Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002064-70.2018.4.03.6102

RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO

APELANTE: ISRAEL BARBERO PARRA

Advogado do(a) APELANTE: GISELE QUEIROZ DAGUANO - SP257653-A

APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002064-70.2018.4.03.6102

RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO

APELANTE: ISRAEL BARBERO PARRA

Advogado do(a) APELANTE: GISELE QUEIROZ DAGUANO - SP257653-A

APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO MORIMOTO (RELATOR):

Trata-se de apelação interposta por ISRAEL BARBERO PARRA em face de sentença de improcedência, nos autos da ação ajuizada em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF, objetivando a anulação de procedimento extrajudicial que culminou na consolidação da propriedade fiduciária de imóvel dado em garantia e suspensão dos leilões designados.

Consta nos autos que a parte autora celebrou contrato de mútuo habitacional com a CEF em 18/10/23 (ID 152047877), com registro em cartório em 22/11/2013 (ID 152047836, averbação nº 12) mas ficou inadimplente por motivos pessoais (ID 152047502), o que ensejou a consolidação da propriedade fiduciária do imóvel em prol da CEF em 08/03/17, após transcorrer in albis o prazo para purgação da mora (ID 152047836, averbação nº 14), e o agendamento de leilões para 20/04/18 e 04/05/18 (ID 152047837).

Alega nulidade no procedimento extrajudicial e direito à revisão do contrato, para evitar eventual lesão, fundamentando-se na teoria da imprevisão. Pede, liminarmente, a suspensão do leilão (ID 152047502).

Em 20/04/18 a autora comprova nos autos o depósito judicial de R$ 20.000,00 (ID 152047513).

A liminar foi concedida parcialmente "para suspender os efeitos de eventual e futura arrematação, até que as partes possam tentar se conciliar em audiência". Houve a concessão do benefício da justiça gratuita à parte autora (ID 152047515).

A CEF informou nos autos o resultado negativo do primeiro leilão e a suspensão do segundo leilão em observância da decisão liminar (ID 152047527).

O banco apresentou contestação alegando ausência de interesse de agir da autora; regularidade do procedimento extrajudicial de consolidação da propriedade, que se processou segundo os ditames da Lei 9.514/97; e requerimento de improcedência da ação (ID 152047833). Foram juntados diversos documentos relacionados ao processo de execução extrajudicial, inclusive intimação do devedor para purgar a mora e notificação sobre a designação dos leilões.

Em réplica, a parte autora afirma não ter sido informada sobre os leilões (ID 152047847).

Foi designada audiência de tentativa de conciliação para 12/09/19, com proposta da CEF de pagamento total para liquidação ou pagamento do débito para reativação do contrato e as partes solicitaram suspensão do processo por 60 dias ante a possibilidade de renegociação (ID 152047860).

Em 27/11/19 houve nova audiência de conciliação, com nova proposta da CEF de pagamento total para quitação do contrato ou parcial para quitação da dívida e retomada do contrato, mas a autora informou que não tinha condições de aceitar a proposta, podendo pagar apenas o valor já depositado nos autos (ID 152047513) e o saldo de FGTS, requerendo nova audiência de conciliação, sem oposição da CEF (ID 152047866).

O pedido de nova audiência de conciliação foi indeferido (ID 152047867).

Foi proferida sentença de improcedência, fundada no reconhecimento da regularidade do procedimento extrajudicial de consolidação da propriedade, nos termos da Lei 9.514/97 e na ausência de irregularidade contratual que justificasse o inadimplemento da autora (ID  152047878).

No recurso em tela, sustenta o apelante que tentou renegociar o débito, sem sucesso, o que ensejou o ajuizamento do processo, que o valor já depositado é suficiente para pagamento do débito em atraso, que deve ser incorporado ao saldo devedor do processo com o recálculo das prestações. Pede a aplicação da teoria da imprevisão para revisar o processo por onerosidade excessiva. Requer seja possibilitada a purgação da mora até a expedição da carta de arrematação ou pagamento das parcelas vencidas (ID 152047880).

Intimada, a CEF apresentou contrarrazões pleiteando a manutenção da sentença recorrida (ID 152047884).

Devidamente processado o recurso, subiram os autos a esta E. Corte.

É o relatório.

 

 

 BC

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
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1ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002064-70.2018.4.03.6102

RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO

APELANTE: ISRAEL BARBERO PARRA

Advogado do(a) APELANTE: GISELE QUEIROZ DAGUANO - SP257653-A

APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO MORIMOTO (RELATOR):

Pugna o apelante seja possibilitada a purgação da mora até a expedição da carta de arrematação ou pagamento das parcelas vencidas (ID 152047880).

Consultando os autos principais, a CEF apresentou contestação e manifestação, alegando que consolidou a propriedade do bem em regular observância da Lei (ID 152047833).

Na matrícula do imóvel, está registrada a alienação fiduciária 22/11/2013 (ID 152047836, averbação nº 12) e a consolidação da propriedade em prol da CEF em 08/03/17 (ID 152047836, averbação nº 14) constando que a devedora foi regularmente intimada e não purgou a mora, informação que goza de fé pública nos termos da art. 3º, Lei 8.935/94.

O Cartório do Registro de Imóveis, através do Oficial respectivo, realiza atos públicos, os quais gozam da presunção de legitimidade, e executa as etapas que obrigatoriamente antecedem à averbação da consolidação da propriedade. A presunção de legitimidade da qual goza o ato público é iuris tantum, e pode ser ilidida durante a instrução do processo em regular procedimento observando o contraditório, encargo do qual não se desincumbiu a apelante (art. 373, I do CPC).

O apelante tinha ciência, desde a assinatura do contrato, que o inadimplemento poderia levar à perda do imóvel, e confirma que deixou de pagar o débito por questões pessoais (ID 152047502).

Apesar de alegar onerosidade excessiva do contrato, não indica as cláusulas contratuais que pretendia controverter, incorrendo em inépcia, no particular (art. 330, § 2º do CPC), nem continuou a depositar os valores incontroversos (art. 330, § 3º do CPC). Toda a alegação sobre a revisão contratual, teoria da imprevisão e onerosidade excessiva é genérica e desprovida de fundamento de fato e de direito.

Não se imputa ilegalidade ao procedimento de consolidação da propriedade e há prova nos autos que a devedora foi intimada para purgação da mora (ID 152047835; ID 152047836) e teve ciência sobre a designação dos leilões (ID 152047836). A inicial foi protocolada um dia antes do primeiro leilão designado já solicitando a suspensão, configurando ciência inequívoca da apelante (precedentes do C. STJ - AgInt-AREsp 1.897.413, Proc. 2021/0141367-2 de 07/2022; AgInt-REsp 1.325.854, Proc. 2011/0168967-2 de 11/2021 e deste E. Tribunal - AI 5029986-20.2022.4.03.0000 de 04/2023; AI 5026292-43.2022.4.03.0000 de 12/2022).

A CEF, mesmo sem obrigatoriedade legal, apresentou nas duas audiências de conciliação realizadas na origem, proposta de acordo, admitindo inclusive apenas a quitação do valor atrasado e retomada do contrato (ID 152047860; ID 152047867), sem aceitação da parte autora, que indicou não ter condições de adimplir.

A mera pretensão de acordo sem que o apelante demonstre efetiva intenção e possibilidade de pagamento não é argumento suficiente para acolhimento do pedido e não há obrigação legal do agente financeiro de renegociar a dívida ou aceitar pagamento parcial, e qualquer provimento jurisdicional nesse sentido configuraria ingerência indevida do Poder Judiciário na autonomia e liberdade contratual das partes envolvidas.

Os atos expropriatórios decorrem do exercício regular do direito da CEF e devem prosseguir para preservar o procedimento complexo de alienação e os interesses legítimos da credora. 

Não obstante o cenário fático demonstrar que o apelante não tem meios reais para adimplir o débito, o contrato foi celebrado em 2013 e a propriedade consolidada em março/2017, na vigência da Lei 9.514/1997 e antes da entrada em vigor da Lei 13.465/2017 (em 11/07/17) que estabeleceu um marco expresso para purgação da mora até a data da averbação da consolidação da propriedade fiduciária (art. 26-A, § 2º).

A Lei 9.514/97 autorizava a purgação sem instituir um marco máximo para o devedor e, segundo entendimento jurisprudencial, pela previsão do art. 34 do Decreto-Lei 70/66, era possível purgar a mora a qualquer momento até a assinatura do auto de arrematação. No mesmo sentido é o art. 826 do CPC e enunciado nº 151 do CJF.

Pela data da contratação e data de consolidação da propriedade, forçoso concluir que a apelante tem direito de purgar a mora até a assinatura do auto de arrematação.

Com fundamento no art. 85, § §11 e 14, do CPC, considerando a sucumbência recíproca e que a inadimplência incontroversa da parte autora deu causa a ação, fixo em 10% o percentual da verba honorária de sucumbência em benefício de cada uma das partes, vedada a compensação e respeitados os limites máximos previstos nesse mesmo preceito legal. Observe-se o art. 98, § 3º, do CPC, ante a concessão de gratuidade de justiça.

Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação, para reconhecer o direito da apelante de purgar a mora até a assinatura do auto de arrematação, fixados os consectários na forma da fundamentação acima.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DIREITO PRIVADO. APELAÇÃO CÍVEL. FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. VÍCIOS NÃO COMPROVADOS. INEXISTÊNCIA DE DIREITO À REVISÃO CONTRATUAL. CONTRATO E CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE ANTERIORES À LEI 13.465/17. DIREITO DE PURGAR A MORA ATÉ A ASSINATURA DO AUTO DE ARREMATAÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

- Pugna o apelante seja possibilitada a purgação da mora até a expedição da carta de arrematação ou pagamento das parcelas vencidas (ID 152047880).

- Na matrícula do imóvel, está registrada a alienação fiduciária 22/11/2013 (ID 152047836, averbação nº 12) e a consolidação da propriedade em prol da CEF em 08/03/17 (ID 152047836, averbação nº 14) constando que a devedora foi regularmente intimada e não purgou a mora, informação que goza de fé pública nos termos da art. 3º, Lei 8.935/94.

- As alegações sobre a revisão contratual, teoria da imprevisão e onerosidade excessiva são genéricas e desprovidas de fundamento de fato e de direito.

- Não se imputa ilegalidade ao procedimento de consolidação da propriedade e há prova nos autos que a devedora foi intimada para purgação da mora (ID 152047835; ID 152047836) e teve ciência sobre a designação dos leilões (ID 152047836).

- Os atos expropriatórios decorrem do exercício regular do direito da CEF e devem prosseguir para preservar o procedimento complexo de alienação e os interesses legítimos da credora. 

- A propriedade foi consolidada em março/2017, na vigência da Lei 9.514/1997 e antes da entrada em vigor da Lei 13.465/2017 (em 11/07/17) que estabeleceu um marco expresso para purgação da mora até a data da averbação da consolidação da propriedade fiduciária (art. 26-A, § 2º).

- A Lei 9.514/97 autorizava a purgação sem instituir um marco máximo para o devedor e, segundo entendimento jurisprudencial, pela previsão do art. 34 do Decreto-Lei 70/66, era possível purgar a mora a qualquer momento até a assinatura do auto de arrematação. No mesmo sentido é o art. 826 do CPC e enunciado nº 151 do CJF.

- Pela data da contratação e data de consolidação da propriedade, forçoso concluir que a apelante tem direito de purgar a mora até a assinatura do auto de arrematação.

- Com fundamento no art. 85, § §11 e 14, do CPC, considerando a sucumbência recíproca e que a inadimplência incontroversa da parte autora deu causa a ação, fixado em 10% o percentual da verba honorária de sucumbência em benefício de cada uma das partes, vedada a compensação e respeitados os limites máximos previstos nesse mesmo preceito legal. Observe-se o art. 98, § 3º, do CPC, ante a concessão de gratuidade de justiça.

- Apelação parcialmente provida. 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, por unanimidade, deu parcial provimento à apelação, para reconhecer o direito da apelante de purgar a mora até a assinatura do auto de arrematação, fixados os consectários, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.