Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5020130-95.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 05 - DES. FED. COTRIM GUIMARÃES

AGRAVANTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

AGRAVADO: BRUNA ALVES CARNEIRO

Advogado do(a) AGRAVADO: JOHNNYS GUIMARAES OLIVEIRA - PB20631-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5020130-95.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 05 - DES. FED. COTRIM GUIMARÃES

AGRAVANTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

 

AGRAVADO: BRUNA ALVES CARNEIRO

Advogado do(a) AGRAVADO: JOHNNYS GUIMARAES OLIVEIRA - PB20631-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O Exmo. Sr. Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES (Relator): Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto pela Caixa Econômica Federal contra a decisão que, nos autos do mandado de segurança, concedeu a liminar formulada pela impetrante para que a CEF libere o valor de seu saldo da conta vinculada do FGTS, em razão de que seu filho é portador do Transtorno do Espectro Autista.               

Em suas razões recursais, a parte agravante pugna pela revogação da medida judicial que determinou a liberação dos valores depositados em conta vinculada.

 

O pedido de liminar foi indeferido (ID 277954902), sendo que contra tal decisão a CEF interpôs agravo interno (ID 278101619). 

 

Apresentada contraminuta pela Impetrante (ID 269502012). 

 

O Ministério Público Federal manifestou-se tão somente pelo prosseguimento da demanda (ID 280789242).

 

É o relatório.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5020130-95.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 05 - DES. FED. COTRIM GUIMARÃES

AGRAVANTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

 

AGRAVADO: BRUNA ALVES CARNEIRO

Advogado do(a) AGRAVADO: JOHNNYS GUIMARAES OLIVEIRA - PB20631-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

O  Exmo. Sr. Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES (Relator):  De início, cumpre salientar que, com o julgamento colegiado do presente agravo de instrumento, o agravo interno interposto (ID 278101619) fica prejudicado.

 

Nesse sentido:

 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA. TUTELA DE URGÊNCIA. PERIGO DA DEMORA. NÃO CONFIGURAÇÃO. AGRAVO INTERNO CONTRA DECISÃO QUE INDEFERIU TUTELA RECURSAL DE URGÊNCIA: PREJUDICADO. - A demanda originária é uma ação civil pública em que foi indeferida a tutela de urgência requerida pelo agravante. - In casu, à falta de tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante relativamente à matéria (artigo 311 do CPC), passa-se à análise nos termos do artigo 300, caput, do CPC. - O dano precisa ser atual e presente, o que não ocorre no caso em análise, em que apenas foi suscitado que mais consumidores e órgãos de defesa do consumidor serão prejudicados em razão da falha no serviço prestado pela recorrida. Não se podem supor prejuízos futuros aos consumidores, de modo que as alegações apresentadas não são concretas e, assim, não justificam a urgência. Desse modo, ausente o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, desnecessária a apreciação da probabilidade do direito, pois, por si só, não legitima a providência almejada. - Por fim, à vista do exame exauriente com o julgamento do agravo de instrumento, resta prejudicado o agravo interno interposto contra a decisão que indeferiu a antecipação da tutela recursal, proferida em sede de cognição sumária. - Agravo de instrumento desprovido e agravo interno prejudicado. (AGRAVO DE INSTRUMENTO 5022267-26.2018.4.03.0000, Desembargador Federal ANDRE NABARRETE NETO, TRF3 - 4ª Turma, Intimação via sistema DATA: 14/05/2019..FONTE_REPUBLICACAO:.)

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. EXECUÇÃO FISCAL. DECISÃO DE PENHORA SOBRE O FATURAMENTO. PARTE DEVIDAMENTE INTIMADA. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA NÃO VIOLADOS. PENHORA SOBRE O FATURAMENTO. POSSIBILIDADE. VERBA HONORÁRIA DO ADMINISTRADOR MANTIDA. AGRAVO DESPROVIDO. 1. As teses de defesa veiculadas no agravo interno, devidamente respondido pela parte adversa, coincidem com aquelas apresentadas na contraminuta de agravo de instrumento. Assim, não havendo prejuízo às defesas, que exerceram o contraditório e tiveram assegurado o devido processo legal, levo o agravo de instrumento ao julgamento colegiado, com análise de todas as teses postas a julgamento, prejudicando o agravo interno interposto. 2. Foi determinada a penhora sobre o faturamento da empresa, com a consequente nomeação de depositário. Muito embora esta decisão não tenha sido publicada na imprensa oficial, apresentado o plano de trabalho pelo depositário, o Magistrado determinou a intimação das partes para se manifestarem sobre a nomeação, o plano de trabalho e honorários. A agravante, devidamente intimada da decisão, deixou o prazo transcorrer in albis. Preliminar rejeitada. 3. Pela análise da prova constante nos autos, não se verifica, por ora, razões que infirmem a penhora sobre o faturamento da pessoa jurídica tendo em vista o esgotamento das outras chances disponíveis ao credor de executar seu crédito. 4. Tendo em vista a média de faturamento da empresa e o mister a ser exercido pelo administrador, não considero os honorários mensais fixados em R$ 7.000,00 (sete mil reais) demasiados. 5. Agravo desprovido. (AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 579560 0006323-40.2016.4.03.0000, DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO, TRF3 - TERCEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/09/2016..FONTE_REPUBLICACAO:.)

 

 A decisão que indeferiu o pedido de efeito suspensivo foi proferida nos seguintes termos: 

 

“Dispõe o Código de Processo Civil:

  Art. 1.019. Recebido o agravo de instrumento no tribunal e distribuído imediatamente, se não for o caso de aplicação do art. 932, incisos III e IV, o relator, no prazo de 5 (cinco) dias:

I - poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão;

O art. 995, por sua vez, prevê que os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão judicial em sentido diverso. Contudo, a eficácia da decisão recorrida poderá ser suspensa por decisão do relator, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso (art. 995, parágrafo único).

Não vejo, ao menos diante de um juízo de cognição sumária, motivos a justificar a atribuição de efeito suspensivo à decisão agravada.

 No caso dos autos, sem adentrar na análise da probabilidade do direito das alegações da parte agravante, não vislumbro a presença do fundado perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, requisito indispensável à concessão do efeito suspensivo.

 Cumpre salientar que a decisão agravada pode perfeitamente ser modificada por ocasião do julgamento do presente recurso pelo colegiado, após o regular contraditório, sem que isso cause prejuízo às partes.

Ante o exposto, indefiro o pedido de efeito suspensivo. 

Publique-se. Intimem-se.”. 

 

O magistrado de primeiro grau decidiu a questão conforme fundamentação a seguir: 

 

“Trata-se de mandado de segurança impetrado por Bruna Alves Carneiro contra ato coator do Gerente Executivo da Caixa Econômica Federal em Jundiaí-SP, objetivando, liminarmente, o levantamento de saldo em sua conta vinculada ao FGTS.

Em síntese, sustenta a parte impetrante que sua filha está acometida de doença grave (autismo), necessitando dos recursos para seu tratamento.

Juntou documentos.

É o relatório. Decido.

O fundo de garantia do tempo de serviço (FGTS) é um direito social do trabalhador, insculpido no inciso III do artigo 7º da Constituição Federal.

Sua função originária é propiciar ao trabalhador uma poupança ao longo do tempo do exercício de sua atividade laborativa, em substituição à antiga estabilidade no emprego.

A par dessa função originária, possui o FGTS eminente função social, visando a amparar o trabalhador em momentos de necessidade ou mesmo auxiliando a melhorar suas condições de moradia.

Contudo, tendo em vista o escopo principal do FGTS, que é fazer uma poupança para o trabalhador - e ainda utilizar o fundo dessa poupança para financiamento de saneamento e habitação - somente nas hipóteses previstas em lei é que se poderá efetuar o levantamento do saldo existente.

A Lei nº 8.036/90, em seu artigo 20, relaciona inúmeras possibilidades de saque do FGTS, entre elas ser o trabalhador ou seu dependente portador de diversas doenças. Confira-se:

 “Art. 20. A conta vinculada do trabalhador no FGTS poderá ser movimentada nas seguintes situações:

(...)

XI - quando o trabalhador ou qualquer de seus dependentes for acometido de neoplasia maligna. (Incluído pela Lei nº 8.922, de 1994);

XIII - quando o trabalhador ou qualquer de seus dependentes for portador do vírus HIV; 

XIV - quando o trabalhador ou qualquer de seus dependentes estiver em estágio terminal, em razão de doença grave, nos termos do regulamento;

(...)”

Na interpretação desse dispositivo legal sobreleva lembrar que “O FGTS constitui-se em direito social do trabalhador (artigo 7º, inciso III, da Constituição Federal). Citado instituto, de natureza alimentar e substitutivo da estabilidade no emprego, visa a manutenção do trabalhador e de sua família, nas circunstâncias de desemprego involuntário, com atendimento de condições materiais mínimas de subsistência do ser humano, visando preservar sua dignidade, princípio fundamental do ordenamento jurídico pátrio.”, conforme já anotado pelo Ministro Teoria Zavascki, no Resp 770.963, de 15/05/07.

Nesse diapasão também já teve oportunidade o Superior Tribunal de Justiça de enfatizar que “O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, com assento no art. 1º, III, da CF/88, é fundamento do próprio Estado Democrático de Direito, que constitui a República Federativa do Brasil, e deve se materializar em todos os documentos legislativos voltados para fins sociais, como a lei que instituiu o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço” (RESP 691.715, Min. Eliana Calmon, de 22/03/05).

Dessa forma, não se pode dar interpretação restritiva às disposições do citado artigo 20 da Lei nº 8.038/90, máxime quando está em jogo a própria dignidade do trabalhador e de sua família, agravada pelas necessidades decorrentes de tratamento médico.

A parte impetrante pretende o saque do seu saldo do FGTS para auxiliar o tratamento de autismo de sua filha, conforme relatórios médicos apresentados com a inicial.

Desse modo, tendo em vista que está comprovado que a dependente da parte impetrante é portadora de grave doença, deve ser autorizado o levantamento do saldo vinculado ao FGTS em seu nome para cobertura de tratamento médico, não sendo restritivo o rol de doenças no art. 20 da Lei nº 8.036/90.

Cito julgado: 

E M E N T A

"ADMINISTRATIVO. FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO. LEVANTAMENTO DE SALDO DE CONTA VINCULADA. DOENÇA GRAVE NÃO ELENCADA EXPRESSAMENTE NO ART. 20 DA LEI Nº 8.036/1990. POSSIBILIDADE.

- O FGTS tem múltiplas finalidades sociais, especialmente dar amparo financeiro ao trabalhador (em situações tais como desemprego involuntário) e criar volume de recursos para financiar políticas públicas em diversas áreas (p. ex., financiamentos habitacionais, saneamento e infraestrutura socioeconômica). Em razão disso, o ordenamento jurídico tem delimitado a movimentação do FGTS mediante listas positivadas em atos normativos.

- As hipóteses tratadas no art. 20 da Lei nº 8.036/1990 devem ser interpretadas restritivamente (vale dizer, trata-se de lista taxativa), devendo ser cumpridas pela CEF. Porque essas hipóteses de saque foram abstratamente positivadas, pelo titular da competência normativa, dentro de limites da discricionariedade concedidos pela ordem jurídica, o Poder Judiciário também deve respeitá-las, contudo, harmonizando aspectos particulares que os autos revelem, podendo avaliar, no caso concreto, se há justificativas jurídicas igualmente protegidas pelo Estado de Direito que permitam saques pelo trabalhador.

- O caso sub judice cuida de situação concreta na qual é juridicamente legítimo o saque do FGTS, porque o motivo do pleito emerge como motivo equivalente àqueles descritos no art. 20 da Lei nº 8.036/1990, conciliando os mesmos propósitos individuais e públicos. Nessas circunstâncias, é presumível que o levantamento pelo trabalhador atenda aos melhores propósitos do FGTS.

- Pela documentação acostada aos autos, em consulta ao sistema de acompanhamento processual da Justiça Federal de Primeiro Grau em São Paulo/SP, verifica-se que o autor/agravado é titular de conta vinculada ao FGTS em relação a qual pede levantamento, bem como comprova que seu filho é portador de Transtorno do Espectro Autista (DSM-5: 299.00, CID-10: F84.0). Destaque-se que, conforme documento médico acostado aos autos, “A não realização das terapias de forma imediata pode causar prejuízos e impactos na qualidade de vida do paciente. As suspensões, interrupções e início tardio das intervenções compromete a perspectiva de um melhor prognóstico para o paciente”.

- Agravo de Instrumento desprovido."

(TRF 3ª Região, 2ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5024602-13.2021.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, julgado em 17/03/2022, DJEN DATA: 23/03/2022).                                        

Quanto ao levantamento imediato, observo que o artigo 29-B da Lei nº 8.036/90 assim dispõe:

“Art. 29-B. Não será cabível medida liminar em mandado de segurança, no procedimento cautelar ou em quaisquer outras ações de natureza cautelar ou preventiva, nem a tutela antecipada prevista nos arts. 273 e 461 do Código de Processo Civil que impliquem saque ou movimentação da conta vinculada do trabalhador no FGTS”. (incluído pela Medida Provisória nº 2.197-43, de 2001)

Contudo, na interpretação desse dispositivo legal não pode ser dado a ele amplitude maior do que vedar a liberação do FGTS para hipóteses não subsumíveis às disposições do artigo 20 da Lei nº 8.036/90.

Ademais, não se trata de medida liminar fundada em mero juízo de plausibilidade do direito da parte impetrante, mas de decisão fundada em documentação comprobatória da gravidade de situação de saúde, relembrando-se aqui que o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana deve ser sopesado em toda legislação, em especial aquela voltada para fins sociais.

Quanto à irreversibilidade da decisão, afora o fato de que o saldo do FGTS é, primeiramente, da própria parte, calha anotar as lições do Professor e Ministro do Supremo Tribunal Federal, Teori Albino Zavascki, em sua obra Antecipação da Tutela, editora Saraiva, 3ª edição, pág. 98, que embora tratando de antecipação de tutela bem se amolda ao caso:

“Casos haverá, e esses certamente são casos extremos, em que o conflito entre segurança e efetividade é tão profundo que apenas um deles poderá sobreviver, já que a manutenção de um importará o sacrifício completo do outro. Na Justiça Federal, por exemplo, não são incomuns pedidos de liberação de mercadorias perecíveis, retidas na alfândega para exame sanitário que, por alguma razão (greve dos servidores, por exemplo) não é realizado. Nesses casos, a concessão liminar da tutela pedida compromete irremediavelmente o direito à segurança jurídica a que faz jus o demandado (liberada e comercializada a mercadoria, já não há que se falar em seu exame fitossanitário); seu indeferimento torna letra morta o direito á efetividade do processo, porque, deteriorando-se o produto, inútil será sua posterior liberação. Em casos dessa natureza, um dos direitos fundamentais colidentes será sacrificado, não por vontade do juiz, mas pela própria natureza das coisas. Ad impossibilia nemo tenetur. Caberá ao juiz, com redobrada prudência, ponderar adequadamente os bens e valores colidentes e tomar a decisão em favor do que, em cada caso, puderem ser considerados prevalentes à luz do direito.” (grifo acrescido).

 

Não tenho dúvida de que a necessidade da parte impetrante, visando a manter a saúde e a dignidade humana, se sobrepõe ao interesse patrimonial do Fundo, que embora digno de resguardo, é verdade, deve ceder frente à natureza vital da necessidade.

Dessa forma não se pode dar interpretação restritiva ao disposto no citado artigo 29-B da Lei nº 8.038/90, máxime quando está em jogo a própria dignidade do trabalhador e de sua saúde, agravada pelas necessidades decorrentes de tratamento médico.

Em conclusão, no presente caso, tratando-se de levantamento do FGTS decorrente de tratamento de doença grave, cuja urgência é manifesta, deve ser desde logo liberado o saldo do FGTS da parte impetrante.

Ante o exposto, DEFIRO A LIMINAR requerida e determino a liberação à parte impetrante do saldo vinculado ao FGTS em seu nome.”. 

 

O Código de Processo Civil, em seu artigo 294, “caput”, dispõe que “A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência”. 

 

O artigo 300, “caput”, do mesmo Codex, por seu turno, prescreve que “A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo”. 

 

A jurisprudência tem firmado entendimento no sentido de que, em se tratando de doença grave, e havendo necessidade da importância depositada no FGTS, o trabalhador tem direito ao levantamento do saldo, ainda que não se trate de doença expressamente prevista na legislação.

 

 

Nesse sentido:

 

ADMINISTRATIVO. FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO. LEVANTAMENTO DE SALDO DE CONTA VINCULADA. DOENÇA GRAVE NÃO ELENCADA EXPRESSAMENTE NO ART. 20 DA LEI Nº 8.036/1990. POSSIBILIDADE.

- O FGTS tem múltiplas finalidades sociais, especialmente dar amparo financeiro ao trabalhador (em situações tais como desemprego involuntário) e criar volume de recursos para financiar políticas públicas em diversas áreas (p. ex., financiamentos habitacionais, saneamento e infraestrutura socioeconômica). Em razão disso, o ordenamento jurídico tem delimitado a movimentação do FGTS mediante listas positivadas em atos normativos.

- As hipóteses tratadas no art. 20 da Lei nº 8.036/1990 devem ser interpretadas restritivamente (vale dizer, trata-se de lista taxativa), devendo ser cumpridas pela CEF. Porque essas hipóteses de saque foram abstratamente positivadas, pelo titular da competência normativa, dentro de limites da discricionariedade concedidos pela ordem jurídica, o Poder Judiciário também deve respeitá-las, contudo, harmonizando aspectos particulares que os autos revelem, podendo avaliar, no caso concreto, se há justificativas jurídicas igualmente protegidas pelo Estado de Direito que permitam saques pelo trabalhador.

- O caso sub judice cuida de situação concreta na qual é juridicamente legítimo o saque do FGTS, porque o motivo do pleito emerge como motivo equivalente àqueles descritos no art. 20 da Lei nº 8.036/1990, conciliando os mesmos propósitos individuais e públicos. Nessas circunstâncias, é presumível que o levantamento pelo trabalhador atenda aos melhores propósitos do FGTS.

- Pela documentação acostada aos autos, verifica-se que o autor é titular de conta vinculada ao FGTS em relação a qual pede levantamento, bem como comprova que seu filho é portador de Transtorno do Espectro Autista (DSM-5: 299.00, CID-10: F84.0). Destaque-se que, conforme documento médico acostado aos autos, “A não realização das terapias de forma imediata pode causar prejuízos e impactos na qualidade de vida do paciente. As suspensões, interrupções e início tardio das intervenções compromete a perspectiva de um melhor prognóstico para o paciente”.

- Remessa necessária desprovida.

 (TRF 3ª Região, 2ª Turma, RemNecCiv - REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL - 5026377-96.2021.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, julgado em 29/07/2022, Intimação via sistema DATA: 29/07/2022)

 

MANDADO DE SEGURANÇA. FGTS. LEVANTAMENTO DE SALDO. LEI 8.036/90, ART. 20. ROL NÃO TAXATIVO.

I - Presente no caso concreto o pressuposto de semelhança relevante, é de se admitir o emprego da analogia, vislumbrando-se na hipótese fática o mesmo elemento de gravidade do estado de saúde do dependente dos impetrantes contemplado pela norma positivada a determinar a autorização de levantamento do FGTS.

II - Recurso provido.

(TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL,5016966-97.2019.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal OTAVIO PEIXOTO JUNIOR, julgado em 14/05/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 18/05/2020)

 

No caso, como bem assinalado na decisão agravada, ao concluir que: “(...) tratando-se de levantamento do FGTS decorrente de tratamento de doença grave, cuja urgência é manifesta, deve ser desde logo liberado o saldo do FGTS da parte impetrante.”.

 

Por derradeiro, cumpre consignar que a alegação no sentido de que os valores do FGTS saque-aniversário foram dados em garantia fiduciária a instituições financeiras para empréstimo, não pode ser apreciada por este Tribunal, sob pena de indevida supressão de instância, uma vez que referida informação não estava disponível na análise da liminar pelo Juízo a quo.

 

Dessa forma, não vejo motivos para alterar o posicionamento adotado. 

 

Ante o exposto, nego provimento ao agravo de instrumento. Julgo prejudicado o agravo interno.  

 

É o voto. 



E M E N T A

 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. FGTS. LEVANTAMENTO DO SALDO. DOENÇA GRAVE NÃO PREVISTA EXPRESSAMENTE PELA LEI N. 8.036/1990. POSSIBILIDADE. TUTELA ANTECIPADA. DEFERIMENTO. RECURSO DESPROVIDO. 

1. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.

2. A jurisprudência pátria vem decidindo a favor do levantamento do saque do FGTS em diversos casos de dependentes/filhos diagnosticados com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Precedentes.

3. No caso, como bem assinalado na decisão agravada, ao concluir que: “(...) tratando-se de levantamento do FGTS decorrente de tratamento de doença grave, cuja urgência é manifesta, deve ser desde logo liberado o saldo do FGTS da parte impetrante.”.

4. Agravo de instrumento não provido. Prejudicado o agravo interno.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, e julgar prejudicado o agravo interno, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.