APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001359-38.2020.4.03.6123
RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS
APELANTE: RACHEL LIMA DE LORENZO BRASIL
Advogados do(a) APELANTE: CARLA DE OLIVEIRA CEZARIO - MG100849-A, RODRIGO MESQUITA MORAIS - MG173904-A
APELADO: OTAVIO ALVES SANTANA, JOSE BOSCO DE MEDEIROS MORAIS, EGNALDO OLIVEIRA SILVA, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
PROCURADOR: DEPARTAMENTO JURÍDICO - CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
Advogado do(a) APELADO: MARCOS TADEU CONTESINI - SP61106-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001359-38.2020.4.03.6123 RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS APELANTE: RACHEL LIMA DE LORENZO BRASIL Advogados do(a) APELANTE: CARLA DE OLIVEIRA CEZARIO - MG100849-A, RODRIGO MESQUITA MORAIS - MG173904-A APELADO: OTAVIO ALVES SANTANA, JOSE BOSCO DE MEDEIROS MORAIS, EGNALDO OLIVEIRA SILVA, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogado do(a) APELADO: MARCOS TADEU CONTESINI - SP61106-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de ação ajuizada originariamente na Justiça Estadual por Rachel Lima de Lorenzo Brasil em face de Otávio Alves Santana, José Bosco Medeiros de Morais e Egnaldo Oliveira Silva, objetivando a rescisão do contrato de compra e venda, com devolução integral dos valores pagos, além do recebimento de indenização por danos morais e materiais. O MM. Juiz estadual julgou parcialmente procedente o pedido para rescindir o contrato de compra e venda e condenar os réus à devolução do valor pago pela autora para a aquisição do imóvel (R$ 305.000,00), bem como ressarci-la pelas benfeitorias úteis no importe de R$ 40.462,00, tudo acrescido de juros de mora e correção monetária. Além disso, condenou os réus ao pagamento de indenização por danos morais fixada em R$ 15.000,00 e de honorários advocatícios sucumbenciais em 10% sobre o valor da condenação (ID 261733407 – Pág. 1-17). Os réus apelaram e a autora interpôs recurso adesivo. O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo anulou a sentença, de ofício, bem como determinou a inclusão da Caixa Econômica Federal – CEF na lide, na condição de litisconsorte necessária, com a remessa dos autos à Justiça Federal, julgando prejudicados os apelos das partes (ID 261733425). O MM. Juiz a quo deferiu parcialmente o pedido de tutela provisória de urgência para determinar que os réus, solidariamente, custeiem o aluguel mensal, no valor de R$ 2.500,00, em favor da autora, a partir de 21.03.2020, data do contrato de locação, até ulterior decisão, com correção monetária e juros de mora com base no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, alterado pela Resolução 267/2013 (ID’s 261733648 e 261733680). Dessa decisão a CEF interpôs agravo de instrumento, cujo provimento foi negado pela Turma. A preliminar de ilegitimidade passiva da CEF foi acolhida e determinada a sua exclusão do polo passivo da ação, extinguindo-se o feito sem resolução de mérito, com fulcro no art. 485, VI do Código de Processo Civil. Por consequência, reconheceu-se a incompetência absoluta da Justiça Federal para julgamento do feito, declinando em favor de uma das varas cíveis da Justiça Estadual de Atibaia/SP (ID 261733751). A autora apelou, alegando, em síntese, que: a) a jurisprudência do STJ é clara no sentido de que, mesmo após a contestação, é possível a emenda da petição inicial, para a correção da legitimidade passiva, sendo que os três primeiros réus já haviam sido citados e não discordaram da emenda da inicial; b) a demanda foi objeto de declaração de incompetência pelo TJ/SP e remetida ao TRF3, ou seja, a emenda é corolário da declaração de incompetência em razão do litisconsórcio necessário, para inclusão da Caixa Econômica Federal, de sorte que o indeferimento da emenda caracteriza cerceamento de defesa e violação ao direito de ação e acesso à justiça; c) o imóvel foi adquirido com recurso do Sistema Financeiro Habitacional - SFH, mediante contrato celebrado entre a apelante e a CEF, que também faz venda casada de seguro habitacional, mas quando o imóvel apresentou os problemas descritos na inicial e constatados em perícia técnica, o seguro se recusou a cobrir os vícios de construção, em contrariedade ao entendimento do STJ, que afirma que o seguro habitacional deve cobrir vícios ocultos. Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal. É o relatório.
PROCURADOR: DEPARTAMENTO JURÍDICO - CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001359-38.2020.4.03.6123 RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS APELANTE: RACHEL LIMA DE LORENZO BRASIL Advogados do(a) APELANTE: CARLA DE OLIVEIRA CEZARIO - MG100849-A, RODRIGO MESQUITA MORAIS - MG173904-A APELADO: OTAVIO ALVES SANTANA, JOSE BOSCO DE MEDEIROS MORAIS, EGNALDO OLIVEIRA SILVA, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogado do(a) APELADO: MARCOS TADEU CONTESINI - SP61106-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Senhor Desembargador Federal Nelton dos Santos (Relator): Trata-se de ação ajuizada originariamente na Justiça Estadual, objetivando a rescisão do contrato de compra e venda, por vícios ocultos, com devolução integral dos valores pagos, além do recebimento de indenização por danos morais e materiais. Alega a autora ter assinado com a Caixa Econômica Federal o contrato por instrumento particular de compra e venda de imóvel residencial quitado, mútuo e alienação fiduciária em garantia – Carta de Crédito com recursos do SBPE-SFH, tendo por objeto residência situada à Rua Professora Adair Carvalho Silva, nº 50-A, Bairro do Itapetinga, Atibaia-SP. Afirma que o imóvel teria apresentado defeitos construtivos que o torna inabitável, motivo pelo qual pretende a rescisão do contrato celebrado, com a condenação dos requeridos ao pagamento de indenização por danos materiais e morais, além do acionamento do seguro habitacional. O Superior Tribunal de Justiça já se debruçou sobre a questão da legitimidade passiva da CEF, ao figurar como mutuante em contrato de financiamento para a aquisição de imóvel, nas ações em que se discute indenização por vício de construção. Definiu-se que, nos casos em que a Caixa atua apenas como agente financeiro, financiando a aquisição de imóvel que já se encontra edificado e em nome de terceiro, essa instituição financeira não pode ser responsabilizada por vícios de construção e é parte ilegítima para compor a lide. Veja-se: “RECURSO ESPECIAL. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. PEDIDO DE COBERTURA SECURITÁRIA. VÍCIOS NA CONSTRUÇÃO. AGENTE FINANCEIRO. ILEGITIMIDADE. 1. Ação em que se postula complementação de cobertura securitária, em decorrência danos físicos ao imóvel (vício de construção), ajuizada contra a seguradora e a instituição financeira estipulante do seguro. Comunhão de interesses entre a instituição financeira estipulante (titular da garantia hipotecária) e o mutuário (segurado), no contrato de seguro, em face da seguradora, esta a devedora da cobertura securitária. Ilegitimidade passiva da instituição financeira estipulante para responder pela pretendida complementação de cobertura securitária. 2. A questão da legitimidade passiva da CEF, na condição de agente financeiro, em ação de indenização por vício de construção, merece distinção, a depender do tipo de financiamento e das obrigações a seu cargo, podendo ser distinguidos, a grosso modo, dois gêneros de atuação no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, isso a par de sua ação como agente financeiro em mútuos concedidos fora do SFH (1) meramente como agente financeiro em sentido estrito, assim como as demais instituições financeiras públicas e privadas (2) ou como agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa ou baixíssima renda. 3. Nas hipóteses em que atua na condição de agente financeiro em sentido estrito, não ostenta a CEF legitimidade para responder por pedido decorrente de vícios de construção na obra financiada. Sua responsabilidade contratual diz respeito apenas ao cumprimento do contrato de financiamento, ou seja, à liberação do empréstimo, nas épocas acordadas, e à cobrança dos encargos estipulados no contrato. A previsão contratual e regulamentar da fiscalização da obra pelo agente financeiro justifica-se em função de seu interesse em que o empréstimo seja utilizado para os fins descritos no contrato de mútuo, sendo de se ressaltar que o imóvel lhe é dado em garantia hipotecária. 4. Hipótese em que não se afirma, na inicial, que a CEF tenha assumido qualquer outra obrigação contratual, exceto a liberação de recursos para a construção. Não integra a causa de pedir a alegação de que a CEF tenha atuado como agente promotor da obra, escolhido a construtora ou tido qualquer responsabilidade relativa à elaboração ao projeto. 5. Recurso especial provido para reconhecer a ilegitimidade passiva ad causam do agente financeiro recorrente”. (REsp n. 1.102.539/PE, relator Ministro Luis Felipe Salomão, relatora para acórdão Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 9/8/2011, DJe de 6/2/2012.) (grifei) Com efeito, se o imóvel já foi construído e escolhido pelo mutuário, não é possível responsabilizar a CEF por vícios de construção, pois não teve qualquer participação na obra, como é o caso dos autos. O papel da CEF, na verdade, foi apenas de fazer o empréstimo à autora, não tendo nenhuma responsabilidade técnica com relação à execução e qualidade da edificação. Nesse sentido é a jurisprudência desta Corte Regional: “CIVIL. COMPRA E VENDA. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. VÍCIO DE CONSTRUÇÃO. RESPONSABILIDADE DO ALIENANTE. AUSÊNCIA DE INTERESSE DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. EXCLUSÃO DO POLO PASSIVO DA AÇÃO. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. REMESSA DOS AUTOS À JUSTIÇA ESTADUAL. RECURSO PREJUDICADO. 1. Das várias avenças celebradas através do mesmo instrumento (no presente caso, compra e venda, financiamento, alienação fiduciária e seguro), tem-se que a relação existente entre o mutuário e o agente financeiro é, exclusivamente, de mútuo de capital destinado ao pagamento do preço avençado com terceiro pela aquisição de bem imóvel. Assim, não há razão para que a CEF permaneça no polo passivo do feito, pois o vício redibitório diz respeito ao contrato de compra e venda e não ao de financiamento. 2. A lei impinge ao alienante responsabilidade pelos vícios redibitórios, situação essa que não é a da empresa pública. 3. Não havendo previsão contratual que determine a responsabilidade da Caixa Econômica Federal - CEF, por vícios de construção, cumpre excluí-la da lide, dada sua ilegitimidade passiva ad causam, julgando extinta a ação com relação a ela, com base no artigo 487, inciso VI, do Novo Código de Processo Civil e reconhecer a incompetência absoluta da Justiça Federal. 4. Exclusão, de ofício, da CEF do polo passivo da ação. Incompetência da Justiça Federal para processar e julgar a presente causa. Apelação prejudicada”. (TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000582-21.2017.4.03.6103, Rel. Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, julgado em 01/06/2023, DJEN DATA: 05/06/2023) (grifei) “APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE COMPRA E VENDA E ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL. RESCISÃO CONTRATUAL. DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS. INDENIZAÇÃO. VÍCIO DE CONSTRUÇÃO. ILEGITIMIDADE DA CEF NO CASO CONCRETO. (...) - Com relação à responsabilidade da CEF no que tange a eventuais vícios de construção de imóveis financiados segundo as regras do Sistema Financeiro de Habitação, há que se distinguir entre duas situações, a saber: nas hipóteses em que a CEF opera como verdadeiro gestor de recursos e executor de políticas públicas federais para a promoção de moradia a pessoas de baixa renda, como é o caso do Programa Minha Casa Minha Vida, atuando na elaboração do projeto ou na fiscalização das obras, é parte legítima e pode ser haver responsabilização; por outro lado, nos casos em que atua apenas como agente financeiro, financiando a aquisição de imóvel que já se encontra edificado e em nome de terceiro, não pode ser responsabilizada. - Não há que se cogitar em responsabilidade da CEF no caso dos autos, visto que esta atuou apenas como agente financiador, liberando o financiamento à parte autora para aquisição de imóveis, de propriedade de terceiro, que já se encontravam erigidos. - Excluído o interesse da CEF, a competência para processar e julgar o feito deixa de ser da Justiça Federal e passa a ser da Justiça Estadual, com fundamento no art. 109, I, da Constituição da República, de modo que a apuração de eventual responsabilidade em relação aos demais corréus deverá ser realizada pelo juízo competente. - Apelações não providas”. (TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0022719-33.2013.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, julgado em 25/02/2021, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 03/03/2021) (grifei) “CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO FIRMADO COM A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. PLEITO DE INDENIZAÇÃO POR VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO. ATUAÇÃO DA CEF COMO MERO AGENTE FINANCIADOR. ILEGITIMIDADE PASSIVA RECONHECIDA. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL RECONHECIDA DE OFÍCIO. REMESSA DOS AUTOS À JUSTIÇA ESTADUAL PARA JULGAMENTO EM RELAÇÃO À CORRÉ REMANESCENTE. APELAÇÃO PREJUDICADA. 1. De acordo com a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça, a responsabilidade da CEF em caso de vícios de construção e atraso de entrega de obra e, por conseguinte, a sua legitimidade para figurar no polo passivo dessas ações, requer sejam diferenciadas duas situações: a primeira, que cuida das hipóteses nas quais a CEF atua, tão somente, como agente do mercado financeiro, liberando os recursos solicitados por meio do contrato de financiamento nas datas acordadas; a segunda, que cuida dos casos em que a CEF é verdadeira promotora de políticas públicas voltadas à construção de moradias voltadas à população de baixa renda, não somente concedendo o financiamento necessário para a aquisição dos imóveis, mas também gerenciando e coordenando a construção e os prazos de entrega. 2. Na primeira hipótese, não há que se falar em responsabilidade civil por eventuais vícios de construção, de vez que o papel da CEF, em casos tais, é voltado apenas para a disponibilização dos recursos financeiros para aquisição do imóvel, não desempenhando qualquer função que diga respeito à construção e ao desenvolvimento de obras. 3. A documentação acostada aos autos, especialmente o contrato de financiamento com alienação fiduciária em garantia, firmado entre o autor e a CEF, permite concluir que a instituição financeira atuou, no presente caso, meramente como agente financiador. Constato, pela leitura do contrato de financiamento, que a CEF não desempenhou qualquer outra função que não a de prover os recursos para a aquisição do imóvel pelo apelante. 4. Portanto, não tendo a CEF atuado na elaboração de projeto de construção, na fiscalização de obras, nem estipulado prazos e condições para a realização de empreendimento imobiliário, não é parte legítima para figurar no polo passivo dessa ação. A jurisprudência desta E. Corte Regional é uníssona em reconhecer a ilegitimidade passiva da CEF em casos tais. 5. Saliento, ademais, que não obstante não ter consignado a ilegitimidade passiva da CEF, proferindo julgamento de improcedência dos pedidos, no ponto, o magistrado sentenciante reconheceu a atuação da corré como mero agente financiador para aquisição do imóvel. 6. Assim, em relação à CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, é de rigor a extinção do processo, sem apreciação do mérito, com fulcro no art. 485, inciso VI, do CPC, em decorrência de sua ilegitimidade passiva. Diante disso, impõe-se o reconhecimento, de ofício, da incompetência absoluta da Justiça Federal, devendo estes autos serem remetidos à Justiça Estadual, para apreciação dos pedidos em relação a corré remanescente. 7. Reconhecimento, de ofício, da ilegitimidade passiva da CEF e da incompetência absoluta da Justiça Federal. Extinção do feito, sem apreciação do mérito, com fulcro no art. 485, inciso VI e § 3º do CPC, em relação à instituição financeira. Remessa dos autos à Justiça Estadual para apreciação dos pedidos formulados contra a corré remanescente. Recurso de apelação prejudicado”. (TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0001843-24.2014.4.03.6132, Rel. Desembargador Federal HELIO EGYDIO DE MATOS NOGUEIRA, julgado em 14/10/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 20/10/2020) (grifei) Registre-se, ademais, que a Caixa Seguros é empresa privada e não se confunde com a Caixa Econômica Federal, empresa pública. Logo, a CEF é parte ilegítima para figurar no polo passivo da lide, devendo a sentença ser mantida tal como lançada, com a remessa dos autos à Justiça Estadual. Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação. É como voto.
PROCURADOR: DEPARTAMENTO JURÍDICO - CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
O Desembargador Federal Wilson Zauhy.
Compulsando melhor os autos, peço vênia ao E. Relator para divergir de seu voto.
Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte Autora em face da sentença proferida nos autos da presente ação de rescisão contratual por vícios redibitórios, cumulada com pedido de indenização a título de danos morais e materiais, que acolheu a preliminar de ilegitimidade passiva da CEF e determinou sua exclusão do polo passivo da ação, extinguindo o feito sem resolução de mérito, com fulcro no art. 485, VI, do Código de Processo Civil. Por consequência, reconheceu a incompetência absoluta da Justiça Federal para julgamento do feito, declinando em favor de uma das varas cíveis da Justiça Estadual de Atibaia/SP.
O Emérito Relator nega provimento ao recurso de apelação, asseverando ser a CEF, parte ilegítima para figurar no polo passivo da lide, devendo a sentença ser mantida tal como lançada, com a remessa dos autos à Justiça Estadual.
Pois bem.
A controvérsia que se coloca nos autos diz com a constatação de vícios de construção no imóvel adquirido pela Autora dos Corréus Otavio Alves Santana, Jose Bosco De Medeiros Morais, Egnaldo Oliveira Silva e financiado pela Caixa Econômica Federal, que dificultam seu uso e habitabilidade.
Compulsando a documentação apresentada, entendo que a CEF é parte legitima para o pedido de rescisão do contrato de financiamento, bem como para o de restituição dos valores pagos pela parte autora.
A consequência da rescisão dos contratos pela constatação de vícios redibitórios é o retorno ao statu quo ante, isto é, as partes devem retornar à posição jurídica em que se encontravam antes da celebração do contrato. Vale dizer: a restituição, pelos vendedores, do valor que os autores pagaram pelo imóvel.
Nesse sentido, inclusive, o entendimento sumulado do C. STJ:
Súmula 543 - Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento. (Súmula 543, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 26/08/2015, DJe 31/08/2015)
Ante o exposto, mostra-se legítima a pretensão da autora em face da CEF, no sentido de que, uma vez constatados os alegados vícios redibitórios no imóvel, deverá, por conseguinte, ser reconhecida a rescisão de ambos os contratos, de compra e venda firmado com os Réus e o de financiamento firmado com a Caixa Econômica Federal.
Desta forma, divirjo do E. Relator, por entender restar demonstrada a legitimidade da CEF para figurar no polo passivo da lide, devendo ser reformada a sentença neste ponto.
Assim, uma vez reconhecida a competência da Justiça Federal para processar e julgar a lide, na forma do art. 109, I, da Constituição Federal, prossigo no julgamento do recurso de Apelação, a fim de apreciar as demais questões ventiladas pela parte Autora em suas razões.
Dos vícios redibitórios
Acerca dos vícios redibitórios, confira-se o seguinte ensinamento da doutrina:
“Os vícios redibitórios são defeitos ocultos existentes na coisa alienada, objeto de contrato comutativo ou de doação onerosa ou com encargo, não comum às congêneres que a tornam imprópria ao uso a que se destina ou lhe diminuem sensivelmente o valor, de tal modo que o negócio não se realizaria se esses defeitos fossem conhecidos, dando ao adquirente ação para redibir o contrato ou para obter abatimento no preço. [...]”. (Diniz, Maria Helena, Código Civil anotado. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, pág. 407).
Evidente, portanto, que a situação dos autos se amolda perfeitamente à previsão do artigo 441 do Código Civil, in verbis:
"Art. 441. A coisa recebida em virtude de contrato comutativo pode ser enjeitada por vícios ou defeitos ocultos, que a tornem imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminuam o valor."
Ainda, segundo leciona Flavio Tartuce, uma vez constatado o vício oculto, poderá o adquirente, “requerer a resolução do contrato (devolvendo a coisa e recebendo de volta a quantia em dinheiro que desembolsou), sem prejuízo de perdas e danos, por meio de ação redibitória. Para pleitear as perdas e danos, deverá comprovar a má-fé do alienante, ou seja, que o mesmo tenha conhecimento dos vícios redibitórios (art. 443 do CC). Todavia, a ação redibitória, com a devolução do valor pago e o ressarcimento das despesas contratuais, cabe mesmo se o alienante não tinha conhecimento do vício.” (Tartuce, Flavio. Manual de Direito Civil: volume único. 6.ed.rev.atual.e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo, 2016. Pág. 670).
Deste modo, para que se reconheça aos autores o direito à recusa do imóvel (e correspondente retorno ao estado prístino), é indispensável que haja, a um só tempo: (i) um contrato comutativo; (ii) vícios desconhecidos pelo adquirente, na data da tradição/registro; (iii) redução do valor da coisa ou inadequação para o fim a que se destina.
Nesse sentido, já se manifestou essa eg. Corte Regional:
CIVIL E PROCESSO CIVIL. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO. AGRAVO RETIDO. PRELIMINARES REJEITADAS. VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO. RESCISÃO CONTRATUAL. COBERTURA SECURITÁRIA. DANOS MATERIAIS E MORAIS. SUCUMBÊNCIA. SENTENÇA REFORMADA.
1. Agravo retido. A alegação da CEF no sentido de ausência de comprovação do fato gerador da fixação da multa é dissociada da decisão agravada, vez que a decisão agravada não aplicou a multa, sequer considerou ter havido descumprimento da liminar. Ao contrário, deixou claro que apenas fixou o valor da multa a ser aplicada no caso de futuro descumprimento. Diante do teor da decisão agravada, a alegação que deveria ter a CEF formulado é que não seria possível a fixação prévia do valor da multa, antes de constatado o descumprimento da liminar. Todavia, melhor sorte não assistiria à agravante, já que é pacífico que é possível a fixação do valor das astreintes antes de verificado o descumprimento da decisão liminar, inclusive se admite a sua fixação na própria decisão que concede a liminar. Com relação ao valor fixado, entendo que o valor se mostra excessivo e desproporcional em relação às obrigações de não fazer que o MM. Juiz a quo impôs à CEF na decisão agravada, a saber: não efetuar cobrança das prestações que a parte autora deveria pagar à CEF em decorrência do contrato de financiamento imobiliário, bem como não inscrever o nome da autora em cadastros restritivos de crédito. É por esta razão que reduzo o valor da multa para R$ 500,00 (quinhentos reais) para o caso de descumprimento das mencionadas obrigações de não fazer.
2. Preliminares. A sentença foi devidamente fundamentada, ainda que de forma sucinta. Em relação ao primeiro pedido (rescisão do contrato de compra e venda do imóvel), é evidente que a CEF é parte legítima porquanto figurou no contrato como financiadora. Já em relação ao segundo pedido (indenização em decorrência dos danos oriundos de vícios de construção), o interesse jurídico da Caixa Econômica federal nos feitos em que discute cobertura securitária ficará restrita aos contratos celebrados entre 02.12.1988 e 29.12.2009, e nas hipóteses em que o instrumento estiver vinculado ao Fundo de Compensação de Variações Salariais - FCVS (apólices públicas, ramo 66), desde que haja demonstração do comprometimento do FCVS, com risco efetivo de exaurimento da reserva técnica do Fundo de Equalização de Sinistralidade da Apólice - FESA. No caso dos autos, o contrato de financiamento foi firmado em 27/04/2001, estando compreendido no lapso temporal firmado pelo STJ. E, tratando-se de contrato assinado posteriormente à vigência da Lei nº 7.682/1988, em período no qual a apólice é necessariamente pública e garantida pelo FCVS, há potencial comprometimento dos recursos do FCVS, razão pela qual resta confirmado o interesse da CEF na lide. Assim, resta configurada a legitimidade passiva da CEF e, consequentemente, a competência da Justiça Federal para processar e julgar a presente demanda. Não há interesse da União. Incide a prescrição ânua prevista no art. 178, § 5º, II, do Código Civil de 1916 e no art. 206, § 1º, II, b, do atual Código Civil. O prazo prescrição não flui a partir do pedido de pagamento da indenização até a comunicação da decisão a respeito, consoante a Súmula n. 229 do Superior Tribunal de Justiça. No caso dos autos, não se sabe ao certo a data em que apareceram os vícios de construção, o sinistro foi comunicado pela mutuária à seguradora em 26/06/2002, o termo de negativa de sinistro foi emitido em 10/07/2002 e a ação foi ajuizada em 26/08/2006. Ocorre que, conforme bem destacado pelo MM. Magistrado a quo na sentença e o perito judicial, os danos são progressivos e continuam a se agravar com o decorrer do tempo, passando de risco iminente de desabamento para desabamentos parciais. É por esta razão que se mostra adequada a conclusão do Juiz no sentido de que, por se agravarem os riscos a cada dia, a pretensão não se encontra fulminada pela prescrição.
3. Primeiro pedido: rescisão do contrato. São 5 os requisitos da resolução do contrato por vícios redibitórios: "a) que a coisa tenha sido recebida em virtude de contrato comutativo, ou de doação com encargo; b) que se ressinta de defeitos prejudiciais à sua utilização, ou lhe diminuam o valor; c) que esses defeitos sejam ocultos; d) que sejam graves; e) que já existam no momento da celebração do contrato". No caso dos autos, estão preenchidos os requisitos para a resolução do contrato. O contrato de compra e venda é o típico contrato cumutativo, em que há prestações certas, recíprocas e equivalentes. Os vícios de construção que atingem a estrutura do imóvel, criando, inclusive, risco de desabamento, conforme atestado pelas vistorias e perícia judicial, tornam o imóvel impróprio para habitação (isto é, para o fim ao qual se destina). Conforme atestado pela perícia e confirmado pelas partes, os vícios de construção não eram visíveis no momento da celebração do contrato de compra e venda com financiamento da CEF. Considerando o iminente risco de desabamento, é evidente que os vícios são graves. E, por fim, tratando-se de vícios de construção, eles estavam presentes no imóvel desde a sua construção. Não prospera a alegação do réu Joaquim no sentido de que a sua ignorância em relação aos vícios de construção o isentaria da responsabilidade por eles. O Código Civil de 1916 é expresso quando a este tema, estipulando que a ignorância de tais vícios pelo alienante não o exime à responsabilidade pelos vícios redibitórios. Ainda sobre as razões do apelante Joaquim, consigno que a rescisão do contrato não é uma punição por qualquer conduta culposa ou ilícita do apelante. Mas apenas a consequência jurídica que o ordenamento impõe para os casos de constatação de vícios redibitórios. Sem prejuízo, pode o apelante Joaquim buscar a reparação de seus prejuízos junto à Construtora em ação autônoma. Portanto, a rescisão do contrato, determinada pela sentença, deve ser mantida.
3.1. Consequências da rescisão. A consequência da rescisão do contrato pela constatação de vícios redibitórios é o retorno ao statu quo ante, isto é, as partes devem retornar à posição jurídica em que se encontravam antes da celebração do contrato. É por esta razão que, de um lado, deve o alienante devolver ao comprador as parcelas recebidas em razão do contrato rescindido, e, de outro, deve o comprador devolver o bem ao alienante, consoante se depreende do art. 1.103 do Código Civil de 1916 (equivalente ao Código Civil de 2002). Estes dispositivos determinam que: (i) se o alienante conhecia o vício, ou o defeito, restituirá o que recebeu e ainda pagará indenização por perdas e danos, e; (ii) se o não conhecia, tão somente restituirá o valor recebido, mais as despesas do contrato. Ademais, não se pode admitir que o alienante, que recebeu valores em decorrência de contrato rescindido, permaneça com tais valores, em atenção ao princípio da vedação ao enriquecimento sem causa. Isto pois, uma vez rescindido o negócio jurídico que ensejou o pagamento destes valores, desaparece a causa jurídica que justificava o domínio/a titularidade do alienante sobre estes valores. No caso dos autos, conforme se depreende do contrato, tanto a CEF quanto o réu Sr. Joaquim receberam os valores pagos pela mutuária/compradora/autora através das prestações mensais. Assim, não se pode admitir que o Sr. Joaquim e a CEF permaneçam na titularidade dos valores que lhe forem entregues em razão de um negócio jurídico não mais existente, sob pena de enriquecimento sem causa destes réus. Portanto, a condenação da CEF e do réu Joaquim de Paula Ribeiro à devolução dos valores recebidos em razão do contrato, devidamente atualizados e acrescidos de juros, estipulada na sentença, deve ser mantida.
4. Segundo pedido: indenização e/ou cobertura securitária.
4.1. Responsabilidade da CEF. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, é possível haver responsabilidade da CEF por vícios de construção em imóveis adquiridos no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação - SFH. Todavia, a responsabilidade dependerá das circunstâncias em que se verifica sua intervenção no caso concreto: a) inexistirá responsabilidade da CEF, quando ela atuar como agente financeiro em sentido estrito; b) existirá responsabilidade da CEF, quando ela como agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa ou baixíssima renda, isto é, nas hipóteses em que tenha atuado, de algum modo, na elaboração do projeto, na escolha do terreno, na execução das obras (construção) ou na fiscalização das obras do empreendimento.
4.2. No caso dos autos, de acordo com o contrato de fls. 70/79, a CEF não financiou, no caso, nenhum empreendimento em construção, com prazo de entrega. Ao contrário, trata-se de contrato de compra e venda com garantia hipotecária e com utilização de recursos do FGTS dos compradores, pelo qual os autores obtiveram recursos para financiar a compra de imóvel de terceiros particulares (fl. 70 e 71). Assim, uma vez que do contrato se vê claramente que a CEF não financia, no caso, um imóvel em construção, mas tão somente libera recursos financeiros para que o comprador adquira de terceiros imóvel já erigido, não há que se falar em responsabilidade da CEF pelos vícios apresentados pelo imóvel financiado, já que não participou do empreendimento, tendo atuado estritamente como agente financeiro. É entendimento pacífico que, nestas hipóteses em que a CEF atua estritamente como agente financeiro, a vistoria/perícia designada pela CEF não tem por objetivo atestar a solidez ou a regularidade da obra, mas sim resguardar o interesse da instituição financeira, uma vez que o imóvel financiado lhe será dado em garantia. Logo, no caso, não há responsabilidade da CEF pelos vícios de construção.
4.3. Ressalto ainda que a ausência de responsabilidade da CEF não afasta sua legitimidade para figurar no pólo passivo e, por conseguinte, a competência da justiça federal. Isto pois a legitimidade é questão preliminar, que deve ser analisada à luz dos critérios firmados pelo C. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Resp repetitivo nº 1.091.393, ao passo que a responsabilidade é questão de mérito, apreciada somente após a constatação da existência de legitimidade.
5. Responsabilidade da seguradora. O contrato de seguro assinado pela autora e entregue a ela no momento do financiamento (fls. 82/86), conforme confirma os documentos juntados pela própria CEF (fls. 157/201), não exclui da cobertura os danos decorrentes de vícios de construção, conforme de depreende da cláusula 4ª (fls. 84/85). Porém, a CAIXA SEGURADORA S/A juntou com a sua contestação, às fls. 258/283, "condições da apólice de seguro habitacional", diversas daquelas que foram entregues à mutuária no momento da contratação. Nesta sim há a exclusão expressa dos danos decorrentes de vícios de construção, na sua cláusula 5.2.6ª (fl. 260). Seja como for, havendo ou não expressa exclusão de cobertura em relação aos danos decorrentes de vícios de construção, a seguradora é responsável em caso de danos decorrentes de vícios de construção.
5.1. Acrescente-se que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal Regional Federal da Terceira Região firmou-se no sentido de que a seguradora é responsável em caso de danos decorrentes de vícios de construção, uma vez que não só é obrigatória a contratação do seguro pelo mutuário, como também é obrigatória a vistoria do imóvel pela seguradora.
5.2. No caso, verifico que a mutuária acionou a seguradora, em 26/06/2002 (fl. 264). Em razão do aviso de sinistro, a seguradora elaborou o laudo de vistoria inicial de fls. 264/271, que conclui pela existência de vício de construção, e foi emitido o "Termo de Negativa de Cobertura" (fl. 202 e 272). Logo, no caso, a CAIXA SEGURADORA S/A responde pelos vícios de construção.
5.3. No tocante à alegação da seguradora no sentido de que a rescisão do contrato de compra e venda com financiamento da CEF (principal) enseja a rescisão do contrato de seguro (acessório), consigno que a regra do direito civil, segundo a qual o acessório segue o principal, não se aplica a este caso. Isso porque não se pode olvidar que, no caso, foi o próprio risco coberto que ensejou a rescisão do contrato de compra e venda. Ora, é ilógico e inconcebível que a ocorrência do risco coberto cause a extinção do contrato de seguro. Ao contrário, o contrato de seguro presta-se a, diante da ocorrência do risco coberto, obrigar o segurador ao pagamento da indenização. É por esta razão que o contrato de seguro subsiste, apesar da rescisão do contrato de compra e venda. [...]” (Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1621961 / SP, 0010401-56.2006.4.03.6102, DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES, QUINTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/12/2017)
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL EM CONSTRUÇÃO. PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA. ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL. FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. SUSPENSÃO DA COBRANÇA DAS PARCELAS DO FINANCIAMENTO.
I - Pretende o autor a rescisão de contrato de compra e venda de futura unidade autônoma, bem como de contrato de financiamento firmado com a CEF para pagamento do preço avençado, em virtude de atraso das obras e entrega do imóvel.
II - A CEF não integrou ou anuiu o contrato de compra e venda firmado entre o autor e a construtora. No entanto, a hipótese trata de financiamento da construção no âmbito do programa "minha casa, minha vida", figurando a instituição como agente executor de políticas federais destinadas ao atendimento de moradia para pessoas de baixa renda.
III - Consta expressamente do contrato de financiamento a obrigação e o interesse da CEF em fiscalizar o andamento da obra (item b, da cláusula 3ª), na medida em que o repasse dos valores se daria mensalmente de acordo com a evolução das obras, resguardando o mutuário, ao menos em tese, do pagamento dos valores à construtora sem que se desse prosseguimento à obra.
IV - Considerando o atraso na entrega do imóvel por mais de dois (2) anos, não se pode sujeitar o autor, que não mais tem interesse no imóvel, a ônus moratórios decorrentes de situação a que não deu causa, não se afigurando viável a continuidade da cobrança das prestações de financiamento quando o imóvel objeto da compra que originou o mútuo não foi entregue.
V - Agravo de instrumento desprovido.
(TRF3, AI n° 0026602-81.2015.4.03.0000. Rel. Des. Fed. Wilson Zauhy. Primeira Turma, e-DJF3: 21/06/2016).
Acerca do tema também já se posicionaram os Eg. Tribunais Regionais Federais da 1ª e 4ª Região:
ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. SISTEMA FINANCEIRO HABITACIONAL - SFH. MÚTUO HABITACIONAL COM GARANTIA FIDUCIÁRIA. VÍCIOS CONSTRUTIVOS. PEDIDO DE RESCISÃO CONTRATUAL E DEVOLUÇÃO DE PRESTAÇÕES PAGAS. POSSIBILIDADE. LEGITIMIDADE PASSIVA DA CEF. JUROS DE OBRA. RETORNO AO STATUS QUO ANTE. NOVAÇÃO. ENTREGA DA OBRA. PRAZO DE TOLERÂNCIA. TERMO INICIAL. ASSINATURA DO CONTRATO DE FINANCIAMENTO. CASO FORTUITO. INOCORRÊNCIA. DANOS EMERGENTES. DANO MORAL IN RE IPSA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. TAXAS CONDOMINIAIS E IPTU. DIREITO DE RETENÇÃO.
Constando da petição inicial pedido de rescisão de ambos contratos (promessa de compra e venda e compra e venda com financiamento adjeto), em caso de procedência do pleito, tanto a ré MRV quanto a CEF seriam atingidas em sua esfera jurídica, sendo evidente a legitimidade passiva da instituição financeira.
Não há que se cogitar de qualquer ilegitimidade da cobrança dos juros de obra (também chamados de "taxa de evolução de obra") durante a fase de construção do imóvel, conforme já pacificado pela 2ª Seção do E. STJ. E, uma vez expirado o aludido prazo, mesmo que a obra ainda se encontre inacabada, deve ser iniciada a fase de amortização do mútuo contratado ou suspensa a cobrança dos mencionados juros em desfavor da parte mutuária. Em almejando a autora a rescisão dos contratos, impõe-se o ressarcimento dos valores pagos a título de juros de obra até a liberação das chaves.
Uma vez preenchidos os requisitos para a rescisão contratual, determina-se o retorno ao status quo anterior à realização do contrato, com a devolução de todos os valores recebidos em razão do contrato, inclusive dos recursos do FGTS da conta vinculada da autora.
Não há como reconhecer tratar-se, o segundo contrato, de novação do contrato primitivo, afigurando-se claramente como contrato de financiamento imobiliário. De mais a mais, completamente despropositado imaginar-se a impossibilidade de rescisão do contrato de compra e venda de imóvel habitacional celebrado entre o adquirente da unidade imóvel e a construtora, ante a comprovação dos diversos vícios de construção do imóvel.
No que toca à legalidade ou não da cláusula de tolerância para entrega de empreendimento imobiliário, adoto a linha de que, estando tal prorrogação de prazo inclusa nos contratos de compra e venda de imóvel na planta, não configura abusividade tampouco vulnera o disposto no art. 51 do CDC, se o prazo estabelecido estiver limitado a período razoável, o que se configura no caso, em que estipulado o acréscimo de 180 dias (precedentes do E. STJ). Não obstante tais considerações, por ocasião da assinatura do contrato de financiamento, as partes renovaram a intenção de fixação do prazo de construção no período de 24 meses, momento em que a construtora efetivamente obrigou-se perante o mutuário, com a participação da CEF na avença.
Por outro lado, não há que se falar em exceção à responsabilização civil por caso fortuito, em decorrência de grave crise financeira que assolou o setor da construção civil. O fato de a parte não ter condições econômico-financeiras de adimplir o que havia contratado e o que havia se comprometido em contrato firmado por sua livre vontade com os compradores, não pode ser tido como motivo que justifique a exoneração da obrigação.
Quanto aos emergentes, restou demonstrado nos autos que os danos materiais equivalem aos alugueis comprovadamente pagos desde a data em que o imóvel deveria ter sido entregue, até a data em que efetivamente foi entregue. Do mesmo modo, demonstrou-se à exaustão, por meio de prova documental e testemunhal, a ocorrência de vício construtivo.
Tratando-se de dano moral decorrente de vícios de construção, presume-se o abalo, pois gerado pela impossibilidade de usufruir plenamente do imóvel adquirido para moradia, sendo conhecido pela experiência comum e considerado in re ipsa, isto é, não se faz necessária a prova do prejuízo, que é presumido e decorre do próprio fato. Na fixação do quantum indenizatório, devem ser observados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. O valor arbitrado deve guardar dupla função, sendo a primeira reparatória, voltada ao lesado, ao efeito de ressarcir os danos sofridos, e a segunda pedagógica, dirigida ao agente lesivo, para evitar a repetição de atos similares. Ademais, o montante não pode servir para o enriquecimento sem causa da parte lesada. Reduzido o quantum fixado na sentença.
Com relação à devolução dos valores despendidos com o pagamento das taxas condominiais e IPTU, independentemente de o imóvel ter sido registrado em 2011 em nome da autora, a construtora assumiu a obrigação de arcar com o pagamento de impostos, taxas e outras despesas até a data do habite-se ou da entrega das chaves (o que ocorrer primeiro).
No que se refere aos alegados direitos de retenção, a hipótese não é aplicável ao caso, eis que não se trata aqui de mero arrependimento, tampouco de inexecução do contrato por culpa do comprador. Trata-se, isso sim, do exercício de seu direito de devolver o bem ante o vício de qualidade que apresentou, sendo certo que o CDC prevê a restituição "da quantia paga" sem qualquer ressalva (art. 18, §1º, inciso II). (TRF4, AC 5027284-07.2014.4.04.7000, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 29/11/2018)
"CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RESCISÃO DO CONTRATO DE COMPRA E VENDA E DO CONTRATO DE MÚTUO HABITACIONAL COM GARANTIA HIPOTECÁRIA. CONSTRUÇÃO DO IMOVEL FINANCIADA COM RECURSOS DO SFH. VICIOS DE CONSTRUÇÃO. COMPROVAÇÃO POR PROVAL PERICIAL. RESPONSABILIDADE DA CONSTRUTORA. IMPOSSIBILIDADE DE MANUTENÇÃO DO CONTRATO DE MÚTUO. 1. A apresentação de razões finais no processo civil tem por finalidade permitir que a parte possa se manifestar sobre a prova produzida. No caso concreto a parte teve oportunidade de se manifestar nos autos sobre a perícia. Não se reconhece o cerceamento do direito de defesa. Inexistência de causa de nulidade por falta de demonstração de prejuízo. Preliminar rejeitada. 2. É legítima a pretensão de rescisão do contrato de compra e venda de imóvel habitacional celebrado entre o adquirente da unidade imóvel e a construtora, ante a comprovação dos inúmeros vícios de construção do imóvel, por meio de perícias de engenharia. Os compradores devem devolver o imóvel à construtora - que deve restituir à instituição financeira integralmente o valor do mútuo e o valor pago com recursos próprios aos mutuários. 3. A jurisprudência recente consagra a legitimidade passiva da instituição financeira nas demandas em que se postula a rescisão de contrato de financiamento imobiliário nos casos em a construção foi financiada com recursos do SFH. No entanto não se reconhece, in casu, a responsabilidade solidária da CAIXA por depreciação do valor do imóvel causada por vícios de construção - os quais não eram possíveis de serem identificados por ocasião da medição das obras executadas para liberação das parcelas do financiamento, de modo que não constatada culpa (negligência). Precedente da Corte (AC 2001.01.00.032911-3/MG, Relatora Desembargadora Federal Selene Maria de Almeida, Quinta Turma, e-DJF1 p.128 de 28/01/2011) 4. A rescisão do contrato de compra e venda importa na rescisão do contrato de financiamento imobiliário. Deve a mutuante devolver aos mutuários os valores correspondentes à parcela das prestações pagas que foi utilizada para amortização do valor do saldo devedor do mútuo. Não deve haver restituição dos valores cobrados a título de correção monetária; de remuneração do capital emprestado (juros) e da parcela de seguro, porque legitimamente cobradas na vigência do contrato celebrado validamente. 5. A APEX deve arcar com o pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação. Em virtude da sucumbência recíproca da CAIXA e da parte-autora aplica-se a norma inserta no artigo 21 do CPC. 6. Em virtude de homologação judicial dos acordos firmados pelos autores apelantes julga-se prejudicada a apelação por eles interposta. 7. Dá-se parcial provimento ao recurso de apelação da CAIXA. Nega-se provimento à apelação da APEX e julga-se prejudicada a apelação interposta pelos autores." (destaquei) (APELAÇÃO , JUIZ FEDERAL RODRIGO NAVARRO DE OLIVEIRA, TRF1 - 5ª TURMA SUPLEMENTAR, e-DJF1 DATA:29/07/2011 PAGINA:186.)
Segundo depreende-se de tais precedentes, é inequívoco que o direito à rescisão do contrato de compra e venda do imóvel se estende ao financiamento contraído perante a CEF, na medida em que não há, de fato, qualquer lógica que autorize a conclusão de que a parte autora deva continuar pagando prestações por um imóvel viciado, sendo que a própria lei lhe garante o direito à redibição/rescisão.
No caso, entendo que tais requisitos restam suficientemente atendidos.
O contrato de compra e venda, como sabido, é comutativo, dado que é um pacto oneroso e bilateral (o vendedor deve transferir a propriedade da coisa vendida e o comprador pagar o preço). Também há vícios na coisa, que reduziram o custo e que eram desconhecidos pelos compradores, na data da avença. E, conforme se depreende dos autos, os defeitos no imóvel foram suficientemente demonstrados, por meio da realização de perícia técnica.
Com efeito, na hipótese dos autos, pela documentação anexada aos autos, em consonância com o laudo pericial técnico, elaborado após a vistoria no imóvel, entendo que resta incontroversa a existência de vícios ocultos de origem construtiva, que foram percebidos pelos adquirentes somente após a celebração do contrato de compra e venda.
Cumpre ressaltar, ainda, trecho elucidativo, extraído da conclusão apresentada pelo i. Perito junto ao Laudo consignado aos autos (Num. 261733401), elaborado perante a Justiça Estadual, que tomo como prova emprestada, por ter sido produzida por Perito equidistante das partes e de confiança do Juízo:
“Pelas vistorias realizadas no local, pelos dados fornecidos pelas partes e demais elementos concernentes, o signatário pôde concluir que:
1. Com base na vistoria técnica in loco, o Jurisperito constatou a existência de diversas manifestações patológicas no imóvel da Requerente, quais sejam:
1.1. Fissuras e trincas (verticais, horizontais, diagonais, no entorno das esquadrias, etc.) nos revestimentos das paredes da sala de estar, cozinha, lavabo, dormitórios, suíte, corredor de circulação interno e externo, lavabo, fachadas e muro de fechamento;
1.2. Recalque do piso da garagem, do corredor de circulação externo e interno, da sala de estar, cozinha, dormitório 02 e banheiro da suíte;
1.3. Danos nos revestimentos cerâmicos do piso da garagem e do corredor de circulação externo, bem como ausência de rodapé nesses ambientes;
1.4. Umidade nos revestimentos das paredes da sala de estar, lavabo, dormitório 01 e 02 e suíte.
[...]
3. Os recalques diferenciais no imóvel da Requerente, que levaram ao aparecimento das manifestações patológicas constatadas no dia da diligência técnica, foram ocasionados pelo subdimensionamento das estacas de fundação do imóvel, sendo classificado como um vício endógeno, inerente à própria obra dos Réus, sendo ainda uma falha na elaboração do projeto estrutural da edificação”.
Desta forma, efetivamente comprovados os vícios redibitórios no imóvel, relativos à construção do imóvel, bem como à própria elaboração do projeto, pelos quais se responsabilizam os vendedores.
Nesse sentido, legítima a pretensão da autora no sentido de ser reconhecida a rescisão de ambos os contratos, posto que funcionalmente coligados, o que não implica, necessariamente, na restituição integral das parcelas pagas.
A propósito, essa é a lição de Orlando Gomes:
“Os contratos coligados são queridos pelas partes contratantes como um todo. Um depende do outro de tal modo que cada qual, isoladamente, seria desinteressante. Mas não se fundem. Conservam a individualidade própria, por isso se distinguindo dos contratos mistos. A dependência pode ser recíproca ou unilateral. Na primeira forma, dois contratos completos, embora autônomos, condicionam-se reciprocamente, em sua existência e validade. Cada qual é a causa do outro, formando uma unidade econômica. (...) A união com dependência unilateral verifica-se quando não há reciprocidade. Um só dos contratos é que depende do outro. Tal coligação requer a subordinação de um contrato a outro, na sua existência e validade. Os contratos permanecem, no entanto, individualizados”. (Orlando Gomes, Contratos. 26ª Edição, Forense, pp.121/122)
Com isso, deverão os vendedores apelados restituir à autora os valores pagos em decorrência do compromisso de compra e venda, além da indenização pelos danos materiais suportados, a título de despesas cartorárias com o registro dos contratos na matrícula do imóvel.
A Caixa Econômica Federal, por sua vez, deverá restituir à autora todas as prestações mensais (inclusive acessórios: juros, prêmios de seguro) que foram pagas por força do contrato de financiamento, de modo que lhe restará buscar junto aos Corréus vendedores, e desde que preenchidos os requisitos de lei, a efetiva restituição dos valores que lhe foram repassados, frente ao retorno ao status quo ante, ditado por este julgado.
Da responsabilidade da CEF
No que diz respeito à legitimidade da CAIXA em casos de vícios de construção de imóvel financiado com recursos do Sistema Financeiro de Habitação, a jurisprudência do STJ firmou orientação assim sintetizada: a) Nas hipóteses em que a CAIXA atua na condição de agente financeiro em sentido estrito, isto é, não financia a construção do imóvel e nem participa dessa fase do empreendimento, não ostenta legitimidade para responder pelos vícios de construção na obra financiada, tendo em vista que a sua responsabilidade contratual diz respeito apenas ao cumprimento do contrato de financiamento, ou seja, à liberação do empréstimo, nas épocas acordadas, e à cobrança dos encargos estipulados no contrato; b) em se tratando de créditos imobiliários cedidos à CAIXA, essa empresa pública também não pode ser responsabilizada por eventuais vícios de construção nos imóveis, seja porque não financiou sua construção, seja porque não financiou originariamente a aquisição das unidades habitacionais.
Nesse sentido:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. VÍCIO DE CONSTRUÇÃO EM IMÓVEL. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTRE SEGURADORA E AGENTE FINANCEIRO. AGRAVO IMPROVIDO.
1. O agente financeiro somente tem legitimidade passiva 'ad causam' para responder solidariamente com a seguradora, nas ações em que se pleiteia a cobertura por vícios de construção do imóvel, quando também tenha atuado na elaboração do projeto, na execução ou na fiscalização das obras do empreendimento. Precedentes.
2. No caso dos autos, como o acórdão recorrido não assinalou nenhuma dessas circunstâncias fáticas, não é possível reconhecer a existência de solidariedade, sob pena de ofensa à Súmula n. 7/STJ.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 1522725/PR, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/02/2016, DJe 22/02/2016) (grifei)
RECURSOS ESPECIAIS. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. SFH. VÍCIOS NA CONSTRUÇÃO. AGENTE FINANCEIRO. ILEGITIMIDADE. DISSÍDIO NÃO DEMONSTRADO. INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. VÍCIO NA REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL.
1. A questão da legitimidade passiva da CEF, na condição de agente financeiro, em ação de indenização por vício de construção, merece distinção, a depender do tipo de financiamento e das obrigações a seu cargo, podendo ser distinguidos, a grosso modo, dois gêneros de atuação no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, isso a par de sua ação como agente financeiro em mútuos concedidos fora do SFH (1) meramente como agente financeiro em sentido estrito, assim como as demais instituições financeiras públicas e privadas (2) ou como agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa ou baixíssima renda.
2. Nas hipóteses em que atua na condição de agente financeiro em sentido estrito, não ostenta a CEF legitimidade para responder por pedido decorrente de vícios de construção na obra financiada. Sua responsabilidade contratual diz respeito apenas ao cumprimento do contrato de financiamento, ou seja, à liberação do empréstimo, nas épocas acordadas, e à cobrança dos encargos estipulados no contrato.
A previsão contratual e regulamentar da fiscalização da obra pelo agente financeiro justifica-se em função de seu interesse em que o empréstimo seja utilizado para os fins descritos no contrato de mútuo, sendo de se ressaltar que o imóvel lhe é dado em garantia hipotecária. Precedente da 4ª Turma no REsp. 1.102.539/PE.
3. Hipótese em que não se afirma, na inicial, tenha a CEF assumido qualquer outra obrigação contratual, exceto a liberação de recursos para a construção. Não integra a causa de pedir a alegação de que a CEF tenha atuado como agente promotor da obra, escolhido a construtora, o terreno a ser edificado ou tido qualquer responsabilidade em relação ao projeto.
4. O acórdão recorrido, analisando as cláusulas do contrato em questão, destacou constar de sua cláusula terceira, parágrafo décimo, expressamente que "a CEF designará um fiscal, a quem caberá vistoriar e proceder a medição das etapas efetivamente executadas, para fins de liberação de parcelas. Fica entendido que a vistoria será feita exclusivamente para efeito de aplicação do empréstimo, sem qualquer responsabilidade da CEF pela construção da obra." Essa previsão contratual descaracteriza o dissídio jurisprudencial alegado, não havendo possibilidade, ademais, de revisão de interpretação de cláusula contratual no âmbito do recurso especial (Súmulas 5 e 7).
5. Recurso especial da CAIXA SEGURADORA S/A não conhecido e recurso especial do CONDOMÍNIO EDIFÍCIO RESIDENCIAL DA PRAÇA E OUTROS não provido.
(STJ, REsp 897.045/RS, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 09/10/2012, DJe 15/04/2013) (grifei)
No caso, a CAIXA cumpriu com a sua parte na avença, entregando à mutuaria o numerário suficiente para que pudesse adquirir o seu imóvel, não podendo ser demandada em ação que discute vício de construção.
O que se vê é que, nesse contrato firmado entre as partes, a CEF atuou apenas como agente financiador.
Dessa forma, a responsabilidade da CEF só é admitida quando também tenha atuado na elaboração do projeto, na execução ou na fiscalização das obras do empreendimento, ou como agente de operador de políticas públicas, para população de baixa renda, hipóteses que não se verifica na hipótese dos autos.
Cumpre consignar que não nos autos qualquer documentação nos autos de que a CEF tenha participado como agente promotor do empreendimento, projetando, acompanhando a construção e promovendo a fiscalização da edificação.
Ressalte-se que, nessas hipóteses, em que atua estritamente como agente financeiro, a perícia designada pela CEF não tem por objetivo atestar a solidez ou a regularidade da obra, mas sim resguardar o interesse da instituição financeira, uma vez que o imóvel financiado lhe será dado em garantia.
Nesse sentido já decidiram o Superior Tribunal de Justiça e este Tribunal Regional Federal da Terceira Região:
RECURSOS ESPECIAIS. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. SFH. VÍCIOS NA CONSTRUÇÃO. AGENTE FINANCEIRO. ILEGITIMIDADE. DISSÍDIO NÃO DEMONSTRADO. INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. VÍCIO NA REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL.
1. A questão da legitimidade passiva da CEF, na condição de agente financeiro, em ação de indenização por vício de construção, merece distinção, a depender do tipo de financiamento e das obrigações a seu cargo, podendo ser distinguidos, a grosso modo, dois gêneros de atuação no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, isso a par de sua ação como agente financeiro em mútuos concedidos fora do SFH (1) meramente como agente financeiro em sentido estrito, assim como as demais instituições financeiras públicas e privadas (2) ou como agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa ou baixíssima renda.
2. Nas hipóteses em que atua na condição de agente financeiro em sentido estrito, não ostenta a CEF legitimidade para responder por pedido decorrente de vícios de construção na obra financiada. Sua responsabilidade contratual diz respeito apenas ao cumprimento do contrato de financiamento, ou seja, à liberação do empréstimo, nas épocas acordadas, e à cobrança dos encargos estipulados no contrato.
A previsão contratual e regulamentar da fiscalização da obra pelo agente financeiro justifica-se em função de seu interesse em que o empréstimo seja utilizado para os fins descritos no contrato de mútuo, sendo de se ressaltar que o imóvel lhe é dado em garantia hipotecária. Precedente da 4ª Turma no REsp. 1.102.539/PE.
3. Hipótese em que não se afirma, na inicial, tenha a CEF assumido qualquer outra obrigação contratual, exceto a liberação de recursos para a construção. Não integra a causa de pedir a alegação de que a CEF tenha atuado como agente promotor da obra, escolhido a construtora, o terreno a ser edificado ou tido qualquer responsabilidade em relação ao projeto.
4. O acórdão recorrido, analisando as cláusulas do contrato em questão, destacou constar de sua cláusula terceira, parágrafo décimo, expressamente que "a CEF designará um fiscal, a quem caberá vistoriar e proceder a medição das etapas efetivamente executadas, para fins de liberação de parcelas. Fica entendido que a vistoria será feita exclusivamente para efeito de aplicação do empréstimo, sem qualquer responsabilidade da CEF pela construção da obra." Essa previsão contratual descaracteriza o dissídio jurisprudencial alegado, não havendo possibilidade, ademais, de revisão de interpretação de cláusula contratual no âmbito do recurso especial (Súmulas 5 e 7).
5. Recurso especial da CAIXA SEGURADORA S/A não conhecido e recurso especial do CONDOMÍNIO EDIFÍCIO RESIDENCIAL DA PRAÇA E OUTROS não provido.
(STJ, REsp 897.045/RS, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 09/10/2012, DJe 15/04/2013)
CIVIL. COMPRA E VENDA. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. VÍCIO DE CONTRUÇÃO. RESPONSABILIDADE DO ALIENANTE. AUSÊNCIA DE INTERESSE DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. EXCLUSÃO DO POLO PASSIVO DA AÇÃO. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. REMESSA DOS AUTOS AO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO. I - Das várias avenças celebradas através do mesmo instrumento (no presente caso, compra e venda, financiamento, alienação fiduciária e seguro), tem-se que a relação existente entre o mutuário e o agente financeiro é, exclusivamente, de mútuo de capital destinado ao pagamento do preço avençado com terceiro pela aquisição de bem imóvel. Assim, não há razão para que a CEF permaneça no polo passivo do feito, pois o vício redibitório diz respeito ao contrato de compra e venda e não ao de financiamento. II - A lei impinge ao alienante responsabilidade pelos vícios redibitórios, situação essa que não é a da empresa pública III - Não havendo previsão contratual que determine a responsabilidade da Caixa Econômica Federal - CEF, por vícios de construção, cumpre excluí-la da lide, dada sua ilegitimidade passiva ad causam, julgando extinta a ação com relação a ela, com base no artigo 487, inciso VI, do Novo Código de Processo Civil e reconhecer a incompetência absoluta da Justiça Federal. VI - Apelação parcialmente provida, apenas para incluir réus José Caetano de Camargo e Maria Fátima Lozano Recio de Camargo no polo passivo da presente ação. Exclusão, de ofício, da Caixa Econômica Federal do polo passivo da ação. Incompetência da Justiça Federal para processar e julgar a presente causa. Remessa dos autos ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
(TRF-3 - Ap: 00110714120134036105 SP, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES, Data de Julgamento: 05/12/2017, SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/12/2017)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO (SFH). VÍCIOS NA CONSTRUÇÃO. ILEGITIMIDADE DA CEF. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS A COMPROVAR QUE A CEF ATUARIA NA ESPÉCIE COMO GESTORA DE RECURSOS E POLÍTICAS FEDERAIS DE PROMOÇÃO DA MORADIA. PRECEDENTES. AGRAVO DE INSTRUMENTO IMPROVIDO. - Recurso interposto contra decisão que, nos autos da ação ordinária ajuizada na origem, julgou extinto o feito sem resolução do mérito em relação à Caixa Econômica Federal, por ilegitimidade passiva. Quanto à responsabilidade da CEF sobre os vícios de construção de imóveis financiados segundo as regras do Sistema Financeiro da Habitação, duas são as situações que se apresentam. - Na primeira delas, a CEF atua tão somente como agente financeiro financiando a aquisição do imóvel para o mutuário e concorrendo neste nicho de mercado com as demais instituições financeiras. Na segunda delas, a CEF opera como verdadeiro agente gestor de recursos e executor de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda, a exemplo do que ocorre no âmbito do Programa Minha Casa Minha Vida. - No caso específico dos autos não há qualquer elemento capaz de comprovar, indicar ou supor a participação da agravada na condição de executora de política pública de moradia a justificar sua responsabilização por danos construtivos do imóvel. Diversamente, o que constata é a existência de disposição contratual prevendo que as vistorias realizadas pela CEF teriam a finalidade exclusiva de medição do andamento da obra e verificação da aplicação dos recursos sem qualquer responsabilidade técnica pela edificação. Precedentes. - Agravo de instrumento a que se nega provimento.
(AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 586708 0015232-71.2016.4.03.0000, DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/02/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA ANTECIPADA. IMÓVEL FINANCIADO. VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO. ILEGITIMIDADE DA CEF. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. - É o caso de acolher a alegação de ilegitimidade passiva da Caixa Econômica Federal, a qual atuou meramente como agente financeiro, não possuindo legitimidade para figurar no polo passivo da ação de rescisão contratual c.c danos materiais e morais, em virtude de vícios na construção do imóvel, tendo sido sua responsabilidade limitada à liberação do empréstimo. Ainda, as vistorias realizadas pela instituição financeira nesta condição destinam-se a avaliar o bem para efeitos da garantia do empréstimo, não implicando em aval acerca da aptidão da obra. - Por conseguinte, observado o princípio da economia processual, é o caso de reconhecer a incompetência absoluta do Juízo a quo para processo e julgamento da causa, em razão dos efeitos translativo dos recursos, que autoriza o Tribunal, ultrapassada admissibilidade do recurso, a apreciar questões de ordem pública fora do alegado nas razões ou contrarrazões recursais, mesmo em sede de agravo de instrumento. - Preliminar de ilegitimidade passiva da Caixa Econômica Federal acolhida e, em consequência, reconhecer a incompetência da Justiça Federal e determinar a remessa dos autos à Justiça Estadual. Agravo de instrumento prejudicado.
(AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 586342 0014395-16.2016.4.03.0000, DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA RIBEIRO, TRF3 - SEGUNDA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/02/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
AGRAVO DE INSTRUMENTO - RESPONSABILIDADE CIVIL - DANOS MATERIAIS E MORAIS - VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO - ILEGITIMIDADE DA CEF - FINANCIAMENTO - ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. - A CEF não responde pelos vícios de construção existente no imóvel financiado. - Trata-se de contrato de compra e venda de imóvel com alienação fiduciária em garantia, em que a CEF financiou o valor para a aquisição da casa própria. Portanto, o dever do agente financeiro é restrito às questões relacionadas ao próprio contato de mútuo. - Cláusula contratual exclui expressamente a cobertura de danos causados por vícios de construção. - Ilegitimidade da CEF para figurar no polo passivo da ação. Competência do Juízo Estadual para processar e julgar a matéria. - Agravo de instrumento desprovido.
(AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 525029 0002996-58.2014.4.03.0000, DESEMBARGADOR FEDERAL MAURICIO KATO, TRF3 - QUINTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/11/2015 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO REDIBITÓRIA - AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRA A DECISÃO RECONHECEU A ILEGITIMIDADE DA CORRÉ CAIXA ECONÔMICA FEDERAL PARA FIGURAR NO PÓLO PASSIVO E DECLINOU DA COMPETÊNCIA EM FAVOR DA JUSTIÇA ESTADUAL - A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL FIGURA COMO PRESTAMISTA DO FINANCIAMENTO - RECURSO IMPROVIDO.
1. Duas são as relações jurídicas postas em discussão: a primeira diz respeito à venda e compra, pactuada com a corré MP Construção Ltda (vendedora), enquanto a segunda refere-se ao mútuo habitacional realizado com a Caixa Econômica Federal, que figura como credora.
2. O vício redibitório 'é o defeito oculto da coisa que dá ensejo à rescisão contratual, por tornar o seu objeto impróprio ao uso a que se destina, ou por diminuir o seu valor de tal modo que, se o outro contratante soubesse do vício, não realizaria o negócio pelo mesmo preço' (ARNOLDO WALD, Curso de Direito Civil Brasileiro - Obrigações e Contratos - 14ª edição, Ed. RT, p. 265); contudo, a lei impinge ao alienante responsabilidade pelos vícios redibitórios, situação essa que não é a da empresa pública.
3. Não há a aventada solidariedade da Caixa Econômica Federal em relação ao alegado vício do imóvel na medida em que a empresa pública federal não 'intermedia' a venda de imóveis, pois não tem funções de corretagem; apenas prestou ao autor dinheiro para adquirir o imóvel. Precedentes desta Corte Regional.
4. Assim, em razão da natureza da relação jurídica formada entre a Caixa Econômica Federal e a parte autora, ora agravante, não há responsabilidade da empresa pública em relação objeto da demanda capaz de atrair a competência da Justiça Federal para apreciar e julgar a lide.
5. Agravo de instrumento a que se nega provimento.
(TRF 3ª Região, PRIMEIRA TURMA, AI 0001594-10.2012.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOHONSOM DI SALVO, julgado em 26/06/2012, e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/07/2012)
Deve-se ter em conta, ainda, que não foi suscitada qualquer questão relativa a supostas irregularidades ou descumprimento do contrato de financiamento firmado com a Caixa Econômica Federal.
Assim sendo, considerando que a relação entre os autores e a CEF se limita ao contrato de mútuo para obtenção de fundos para compra de imóvel de terceiro, e ao pedido de rescisão do mútuo e restituição dos valores pagos, não há qualquer responsabilidade da instituição financeira pelos danos morais e materiais suportados pela apelante.
Dos danos morais
Tenho que o caso dos autos, em que a autora adquiriu imóvel dos apelados e foi surpreendida pela constatação de vícios estruturais, e inundações no imóvel, que acarretaram a perda de bens materiais, revela situação que ultrapassa os limites de um mero aborrecimento, ensejando o dano moral passível de recomposição.
Desta forma, demonstrada a ocorrência do dano, e presentes os requisitos ensejadores à configuração da responsabilidade dos vendedores Réus, a fixação de indenização é medida que se impõe.
No que se refere ao arbitramento do valor a título de indenização por danos morais, é firme a orientação jurisprudencial no sentido de que, nesses casos, deve ser determinada segundo o critério da razoabilidade e do não enriquecimento despropositado, nos seguintes moldes, in verbis:
"A indenização por dano moral deve ser fixada em termos razoáveis, não se justificando que a reparação venha a constituir-se em enriquecimento indevido, devendo o arbitramento operar-se com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao porte empresarial das partes, às suas atividades comerciais e, ainda, ao valor do negócio. Há de orientar-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida, notadamente à situação econômica atual e às peculiaridades de cada caso".
(STJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, in RT 776/195)
Considerando as circunstâncias específicas do caso concreto, em especial o considerável grau de culpa dos réus e o padrão econômico do imóvel tenho que o montante de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), se revela mais razoável e suficiente para a compensação do dano no caso dos autos, sem importar no indevido enriquecimento dos requerentes, inclusive conforme precedentes desta Eg. Turma:
CIVIL E PROCESSO CIVIL. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO. VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. LEGITIMIDADE DA CEF. SEGURADORA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. QUANTUM INDENIZATÓRIO.
1. No que tange ao pedido de rescisão do contrato de compra e venda do imóvel com financiamento e garantia, a CEF é parte legítima, pois celebrou o contrato de mútuo habitacional. Os mutuários efetuavam o pagamento das prestações diretamente ao agente financeiro e este repassou o crédito ao vendedor (cláusula quarta do contrato de mútuo).
2. Em relação ao segundo pedido (indenização por danos morais em decorrência dos danos oriundos de vícios de construção), presente o interesse da CEF na lide, pois se trata de contrato assinado na vigência da Lei nº 7.682/1988, período no qual a apólice é necessariamente pública, garantida pelo FCVS e há potencial comprometimento dos recursos desse fundo.
3. Estão preenchidos os requisitos para a resolução do contrato. O contrato de compra e venda é o típico contrato cumutativo, em que há prestações certas, recíprocas e equivalentes. Os vícios de construção que atingem a estrutura do imóvel, criando, inclusive, risco de desabamento, conforme atestado pelas vistorias e perícia judicial, tornam o imóvel impróprio para habitação (isto é, para o fim ao qual se destina). Esses vícios não eram visíveis no momento da celebração do contrato de compra e venda com financiamento da CEF e, considerando os riscos constatados por perícia, a gravidade é evidente.
4. A rescisão do contrato não é uma punição por qualquer conduta culposa ou ilícita, mas apenas a consequência jurídica que o ordenamento impõe para os casos de constatação de vícios redibitórios.
5. Mantida a sentença em que determinada a rescisão do contrato.
6. A consequência da rescisão do contrato pela constatação de vícios redibitórios é o retorno ao statu quo ante, isto é, as partes devem retornar à posição jurídica em que se encontravam antes da celebração do contrato. Logo, mantém-se a condenação da CEF e da Caixa Seguradora S/A à devolução dos valores recebidos em razão do contrato, devidamente atualizados e acrescidos de juros, conforme determinado na sentença.
7. A CEF responde pelos vícios de construção, o que não obsta eventual ação regressiva contra a construtora.
8. Na apólice de seguro juntada aos autos, consta a exclusão expressa dos danos decorrentes de vícios de construção (cláusula 5.2.6), mas o documento sequer está assinado ou datado.
9. A jurisprudência é de que a seguradora é responsável em caso de danos decorrentes de vícios de construção, uma vez que não só é obrigatória a contratação do seguro pelo mutuário, como também é obrigatória a vistoria do imóvel pela seguradora.
10. A responsabilidade da CEF e da seguradora é solidária, pois o negócio é um só e deve ser considerado no todo, em face da circunstância de ser viabilizado com recursos públicos, em projeto concebido sistematicamente.
11. Por perícia, constataram-se vícios de construção, assim descritos: a) fissuras no teto; b) desnivelamento do piso do banheiro; c) inadequada impermeabilização das calhas da cobertura; d) ausência de manutenção da pintura externa; e) umidade ascendente no corredor externo, mas não foi comprovada a existência de qualquer dano material.
12. No que concerne aos danos morais, tem-se que estes decorrem de ato que violem direitos de personalidade, causando sofrimento, angústia, aflição física ou espiritual ou qualquer padecimento infligido à vítima em razão de algum evento danoso. Contudo, o mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo.
13. O dano moral decorre das dificuldades impostas aos autores, compelidos a residirem em imóvel com diversos vícios de construção, causando-lhes frustação, insegurança e receio, além dos transtornos decorrentes de ter que diligenciar junto à construtora, à CEF, à seguradora e ao Judiciário na tentativa de solucionar a situação.
14. No tocante ao quantum indenizatório, a título de danos morais, é fato que a indenização por danos morais deve traduzir-se em montante que represente advertência ao lesante e à sociedade e, ainda, deve levar em consideração a intensidade do sofrimento do ofendido, a intensidade do dolo ou grau da culpa do responsável, a situação econômica deste e também da vítima, de modo a não ensejar um enriquecimento sem causa do ofendido. O seu escopo define-se pela incidência dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade da sanção em relação à extensão do dano ou do ilícito, evitando-se assim condenações extremas. O valor da condenação imposta à ré deve cumprir esse dúplice escopo, ou seja, ressarcir a vítima do dano moral sofrido e desestimular práticas correlatas; afastando a comissão de condutas análogas; não podendo, pois, tornar baixos os custos e riscos sociais da infração.
15. Por tais razões, mostra-se razoável manter a indenização fixada na sentença a título de danos morais, em R$ 15.000,00 (quinze mil reais), diante das circunstâncias fáticas que nortearam o presente caso, eis que tal importância não proporcionará enriquecimento indevido e exagerado da parte autora e, ainda, é capaz de impor punição a parte ré, mormente na direção de evitar atuação reincidente, além de compatível com os parâmetros desta Quinta Turma.
16. Apelações a que se nega provimento.
(TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0028562-57.2005.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal WILSON ZAUHY FILHO, julgado em 14/02/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 18/02/2020)
Dos danos materiais
Pelos documentos acostados aos autos, em consonância com a prova pericial produzida durante a instrução do feito, entendo que resta incontroversa a ocorrência dos danos materiais, em virtude dos prejuízos suportados pela Autora, com a realização dos reparos emergenciais no imóvel, bem como as benfeitorias tidas como necessárias.
Estamos diante, portanto, de verdadeira hipótese de responsabilidade civil extracontratual, que se refere a responsabilidade dos vendedores pela perfeição da obra, vinculada, portanto, à garantia da construção e do resultado que se espera, seja pela perfeição técnica da obra, como também pela sua solidez e segurança, conforme prevê o artigo 618 do Código Civil, verbis:
Art. 618. Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o prazo irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo.
Aplicável, ainda, à espécie, os comandos contidos no artigo 931 do Código Civil vigente, segundo o qual "os empresários individuais e as empresas respondem independentemente de culpa pelos danos causados pelos produtos postos em circulação", em consonância com o artigo 927, que determina a obrigação de reparação por ato ilícito, quando causado danos a outrem.
Por serem os responsáveis pela construção do imóvel, inquestionável que os Corréus têm responsabilidade por vícios redibitórios e também pelos prejuízos suportados pelo comprador, quando comete erros de projeto, utiliza materiais inadequados, ou quando a execução da obra, por qualquer razão que lhe possa ser imputada, compromete seu resultado final causando danos no imóvel.
Assim, suficientemente demonstrado o "an debeatur", a sentença determinou que o "quantum debeatur" seja apurado em sede de liquidação de sentença, o que se mostra plenamente possível, conforme determina o artigo 509, inciso I do CPC/15.
Dispositivo
Ante o exposto, divirjo do E. Relator e voto por dar parcial provimento ao recurso de apelação da autora para reformar a sentença e julgar parcialmente procedentes os pedidos para:
(a) decretar a rescisão dos negócios jurídicos celebrados (promessa de compra e venda, contrato de financiamento e contrato de seguro adjeto), com a consequente condenação dos réus à restituição de todos os valores desembolsados, nos termos da fundamentação supra. Os valores, a serem apurados em liquidação de sentença, deverão ser corrigidos monetariamente pela Tabela da Justiça Federal desde a data da referida petição inaugural e acrescida de juros moratórios a partir da citação.
(b) Condenar os réus OTAVIO ALVES SANTANA, JOSE BOSCO DE MEDEIROS MORAIS, EGNALDO OLIVEIRA SILVA ao pagamento de indenização (b.1) a título de danos materiais, a ser apurado em sede de liquidação de sentença; (b.2) a título de danos morais, no montante de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), sobre o qual incidirá correção monetária pela Tabela da Justiça Federal e juros de mora desde a presente data.
(c) Assente a necessidade de provimento do apelo da autores e, por força do princípio da causalidade, deverão os réus OTAVIO ALVES SANTANA, JOSE BOSCO DE MEDEIROS MORAIS, EGNALDO OLIVEIRA SILVA, a suportar, na integralidade, o pagamento das custas e honorários advocatícios aos autores, no percentual de 10 % (dez por cento) sobre o valor atualizado da condenação.
Considerando, ainda, a sucumbência da Autora, uma vez afastada a responsabilização da CEF pelos danos suportados, lhe condeno ao pagamento de honorários advocatícios, também no percentual de 10%, porém sobre o proveito econômico obtido pela requerida, mantida a suspensão da exigibilidade da cobrança, em razão da concessão dos benefícios da justiça gratuita, na forma do artigo 98, § 3º do CPC/15.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSO CIVIL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO FIRMADO COM A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. INDENIZAÇÃO POR VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO. ATUAÇÃO DA CEF COMO MERO AGENTE FINANCEIRO. ILEGITIMIDADE PASSIVA. REMESSA DOS AUTOS À JUSTIÇA ESTADUAL. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. Trata-se de ação ajuizada originariamente na Justiça Estadual, objetivando a rescisão do contrato de compra e venda, por vícios ocultos, com devolução integral dos valores pagos, além do recebimento de indenização por danos morais e materiais.
2. A autora firmou com a Caixa Econômica Federal o contrato por instrumento particular de compra e venda de imóvel residencial quitado, mútuo e alienação fiduciária em garantia – Carta de Crédito com recursos do SBPE-SFH, tendo por objeto residência situada em Atibaia/SP.
3. O Superior Tribunal de Justiça já se debruçou sobre a questão da legitimidade passiva da CEF, ao figurar como mutuante em contrato de financiamento para a aquisição de imóvel, nas ações em que se discute indenização por vício de construção.
4. Definiu-se que, nos casos em que a Caixa atua apenas como agente financeiro, financiando a aquisição de imóvel que já se encontra edificado e em nome de terceiro, essa instituição financeira não pode ser responsabilizada por vícios de construção e é parte ilegítima para compor a lide (REsp n. 1.102.539/PE).
5. Se o imóvel já foi construído e escolhido pelo mutuário, não é possível responsabilizar a CEF por vícios de construção, pois não teve qualquer participação na obra, como é o caso dos autos. O papel da CEF, na verdade, foi apenas de fazer o empréstimo à autora, não tendo nenhuma responsabilidade técnica com relação à execução e qualidade da edificação. Precedentes.
6. Apelação desprovida.