Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5008171-93.2019.4.03.6103

RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. AUDREY GASPARINI

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

APELADO: LIANE ADORNO DE OLIVEIRA

Advogado do(a) APELADO: ERICK ARAUJO DUARTE - SP376616-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5008171-93.2019.4.03.6103

RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. AUDREY GASPARINI

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

 

APELADO: LIANE ADORNO DE OLIVEIRA

Advogado do(a) APELADO: ERICK ARAUJO DUARTE - SP376616-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de ação ordinária promovida por LIANE ADORNO DE OLIVEIRA em face da União, objetivando a concessão de provimento jurisdicional que determine que a ré se abstenha de licenciar ou de impedir a prorrogação do tempo de serviço da autora, ao fundamento de ter atingido a idade de 45 anos.

Por sentença proferida em ID 155508469 foi julgada procedente a ação “para condenar a União a se abster de impedir a prorrogação do tempo de serviço da autora ao exclusivo fundamento do atingimento da idade de 45 (quarenta e cinco) anos, devendo reintegrá-la ao Quadro de Sargentos da Reserva de 2ª Classe Convocados”.

Apela a União (ID 155508482) sustentando que o limite etário de 45 (quarenta e cinco) anos de idade para o serviço ativo está estabelecido expressamente previsto na Lei nº 13.954/2019 e aduzindo que “Não cabe ao Judiciário intervir no mérito do ato administrativo a ponto de substituir a decisão da Administração Militar, salvo quando os critérios legais do procedimento forem devidamente inobservados, já que qualquer ilegalidade representaria desrespeito aos limites do poder discricionário e seria passível de correção, o que não ocorreu no caso”, requerendo o julgamento de improcedência da ação em razão da inexistência de ilegalidade cometida pela Administração Militar.

Com contrarrazões, subiram os autos.

É o relatório.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5008171-93.2019.4.03.6103

RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. AUDREY GASPARINI

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

 

APELADO: LIANE ADORNO DE OLIVEIRA

Advogado do(a) APELADO: ERICK ARAUJO DUARTE - SP376616-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

Trata-se de recurso de apelação objetivando a reforma de sentença que julgou procedente a ação para condenar a União a se abster de impedir a prorrogação do tempo de serviço da autora ao exclusivo fundamento do atingimento da idade de 45 (quarenta e cinco) anos.

O Juízo de primeiro grau decidiu a questão sob os seguintes fundamentos:

“Busca a parte autora seja obstado o seu licenciamento “ex officio” da Aeronáutica em razão do atingimento da idade de 45 anos, considerada pela ré como limite para permanência dos militares temporários no desempenho do serviço para o qual inicialmente convocados. Como já ocorrido o licenciamento (no curso do processo), pugna por sua reintegração às Forças Armadas.

Segundo a parte autora, a limitação etária contra si imposta deveria estar fundamentada em lei e não em ato normativo de estirpe inferior, o que entende contrariar o disposto na Constituição Federal.

Acerca do requisito “idade” para ingresso nas Forças Armadas, estabelece o artigo 10 da Lei nº 6.880/80 (Estatuto dos Militares) que “O ingresso nas Forças Armadas é facultado, mediante incorporação, matrícula ou nomeação, a todos os brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei e nos regulamentos da Marinha, do Exército e da Aeronáutica”.

Não obstante a legislação em questão contemple a possibilidade de que os requisitos para ingresso nas Forças Armadas sejam fixados por meio de atos diversos da lei stricto sensu (no caso, regulamentos), o artigo 142, §3º, inciso X da Constituição Federal é categórico ao dispor que:

Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.

§ 3º Os membros das Forças Armadas são denominados militares, aplicando-se-lhes, além das que vierem a ser fixadas em lei, as seguintes disposições:

(...)

X- a lei disporá sobre o ingresso nas Forças Armadas, os limites de idade, a estabilidade e outras condições de transferência do militar para a inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as prerrogativas e outras situações especiais dos militares, consideradas as peculiaridades de suas atividades, inclusive aquelas cumpridas por força de compromissos internacionais e de guerra” (grifei)

Tem-se, assim, que os requisitos para o ingresso nas Forças Armadas (entre os quais os limites etários) devem estar fundamentados em lei em sentido material e formal, ou seja, em ato normativo emanado do Poder Legislativo, na forma do artigo 61 da Constituição Federal, excluídas, para o cumprimento de tal finalidade, outras espécies normativas, sob pena de afronta ao princípio da legalidade a que aludem os artigos 5º, II e 37 da Norma Ápice.

Pertinente ressaltar que o C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 600.885/RS, submetido ao regime da repercussão geral, declarou que não foi recepcionada a expressão "nos regulamentos da Marinha, do Exército e da Aeronáutica" contida no citado art. 10 da Lei 6.880/80. Confira-se a ementa do referido julgado:

(...)

No caso concreto, a parte autora ingressou nas Forças Armadas na data de 15/06/2018 (id 25645831), por meio de convocação, para integrar quadro de militares temporários (o Quadro de Sargentos Convocados - QSCON, na especialidade Obras), com previsão da possiblidade de prorrogação do prazo para a prestação do serviço por até 08 (oito) anos, a critério da Administração Castrense.

No entanto, por ter a requerente atingido a idade de 45 (quarenta e cinco) anos em 20/04/2020, a Aeronáutica limitou a prorrogação do seu tempo de serviço até 31.12.2018, motivando a dispensa “ex-officio” no atingimento do limite de 45 anos de idade, na forma estabelecida pelo item 2.11.3 da Instrução Reguladora do Quadro de Sargentos da Reserva de 2ª Classe Convocados, aprovada pela Portaria nº 1591/GC3, de 25 de setembro de 2014.

Argumenta a ré, em defesa, que, ao contrário da tese esposada na inicial, o limite etário imposto à parte autora encontra-se previsto expressamente no art.5º da Lei nº4.375/1964, que disciplinaria o serviço militar temporário, o qual afirma ter sido recepcionado pela CF/88. Transcrevo, abaixo, o artigo em comento, para melhor compreensão da matéria:

“Art. 5º. A obrigação para com o Serviço Militar, em tempo de paz, começa no 1º dia de janeiro do ano em que o cidadão completar 18 (dezoito) anos de idade e subsistirá até 31 de dezembro do ano em que completar 45 (quarenta e cinco) anos”.

Acrescenta, ainda, o ente público, ainda, que o Decreto nº 6.854/2009 (alterado pelo Decreto nº 8.130/2013), que trata do Regulamento da Reserva da Aeronáutica, prevê expressamente em seu artigo. 31, §1º, que “em tempo de paz, não será concedida prorrogação de tempo de serviço ao militar R/2 por períodos que venham a ultrapassar a data de 31 de dezembro do ano em que ele completar quarenta e cinco anos de idade, data de sua desobrigação para com o Serviço Militar”.

Pois bem. É sabido que os militares temporários podem ser licenciados por motivos de conveniência e oportunidade (ato discricionário), o que, em regra, dispensa motivação. Pode a Administração Castrense, após o transcurso do período inicial previsto para a prestação do serviço pelo militar convocado, optar pela não prorrogação do período, o que não é passível de revisão pelo Poder Judiciário, a quem cabe apenas apreciar a legalidade do ato administrativo, em apreço à teoria dos motivos determinantes.

Não obstante, se verificada hipótese de licenciamento fundamentado exclusivamente no atingimento de limite etário que não esteja assentado em lei (em sentido material e formal), será devida a prorrogação de prazo requerida, sem a limitação etária.

Diferentemente da tese sustentada pela União, a jurisprudência do C. STJ tem se posicionado no sentido de que "(...) a Lei nº 4.375/64 embora disponha em seu art. 5º, caput, limites etários quanto à obrigatoriedade do serviço militar, podendo haver a convocação do cidadão até a idade de 45 anos, não trata de limitação da idade para a permanência do militar voluntário temporário, mas de serviço obrigatório. O Decreto nº 6.854/2009 também não trata de serviço voluntário, mas serviço obrigatório, diferentemente da discussão aqui analisada" (...)” (PROCESSO 08099806320174050000, AG/SE, DESEMBARGADOR FEDERAL ROBERTO MACHADO, 1ª Turma, JULGAMENTO: 26/02/2018).

Tem-se, assim, que o artigo 5º da Lei nº4.375/64 constitui previsão legal reguladora do serviço militar obrigatório, cujo regime jurídico difere daquele que ampara os militares temporários convocados (caso da autora).

A corroborar o entendimento ora externado, colaciono julgados recém proferidos pelo E. TRF da 3ª Região:

(...)

Disso decorre que o licenciamento de militar voluntário temporário fundado exclusivamente no atingimento da idade de 45 (quarenta e cinco) anos, por ausência de previsão legal, não pode subsistir. Essa é a hipótese dos autos, consoante se extrai do documento sob Id 35043287.

Deveras, se o disposto no artigo 5º da Lei nº4.375/64, como anteriormente mencionado, não trata de limitação da idade para a permanência do militar voluntário temporário, mas do serviço militar obrigatório, tem-se que o licenciamento da parte autora, que foi fundamentado exclusivamente no atingimento da idade de 45 (quarenta e cinco) anos, restou amparado apenas em Portaria do Comando da Aeronáutica (Instrução Reguladora do Quadro de Sargentos da Reserva de 2ª Classe Convocados, aprovada pela Portaria nº 1591/GC3, de 25 de setembro de 2014), o que não pode subsistir, devendo ser reconhecida a ilegalidade do ato praticado.

Ainda que possa haver entendimento em sentido contrário a respeito da aplicação da citada Lei nº4.375/64 (que regula o Serviço Militar), inexorável é que o citado art. 5º, ao estipular o limite 45 (quarenta e cinco) anos, apenas faz referência à idade em que se extinguiria a obrigação de prestar serviço militar, não contemplando nenhuma proibição para o exercício da atividade.

O pedido destes autos deve, assim, ser julgado procedente, a fim de impor à União a obrigação de se abster de licenciar a parte autora ou de impedir a prorrogação do tempo de serviço dela tão-somente pelo fundamento do atingimento do limite de idade de 45 (quarenta e cinco) anos.

Na hipótese, o documento de id 35043287 demonstra que a autora, no curso da presente ação, foi licenciada (em 20/05/2020) por conclusão de tempo de serviço (em razão do atingimento do limite etário – id 25645832), razão pela qual se impõe a reintegração dela ao Quadro de Sargentos da Reserva de 2ª Classe Convocados, por se tratar de pedido subsidiário implícito ao formulado inicialmente (de condenação da ré a se abster de licenciar a autora ou de impedir a prorrogação do tempo de serviço dela). Não há, assim, que se cogitar de julgamento ultra petita.

Verifico, ainda, que estão presentes os requisitos para a concessão de tutela antecipada. A probabilidade do direito alegado é patente ante a fundamentação acima. Igualmente, presente está o perigo de dano, haja vista que eventual demora na reintegração da autora poderá acarretar-lhe prejuízos de grande monta, haja vista a natureza alimentar das parcelas remuneratórias decorrentes do Posto.”

A sentença merece reforma.

Com efeito, observo que o Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário nº 600.885/RS, declarou a inconstitucionalidade de limitação de idade baseada tão somente em ato normativo infralegal, ou seja, não havendo lei que limitasse o ingresso nas Forças Armadas com base em idade, não seria lícito, ou mesmo constitucional, que a Administração estabelecesse restrição dessa natureza com base em norma secundária, cujo caráter regulamentar lhe é inerente, verbis:

DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO PARA INGRESSO NAS FORÇAS ARMADAS: CRITÉRIO DE LIMITE DE IDADE FIXADO EM EDITAL. REPERCUSSÃO GERAL DA QUESTÃO CONSTITUCIONAL. SUBSTITUIÇÃO DE PARADIGMA. ART. 10 DA LEI N. 6.880/1980. ART. 142, § 3º, INCISO X, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. DECLARAÇÃO DE NÃO-RECEPÇÃO DA NORMA COM MODULAÇÃO DE EFEITOS. DESPROVIMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO.

1. Repercussão geral da matéria constitucional reconhecida no Recurso Extraordinário n. 572.499: perda de seu objeto; substituição pelo Recurso Extraordinário n. 600.885.

2. O art. 142, § 3º, inciso X, da Constituição da República, é expresso ao atribuir exclusivamente à lei a definição dos requisitos para o ingresso nas Forças Armadas.

3. A Constituição brasileira determina, expressamente, os requisitos para o ingresso nas Forças Armadas, previstos em lei: referência constitucional taxativa ao critério de idade. Descabimento de regulamentação por outra espécie normativa, ainda que por delegação legal.

4. Não foi recepcionada pela Constituição da República de 1988 a expressão “nos regulamentos da Marinha, do Exército e da Aeronáutica” do art. 10 da Lei n. 6.880/1980.

5. O princípio da segurança jurídica impõe que, mais de vinte e dois anos de vigência da Constituição, nos quais dezenas de concursos foram realizados se observando aquela regra legal, modulem-se os efeitos da não-recepção: manutenção da validade dos limites de idade fixados em editais e regulamentos fundados no art. 10 da Lei n. 6.880/1980 até 31 de dezembro de 2011.

6. Recurso extraordinário desprovido, com modulação de seus efeitos.

(STF, RE 600885, Relator(a):  Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 09/02/2011, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-125 DIVULG 30-06-2011 PUBLIC 01-07-2011 EMENT VOL-02555-03 PP-00398)

Não obstante, a partir das mudanças promovidas pela Lei nº 13.954/2019 foi atendida a exigência formal do art. 142 § 3º, X, da Constituição de 1988, restando estabelecido limite etário de permanência, qual seja, o de 45 (quarenta e cinco) anos, conforme o artigo 27 da Lei do Serviço Militar (Lei nº 4.375/1964).

Destarte, considerando que o critério de idade em questão foi estabelecido em lei, cuja edição resta autorizada na própria Constituição Federal, não cabe ao Poder Judiciário ampliá-lo ao argumento de violação do princípio da razoabilidade.

Outrossim, assevero que a Lei nº 13.954/2019, publicada em 16/12/2019, é aplicável às relações dos militares com a Administração castrense, ainda que o militar tenha ingressado em tempo anterior à efetividade da referida legislação, tendo em vista que tal fato não possui o condão de lhe conferir uma espécie de "direito adquirido", devendo ser aplicada a lei vigente à época da análise dos requisitos para a prorrogação do tempo de serviço.

No sentido do exposto destaco os seguintes julgados desta Corte:

ADMINISTRATIVO. JUÍZO NEGATIVO DE RETRATAÇÃO. MILITAR TEMPORÁRIO E VOLUNTÁRIO. PRORROGAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE DIREITO SUBJETIVO. LIMITE DE IDADE. LEI Nº 13.954/2019. TEMA 121/STF. SUPERAÇÃO

- A expressa referência feita a “limites de idade” no art. 142, §3º, X, da ordem constitucional de 1988, impediu a recepção da parte final do art. 10, caput, da Lei nº 6.880/1980, razão pela qual decretos regulamentares e demais atos normativos da administração militar não podem mais cuidar desse tema submetido à reserva absoluta de lei. Os limites etários previstos no art. 5º da Lei nº 4.375/1964 ficaram restritos ao serviço militar temporário e obrigatório em tempo de paz, e foram considerados inválidos decretos regulamentares que estabeleceram idade máxima para a prorrogação no serviço militar temporário e voluntário. Precedentes do E.STF (RE 600885, Tema 121) e deste E.TRF.

- Ocorre que sobreveio a Lei nº 13.954/2019, dando nova redação ao art. 27 da Lei nº 4.375/1964, cumprindo a exigência de lei ordinária (art. 142 § 3º, X, da Constituição) para estabelecer limite etário para ingresso e para a permanência no serviço militar temporário e voluntário (como praças ou oficiais), assim como tempo máximo de 96 meses de duração (em qualquer Força Armada).

- As disposições da Lei nº 13.954/2019 são aplicáveis desde sua publicação (DOU de 17/12/2019, inclusive), de tal modo que a partir de então a administração militar está vinculada aos limites legais para prorrogações do serviço militar temporário e voluntário. Ainda que a admissão do militar tenha se dado anteriormente à edição da Lei nº 13.954/2019, os respectivos editais e processos seletivos têm contínua subordinação à lei, mesmo porque os atos administrativos de efeito concreto devem obedecer os comandos normativos vigentes no momento em que são elaborados.

- Mesmo as redações anteriores da Lei nº 4.375/1964 e da Lei nº 6.880/1980 não asseguravam direito subjetivo à permanência no serviço militar temporário e voluntário. O art. 33, §2º, da Lei nº 4.375/1964 (na redação dada pela Lei nº 13.954/2019) apenas deixou expresso o entendimento já afirmado no sentido de que a administração militar sempre teve discricionariedade para avaliar a permanência do temporário e voluntário no serviço militar (salvo hipóteses de atos vinculados à lei, por óbvio). Mas com as novas redações dadas pela Lei nº 13.954/2019 ao art. 27 da Lei nº 4.375/1964 e ao art. 121, §3º, “d”, da Lei nº 6.880/1980, o licenciamento ex officio de militar temporário e voluntário é ato administrativo vinculado quanto aos limites etários, e o Poder Judiciário não pode impor prorrogações além das previstas em legítima legislação específica.

- Diante da edição da Lei nº 13.954/2019, que dispõe sobre o limite etário para ingresso e permanência no serviço militar temporário e voluntário, resta superada a Tese firmada pelo E.STF no Tema 121: “Não foi recepcionada pela Constituição da República de 1988 a expressão “nos regulamentos da Marinha, do Exército e da Aeronáutica” do art. 10 da Lei 6.880/1980, dado que apenas lei pode definir os requisitos para ingresso nas Forças Armadas, notadamente o requisito de idade, nos termos do art. 142, § 3º, X, da Constituição de 1988. Descabe, portanto, a regulamentação por outra espécie normativa, ainda que por delegação legal”. 

-Em juízo negativo de retratação, nos termos do art. 1.041 do Código de Processo Civil, mantém-se a conclusão do julgamento no sentido de negar provimento ao apelo autoral. 

(TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5009650-96.2020.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, julgado em 14/07/2023, DJEN DATA: 19/07/2023);

MILITAR TEMPORÁRIO. LICENCIAMENTO. LIMITE ETÁRIO DE 45 ANOS. RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 600.885 (TEMA 121 DA REPERCUSSÃO GERAL). INAPLICABILIDADE. JUÍZO DE RETRATAÇÃO NEGATIVO.

I - Os fundamentos adotados pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 600.885 (Tema 121 da Repercussão Geral) não se aplicam aos licenciamentos fundamentados na Lei nº 13.954/2019, uma vez que os motivos determinantes daquela decisão basearam-se na ausência de previsão legal limitadora da idade para o serviço militar, questão diversa da debatida no presente feito, cuja parte autora foi licenciada em razão do limite de idade fixado em lei.

II - Juízo de retratação negativo, mantendo o acórdão que rejeitou os Embargos de declaração.

(TRF 3ª Região, 2ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5020653-78.2021.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, julgado em 15/12/2022, DJEN DATA: 19/12/2022);

ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. MILITAR TEMPORÁRIO. VOLUNTÁRIO. PRORROGAÇÃO DO TEMPO DE SERVIÇO. IDADE LIMITE DE 45 (QUARENTA E CINCO) ANOS. PREVISÃO LEGAL. TEMA 121/RE 600.885, STF. NÃO APLICAÇÃO AO CASO CONCRETO. DIREITO ADQUIRIDO A ESTABILIDADE. AUSÊNCIA. LICENCIAMENTO. LEGALIDADE. DATA DE INGRESSO. TERMO INICIAL. CONTAGEM DO TEMPO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.

1. Com relação ao serviço militar temporário, deve ser salientado que não objetiva a efetivação do militar às Forças Armadas para o preenchimento de uma vaga na Organização Militar, e sim, visa preparar uma reserva de cidadãos aptos a serem mobilizados e convocados em uma situação de emergência, prevista em lei, sem a obrigatoriedade de manutenção desse militar no corpo efetivo das Forças Armadas, com todas as prerrogativas de um militar de carreira estável e às expensas dos cofres públicos.

2. Tem-se que o serviço militar temporário tem a natureza jurídica de vínculo precário do militar com a administração, em razão de prestação temporária do serviço militar por tempo determinado, com a possibilidade de prorrogações de tempo (engajamentos e reengajamentos), sob os critérios de discricionariedade – conveniência e oportunidade - da Administração Militar.

3. O serviço militar temporário pode ser prestado sob duas modalidades: serviço obrigatório, por força da CF/88 art. 143 e de forma voluntária, com ingresso através de Processo Seletivo simplificado, de convocação Regional, diverso de Concurso Público de convocação Nacional, sendo ambos por prazo determinado ou com possibilidade de prorrogação do tempo de serviço, após o término do prazo determinado.

4. Por previsão expressa na CF/88 no artigo 142, § 3º, inciso X, dispõe que dependerá de disposição em lei, o ingresso nas Forças Armadas, os limites de idade, a estabilidade e outras condições de transferência do militar para a inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as prerrogativas e outras situações especiais dos militares, consideradas as peculiaridades de suas atividades, inclusive aquelas cumpridas por força de compromissos internacionais e de guerra. Sendo assim, há expressa norma constitucional prevendo que ficará por conta da lei as disposições sobre o limite de idade para o ingresso e permanência no serviço militar. A Lei 6.880/80, por sua vez, também prevê, em seu art. 12, ‘caput’, que "a convocação em tempo de paz é regulada pela legislação que trata do serviço militar".

5. Ao tratar da duração do serviço militar, o artigo 5º da Lei nº 4.375/64 que dispõe sobre a limitação até o dia 31/12 do ano em que completa 45 anos de idade a duração do serviço militar, tanto o obrigatório (‘caput’) quanto o voluntário (§2º). É certo que, o dispositivo legal em comento tem aplicabilidade tanto para aos militares que ingressaram no serviço militar obrigatório e quanto para militares que ingressaram de forma voluntária, categoria que se enquadram os militares temporários. O § 2º do mesmo artigo 5º da Lei nº 4.375/64 autoriza a prestação de serviço militar voluntário a partir dos 17 anos de idade, daí ser razoável a presunção de que o limite de idade ser-lhe-ia igualmente cabível.

6. Ainda que o ato administrativo de licenciamento tenha sido publicado antes da vigência da Lei n. 13.954/19 que alterou a redação original do art. 27 da Lei n. 4.375/64, a regra prevista na Lei 13.954/19 em nada contrariou o disposto anteriormente pela Lei 4.375/64, restando por recepcionada a regra prevista no art. 5º, já que mesmo antes da vigência da Lei 13.954/19 o dispositivo que limitava a permanência no serviço ativo à idade de 45 anos se encontrava em vigor à época do ingresso do militar, inclusive, foi recepcionado pela CF/88 pois em nada a contrariou quanto a previsão do limite etário para a permanência do militar incorporado para a prestação de serviço militar temporário, de ingresso voluntário.

7. Não há violação ao princípio da reserva legal, eis que a norma relativa ao limite de idade dos militares que ingressaram no serviço militar de forma obrigatória ou voluntária já estava prevista na redação anterior da Lei do Serviço Militar - artigo 5º da Lei nº 4.375/64-, que com a edição da Lei 13.954/2019, recebeu nova redação ao artigo 27, agora prevendo expressamente no inciso II que idade-limite para permanência será de 45 (quarenta e cinco) anos, afastando, por fim, o argumento de necessidade lei em sentido formal, para a norma antes prevista na CF.

8. Com o advento da Lei 13.954/2019, a questão acerca da necessidade ou não de lei em sentido estrito, foi dirimida, eis que, a referida lei deu nova redação ao art. 27 da Lei 4.375/64, prevendo, agora expressamente, sobre a permanência do militar que ingressou de forma obrigatória ou voluntária até a idade de 45 anos.

9. Considerando o quanto decidido pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 121/RE 600.885, em regime de repercussão geral, que entendeu que o art. 10 do Estatuto dos Militares era inconstitucional, no que se referia a fixação de idade limite para o ingresso nas Forças Armadas em regulamentos ou normas infralegais, Tem-se que a questão decidida no citado julgado trata da nulidade de cláusula editalícia que previa a idade máxima para a inscrição no certame, tendo, porém, modulado seus efeitos para data específica, admitindo que, nos concursos realizados até 31/12/2011, os candidatos que questionavam os limites mínimos de idade poderiam concorrer nos termos de decisão judicial individual.

10. Diferentemente, a controvérsia aqui instaurada não é o limite de idade para o ingresso ou inscrição em processo seletivo, mas sim, para permanência daquele militar que já se encontra em atividade e busca a prorrogação de tempo de serviço ou o denominado reengajamento, daí não ser aplicável ao caso o entendimento fixado pelo STF em Repercussão Geral, no RE 600.885.

11. Ainda que ambas as discussões tenham em comum o limite de idade de militares, a repercussão geral RE 600.885, trata da inconstitucionalidade de norma infralegal (edital) que limitava a idade para a inscrição em concurso público na carreira militar, por sua vez, a presente demanda versa sobre a questão da idade limite para permanência do militar no serviço ativo após os 45 anos de idade, quando já incorporado às Forças Armadas, para prestação de serviço militar voluntário e temporário.

12. Aquele militar que ingressou no serviço ativo por meio de processo seletivo simplificado realizado por Comando Regional, de abrangência regional – diversa de concurso público de abrangência nacional-, não é militar de carreira, logo, não possui estabilidade assegurada e na ocasião do seu ingresso já possuía ciência de que a prestação de serviço militar seria temporária, se submetendo às regras da Lei nº 4.375/64 com as alterações trazidas pela Lei 13.954/19, pois, mesmo anteriormente à entrada em vigor da Lei 13.954/19, existia a Lei 4.375/64 que previa o limite de idade para a permanência no serviço ativo ao militar temporário.

13. O limite etário de 45 (quarenta e cinco anos) também estava previsto no §1º, do Art. 31 e no Art. 53, caput, do Decreto 6.854/2009, que dispõe sobre o Regulamento da Reserva da Aeronáutica,’verbis’: "Art. 31. Na concessão das prorrogações, deverá ser considerado que o tempo total de efetivo serviço prestado pelos incorporados, sob qualquer aspecto e em qualquer época, não poderá atingir dez anos, contínuos ou não, computados para esse efeito todos os tempos de efetivo serviço, inclusive os prestados às outras Forças. § 1º Em tempo de paz, não será concedida prorrogação de tempo de serviço ao militar R/2 por períodos que venham a ultrapassar a data de 31 de dezembro do ano em que ele completar quarenta e cinco anos de idade, data de sua desobrigação para com o Serviço Militar".

14. Conforme se verifica através da Folha de Alterações, trazidas pela parte apelante, na inicial (220085444 - Pág. 34/ss.), o autor foi incorporado ao SERVIÇO MILITAR TEMPORÁRIO, mediante a realização do Estágio de Adaptação para Praças (EAP), pelo prazo de 12 meses, a contar de 25/04/2016. Da leitura da legislação constante na Folha de Alterações quando do ingresso da militar, consta o Decreto 6.854/2009, que por sua vez já previa o limite etário de 45 (quarenta e cinco anos), mesma previsão constante no §1º, do Art. 31 e no Art. 53, caput, do Decreto 6.854/2009.

15. Observa-se que o ato de reengajamento é renovado a cada ano, e a cada vencimento, o militar temporário deve requerer administrativamente seu reengajamento, cabendo a Administração Militar avaliar a permanência ou não do militar no serviço ativo, a corroborar que, justamente por se tratar de militar temporário, a permanência nas Forças Armadas constitui mera expectativa de direito, sujeitando-se aos critérios de interesse e conveniência da Administração, não cabendo ao Judiciário se imiscuir no mérito, tão somente analisar se o ato foi realizado de acordo com a lei.

16. Não merece reforma a sentença, eis que, inexiste a ilegalidade apontada no ato de exclusão do quadro das Forças Armadas ou o indeferimento de prorrogação do serviço em razão do alcance de idade de 45 anos pelo militar, e o marco inicial da contagem do tempo de serviço do militar é a “data de ingresso em qualquer organização militar da Marinha, Exército ou da Aeronáutica”, o que leva à conclusão de que a contagem do tempo pretérito como soldado, questionada pelo autor, está em consonância com a previsão legal.

17. Apelação não provida.

(TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5003431-02.2019.4.03.6133, Rel. Desembargador Federal WILSON ZAUHY FILHO, julgado em 28/10/2022, DJEN DATA: 07/11/2022).

A situação que se verifica, portanto, é de integral improcedência do pedido, pelo que deve a parte autora arcar com o pagamento da verba honorária.

Considerando que a hipótese dos autos é de demanda em que figura como parte a Fazenda Pública, com valor da causa inferior a duzentos salários mínimos, em atenção ao disposto no artigo 85, §§3ºe 4º do CPC/15, fixo a verba honorária no percentual de 10% sobre o valor atualizado da causa, anotando tratar-se do patamar mínimo previsto que depara-se apto a remunerar o trabalho do procurador em proporção à complexidade do feito, devendo ser observadas as condições do art. 98, §3º, do CPC.

Reforma-se, destarte, a sentença para julgar improcedente a ação, reconhecendo-se a legalidade do licenciamento da servidora militar com fundamento no limite etário de 45 anos previsto no art. 27 da Lei do Serviço Militar, com as alterações da Lei nº 13.954/2019.

Diante do exposto, dou provimento ao recurso, nos termos supra.

É como voto.

 

Audrey Gasparini

Desembargadora Federal



E M E N T A

 

MILITAR. PRORROGAÇÃO DO TEMPO DE SERVIÇO. LICENCIAMENTO. LIMITE ETÁRIO. LEI Nº 13.954/2019. INEXISTÊNCIA DE DIREITO SUBJETIVO.

I - O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário nº 600.885/RS, declarou a inconstitucionalidade de limitação de idade baseada tão somente em ato normativo infralegal, no entanto, a partir das mudanças promovidas pela Lei nº 13.954/2019 foi atendida a exigência formal do art. 142 § 3º, X, da Constituição de 1988, restando estabelecido limite etário de permanência, qual seja, o de 45 (quarenta e cinco) anos, conforme o artigo 27 da Lei do Serviço Militar (Lei nº 4.375/1964).

II - Lei nº 13.954/2019 que é aplicável às relações dos militares com a Administração castrense, ainda que o militar tenha ingressado em tempo anterior à efetividade da referida legislação, tendo em vista que tal fato não possui o condão de lhe conferir uma espécie de "direito adquirido", devendo ser aplicada a lei vigente à época da análise dos requisitos para a prorrogação do tempo de serviço. Precedentes da Corte.

III - Recurso provido.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.