da decisão rescindenda até julgamento de processo no e.STF sobre o mesmo tema é incompatível com o teor do art. 966 e do art. 974, ambos do CPC/2015, que indicam que a ação rescisória apenas poderá resultar em rescisão da decisão atacada ou emissão de novo pronunciamento de mérito) e a falta de interesse de agir, na modalidade adequação (a parte autora não tem necessidade de obter pronunciamento judicial acerca do mérito de seu alegado direito, visto que sequer foi proferido o julgamento pelo STF). No mérito sustenta, em síntese, a regularidade da decisão rescindenda. Apresentadas razões finais pelos autores. Manifestação do Ministério Público Federal pela inexistência de hipótese de intervenção meritória. É o relatório.
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5027679-93.2022.4.03.0000 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO AUTOR: ANDRE LUIZ PIRES, MARCELO FERNANDES ARAUJO, ANTONIO MOREIRA DA COSTA, CLAUDEMAR MOULIN ROCHA, CLOVIS MIGUEL DE LIMA JUNIOR, FATIMA LOPES DE CARVALHO COSTA, EDSON GARCIA DE ANDRADE FILHO Advogados do(a) AUTOR: MARCELLY CAROLINE CREPALDE ALARCON - SP476034, SONETE NEVES DE OLIVEIRA - SP178402-A REU: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: DECLARAÇÃO DE VOTO VENCEDOR O Senhor Desembargador Herbert de Bruyn: Trata-se de ação rescisória proposta por André Luiz Pires e outros visando desconstituir a decisão monocrática que negou provimento ao recurso dos autores, interposto nos autos do processo n. 5005249-16.2018.4.03.6103, que tinha por objeto a correção dos saldos do FGTS. Acompanho o voto do E. Des. Federal Relator quanto ao juízo rescindente, bem como quanto à determinação de retorno dos autos à Turma competente, até o julgamento da ADI 5090, divergindo, com a devida vênia, de S. Exa. exclusivamente quanto ao arbitramento da verba honorária. Constou do voto proferido pelo E. Relator, que os honorários seriam arbitrados nos termos do art. 85, §3º, do CPC, “mediante aplicação do percentual mínimo das faixas previstas sobre o montante atribuído à causa (correspondente ao proveito econômico tratado nos autos).” Considerando-se que o valor da causa é de R$1.000,00 (outubro/2022), a aplicação do percentual estabelecido no art. 85, §3º, do CPC tornará irrisórios os honorários advocatícios. Dessa forma, é de se aplicar o art. 85, §8º, do CPC, bem como a orientação estabelecida no Tema n. 1076, do STJ, in verbis: “I) A fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória nesses casos a observância dos percentuais previstos nos §§ 2º ou 3º do artigo 85 do CPC - a depender da presença da Fazenda Pública na lide -, os quais serão subsequentemente calculados sobre o valor: (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa. II) Apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo.” (grifos nossos). Ante o exposto, acompanho o voto do E. Relator para julgar procedente a rescisória, aguardando-se a decisão final da ADI 5090, divergindo apenas quanto a verba honorária, que fica arbitrada em R$2.000,00, com fundamento no art. 85, §8º, do CPC e no Tema 1.076, do STJ. É o meu voto. Herbert de Bruyn Desembargador Federal do TRF-3ª Região
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5027679-93.2022.4.03.0000
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V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Carlos Francisco (Relator): Verifico que a ação rescisória foi ajuizada em 10/10/2022, dentro, portanto, do prazo decadencial previsto no art. 975 do CPC, já que a decisão atacada transitou em julgado em 10/11/2020 (Id. 42208911 - Pág. 38 dos autos de origem).
Há interesse de agir pois, afinal, negar aos autores o acesso à via da ação rescisória implica em impor que aguardem o desfecho dessa ADI para, eventualmente, repropor o que já se vê ajuizado. É possível a rescisão de julgado por ofensa a determinação de sobrestamento,, como se nota no seguinte julgado:
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO DE LITERAL DISPOSITIVO DE LEI. REQUISITOS. DETERMINAÇÃO DE SOBRESTAMENTO DE PROCESSO PELO STJ NÃO ATENDIDA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. OFENSA AO ART. 543-C, § 2º, DO CPC/73. ACÓRDÃO PROFERIDO PELO SODALÍCIO A QUO EM DESACORDO COM ORIENTAÇÃO FIRMADA EM RECURSO REPETITIVO. SÚMULA 343/STF. NÃO INCIDÊNCIA. 1. Na hipótese dos autos, em 14.12.2009 foi determinado pelo Superior Tribunal de Justiça o sobrestamento dos processos que tratassem de questões relativas à competência para a cobrança do ISS sobre leasing (arrendamento mercantil financeiro), por força da afetação do Resp. 1.060.210/SC. Todavia, o Sodalício a quo desrespeitou a determinação do STJ, dando sequência ao julgamento do processo. 2. Em 20.04.2011, foi proferido acórdão em processo que deveria estar suspenso. O referido acórdão, por sua vez, posicionou-se de forma contrária ao entendimento que, posteriormente, consolidou-se nesta Corte Superior por ocasião do julgamento do Recurso Repetitivo 1.060.210/SC. Este fato é incontroverso, pois declarado pelo próprio Tribunal de origem (fl. 1.245/e-STJ). 3. Com efeito, o acórdão vergastado decidiu pela inexistência de ofensa ao art. 543-C do CPC/73, sob o argumento de que o processo não poderia ficar paralisado por prazo superior a 1 ano, aplicando o disposto no art. 265, IV, "a", §5º, do CPC. 4. Todavia, a sistemática dos recursos repetitivos é sui generis e o STJ possui orientação de que a afetação de Recursos Especiais como representativos da controvérsia impõe ao Tribunal de origem a suspensão de recursos interpostos que abordem idêntica questão até o julgamento definitivo da controvérsia. Somente após o pronunciamento do Superior Tribunal de Justiça os recursos suspensos devem ser analisados na forma prevista nos §§ 7º e 8º do art. 543-C do CPC (art. 5º, inciso III, da Resolução 8/2008 da Presidência do STJ). (AgInt nos EDcl no AREsp 804.969/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 04/08/2016, DJe 17/8/2016; AgRg no AREsp 763.516/SP, Rel. Ministra Diva Malerbi (Desembargadora convocada TRF 3ª região), Segunda Turma, julgado em 17/5/2016, DJe 31/5/2016). 5. Dessarte, in casu, deveria o Sodalício a quo ter mantido o presente feito sobrestado, o que não ocorreu. A não suspensão do processo resultou na prolação de acórdão contrário à orientação do Superior Tribunal de Justiça. Nesse quadro, houve violação literal ao art. 543-C, §2º, do CPC. 6. Outrossim, não há falar em incidência da Súmula 343/STF. Além de constatada prima facie violação literal ao disposto no art. 543-C, § 2º, do CPC/73, a jurisprudência, tanto do STF como do STJ, evoluiu de modo a considerar que não se pode admitir que prevaleça acórdão que adotou interpretação inconstitucional (STF) ou contrária à Lei, conforme interpretada por seu guardião constitucional (STJ). Assim, nas hipóteses em que, após o julgamento, a jurisprudência, ainda que vacilante, tiver evoluído para sua pacificação, a rescisória pode ser ajuizada. (AR 3.682/RN, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, julgado em 28/9/2011, DJe 19/10/2011) 7. Recurso Especial provido, determinando-se o retorno dos autos ao Tribunal de origem para que haja o regular julgamento da Ação Rescisória.
(STJ. REsp 1569658 - 2015.01.81271-1, Segunda Turma. Relator: Herman Benjamin, DJE 19/12/2016)
A coisa julgada é garantia fundamental que ampara a segurança jurídica (art. 5º, XXXI da Constituição), e sua preservação é a regra geral no Estado de Direito brasileiro, de modo que sua rescisão é exceção subordinada a hipóteses legais interpretadas restritivamente. Contudo, a coisa julgada não é um fim em si mesmo ao ponto de ser defendida a qualquer custo (especialmente se formada com irregularidades), mesmo porque a segurança jurídica se projeta para a preservação dos efeitos jurídicos de atos passados, bem como para certeza possível do presente e para previsibilidade elementar do futuro.
Previstas no art. 966 do CPC/2015, as hipóteses que permitem a ação rescisória envolvem vícios, erros e conflitos que colocam determinada coisa julgada em conflito com o funcionamento lógico-racional do sistema jurídico. Sendo o caso de rescindir a decisão transitada em julgado (juízo rescidendo), o feito originário deve ser rejulgado para sanar a irregularidade em sua extensão (juízo rescisório), mostrando que a ação rescisória é inconfundível com as vias recursais.
A presente ação rescisória pretende a rescisão de acórdão deste e.TRF com base no art. 966, V (violação manifesta de norma jurídica), do CPC/2015:
“Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
(...)
V - violar manifestamente norma jurídica;
(...)
§ 5º Cabe ação rescisória, com fundamento no inciso V do caput deste artigo, contra decisão baseada em enunciado de súmula ou acórdão proferido em julgamento de casos repetitivos que não tenha considerado a existência de distinção entre a questão discutida no processo e o padrão decisório que lhe deu fundamento. (Incluído pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência)
§ 6º Quando a ação rescisória fundar-se na hipótese do § 5º deste artigo, caberá ao autor, sob pena de inépcia, demonstrar, fundamentadamente, tratar-se de situação particularizada por hipótese fática distinta ou de questão jurídica não examinada, a impor outra solução jurídica. (Incluído pela Lei nº 13.256, de 2016)”
O art. 485, V, do CPC/1973 previa o cabimento de ação rescisória em caso de violação literal de lei, ao passo em que o art. 966, V, do CPC/2015 permite o juízo rescidendo se constatada a violação manifesta de norma jurídica. A redação do CPC/2015 atende à premissa que o texto (em sua literalidade) é o ponto de partida para que dele seja extraído o comando normativo pela interpretação do conjunto de elementos que compõem o âmbito social (no tempo e no espaço).
Nos moldes do art. 966, V, §§ 5º e 6º, do CPC/2015, a violação manifesta de norma jurídica se materializa quando o julgado se apoiar em entendimento inaceitável pelo sistema jurídico, compreendendo tanto omissão sobre a existência de preceito normativo (constituições, leis, etc., bem como súmulas vinculantes e demais decisões obrigatórias derivadas do mecanismo de precedentes) quanto interpretação claramente incoerente, má ou teratológica. Não caberá ação rescisória como sucedâneo recursal para rever coisa julgada fundamentada em uma dentre várias interpretações aceitáveis (ainda que não seja a predominante). A esse respeito, há ampla jurisprudência no e.STJ, como se nota nos seguintes casos: AgInt na AR n. 6.839/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, julgado em 13/12/2022, DJe de 15/12/2022; AR n. 6.335/DF, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, julgado em 14/12/2022, DJe de 20/12/2022; AgInt no REsp n. 1.960.713/SC, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 31/3/2022; e AgInt no AREsp n. 1.238.929/SP, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 13/6/2022, DJe de 21/6/2022). Por isso, a Súmula 343 do c.STF é categórica ao rejeitar a rescisão baseada em interpretação controvertida ("Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais").
O marco temporal para a demonstração da interpretação controvertida que impede o juízo rescindendo é momento no qual foi lançada a decisão que transitou em julgado, mas se a coisa julgada transgrediu (de modo evidente, direto e manifesto) a compreensão jurídica que já vinha sendo dada, que era empregada quando o julgamento foi feito e que permaneceu aplicável, há manifesta violação de norma jurídica (compreendida pela combinação de texto e de interpretação). A esse respeito, no e.ST, cito como exemplos: AgInt na AR 2990 / SP, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, DJe de 17/10/2017; AgRg na AR n. 5.300/RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, CORTE ESPECIAL, DJe de 5/3/2014; e AgInt na AR n. 4.821/RN, relator Ministro Marco Buzzi, Segunda Seção, julgado em 13/3/2019, DJe de 18/3/2019. Diversa é a situação da coisa julgada que contraria julgado vinculante ou obrigatório do c.STF ou do e.STJ, pois nesse caso é inexigível esse marco temporal em favor da unificação dos pronunciamentos judiciais e da isonomia.
Em juízo rescindendo escorado no art. 966, V, §5º, do CPC/2015, é necessário rescindir o julgado porque a improcedência do pedido (afirmada por este e.TRF) se deu quando já havia sido proferida decisão liminar pelo e.STF (na ADI 5090) determinando a suspensão de processos cuidando da substituição da TR em se tratando de contas do FGTS.
No caso dos autos, a decisão monocrática rescindenda (Id. 42207847 dos autos de origem) foi proferida em 05/11/2019, nos seguintes termos:
“Trata-se de ação movida em face da Caixa Econômica Federal - CEF visando a substituição do índice de correção monetária da conta vinculada do FGTS.
A r. sentença julgou improcedente o pedido. Nas razões recursais, a parte autora pleiteia a reforma da r. sentença, alegando a inaplicabilidade da TR e a utilização de outro índice para correção monetária dos saldos vinculados ao FGTS.
Decorrido o prazo para resposta, subiram os autos a esta E. Corte Regional.
É o relatório. Decido.
O caso comporta decisão na forma do artigo 932, inciso IV, do CPC/2015.
Inicialmente, deve-se observar que o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS não tem natureza contratual e sim estatutária, por decorrer e ser disciplinado por lei. Assim sendo, não há direito adquirido a regime jurídico de correção monetária, situando-se a matéria exclusivamente no terreno legal infraconstitucional.
Nesse passo, todo empregador é responsável pelo depósito mensal de 8% (oito por cento) sobre a remuneração recebida no mês pelo empregado, realizado junto à conta vinculada ao FGTS, cujo saldo é corrigido monetariamente e acrescido de juros, por força do disposto nos artigos 2º e 13 da lei 8.036/90:
Art. 2º O FGTS é constituído pelos saldos das contas vinculadas a que se refere esta lei e outros recursos a ele incorporados, devendo ser aplicados com atualização monetária e juros, de modo a assegurar a cobertura de suas obrigações.
Art. 13. Os depósitos efetuados nas contas vinculadas serão corrigidos monetariamente com base nos parâmetros fixados para atualização dos saldos dos depósitos de poupança e capitalização juros de 3% ao ano.
Com o advento da Lei nº 8.177/1991, que estabeleceu regras para a desindexação da economia, ficou disposto que:
Art. 17. A partir de fevereiro de 1991, os saldos das contas do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) passam a ser remunerados pela taxa aplicável à remuneração básica dos depósitos de poupança com data de aniversário no dia 1°, observada a periodicidade mensal para remuneração.
Parágrafo único. As taxas de juros previstas na legislação em vigor do FGTS são mantidas e consideradas como adicionais à remuneração prevista neste artigo.
Posteriormente, a Lei nº 8.660/93, que estabelecia novos critérios para a fixação da Taxa Referencial - TR, extinguiu a Taxa Referencial Diária - TRD, e estabeleceu a TR como critério de remuneração da poupança:
Art. 2º. Fica extinta, a partir de 1º de maio de 1993, a Taxa Referencial Diária - TRD de que trata o art. 2º da Lei 8.177, de 1º de março de 1991.
(...) Art. 7º. Os depósitos de poupança têm como remuneração básica a Taxa Referencial - TR relativa à respectiva data de aniversário.
Dessa forma, a atualização dos saldos dos depósitos das contas vinculadas ao FGTS, assim como das contas de poupança, é realizada pela TR - Taxa Referencial, de acordo com os artigos 12 e 17 da lei nº 8.177/91.
Portanto, desde maio de 1993, a TR é o índice legal previsto para a remuneração dos valores depositados em conta vinculada ao FGTS, acrescidos de juros de 3% ao ano.
A respeito da sua aplicabilidade sobre os valores devidos a título de FGTS, o C. Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula nº 459: "A Taxa Referencial (TR) é o índice aplicável, a título de correção monetária, aos débitos com o FGTS recolhidos pelo empregador mas não repassados ao fundo".
Convém salientar, ainda, que o Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento da ADIn 493/DF, não declarou a inconstitucionalidade da utilização da TR como índice de indexação, tendo considerado inconstitucionais o art. 18, caput, § 1º, § 4º, o art. 20, o art. 21, parágrafo único, o art. 23 e parágrafos e o art. 24 e parágrafos, da Lei 8.177/91, apenas quanto à sua aplicação em substituição a índices estipulados em contratos firmados antes da vigência dessa lei.
Diante das disposições legais que estabelecem a TR como o índice legal devido, descabe a sua substituição por qualquer outro índice, ainda que mais vantajoso ao fundista, por implicar a atuação do Poder Judiciário como legislador positivo, em flagrante ofensa ao Princípio da Separação dos Poderes.
Nesse mesmo sentido decidiu o C. STJ no REsp 1.614.874/SC, cujo recurso especial é representativo da controvérsia (sob a sistemática do artigo 1.036 do CPC/2015), com a seguinte ementa:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 731. ARTIGO 1.036 DO CPC/2015. FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO - FGTS. SUBSTITUIÇÃO DA TAXA REFERENCIAL (TR) COMO FATOR DE CORREÇÃO MONETÁRIA DOS VALORES DEPOSITADOS POR ÍNDICE QUE MELHOR REPONHA AS PERDAS DECORRENTES DO PROCESSO INFLACIONÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. FGTS QUE NÃO OSTENTA NATUREZA CONTRATUAL. REGRAMENTO ESTABELECIDO PELO ART. 17 DA LEI N. 8.177/1991 COMBINADO COM OS ARTS. 2º E 7º DA LEI N. 8.660/1993.
1. Para os fins de aplicação do artigo 1.036 do CPC/2015, é mister delimitar o âmbito da tese a ser sufragada neste recurso especial representativo de controvérsia: discute-se a possibilidade, ou não, de a TR ser substituída como índice de correção monetária dos saldos das contas vinculadas ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS.
2. O recorrente assevera que "[...] a TR deixou de refletir, a partir de 1999, as taxas de inflação do mercado financeiro, e, por conseguinte, o FGTS também deixou de remunerar corretamente os depósitos vinculados a cada trabalhador" (fl. 507). Defende a aplicação do INPC ou IPCA ou, ainda, de outro índice que melhor reponha as perdas decorrentes da inflação.
3. Por seu turno, o recorrido alega que a lei obriga a aplicação da TR como fator de correção de monetária, na medida em que o FGTS não tem natureza contratual, tendo em vista que decorre de lei todo o seu disciplinamento, inclusive a correção monetária que lhe remunera.
4. A evolução legislativa respeitante às regras de correção monetária dos depósitos vinculados ao FGTS está delineada da seguinte forma: (i) o art. 3º da Lei n. 5.107/1966 previra que a correção monetária das contas fundiárias respeitaria a legislação especifica; (ii) posteriormente, a Lei n. 5.107/1966 foi alterada pelo Decreto-Lei n. 20/1966, e o art. 3º supra passou a prever que os depósitos estariam sujeitos à correção monetária na forma e pelos critérios adotados pelo Sistema Financeiro da Habitação e capitalizariam juros segundo o disposto no artigo 4º; (iii) em 1989, foi editada a Lei n. 7.839, que passou a disciplinar o FGTS e previu, em seu art. 11, que a correção monetária observaria os parâmetros fixados para atualização dos saldos de depósitos de poupança;
(iv) a Lei n. 8.036/1990, ainda em vigor, dispõe, em seu art. 13, a correção monetária dos depósitos vinculados ao FGTS com parâmetro nos índices de atualização da caderneta de poupança; (v) a Lei n. 8.177/1991 estabeleceu regras de desindexação da economia, vindo a estipular, em seu art. 17, que os saldos das contas do FGTS deveriam ser remunerados, e não mais corrigidos, pela taxa aplicável à remuneração básica da poupança; e (vi) a partir da edição da Lei n. 8.660/1993, precisamente em seus arts. 2º e 7º, a Taxa Referencial.
5. O FGTS não tem natureza contratual, na medida em que decorre de lei todo o seu disciplinamento. Precedentes RE 248.188, Relator Ministro Ilmar Galvão, Tribunal Pleno, DJ 1/6/2001; e RE 226.855/RS, Relator Ministro Moreira Alves, Tribunal Pleno, DJ 13/10/2000.
6. É vedado ao Poder Judiciário substituir índice de correção monetária estabelecido em lei. Precedentes: RE 442634 AgR, Relator Ministro Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJ 30/11/2007; e RE 200.844 AgR, Relator: Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, DJ 16/08/2002.
7. O FGTS é fundo de natureza financeira e que ostenta característica de multiplicidade, pois, além de servir de indenização aos trabalhadores, possui a finalidade de fomentar políticas públicas, conforme dispõe o art. 6º da Lei 8.036/1990.
TESE PARA FINS DO ART. 1.036 DO CPC/2015
8. A remuneração das contas vinculadas ao FGTS tem disciplina própria, ditada por lei, que estabelece a TR como forma de atualização monetária, sendo vedado, portanto, ao Poder Judiciário substituir o mencionado índice.
9. Recurso especial não provido. Acórdão submetido à sistemática do artigo 1.036 do CPC/2015.
(REsp 1614874/SC, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 11/04/2018, DJe 15/05/2018)
Ainda, colaciono precedentes da 1ª Seção desta Corte Regional Federal, competente para o julgamento da presente matéria, in verbis:
(...)
Verifica-se, portanto, que inexiste qualquer ilegalidade na aplicação da TR como índice de atualização monetária das contas vinculadas ao FGTS. Ante o exposto, com fulcro no art. 932 do CPC/2015, nego provimento à apelação da parte autora, na forma da fundamentação acima.
P.I.
Oportunamente, baixem os autos à Vara de Origem.”
Contra tal decisão do e.TRF, os autores interpuseram diretamente Recurso Extraordinário, sem sucesso, diante do óbice consistente na Súmula nº 281 do e.STF, que estatui a necessidade de que a parte interponha todos os recursos ordinários perante o tribunal de origem antes de buscar a instância extraordinária. Ressalte-se que por ocasião do julgamento de agravo interno contra a decisão monocrática que negou seguimento ao recurso, o e.STF manifestou-se sobre pedido de suspensão do feito em razão da cautelar deferida na ADI 5090, afirmando que “(...) a orientação a ser firmada na referida ação direta não repercutirá no caso concreto, qualquer que seja o seu resultado, pois o óbice da Súmula 281/STF impede o exame da matéria de fundo veiculada no recurso extraordinário, o que torna sem qualquer efeito prático o sobrestamento do feito até o julgamento da ação direta” (Id. 42208911, p. 30/36dos autos de origem).
É certo o efeito vinculante e obrigatório das decisões do e.STF em ADIs, cuja a regra é o efeito ex nunc em pronunciamentos liminares, e ex tunc nos definitivos (salvo modulações). Ao julgar a apelação em 05/11/2019, este e.TRF não atentou para o fato de o c.STF, em 06/09/2019, na medida cautelar na ADI 5090, ter determinado a suspensão de todos os feitos que discutam a TR nas contas do FGTS pela TR, até que se proceda ao julgamento do mérito da matéria pelo Plenário. Portanto, houve manifesta violação da liminar do e.STF, combinada com o art. 11, §1º da Lei nº 9.868/1999.
Em juízo rescisório, a única e coerente decisão é determinar o sobrestamento da apelação até o desfecho do julgamento da ADI 5090 pelo e.STF), devendo os autos retornarem à e.Turma competente.
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a presente ação rescisória, para desconstituir o v. acórdão prolatado e determinar que se aguarde a decisão final da ADI 5090 pelo STF antes de proceder ao novo julgamento do feito.
Nos termos do art. 85, §3º do CPC/2015, condeno a parte sucumbente ao pagamento da verba honorária, fixada mediante aplicação do percentual mínimo das faixas previstas sobre o montante atribuído à causa (correspondente ao proveito econômico tratado nos autos). Custas e demais ônus processuais têm os mesmos parâmetros.
É como voto.
E M E N T A
RESCISÓRIA. FGTS. CORREÇÃO MONETÁRIA. ADI 5090. SUSPENSÃO DOS FEITOS QUE TRATAVAM DA MATÉRIA. INOBSERVÂNCIA. VIOLAÇÃO À NORMA. RESCISÓRIA PROCEDENTE. VERBA HONORÁRIA.
I – A improcedência do pedido formulado pelos autores na demanda originária dos autores se deu quando já havia sido proferida decisão liminar pelo STF na ADI 5090, determinando a suspensão de processos que tinham por objeto a substituição da TR, em se tratando de contas do FGTS.
II - Ao julgar a apelação em 05/11/2019, este TRF não atentou para o fato de o STF ter determinado, em 06/09/2019, na medida cautelar na ADI 5090, a suspensão de todos os feitos que discutiam a TR nas contas do FGTS, até que fosse julgado o mérito da matéria pelo Plenário.
III – Em juízo rescisório, determinado o sobrestamento da apelação até o desfecho do julgamento da ADI 5090 pelo STF, devendo os autos retornarem à Turma competente.
IV- Verba honorária fixada por equidade, nos termos do art. 85, §8º, do CPC e do Tema n. 1076, do STJ
V – Rescisória procedente.