APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0000158-41.2016.4.03.6122
RELATOR: Gab. 44 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA
APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
PROCURADOR: PROCURADORIA DA REPÚBLICA-EM SÃO PAULO
APELADO: ANTONIO ALVES DA SILVA, THIAGO ROBERTO APARECIDO MARCELINO FERRAREZI
Advogado do(a) APELADO: RODRIGO RODRIGUES CORDEIRO - SP303803-A
Advogado do(a) APELADO: DORCILIO RAMOS SODRE JUNIOR - SP129440-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0000158-41.2016.4.03.6122 RELATOR: Gab. 44 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP APELADO: ANTONIO ALVES DA SILVA, THIAGO ROBERTO APARECIDO MARCELINO FERRAREZI Advogado do(a) APELADO: RODRIGO RODRIGUES CORDEIRO - SP303803-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA (R elator): O Ministério Público Federal ofereceu denúncia em face de ANTÔNIO ALVES DA SILVA e THIAGO ROBERTO APARECIDO, qualificados nos autos, nascidos aos 14/01/1956 e 06/09/1984, respectivamente, pela prática do crime previsto no art. 89, caput e parágrafo único, da Lei n. 8.666/93. Consta da denúncia (id 203913242 – pág. 3/6): “O denunciado Antonio Alves da Silva, em dezembro de 2009, na condição de Prefeito Municipal de Parapuã/SP, contratou, mediante inexigibilidade de licitação e visando a dar execução ao Convênio Federal nº 722029/2009, firmado entre o Ministério do Turismo e a municipalidade, a empresa Usina de Promoções de Eventos LTDA-ME, em que figura como sócio e único administrador o denunciado Thiago Roberto Aparecido Marcelino Ferrarezi, para realização do 5º Rodeio Festival Show de Parapuã/SP, fora das hipóteses previstas em lei, dando azo à utilização irregular de R$100.000,00 em verbas federais. Tais fatos vieram a tona a partir do Ofício 1662/2012, da Procuradoria da República de São José do Rio Preto/SP, o qual informou irregularidades na execução do convênio nº 704495/2009, em que a prefeitura de Floreal/SP celebrou contrato de prestação de serviços juntamente com a mesma empresa Usina de Promoções de Eventos LTDA-ME. A partir daí, passou-se a apurar todos os contratos que a referida empresa realizou com prefeituras em todo Estado de São Paulo. Conforme conta nos autos às fls. 92/121, a contratação da empresa supracitada teria se dado por meio do Processo de Inexigibilidade de Licitação n.º 01/2010, justificando-se com base no Art. 25, III da Lei 8.666/93, o qual dispõe ser inexigível a licitação quando da contratação de profissional do setor artístico se fizer diretamente com o artista ou por meio de seu empresário exclusivo, desde que seja consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública. Ocorre que as cartas de exclusividade apresentadas pelos artistas foram elaboradas para um único e específico evento, qual seja, apresentação no 5º Rodeio Festival Show de Parapuã/SP, o que contraria o conceito de exclusividade adotado pela jurisprudência do TCU, a qual não admite a existência de uma carta ou contrato de exclusividade para um único evento, senão vejamos: (…) Desta forma, não há como falar que a empresa Usina de Promoções de Eventos LTDA-ME, de propriedade do denunciado Thiago, possuísse exclusividade de representação para todos os shows das duplas “Leandro & Fernando, Markos e Marcello e Roby & Roger”, ficando claro que tudo não passou de uma manobra para incluir na contratação a empresa “intermediadora”, de modo a justificar a canalização de recursos públicos que deveriam ter sido despendidos por meio de regular processo licitatório. Ademais, como as referidas duplas passam longe de apresentar grau de singularidade acima da média, tampouco possuem (ou possuíram) destaque junto à opinião pública, não há que se falar que são artistas consagrados, uma vez que são conhecidas apenas pelo público de determinada e específica região geográfica. Assim agindo, o denunciado Antonio Alves da Silva, após prévio ajuste e com unidade de desígnios com o co-denunciado, inexigiu licitação fora das hipóteses previstas em Lei, sendo que Thiago Roberto Aparecido Marcelino Ferrarezi beneficiou-se da inexigibilidade ilegal para celebrar contrato com o Poder Público, no caso a Prefeitura Municipal de Parapuã. Com suas condutas, os denunciados Antonio Alves da Silva e Thiago Roberto Aparecido Marcelino Ferrarezi agindo de maneira livre e consciente, incorreram, respectivamente, nas sanções do artigo 89, "caput" e parágrafo único da Lei n. 8.666/93. (...) Por fim, indicado, para reparação do dano causado à vítima (União), o montante de R$100.000,00, vigente em dezembro/2009.” A denúncia foi recebida em 18/03/2016 (ID 203913242 – pág. 10). Após a instrução, sobreveio sentença, da lavra do MM. Juiz Federal VANDERLEI PEDRO COSTENARO e publicada em 29/11/2019 (id 203913246 – pág.26/34), que julgou improcedente a denúncia para absolver ANTÔNIO ALVES DA SILVA e THIAGO ROBERTO APARECIDO MARCELINO FERRAREZI da prática do delito previsto no art. 89 da Lei 8.666/93, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal. Apela o Ministério Público Federal (id 203913246 – pág. 40/64) postulando a reforma da sentença, com a condenação de ANTÔNIO e THIAGO pela prática do crime imputado na denúncia, sustentando ser dispensável a comprovação do efetivo prejuízo ao erário, para a configuração do delito tipificado no art. 89 da Lei 8.666/93, por ser crime formal, bastando a comprovação da ação ou omissão para sua consumação, nos termos da jurisprudência da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal. Aduz ainda que, no caso, a contratação por inexigibilidade de licitação objeto dos presentes autos resultou em efetivo prejuízo à administração pública. Alega que restou demonstrada a materialidade, a autoria delitiva e o dolo específico de fraudar a concorrência pública e de inexigir licitação indevidamente em prejuízo da administração pública. Contrarrazões dos réus (id 203913255 e 203913273) pelo desprovimento do recurso ministerial. A Procuradoria Regional da República, em parecer da lavra do Dr. ORLANDO MARTELLO opinou pelo provimento do recurso ministerial, para que ANTÔNIO ALVES DA SILVA e THIAGO ROBERTO APARECIDO MARCELINO FERRAREZI sejam condenados pela prática do delito previsto no art. 89, caput e parágrafo único, da Lei 8.666/93 (id 210304980). É o relatório. Dispensada a revisão, nos termos regimentais.
PROCURADOR: PROCURADORIA DA REPÚBLICA-EM SÃO PAULO
Advogado do(a) APELADO: DORCILIO RAMOS SODRE JUNIOR - SP129440-A
APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0000158-41.2016.4.03.6122 RELATOR: Gab. 44 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP APELADO: ANTONIO ALVES DA SILVA, THIAGO ROBERTO APARECIDO MARCELINO FERRAREZI Advogado do(a) APELADO: RODRIGO RODRIGUES CORDEIRO - SP303803-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA (Relator): Da tipicidade da conduta ANTÔNIO ALVES DA SILVA foi denunciado por ter supostamente, de forma livre, consciente e voluntária inexigido licitação fora das hipóteses previstas em lei, conduta que se amolda ao tipo penal previsto na primeira parte do artigo 89, caput, da Lei n. 8.666/93. THIAGO ROBERTO APARECIDO MARCELINO FERRAREZI foi denunciado pela prática do crime previsto no artigo 89, parágrafo único, da Lei n. 8.666/93, por ter participado da consumação da ilegalidade mediante instrumento de inexigibilidade de licitação fora das hipóteses legais previstas. Considerada a superveniência da Lei n. 14.133/2021, que revogou expressamente o art. 89 da Lei n. 8.666/93, convém analisar a tipicidade da conduta imputada aos réus. Dispunha o art. 89 da Lei 8.666/93 (tipo no qual a denúncia amolda a conduta dos apelados), antes da promulgação da lei revogadora: Lei 8.666/93 Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade: Pena - detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa. Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público. Em 01/04/2021, sobreveio a Lei n. 14.133/2021 (Lei de Licitações e Contratos Administrativos), assim dispondo: Lei 14.133/21 Art. 178. O Título XI da Parte Especial do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passa a vigorar acrescido do seguinte Capítulo II-B: “CAPÍTULO II-B DOS CRIMES EM LICITAÇÕES E CONTRATOS ADMINISTRATIVOS Contratação direta ilegal Art. 337-E. Admitir, possibilitar ou dar causa à contratação direta fora das hipóteses previstas em lei: Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. (...) Art. 193. Revogam-se: I – os arts. 89 a 108 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, na data de publicação desta Lei; II - em 30 de dezembro de 2023: (Redação dada pela Lei Complementar nº 198, de 2023) a) a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993; (Redação dada pela Lei Complementar nº 198, de 2023) b) a Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002; e (Redação dada pela Lei Complementar nº 198, de 2023) c) os arts. 1º a 47-A da Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011. (Redação dada pela Lei Complementar nº 198, de 2023) Art. 194. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Como se observa, a Lei n. 14.133/2021 revogou expressamente os artigos 89 a 108, todos da Lei n. 8.666/93, com efeitos a partir da publicação da referida lei, nos termos do artigo 193, I, da Lei n. 14.133/2021. Todavia, consoante jurisprudência do STJ, “não há se falar em abolitio criminis com relação aos crimes da Lei n. 8.666/1993, porquanto houve a continuidade típico-normativa, por meio da inserção do Capítulo II-B no Código Penal, intitulado ‘Dos Crimes em Licitações e Contratos Administrativos’.” (AgRg no AREsp n. 2.073.726/PA, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 21/6/2022, DJe de 27/6/2022.). (AgRg no REsp n. 1.996.050/MG, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 11/9/2023, DJe de 14/9/2023.). O art. 89, caput, da Lei n. 8.666/93 previa três figuras típicas: na primeira parte, a dispensa de licitação e a inexigibilidade de licitação fora das hipóteses previstas em lei, e na segunda parte, o descumprimento das formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade. A conduta de “dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei” continua normatizada no novo tipo penal introduzido no artigo 337-E, do Código Penal, que criminaliza a conduta de “contratação direta fora das hipóteses previstas em lei”. Dessa forma, embora o crime do art. 89 da Lei n. 8.666/93 tenha sido revogado, não há que se falar em abolitio criminis, pois a conduta encontra correspondência no novel artigo 337-E do Código Penal, considerado o princípio da continuidade típico-normativa. Por outro lado, a conduta de descumprimento das formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade, prevista na segunda parte do art. 89 da Lei n. 8.666/93, não é mais tipificada como crime, ocorrendo abolitio criminis. No sentido da inocorrência de abolitio criminis em relação ao crime previsto na primeira parte do art. 89 da Lei n. 8.666/93 (dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei), e da ocorrência de abolitio criminis em relação a segunda conduta prevista no tipo penal (não cumprimento das formalidades legais para dispensa ou inexigibilidade de licitação), registro os precedentes desta Corte Regional: E M E N T A PENAL. PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO CONTRA DECISÃO QUE RECONHECEU A EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DO RÉU EM RAZÃO DA OCORRÊNCIA DE "ABOLITIO CRIMINIS". LEI Nº 8.666/93. ART. 89, “CAPUT” - SEGUNDA PARTE - NÃO FOI REPRODUZIDA NO ART. 337-E DO CÓDIGO PENAL. LEI PENAL BENÉFICA. RETROATIVIDADE. RECURSO DESPROVIDO. 1. Narra a inicial acusatória que, na sede da Prefeitura de Estrela D’Oeste/SP, os acusados contrataram serviço de mão de obra, seja dispensando a licitação respectiva indevidamente, seja não cumprindo as formalidades legais para dispensa ou inexigibilidade de licitação, treze vezes no ano de 2015 e onze vezes no 2016. 2. A sentença recorrida, acolhendo requerimento do órgão acusatório, julgou improcedente a pretensão punitiva para absolver Michele de todas as imputações, bem como Pedro, em relação ao delito de dispensa indevida de licitação referente aos fatos 1 a 5 do ano de 2015 e 1 a 4 do ano de 2016, e decretou a extinção da punibilidade de Pedro, em relação aos 24 fatos narrados, pela prática do crime do artigo 337-E (observando-se as penas do revogado art. 89 da Lei 8.666/93) c/c o artigo 71 (por 24 vezes), ambos do Código Penal, sob o fundamento de que teria havido a abolitio criminis da conduta de deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade de licitação (segunda parte do artigo 89 da Lei 8.666/93) 3. A sentença recorrida deve ser mantida, uma vez que o legislador reproduziu apenas parcialmente a redação do art. 89, “caput” da Lei n. 8.666/93, vale dizer, não inseriu a segunda parte do preceito primário do artigo revogado no art. 337-E, do Código Penal, o que caracteriza, portanto, "abolitio criminis" da conduta pela qual o apelante foi denunciado. 4. Desse modo, configurada a “abolitio criminis” da conduta narrada na denúncia e tendo em vista as disposições constitucional e legal da retroatividade da lei penal mais benéfica – inseridas, respectivamente, no art. 5º, XL, da Constituição Federal e no art. 2º, parágrafo único, do Código Penal – de rigor a manutenção da extinção da punibilidade do apelado. 5. Recurso em sentido estrito desprovido. (TRF 3ª Região, 11ª Turma, ReSe - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - 0000045-76.2019.4.03.6124, Rel. Desembargador Federal JOSE MARCOS LUNARDELLI, julgado em 15/09/2023, DJEN DATA: 21/09/2023) E M E N T A PENAL. PROCESSUAL PENAL. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. ARTIGO 89, “CAPUT”, DA LEI Nº 8.666/93. INEXIGIBILIDADE. PRESCRIÇÃO. “ABOLITIO CRIMINIS”. NÃO OCORRÊNCIA. MATERIALIDADE DEMONSTRADA. AUTORIA NÃO COMPROVADA. DOLO. PREJUÍZO NÃO CONFIGURADO. ABSOLVIÇÃO. ARTIGO 386, INCISO VII, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. 1. Apelantes condenados pelo cometimento do crime descrito no artigo 89, “caput”, e parágrafo único, da Lei nº 8.666/93. 2.Prescrição. Inocorrência. Preliminar rejeitada. 3. “Abolitio criminis”. Com a superveniência da edição da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, as Seções III (Dos Crimes e das Penas) e IV (Do Processo e do Procedimento Judicial) do Capítulo IV (Das Sanções Administrativas e da Tutela Judicial) da Lei nº 8.666/1993 foram expressamente revogadas na data de sua publicação, sendo que o art. 193 da Lei nº 14.133/2021 dispõe que: Revogam-se: I – os arts. 89 a 108 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, na data de publicação desta Lei. 4. Ao mesmo tempo o art. 178 da Lei nº 14.133/2021 fez incorporar o “CAPÍTULO II-B – DOS CRIMES EM LICITAÇÕES E CONTRATOS ADMINISTRATIVOS” (arts. 337-E a 337-P) no Título XI da Parte Especial do Código Penal, prevendo, dentre os novos tipos penais, exatamente o delito de “contratação direta ilegal” (art. 337-E). 5. A revogação dos crimes da Lei 8.666/93 não significa, contudo, que, necessariamente, tenha ocorrido “abolitio criminis”. 6. Do cotejo do artigo 337-E com o artigo 89 da Lei 8.666/93, verifica-se uma continuidade normativo-típica, pois o caráter criminoso do fato foi mantido, mas apenas em outro dispositivo penal, com uma exceção apontada pela doutrina no que tange à conduta "deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade" constante do caput do art. 89. 7. Ademais, há a superveniência de “novatio legis in pejus”, uma vez que as penas cominadas foram agravadas com a nova lei, pois o preceito secundário do artigo 89 era mais benéfico ao acusado, já que previa pena de detenção, em oposição à pena de reclusão agora cominada, não se cogitando, pois, de atipicidade fática. Desta feita, o referido artigo 89 da Lei 8.666/90 goza de ultra-atividade benéfica e deve ser aplicado ao presente caso. Preliminar rejeitada. 8. Materialidade demonstrada. 9. Autoria não comprovada. Para a configuração do delito do artigo 89 da Lei nº 8.666/93 exige-se o dolo específico de causar prejuízo às finanças da Administração Pública. Dolo não configurado. 10. Apelações defensivas providas para absolver os acusados, com fulcro no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. (TRF 3ª Região, 5ª Turma, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 0003766-46.2017.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal PAULO GUSTAVO GUEDES FONTES, julgado em 20/06/2023, DJEN DATA: 27/06/2023) Por fim, a conduta prevista no parágrafo único do art. 89 da Lei n. 8.666/93, do particular que concorre para o crime de dispensa/inexigibilidade de licitação praticado pelo funcionário público, permanece típica, configurando o crime do art. 337-E do Código Penal, na forma do art. 29 do Código Penal, que dispõe expressamente que: “Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade”. Quanto ao ponto, ensina Miguel Reale Junior: “Prosseguindo, por força do parágrafo único do art. 89 da Lei n. 8.666/93, prevalecia o entendimento de que, para se responsabilizar o particular que concorreu para a prática de ato criminoso, era indispensável que ele fosse beneficiado, celebrando contrato com a administração. O art. 337-E não comporta preceito de mesmo teor, de modo que a responsabilidade do particular incide por força do art. 29 do CP, não mais se exigindo tal demonstração.” (JÚNIOR, Miguel R. Código penal comentado. Editora Saraiva, 2023, pág. 525). Nesse sentido, já decidiu esta Corte Regional: E M E N T A PROCESSO PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME DE DISPENSA/INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO. ART. 89, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI N. 8.666/93. REVOGAÇÃO PELA LEI N. 14.133/21. PARTICULAR. ABOLITIO CRIMINIS. NÃO OCORRÊNCIA. ART. 337-E C. C. ART. 29, AMBOS DO CÓDIGO PENAL. RECURSO EM SENTIDO PROVIDO. 1. A conduta do particular que concorre para o crime de dispensa/inexigibilidade de licitação praticado pelo funcionário público, anteriormente prevista no art. 89, parágrafo único, da Lei n. 8.666/93, revogado pela Lei n. 14.133/21, permanece típica, configurando o crime previsto no art. 337-E do Código Penal, aplicando-se o art. 29 do diploma penal, não havendo, pois, abolitio criminis (TRF 3ª Região, HC n. 5014459-62.2021.4.03.0000, rel. Desembargador Federal Paulo Fontes, j. 09.08.21). 2. Recurso em sentido estrito provido. (TRF 3ª Região, 5ª Turma, ReSe - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - 5000915-65.2021.4.03.6124, Rel. Desembargador Federal ANDRE CUSTODIO NEKATSCHALOW, julgado em 20/06/2023, Intimação via sistema DATA: 22/06/2023) Dessa forma, tendo em vista que o tipo penal de inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei encontra correspondência no art. 337-E do CP, a conduta dos réus permanece típica. Ressalto ainda que, considerado que as alterações promovidas pela Lei n. 14.133/2021 trouxeram penalidade mais severa, por força do princípio da irretroatividade da lei penal, as penas do art. 337-E do CP não retroagem para fatos ocorridos anteriormente. Da indevida inexigibilidade de licitação (art. 89 e parágrafo único da Lei 8.666/1993): Segundo a denúncia, ANTÔNIO ALVES DA SILVA, na qualidade de Prefeito do Município de Parapuã/SP, teria contratado, mediante inexigibilidade de licitação, nos termos do art. 25, III da Lei 8.666/93, a empresa Usina de Promoções de Eventos Ltda. ME, para dar execução ao Convênio Federal n. 722.029/2009, firmado pela municipalidade e o Ministério do Turismo, alusivo ao 5ºRodeio Festival Show de Parapuã/SP. THIAGO ROBERTO APARECIDO MARCELINO, na qualidade de sócio e único administrador da empresa Usina de Promoções de Eventos Ltda. ME, teria participado da consumação da ilegalidade mediante instrumento de inexigibilidade de licitação fora das hipóteses legais previstas. A denúncia narra, em síntese, que a Prefeitura Municipal de Parapuã/SP firmou o Convênio n. 722.029/2009 com o Ministério do Turismo, obtendo o repasse de verbas federais para realização do “5º Rodeio Festival Show de Parapuã/SP”. Assim, o Município de Parapuã/SP, na gestão do então Prefeito ANTÔNIO ALVES DA SILVA, firmou contrato de prestação de serviços com a empresa Usina de Promoções de Eventos Ltda., representada por THIAGO ROBERTO APARECIDO MARCELINO, cujo objeto era a apresentação de shows artísticos pelas duplas sertanejas "Leandro & Fernando”, “Markos e Marcello” e “Roby & Roger”. Segundo a denúncia, a contratação foi realizada mediante procedimento de inexigibilidade de licitação (Processo de Inexigibilidade de Licitação nº 001/2010), sob pretexto da aplicação do art. 25, inciso III, da Lei de Licitações, que assim dispõe: Art. 25 - É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial: (…) III – para a contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública. Narra a denúncia que as cartas de exclusividade apresentadas pelos artistas foram elaboradas para um único e específico evento, qual seja, apresentação no 5º Rodeio Festival Show de Parapuã/SP, o que contraria o conceito de exclusividade adotado pela jurisprudência do TCU, a qual não admite a existência de uma carta ou contrato de exclusividade para um único evento, de forma que a empresa Usina de Promoções de Eventos LTDA-ME, de propriedade de THIAGO, não possuía exclusividade de representação para todos os shows das duplas "Leandro & Fernando”, “Markos e Marcello” e “Roby & Roger". A exordial ainda descreve que, como as referidas duplas passam longe de apresentar grau de singularidade acima da média, tampouco possuem (ou possuíram) destaque junto à opinião pública, não há que se falar que são artistas consagrados, uma vez que são conhecidas apenas pelo público de determinada e específica região geográfica. Assim, segundo a denúncia, Antonio Alves da Silva, após prévio ajuste e com unidade de desígnios com THIAGO, inexigiu licitação fora das hipóteses previstos em Lei, sendo que Thiago Roberto Aparecido Marcelino Ferrarezi beneficiou-se da inexigibilidade ilegal para celebrar contrato com o Poder Público, dando azo à utilização irregular de R$100.000,00 em verbas federais. O juízo sentenciante absolveu os réus ao fundamento que, para caracterização do delito do art. 89 da Lei n. 8.666/93, é indispensável a “demonstração de dolo específico de causar dano ao erário, bem como o efetivo prejuízo causado à administração pública”, sendo que no caso dos presentes autos não restou suficientemente demonstrado “terem os réus causado efetivo prejuízo à administração pública” ao contratarem as duplas sertanejas mediante procedimento de inexigibilidade de licitação, previsto no art. 25, inciso III, da Lei n. 8.666/1993. Confira-se o excerto: “Determina o art. 37, XXI, da Constituição Federal (CF) que, ressalvados casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados pela Administração Pública mediante processo de licitação que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes. Como de domínio, a disciplina do processo licitatório é dada pela Lei 8.666/93, que estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Portanto, a regra geral é a de que a contratação de terceiros se dê mediante regular processo licitatório - art. 2º da Lei 8.666/93. A fim de resguardar os primados do processo licitatório, em especial, a igualdade entre os concorrentes e a escolha da proposta mais vantajosa para o ente público, a própria Lei 8.666/93 previu algumas figuras criminais - sem prejuízo de ilícitos de outras naturezas. Para o caso, interessa o tipo penal previsto no ar. 89 da Lei 8.666/93, que preconiza: Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade: Pena - detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa. Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público. As hipóteses de inexigibilidade, quando a Administração contrata com terceiro sem realização de prévia licitação, estão previstas no art. 25 da Lei 8.666/91, merecendo destaque para a hipótese do inciso III: Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial: III - para contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública. Pois bem. Conquanto a figura delitiva do art. 89 da Lei 8.666/91 não reclame qualquer resultado material, levando a crer tratar-se de crime formal, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmaram entendimento diverso, posicionando-se pela necessidade de demonstração de dolo específico de causar dano ao erário bem como o efetivo prejuízo causado à administração pública. Nesse sentido: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO (ARTIGO 89 DA LEI Nº 8.666/93). INÉPCIA DA DENÚNCIA. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DE DOLO ESPECÍFICO E DE EFETIVA LESÃO AO ERÁRIO. ART. 1º, I, DO DECRETO-LEI N. 201/67. APLICAÇÃO DA SÚMULA N. 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ. AGRAVO DESPROVIDO.1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, inaugurada com o julgamento da APn 480/MG pela Corte Especial, firmou o entendimento de que, para a configuração do delito tipificado no art. 89 da Lei n. 8.666/93, deve-se demonstrar, ao menos em tese, o dolo específico de causar dano ao erário bem como o efetivo prejuízo causado à administração pública, devendo tais elementos estarem descritos na denúncia, sob pena de ser considerada inepta.2. Quanto à conduta descrita no art. 1º, I (segunda parte), do Decreto-Lei n. 201/67, para desconstituir o entendimento firmado pelo Tribunal de origem, no sentido de que o agravado agia com dolo, tendo ciência das ilegalidades, seria necessário o revolvimento do conjunto fático-probatório, procedimento vedado pela Súmula n.7/STJ.3. Agravo regimental desprovido.(AgRg no REsp 1372728/BA, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 13/11/2018, DJe 22/11/2018) PENAL. PROCESSO PENAL. ARTIGO 89 DA LEI 8666/93. CONTRATAÇÃO POR DISPENSA DE LICITAÇÃO. DOLO. PREJUÍZO. AUSÊNCIA. ABSOLVIÇÃO MANTIDA.1. Para configuração do tipo penal mostra-se imprescindível a presença do dolo específico de causar dano ao erário bem como a comprovação do efetivo prejuízo à Administração Pública. Não restou comprovado o dolo específico de causar dano ao erário.2. A denúncia não apontou e nos autos não se constatou prejuízo ao erário público, ou seja, o valor auferido com a dispensa ou inexigibilidade da licitação. A conduta do agente somente se torna típica se houver dano à administração pública.3. Apelação desprovida. Sentença mantida. (TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 79037 - 0001169-41.2012.4.03.6124, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL MAURICIO KATO, julgado em 26/08/2019, e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/09/2019) No caso, tenho não estar suficientemente demonstrado nos autos terem os réus causado efetivo prejuízo à administração pública. Como dito, entre os vários objetivos do processo licitatório, tem-se a busca pela proposta mais vantajosa para o ente público, preservado mesmo na hipótese de inexigibilidade por inviabilidade competição (art. 25 da Lei 8.666/93). A punição criminal prevista no art. 89 da Lei 8.666/93 advém do emprego de ilícita hipótese de inexigibilidade visando a contratação de proposta desfavorável ao ente público, dando ensejo ao efetivo prejuízo à Administração Pública. Aqui não há prova suficiente de que a contratação das duplas sertanejas, por inexigibilidade de licitação, tenha produzido efetivo prejuízo à Administração Pública. É que a denúncia não refere e os autos não apontam que os valores despendidos para contratação de cada dupla eram superiores ao do mercado artístico - certamente, de duplas do mesmo nível consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública. A propósito, argumenta o MPF (fl. 726): "Ademais, diferentemente do alegado na defesa do acusado Antonio Alves, o prejuízo ao Erário decorreu da inserção da empresa Usina de Promoções de Eventos na intermediação da contratação das duplas sertanejas, acabando por certamente inflacionar demasiadamente nos valores dispendidos. Esse fato, inclusive, está comprovado através do próprio interrogatório prestado pelo acusado Antonio Alves, o que foi peremptório em afirmar que o preço de mercado dos shows era, em média, de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) a R$ 20.000,00 (vinte mil reais), o que é possível concluir, caso não houvesse empresa intermediadora, a Prefeitura iria gastar, no máximo, R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) na contratação das três duplas sertanejas, valor esse muito menor do que os R$ 100.000,00 (cem mil reais) que foram realmente despendidos" É certo que em rápida passagem no interrogatório o réu ANTÔNIO ALVES DA SILVA, ao responder às indagações do magistrado, disse vagamente que os shows das duplas sertanejas variavam entre quinze mil reais, vinte mil reais ou mesmo trinta mil reais. Entretanto, em passagem anterior do interrogatório, o réu havia dito que não se recordava quanto havia sido pago para cada dupla sertaneja que se apresentou no evento da cidade. Portanto, não me parece possível concluir que o réu tivesse ciência de que o valor pago para cada dupla sertaneja - que induvidosamente se apresentam no denominado 5º Rodeio Festival Show de Parapuã/SP - superava o preço do mercado artístico à época - bastava o MPF ter demonstrado que, em eventos diversos, as mesmas duplas receberam valores por apresentação inferiores ao caso aqui retratado. E para o corréu THIAGO ROBERTO A. M. FERRAREZI nada se indagou no interrogatório sobre o efetivo valor de mercado da apresentação de cada dupla sertaneja. Nesse quadro, ainda que o processo de inexigibilidade de licitação contenha vários vícios (tanto que houve reprovação da Prestação de Contas pelo Ministério do Turismo (fl. 224), não se questionando, entretanto, a inexigibilidade de licitação fundada nas impugnadas cartas de exclusividade apresentadas pela intermediadora dos artistas), passíveis de sanções próprias aos gestores, para fins criminais, não demonstrado o efetivo prejuízo à Administração Pública, impõe-se a absolvição por falta de provas (art. 386, VII, do CPP). “ Em suas razões de apelação, o Ministério Público Federal alega que a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) possui entendimento diametralmente oposto ao do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no sentido de que o crime previsto no art. 89 da Lei de Licitações é delito formal, que dispensa prova de dano ao Erário para a sua configuração, embora exija a necessidade de comprovar a intenção específica do agente de lesar o património público: (AP 971, Relator(a): EDSON FACHIN, Primeira Turma, julgado em 28-06-2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-217 DIVULG 10-10-2016 PUBLIC 11-10-2016); (AP 580, Relator(a): ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 13-12-2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-139 DIVULG 23-06-2017 PUBLIC 26-06-2017); (Inq 3674, Relator(a): LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 07-03-2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-209 DIVULG 14-09-2017 PUBLIC 15-09-2017). A sentença absolutória é de ser mantida. Não obstante divergência jurisprudencial apontada da 1ª Turma do STF, consoante entendimento pacificado no Superior Tribunal de Justiça, para a configuração do crime do art. 89 da Lei n. 8.666/93, é necessária a presença cumulativa do dolo específico de causar dano ao erário e a demonstração da efetiva ocorrência de prejuízo à Administração Pública, sob pena de a conduta ser considerada atípica: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. OPERAÇÃO RECICLAGEM. CRIMES DA LEI DE LICITAÇÕES. ARTS. 89 E 92 DA LEI N. 8.666/1993. INÉPCIA DA DENÚNCIA. AUSÊNCIA DE DESCRIÇÃO DOS ELEMENTOS TÍPICOS. DOLO ESPECÍFICO. ORDEM CONCEDIDA. TRANCAMENTO PARCIAL DA AÇÃO PENAL NA ORIGEM. AGRAVOS REGIMENTAIS DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL E DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL DESPROVIDOS. I - Conforme o entendimento jurisprudencial sedimentado nesta Corte Superior de Justiça, para a configuração dos delitos previstos nos arts. 89 e 92 da Lei n. 8.666/1993, é imprescindível que o Ministério Público aponte minimamente, na exordial acusatória, o dolo específico, consistente na vontade de causar dano ao erário, bem como demonstre o efetivo prejuízo causado à administração pública. Precedentes. II - Neste agravo regimental, não foram apresentados argumentos capazes de alterar o entendimento anteriormente firmado, devendo ser mantida a decisão impugnada por seus próprios e jurídicos fundamentos. Agravo regimental desprovido. (AgRg no AgRg no HC n. 607.605/SC, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 14/8/2023, DJe de 23/8/2023.) AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. DISPENSA E FRAUDE A LICITAÇÃO. TRANCAMENTO. PACIENTE RESPONSÁVEL PELA EMISSÃO DO PARECER FAVORÁVEL À DISPENSA DE LICITAÇÃO. DESCRIÇÃO DO INDISPENSÁVEL NEXO CAUSAL ENTRE A CONDUTA IMPUTADA E A OFENSA AO BEM JURÍDICO TUTELADO PELA NORMA PENAL. AUSÊNCIA. DEMONSTRAÇÃO DO VÍNCULO ENTRE O DENUNCIADO E OS DEMAIS CORRÉUS QUE PROCEDERAM DE FORMA INDEVIDA. INEXISTÊNCIA. ÓBICE AO EXERCÍCIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. DESCRIÇÃO DA INTENÇÃO DO AGENTE EM LESAR O ERÁRIO E O EFETIVO PREJUÍZO. AUSÊNCIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. INÉPCIA DA DENÚNCIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. 1. Esta Corte pacificou o entendimento de que o trancamento de ação penal pela via do habeas corpus é medida excepcional, cabível apenas quando demonstrada, de plano, a atipicidade da conduta, a extinção da punibilidade ou a manifesta ausência de provas da existência do crime e de indícios de autoria. 2. No caso, o Ministério Público Federal atribuiu ao acusado a conduta de colaborar para a formalização de contratos irregulares apenas pelo fato de ele ser o responsável pela emissão do parecer favorável às contratações imputadas de ilegais, deixando-se de se descrever o necessário nexo causal entre a conduta atribuída e a ofensa ao bem jurídico tutelado pela norma penal. 3. Sem a mínima menção à atuação ou contribuição do acusado na empreitada criminosa, imputou-se-lhe a ocorrência do fato delituoso, consubstanciando-se exclusivamente na função exercida por ele, situação que impossibilita o exercício do contraditório e da ampla defesa. 3. Não se demonstrou também de que forma a dispensa da licitação configurou o crime previsto no art. 89 da Lei nº 8.666/1993. Não ficou nítida na inicial acusatória a intenção do agente em lesar os cofres públicos, tampouco a ocorrência de prejuízo. Em outras palavras, não há, na inicial ofertada pelo Parquet, menção à ocorrência de dolo específico ou de dano ao erário. 4. Conforme entendimento pacificado nesta Corte, para a configuração do crime previsto no art. 89 da Lei nº 8.666/1993, devem ficar demonstradas a intenção dos agentes em lesionar os cofres públicos e a existência de dano ao erário (APn n. 480/MG, Relator p/ o acórdão Ministro Cesar Asfor Rocha, DJe 15/6/2012). 5. Agravo regimental provido para conceder ordem de habeas corpus para declarar a inépcia da inicial acusatória e, por conseguinte, a nulidade de todo o processo em relação ao paciente, ressalvada a possibilidade de oferecimento de nova denúncia com a correta individualização das ações a ele atribuídas, que efetivamente possam ter contribuído para a prática delituosa, ensejando, desse modo, o exercício da ampla defesa. (AgRg no RHC n. 171.110/BA, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 20/6/2023, DJe de 3/7/2023.) AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO (ART. 89 DA LEI N. 8.666/1993). NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DE DOLO ESPECÍFICO E DE EFETIVA LESÃO AO ERÁRIO. INÉPCIA DA DENÚNCIA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. 1. A denúncia oferecida pelo Ministério Público estadual destoa da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça que se orienta no sentido de que deve a denúncia descrever o dolo específico do agente de causar dano à Administração Pública, bem como o efetivo prejuízo ao erário, a fim de se caracterizar o delito previsto no art. 89 da Lei n. 8.666/1993, o que, in casu, não ocorreu. Precedentes do STF e STJ. 2. Inservível a denúncia que narra o dolo geral e aponta para a dispensa de licitação fora das hipóteses legais, não ficando evidenciado, no entanto, o dolo específico exigível ao tipo penal em questão, tampouco o efetivo prejuízo suportado pelo erário municipal. 3. No caso, embora o Ministério Público tenha demonstrado o envolvimento do paciente no processo de dispensa ou inexigibilidade ilegal, deixou de fazer referência à ocorrência de efetivo dano ao erário, limitando-se a indicar o valor total do aluguel pago pela prefeitura, sem, contudo, demonstrar eventual superfaturamento ou quanto daquele montante estaria fora dos padrões aceitáveis no mercado ou, ainda, se a contraprestação seria condizente com a cifra paga pelo município. 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 737.122/SP, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Sexta Turma, julgado em 24/4/2023, DJe de 27/4/2023.) PENAL. PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIME DO ART. 89 DA LEI N. 8.666/93. PLEITO ABSOLUTÓRIO. PRESENÇA DO DOLO ESPECÍFICO E DO DANO AO ERÁRIO. NECESSIDADE DO REEXAME DE PROVAS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Consoante jurisprudência desta Corte, para configuração do delito previsto no art. 89 d a Lei n. 8.666/93, é imprescindível, além do efetivo prejuízo causado à administração pública, o dolo específico, consistente na deliberada intenção de lesar o erário. No caso dos autos, as instâncias ordinárias apontaram o dolo específico do agente, além da existência de dano ao erário para manter a condenação, não destoando do entendimento desta Corte Superior. 2. Embora o Tribunal de origem tenha manifestado seu entendimento acerca da desnecessidade do dolo específico para configuração do delito, posteriormente, apontou circunstâncias que demonstraram o conluio dos acusados para realizar compras diretas de bens de valores elevados, sem observância do procedimento licitatório, gerando dano ao ente municipal. 3. Tendo as instâncias ordinárias constatado a autoria e a materialidade delitivas para configuração do delito previsto no art. 89 da Lei n. 8.666/93, a modificação do julgado demandaria o reexame das provas dos autos, providência vedada pela Súmula n. 7/STJ. 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no AREsp n. 2.197.334/SC, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 14/3/2023, DJe de 16/3/2023.) HABEAS CORPUS. PENAL. ART. 89 DA LEI N. 8.666/1993. DISPENSA DE LICITAÇÃO MEDIANTE FRACIONAMENTO DA CONTRATAÇÃO. DOLO ESPECÍFICO. INTENÇÃO DE LESAR A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. PREJUÍZO EFETIVO AO ERÁRIO. FALTA DE DEMONSTRAÇÃO. CONDUTA. ATIPICIDADE. EXTENSÃO DA ORDEM AOS CORRÉUS (ART. 580 C/C ART. 654, § 2º, AMBOS DO CPP). 1. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmada a partir do julgamento da APn n. 480/MG, a consumação do crime do art. 89 da Lei n. 8.666/1993 exige a demonstração do dolo específico, ou seja, a intenção de causar dano ao Erário e a efetiva ocorrência de prejuízo aos cofres públicos. 2. Hipótese em que o paciente, prefeito do município, foi condenado como incurso no art. 89 da Lei n. 8.666/1993, por ter, juntamente com os membros da comissão de licitação, fracionado o serviço de transporte escolar em vários roteiros para, considerando o valor isolado de cada uma das linhas, dispensar o processo licitatório, em desacordo com o que determina o art. 23, §§ 2º e 5º e art. 24, II, da Lei n. 8.666/1993. 3. Observa-se, contudo, a existência de condenação baseada no dolo genérico (dispensa ou inexigibilidade de licitação, fora das hipóteses legais, com o objetivo de direcionamento da contratação), o que, segundo a jurisprudência desta Corte, não é suficiente para sustentar o decreto condenatório. 4. A sentença não fez qualquer referência à existência de deliberada intenção de causar prejuízos à Administração Pública ou à efetiva ocorrência do dano. Ao contrário, o magistrado de primeiro grau reconhece que os serviços foram prestados e, ao afastar a conduta prevista no art. 1°, inciso I, do Decreto-Lei n. 201/67, afirma, categoricamente, inexistir nos autos provas suficientes para comprovar o dolo do denunciado de efetuar pagamentos aos contratados superiores aos ajustados, sem qualquer justificativa para tanto. 5. Ordem concedida para absolver o paciente Cesar Augusto de Freitas, com fundamento no art. 386, III, do Código de Processo Penal, da imputação da prática do crime previsto no art. 89 da Lei n. 8.666/1993, com extensão dos efeitos aos corréus Ronildo Vieira Maciel, Tereza Maria Lopes de Brito e Amarildo Bezerra Leite (art. 580 do CPP). Pedido de reconsideração da decisão que apreciou o pleito liminar prejudicado. Comunique-se, com urgência, ao Juízo da 37ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Caruaru/PE e à Primeira Turma do Tribunal de Justiça de Pernambuco. (HC n. 588.359/PE, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 8/9/2020, DJe de 14/9/2020.) AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. CRIME LICITATÓRIO (ART. 89 DA LEI N. 8.666/1993). NECESSIDADE DE INDICAÇÃO DE PREJUÍZO AO ERÁRIO E DOLO ESPECÍFICO. DENÚNCIA QUE CONTEMPLA TAIS REQUISITOS. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. A jurisprudência desta Corte Superior acompanha o entendimento do Pleno do Supremo Tribunal Federal (Inq n. 2.482/MG, julgado em 15/9/2011), no sentido de que a consumação do crime do art. 89 da Lei n. 8.666/1993 exige a demonstração do dolo específico, ou seja, a intenção de causar dano ao erário e a efetiva ocorrência de prejuízo aos cofres públicos, malgrado ausência de disposições legais acerca dessa elementar. 2. Considerando que da simples leitura da denúncia verificar-se, o fim especial de agir e o dano ao erário, não há ilegalidade a ser sanada. 3. Agravo regimental improvido. (AgRg no RHC n. 103.896/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 6/2/2020, DJe de 12/2/2020.) RECURSOS ESPECIAIS. PENAL. ART. 89 DA LEI N.º 8.666/1993. ART. 1º, INCISO I, DO DECRETO-LEI N.º 201/1967. DOLO ESPECÍFICO E PREJUÍZO AO ERÁRIO. COMPROVAÇÃO. NECESSIDADE. DEMONSTRAÇÃO. AUSÊNCIA. ABSOLVIÇÃO. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO ESPECIAL DE MARCOS ANDRÉ LIMA NOGUEIRA E LUIZ ALBERTO CARVALHO TORALDO PROVIDO, COM EXTENSÃO DOS EFEITOS. RECURSO ESPECIAL DE LUIZ FELIPE ROUX LIMA PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO. HABEAS CORPUS CONCEDIDO, DE OFÍCIO, A LUIZ FELIPE ROUX LIMA. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que a configuração dos delitos previstos no art. 89, caput e parágrafo único, da Lei n.º 8.666/1993 exige a demonstração da presença concomitante do dolo específico, consistente na deliberada intenção de lesar o erário, bem assim a efetiva ocorrência do dano ou prejuízo, não evidenciados, no caso concreto, pelas instâncias ordinárias. 2. O art. 1.º, inciso I, do Decreto-Lei n.º 201/1967 tipifica como crime a conduta de "apropriar-se de bens ou rendas públicas, ou desviá-los em proveito próprio ou alheio", o qual exige, para a sua configuração, a presença do dolo específico de enriquecimento ilícito. 3. Ainda que possa ter havido irregularidades no procedimento de contratação com dispensa de licitação, não se pode considerar como desvio de bens ou rendas públicas o pagamento da remuneração pactuada pelos serviços que foram efetivamente prestados, sem notícia de haver prejuízo ao erário público, mormente quanto tais máculas no procedimento não chegaram a configurar ilícito penal. 4. Recurso especial de MARCOS ANDRÉ LIMA NOGUEIRA E LUIZ ALBERTO CARVALHO TORALDO provido para absolvê-los da imputação de prática do crime do art. 89 da Lei n.º 8.666/1993, com extensão dos efeitos aos corréus JORGE PEREIRA NUNES, RENATA TOMAZ MAIA e ELDER DE MATTOS AZARA, na forma do art. 580 do Código de Processo Penal. Recurso especial de LUIZ FELIPE ROUX LIMA parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido, restabelecendo a sentença na parte em que o absolvera em relação ao crime do art. 1º, inciso I, do Decreto-Lei n.º 201/1967. Habeas corpus concedido, de ofício, a LUIZ FELIPE ROUX LIMA, a fim de absolvê-lo da acusação de ter cometido o delito do art. 89 da Lei n.º 8.666/1993. (REsp n. 1.799.355/RJ, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 28/5/2019, DJe de 5/6/2019.) PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INDEFERIMENTO LIMINAR. CRIME DE LICITAÇÃO. ART. 89 DA Lei 8.666/93. DOLO ESPECÍFICO. DIVERGÊNCIA NÃO COMPROVADA. SÚMULA 168/STJ. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. REGRA TÉCNICA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 315/STJ. PEDIDO DE CONCESSÃO DE HABEAS CORPUS. NÃO CABIMENTO. AGRAVO IMPROVIDO. 1. É exigível a presença do dolo específico de causar dano ao erário e a caracterização do efetivo prejuízo para que tipificado o crime previsto no artigo mencionado (art. 89 da Lei n. 8.666/1993) (AgRg no AREsp 1254177/MG, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 12/06/2018, DJe 22/06/2018). (...) 5. Agravo regimental improvido. (AgRg nos EAREsp n. 263.820/DF, relator Ministro Nefi Cordeiro, Terceira Seção, julgado em 24/10/2018, DJe de 30/10/2018.) PENAL. ARTIGO 89 DA LEI N.º 8.666/93. DISPENSA DE LICITAÇÃO. FALTA DE DEMONSTRAÇÃO DO DOLO ESPECÍFICO E DE PREJUÍZO AO ERÁRIO. NECESSIDADE. ENTENDIMENTO FIRMADO PELA CORTE ESPECIAL. RESSALVA DA RELATORA. DESCRIÇÃO INSUFICIENTE NA DENÚNCIA. NÃO ATENDIMENTO DO ART. 41 DO CPP. INÉPCIA. TRANCAMENTO. FALTA DE JUSTA CAUSA. MATÉRIA DE PROVA. 1. Nos autos da Ação Penal n.º 480/MG, a Corte Especial deste Sodalício acolheu, por maioria, a tese de ser imprescindível a presença do dolo específico de causar dano ao erário e a demonstração do efetivo prejuízo para a tipificação do crime previsto no artigo artigo 89 da Lei n. 8.666/1993. Ressalva do entendimento da relatora. 2. Na hipótese em apreço, a denúncia, sem atender às disposições do art. 41 do Código de Processo Penal, não descreve o dolo específico e nem o efetivo prejuízo, limitando-se à burla da licitação, sendo, pois, inepta. 3. De outra parte, o pretendido trancamento, por falta de justa causa, que depende da certeza da inexistência do elemento subjetivo e da total ausência de prejuízo, não está demonstrado sem maiores digressões, necessitando de revolvimento fático-probatório, não condizente a via eleita, mandamental por excelência. 4. Recurso parcialmente provido, apenas para anular a denúncia por inépcia, ressalvando a possibilidade de uma nova ser apresentada, desde que, dentro dos requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, seja demonstrado o doloe específico e o efetivo prejuízo aos cofres públicos. (RHC n. 36.562/SP, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 11/11/2014, DJe de 27/11/2014.) HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. DELITO PREVISTO NO ART. 89 DA LEI Nº 8.666/1993. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO DOLO ESPECÍFICO DE FRAUDAR O PROCEDIMENTO LICITATÓRIO E DE EFETIVO DANO AO ERÁRIO. CRIME DO ART. 1.º, INCISO II, DO DECRETO-LEI N.º 201/67. INÉPCIA DA DENÚNCIA. ORDEM DE HABEAS CORPUS CONCEDIDA. 1. A controvérsia relativa à caracterização do delito do art. 89 da Lei n.º 8.666/93 tem sido objeto de divergência tanto na doutrina quanto na jurisprudência, orientando-se este Tribunal Superior, inicialmente, no sentido de que o ilícito em questão constituiria crime de mera conduta, sendo dispensável, para a sua configuração, a existência do dolo específico de fraudar o erário ou do efeito prejuízo à Administração Pública. Precedentes. 2. Contudo, em recente julgado, a Corte Especial deste Superior Tribunal de Justiça, ao analisar hipótese semelhante à dos autos, assentou que, para a configuração do delito previsto no art. 89 da Lei de Licitações, é necessário demonstrar o dano causado ao erário, bem assim o dolo específico em produzir o resultado lesivo. Precedentes. 3. Na hipótese, não foram apresentados elementos suficientes para o enquadramento da conduta do Paciente no tipo penal em questão, decidindo o Tribunal a quo, portanto, em desconformidade com a orientação recentemente adotada por esta Corte. 4. Em relação ao delito previsto no art. 1.º, inciso II, do Decreto-Lei n.º 201/67, não restou demonstrado, em nenhum momento, na peça acusatória, que o Paciente teria se utilizado, indevidamente, em proveito próprio ou alheio, de bens, rendas ou serviços públicos. 5. Ordem de habeas corpus concedida para, reconhecendo a falta de justa causa, trancar a ação penal. (HC n. 190.782/BA, relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 11/12/2012, DJe de 17/12/2012.) No mesmo sentido, registro precedentes da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal: Ementa: AGRAVO INTERNO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME DE DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. ARTIGO 89 DA LEI 8.666/1993. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ARTIGO 5º, XXXIX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS 282 E 356 DO STF. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. PREJUÍZO E DOLO ESPECÍFICO COMPROVADOS. MATÉRIA DE ÍNDOLE INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA INDIRETA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 279 DO STF. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO. INEXISTÊNCIA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. (ARE 1108494 AgR, Relator(a): LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 31-08-2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-194 DIVULG 14-09-2018 PUBLIC 17-09-2018) Penal. Processo Penal. Ação penal originária. Deputado federal. Acusação da prática do art. 89 da Lei 8.666/93 (dispensa indevida de licitação), em duas oportunidades, em concurso material (art. 69 do CP). 2. Inépcia da denúncia. Art. 41 do Código de Processo Penal. O tipo do art. 89 da Lei 8.666/93 não menciona prejuízo à Administração ou finalidade específica. Denúncia apta. 3. Art. 89 da Lei 8.666/93. A jurisprudência interpreta o dispositivo no sentido de exigir o prejuízo ao erário e a finalidade específica de favorecimento indevido como necessários à adequação típica – INQ 2.616, relator min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno, julgado em 29.5.2014. 4. Licitação. Inexibilidade fora das hipóteses legais. ProJovem: qualificação profissional e desenvolvimento de ações comunitárias voltadas ao público-alvo do programa. Art. 25, II, combinado com art. 13, VI, da Lei 8.666/93 – serviços técnicos de treinamento e aperfeiçoamento de pessoal, de natureza singular, com empresa de notória especialização. Não foi documentada pesquisa de mercado que pudesse levar à conclusão de que não haveria outras entidades com capacidade de realizar o serviço na região, em condições iguais ou melhores. Justificativa retórica. Inexigibilidade fora das hipóteses legais comprovada. 5. Ausência de elementos levando a crer que o denunciado tinha intenção de desviar recursos ou, de qualquer forma, causar prejuízo ao erário. A estrutura do Convênio que não estimulava as administrações estaduais à economia. Secretário de Estado que recebeu de sua assessoria administrativa e jurídica pareceres pela conveniência, oportunidade e juridicidade da contratação. Ausência de elemento indicando que tenha pessoalmente influenciado a escolha ou que tenha relação com a contratada. Inexistência de prova suficiente de que o fato constitua infração penal. 6. Dispensa indevida de licitação. ProJovem. Ações de formação inicial e continuada de educadores na esfera do ProJovem Urbano. Licitação dispensada com base no art. 24, XIII, da Lei 8.666/93 – contratação de instituição brasileira incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional, ou de instituição dedicada à recuperação social do preso, desde que a contratada detenha inquestionável reputação ético-profissional e não tenha fins lucrativos. Atendimento aos requisitos legais. Fundação que participou da estruturação do Programa e da formação de formadores promovida pela Secretaria Nacional da Juventude. Parecer da Assessoria Jurídica apontava regularidade da contratação. Fato que não constituiu infração penal. 7. Denúncia julgada improcedente. (AP 683, Relator(a): GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 09-08-2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-041 DIVULG 03-03-2017 PUBLIC 06-03-2017) Inquérito. Competência criminal originária. Penal. Processo Penal. 2. Inépcia da denúncia. Peculato. Denúncia que descreve que desvio em proveito da administração. Descrição suficiente da finalidade. Denúncia apta. 3. Inépcia da denúncia. Inexigibilidade de licitação. Prejuízo à administração ou finalidade específica de favorecimento. Elementos não não mencionados no texto da lei. Construção jurisprudencial. Não é exigível que a petição inicial os descreva com minudência. Denúncia apta. 4. Art. 312, caput, do Código Penal (peculato desvio). O desvio de recursos para finalidades públicas não configura o crime de peculato. O proveito à administração pública não se enquadra no conceito de proveito próprio ou alheio exigido pelo tipo penal. Desclassificação para o art. 315 do CP. Pronúncia da prescrição da pretensão punitiva em abstrato. 5. Art. 89 da Lei 8.666/93 (inexigibilidade indevida de licitação). Prova da inexigibilidade fora das hipóteses legais. Indícios de autoria. 6. Necessidade de demonstração de prejuízo ao erário e da finalidade específica de favorecimento indevido. Secretária de Estado. Pareceres pela conveniência e oportunidade da licitação e pela juridicidade da contratação direta. Ausência de indicativo de influência na escolha ou relação com a contratada. Preponderância da prova no sentido da inexistência do propósito de causar prejuízo ou favorecer indevidamente. 7. Denúncia rejeitada. (Inq 3731, Relator(a): GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 02-02-2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-039 DIVULG 01-03-2016 PUBLIC 02-03-2016) Inquérito. 2. Competência originária. 3. Penal e Processual Penal. (...) 8. Art. 89 e parágrafo único da Lei 8.666/93. Dispensa indevida de licitação. Tipicidade. Indispensabilidade do elemento subjetivo consistente na intenção de causar dano ao erário ou obter vantagem indevida. Entendimento da maioria no sentido de que provada a inexistência do elemento subjetivo. 9. Decretação da extinção da punibilidade, pela prescrição da pretensão punitiva, quanto ao crime do art. 89 e parágrafo único da Lei 8.666/93, referente ao contrato 168/2001, celebrado em 2.7.2001, decisão unânime. Absolvição liminar dos denunciados quanto ao restante, vencida a relatora. (Inq 2688, Relator(a): CÁRMEN LÚCIA, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 02-12-2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-029 DIVULG 11-02-2015 PUBLIC 12-02-2015) A Corte Especial do STJ também concluiu que o crime do art. 89 da Lei 8.666/93 somente é punível quando demonstrado o resultado danoso ao erário, ou seja, o efetivo prejuízo à Administração: PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA E JURÍDICA ENTRE O ACÓRDÃO EMBARGADO E O ACÓRDÃO PARADIGMA. NÃO CONHECIMENTO. DISPENSA DE LICITAÇÃO. EXIGÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE DANO AO ERÁRIO. PREJUÍZO ADEQUADAMENTE DESCRITO NO ACÓRDÃO PROLATADO PELO TRIBUNAL A QUO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. I - A comparação de acórdãos para o fim de demonstrar a divergência jurisprudencial pressupõe similitude fática e jurídica entre os casos confrontados e a adoção de teses jurídicas distintas (Precedentes). II - Na hipótese, os acórdãos comparados versam sobre competências distintas, cuidando o paradigma de competência de natureza cível (ação de cobrança com interesse da União) e o acórdão embargado, de natureza criminal (desvio de verbas do FUNDEF), razão pela qual, nesse ponto específico, não poderá ocorrer a uniformização. III - É cediço que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e dessa Corte firmaram o entendimento no sentido de que se exige a demonstração de efetivo prejuízo ao erário para configuração do crime previsto no art. 89, da Lei n. 8.666/93 (Precedentes). IV - Contudo, a despeito de reconhecer a conduta do art. 89, da Lei n. 8.666/93 como crime de mera conduta, o que não mais se coaduna com a interpretação jurisprudencial predominante, o eg. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul apontou expressamente diversas irregularidades aptas a causar prejuízo ao erário do Município de Uruguaiana/RS, tudo a indicar o dolo de se beneficiar de dispensa irregular de licitação e se locupletar do erário público, o que justifica a manutenção da condenação imposta. Agravo regimental desprovido. (AgRg nos EAREsp n. 92.923/RS, relator Ministro Felix Fischer, Corte Especial, julgado em 6/5/2015, DJe de 25/5/2015.) AÇÃO PENAL. EX-PREFEITA. ATUAL CONSELHEIRA DE TRIBUNAL DE CONTAS ESTADUAL. FESTA DE CARNAVAL. FRACIONAMENTO ILEGAL DE SERVIÇOS PARA AFASTAR A OBRIGATORIEDADE DE LICITAÇÃO. ARTIGO 89 DA Lei N. 8.666/1993. ORDENAÇÃO E EFETUAÇÃO DE DESPESA EM DESCONFORMIDADE COM A LEI. PAGAMENTO REALIZADO PELA MUNICIPALIDADE ANTES DA ENTREGA DO SERVIÇO PELO PARTICULAR CONTRATADO. ARTIGO 1º, INCISO V, DO DECRETO-LEI N. 201/1967 C/C OS ARTIGOS 62 E 63 DA LEI N. 4.320/1964. AUSÊNCIA DE FATOS TÍPICOS. ELEMENTO SUBJETIVO. INSUFICIÊNCIA DO DOLO GENÉRICO. NECESSIDADE DO DOLO ESPECÍFICO DE CAUSAR DANO AO ERÁRIO E DA CARACTERIZAÇÃO DO EFETIVO PREJUÍZO. - Os crimes previstos nos artigos 89 da Lei n. 8.666/1993 (dispensa de licitação mediante, no caso concreto, fracionamento da contratação) e 1º, inciso V, do Decreto-lei n. 201/1967 (pagamento realizado antes da entrega do respectivo serviço pelo particular) exigem, para que sejam tipificados, a presença do dolo específico de causar dano ao erário e da caracterização do efetivo prejuízo. Precedentes da Corte Especial e do Supremo Tribunal Federal. - Caso em que não estão caracterizados o dolo específico e o dano ao erário. Ação penal improcedente. (APn n. 480/MG, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, relator para acórdão Ministro Cesar Asfor Rocha, Corte Especial, julgado em 29/3/2012, DJe de 15/6/2012.) PROCESSO PENAL. LICITAÇÃO. DISPENSA. DENÚNCIA. REJEIÇÃO. FALTA DE JUSTA CAUSA. 1. O entendimento dominante no Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o crime do art. 89 da Lei 8.666, de 1993, somente é punível quando produz resultado danoso ao erário. 2. Cabe realçar ainda que uma vez atestada a regularidade das contas e, ipso facto, da gestão, nela incluídas as transações envolvendo a necessidade ou dispensa de licitação, sob o exclusivo prisma do art. 89, não haverá justa causa para ação penal, quando nada, pela ausência do elemento mínimo culpabilidade que viabiliza seja alguém submetido a um processo criminal, dada a falta de probabilidade ainda que potencial de uma condenação. Não se pode deixar de lado o entendimento de que somente a intenção dolosa, tem relevância para efeito de punição. 3. Denúncia rejeitada. (Apn n. 375/AP, relator Ministro Fernando Gonçalves, Corte Especial, julgado em 5/4/2006, DJ de 24/4/2006, p. 340.) PROCESSO PENAL ? REJEIÇÃO DA DENÚNCIA ? DISPENSA DE LICITAÇÃO (ART. 89 LEI 8.666/93). 1. O tipo descrito do art. 89 da Lei de Licitação tem por escopo proteger o patrimônio público e preservar o princípio da moralidade, mas só é punível quando produz resultado danoso. 2. É penalmente irrelevante a conduta formal de alguém que desatente as formalidades da licitação, quando não há conseqüência patrimonial para o órgão público. 3. O dolo genérico não é suficiente para levar o administrador à condenação por infração à Lei de Licitações. 4. Prática de padronização de mobiliários ou equipamentos que não afasta a exigência de licitação, mas não se configura como crime, senão quando ocasiona dano ao erário. 5. Denúncia rejeitada. (Apn n. 261/PB, relatora Ministra Eliana Calmon, Corte Especial, julgado em 2/3/2005, DJ de 5/12/2005, p. 197.) Quanto ao ponto, registro ainda precedentes deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região: E M E N T A PENAL. PROCESSO PENAL. INEXIGIBILIDADE E DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. LEI N. 8.666/93, ART. 89, CAPUT E PARÁGRAFO ÚNICO. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. DISPENSA DE LICITAÇÃO (LEI N. 8.666/93, ART. 89). DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO. EXIGIBILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA PROVADAS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO DOLO ESPECÍFICO DA CONDUTA E DE DEMONSTRAÇÃO DO PREJUÍZO. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. O delito do art. 89 da Lei n. 8.666/93 se tipifica quando o agente “dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade”. Trata-se, portanto, de delito formal que dispensa resultado naturalístico para sua configuração. Não obstante, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça desabona a tipificação do fato abstraindo-se a intenção do agente de ocasionar dano à Administração Pública, o qual por essa razão seria pressuposto à tipificação (STF, Plenário, Inq. 2.688, Rel. p/ acórdão Min. Gilmar Mendes, j. 02.12.14; STF, Plenário, Inq. n. 2.616, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 29.05.14; STF, Inq. n. 3.077, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 29.03.12; STF, AP n. 527, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 16.12.10; STJ, AP n. 480, Rel. p/ acórdão Min. Cesar Asfor Rocha, j. 29.03.12). 2. No caso dos autos, há elementos bastante de materialidade e autoria das condutas, mas não restou satisfatoriamente demonstrada a especial finalidade de lesar o patrimônio público, tampouco a concretização de prejuízo ao erário. 3. Sentença de absolvição mantida por seus próprios fundamentos (CPP, art. 386, VII). 4. Apelação desprovida. (TRF 3ª Região, 5ª Turma, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 0001173-78.2012.4.03.6124, Rel. Desembargador Federal ANDRE CUSTODIO NEKATSCHALOW, julgado em 28/09/2021, DJEN DATA: 05/10/2021) E M E N T A PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA A LEI DE LICITAÇÕES. CORREIOS. ARTS. 89, 92 E 96, IV E V, DA LEI Nº 8.666/93. MATERIALIDADE. AUTORIA. DOLO. DOLO ESPECÍFICO. DOSIMETRIA DA PENA. PENA DE MULTA. ART. 99 DA LEI Nº 8.666/93. 1. Materialidade, autoria e dolo comprovados. 2. Não há que se falar em violação ao art. 155 do Código de Processo Penal, na medida em que essa conclusão deriva do cotejo do amplo conjunto probatório formado ao longo da persecução penal, inclusive a prova oral produzida em juízo. 3. O tipo penal descrito no art. 89 da Lei nº 8.666/1993 somente se perfaz caso comprovada a vontade do agente de causar dano ao erário e de impor prejuízo à administração, o que ocorreu no caso. Dolo específico demonstrado. 4. O dolo do administrador da empresa contratada pela empresa pública também ficou comprovado. As cláusulas do contrato eram de seu conhecimento, bem como que deveria cumprir as condições nele estabelecidas. (TRF 3ª Região, 11ª Turma, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 0011941-96.2006.4.03.6181, Rel. Desembargador Federal NINO OLIVEIRA TOLDO, julgado em 30/04/2021, DJEN DATA: 06/05/2021) HABEAS CORPUS. PENAL. PROCESSO PENAL. ART. 89, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 8.666/93. DISPENSA DE LICITAÇÃO. NECESSIDADE DE PROVA DO DOLO ESPECÍFICO DO CONTRATADO. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO AO ERÁRIO. DENÚNCIA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ORDEM CONCEDIDA. 1. O crime capitulado no art. 89, parágrafo único, da Lei 8.666/93 pune a conduta do particular que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal para celebrar contrato com o Poder Público. 2. No caso, a análise do contexto probatório não demonstra que a paciente agiu com dolo ao praticar o crime descrito na denúncia (art. 89, parágrafo único, da Lei 8.666/93). 3. Consoante entendimento do Superior Tribunal de Justiça, o crime do art. 89 da Lei 8.666/93 somente é punível quando comprovado o dolo específico do agente em causar dano à Administração Pública e produz resultado danoso ao erário, o que não restou evidenciado nos autos. 4. Ordem concedida. (TRF 3ª Região, 11ª Turma, HCCrim - HABEAS CORPUS CRIMINAL - 5005434-59.2020.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal JOSE MARCOS LUNARDELLI, julgado em 10/08/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 13/08/2020) E M E N T A PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. EXCEPCIONALIDADE. ART. 89. DA LEI Nº 8.666/93. DOLO ESPECÍFICO. DANO AO ERÁRIO. AUSÊNCIA. ORDEM CONCEDIDA. EXTENSÃO. 1. Paciente denunciada pela prática do crime capitulado no art. 89, caput, da Lei n° 8.666/93, porque teria ela dispensado indevidamente processo licitatório e/ou a formalização para a contratação direta de gêneros alimentícios e serviços de funilaria em transporte escolar no município de Cesário Lange/SP, com aplicação irregular de verbas federais repassadas ao respectivo município por meio do Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE e do Programa Nacional de Apoio ao Transporte Escolar – PNATE, cuja legitimidade para figurar no polo passivo da ação penal se justificaria porque, segundo ela própria declarou, em 2013, desde 1998 responde pela formalização das licitações do município. 2. O art. 89, caput, da Lei nº 8.666/93, por sua vez, prevê pena de detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa, para aquele que “[d]ispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade”, e, como tal, pela teoria da asserção e da posição funcional ocupada por anos pela paciente, haveria indícios suficientes de que as contratações irregulares levadas a efeito pela Prefeitura em questão, objeto da persecução penal em curso, não teriam sido feitas à sua revelia, mas, ao revés, contaram, ao que tudo indica, com a sua efetiva participação. 3. Tese defensiva consentânea com os mais recentes precedentes do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que o crime capitulado no art. 89, caput, da Lei de Licitações não é de mera conduta, mas exige o dolo específico do agente de causar dano ao erário, bem como prejuízo à Administração Pública. A propósito: STJ, HC - HABEAS CORPUS - 498748, Quinta Turma, Rel. Min. FELIX FISCHER, DJE DATA:06/06/2019; STJ, RESP 1799355, Sexta Turma, Rel. Min. LAURITA VAZ, DJE DATA:05/06/2019. 4. Os fatos tal como descritos na denúncia, à vista das peças do inquérito policial que instruem o writ, dão conta de não haver justa causa para a ação penal de origem, vez que, não obstante as irregularidades atestadas pela perícia contábil acostada aos autos, não há nem nela, nem na denúncia, a necessária descrição dos danos que teriam sido acarretados - consciente e voluntariamente - pela paciente à Administração municipal, ao proceder supostamente à indevida e reiterada dispensa de processos licitatórios e/ou formalização para a contratação direta de bens e serviços municipais. 5. Não há na denúncia nem na perícia contábil nenhum elemento - sequer indiciário - de que a paciente tenha agido com dolo específico de causar dano ao erário, tampouco demonstração do prejuízo que sua conduta teria causado aos cofres públicos. Trancamento da ação penal originária, por ausência de justa causa, com extensão a favor do corréu Ramiro de Campos, com fundamento no art. 580 do Código de Processo Penal. 6. Ordem concedida. (TRF 3ª Região, 11ª Turma, HC - HABEAS CORPUS - 5031922-22.2018.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal NINO OLIVEIRA TOLDO, julgado em 03/02/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 10/02/2020) PENAL. CRIMES DE LICITAÇÃO. ART. 89 (E SEU PARÁGRAFO ÚNICO) DA LEI Nº 8.666/1993 (EM SEIS OPORTUNIDADES). INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO PARA A CONTRATAÇÃO DE SHOWS DE ARTISTAS E/OU DE BANDAS EM EVENTOS PROMOVIDOS PELA PREFEITURA MUNICIPAL DE ILHA SOLTEIRA/SP. NECESSIDADE, PARA A CONFIGURAÇÃO TÍPICA, DA COMPROVAÇÃO DO DOLO ESPECÍFICO CONSISTENTE NA VONTADE DO SUJEITO ATIVO DE CAUSAR DANO AO ERÁRIO E DE PROMOVER EFETIVO PREJUÍZO À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. PROVA DOS AUTOS QUE NÃO DENOTA TAL ESPECIAL FIM DE AGIR. DÚVIDA RAZOÁVEL ACERCA DE COMO SE INTERPRETAR A EXPRESSÃO "ATRAVÉS DE EMPRESÁRIO EXCLUSIVO" CONSTANTE DO ART. 25, III, DA LEI Nº 8.666/1993. QUESTÃO DIRIMIDA PELO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO APENAS EM JANEIRO DE 2008. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DO ATUAR DOLOSO (INCLUSIVE ESPECÍFICO) DOS ACUSADOS. MANUTENÇÃO DA ABSOLVIÇÃO. - A presente relação processual penal foi instaurada tendo como panorama de fundo a celebração de 02 (dois) Convênios pela Prefeitura Municipal de Ilha Solteira/SP junto ao Ministério do Turismo (Governo Federal) com o escopo de viabilizar verbas para a realização de festividades que ocorreriam no município declinado nos idos de 2007, quais sejam, a "25ª Feira Agropecuária, Industrial e Comercial - FAPIC e a 27ª Festa do Peão de Boiadeiro" (Convênio nº 405/2007) e as "Festividades de Comemoração da Passagem de Final de Ano" (Convênio nº 732/2007). - A atual jurisprudência formada acerca do elemento subjetivo exigido para a caracterização do art. 89 da Lei nº 8.666/1993 firmou-se no sentido de exigir a presença do chamado dolo específico consistente na comprovação da vontade do sujeito ativo de causar dano ao erário e de promover efetivo prejuízo à administração pública, sob pena de, à míngua da demonstração de tais desideratos, a conduta ser considerada atípica pela ausência do elemento subjetivo específico. Entendimento do C. Supremo Tribunal Federal, do C. Superior Tribunal de Justiça e do C. Tribunal Regional Federal da 3ª Região. - Com ressalva de entendimento eventualmente diverso, tal posicionamento visa distinguir a conduta levada a efeito pelo administrador que se mostra inábil (não penalmente relevante) daquela perpetrada pelo administrador ímprobo (esta, sim, ensejadora da aplicação do Direito Penal como ultima ratio). - Adentrando ao caso dos autos, analisando o conjunto fático-probatório amealhado ao longo dos diversos cadernos processuais que compõem esse feito, nota-se a ausência de comprovação do necessário dolo específico para que as condutas perpetradas pelos acusados pudessem ser tipificadas no crime previsto no art. 89 da Lei nº 8.666/1993. - A questão jurídica que se põe guarda relação com a interpretação que deve ser dada ao comando contido no art. 25, III, da Lei nº 8.666/1993 (É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial: (...) III - para contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública (...)), especificamente no que concerne à locução "através de empresário exclusivo", no sentido de que tal expressão somente permitiria a contratação de profissional do setor artístico por meio de seu agente pessoal e exclusivo ou também poderia se dar por intermédio de agente que detivesse a exclusividade do show do artista para uma data predeterminada do calendário. - Para além de inferências passíveis de serem tecidas tendo como base a antiga Lei de Licitações (Decreto-Lei nº 2.300, de 21 de novembro de 1986) que, em seu art. 23, III, aduzia que a dispensa de licitação para a contratação de profissional do setor artístico somente poderia ocorrer diretamente com o artista ou por meio de empresário, ao passo que a Lei nº 8.666/1993 (revogadora do Decreto-Lei indicado) condicionou tal dispensa à contratação direta do profissional ou por meio de empresário exclusivo, fato é que a temática encontrava-se em aberto junto ao C. Tribunal de Contas da União até a prolação do v. acórdão nº 96/2008, o que ocorreu em sessão que se realizou em 30 de janeiro de 2008, de molde a não ser possível incriminar condutas (tais quais as constantes dos autos) se a Corte de Contas ainda não tinha firmado um entendimento ao tempo das licitações questionadas. - O E. Tribunal de Contas da União, em indicado precedente, estabeleceu obrigação ao Ministério do Turismo para que deixasse explícito em suas regras de prestação de contas afetas a convênios a impossibilidade de que a contratação de artistas com licitação inexigível ocorresse por meio de intermediário que detivesse apenas a exclusividade de representação para os dias em que os shows seriam executados, devendo, na realidade, que tal contratação fosse levada a efeito juntamente com pessoa que ostentasse a qualidade de empresário exclusivo por meio de contrato registrado em cartório. Ademais, outro julgado do C. Tribunal de Contas da União (v. acórdão nº 8244/2013, exarado em 19 de novembro de 2013) assentou entendimento segundo o qual se delimitou temporalmente a aplicabilidade do precedente firmado no início de 2008 a fim de que ele não retroagisse para certames pretéritos a tal data. - Portanto: (a) o disciplinamento das formalidades para fins de dispensa de licitação supedaneadas no art. 25, III, da Lei nº 8.666/1993, somente foi firmado em janeiro de 2008 (por meio da prolação do v. acórdão nº 96/2008 da lavra do C. Tribunal de Contas da União) e, partindo-se da constatação de que os fatos ora em julgamento remontam a datas pretéritas a tal marco temporal, impossível extrair repercussão penal a imputar a criminalização das condutas perpetradas pelos acusados haja vista sequer existir um entendimento pacificado acerca da matéria; e (b) a ausência de demonstração de que as licitações inexigidas teriam causado prejuízo ao erário (fundado, por exemplo, no superfaturamento das contratações ou no desvio de recursos públicos para finalidades outras que não o interesse público primário) também corrobora o não implemento do elemento subjetivo específico exigido pela jurisprudência no que tange ao crime previsto no art. 89 da Lei nº 8.666/1993. - Precedente deste C. Tribunal Regional Federal da 3ª Região. - Negado provimento ao recurso de Apelação interposto pelo Ministério Público Federal. (TRF 3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 78676 - 0001168-56.2012.4.03.6124, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, julgado em 30/01/2020, e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/02/2020) DIREITO PENAL. PROCESSO PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. DENÚNCIA. REJEIÇÃO. LICITAÇÕES. LEI 8.666/93. CRIME. DISPENSA INDEVIDA. ARTIGO 89. DOLO ESPECÍFICO. EXIGÊNCIA. JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA. AUSÊNCIA DE DESCRIÇÃO NA DENÚNCIA. PREJUÍZO AO ERÁRIO. AUSÊNCIA DE NARRATIVA CONCRETA. REJEIÇÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. 1. Recurso em sentido estrito interposto contra decisão de rejeição da denúncia. Imputação, a ex-prefeito municipal, de prática de condutas amoldadas ao art. 89 da Lei 8.666/93. Suposta contratação irregular e sem formalidade de profissional médico para atendimento junto aos munícipes. 2. É pacífico no âmbito do Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que o crime do art. 89 da Lei de Licitações ostenta natureza material, tipificando-se apenas em caso de lesão ao erário, bem como exige dolo específico para sua consumação (dolo de lesar o erário ou auferir benefício com a prática). No mesmo sentido, há precedentes do Supremo Tribunal Federal e deste TRF-3. Mesmo julgados do Pretório Excelso que dispensam a efetiva ocorrência de dano ao erário exigem a descrição efetiva do dolo específico, tratando-se tal ponto, pois, de exigência pacífica dos Tribunais Superiores. 3. A ratio decidendi, como bem explicado nos precedentes, é diferenciar com clareza a esfera das irregularidades e equívocos político-administrativos, e a seara estrita e especificamente criminal nos casos de contratações públicas. 4. No contexto em exame, tem-se denúncia a partir da qual não se infere, nem mesmo em tese, a ocorrência de dolo específico. O fato envolveu a contratação de profissional da área de saúde para atuação em equipamento público dessa mesma área. O médico efetivamente prestou os serviços de saúde pelos quais foi remunerado. Isso, somado à ausência de elementos caracterizadores de enriquecimento ilícito, torna forçosa a conclusão, com base na denúncia, de que não há elementos no sentido de haver fraude para obtenção de qualquer proveito econômico. 5. Não há elemento nos autos ou mesmo argumentação na exordial que demonstre que os atos adotados pelo alcaide se revestiam do especial fim de agir consistente na lesão aos cofres públicos. 6. Além desse fundamento central, destaque-se que, a rigor, dificilmente cabe falar - nem sequer em tese - em fraude a licitações, ante o simples fato de que não se trata da contratação de obras ou de serviços específicos, mas sim de verdadeira contratação para prestação de serviços por um período de tempo junto a serviços públicos permanentes do Município. Tem-se aqui, portanto, não uma licitação, mas uma contratação de agente público, mais especificamente, de pessoa para exercício, em tese, de função pública, assim entendido o vínculo que, não caracterizado como de cargo ou emprego público, junge determinados profissionais, por períodos de tempo, à Administração Pública. A contratação temporária para exercício de função pública na área de saúde (em caso de urgência e necessidade concretas) é, em tese, admissível, e não se transmuda, em sua natureza jurídica, pela (grave) irregularidade de se proceder a uma contratação sem observância dos procedimentos cabíveis. 7. Inexistindo descrição concreta e suficiente dos elementos necessários à configuração concreta dos crimes imputados na denúncia, constata-se sua inépcia, sendo de rigor a manutenção da decisão recorrida. 8. Recurso em sentido estrito desprovido. (TRF 3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, RSE - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - 8853 - 0013213-71.2015.4.03.6000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI, julgado em 07/11/2019, e-DJF3 Judicial 1 DATA:25/11/2019) PENAL. PROCESSO PENAL. ARTIGO 89 DA LEI 8666/93. CONTRATAÇÃO POR DISPENSA DE LICITAÇÃO. DOLO. PREJUÍZO. AUSÊNCIA. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. 1. Para configuração do tipo penal mostra-se imprescindível a presença do dolo específico de causar dano ao erário bem como a comprovação do efetivo prejuízo à Administração Pública. Não restou comprovado o dolo específico de causar dano ao erário. 2. A denúncia não apontou e nos autos não se constatou prejuízo ao erário público, ou seja, o valor auferido com a dispensa ou inexigibilidade da licitação. A conduta do agente somente se torna típica se houver dano à administração pública. 3. Apelação desprovida. Sentença mantida. (TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 79037 - 0001169-41.2012.4.03.6124, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL MAURICIO KATO, julgado em 26/08/2019, e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/09/2019) REVISÃO CRIMINAL. INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 621 E 626, DO CPP. DA TIPIFICAÇÃO DA CONDUTA IMPUTADA AO AUTOR - ARTIGO 1°, I, DO DECRETO-LEI 201/1967. DA NÃO CONFIGURAÇÃO DO ALEGADO BIS IN IDEM CONFLITO APARENTE DE NORMAS. DECRETO-LEI 201/67 E LEI 8.666/93. DO DELITO DO ARTIGO 89, DA LEI 8.666/93 - COMPROVAÇÃO DO DANO AO ERÁRIO E DO DOLO ESPECÍFICO CONSISTENTE NA INTENÇÃO DE CAUSAR DANO AO ERÁRIO. DOS DOCUMENTOS NOVOS TRAZIDOS PELO AUTOR NA REVISÃO CRIMINAL. DEPOIMENTO PRESTADO POR TESTEMUNHA. DECISÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO. DA DOSIMETRIA DA PENA. (...) VII.Para a configuração do delito do artigo 89, da Lei 8.666/93, é preciso o "dolo específico", entendido como a intenção de causar dano ao erário, e a efetiva ocorrência de prejuízo aos cofres públicos. Apesar de o acórdão embargado não ter feito menção à expressão "dolo específico", ele deixa claro que houve a intenção de causar dano ao erário, dano este consubstanciado no prejuízo aos cofres públicos, o qual corresponde ao desvio das verbas públicas em "favorecimento à empresa ISOCRET". Por conseguinte, não há que se falar em nulidade tampouco em contrariedade à evidência dos autos, no particular, eis que a decisão impugnada pelo requerente encontra-se devidamente fundamentada e amparada na prova processual, tendo evidenciado que houve a intenção de ("dolo específico") causar dano ao erário, dano este consubstanciado no prejuízo aos cofres públicos decorrente do favorecimento à empresa ISOCRET. (TRF 3ª Região, QUARTA SEÇÃO, RvC - REVISÃO CRIMINAL - 1233 - 0006787-64.2016.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL CECILIA MELLO, julgado em 20/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/11/2016 ) PENAL. PROCESSUAL PENAL. AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA. AQUISIÇÃO DE PRODUTOS DE EMPRESAS NÃO VENCEDORAS DE CERTAME LICITATÓRIO, OU POR VALOR SUPERIOR AO ESTABELECIDO NA LICITAÇÃO, SEM FORMALIZAÇÃO DE PROCESSO DE DISPENSA OU INEXIGIBILIDADE. AQUISIÇÃO DE PRODUTOS NAS MESMAS CONDIÇÕES DE PREÇOS E PRAZOS, CONSTANTES DE CONTRATO EXPIRADO, SEM A DEVIDA FORMALIZAÇÃO DE TERMO ADITIVO OU DE NOVO PROCESSO DE LICITAÇÃO. INTERPRETAÇÃO DOS ARTIGOS 89 E 92 DA LEI N. 8.666/93. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE DOLO ESPECÍFICO E DE DANO AO ERÁRIO PARA CONFIGURAÇÃO DOS DELITOS. FATOS QUE NÃO CONSTITUEM INFRAÇÃO PENAL. ABSOLVIÇÃO. ARTIGO 386, INCISO III, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. (...) - Em consideração a mudança de compreensão acerca do tema nos Tribunais Superiores, passou-se a entender que, "para a tipificação do crime previsto no artigo 89, da Lei n. 8.666/1993, é necessária a comprovação do dolo específico de causar dano ao erário e a caracterização do efetivo prejuízo à Administração Pública, não sendo suficiente apenas a vontade de desobedecer às normas legais do procedimento licitatório" (STJ, 5ª Turma, AGREsp 1.199.871, rel. Ministra Regina Helena Costa, DJE de 14.5.2014). - À luz dos elementos típicos exigidos atualmente, carece a denúncia, in casu, da necessária descrição da conduta quanto ao dolo específico dos acusados, ausente menção à intenção do prefeito e demais agentes de causar dano ao erário e a efetiva ocorrência de prejuízo aos cofres públicos. - A comprovação da ausência do prejuízo para a Administração Pública, em relação às aquisições de gêneros alimentícios das empresas Prontinho Indústria e Comércio Ltda. e Maria Cristina Fernandes de Matos Zoccal ME, decorre da realização de prévia cotação de preços pelo telefone, denotando que a finalidade das compras era fornecer merenda às creches municipais. (...) (TRF 3ª Região, ORGÃO ESPECIAL, APN - AÇÃO PENAL - 462 - 0002731-90.2009.4.03.6124, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL THEREZINHA CAZERTA, julgado em 27/07/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/08/2016 ) No caso em tela, para a contratação dos artistas que iriam se apresentar no 5º Rodeio Festival Show de Parapuã/SP, a Prefeitura Municipal de Parapuã/SP contratou a empresa Usina de Promoções de Eventos Ltda., por meio do Processo de Inexigibilidade de Licitação n. 001/2010, justificando-a com base no Art. 25, inciso III, da Lei 8.666/93. Para comprovar a suposta exclusividade foram apresentados os “atestados de exclusividade”: a) Atestado de exclusividade, datado de 09/12/2009, que atesta que a empresa que a Usina de Promoções de Eventos Ltda., representada pelo Sr. Thiago Roberto Aparecido Marcelino Ferrarezzi, “detém a exclusividade do show da Dupla Sertaneja 'Leandro e Fernando’ que se apresentará no dia 08 de janeiro de 2010 (Sexta Feira) na cidade de Parapuá-SP, com apresentação na 5ª Festa do Peão de Boiadeiro de Parapuã, detendo única e exclusivamente por local de apresentação Recinto de Festa” (id 203913236, pág. 11); b) Carta de exclusividade, datada de 09/12/2009, que atesta que a empresa que a Usina de Promoções de Eventos Ltda., representada pelo Sr. Thiago Roberto Aparecido Marcelino Ferrarezzi, “detém a exclusividade para a realização de 01 ( UM ) show artístico com a dupla Markos e Marcello no dia 09 de Janeiro de 2010, na cidade de Parapuã no estado de São Paulo” (id 203913236, pág. 13); c) Atestado de exclusividade, datado de 08/12/2009, que atesta que a empresa que a Usina de Promoções de Eventos Ltda., representada pelo Sr. Thiago Roberto Aparecido Marcelino Ferrarezzi, “detém a exclusividade do show da Dupla Sertaneja 'Roby e Roger’ que se apresentará no dia 10 de janeiro de 2010 (Domingo) na cidade de Parapuã-SP, com apresentação na 5ª Festa do Peão de Boiadeiro de Parapuã, detendo única e exclusivamente por local de apresentação Recinto de Festa” (id 203913236, pág. 15). Como se observa, é incontroverso que a empresa Usina de Promoções de Eventos Ltda, administrada por THIAGO, não detinha contrato de exclusividade com os artistas. A mera carta de exclusividade que concede exclusividade apenas para dia e local específico, não é suficiente para autorizar a hipótese de inexigibilidade de licitação do art. 25, inciso III, da Lei nº 8.666/93. Ademais, os mencionados artistas não são consagrados pela opinião pública e não apresentam grau de singularidade profissional a ponto de justificar a contratação pela modalidade inexigibilidade da licitação, ocorrendo a infringência do art. 25, III, da Lei n. 8.666/93. O próprio acusado ANTONIO afirmou em seu interrogatório judicial que conhecia apenas a dupla Rob e Roger da cidade de Parapuã, que outra dupla tinha um integrante casado com uma moça de Parapuã, e o acusado não conhecia a terceira dupla, que havia sido indicada por um assessor de imprensa que tem o apelido de "Babu". Não obstante, conforme demonstrado acima, consoante jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, para a configuração do crime descrito no art. 89 da Lei n. 8.666/93, é necessária a presença concomitante do dolo específico, consistente na deliberada intenção de lesar o erário, e da efetiva ocorrência do dano ou prejuízo à Administração Pública. O Ministério Público Federal alega em suas razões de apelação que a inexigibilidade de licitação teria acarretado efetivo prejuízo ao Erário. Aduz que o prejuízo ao erário decorreu da intermediação da empresa do corréu Thiago na contratação das duplas sertanejas, pois teria acabado por inflacionar os valores dispendidos. No caso em tela, não há prova do efetivo prejuízo à Administração Pública. Conforme ponderado pelo juízo sentenciante, “a denúncia não refere e os autos não apontam que os valores despendidos para contratação de cada dupla eram superiores ao do mercado artístico - certamente, de duplas do mesmo nível consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública.” Com efeito, a Acusação não demonstrou que essas mesmas duplas tenham recebido valores inferiores por apresentação em eventos diversos. O acusado ANTONIO afirmou em seu interrogatório não saber o valor de mercado das duplas que se apresentaram no Rodeio, acreditando que, na época, os shows de duplas sertanejas variavam entre quinze mil reais, vinte mil reais ou mesmo trinta mil reais. O acusado THIAGO não foi questionado sobre os valores pagos a cada dupla sertaneja. Ademais, consoante Processo de Inexigibilidade de Licitação nº 001/2010, o objeto era não apenas a contratação de shows artísticos, mas também o fornecimento e montagem de estrutura para realização dos eventos, em conformidade com convênio celebrado junto ao Ministério do Turismo (id 203913236, pág, 33/35). Conforme depoimento da testemunha de acusação Samir Alberto Permoniam, que à época dos fatos ocupava o cargo de vice-prefeito de Parapuã-SP, todas as duplas compareceram e tocaram e, em razão dos recursos federais, a estrutura montada foi muito boa, com a existência de palco etc. Ressalte-se, por fim, que o parecer jurídico elaborado pela assessoria judicia da Prefeitura Municipal de Parapuã foi favorável à inexigibilidade de licitação, nos termos do artigo 25, III, da Lei n. 8.666/93, ao ponderar que a empresa contratante possui “carta de exclusividade” dos artistas em questão, conforme reza a legislação vigente, e que os preços dos shows estão condizentes com os praticados no mercado (id 203913236, pág. 46/47). Quanto ao ponto, registro que, conforme entendimento do STF, a inexigibilidade da licitação fundada em parecer jurídico lavrado idoneamente pelo órgão competente descaracteriza o crime por ausência de dolo, quando não demonstrado conluio na elaboração do parecer: Ementa: PENAL. DENÚNCIA. CRIME DE INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO FORA DAS HIPÓTESES LEGAIS OU EM INOBSERVÂNCIA DAS FORMALIDADES PERTINENTES. ART. 89 DA LEI 8.666/93. CELEBRAÇÃO DE TERMO DE PARCERIA ENTRE MUNICIPALIDADE E OSCIP NO ÂMBITO DA SECRETARIA DE SAÚDE. PARECER JURÍDICO DA PROCURADORIA-GERAL DO MUNICÍPIO NO SENTIDO DA INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO. ERRO QUANTO A ELEMENTO CONSTITUTIVO DO TIPO. CRIME FORMAL: DISPENSA-SE O RESULTADO DANOSO, MAS NÃO A DESCRIÇÃO DE AÇÃO FINALISTICAMENTE VOLTADA À LESÃO DO PATRIMÔNIO PÚBLICO. DISTINÇÃO ENTRE ILÍCITO ADMINISTRATIVO E PENAL. CONCURSO DE AGENTES. DISTINÇÃO ENTRE COAUTORIA E AUTORIA COLATERAL: NECESSIDADE DO ACORDO SUBJETIVO ENTRE COAUTORES E PARTÍCIPES, VOLTADO À CONSECUÇÃO COMUM DA PRÁTICA CRIMINOSA. JUSTA CAUSA NÃO CONFIGURADA. DENÚNCIA REJEITADA. 1. O Direito Penal constitui a ultima ratio legis quanto às condutas humanas, por isso que deve incidir somente quando indispensável para a manutenção da ordem jurídica, posto inexistir norma jurídica para controlar e sancionar ações que violem expectativas normativas de maior intensidade. 2. Os princípios que regem a Administração Pública, insculpidos na lei maior, recebem distintos graus de proteção do ordenamento, razão pela qual a violação dos mesmos nem sempre constitui ilícito jurídico penal. 3. O agir administrativamente ilícito distingue-se do agir criminoso previsto no tipo penal do art. 89 da Lei 8.666/93 à luz de três critérios cunhados a partir da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a saber: (i) a inexigibilidade da licitação fundada em parecer jurídico lavrado idoneamente pelo órgão competente descaracteriza o crime (Precedentes: Inq. 2482, Tribunal Pleno, Rel. p/ acórdão Min. Luiz Fux; Inq. 3731, Segunda Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes; AP 560, Segunda Turma, Rel. Min. Dias Toffoli); (ii) o especial fim de lesar o erário ou promover enriquecimento ilícito dos acusados é de rigor para configurar a infração penal (Precedentes: Inq. 3.965, Segunda Turma, Rel. Min. Teori Zavascki; AP 700, Segunda Turma, Rel. Min. Dias Toffoli; Inq. 3.731, Segunda Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes; dentre outros); (iii) o vínculo subjetivo entre os agentes no concursus delinquentium deve ser minuciosamente descrito para fins de imputabilidade (AP 595, Primeira Turma, Rel. Min. Luiz Fux). 4. (i) O parecer jurídico do órgão técnico especializado, favorável à inexigibilidade, impede a tipificação criminosa da conduta, precisamente por afastar, a priori, a ciência da ilicitude da inexigibilidade e determina o erro do agente quanto a elemento do tipo, qual seja, a circunstância “fora das hipóteses legais” (art. 20 do Código Penal). (ii) A distinção do ilícito administrativo (ato de improbidade) do ilícito penal (ato criminoso) reclama que a exordial acusatória narre a ação finalística do agente, voltada à obtenção de vantagem indevida por meio da dispensa da licitação, violando, com isto, o bem jurídico penal protegido pelo tipo incriminador; (iii) A imputação do crime definido no art. 89 da Lei 8.666/93 a uma pluralidade de agentes demanda a descrição indiciária, na exordial acusatória, do vínculo subjetivo entre os participantes, para a obtenção do resultado criminoso; (iv) O concurso de agentes caracteriza-se pelo liame subjetivo entre coautores ou partícipes na prática criminosa comum, configurado pelo mútuo acordo evidenciado seja por prova oral, seja pelo iter criminis ou por outros elementos reunidos no curso da investigação; (v) Distingue-se, dogmaticamente, a coautoria da denominada Autoria Colateral, que se define pela ausência de vínculo subjetivo entre vários agentes, que, simultaneamente, produzem um resultado típico – em regra culposo, como, v. g., em delitos de trânsito; (vi) a ausência de elementos indiciários do conluio entre os agentes obsta a caracterização da justa causa para o recebimento da denúncia que impute prática criminosa em coautoria ou participação. 5. In casu, (i) o Acusado, então Prefeito de Três Rios, firmou Termo de Parceria com Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, mediante procedimento de inexigibilidade de licitação, à luz do parecer jurídico da Procuradoria-Geral do Município, razão pela qual o órgão do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro em atuação perante o Tribunal de Justiça daquela unidade da Federação manifestou-se pela inexistência de justa causa para imputação do crime definido no art. 89 da Lei 8.666/93, que restou incluído na denúncia oferecida pelo órgão de primeiro grau, sendo certo que esta questão não foi apreciada, porquanto o feito sofreu o deslocamento da competência por força do fim do mandato do Prefeito; (ii) a denúncia não descreveu eventual finalidade do Acusado de obter proveito ilícito, em detrimento do erário, por meio da parceria firmada com a OSCIP e a investigação não coligiu elementos quanto à forma de emprego dos recursos públicos destinados à execução da parceria, inexistindo menção a qualquer indício de superfaturamento ou de desvios, sendo certo que os serviços foram efetivamente prestados, não se tratando dos denominados “servidores fantasmas”; (iii) deveras, a investigação não reuniu elementos indicativos do mútuo acordo entre os agentes para a execução da empreitada criminosa em comum, omitindo-se na descrição da existência de liame subjetivo entre os acusados na comissão do crime, que se imputou, em concurso de agentes, ao ex-Prefeito, ao ex-Secretário de Saúde e ao então Presidente da PROMUR; (iv) Consectariamente, não mencionou a existência sequer de um indício de atuação conjunta, de vínculo pessoal ou de ajuste entre os acusados, para afastarem a licitação e obterem o proveito da empreitada criminosa; (v) a denúncia indica que o Termo de Parceria teria se destinado à contratação direta de mão-de-obra voltada à área fim, e que deveria ser contratada mediante concurso público, além da afirmação de que parte dos prestadores de serviços contratados no âmbito da parceria não tinha qualquer relação com a área de saúde; (vi) a supervisão da execução da parceria não cabia ao Prefeito, mas ao Secretário de Saúde, Sr. Walter Luiz Ribeiro Lavinas, que firmou o Termo de Parceria “indicado pelo Município como Supervisor” (fls. 90 do Apenso 2); (vii) a denúncia não esclareceu, minimamente, se os prestadores de serviços de áreas distintas da saúde foram contratados no âmbito do Termo de Parceria indigitado na exordial ou no âmbito de outras parcerias, sendo certo que na lista constam psicólogos, médicos, auxiliares de laboratório, técnicos em radiologia, médicos em radiologia e protéticos contratados ao longo dos serviços prestados, profissionais definitivamente vinculados à área específica (fls. 140/141 do Apenso 2). (viii) Consequentemente, impõe-se a conclusão de que a inicial acusatória falhou em demonstrar, minimamente, que o Prefeito, ao firmar o Termo de Parceria com a PROMUR, no âmbito da Secretaria de Saúde, e seus respectivos Termos Aditivos, teria também autorizado a contratação de prestadores de serviços de outras áreas, para o exercício de atividades fins exclusivas de servidores públicos. 6. À míngua de elementos que confiram suporte probatório à instauração de ação penal, pela prática do crime definido no art. 89 da Lei 8.666/93, deve-se rejeitar a denúncia. 7. Denúncia rejeitada, nos termos do art. 395, III, do Código de Processo Penal. (Inq 3674, Relator(a): LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 07-03-2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-209 DIVULG 14-09-2017 PUBLIC 15-09-2017) Ementa: PENAL E PROCESSO PENAL. INQUÉRITO. INÉPCIA DA DENÚNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. OBSERVÂNCIA DOS ARTIGOS 41 E 395 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. IMPUTAÇÃO DOS CRIMES TIPIFICADOS NOS ARTIGOS 89 E 92 DA LEI 8.666/1993 E NO ARTIGO 312, § 1º, DO CÓDIGO PENAL. EXISTÊNCIA DE PROVA DA MATERIALIDADE E INDÍCIOS DE AUTORIA. DENÚNCIA RECEBIDA. 1. Não é inepta a denúncia que expõe de forma compreensível e coerente os fatos e todos os requisitos exigidos, permitindo ao acusado a compreensão da imputação e, consequentemente, o pleno exercício do seu direito de defesa, como exigido por esta Corte (AP 560, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, DJe de 11/6/2015; INQ 3204, Rel. Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, DJe de 3/8/2015). 2. Além da presença dos requisitos do art. 41 do CPP, está presente a “justa causa” para a ação penal (CPP, art. 395, III), analisada a partir de seus três componentes – tipicidade, punibilidade e viabilidade –, de maneira a garantir a presença de um “suporte probatório mínimo a indicar a legitimidade da imputação e se traduz na existência, no inquérito policial ou nas peças de informação que instruem a denúncia, de elementos sérios e idôneos que demonstrem a materialidade do crime e de indícios razoáveis de autoria” (Inq. 3.719, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, DJe de 30/10/2014). 3. A alegação de ausência do dolo, na fase de recebimento da denúncia, só pode ser acolhida quando for demonstrável ictu oculi, conforme reiterados pronunciamentos desta Suprema Corte (Inq. 3.331, Rel. Min. EDSON FACHIN, Primeira Turma, DJe de 4/4/2016; Inq. 3672, Rel. Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, DJe de 14/10/2014; Inq. 3344, Rel. Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, DJe de 27/8/2014; Inq. 2126, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Pleno, DJe de 26/4/2007). 4. O fato de a dispensa de licitação e do aditamento do contrato terem sido precedidos de parecer jurídico não é suficiente para afastar o dolo quando há indícios que apontam para a existência de desvio de finalidade ou de conluio com o parecerista, a sinalizar para a plena consciência do agente acerca da ilegalidade da dispensa licitatória e da modificação contratual perpetradas. Presença, nos autos, de prova da materialidade e de indícios de autoria da prática dos crimes dos arts. 89, caput, e 92, caput, da Lei de Licitações. 5. O pagamento antecipado, ao arrepio da lei, da totalidade do valor de aditivo contratual celebrado irregularmente, poucos dias após a sua assinatura e antes de realizadas as obras públicas objeto do liame jurídico-administrativo, permite a formulação inicial de um juízo positivo de tipicidade do crime de peculato-desvio, previsto no art. 312, caput, segunda parte, do Código Penal, o que também autoriza o recebimento da denúncia, no ponto. 6. Denúncia integralmente recebida. (Inq 3621, Relator(a): ROSA WEBER, Relator(a) p/ Acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 28-03-2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-138 DIVULG 22-06-2017 PUBLIC 23-06-2017) Ementa: PROCESSO PENAL. INQUÉRITO. ENVOLVIMENTO DE PARLAMENTAR FEDERAL. CRIME DE DISPENSA IRREGULAR DE LICITAÇÃO (ART. 89 DA LEI Nº 8.666/93). AUDIÇÃO PRÉVIA DO ADMINISTRADOR À PROCURADORIA JURÍDICA, QUE ASSENTOU A INEXIGIBILIDADE DA LICITAÇÃO. AUSÊNCIA DO ELEMENTO SUBJETIVO DOLO. ART. 395, INCISO III, DO CPP. INEXISTÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A AÇÃO PENAL. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA. 1. A denúncia ostenta como premissa para seu recebimento a conjugação dos artigos 41 e 395 do CPP, porquanto deve conter os requisitos do artigo 41 do CPP e não incidir em nenhuma das hipóteses do art. 395 do mesmo diploma legal. Precedentes: INQ 1990/RO, rel. Min. Cármen Lúcia, Pleno, DJ de 21/2/2011; Inq 3016/SP, rel. Min. Ellen Gracie, Pleno, DJ de 16/2/2011; Inq 2677/BA, rel. Min. Ayres Britto, Pleno, DJ de 21/10/2010; Inq 2646/RN, rel. Min. Ayres Britto, Pleno, DJ de 6/5/010. 2. O dolo, consubstanciado na vontade livre e consciente de praticar o ilícito penal, não se faz presente quando o acusado da prática do crime do art. 89 da Lei nº 8.666/93 (“Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade”) atua com fulcro em parecer da Procuradoria Jurídica no sentido da inexigibilidade da licitação. 3. In casu, narra a denúncia que o investigado, na qualidade de Diretor da Secretaria Municipal de Esportes e Lazer, teria solicitado, mediante ofício ao Departamento de Controle e Licitações, a contratação de bandas musicais ante a necessidade de apresentação de grande quantidade de bandas e grupos de shows musicais na época carnavalesca, sendo certo que no Diário Oficial foi publicada a ratificação das conclusões da Procuradoria Jurídica, assentando a inexigibilidade de licitação, o que evidencia a ausência do elemento subjetivo do tipo no caso sub judice, tanto mais porque, na área musical, as obrigações são sempre contraídas intuitu personae, em razão das qualidades pessoais do artista, que é exatamente o que fundamenta os casos de inexigibilidade na Lei de Licitações – Lei nº 8.666/93. 4. Denúncia rejeitada por falta de justa causa – art. 395, III, do Código de Processo Penal. (Inq 2482, Relator(a): AYRES BRITTO, Relator(a) p/ Acórdão: LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 15-09-2011, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-035 DIVULG 16-02-2012 PUBLIC 17-02-2012) Por restas razões, de rigor a manutenção do decreto absolutório. Dispositivo Diante do exposto, nego provimento à apelação do Ministério Público Federal. É o voto.
PROCURADOR: PROCURADORIA DA REPÚBLICA-EM SÃO PAULO
Advogado do(a) APELADO: DORCILIO RAMOS SODRE JUNIOR - SP129440-A
Ainda que o Ministério do Turismo tenha reprovado a Prestação de Contas relativo ao Convênio n. 722.029/2009, por não ter sido apresentada toda documentação exigida (id 203913572, pág. 67/70), é certo que o evento foi realizado, com a apresentação dos artistas contratados.
E M E N T A
PENAL. PROCESSO PENAL. INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO. LEI N. 8.666/93, ART. 89, CAPUT E PARÁGRAFO ÚNICO. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. MATERIALIDADE PROVADA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE AUTORIA DE CONDUTA DOLOSA. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. Apelação interposta pela Acusação contra sentença que absolveu os réus da imputada prática do art. 89, caput e paragrafo único, da lei n. 8.666/93, em virtude da insuficiência de prova do efetivo prejuízo à administração pública.
2. A Lei n. 14.133/2021 revogou expressamente os artigos 89 a 108, todos da Lei n. 8.666/93, com efeitos a partir da publicação da referida lei, nos termos do artigo 193, I, da Lei n. 14.133/2021. Todavia, consoante jurisprudência do STJ, “não há se falar em abolitio criminis com relação aos crimes da Lei n. 8.666/1993, porquanto houve a continuidade típico-normativa, por meio da inserção do Capítulo II-B no Código Penal, intitulado ‘Dos Crimes em Licitações e Contratos Administrativos’.” (AgRg no AREsp n. 2.073.726/PA, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 21/6/2022, DJe de 27/6/2022.). (AgRg no REsp n. 1.996.050/MG, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 11/9/2023, DJe de 14/9/2023.).
3. O art. 89, caput, da Lei n. 8.666/93 previa três figuras típicas: na primeira parte, a dispensa de licitação e a inexigibilidade de licitação fora das hipóteses previstas em lei, e na segunda parte, o descumprimento das formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade. A conduta de “dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei” continua normatizada no novo tipo penal introduzido no artigo 337-E, do Código Penal, que criminaliza a conduta de “contratação direta fora das hipóteses previstas em lei”. Dessa forma, embora o crime do art. 89 da Lei n. 8.666/93 tenha sido revogado, não há que se falar em abolitio criminis, pois a conduta encontra correspondência no novel artigo 337-E do Código Penal, considerado o princípio da continuidade típico-normativa.
4. A conduta de descumprimento das formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade, prevista na segunda parte do art. 89 da Lei n. 8.666/93, não é mais tipificada como crime, ocorrendo abolitio criminis.
5. A conduta prevista no parágrafo único do art. 89 da Lei n. 8.666/93, do particular que concorre para o crime de dispensa/inexigibilidade de licitação praticado pelo funcionário público, permanece típica, configurando o crime do art. 337-E do Código Penal, na forma do art. 29 do Código Penal, que dispõe expressamente que: “Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade”.
6. Consoante entendimento pacificado no Superior Tribunal de Justiça, para a configuração do crime do art. 89 da Lei n. 8.666/93, é necessária a presença cumulativa do dolo específico de causar dano ao erário e a demonstração da efetiva ocorrência de prejuízo à Administração Pública, sob pena de a conduta ser considerada atípica. Precedentes da 2ª Turma do STF e desta Corte Regional.
7. No caso em tela, não há prova do efetivo prejuízo à Administração Pública. Conforme ponderado pelo juízo sentenciante, “a denúncia não refere e os autos não apontam que os valores despendidos para contratação de cada dupla eram superiores ao do mercado artístico - certamente, de duplas do mesmo nível consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública.” A Acusação não demonstrou que essas mesmas duplas tenham recebido valores inferiores por apresentação em eventos diversos. Ademais, consoante Processo de Inexigibilidade de Licitação nº 001/2010, o objeto era não apenas a contratação de shows artísticos, mas também o fornecimento e montagem de estrutura para realização dos eventos, em conformidade com convênio celebrado junto ao Ministério do Turismo. Ademais, o evento foi realizado, com a apresentação dos artistas contratados.
8. Conforme entendimento do STF, a inexigibilidade da licitação fundada em parecer jurídico lavrado idoneamente pelo órgão competente descaracteriza o crime por ausência de dolo, quando não demonstrado conluio na elaboração do parecer.
9. Apelação desprovida.